22 VIVACIDADE | JULHO 2021
SOCIEDADE
“O folclore é isso, é o convívio. Para muitas pessoas as nossas saídas e os nossos ensaios, eram uma forma de sair de casa” Atualmente, o Rancho Folclórico “As Ceifeiras de Sta Maria de Medas”, é constituído por 55 pessoas, sendo que o elemento mais novo tem 12 anos e o mais velho 75 anos. Com 61 anos de vida, é uma associação com história em Medas e que, devido à pandemia, está a passar momentos conturbados. Estivemos à conversa com José Sousa, Vice Presidente e Eusébio, Secretário da Assembleia, que nos revelaram como tem sido os últimos tempos. Como é que foi fundado o Rancho Folclórico “As Ceifeiras de Sta Maria de Medas”? Esta Associação foi fundada a 19 de junho de 1960. A ideia surgiu porque havia o hábito aqui nas redondezas de fazerem o chamado ‘zonas’, outras localidades chamam de ‘cortejos’. As zonas eram, o que nós chamamos, hoje, de lugares. Havia os lugares de cima e os de baixo. Portanto, os populares juntavam-se para angariar fundos para festas ou desfiles. E, a iniciativa correu bem e as pessoas gostavam daquelas danças, resolveram criar o Rancho Folclórico Ceifeira de Santa Maria de Medas. Todos os anos, por volta do nosso aniversário, temos o hábito de realizar um festival, mas devido ao momento que estamos a passar, não nos foi permitido fazer. E, o que é que vos diferencia dos outros Ranchos que existem? As músicas do Rancho das Medas e os cantares são originais. Embora que, outros Ranchos já tenham algumas e outros fizeram umas adaptações. Mas o Rancho das Medas é considerado do Douro Litoral, ou seja, temos muitos ‘viras’. Nós até temos um livro que foi uma pessoa aqui da Terra que o escreveu, onde consta as nossas músicas, para preservar para o futuro. Um Rancho é sinónimo de tradição. Vocês sentem que, com o passar dos anos, a dificuldade em atrair pessoas aumenta? Já há um pouco de dificuldade. Ainda vai aparecendo algumas pessoas, mas já não é, como era de antes. Eu tenho 32 anos de
> Eusébio e José Sousa dirigentes da Associação
Rancho e, na altura, o ambiente, a maneira de conviver com as pessoas era diferente. Claro que, com o passar dos anos, as coisas mudam, apesar de ainda haver alguns jovens que acabam por vir, porque tem familiares ou conhecidos na Associação. Mas na minha perceção, o Folclore no geral está a perder um pouco da força que tinha em certas zonas e isso preocupa-nos. Por exemplo, os acordionistas é uma preocupação constante, porque antigamente havia jovens que iam aprendendo, agora, para arranjar um é complicado e, pelo menos no nosso rancho, a base essencial das nossas músicas é o acordeão. Sentem o apoio das entidades à valorização da vossa arte? Eu sinto que muitas vezes não há compreensão por parte de algumas entidades. Nós somos uma coletividade sem fins lucrativos e de utilidade pública. Se temos utilidade pública, quando digo nós, falo também pelas outras, pelo menos o IMI ou o IVA, deveria de funcionar de forma diferente, principalmente em alturas de pandemia. Na minha opinião deveria de haver mais consideração. Mesmo com a água e a luz fechadas, temos que pagar na mesma as taxas. E, quanto às telecomunicações, as operadoras, mesmo vendo que nada está a ser utilizado, elas cobram-nos na mesma. Já tentamos de tudo para cancelar ou interromper o contrato, mas eles só querem saber do dinheiro. Com as ajudas da Câmara e da Junta, as coisas foram-se compondo. Na vossa perspetiva, o que é que foi o mais difícil com a pandemia? Todos os anos, juntamente com a Junta de Freguesia, nós fazíamos eventos aqui,
como as comemorações do 25 de abril. Nós conseguíamos trazer para aqui as coletividades todas. Em simultâneo, todos os anos fazíamos festivais, com Ranchos Nacionais, que são as chamadas permutas. Nós ficávamos de ir lá e depois eles vinham cá. Com a pandemia tudo acabou e nem sabemos quando é que vamos voltar. O Folclore é o convívio entre as pessoas, que são como uma família, porque trabalham a semana toda e depois vem ao fim de semana, para aqui, relaxar um pouco. Depois, quando tínhamos as saídas, eram a cereja no topo do bolo. O folclore é isso, é o convívio. Para muitas pessoas as nossas saídas e os nossos ensaios, eram uma forma de sair de casa. Como é que foi para vocês lidar com o último ano a nível económico? Sentimos muito e vou acentuar o muito, porque o Rancho não tem patrocínios e arranja-los é muito difícil, assim, um Rancho vive das atuações que faz nas festas. E, uma sede como a nossa, tem uma despesa mensal muito grande. Por exemplo, as entidades da água, luz e telecomunicações não têm compreensão com as dificuldades das Associações. Chegamos a pedir até para, por exemplo cancelar o pacote de telecomunicações e até propusemos assinar um contrato, onde iria constar que, quando retomássemos as nossas funções, eles seriam a empresa escolhida, mas não, eles não aceitaram ajudar. As poucas reservas que tínhamos guardado no banco, foram-se. A Câmara e, em particular, a Junta de Freguesia, ajudaram-nos. Para não falar que temos um Vice Presidente que, pontualmente, ajuda a nossa Associação a sobreviver. Estivemos fechados e
só abrimos há oito dias. Este verão, provavelmente, será mais um verão esquecido. Nós temos um palco para espetáculos que é verdadeiramente de ponta. Foi graças a esse palco que conseguimos pagar algumas despesas, como o IMI. É ele que nos ajuda a sustentar. Porque o Rancho em si e as atuações não justifica, porque temos sempre despesas. As pessoas que fazem parte da nossa associação, estão sempre a perguntar quando é que os ensaios irão retomar, mas para já ainda não temos previsão de quando vamos voltar. Isto porque, treinar com máscaras é difícil, porque as nossas danças são muito exigentes. Não é aquele folclore que as pessoas estão habituadas. E, o que é que vocês esperam para o futuro? A palavra que me vem à cabeça é ‘tremido’, porque nós não vamos ter atuações neste verão, dado que, normalmente a época mais alta é junho e agosto. Neste momento, já estamos a meio do mês de julho e não há nada agendado e quanto a agosto, como nós não podemos fazer as romarias, não podemos fazer as festas, vamos entrar na época baixa, que será até ao mês de maio do próximo ano. Portanto, quanto ao futuro, vamos tentar aguentar, não com o Folclore, mas com a sede que temos e que irá ajudar a pagar as nossas despesas. Como é que as pessoas podem entrar em contacto com a vossa associação? Nós temos o nosso email e o nosso telefone. Além disso, também criei uma página na internet e temos Facebook, embora que, este ano, sem as atuações, a nossa página não está atualizada. ■