ALIMENTAÇÃO ANIMAL SUSTENTABILIDADE
VALORIZAÇÃO DOS PRODUTOS DOS RUMINANTES PELA SUA COMPOSIÇÃO EM ÁCIDOS GORDOS PROJETO VAL+ALENTEJO Eliana Jerónimo CEBAL – Centro de Biotecnologia Agrícola e Agro-Alimentar do Alentejo MED – Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento José Santos-Silva Polo de Investigação da Fonte Boa, Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária CIISA – Centro Investigação Interdisciplinar em Sanidade Animal Rui J. B. Bessa Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade de Lisboa CIISA – Centro Investigação Interdisciplinar em Sanidade Animal
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ALIMEN TAÇÃO AN IMAL
Os produtos dos ruminantes – carne, leite e derivados, são uma importante fonte de proteína de elevada qualidade, vitaminas, minerais e de ácidos gordos bioativos na alimentação humana. Embora estes alimentos assumam um importante papel na evolução humana, na atualidade são muitas vezes conotados de uma forma negativa, devido não só a questões relativas aos impactos ambientais da produção de ruminantes, mas também ao risco de desenvolvimento de doenças crónicas a que tem sido associado o seu consumo. Esta má imagem do ponto de vista nutricional dos produtos dos ruminantes deve-se, em grande parte, ao seu perfil de ácidos gordos, apresentando uma elevada quantidade de ácidos gordos saturados, quantidade variável de ácidos gordos trans e baixos níveis de ácidos gordos polinsaturados. A composição em ácidos gordos da carne de borrego e cabrito e de leite de ovelha e cabra é apresentada na Tabela 1. As recomendações nutricionais apontam para a redução do consumo de gordura e de ácidos gordos saturados e trans e para o aumento do consumo de ácidos gordos polinsaturados como medida para prevenção de doenças crónicas [1], o que tem sido favorável à redução, eliminação ou substituição dos produtos dos ruminantes por outros alimentos considerados mais saudáveis na dieta humana. Apesar de ser já claro que os vários ácidos gordos saturados diferem grandemente quanto ao seu impacto na saúde, as mais recentes recomendações nutricionais ainda não o considera, mantendo-se a indicação para redução do consumo de gorduras saturadas independentemente da sua composição [1]. Os diferentes ácidos gordos trans também podem apresentar atividades biológicas distintas. Relativamente aos ácidos gordos trans de origem industrial, que se encontram presentes em margarinas, bolachas ou produtos de pastelaria, existem consistentes evidências dos seus efeitos adversos para a saúde, nomeadamente no aumento do risco de doenças cardiovasculares, de cancro e diabetes [2]. Neste tipo de produtos, os ácidos gordos trans podem atingir até 60% da gordura, enquanto que nos produtos dos ruminantes a proporção ácidos gordos trans varia entre 2 e 5% da gordura [2]. Os ácidos 18:1 trans-11 (ácido vacénico) e 18:1 trans-10 são os que predominam nos produtos dos ruminantes, sendo que a quantidade de cada um deles no produto depende da dieta a que o animal está sujeito [3,4]. O 18:1 trans-11,
que ocorre em maior abundância na carne e leite de animais alimentados com dietas ricas em pastagens e forragens, está associado a vários efeitos benéficos para a saúde, tendo sido demonstrado o seu efeito anti-inflamatório, anticancerígeno, antiaterogénico e antidiabético em modelos celulares e animais [4–6]. Pelo contrário, o 18:1 trans-10, que é encontrado em maior quantidade nos produtos dos ruminantes alimentados com dietas ricas em cereais [7], está associado a efeitos adversos para a saúde [4,6]. Por outro lado, as recomendações nutricionais que promovem a redução/eliminação do consumo de produtos com origem nos ruminantes negligenciam o papel que estes produtos podem ter no fornecimento de ácidos gordos com potenciais efeitos benéficos para a saúde, particularmente em ácidos gordos polinsaturados da série n-3 (ómega-3) e em ácidos gordos resultantes do processo de bioidrogenação ruminal, como o 18:1 trans-11 e os isómeros conjugados do ácido linoleico (CLA). Os efeitos benéficos dos ácidos gordos ómega-3 estão particularmente associados aos ómega-3 de cadeia longa, aos ácidos eicosapentanóico (20:5 n-3, EPA), docosapentaenóico (22:5 n-3, DPA) e docosahexanóico (22:6 n-3, DHA), que têm um importante papel na prevenção de doenças crónicas, com efeitos antiaterogénico, antitrombótico, anti-inflamatório e anticancerígeno [8]. O consumo de ácidos gordos ómega-3 de cadeia longa está também associado a um menor risco de desenvolvimento de doenças neurodegenerativas [8]. Estes ácidos gordos encontram-se em elevadas quantidades nos produtos de origem marinha, no entanto os produtos dos ruminantes produzidos em determinadas condições também podem ter um importante contributo para a satisfação das necessidades diárias destes ácidos gordos. Os CLA também têm demostrado importantes atividades biológicas em diversos modelos celulares e animais, como redução da gordura corporal, efeitos anticancerígeno, antiaterogénico e anti-inflamatório [9,10].
Metabolismo Lipídico em Ruminantes O perfil de ácidos gordos dos produtos dos ruminantes resulta da intensa metabolização que os lípidos da dieta sofrem durante o processo digestivo, especificamente no rúmen por ação da população microbiana. Os lípidos presentes