TGI I 2021 Ana Victoria - IAU USP

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A CIDADE COMO INFRAESTRUTURA DE SAÚDE À LUZ DAS DISCUSSÕES DE VIDA URBANA PÓS PANDEMIA

Ana Victoria Silva Gonçalves Trabalho de Graduação Integrado I 1


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A cidade como infraestrutura de saúde à luz das discussões de vida urbana pós pandemia Ana Victoria Silva Gonçalves Orientação: Bruno Damineli | Joubert Lancha Trabalho de Graduação Integrado I Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAUUSP) São Carlos 2021

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Em memória das mais de 500 mil vidas brasileiras perdidas para a COVID-19, agravadas pela negligência e descaso do atual Governo Federal. 5


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CONTEÚDO INTRODUÇÃO

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PROPOSTAS

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REFLEXÕES E QUESTIONAMENTOS

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conceitos

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a saúde na cidade

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a área

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desenvolvimento urbano de baixo impacto

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proposta de macrozoneamento

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cidade pós-covid

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recorte de desenho urbano

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LEITURAS E APROXIMAÇÕES

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as vilas no local

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franco da rocha nos eixos

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EXPERIMENTAÇÕES

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franco da rocha no território metropolitano

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desenho de viário

68

município

22

unidade urbana: vila

70

mobilidade

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PARA AS PRÓXIMAS ETAPAS

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meio ambiente e clima

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BIBLIOGRAFIA

74

a cidade

28

o complexo hospitalar do juquery

20

marcos na linha do tempo

38

o complexo em satélite

40

parque estadual do juquery

42

emplasa

48

visita de campo

50

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INTRODUÇÃO Passado apenas 1/5 do século XXI, já temos evidências suficientes de que precisamos reajustar a forma como produzimos, consumimos e nos relacionamos. São incontáveis as tragédias mundiais e nacionais que ocorreram nos últimos 20 anos: aumento no nível dos oceanos, acidentes nucleares irreversíveis, recordes de desmatamento e queimadas na Amazônia e no Pantanal, vazamento de óleo nos oceanos, rompimento da barragem em Mariana, e a mais recente tragédia sanitária mundial da COVID-19. Embora essa listagem aparente ser uma visão pessimista ou ainda uma anunciação do colapso inevitável, reforço que são apenas fatos de eventos reais que aconteceram nos últimos anos no Brasil e no mundo. Entretanto, tragédias não são apenas as de grande divulgação e comoção como as supracitadas, pois diariamente a nossa forma de habitar e viver avança em direção a situações irreversíveis, e a consequente destruição do planeta. E são nas cidades onde essas atividades ocorrem com maior voracidade, a partir do acúmulo de lixo incapaz de ser decomposto na mesma velocidade que é produzido, da poluição corrente de rios por falta de tratamento de esgoto, ou ainda da grande geração de dióxido de carbono pelos meios de transporte motorizados à combustão. Segundo dados da ONU, atualmente 55% da população mundial vive em áreas urbanas, e

a expectativa é de que essa porcentagem aumente para até 70% até 2050. Semelhante a isso, os gráficos abaixo mostram que no Brasil a situação é ainda mais representativa, podendo chegar a mais de 90% para o mesmo ano. Com isso, aumentam também a produção de lixo, a demanda por transportes motorizados, desmatamento, impermeabilização do solo, ilhas de calor, poluição dos rios etc. “Tomando-se como referência o fato de a maior parte da população brasileira viver em cidades, observa-se uma crescente degradação das condições de vida, refletindo uma crise ambiental. Isto nos remete a uma necessária reflexão sobre os desafios para mudar as formas de pensar e agir em torno da questão ambiental numa perspectiva contemporânea.” (JACOBI, 2003, p.190)

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Para além das questões ambientais, a forma como habitamos e produzimos a cidade atualmente é prejudicial também em termos de saúde. Segundo o médico patologista e pesquisador Paulo Saldiva, a vida urbana implicou na piora da saúde da população urbana de diversas formas, visto que algumas doenças surgiram ou são decorrentes da vida urbana e seus desdobramentos. Entre os casos, estão o aumento na obesidade, doenças cardiorrespiratórias, e as mortes no trânsito. O médico ainda afirma que para esses problemas a resposta não deve se dar por intermédio de medicamentos ou tratamentos, mas sim a prevenção e a melhora na qualidade de vida urbana. Em uma reportagem à Revista FAPESP em 2016, o médico comentou estudos que relacionam a proximidade de habitação a parques com a diminuição no risco de morte por infarto agudo, e que isso se deve ao aumento da umidade, diminuição da poluição e exercícios físicos ao ar livre. (FIORAVANTI, Revista FAPESP, 2016) Soma-se, finalmente, a maior crise sanitária e humanitária dos últimos com o surgimento do vírus SARS-CoV (popularmente conhecido como coronavírus), que no instante em que escrevo já fez mais de 3,94 milhões de vítimas globais, sendo 516 mil no Brasil - o segundo país com maior número conforme mostra o gráfico seguinte.


“A problemática da sustentabilidade assume neste novo século um papel central na reflexão sobre as dimensões do desenvolvimento e das alternativas que se configuram. O quadro socioambiental que caracteriza as sociedades contemporâneas revela que o impacto dos humanos sobre o meio ambiente tem tido conseqüências cada vez mais complexas, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos” (JACOBI, 2003, p.193)

Não há, ainda, um consenso sobre quais circunstâncias deram origem à transmissão do vírus pelos humanos, mas de qualquer forma a pandemia iluminou a fragilidade dos aspectos sanitários para grande parte da nossa sociedade. No Brasil, e mais especificamente em São Paulo, o maior número de vítimas estão nas periferias (mapap ao lado), onde as condições de habitação e saneamento são mais vulneráveis.

De grosso modo, enquanto alguns discutem as formas corretas de se lavar as mãos e a higienização de todos os alimentos, outros enfrentam falta d’água para beber e de qualquer alimento para consumir.

“A sustentabilidade como novo critério básico e integrador precisa estimular permanentemente as responsabilidades éticas, na medida em que a ênfase nos aspectos extra-econômicos serve para reconsiderar os aspectos relacionados com a eqüidade, a justiça social e a própria ética dos seres vivos. A noção de sustentabilidade implica, portanto, uma inter-relação necessária de justiça social, qualidade de vida, equilíbrio ambiental e a ruptura com o atual padrão de desenvolvimento (JACOBI, 2003, p. 196)

Diante disso, é inegável que as cidades e as atuais formas de produzir e consumir no espaço urbano devem ser repensadas sob a ótica da sustentabilidade. O termo desenvolvimento sustentável surge para equilibrar os processos naturais do meio ambiente e a necessidade de desenvolvimento econômico. Já a sustentabilidade refere-se à necessidade de impor limites às possibilidades de crescimento, ainda que diante do atual padrão predatório de desenvolvimento. 9

Em suma, ao passo que avançamos enquanto sociedade, ciência e tecnologia, também caminhamos em direção a situações cada vez mais complexas. Por isso, este trabalho propõe explorar e repensar, no campo projetual, de como nós produtores do espaço urbano podemos contribuir na construção de cidades mais resilientes, sustentáveis e saudáveis.


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REFLEXÕES E QUESTIONAMENTOS 11


A SAÚDE NA CIDADE frequentemente faz com que as pessoas inalem maiores quantidades de poluentes atmosféricos. Em contraposição, outras formas de transporte especialmente os ativos, isto é, transportes em que se emprega algum tipo de exercício físico como caminhar ou pedalar, o mesmo não acontece:

O que movia, e ainda move as pessoas do campo para as cidades são, principalmente, as buscas por melhores oportunidades de emprego, de lazer, de cultura, e de qualidade de vida. Entretanto, esse movimento de adensamento populacional descontrolado, aliado à más condições de saneamento criaram ambientes propícios para surgimento de doenças históricas tais como a peste negra, malária, febre amarela, tifo e tuberculose, cuja ocorrência se deu com maior descontrole nas cidades. Soma-se a isso o surgimento mais recente de situações que atentam contra a saúde dos habitantes da cidade, como a violência no trânsito, a criminalidade e os acidentes urbanos, que embora não sejam contagiosos como são algumas doenças, ainda assim prejudicam a saúde tanto quanto. E como pano de fundo tem-se as constantes poluição atmosférica, imobilidade urbana e sedentarismo, formação das ilhas de calor etc. Deste contexto, depreende-se o aumento de obesidade, doenças mentais como estresse e ansiedade, problemas cardíacos e respiratórios, e aumento na contagiosidade. Nesse sentido, o pesquisador e médico Paulo Saldiva explica que as respostas mais comuns que temos aos problemas tipicamente urbanos são no sentido do tratamento e gestão da crise já estabelecida, quando na verdade é a prevenção que deveria ser discutida:

“No caso da bicicleta, respiramos maior quantidade de ar para fazer frente ao exercício, mas a dose de poluentes que um ciclista recebe em geral é menor, pois, a despeito do maior volume inalado, o tempo de permanência no congestionamento é menor pela agilidade do modal. Portanto, procurar ruas mais tranquilas para pedalar ajuda não apenas na segurança, mas também na saúde.” (SALDIVA, 2018, p. 71)

A discussão pode se estender também para as ilhas de calor e as mudanças climáticas, pois inegavelmente as cidades estão se tornando cada vez mais quentes e impermeáveis no verão, e geladas e infecciosas no inverno. O médico relaciona alguns fatores fisiológicos do corpo humano diante das variações térmicas, e acrescenta que a alteração de temperatura de forma a constituir ambientes urbanos para além do conforto térmico da população pode levar a um aumento de até 50% da mortalidade.

“Considerando que somos afetados pelas variações de temperatura, temos que imaginar antídotos que aumentem a resiliência urbana às mudanças climáticas, notadamente quanto às ilhas de calor urbano. Talvez o recurso mais reconhecido para tal seja a ampliação das áreas verdes, recuperando em partes o espaço cedido ao concreto e cimento. A presença da vegetação faz com que a radiação solar seja absorvida pelas folhas das árvores e vegetação rasteira, reduzindo a temperatura.” SALVIDA, 2018, p.95)

“Com o progressivo desenvolvimento de sistemas democráticos, as cidades passam a dispor de estruturas parlamentares que têm como função harmonizar as informações recebidas dos diferentes atores urbanos, integrá-las e tomar decisões que favoreçam o conjunto da cidade e seus cidadãos. [...] Ineficiência e incompetência forçam as cidades a transformarem a arquitetura de sua governança, modificando o sistema de longo prazo para um procedimento de gestão das crises que se apresentam para o momento. Em termos médicos, abandonamos as medidas de promoção da saúde e abrimos as portas de um pronto-socorro urbano. Gerir crises sem o devido planejamento de futuro tornou as megacidades ineficientes, virtualmente insustentáveis e, como consequência, pouco saudáveis.” (SALDIVA, 2018, p.29)

Diante desse exposto, as minhas reflexões alcançam os questionamentos de que se é possível viver nas cidades sem que elas nos adoeçam; e se sim, como? Apesar de todo o discorrido, as cidades ainda são nossos locais de encontro, de convivência, de conquista e de constante luta, e todos nós temos o direito a ela. Assim, cabe a cada um de nós enquanto cidadãos, mas especialmente aos nossos líderes e governantes, a responsabilidade de liderar a construção de cidades mais sustentáveis e hábitos de vida urbana mais saudáveis.

Quando analisamos a imobilidade urbana, por exemplo, percebemos que os prejuízos são de diferentes ordens: perdemos horas de sono e ganhamos horas no trânsito, ganhamos peso, aumentamos o nível de estresse e reduzimos o tempo de convívio social. Além disso, a imobilidade urbana 12


DESENVOLVIMENTO URBANO DE BAIXO IMPACTO Ainda dentro da discussão de saúde e cidade, é inevitável não abordar as questões de infraestrutura verde e azul como suporte no aumento da qualidade de vida e saúde de seus habitantes. Nesse sentido, a expansão da mancha urbana colabora não apenas na impermeabilização do solo e poluição atmosférica, como também na formação de ilhas de calor devido à ausência de grandes áreas verdes na cidade (RUBIRA, 2015). Assim, conforme já exposto, essa realidade diminui de forma significativa a saúde de seus habitantes, colabora no surgimento de infecções e doenças respiratórias, e cria um ambiente favorável ao surgimento de novas epidemias. No século XIX, com o aumento das aglomerações urbanas e o início das discussões epidemiológicas, preconizou-se que os fluidos - especialmente as águas urbanas - eram os principais responsáveis pela transmissão de doenças. Nesse momento, houve uma importante mudança de paradigma sanitário, que conduziu ao conceito higienista (e majoritariamente insustentável de drenagem desse período (SOUZA et. al, 2012). A prática caracterizava-se pela evacuação rápida das águas pluviais, e impermeabilização de áreas urbanas que deram lugar, posteriormente, a grandes avenidas e sistemas de condutos artificiais. Ao fim do século XIX, o engenheiro Saturnino de Brito surge nesse debate com sugestões que contrariavam em partes esses preceitos, e em defesa da conservação do sistema natural de drenagem (ANDRADE, 1996). Após isso, os sistemas de drenagem tornaram-se cada vez mais comuns nas cidades brasileiras, mas Souza et al (2012) ressalta que frequentemente a forma como são realizadas as drenagens além de provocarem alterações no ciclo hidrológico, também aceleram e ampliam o pico de descarga superficial, aumentando, assim, o volume do escoamento superficial e a duração das inundações.

Frente às problemáticas expostas desde a introdução, a busca por técnicas e dispositivos de manejo mais sustentável tornaram-se cada vez mais comuns devido ao aumento das ameaças aos corpos hídricos de interesse ambiental urbano e regional. É neste contexto que surgem as discussões de Desenvolvimento Urbano de Baixo Impacto - ou LID do inglês Low Impact Development - e por meio do emprego de conhecimentos e planejamento multidisciplinar integrado. Os princípios do LID consistem em: 1. conservação e preservação vegetal, minimizando a impermeabilização do solo 2. projetos únicos que respeitem as particularidades locais naturais 3. direcionar o escoamento para as áreas vegetadas, encorajando a infiltração ao invés do escoamento superficial 4. controles de inundação distribuídos em pequenas escalas 5. prevenção à poluição e educação ambiental Outro importante manual é o SuDS (Sustainable Drainage Systems), que também defende a conservação, e reconhece o papel do solo e da vegetação no controle de águas pluviais e ciclos naturais que promovem a renovação do ar (SOUZA et. al, 2012). É evidente que o processo de construção da cidade não considerou muitos aspectos naturais determinantes para promover qualidade de vida. Conforme discutido na questão anterior, vimos que o espaço da cidade não é estimulante para uma vida saudável, e agora percorremos trajetos que mostram que o espaço das cidades também não foi construído respeitando as sensibilidades ambientais, seja pela impermeabilização do solo, seja pelo esquecimento dos rios. É diante desse percurso histórico e discussão crítica sobre formas e técnicas de desenvolvimento urbano resiliente que o trabalho pretende se apoiar nas etapas projetuais. A partir dos princípios e dispositivos apresentados pelos manuais, pretende-se, portanto, identificar e valorizar as características naturais essenciais para a manutenção de um equilíbrio.

“Com esta abordagem, o que acaba por ocorrer é (Baptista et al. 2005): (a) a transferência do problema para áreas de jusante, implicando em novas obras de ampliação do sistema com custos incrementais crescentes; (b) a falsa sensação de segurança na população com respeito às inundações, culminando em grandes prejuízos à sociedade, e; (c) a limitação de outros usos presentes ou futuros da água em meio urbano.” (Souza et al, 2012, p.10)

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Figura 1 – Difusão da epidemia de COVID-19 de abril a julho de 2020.

CIDADE PÓS-COVID Para outros processos históricos tão marcantes quanto, foram necessários anos de estudo e reflexão para apreender-se as principais contribuições e ensinamentos dessas situações. Como sabemos, este não é o caso, pois ainda vivemos sob os efeitos do vírus e o medo da doença. Contudo, é importante traçar o histórico do processo, ainda recente, buscando entender as diversas relações com as coisas, pessoas e espaço. Para tanto, inicialmente me apoiarei no capítulo “Epidemia de COVID-19, mapas à procura de fatores associados” de Hervé Théry na coletânea do livro “COVID-19: passado, presente e futuro”. Sabe-se que o vírus que surgiu na China percorreu primeiramente a Europa e posteriormente as Américas, estágio onde adentrou o Brasil. Nos mapas ao lado é possível acompanhar o percurso do coronavírus e o seu processo de contagiosidade pelo país. O que é importante notar nesses mapas é que à medida que o tempo avança, os círculos vermelhos aumentam em número e em raio, indicando o aumento no acúmulo total de casos; e as tonalidades em azul tornam-se mais escuras, indicando a relação de casos com a população de determinado estado, mais especificamente em direção a Amazônia. Ele acrescenta que, embora a região seja pouco povoada, a população está concentrada ao longo dos rios, que para aquele contexto são como nossas rodovias, isto é, os principais meios de transporte e por onde a população urbana se concentra, o que facilitou a rápida circulação da doença. (Théry, 2020) O autor segue analisando e relacionando mapas do avanço da COVID-19 com outros fatores socioeconômicos do país, como densidade em domicílios, razão de dependência familiar, saneamento inadequado, esperança de vida e população ativa sem renda. E pontua:

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“Analisando esses mapas, pode-se argumentar que a distribuição de casos (conhecidos) de COVID-19 é semelhante à de fatores como pobreza, más condições sanitárias associadas a ela, alta densidade de ocupação de moradias e seus equipamentos sanitários insuficientes, composição familiar com muitos dependentes (crianças, jovens e idosos) e baixo nível de escolaridade.” (THÉRY, 2020, p.109)

600 km

Fonte: Elaborada pelo autor (2020) com base em dados das Secretarias Estaduais de Saúde (MINISTÉRIO DAThéry SAÚDE, Software Cartes & Données ©Articque. FONTE: Elaborado por Henvé (2020)2020). com base nos dados das Secretarias Estaduais de Saúde (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020). Disponível em: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/book/552

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Além disso, um aspecto conhecido desde o início e que continua de extrema importância para o tema é a transmissão por meio da mobilidade contínua, capacidade que adquirimos e aprimoramos conforme avançamos enquanto sociedade. Nunca fomos tão urbanos, globalizados e interconectados. Atravessamos cidades, estados e até países em questão de horas. Nesse sentido, e restringindo o recorte para o interesse do trabalho, a rede de cidades especialmente no estado de São Paulo é a rede pela qual se estruturam diversas outras: de transporte, de economia, de riqueza, desigualdade social etc. Assim, é evidente o porquê o vírus entraria por São Paulo, e como ele mantém forte relação com as hierarquias dos centros urbanos (comparar mapas ao lado com os seguintes). O mapa anterior mostra não apenas a relação do eixo de contágio com os eixos rodoviários, mas também a relação com a rede de cidades mencionada. O alcance espacial dos fluxos que partem ou chegam em São

Paulo estrutura rotas de disseminação do vírus pelas cidades paulistas, especialmente as grandes e médias cidades. No âmbito das impressões pessoais, e diante de todo o exposto até o momento, me parece necessário e urgente a proposição de novas diretrizes e modelos de desenvolvimento e expansão urbana. Os investimentos públicos em saneamento básico, saúde e habitação para populações de vulnerabilidade social devem deixar, finalmente, o campo das discussões e migrar para a implementação urgente e obrigatória, pois não cabe mais discutir questões de ordem tão básicas frente aos temas abordados daqui em diante. Dito isso, a pandemia e as situações derivadas dela retomou as necessidades de uso dos recursos naturais e renováveis em diferentes escalas, como ventilação e iluminação natural. Isto é, a ventilação e iluminação tornou-se novamente de suma importância nos cômodos domiciliares, ambientes de trabalho e espaços públicos; depois de um longo período dominado pelo protagonismo da iluminação artificial e dos ares-condicionados. Nesse mesmo sentido, o fortalecimento das economias locais e dos produtores familiares rurais se fez ainda mais necessária diante de tamanha crise econômica, e soma-se a isso a necessidade de digitalização das interações sociais de trabalho, compra e venda. Essas situações surgidas pela pandemia abriram discussões sobre a retomada ou incentivo dessas questões, uma aliança entre o naturalizado e ancestral, e o inovador e digitalizado, ambos em prol de um melhor funcionamento das relações e dinâmicas diante desse contexto atípico e histórico. Assim, pode-se dizer que algumas dessas atividades podem e devem permanecer como modelos de funcionamento, especialmente aquelas que dizem respeito à construção de espaço e cidade mais saudável, sustentável e resiliente.

Elaborado pelo IBGE, disponível em: https://www2. unesp.br/portal#!/noticia/35626/por-que-a-circulacao-de-pessoas-tem-peso-na-difusao-da-pandemia

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LEITURAS E APROXIMAÇÕES 17


FRANCO DA ROCHA NOS EIXOS Franco da Rocha é um município localizado no estado de São Paulo, no norte da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) e vizinho às cidades de Caieiras e Francisco Morato, também da região norte metropolitana. Historicamente esses municípios foram os primeiros vetores de expansão urbana da capital, e juntamente com outras cidades formaram o que se entende por cinturão caipira, responsável pelo fornecimento de matéria prima para a capital. Essa região é cruzada por importantes eixos rodoviários como a Régis Bittencourt, Anhanguera, Bandeirantes, Tancredo Neves e Fernão Dias. Nesse sentido, Pizzolato (2008) destaca a importância de Franco da Rocha no cruzamento de dois eixos definidores da metrópole expandida de São Paulo: Diante disso, e somando ao exposto no tópico anterior de cidade pós covid, tanto os eixos quanto à “Deve-se compreender a metrópole expandida de São Paulo como o “quadrilátero geográfico” formados pelas cidades de Santos/Campinas (eixo norte-sul) e Sorocaba/São José dos Campos (eixo leste-oeste). Tal fenômeno, conforme conceituação mais recente, é definido como “cidade-mundo”. Esse conceito deriva do processo de globalização das relações sócio-econômicas representando a criação de uma centralizadora, não apenas geográfica, mas também virtual, onde as decisões financeiras e a distribuição de recursos de mão de obra por vários setores são definidas.” (PIZZOLATO, 2008, p.21)

localização na macrometrópole são fatores importantes para a cidade, pois essa conectividade sobre a rede de cidades que atravessa a região de Franco da Rocha ganha ainda mais importância, visto que esses eixos são correntes não apenas de circulação de pessoas, como de bens e mercadorias. A seguir, veremos que os movimentos pendulares que saem da cidade em direção à outras fora da RMSP por motivos de trabalho também somam nessa discussão. 18


20km

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3.2.2 Estrutura Setorial 3.2.2 Estrutura Setorial Figura 3.3 – Estrutura Setorial – Agropecuária (2012)

FRANCO DA ROCHA NO TERRITÓRIO METROPOLITANO Tabela 3.2 - Distribuição porcentual do VA de cada setor por município

Figura 3.3 – Estrutura Setorial – Agropecuária (2012)

Tabela 3.2 - Distribuição porcentual do VA de cada setor por município

Tabela 3.2 - Distribuição porcentual do VA de cada setor por município Figura 3.4 – Estrutura Setorial – Indústria (2012) Figura 3.4 – Estrutura Setorial – Indústria (2012)

Figura 3.5 – Estrutura Setorial – Serviços (2012) Figura 3.5 – Estrutura Setorial – Serviços (2012)

Os mapas são levantamentos realizados Relatório Preliminar de subsídio à elaboração do PDUI (Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado), e apontam importantes características da cidade de Franco da Rocha e cidades vizinhas. Segundo eles, a economia do município está fortemente associada às atividades de agropecuária e indústria no âmbito metropolitano. Além disso, o último mapa aponta para uma baixa participação das atividades de serviço na economia da cidade, o que é reforçado e justifica o gráfico de movimento pendular para fora da RMSP 22 por motivo de trabalho. Vale lembrar que por muito 22 tempo a situação não era essa, e na verdade a economia da cidade estava muito vinculada à presença do Complexo Hospitalar do Juquery, portanto com uma grande participação do serviço na economia local. Assim, as áreas rurais, periurbanas e industriais são os espaços de maior importância na ótica da economia municipal.

Figura 3.5 – Estrutura Setorial – Serviços (2012) Fonte: IBGE. Elaboração: Emplasa Fonte: IBGE. Elaboração: Emplasa

todas as figuras desta página foram elaboradas pela EMPLASA para o relatório preliminar do PDUI de 2015, e estão disponíveis em: https://www.pdui.sp.gov.br/ rmsp/?page_id=4948

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Os mapas à direita expressam a maior declividade e risco de deslizamento na região norte da RMSP. Essa leitura direciona um olhar mais atento e cuidadoso com a topografia local, solo e habitação, alinhado aos conceitos de resiliência urbana, diante da capacidade ambiental de suportar ou não determinados usos do solo.

SPMA due to local changes in hydrologic hydrometeorological conditions (which increas hazard) and landslide vulnerability. It makes the relationship between urban growth, floodi landslides due to increased impermeability, w aggravated by rainfall via microclimatic chan The land use in the SPMA is diverse (e.g services, industry, settlements with high stan wealth); however, the concentration of lowpopulations along the Tiete basin, in areas of tion (riverbanks and floodplains) causes con view of the precarious housing conditions, o tion of water bodies and weathering and eros Altogether, urbanization is causing serious c in the remaining areas of the watershed, stre into its tributaries and occupying its slopes and waters as well. If this process persists throug new areas of risk will appear and vulnerabil increase, with regard to both floods and lands The region of the SPMA where changes most intensely, with 80% of the already urb is the stretch that includes the Tiete and Pi River basins. These areas are located on th plain or stream terraces, where the natural v

other words, the area currently prone to landslides  (0.9%) could almost triple, from 21.21 km2 in 2008 to 69.88 km2 in 2030. These areas are located mainly in the Serra da Cantareira, Serra do Mar and in São Lourenço da Serra, which are not yet fully occupied since they are considered Areas of Environmental Protection. The areas consist of land located on steep slopes that contain alluvial deposits, and therefore require special care in the implementation of any kind of urban settlement; they are also unstable due to a combination of upstream erosion greater river energy and increased surface runoff.

4. CONCLUSION The combination of Dinamica EGO’s transition function, GIS and remote sensing techniques provides a powerful tool with respect to the generation Elaborados pela EMPLASA para o relatório preliminar doof spatial patterns of change. Through and evolution PDUI de 2015, e disponível the transition function, we performed a simulation of em: https://www.pdui.sp.gov. br/rmsp/?page_id=4948 future land use change (2030), utilizing land use maps from 2 different dates (2001 and 2008).

Figura 2.1. 4 - Declividade .

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Elaborados por Andrea Ferraz Young e disponível em: https://www.researchgate.net/ publication/269901162_Urban_expansion_and_environmental_risk_in_the_Sao_Paulo_Metropolitan_Area

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MUNICÍPIO Por fim, em relação ao aspecto sócio-econômico, o município tem renda média relativamente baixa, e os dados oficiais do último censo do IBGE apontaram para um intervalo de até 5.000,00 reais. Esse dado é importante quando relacionado com os aspectos económicos no âmbito da RMSP expostos anteriormente, em que Franco da Rocha tem a economia fortemente vinculada às atividades agropecuárias e industriais, e pouca presença de serviços.

No geral, o município apresenta baixa densidade em relação às outras áreas metropolitanas da RMSP, e como pode-se observar, o mapa de densidade expõe que a maior concentração de habitantes está disposta ao longo de dois importantes elementos: o rio juquery (leste-oeste), e a presença da linha da CPTM (norte-sul). Ou seja, a ocupação urbana e maior densidade concentram-se no quadrante direito do município. Contudo, sabe-se que outro fator condicionante para essa ocupação urbana é a topografia acidentada, e a presença histórica das grandes propriedades fundiárias também nessa porção leste, e que estavam associadas às atividades do Complexo Hospitalar, como veremos mais adiante. O mapa de declividade da página seguinte mostra uma menor variação de cor na região mais adensada.

Densidade/HA 0 - 34

Renda 0,00 reais - 1.000,00

34 - 80

1.001,00 - 2.000,00

80 - 119

2.001,00 - 3.000,00

119 - 189

3.001,00 - 4.000,00

189 - 435

4.001,00 - 5.000,00

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Os mapas das páginas 22 e 23 forram elaborados no QGiz com subsídio dos dados do IBGE do último censo de 2010.

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MOBILIDADE De todos os aspectos de mobilidade no município, talvez o de maior destaque seja a linha ferroviária da CPTM, que o integra à capital, e o conecta aos demais municípios localizados mais ao norte, como Francisco Morato. Inclusive, a linha de trem interliga a cidade com Jundiaí, já dentro da Região Metropolitana de Campinas. Dessa forma, é evidente que essa presença seja condicionante na ocupação urbana, dispondo a concentração de comércio, serviço e habitação ao longo dele. Entretanto, outro eixo importante é o da rodovia Estrada do Governo, que acompanha o rio Juquery, separando a área adensada e as áreas do Complexo Hospitalar e do Parque Estadual do Juquery, e conectando Franco da Rocha à cidade de Mairiporã e à rodovia Fernão Dias. Veremos mais adiante que é neste eixo rodoviário onde estão concentrados importantes equipamentos urbanos da cidade.

an

ha

ng

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ra

LEGENDA: raios de maior caminhabilidade linha da CPTM vias metropolitanas à melhorar vias metropolitanas à construir vias coletoras à construir ou melhorar limites municipais rios

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1km

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1km

FONTES: Mapa de Intervenções Urbanas da Diretoria de Planejamento da Prefeitura Municipal de Franco da Rocha, e IBGE produção gráfica própria

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MEIO AMBIENTE E CLIMA Gráfico do cruzamento da média mensal de chuva em 2016 no reservatório Paiva Castro do Sistema Cantareira, com a temperatura média do município de Franco da Rocha.

Gráfico Rosa dos Ventos para o município de São Paulo, a cidade mais próxima de Franco da Rocha com dados disponíveis

Fonte: ProjetEEE

Em relação ao clima, o gráfico aponta uma variação térmica entre 16 e 23ºC, o que representa uma amplitude suportável e de bom conforto térmico urbano. Contudo, os dados são referentes ao município de forma geral, que devido à presença de grandes áreas permeáveis e verdes por ter amenizado os dados sensíveis aos habitantes da cidade. Em outras palavras, esses números podem apresentar variações no meio urbano, sob influência dos aspectos como impermeabilização do solo, formação de ilhas de calor etc. Em relação à pluviosidade, a maior concentração de chuvas está distribuída nos meses de verão, como é esperado para o clima tropical da região sudeste. Contudo, observa-se um alto índice de pluviosidade no mês de junho, que geralmente é um mês de maior seca por introduzir a estação de inverno - a estação da seca. É de conhecimento de todos o histórico problema da ausência de chuva que coloca em xeque o abastecimento metropolitano de água, o que reforça ainda mais a importância desse dado, visto que Franco da Rocha está localizado no limite oeste do Sistema Cantareira - um dos mais importantes sistemas de abastecimento da RMSP. Por fim, no que se refere à ventilação no município, a rosa dos ventos indica a predominância vinda das direções leste, sudeste e em menor intensidade sul. A velocidade varia de 2 a 4m/s, o que pode ser intensificado pela formação de corredores de vento urbanizados ou vegetados; e sabe-se, por fim, que nas estações de inverno a direção principal dos ventos vem do nordeste e norte. 26

O mapa ao lado reúne informações geográficas e indicadores presentes nos anexos do Plano Diretor da Prefeitura Municipal de Franco da Rocha. Assim, os traçados referentes ao parque linear e via verde são indicações da própria prefeitura, mas em visitas de campo observou-se que não há uma qualidade urbanística que configure esse parque, e nem o que ao certo diz respeito à via verde. Entretanto, essas intenções serão incorporadas pelas propostas de projeto. Em relação ao meio físico do município, especificamente relativo ao quadrante leste onde estão concentrados a mancha urbana, o Complexo Hospitalar e o Parque Estadual do Juquery, o relevo é movimentado do tipo “mar de morros”, conforme indica o relatório da EMPLASA de 1987. Os baixos e médio terraços (720/730m) estão próximos ao Rio Juquery, e os mais altos patamares de morro grande (940m) estão no Parque Estadual. A área é de elevada drenagem pelo rio Juqueri, e abriga importantes nascentes de córregos. Os solos são rasos, raramente ultrapassando 1m de espessura, o que será retomado mais adiante no tópico do Parque Estadual, e o relatório também indica que as rochas são altamente erodíveis. A vegetação é composta por um mosaico de matas e campos limpos do cerrado.


LEGENDA: zona de interesse ambiental

zona de uso rural

zona de proteção ambiental

zona de condomínios em chácara

área do MST existente

rios e massas d’água

parque linear

parque de fundo de vale

cemitério privado existente

via verde

área de recuperação ambiental

cemitério municipal existente

cursos d’água

FONTES: Mapa de Sistema Municipal de A´reas Verdes da Prefeitura de Franco da Rocha; elaboração gráfica própria

27

Fonte: elaboração própria


CIDADE

28


O mapa sensível ao lado esquerdo expressa as presenças mais importantes que observei tanto em mapas, quanto em visitas. Novamente a linha ferroviária é um eixo concentrador de pessoas, comércios e serviços, e é por onde há maior presença de pessoas se locomovendo ativamente a pé, por bicicleta e skates - este último, inclusive, foi observado com frequência como elemento unificador e de transporte em grupo. Os equipamentos urbanos, representados pelos paralelepípedos no mapa, estão concentrados ou no eixo ferroviário, ou no eixo rodoviário, com ainda mais intensidade. Abaixo desse eixo rodoviário, tem-se uma imensa área não urbanizada, com presença de vegetação esparsa e característica do cerrado distribuídas nos morros, onde entre esses últimos há a presença de importantes dedos de mata ciliares que protegem naturalmente os cursos d’água. Essa área é contrastante à superior, onde estão concentrados os usos de habitação, comércio e serviço. Ao fim, tem-se o distrito industrial que adentra na imensa área do cerrado, e une indústrias do setor têxtil, de plástico e de metais. Ao lado, as duas primeiras imagens ilustram a paisagem urbana de topografia movimentada e terreno íngreme. A terceira indica o ponto de cruzamento do eixo ferroviário com o rodoviário, formando um viaduto muito significativo na paisagem, e por fim a última imagem refere-se à qualidade paisagística dada na transição da mancha urbana adensada em direção ao Complexo Hospitalar, atravessando o Rio Juquery.

Fotografias: Ana Victoria S. Gonçalves

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O COMPLEXO HOSPITALAR DO JUQUERY

Fotografia: Acervo IBGE

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O Complexo Hospitalar do Juquery está localizado na margem direita da linha férrea da CPTM, e até 1983 ocupava cerca de 20% de toda a área do município, cuja influência era tamanha nas primeiras décadas da cidade que essa teve seu desenvolvimento urbano e econômico vinculado ao Asilo. O trecho seguinte destaca impactos importantes do hospital em relação à aspectos territoriais e econômicos:

“a) o Juqueri ocupa aproximadamente 21% da área do município; b) em virtude da existência do Hospital de Juqueri, Franco da Rocha possui uma das maiores percentagens, na Grande São Paulo, de pessoas não naturais do município em relação à população total; c) devido ao funcionamento do Juqueri, a maior parte da população do município está alocada no setor terciário; d) o Juqueri, além do atendimento psiquiátrico, oferece serviço médico gratuito aos familiares dos internos e dos servidores, bem como à população de Franco da Rocha e municípios vizinhos; e) apenas 40% da população está servida com rede de esgoto; assim, os esgotos “in natura” e o lixo do hospital são lançados no rio Juqueri, contribuindo para a poluição dos cursos d’água da região.” (CASTRO SÁ, 1983, p. 86)

Não apenas a abrangência territorial, mas a dependência econômica em relação ao Complexo deve ser exaltada, especialmente porque conforme observamos nos mapas do PDUI, atualmente a situação é completamente diferente visto que a economia está intimamente ligada às atividades agropecuárias e industriais. Sabe-se que a cidade teve sua ocupação distribuída na porção marginal ao rio Juqueri, em função de serem áreas mais articuladas e próximas às Colônias Agrícolas do Complexo. Mas, para entender essa importante relação, é preciso entender o processo de formação desse Complexo na cidade de Franco da Rocha, que além de ter sido o primeiro e mais antigo Hospital Terapêutico do país, também foi o maior. 31


Em 1852, houve a inauguração do primeiro Manicômio de São Paulo após a Santa Casa de Misericórdia paulista recusar a população alienada da cidade, o que seria o início de uma cadeia de acontecimentos para a implantação do Complexo Hospitalar do Juquery. O espaço localizava-se em um edifício já existente na esquina das ruas São João (atual avenida São João) e Aurora, uma região que posteriormente passou por intenso processo de urbanização e adensamento urbano.

“O asilo iniciou suas atividades contando com nove internos, alguns criminosos vindos das cadeias públicas da cidade. Popularmente conhecida como Casa de Alienados, onde receberam apenas condições mínimas de habitabilidade, mas sem nenhum tipo de acompanhamento psiquiátrico. [...] A internação de escravos era condicionada ao pagamento de pensão diária ou havia a opção de dar aos alienados a carta de alforria, para que os mesmo ficassem à mercê do serviço - obviamente os donos dos escravos davam alforria para se verem livres do problema.” (PIZZOLATO, 2008, p.49)

Por se tratar de um edifício adaptado para receber essas atividades, o Asilo passou por diversas críticas de sanitaristas sob a acusação de ser considerado um cárcere ou depósito de presos. Em 1859, o prédio tornou-se insuficiente para atender às atividades e demandas, e diante disso o Governo do Estado comprou a chácara do Padre Monte Carmelo na Várzea do Tamanduateí, onde recebeu o Asilo e seus pacientes em 1862. A partir de então, sucessivas expansões foram necessárias para atender a demanda cada vez maior de pacientes “alienados”, que agora estavam sob tratamentos coordenados pelo Dr. Inácio Xavier Paes de Campos. Em 1881, o número de pacientes era de 67 homens e 70 mulheres, mas é apenas em

1888 que a ala feminina foi construída. Ou seja, as condições de abrigo já denunciavam uma situação de superlotação. Diante disso, o governo do Estado promulga a lei nº15 de 11 de novembro de 1891 criando três novas colônias agrícolas para alienados em cidades fora de São Paulo, cujo interesse é na colônia de Sorocaba que mais tarde encaminhará os primeiros pacientes para o Juquery. Outro importante aspecto desse momento é o início da direção na Instituição pelo Dr. Franco da Rocha, que impactou numa remodelação do sistema assistencial, implicando em uma visão social avançada e na implantação da própria psicanálise. (PIZZOLATO, 2008, p. 52 e 53)

“Conjuntamente com o Dr. Franco da Rocha, formou-se uma comissão composta pelo engenheiro Theodoro Sampaio e o naturalista sueco Albert Loefgren, com o intuito de propor um leque de características topográficas e de localização importantes para resolver a situação para o novo local. Foram definidos os seguintes parâmetros: Não ser muito perto da cidade, para que em breve não seja o edifico alcançado pelo desenvolvimento que a mesma possa tomar; Ter área suficiente não só para as edificações necessárias, como também para a aplicação agrícola dos asilados; Ser de fácil acesso, o que não só convirá à construção como à fiscalização do estabelecimento Ter abundância de água para todos os misteres; Não apresentar dificuldades para o transporte dos materiais de modo a encarecê-los; Não serem muito caros os terrenos.” (PIZZOLATO, 2008, p. 53)

A região do Juquery se destacou pela sua proximidade com a cidade de Caieiras que à época produzia cal e pedra, materiais que seriam utilizados na construção dos edifícios, e pela quantidade de trens que circulavam na região. Assim, foram adquiridos 150 hectares na região do Juquery, e a primeira construção iniciou-se em 1895 com projeto 32


de Ramos de Azevedo e capacidade inicial de 800 leitos, inaugurados em 1898 pelos pacientes vindos de Sorocaba. O conceito do Asilo deriva das recomendações do Congresso Internacional de Alienistas, realizado em Paris, 10 anos antes da inauguração do primeiro edifício do Juquery. De forma geral, as recomendações diziam respeito a ter-se colônias agrícolas anexadas aos asilos, e adotar um sistema onde deveria haver um asilo central cercado de áreas destinadas ao trabalho agrícola desenvolvido pelos pacientes para fim de ocupação. “O Asilo de alienados do Juquery foi concebido como um sistema completo, onde a proposta asilar da Instituição incluía além do hospital central para os agudos, as colônias em regime open-door parcial (da 1º colônia até a 6º colônia, pois a cronificação dos pacientes agudos era a tônica do tratamento), fazendas com open-door total (Crisciuma e Fazenda Velha) e assistência familiar (nutricio).” (PIZZOLATO, 2008, p.59)

3º CAPÍTULO - A ARQUITETURA

Fotografias: Acervo IBGE e Prof. Parada

Ilustração 101 – Foto dos pátios dos pavilhões de internação. (foto Prof. Parada sem data definida)

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Além disso, os próprios edifícios dentro de uma mesma colônia respeitavam preceitos ditados pela época. Isto é, organização em pavilhoes horizontais, racionalização, setorização e separação dos doentes por diversos criterios como sexo, tipo de doença e tratabilidade etc. Também foram considerados aspectos de iluminação, ventilação, e higiene, com a disposição dos pavilhões assentados em diferentes patamares respeitando a topografia local e aclive do terreno. O edifício frontal é o que norteia todo o conjunto central, e por isso é dele que partem os eixos de simetria e articulação do restante do conjunto. Em 1901, os dados apontaram para um total de 160 alienados e 289 pacientes em toda a construção da Instituição. Contudo o maior dado que se tem é de 1971, com a indicação de cerca de 13 mil pacientes ao todo, segundo Castro Sá (1983). Em relação ao aspecto econômico, o conceito de cultivo agrícola e animal oferece outras vantagens se não as de tratamentos, pois segundo o próprio Dr. Franco da Rocha, essas atividades reduziam o aporte em dinheiro necessário pelo Governo, pois os produtos desses cultivos eram utilizados para consumo próprio dos pacientes. Mas, acrescenta que essa organização não poderia “considerar o trabalho dos pacientes como único sistema de manutenção e financiamento de alimentação, o que seria uma exploração que desmentiram os fins humanitários e terapêuticos”. (PIZZOLATO, 2008, p. 65) Devido às mortes serem recorrentes nas Colônias e Asilo devido à doenças trazidas ou adquiridas em meio a superlotação, foi necessário a implantação em 1913 de um cemitério formal. Contudo, diversas mortes anteriores, e até posteriores tiveram as certidões de óbitos preenchidos de forma incompleta, incorreta, ou até mesmo anulada. Durante a Ditadura Militar a situação foi ainda pior, com aumento no número de mortes e restrição de divulgação dos óbitos. Entre diversas denúncias e escândalos, estima-se segundo dados da reportagem local em 1998 publicados na Folha de S. Paulo, que:

Em 1923 a direção passa para o Dr. Pacheco e Silva, depois de Franco da Rocha atingir idade suficiente para aposentar-se. Com a nova direção, às colônias continuam a serem construídas, mas agora com uma nova disposição arquitetônica, menos central e introspectivo, e com um posicionamento em leque, com maior presença de áreas verdes, como é o caso da 6º colônia psiquiátrica masculina e a 1º colônia psiquiátrica feminina. É também nessa nova direção que ocorre a construção do Manicômio Judiciário, uma antiga reivindicação dos alienistas desde quando a instituição estava em São Paulo. A partir de 1934, e por se tratar de uma cidade recém formada, foi necessário a construção de diversas infraestruturas para abrigar os funcionários da instituição e suas famílias. Tem-se, portanto, a construção de lavanderia, cozinha, padaria, praça de esportes e outras facilidades. A praça de esportes é uma das principais contribuições da nova administração para a constituição da paisagem urbana de Juquery, cuja localização está abaixo do prédio da administração, entre a várzea do rio Juquery, e próximo à atual linha da CPTM. Após esse período, a demanda pelo hospital torna-se ainda mais expressiva e preocupante:

“A partir de 1966 - a criação do INPS assegura a uma grande faixa da população o direito à cobertura de assistência médica; não houve expansão da rede hospitalar, em proporção ao aumento da população; não se dotava, para a maioria das pessoas com transtornos mentais, outro tratamento psiquiátrico que não o hospitalar; há a deterioração na qualidade de vida em São Paulo por: expansão industrial fora de controle; êxodo rural, mudanças de hábitos de vida; especulação imobiliária. Esses fatores sociais condicionantes jamais permitiria diminuir a lotação de doentes no Juqueri” (CASTRO SÁ, 1983, p. 61)

Outro importante espaço, que ainda perdura até hoje, é o Museu Osório César. O museu deriva do Ateliê Livre, uma sala de artes criada em 1948 pelo médico psiquiatra Osório César com o objetivo de possibilitar aos pacientes o desenvolvimento de potencialidades que seriam reveladas no ato de criação e criatividade. Não havia interferência alguma na produção, e a única orientação era em relação ao uso das técnicas e materiais . Em 1952, após o acúmulo da intensa produção dentro dos ateliês, foi fundado o Museu de Imagens do Inconsciente, que mais tarde tornou-se o Museu Osório César.

“Com base nos dois livros recebidos, a comissão parlamentar estimou que 61 mil pessoas teriam morrido dentro do hospital de 1898, quando foi inaugurado, até 1991. Desse total, cerca de 30 mil teriam sido enterrados no cemitério do próprio Juqueri. “Informações do próprio hospital, recolhidas na época, falavam em 33.977 mortos enterrados ali”, diz o deputado Gouveia. Nesse meio, haveria cerca de 7.000 adolescentes, crianças e natimortos, além de um número grande de membros amputados, como pernas e braços, diz Cristina Lopes. “O que nos espanta é a grande quantidade de crianças enterradas e a razão de tantas amputações”, afirma a psicóloga. Quase todas as crianças seriam filhas de pacientes do próprio hospital.”(Folha de S. Paulo, 1998)

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Fotografias: Alice Brill. Disponível em: https://ims.com.br/por-dentro-acervos/ alice-brill-e-a-arte-no-juquery-por-cassiano-viana/

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O que é interessante expor é que Osório foi casado com Tarsila do Amaral, e próximo de artistas e intelectuais como Mário de Andrade, Di Cavalcanti e Carlos Scliar, e portanto era um grande admirador dos modernistas. Alice Brill foi convidada a fotografar os internos do Juquery nesse espaço de produção e arte, e as imagens mostram um imaginário diferente dos loucos perigosos, do desespero ou das crises. As imagens são do Acervo Instituto Moreira Salles, e são datadas de há quase sete décadas. O ateliê foi desativado durante a década de 70, mas reinaugurado sob forma de museu em 1985. Contudo, o Complexo era alvo de duras críticas e denúncias relativas aos direitos humanos: más condições de higiene, violências e práticas abusivas, péssimas condições de moradia e alimentação, repressão, torturas e técnicas terapêuticas como retirada de dentes e eletroconvulsoterapia. Durante a ditadura militar, as denúncias são ainda piores. Assim, embora por vezes a historiografia retrate por vezes uma atmosfera terapêutica asilar de zelo e cuidado, as denúncias e retratos expressam diferente. As fotografias a seguir são de autoria de Claudio Edinger de 1990, e foram retiradas do Acervo do Autor na Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.

“ Aquele lugar parecia uma maçã podre. Por fora, a casca era bonita e reluzente, com prédios e construções que eu nunca tinha imaginado que veria na minha vida. Do lado de dentro, a polpa estava pobre e carcomida por vermes famintos. Um amontoado de homens pelados ou maltrapilhos com a cabeça raspada passava o dia perambulando pelas galerias e corredores e povoava cada um dos pátios.” (O Capa Branca – Farias, Walter e Sonim Daniel Navarro– p. 35) Fotografias desta página: Cláudio Edinger. Disponível em: https:// enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa21658/claudio-edinger

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Nos últimos anos o que se teve foi uma acelerada decadência do hospital enquanto Asilo Terapêutico, e enquanto edificações tombadas pelo CONDEPHAAT. A desativação segue em processo lento e gradual, e os últimos dados encontrados foram de uma reportagem do Estadão, onde os últimos 57 pacientes ainda habitavam o local. Em 2005, um incêndio destruiu drasticamente não apenas o principal edifício administrativo, tombado pelo CONDEPHAAT, como também a biblioteca mais completa de livros e periódicos de psiquiatria do país, acumulados ao longo dos mais de 100 anos do Complexo. Do edifício, infelizmente sobraram apenas elementos estruturais. Contudo, o ocorrido não é o único a denunciar o descaso com o maior e mais importante Complexo Hospitalar Terapêutico do país, pois a 1º Colônia Colônia Masculina também projetada por Ramos de Azevedo e que não teve seu restauro concluído até hoje. O que é mais intrigante, diante desses fatos, é que nas visitas de campo me foi proibido visitas aos edifícios, desenhá-los ou até mesmo fotografá-los. Essa repressão não aparenta ser nada mais do que um acobertamento do enorme descaso para com esses edifícios históricos e tombados, e deixo aqui, de forma clara, meu protesto e indignação em relação a esse descaso com o patrimônio histórico nacional. “Embora ainda seja cedo para avaliar se o incêndio foi intencional ou não, ele certamente será fruto de mais de uma década de abandono e descaso na manutenção das edificações do Complexo. Cabe ressaltar que o prédio da antiga 3ª Clínica Feminina do Hospital Central, que foi incendiado (!) há alguns anos, ainda não foi recuperado, correndo sérios riscos de desaparecer. Esse risco também se estende à Colônia Azevedo Soares, construída em 1896, primeira edificação do Hospital do Juquery, também projetada por Ramos de Azevedo, há 110 anos com indiscutível valor histórico e arquitetônico.” (Iná Rosa e Lucia Teresa Faria, arquitetas e pesquisadoras do Hospital do Juquery, para Vitruvius)

Fonte das imagens: Acervo IBGE

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MARCOS NA LINHA DO TEMPO Inauguração na casa localizada na esquina das ruas São João e Aurora

Proclamação da República e decorrente adequação do atendimento ao alienados vinculados aos preceitos positivistas

Superlotação com 137 internados

Improvisação de um Hospital Clínico para atender o grande número pacientes, servidores e moradores da região atingidos pela epidemia de gripe

Inauguração da 2º Colônia Masculina

Compra de mais 14.400,00m² também do sítio Cresciúma para captação de água dos mananciais, inauguração da 1º Colônia Agrícola Masculina para 80 pacientes

Inauguração da Vila Residencial e fim das obras do Manicomio Judiciário

Inauguração do Pavilhão de Menores Alienados

Implantação do cemitério

1881

1852 1862

1888

1889

1898

1895

1909 1907

1918

1913 1916

1911

1923

1929 1930

1934 1935

Desvio do curso do Rio Juquery na altura do manicômio judiciário

Lei Áurea

Revolução de 1930 Compra de 176.616,75m² na margem direita do rio Juquery para construção da 2º Colônia Masculina Ampliações com capacidade total para 2.500 enfermos

Mudança para Chácara do Fonseca (Padre Monte Carmelo)

Direção de Franco da Rocha, compra de 18.645,00m² do sítio Cresciúma à margem da estrada de ferro Santos Jundiaí e rio Juquery

Aquisição das Fazendas Velha e Cresciuma, totalizando 1200 ha

38

Fim da administração de Franco da Rocha, início do Dr. Pacheco e Silva, e inauguração do 5º Pavilhão Feminino

Processo de reflorestamento das áreas consideradas improdutivas,com objetivo de tornar a paisagem mais salubre, amena e agradável


Inauguração da praça de esportes

Início da Ditadura Militar e das obras da Colônia conhecida como Xangrilá para receber pacientes de ascendência japonesa, mas que nunca chegou a ser terminada, pois grande parte do material de construção foi reaproveitado em reformas internas da instituição ou roubado para construção de assentamentos irregulares

Desenvolvimento do “Projeto Juquery”, uma proposta de urbanização intitulada “Projeto de Urbanização da Fazenda Juquery” realizada pela EMPLASA e CDH, “onde permitiu integrar um plano de expansão para a área norte da região metropolitana.” (PIZZOLATO, 2008, p. 102).

Diminuição pela metade dos pacientes por meio de políticas internas que objetivaram o retorno social dos enfermos, e parceria com a Faculdade de Medicina de Jundiaí com incentivo de residência médica psiquiátrica para o Complexo

1937 1938

1964 1952

Criação do Parque Estadual do Juquery

1986

1973 1971

Incêndio do Pavilhão Masculino de Agudos, destruindo parte da construção histórica

Construção do novo Hospital das Clínicas do Complexo

1985

1993 1988

1999 1998

2008 2005

Inauguração do Museu Osório César, e fim da Ditadura Militar

Reconhecimento da superlotação dos 13 mil pacientes no Complexo pelo Secretário de Saúde Mário Machado Leme, que descreve a situação como uma “tragédia humana, técnica e administrativa” (CASTRO SÁ, 1983), mas nada o fez Inauguração dos pavilhões de Observação, Tuberculosos, 7º e 8º Colônia Feminina, 8º Colônia Masculina, Farmácia, Creche, e Escola para auxiliares de enfermaria

Comemoração do centenário da Instituição, e início da restauração da 1º Colônia Masculina que foi não concluída Aprovação do tombamento da área do Complexo Hospitalar do Juquery pelo CONDEPHAAT

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Incêndio do Prédio da Diretoria Técnica de Departamento, destruindo quase a totalidade do edifício histórico tombado


O COMPLEXO EM SATÉLITE

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4 COLÔNIA MASCULINA

MANICÔMIO JUDICIÁRIO

ÁREA CENTRAL

5 COLÔNIA MASCULINA

2 COLÔNIA MASCULINA 6 COLÔNIA MASCULINA

1 COLÔNIA FEMININA SEDE DA FAZENDA CRESCIÚMA POCILGA

1 COLÔNIA MASCULINA

COLÔNIA XANGRILÁ

CEMITÉRIO

COLÔNIA ADEMAR DE BARROS

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3 COLÔNIA MASCULINA


PARQUE ESTADUAL DO JUQUERY

42


O Parque Estadual do Juquery (PEJy) é uma Unidade de Conservação presente no município de Franco da Rocha, mas que abrange também parte do município de Caieiras, no limite sul do Parque. A área do Parque foi uma das adquiridas pelo Estado em 1895 para a implantação das Colônias do Complexo Hospitalar, mas em 1993 foi destinada à criação do PEJy com o objetivo de proteger mananciais do Reservatório Paiva Castro, integrante do Sistema Cantareira, e conservar a vegetação nativa residual existente na Fazenda Juquery. Essa vegetação residual existentente integra uma associação entre vegetação do cerrado, campos cerrados, e remanescentes da Floresta Ombrófila Densa, e segundo Lucas Gonzaga Santos (2020) são as últimas fitofisionomias existentes desse conjunto de ecossistema na RMSP. A área total do PEJy é de 2.058 ha, e atualmente é administrado pela Fundação Florestal, instituição vinculada à Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo. “Devido à expansão urbana, vem sofrendo uma grande pressão externa com a ocupação recente das áreas do entorno, enfrentando problemas ambientais gerados pelo fogo, caça, pesca e invasão (GASPARETO E FURLAN, 2016).” (SANTOS, 2020, p.21)

Fotografia: Ana Victoria S. Goncalves

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A dissertação de mestrado de Santos (2020) elaborou uma série de mapas de diagnóstico do meio físico, buscando relacionar diversos aspectos da paisagem do parque para estabelecer uso segundo os apontamentos de fragilidade ambiental, de uso do solo e de capacidade de biodiversidade e aptidão agrícola. O primeiro mapa é de Fragilidade Ambiental das áreas, onde as Unidades Ecodinâmicas Estáveis referem-se às áreas que estão em equilíbrio dinâmico e sem ocupação humana; e Unidades Ecodinâmicas Instáveis dizem respeito às áreas intensamente modificadas pelas ações antrópicas, urbanizadas ou não. O segundo mapa refere-se ao mapeamento realizado pelo autor da vegetação do parque e seu entorno. Ao todo, foram reconhecidas 4 fitofisionomias: campo-limpo, campo-sujo, cerrado sentido restrito e floresta ombrófila densa, além da vegetação das planícies fluviais, áreas em regeneração e de infraestrutura. Por fim, o último mapa trata a respeito da capacidade de sustentação à biodiversidade a partir do mapeamento dos solos, visto que este é o elemento mais importante que oferece suporte físico e nutricional às vegetações. Assim, a análise foi fundamentada observando-se o comportamento da água no solo (capacidade de infiltração, armazenamento e escoamento); disponibilidade potencial de nutrientes (presença e teor de macro e micronutrientes); e suscetibilidade a processos como erosão, deslizamento etc. Todos esses mapas dão suporte científico para um estudo mais completo e aprofundado das vulnerabilidades e potencialidades da área, dados fundamentais que serão utilizados no processo de projeto e diretrizes. 44


324000

326000

328000

330000

7416000

7418000

322000

Uso do solo

Área de estudo

Mapa de cobertura vegetal e do solo LEGENDA:

Campo limpo floresta ombrófila

campo sujo silvicultura

densa

Campo sujovegetação higrófila área degradada Cerrado sentido-restrito

cerrado sentido restrito

regeneração corpo d’água infraestrutura

Corpo d'água área urbana

P. E. do Juquery

Infraestrutura lavoura pastagem Área urbana

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km 0

FONTE: SIRGAS 2000 Projeção Universal de Mercator Fuso: 23 S Elaborado por Lucas Gonzaga Santos, 2020

km 0

1

0,5

1


324000

326000

328000

330000

7416000

7418000

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Fragilidade Ambiental

Limites

Unidades Ecodinâmicas Estáveis

Unidades Ecodinâmicas Instáveis

Muito fraca

Muito fraca

Mapa de Fragilidade Ambiental LEGENDA:

Fraca

Unidades Ecodinâmicas Estáveis

Fraca

Muito fraca

Fraca

Fraca

Média Forte

Forte Muito Forte

Muito forte

Infraestrutura

Unidades Ecodinâmicas Instáveis

Muito fraca

Média

P. E. do Juquery

Média Forte Muito forte

Média

Área urbanizada

Área urbanizada

Hidrografia Topografia Curva de nível

0

Corpo d’água

Forte Muito Forte

.

Corpo d'água

km 0

46

Figura 35 - Mapa de fragilidade ambiental do PEJy.

km 0,5

1

FONTE: Datum: SIRGAS 2000 SIRGAS 2000 Projeção: Universal Transversa deProjeção MercatorUniversal de Fuso: 23 S Mercator Fuso: 23 S Fonte: IBGE, 1984. Elaborado por Lucas

Elaborado pelo autor.Santos, 2020 Gonzaga 1 67


324000

326000

328000

330000

7416000

7418000

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Capacidade de Sustentação à Biodiversidade

Mapa de Capacidade de Sustenção à Biodiversidade LEGENDA:

Classe 1

Classe 4

Classe 2

Classe 5

Classe 3

Classe 6

Grande capacidade de abrigar biodiversidade, mas atualmente tem uso antrópico intenso solos moderadamente drenados, úmidos, e com alta suscetibilidade à erosão. É necessário preservar cobertura vegetal. Solos muito rasos que impedem formação raticular nutricionalmente e mecanicamente. Pouca capacidade de infiltração, alta de escoamento subsuperficial, empobrecendo o solo com facilidade

Limites

Maior profundidade, mas sujeito ao déficit hídrico pela baixa capacidade de reter água

Corpo d'água

Solos pouco profundos, e com partes degradadas, ocordo Juquery Classe 7 rendo processos erosivos, eP. deE. formação de voçoroca. Resiliencia comprometida, bem como a capacidade de sustentar biodiversidade.

Infraestrutura

Topografia

Solos mais profundos, bem drenados e com florestas ombrófilas em topo, situação restrito a esse local

Área urbanizada

Planíces fluviais do rio Juqueri, são solos de zonas acumuladoras de sedimentos, são profundos e sujeitos à contaminação e inundação Corpos d’água Figura 36 - Carta de Capacidade de Sustentação à Biodiversidade

47

.

Área urbanizada Hidrografia

0

Curva de nível km 0

km 0,5

1

FONTE: Datum: SIRGAS 2000 SIRGAS 2000 Projeção: Universal Universal de TransversaProjeção de Mercator Mercator Fuso: 23 S Fonte: IBGE,Fuso: 1984.23 S Elaborado por Lucas

Elaborado pelo autor. Gonzaga Santos, 2020 1 71


PROPOSTA DA EMPLASA

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O mapa ao lado refere-se ao zoneamento proposto pela EMPLASA em 1987, resultado de uma série de levantamentos e discussões que compõem o documento digitalizado “Projeto Juqueri”. O mapa está representado segundo uma re-elaboração pois o original, em papel vegetal, tem cores aproximadas que dificultam a leitura. O projeto previa, para além desse macrozoneamento, a reciclagem de áreas do hospital, e também um projeto de vila, que pouco mantém relação com o termo “vila” que estará mais adiante neste caderno, mas que ainda assim vale a pena ser destacado. Segundo o próprio documento, o Projeto Vilas:

“- É parte da proposta assistencial contida na “carta de intenções para a modernização do Juqueri”; - As “vilas” destinam-se a atender um conjunto de pacientes que, embora apresentem um alto grau de autonomia, carecem de um trabalho de “ressocialização”, reinserção na vida social; - O “Projeto Vilas” poderia se resumir numa proposta assistencial de vila “tutelada”, superando as deficiências da vida macro-asilar, onde a individualidade e a própria identidade se perdem na uniformização e disciplinamento do coletivo; - É uma proposta de reabilitação onde a dinâmica entre o psicológico e o social devem ocorrer num “contexto propício”. Esse “propício” será tanto mais adequado quanto mais próximo da vida comum. Essa proposta piloto pode chegar a ser um modelo para outras áreas de promoção social, levando ao fim do “macro asilo”, com todas as suas realidades desumanizantes. A instituição, além de abrigar deve promover uma existência social menos desagregadora.” (EMPLASA, 1987, sem indicação de página)

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VISITAS EM CAMPO

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tes. Além disso, visitei as áreas degradadas, de cerrado sentido restrito e campo sujo, conforme apreendido na dissertação de Lucas Gonzaga Santos (2020). É também nesta área onde está localizada a 3º Colônia Masculina do Complexo, que atualmente é utilizada pela administração do parque. Já o terceiro e último mapa é do segundo dia de visita, após o pedido formal mediante formulário preenchido junto à administração do CHJ para fotografar a parte inferior do Complexo (a única permitida). Do primeiro dia de visita para esse segundo, passaram-se 3 dias, e nessa segunda visita duas funcionárias me acompanharam durante todo o percurso, que durou cerca de 2 horas apenas. Além disso, não foram todos os edifícios que puderam ser fotografados, mesmo com a presença das funcionárias. Um deles - o mais importante - foi o edifício da administração que em 2005 foi quase inteiramente destruído pelo fogo, e ainda permanece sem restauro.

Foram elaborados mapas de visitas de campo, separados por dia, como forma de reconstruir a memória das visitas e as experiências apreendidas em cada espaço. Além disso, eles são úteis visto a imensidão da área, do complexo, e da quantidade de edifícios com estética semelhante em um mesmo quadrante. Por isso, nos mapas estão traçados os percursos realizados em determinadas áreas, e que foram norteados segundo as permissões e capacidade de alcance no período diurno. O primeiro mapa refere-se à primeira visita, cuja pouca quantidade de imagens se deve ao fato de, durante as primeiras fotografias, ter sido abordada e informada de que os registros eram proibidos senão mediante pedido formal junto à administração local do Complexo, e acompanhamento integral. Diante dessa proibição, parti em direção à estrada que levaria até a Pocilga e 6º Colônia Masculina, mas fui novamente impedida pela abordagem de dois cachorros. (risos, de nervoso). Nesse percurso, foi possível observar trechos do rio Juquery, e um mau cheiro característico da poluição que o compromete. O segundo mapa, ainda do primeiro dia de visita, retrata a visita ao PEJy, onde foi percorrido cerca de 12km entre os morros, trilhas e lagos existen-

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PROPOSTAS 55


CONCEITOS

O objetivo da proposta é desenvolver um projeto urbano de baixo impacto ambiental alinhado com as discussões de vida urbana saudável e sustentável, e dentro do contexto das discussões de cidade pós pandemia. Assim, diretrizes como aproximar a produção alimentar das habitações e diminuir a cadeia de processamento; estimular o transporte ativo; tratamento de resíduos e proteção dos cursos naturais de água devem integrar a proposta, juntamente com outros que se fazem necessários. Além disso, o patrimônio histórico e cultural do Complexo irá integrar a proposta a partir da intenção de retomar e valorizar a memória não apenas dos habitantes locais, como também de todos do país. Por isso, os principais conceitos que irão permear os desenhos são: Suficiência Econômica e Sustentável Estilo de Vida Urbana Saudável Desenvolvimento de Baixo Impacto Ambiental Capacidade de Regeneração

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HABITAR

- produção agrícola familiar, regenerativa e resiliente, sugestão SAF

- comércios de pequeno e médio porte (feiras, mercado familiares, hortifruti, restaurantes, bares, padaria etc) - serviços essenciais e de rotina (centro de prevenção à saúde, centros de ensino, centro de coleta e reciclagem, dentistas, escritórios etc) - incentivo ao primeiro e terceiro setor das atividades economicas (secretarias do meio ambiente e da saúde, e ONGs)

- pré existente distrito industrial; - a ETE em etapa de finalização; - incentivo à indústrias com logistica reversa; - incentivo à startups e aceleradoras alinhadas com a economia circular

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- O Museu Osório César do Complexo Hospitalar do Juquery (CHJ) - Os edifícios historios do CHJ - O Parque Franco da Rocha - Area esportiva do Parque Estadual do Juquery - Parque Linear proposto - Áreas de cultivo agrícola propostas - Troncos-verdes locais situados entre as vilas - Memorial das vítimas COVID-19


A ÁREA Diante do exposto anteriormente, é imprescindível que se pense na proposta de forma integrada e articulada. Contudo, é inevitável não intrigar-se com as enormes e várias montanhas restantes do cerrado e cercado por áreas urbanizadas ou de expansão urbana. E foram esses os motivos que me levaram a eleger o somatório das áreas do PEJy e do CHJ, limitado pela linha férrea da CPTM à oeste, pela marginal à norte (estrada do governo), a represa do reservatório Paiva Castro à leste, e o limite municipal de Franco da Rocha ao sul. A área compreende, para além de uma paisagem residual e valorosa do cerrado brasileiro, o rio Juqueri e a maior parte dos edifícios do CHJ. Contudo, não se pretende elaborar desenho urbano, nem mesmo ignorar todo o apreendido até esse momento. Como será exposto em seguida, foram propostas diretrizes em forma de macrozoneamento para restaurar, valorizar e/ ou potencializar diversos usos nesse espaço, com o intuito de proteger o local como um grande coração do cerrado metropolitano.

MEDIDAS

VALOR

UNIDADE

perímetro

23.250

metros

área

24.022.347,00

metros2 58


perfil topográfico

842m 800m

750m 720m 1km

4km

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8.13km


PROPOSTA DE MACROZONEAMENTO

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A proposta de macrozoneamento da área foi pensada seguindo os conceitos discutidos anteriormente, e respeitando os direcionamentos e leituras da EMPLASA (1987) e de Lucas Santos (2008). Assim, a área de ocupação urbana próxima ao hospital alinha-se ao histórico de ocupação próxima ao rio e à linha da CPTM. Além disso, também incorpora o parque linear presente no mapa do sistema municipal de áreas verdes, e o interliga até as proximidades da entrada do Parque Estadual do Juquery, ao longo de toda a marginal que concentra alguns equipamentos urbanos como escola de bombeiros, escola técnica, etc. As áreas que estão na interface entre o PEJy e Distrito Industrial e ETE são áreas de proteção que visam conter a possível expansão dessas atividades em direção às áreas de conservação do PEJy, além de serem monitoradas visto que as atividades têm potencial de degradação e poluição ambiental. As áreas em verde claro e laranja são áreas de manutenção, cuja principal diferença é a manutenção do uso já existente, na área laranja, voltado ao turismo ecológico e de esporte, também alinhado com os conceitos das propostas. As áreas em verde escuro são destinadas ao uso da agricultura ecológica - como um Sistema Agroflorestal (SAF), por exemplo - e que irá abastecer prioritariamente os habitantes locais. Para isso, foi levado em consideração as leituras da capacidade de diversidade do solo, por Santos (2008). Por fim, os assinalados em vermelho dizem respeito a áreas de recuperação ambiental com urgência, que serão protegidas de processos de erosão e empobrecimento do solo pela proteção da SAF ou similar. Os limites dessas definições foram definidos ou pelas curvas de nível mestre ou pelas indicações presentes nos mapas de Santos (2008), conforme mostra a sobreposição de mapas ao lado.

macrozoneamento proposto

capacidade de sustentação à biodiversidade

fragilidade ambiental

cobertura vegetal e uso do solo

macrozoneamento EMPLASA

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RECORTE DE DESENHO URBANO

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MEDIDAS

VALOR

UNIDADE

perímetro

6.221

metros

área

2.014.263,00

metros2

Ao lado está indicado a área de recorte projetual, onde será elaborado o desenho urbano para implantação das unidades urbanas. A área compreende a margem esquerda da linha da CPTM, onde é previsto um parque linear, a área de urbanização propriamente dita, e parte da SAF que irá abastecer essas unidades. É importante lembrar que nesta área estão duas importantes colônias de extrema importância patrimonial: a 1º Colônia Masculina, a primeira edificação construída no local, a 1º Colônia Feminina, a Colônia Ademar de Barros e o Cemitério. 63


AS VILAS NO LOCAL Conforme já mencionado, a paisagem é composta por uma paisagem de terreno movimentado. Assim, foi necessário elaborar um mapa de estudo do terreno para investigar onde a topografia estava mais acidentada, e dessa forma, alocar onde poderiam ser implantadas as unidades urbanas. Reforço que o intuito do processo é analisar onde o meio ambiente é capaz de suportar determinados usos pretendidos, ou seja, há uma prioridade em entender as relações ambientais de cada espaço, e respeitá-las. Feito isso, as áreas em vermelho são as áreas onde a declividade é mais acentuada, e as em amarelo, menos acentuada. Assim, entendendo que o processo de urbanização implica, necessariamente, em impermeabilização de certa parcela do solo, foi priorizado que as unidades urbanas estivessem na área com menor

vilas

declividade para: a) ser menos suscetível à tragédias de deslizamento; b) não impermeabilizar áreas íngremes onde o escoamento d´água seria mais veloz; c) respeitar os cursos naturais d’água; d) priorizar menores declives para melhor locomoção de pedestres, ciclistas e similares.

curso natural d’agua

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via integradora


Dessa forma, o diagrama ao lado exemplifica o conceito de ocupação das unidades urbanas, que estão descritas como “vilas” no desenho. Ao todo são 4, sendo que todas elas fazem interface com uma área de curso d’água natural, e são acessadas por vias transversais. Além disso, elas estão localizadas entre a SAF, à direita, e ao parque linear da CPTM, na esquerda. O conceito conceitual exprime a construção de paisagem pretendida.

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EXPERIMENTAÇÕES 67


DESENHOS DE VIÁRIO

Aqui estão algumas etapas de experimentações do processos, que não são apresentadas como proposições projetuais, mas sim uma investigação pelo desenho. No primeiro desenho de viário, o principal aspecto determinante das linhas foram os sentidos dos ventos. No segundo, o aspecto determinante foi a topografia. Nesse último, o traçado não é ordinariamente ortogonal pois as linhas foram cruzadas seguindo a maior distância possível entre as curvas de nível mestras, de forma a obter-se menor inclinação no terreno. 68


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UNIDADE URBANA: VILA Nestas páginas expostas alguns princípios pretendidos com cada unidade urbana, segundo os conceitos apresentados na proposta. O objetivo é entender, por meio dos diferentes aspectos que constroem uma paisagem urbana, isto é, vias, volumes, gabaritos e densidade, qual a forma e o conceito de uma dessas vilas que compõem o imaginário de uma cidade como infraestrutura de saúde à luz das discussões de vida urbana pós pandemia.

RUAS E CIRCULAÇÃO

GABARITOS

A intenção é construir uma hierarquia viária que priorize o pedestre e as diversas formas de transporte ativo. Por isso, não há intenção de permitir a entrada de veículos motorizados e individuais no interior das vilas, salvo a exceção de veículos de ambulância, bombeiro e possivelmente ônibus. Assim, imagina-se que o desenho dessas vias internas tenha um generoso espaço de circulação e parada para pedestres, e um leito carroçável semelhante ao que conhecemos como “travessas”: estreito e de pavimentação irregular que desacelere a velocidade de circulação no leito. Além disso, pretende-se articular essas travessas internas de forma desencontrá-las, eliminando a ortogonalidade ordinária que desvenda a cidade pela lógica. O objetivo é construir espaços de descoberta, tendo em vista as diversas estratégias de iluminação e segurança para mulheres, crianças e idosos.

A ideia é concentrar os maiores gabaritos (6 a 8) no centro da vila para que: a) a altura do volume não forme barreira na ventilação do restante da vila; b) provoque uma circulação e atração de pessoas para o centro da vila, ativando-o; e c) crie um observatório natural das vilas por concentrar as edificações mais altas, colaborando também na construção de uma vigilância natural (segurança feminina na cidade). Ainda no interior, o restante é composto por edificações coletivas ou unifamiliares de gabarito mais baixo (2 a 3), ainda ativando o centro, e principalmente as travessas. Por fim, as bordas têm os menores gabaritos (1 a 2), e portanto não obstruem a construção da visão da vila pelos olhares de fora. Além disso, sabe-se que os ventos do inverno vêm especialmente do norte, e por isso espera-se utilizar dos volumes para barrar ou filtrar esses ventos, tendo em vista o conforto térmico pretendido. Nesse sentido, é provável que as vias que cruzam a vila no norte-sul se encerre nesses edifícios-barreira. 70


USOS E OCUPAÇÕES

DENSIDADE Assim, unindo todas as expectativas anteriores, espera-se que haja uma maior densidade habitacional no interior das vilas. Essa intenção está relacionada com a ideia de que haja um movimento rotineiro de saída do centro para as bordas no horário comercial pela população adulta, e ocupação desses espaços públicos centrais pelas crianças e idosos; e ao fim do dia um recolhimento por parte desses adultos, crianças e idosos para o centro da vila. Entretanto, também foi pensado em trazer o uso noturno, especialmente comercial, para pontos estratégicos dessas bordas, de forma a ativá-los também à noite e construir uma interface de conexão entre as 4 vilas, visto que essas bordas estão conectadas ou à áreas verdes ou à outra vila.

Para os usos, pensou-se numa concentração de comércio e serviço nas interfaces leste e oeste das vilas, onde estão localizadas as vias que acessam as 4 vilas. Nas interfaces norte e sul estão os usos mistos, que gradativamente continuam até o interior da vila, cada vez mais habitacional. Assim, as habitações estão concentradas no centro, e o comércio e serviço nos arredores. Contudo, há uma forte intenção de trazer equipamentos “urbanos” , que na verdade suportariam o atendimento na escala da vila. Inicialmente pensou-se em um único equipamento que, alinhado com as discussões de cidade pós pandemia e vida urbana saudável, estimule a prevenção à saúde ao invés do tratamento. Nele, também haveria atividades de cultura e lazer, visto que a discussão de prevenção abrange essas atividades também.

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PARA AS PRÓXIMAS ETAPAS Para as próximas etapas, a intenção é de finalizar os princípios, conceitos e desenho de uma dessas vilas, e implantá-las no terrenos, fazendo todos os ajustes necessários em relação à topografia, ventilação e similares, sem que o conceito e os princípios sejam prejudicados. Posteriormente, definir como ocorreria o parcelamento do solo de forma a viabilizar a paisagem pretendida, e desenhar cortes genéricos da hierarquia viária, esboçando as principais interfaces com os espaços externos da vila. Por fim, eleger um recorte de uma dessas vilas, que permita um detalhamento na escala de 1:500. E se for viável, elaborar uma proposta genérica de volumetria, planta e fachada-tipo, de forma a articular e construir a unidade urbana.

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São Carlos 2021 76


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