MÉTODOS DE IMPRESSÃO ARTESANAL NA ERA DIGITAL
MÉTODOS DE IMPRESSÃO ARTESANAL NA ERA DIGITAL Alice Abdul Andréia Andrade Andréia Felippe Diego Alves Guilherme Baldin Keila Casarin Tayrine Cruz Thais Valoto
SÃO PAULO - 2012/2
Título original: Métodos de impressão artesanal na era digital Copyright© 2012. Direitos reservados, exclusivamente, à Garagem design Rua Pamplona, 414 - Jardins - CEP 03280-020 São Paulo - SP | design.garagem@gmail.com Impresso no Brasil Capa: Garagem design CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. Massih, Alice Abdul et all São Paulo: Garagem, 2012. 1. design gráfico, produção gráfica.
Agradecemos nossos orientadores Luciano de Abreu e Gisela Belluzzo, pela dedicação, incentivo e entusiasmo. Aos professores que estiveram conosco durante a execução deste trabalho: Cláudio Ferlauto e Gilberto Mariot. Especialmente a Marcos Mello pelo apoio, colaboração e inspiração. Enfim, a todos os professores que compartilharam seus conhecimentos durante todo o nosso percurso acadêmico e que, portanto, também tornaram possível nossos objetivos. E aos pais e familiares que não mediram esforços para que chegássemos até aqui.
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AS TÉCNICAS DE IMPRESSÃO E O DESIGN GRÁFICO Todo mundo sabe o que é uma impressão, todo mundo sabe fazê-la. Todo mundo, um dia ou outro, já fez uma.
Desde os primeiros anos de sua existência, já se reconhece uma necessidade do ser humano de registrar acontecimentos, ideias, histórias, conhecimentos e experiências. Seja de forma pictórica, simbólica ou figurativa, esse desejo é inato, e surge espontaneamente: “Todo mundo sabe o que é uma impressão, todo mundo sabe fazê-la. Todo mundo, um dia ou outro, já fez uma, mesmo marcando seus passos na areia da praia ou manchando seus dedos de tinta ou em frottages de moedas sobre uma folha de papel” (HUBERMAN, 1997, p.9)
Para satisfazer essa necessidade, o homem desenvolveu diversos métodos e técnicas, aprimorando-as e atualizando-as ao longo dos anos, conforme novas tecnologias foram surgindo, sendo a invenção da escrita – “a contrapartida visual da fala” (MEGGS, 2009, p. 18) – o grande momento de mudança, pois
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até que fossem inventados aparelhos capazes de registrar a voz e as imagens em movimento, as palavras faladas desapareciam sem deixar vestígios, ao passo que as palavras escritas ficavam (Ibid, p. 19). Tais registros possuíam, também, a finalidade de retratar a realidade, induzindo à observação e servindo também como forma de inspiração, pois “para orientar-se por entre a multidão e a diversidade dos fatos, carece o homem sempre de alguma concepção à imaginação, abrir caminho para a observação” (LINS, apud TAVARES, p. 45). O ato do registro impresso também pode ser visto como um gesto natural do homem de se fazer presente e de se individualizar, uma atitude sempre tomada frente à vida O ato do registro impresso (NUNES, 2010, p.34). A impressão protambém pode ser visto como porcionou ao homem – no decorrer do um gesto natural do homem seu processo evolutivo – a capacidade de atribuir significados à natureza de de se fazer presente e de se suas imagens, à medida que novos reindividualizar, uma atitude que cursos e procedimentos a elas foram ele toma frente à vida. incorporados (Ibid, p.138). Embora essa capacidade de registro – para nós, especificamente o registro impresso – seja universal e análoga ao homem até hoje, as técnicas utilizadas para este fim foram objeto de mudanças constantes através dos anos, motivadas por diversos fatores – evolução industrial, vanguardas estéticas, novas escolas de pensamento – e trouxeram inegáveis vantagens para a comunicação visual, tanto técnicas quanto mercadológicas: por exemplo, as novas tecnologias reduziram os custos unitários, consequentemente aumentando a produção de impressos (MEGGS, 2009, p. 175), e fazendo com que tais pensamentos e registros ficassem acessíveis a todos.
1.1 as técnicas de impressão e seu desenvolvimento
Figura 01: Xilogravuras de Jost Amman retiradas do livro Das Ständebuch (Book of Trades, ou o Livro das Profissões, publicado na Alemanha em 1568) retratando o processo de fabricação de livros; desde a manufatura do papel, até a composição com os tipos móveis e o encadernamento. Fonte: MEGGS p. 98
A impressão tipográfica – inventada pelos chineses no século XI e paralelamente desenvolvida por Johannes Gutemberg por volta do ano de 1454, ano em que trouxe ao público a primeira prensa de tipos móveis (SILVA, 2008) – teve grande importância no aspecto industrial das artes gráficas por possibilitar a impressão pelo contato direto entre os tipos de metal ou madeira e o papel (Figura 01) – ideal para o nosso alfabeto ocidental, muito mais simples e adaptável ao sistema de “blocos” de letras do que o chinês – permitindo pela primeira vez uma produção em massa de livros. Em 1886 surgiram as Linotipos (Figura 02), desenvolvida por Ottmar Mergenthaler, máquinas com teclados e matrizes disponíveis com mais de mil idiomas, que tinham como vantagem o método de impressão que era feito linha por linha, mecanicamente, deixando o processo muito mais rápido se comparado com a composição manual da tipografia, que era feita letra por letra, possibilitando a expansão dos meios gráficos, como por exemplo, as revistas que agora poderiam ser impressas em tiragens ainda mais altas.
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o método de impressão era feito linha por linha, mecanicamente, deixando o processo muito mais rápido
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Figura 02: A Linotype Modelo 5. Fonte: MEGGS, p. 184
Em meados do século XVIII, mais uma técnica inovadora foi desenvolvida: a litografia, inventada por Alois Senefelder e aprimorada por Godefroy Engellman. O sistema se baseia na incompatibilidade da água e de substâncias gordurosas - o desenho é feito na matriz com um lápis litográfico feito de material oleoso (Figura 03), e em seguida a matriz (Figura 04) é umedecida e entintada com uma tinta graxa que adere somente ao desenho. A litografia facilitou muito a produção de imagens em grandes formatos, além de ser um sistema mais econômico, e que dava ao impressor a possibilidade de desenhar suas tipografias, não ficando preso à fontes pré-estabelecidas. Cartazistas famosos como Henri de Toulouse-Lautrec e Alphonse Mucha utilizaram muito esta técnica, pela liberdade que ela oferecia aos layouts e ilustrações, sempre auxiliados por
Figuras 03 e 04: O aluno Greg Luckeroth durante aula de Litografia na Universidade de Wisconsin - 2010 (Foto: Bryce Richter; UW Madison) e o artista plástico Will Baumeister e uma matriz litográfica - 1952. Fonte: www.willibaumeister.org
Figura 05: O artista Henri de ToulouseLautrec o litógrafo Jules Chéret, em 1895. Fonte: WEILL, p. 19
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O sistema exigia manutenções delicadas, pois as matrizes feitas de pedra pesavam várias centenas de quilos, e portanto, com o passar do tempo e das tecnologias, foi caindo em desuso impressores talentosos (no caso de Lautrec, Jules Chéret) (Figura 05). O sistema exigia manutenções delicadas, pois as matrizes feitas de pedra pesavam várias centenas de quilos (WEILL, 2010 p. 12), e portanto, com o passar do tempo e das tecnologias, foi caindo em desuso em troca de outras maneiras de trabalhar com gravuras. O que não impede que, mesmo hoje, diversos artistas e ateliers ainda façam uso da técnica, com interessantes resultados visuais (Figura 06). Outra técnica de impressão que podemos citar é a serigrafia, inventada pelos egípcios pela necessidade de reprodução das plantas das pirâmides (SILVA, 2008, p.102), que possui um custo de produção ainda menor de suas matrizes - telas feitas de seda ou nylon - e a possibilidade de impressão em diversos materiais e suportes. A serigrafia (Figura 07), ainda é muito utilizada na confecção de camisetas e uniformes, por exemplo.
Figura 06 (acima): Obras litográficas do artista Guilherme de Faria. Fonte: www.oanagrama.blogspot. com.br
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Figura 07 (ao lado): Execução de impressão em serigrafia. Fonte: Arquivo pessoal de Andréia Andrade
Os avanços tecnológicos nunca pararam e a litografia e a serigrafia deram lugar à fotomontagem (Figura 08), possibilitada pela impressão offset, que utiliza fotolitos, o que permite a reprodução em massa de fotografias, ilustrações e montagens – influenciada pelas colagens realizadas no mundo das artes plásticas, e essencialmente a precursora do que hoje é feito por softwares de edição de imagem. A tecnologia da impressão, como todas as outras, foi sempre se adequando aos tempos e à necessidade do homem. E existe uma enorme quantidade de possibilidades de impressão, mas, para que o resultado final de um projeto de design gráfico seja consistente e satisfatório, é necessário que se tenha conhecimento sobre as características do método que será aplicado; inclusive, é possível até apresentar soluções de design baseando-se especificamente na técnica que será utilizada, levando em conta as vantagens e desvantagens, assim como podemos fazer escolhas estéticas tomando como referência técnicas antigas ou atuais (FUENTES, 2006, p.97). Assim, a constante evolução da técnica de produção gráfica, independente de qual época estejamos falando, cria a base estétiFigura 08: Clássicos e pioneiros exemplos ca da produção visual do período. de fotomontagem, No século XIX, as tipografias começaram cartazes publicitários a se adaptar às novas exigências do mercado para Pontresina e Schweiz, de Herbert da época: estavam reduzindo o tempo de imMatter. Todos de 1934. pressão e consequentemente aumentando o Fonte: MEGGS, p. 433 número de tiragens e, além disso, em união
com as novas tecnologias que estavam surgindo, elas estavam se transformando em indústrias (TAVARES, 2005, p.39). Todas as facilidades das técnicas modernas, porém, trouxeram consequências não tão vantajosas: antes, o impressor, tal como o artesão, estava envolvido em todos os aspectos de seu produto. As máquinas e os novos métodos trouxeram a especialização, fragmentando as artes gráficas em projeto e produção (MEGGS, 2009, p. 175) e como resposta a este desenvolvimento, surgiram pensadores e movimentos que contestaram esta inevitável industrialização da qual estavam fazendo parte. Um dos primeiros movimentos estéticos que questionou essa especialização, já no século XIX, foi o Arts & Crafts. Seus mentores acreditavam em um retorno à criatividade dos artesãos da Idade Média (WEILL, 2010, p. 14) e possuíam uma concepção de obra de arte total – o Gesamtkunstwerk (Figura 09) – Figura 09: Algumas páginas de “The Works of Geoffrey Chaucer”. William Morris cuidou do design do livro até os mínimos detalhes, incluindo o desenho de todos os tipos. Até hoje, é considerado um dos mais belos impressos da história, e um marco do movimento Arts & Crafts, e do seu conceito de “obra de arte total”. (Fonte: www.printing-museum.org)
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congregando todos os ramos das artes decorativas – arquitetura, decoração, ilustração, e, claro, tipografia e arte publicitária (Ibid, p. 14). Apesar da alta qualidade estética atingida nos trabalhos do Arts & Crafts, sua total hostilidade em relação à máquina acabou por limitá-lo a um público restrito, e consequentemente a uma produção elitizada (Ibid, p. 16). Muitos especialistas veem o movimento Arts & Crafts como o embrião do design, por sua preocupação estética e ideia da obra de arte total, embora ironicamente seja um retorno nostálgico ao artesanato e o design produza, quase que exclusivamente, objetos para a produção em massa: “O design tomou forma como uma crítica à industria, entretanto, ganhou status maduro e legítimo ao tornar-se um agente da produção em máquinas e do consumo em massa” (LUPTON & MILLER, 1996 apud GRUSZYNSKI, 2000, p.18).
1. 2 O DESIGN GRÁFICO NO MEIO DIGITAL
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Recentemente, a informática domina cada vez mais os projetos de design e, se por um lado o computador oferece muita liberdade de criação e oportunidades aos designers, além de simplificar processos que antes eram custosos e dispendiosos (como o processo de fotomontagem descrito anteriormente, hoje realizado com facilidade por softwares de edição de imagem como o Photoshop), ele também pode limitar o designer em seu processo criativo, e comprometer a exclusividade de seus projetos: os softwares facilitaram os procedimentos de elaboração dos trabalhos, o que possibilita qualquer pessoa, mesmo não profissional, a desenvolver uma peça de design:
Um universo técnico, que exigia formação profissional específica, abriu um campo de atuação para pessoas sem habilidade manual para desenhar, sem educação estética para compor uma página equilibrada, sem paciência ou tempo para compor capas, relatórios, gêneros variados (GRUSZYNSKI, 2000, p.63).
Afinal, a utilização dos métodos analógicos de impressão pressupunha uma mão de obra especializada – e talentosa – e também produzia resultados únicos; um impresso nunca é idêntico a outro. Com a era da informática – e da impressão digital – essa exclusividade se perdeu. A tecnologia digital permite, ainda, que os trabalhos sejam realizados e finalizados, do rough ao arquivo fechado, num espaço inteiramente virtual; porém, quando se trata de trabalhos que serão impressos, é importante que se lembre da existência do material físico: “nunca deixa de ser necessário moldar uma ideia com os velhos e queridos lápis e papel, o contato com a realidade. De alguma forma, exceto nos programas puramente virtuais, o destino final de nossas idéias será palpável e visível como matéria” (FUENTES, 2006). Também é essencial lembrar que o trabalho do designer não é apenas manipular ferramentas digitais, e sim realizar projetos inovadores, que necessitam de um conhecimento prévio, extenso repertório visual e habilidades específicas (Figura 10).
Figura 10: Em “Does It Make Sense?” cartaz lançado em 1986, a influente designer April Greiman (grande defensora do design digital) não só demonstra a capacidade do Macintosh da década de 80, como prova que, mesmo no âmbito digital, design é muito mais do que o simples manejo de softwares. Fonte: www. modernism101.com
O mesmo podemos dizer sobre a tipografia; conforme aponta Noberto Gaudêncio Junior (2004, p.94, 95, 97), com o constante avanço das novas tecnologias e os métodos digitais cada vez mais acessíveis a todos, essa prática que antes era realizada por especialistas nas oficinas tipográficas agora está a disposição de qualquer pessoa que tenha acesso a um computador, independente do tipo de conhecimento que ela tenha e área em que atue. Com isso a tipografia deixou de ser algo físico e passou a ser uma imagem virtual (Figura 11), facilmente manipulada. Os métodos de impressão foram obrigados a se modernizar e atender a essa tecnologia digital, para acompanhar e suprir a alta demanda. As máquinas também tornaram desnecessária a presença de um profissional e essa produção em massa, embora vantajosa, justamente pela necessidade de uma padronização, abriu caminho para uma grande quantidade de projetos sem nenhuma inovação ou diferenciação:
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Ainda que a produção em massa tenha baixado o custo da impressão por unidade para o consumidor e o público alvo, o investimento necessário continua aumentando, então existe um grande incentivo para criar dentro de formatos padronizados – aqueles que utilizam procedimentos padronizados – e portanto evitam a necessidade de ajustes nas máquinas que requerem conhecimento humano. A resultante queda na qualidade é o preço que pagamos por produção em massa barata na qual apenas o resultado convencional, extremamente previsível é realizável (JURY, 2006, p. 20). 1
Vemos, portanto, muitos projetos repetidos, comuns e automáticos, feitos muitas vezes na pressa de suprir demandas de clientes ou ficar à frente da concorrência, e utilizando-se demasiadamente de processos e efeitos digitais; no máximo, numa tentativa de voltar às sensações do passado, faz-se um simulacro de texturas e imperfeições (Figura 12) e certamente os resultados
1. Original em inglês: “Although mass-production has brought down the print cost per unit for the costumer and the end user, the investment costs required continue to rise, so there is a strong incentive to design within standardized formats - those that utilize the standard procedures - and thereby avoid the need for machine adjustments requiring human information. The resulting impoverishment is the price we pay for cheap mass-production in which only the conventional, highly predictable outcome is practicable”.
a tipografia deixou de ser algo físico E passou a ser uma imagem virtual facilmente manipulada.
Figura 11: Manipulação tipográfica, Impressão digital. Capa de folheto da Geigy, de Steff Geissbuhler (1965) e mala direta para a gráfica Anton Schob, de Rosmarie Tissi (1981). Fonte: www. thenewgraphic.com
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Figura 12: Old Typewriter, fonte de Martin Steiner lançada em 2007 que simula o “ruído” visual obtido pelo uso de uma máquina de escrever antiga. Fonte: www. dafont.com
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alcançados ficam aquém das qualidades táteis proporcionadas por alguns métodos de impressão artesanais. (GAUDÊNCIO JUNIOR, 2004, p. 98). Além disso, observamos que a produção através da impressão digital causa uma perda de experiência e vivência para o designer. Hoje em dia poucas pessoas – designers ou não – têm contato ou são familiarizadas diretamente com os processos de impressão, seja pelo pouco tempo dedicado à cada peça em meio ao ritmo acelerado de uma agência ou editora, ou pela própria falta de interesse; e muitos também esquecem que moderno não é sinônimo de qualidade. Portanto, como no século XIX, podemos dizer que vivemos uma especialização, uma situação em que na maioria das vezes os responsáveis pelos projetos não possuem conhecimento de todas as etapas de produção (TSCHICHOLD, apud JURY, 2006, p. 10).
1.3 ELIMINANDO FRONTEIRAS Até agora pudemos observar, através de nossas pesquisas, que, embora o design digital – em que o computador é utilizado durante toda a execução do projeto ou apenas para a finalização – tenha trazido inúmeras vantagens aos designers, também tornou o processo tão simples – na superfície – que invariavelmente provocou o aparecimento de muitos projetos medianos e amadores. Devemos nos lembrar, no entanto, que é a partir da necessidade de inovar e diferenciar que surge o processo de experimentação de novas possibilidades. Caso contrário, corremos o risco de nos prender às nossas idiossincrasias, semelhante ao que ocorreu aos artistas e artesãos do Arts & Crafts. Cria-se então uma relação de tentativa e erro em busca do aprimoramento daquilo que já é feito, visando atender novas necessidades que surgem constantemente, de acordo com a evolução É a partir da necessidade de da sociedade. O designer deve experiinovar e diferenciar que surge mentar, “injetar no interior da tecnoloo processo de experimentação gia um quê de desordem, reintroduzir de novas possibilidades. Caso o ser artístico no todo organizado, desmontando suas partes, reconfigurancontrário, corremos o risco de nos do-as, e possibilitando o surgimento prender às nossas idiossincrasias de novos paradigmas, que por sua vez criarão novas ordens tecnológicas, e assim sucessivamente” (GAUDENCIO JUNIOR, 2004, p. 109) Cada técnica possui suas particularidades; processos manuais como o letterpress (impressão através de tipos móveis) e a xilogravura, por exemplo, que produzem relevos e texturas no papel, um efeito tátil que não poderia ser conseguido nem simulado através
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da impressão digital ou offset, e até mesmo os erros e imperfeições do impresso (manchas, borrões, elementos desalinhados e tortos, entre outros) podem ser vistos como um diferencial, por conta da exclusividade, algo que agrega valor à peça (Figura 13). Mencionamos ainda que o avanço tecnológico hoje nos permite utilizar várias linguagens visuais em uma única peça – através de ferramentas como scanners, e softwares de edição e tratamento de imagens – podendo “eliminar, progressivamente, as fronteiras entre os diversos procedimentos técnicos” (NUNES, 2010, p. 39) e criar projetos de design atemporais, livres de amarras e modismos. Podemos dizer também que a escolha do método de impressão, somada à escolha do suporte (Figura 14), são fatores muito importantes na composição do projeto a ser realizado, e temos que concordar com Rodolfo Fuentes que a “cor, textura, peso, brilho ou ausência dele são argumentos indiscutíveis na escolha desse suporte” (2006, p.78). Figura 13: Impressão tipográfica. Falhas e imperfeições são comuns nesse tipo de impressão, e podem ser usados para valorizar as peças gráficas. Agência Bond. Fonte: www.identitydesigned.com Figura 14: Suporte em tecido, impressão tipográfica. Fonte: www.red-licorice.com
1.4 CASES As técnicas manuais de impressão têm atraído cada vez mais a atenção de diversos designers e artistas contemporâneos. Seja pela exclusividade que dão ao material impresso, qualidade gráfica que podem oferecer, ou pela curiosidade e experimentação e pelo envolvimento em todo o processo de impressão que é necessário. Podemos exemplificar com o cartunista, artista plástico e tatuador Samuel Casal que afirma em entrevista à revista Inked: “Descobri que a forma que eu desenhava no computador tinha muito a ver com gravuras, com a técnica chamada maneira negra, em que, ao invés de você traçar o preto, você tira o preto da imagem e vai abrindo luz. Então, quando cheguei nesse estágio, resolvi buscar outro desafio: a gravura” ele faz narrativas gráficas inteiramente com xilogravuras (Figura 15). O letterpress, um processo de impressão com uma experiência única, também é muito procurado hoje em dia. A quantidade de tinta, superfície e condição dos tipos e outras circunstâncias irreproduzíveis fazem com que cada resultado seja ímpar, por mais sutis que fossem as variações. Com isso, cada peça se torna uma obra única; não só uma cópia, mas um original por si próprio (JURY, 2006). Grande parte da atração por letterpress hoje em dia se dá por essa individualidade, essas ‘falhas’ na impressão que mencionamos anteriormente. Estas ocorrem principalmente com os tipos móveis de madeira. Como afirma David Jury: Não apenas muda em forma e tamanho com os anos, mas sua superfície é facilmente danificável. Consequentemente a impressão com tipos de madeira - especialmente se nenhum cuidado é tomado para garantir que cada letra seja alinhada na mesma altura - fornece de imediato bastante caráter visual com um mínimo de esforço necessário por parte do designer (JURY, 2006, p. 17). 2
2. Original em inglês: “Not only does it change shape and size with age, but its surface is very easily damaged. Consequently printing from wood type - especially if no trouble is taken to ensure that each letter is packed to the same height instantly provides plenty of visual character with minimal effort required from the designer”.
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As técnicas manuais de impressão têm atraído cada vez mais a atenção de diversos designers. Seja pela exclusividade, pela curiosidade e experimentação e pelo envolvimento em todo o processO
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Figura 15: Xilogravuras de Samuel Casal, parte da série Cordel From Hell (2010). Fonte: www. samuelcasal.com
Possuindo formas elegantes e um tamanho considerável, a principal função dos tipos de madeira é atrair. Hoje em dia eles atraem com suas características físicas, o relevo da impressão, a textura das letras, e os ruídos causados pelas falhas na superfície do tipo. A decisão de expor essas marcas é consciente; cada uma delas um relato, uma história. Elas dão personalidade às letras. Os trabalhos desenvolvidos pelo Corrupiola – coletivo formado por Leila Lampe (artista e designer gráfica) e Aleph Ozuas (escritor e webdesigner) – não utilizam métodos industriais e terceirizam o mínimo possível seus projetos (Figura 16) e ao mesmo tempo trazem uma característica contemporânea, nova, às peças. Porém, o letterpress – e nenhuma outra técnica de impressão manual – por si só, ou apenas por suas características estéticas, não é superior à impressão em massa feita digitalmente. O conteúdo e a maneira como estas técnicas são usadas deve permanecer relevante e continuar a realizar uma função, não apenas decorativa (JURY, 2006, p. 24) – ou não haverá diferença entre a impressão manual genuína e os simulacros digitais feitos com texturas e manchas escaneadas. Observando as falhas e acertos tanto de movimentos históricos como o Arts & Crafts, quanto de profissionais de design contemporâneos que optam por técnicas antigas, podemos concluir que é possível alcançar resultados gráficos utilizando técnicas diversas, antigas e novas, fazendo uso de suas vantagens e desvantagens, e também que devemos pensar fora do lugar-comum se queremos produzir coisas exclusivas.
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Figura 16: Combo tipográfico Corrupiola, vendido pelo site. Lançado em 2011 e fora de catálogo atualmente. Fonte: www. corrupiola.com.br
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O DESIGNER E OS PROCESSOS MANUAIS A criatividade não se restringe somente ao campo artístico, mas abrange todas as outras áreas do conhecimento e do viver de cada ser humano.
Neste capítulo, discutiremos mais sobre o que leva alguns designers contemporâneos optarem por utilizar processos manuais de impressão em seus projetos.
2.1 O PROCESSO CRIATIVO Podemos considerar a criatividade, ou o ato criativo, como algo que está ligado ao homem desde o seu nascimento; uma característica inseparável e necessária para sobrevivência. A criatividade não se restringe somente ao campo artístico, mas abrange todas as outras áreas do conhecimento e do viver de cada ser humano. Desde as primeiras culturas, o ser humano surge dotado de um dom singular: mais do que “homo faber”, ser fazedor, o homem
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é um ser formador. Ele é capaz de estabelecer relacionamentos entre os múltiplos eventos que ocorrem ao redor e dentro dele. Relacionando os eventos ele os configura em sua experiência do viver e lhes dá um significado. Nas perguntas que o homem faz ou nas soluções que encontra, ao agir, ao imaginar, ao sonhar, sempre o homem relaciona e forma. (OSTROWER, 1997, p.9)
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Todo tipo de informação que recebemos, toda a cultura, todos os momentos vividos, pessoas com quem nos relacionamos, os desejos, medos, tudo, mesmo que inconscientemente é transmitido de alguma forma no processo de criação e nas criações (Figura 17). Tendo cada um sua própria maneira de separar tais influências e interpretá-las de forma diferente, buscando os resultados e significados de forma que consigam satisfazer seus desejos e necessidades (OSTROWER, 1997). Segundo Cecilia Almeida Sales, a figura do artista, do criativo, é impulsionada a vencer o desafio, ou seja, a satisfação de sua necessidade. A sedução gerada pela concretização deste desejo é o que o leva à ação. Os caminhos que o levam a este propósito são vários, e indefinidos, mas o artista trabalha com esta indefinição: “A tendência é indefinida, mas o artista é fiel a essa vagueza. O trabalho caminha para um maior discernimento daquilo que se quer elaborar. A tendência não aparenta já em si a solução concreta para o problema, mas indica o rumo. O processo é a explicação dessa tendência” (SALES, 1998, p. 29). O processo criativo, portanto, não é igual nem definível para todos, e sim intuitivo e individual. Mesmo quando há criação coletiva (Figura 18), ela é resultado de indivíduos distintos, com repertórios culturais e pessoais diferentes, trabalhando juntos em um mesmo projeto. O projeto coletivo dificilmente acontecerá sem algumas concessões das pessoas envolvidas, e é uma proposta totalmente diferente de um projeto individual ou autoral, por exemplo.
tudo, mesmo que inconscientemente é transmitido de alguma forma no processo de criação
Figura 17: A ilustradora Catarina Gushiken, em uma palestra sobre “processo criativo” (25/08/2012 na galeria Urban Arts) nos contou que a figura feminina, que aparece em 99% dos seus trabalhos, é influência direta da sua infância, que passou na casa da vó, que participava de um grupo de dança japonesa. A imagem daquelas mulheres maquiadas e vestidas nunca saiu de sua memória. Fonte: www.catarinagushiken. com.br
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Figura 18: A Call Parade é uma criação coletiva e, embora o “suporte” seja o mesmo para todos e imponha algumas necessidades/ características (por conta do formato do orelhão, e de ficar a céu aberto), os resultados de cada artista foram completamente diferentes. Fonte: www. callparade.com.br
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Os processos intuitivos estão diretamente ligados com nossa parte sensível. A sensibilidade é algo existente em todos os seres humanos, mesmo que em diferentes graus, em áreas diferentes e expressas de diversas formas. Estando a maior parte na nossa parte inconsciente da memória, é a percepção que nos ajuda a organizar essas sensações de maneira a evoluir, aprender e compreender melhor (OSTROWER, 1997). A percepção visual e o conjunto de sensações são os principais fatores que fazem com que quem está criando se comunique com seu público (DONDIS, 2003). Além da sensibilidade e da percepção outro fator importantíssimo no processo criativo é a cultura (Figuras 19 e 20). O homem, por ser um ser cultural, sofre constantemente – desde a pré história – a influência da cultura; seja na forma de agir, na forma de se comunicar, com as experiências vividas e até mesmo nas recebidas das gerações anteriores (OSTROWER, 1997).
No homem, a biologia tornou-se inseparável da cultura, uma vez que nossos ancestrais começaram a usar ferramentas. A partir de então, a seleção natural favoreceu aqueles que puderam usar a cultura em seu melhor benefício (COON, 1967, p.35 apud OSTROWER, 1997, p.16).
O resultado desse processo de criação é dependente da percepção humana; pelos seus critérios de forma e estrutura – desenvolvidos durante séculos através da experimentação e tentativa-e-erro, definindo e difundindo o nosso repertório e herança cultural – ele pode ser entendido. É através da manipulação desses elementos identificáveis e compreensíveis pelo ser humano que o artista encontra sua linguagem. Elementos como linhas, cores, formas, direções, texturas, escalas, dimensões, movimento, entre outros, que são percebidos e reconhecidos por nós, e dependem da expressão subjetiva do artista – a manipulação estratégica, a ênfase em determinados elementos em detrimento de outros, entre outras opções e técnicas, são utilizadas pelo artista para encontrar seu significado. “O resultado final é a verdadeira manifestação do artista” (DONDIS, 2003, p.31)
Figuras 19 e 20: As teorias de Freud sobre o inconsciente influenciaram tanto o movimento surrealista (Fonte: http://www.infoescola.com/movimentos-artisticos/ surrealismo/ - Acessado em 09/09/2012), como o movimento punk dos anos 70, que tinha uma postura crítica e independente em relação ao sistema e à moda, influenciando as artes gráficas do período (Fonte: Design Retrô – 100 anos de design gráfico).
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Essa manifestação do artista é uma expressão de sensibilidade, de sensações. É por conta delas que o processo se torna possível. “O que se observa é a sensibilidade permeando todo o processo. A criação parte de e caminha para sensações e, nesse trajeto, alimenta-se delas” (SALLES, 1998, p. 53). Entretanto, para que o objeto tenha Para que o objeto tenha uma uma identidade própria (o produto no caso identidade própria , existe um do design, ou a obra de arte no caso dos desenvolvimento processual pelo artistas), existe um desenvolvimento proqual o mesmo deve passar: Este cessual pelo qual o mesmo deve passar: surge ao longo de um processo “Um artefato artístico surge ao longo de de transformações e ajustes um processo complexo de apropriações, transformações e ajustes” (SALLES, 1998, p. 13). Cada “criador” possui seus métodos próprios para desenvolver e concluir seus objetivos. Sejam eles métodos e costumes rotineiros para ele, ou simplesmente técnicas em que é mais eficiente, ou até mesmo as gráficas que já conhece ou está habituado a utilizar; tudo isso é parte do processo criativo, tanto quanto os métodos e técnicas utilizados ou o estilo pessoal que cada pessoa imprime em suas criações.
2 . 2 O DESIGN E OS PROCESSOS ARTESANAIS 32
Muitos foram os avanços tecnológicos no decorrer dos tempos. Esses avanços ocorreram em todos os campos e proporcionaram novos conhecimentos, mudando formas de produção, resultados, conceitos e até mesmo ideologias; inclusive no mundo artístico. Porém, hoje, é preciso repensar as metas e significados da arte, ou mesmo das atividades que se utilizam da arte para criar objetos, em sua maioria, industrializados – como o design.
Com a presença da tecnologia até mesmo nas artes plásticas, o design, que emprega tantos elementos do mundo das artes, não poderia ser diferente; mas, como discutimos no capítulo anterior, toda técnica - moderna ou antiga - deve possuir significado, nunca deve ser utilizada gratuitamente ou por razões puramente estéticas; em suma, deve se adequar ao projeto. A tecnologia, como vimos, facilitou em muitos pontos a produção da peça gráfica, mas o seu uso exclusivo tem que ser revisto, afinal, o artefato, o produto que chega às livrarias, exposições ou palcos é resultado de um percurso longo e repleto de dúvidas, ajustes, certezas, acertos e aproximações (Marx, citado por Eisenstein, 1942, in SALES, 1998, p. 25). Também vimos que observa-se, no design contemporâneo, uma tendência à divisão de tarefas e especialização: muitas vezes, o designer não tem contato com o impressor, que por sua vez não tem contato com as pessoas que fecham o arquivo. Novamente recorrendo ao mundo das artes plásticas, encontramos a figura do artesão. O artesão participa de todas as etapas do processo de criação de seu produto sendo que é ele quem muitas vezes separa e adquire a matéria-prima que irá utilizar. Trabalhando sozinho ou com colaboração, o artesão participa pessoalmente na elaboração da peça (Figura 21), e é muitas vezes o responsável direto pela venda desse produto (Figura 22), ou seja, é ao mesmo tempo o artista, produtor e vendedor (HESKETT, apud VALVERDE, 2008, p. 33).
33 Figuras 21 e 22: Em Fortaleza, a feira de artesanatos é típica da cultura cearense e os produtos são muitas vezes criados (fonte: www.inema. com.br) e vendidos (fonte: www.4.bp. blogspot.com) pelos próprios artesãos.
Figura 23: Produção de um fotolito para impressão em offset. Partindo do mesmo layout, incontáveis impressos. Recentemente, o fotolito têm sido substituído pelo processo de CTP (Computer To Plate) que permite a separação de cores diretamente do software de edição de imagens para a gravação na chapa de impressão. No entanto, o fotolito ainda é bastante utilizado em impressos de baixo custo. Fonte: www. artlaserdigital.com.br
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Podemos dizer que a arte só se faz existente quando o artesão encontra a solução, “através da elaboração de cada uma das peças, ou seja, através de uma incessante experimentação” (DONDIS, 2003, P.210) em todo o processo de produção e criação, fazendo uso excessivo e adequado de suas experiências, técnicas, intervenções, motivações, emoções e principalmente, vontade. Na produção artesanal, o artesão, pelo seu contato pessoal e direto com o produto e com as técnicas, usa sua experiência adquirida ao longo do tempo para transformar a matéria-prima em arte, criando uma peça por vez, através do trabalho manual. Diferente do designer, que produz, na sua essência, um artigo voltado para a produção industrial, para a fabricação em série; no caso do design gráfico, impresso, um layout a partir do qual diversas cópias serão impressas (Figura 23). Podemos mencionar também que o artesão possui conhecimentos que não estão “nos livros”, ou seja, características e maneiras de utilizar os materiais que só são percebidas através de muita experiência prática e experimentação, que dificilmente serão encontradas nas bibliografias sobre o assunto.
É válido notar que mencionamos a figura do artesão aqui principalmente como contraponto aos processos modernos de produção – pelo seu conhecimento de todas as etapas do projeto, ou seja, pelos seus processos artesanais. Não entraremos nos méritos da qualidade ou finalidade de sua produção, e sim no seu modo de trabalhar. Como exemplo deste conhecimento, em uma visita à Graphias – atelier e espaço de exposições especializado em gravuras, principalmente xilo e litogravura, mantido pelo
Pudemos observar como todas as etapas da produção acontecem na prática impressor Mauro César de Paula Vaz e pela artista plástica e gravadora Salete Mulin no bairro Vila Mariana, em São Paulo – pudemos observar como todas as etapas da produção acontecem na prática: tratam-se de técnicas que exigem uma habilidade manual, ou seja, um impressor talentoso. E conversando com Mauro sobre o assunto, notam-se muitos insights e observações típicas de quem possui conhecimento de causa; além de maneiras de utilizar e subverter as técnicas que jamais haveríamos cogitado ao apenas ler sobre elas nos livros de história da arte (Figuras 24 e 25).
Figuras 24 e 25: Exemplos de utilizações pouco usuais de uma técnica convencional (no caso, a litografia) na casa Graphias: na primeira foto, uma gravura feita a partir de uma matriz que teve como base uma fotografia; nas duas seguintes, matrizes que foram aplicadas em cima de cartazes já impressos em offset: a ideia destes é usar a técnica manual como um detalhe, um acabamento que faz toda a diferença. Fotos: Guilherme Baldin (2012)
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Figura 26: Cartaz tipográfico de Rogério Fratin, realizado no curso da Oficina Tipográfica SP. O designer se baseou na medida 23,5 mm, que significa a altura do tipo para a impressão, para o compor.
Cardoso (apud MOURA, 2002, p,12) afirma que a diferença entre design e artesanato (no sentido de um produto manufaturado inteiramente pelo artista) reside justamente no fato de que o designer se limita a projetar para ser fabricado por outras mãos ou, de preferência, por meio mecânico. Não é surpreendente, portanto, que muitos designers hoje em dia estejam interessados em trabalhar com o manual, o analógico. Há uma corrente de designers que têm buscado cada vez mais os processos artesanais e que, através dos mais diversos métodos – letterpress, xilogravura, serigrafia, entre outros – criam peças gráficas, que, embora limitadas pelas próprias técnicas (tiragens pequenas, entre outros fatores) têm conquistado um número crescente de clientes que se interessam pela qualidade e valor estético dos produtos. Já discutimos alguns destes casos anteriormente, mas agora entraremos em mais detalhes. Seja pela textura e pelo relevo deixado no papel, pelo contato diEntre as razões que levaram reto com o material, ou pelo simao trabalho com letterpress é ples prazer da criação artesanal, a perda de valores do design mais e mais designers tem crugráfico na mídia virtual. zado esta linha tênue. Por exemplo, Rogério Fratin, designer que O designer diz valorizar a trabalha principalmente no meio experimentação, a transformação digital, em entrevista, cita entre da teoria em materiais palpáveis as razões que o levaram ao trabae a exclusividade, o fato de um lho com letterpress (Figura 26), projeto nunca ser igual ao outro uma perda de valores do design gráfico na mídia virtual. O desig-
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ner diz valorizar a experimentação, a transformação da teoria em materiais palpáveis e a exclusividade, o fato de um projeto nunca ser igual ao outro. Também cita a dificuldade de encontrar estes materiais sem o apoio de alguma instituição que os tenha, problema que é comum entre os designers que se arriscam nessa área, e evidencia o quanto estas técnicas são tidas como “ultrapassadas” pelas pessoas em geral. Já a australiana Alischa do estúdio Bespoke Press (Figura 27), diz que como designer gráfico lidando com clientes, raramente conseguia que sua arte saísse exatamente do jeito que ela a visualizara em sua mente, e que o letterpress atiçou todos os seus sentidos, desde o olhar até o tátil – e inclusive o olfato, através do cheiro das tintas – e a realizou completamente, a ponto de hoje só trabalhar com este método (KLANTEN, 2011, p.40). Portanto, podemos afirmar que hoje estamos passando por um redescobrimento – e revitalização, afinal, as técnicas devem promover um design inovador e moderno, por mais que sejam antigas – dos métodos e processos de impressão manuais, que tem auxiliado designers do mundo todo a projetar criações exclusivas e únicas, além de satisfazê-los e permitir-lhes mais controle sobre seu trabalho.
o letterpress atiçou todos os sentidos, desde o olhar até o tátil – e inclusive o olfato, através do cheiro das tintas –
Figura 27: Trabalhos desenvolvidos pelo estúdio Bespoke Press em 2011, utilizando tipos móveis e clichês em relevo; métodos manuais promovendo design impresso contemporâneo e de alta qualidade. Fonte: www.bespokepress. bigcartel.com
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