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Capítulo Quatro

O que era pior que Reece pensando que tínhamos transado e se arrependendo do que nunca aconteceu? E de verdade, o que podia ser mais errado que isso? Reece Anders, apensar das mentiras de todos os tipos. Mentiras brancas. Pequenas mentiras. Mentiras necessárias. Mentiras para perdoar. Todas as mentiras.

A minha era uma mentira branca desde que eu nunca disse que tínhamos dormido juntos. Eu só nunca disse que não fizemos. Mesmo que ele me conhecesse desde os quinze anos, ele tinha estado lá depois de tudo que aconteceu com Charlie e, na primeira noite que ele voltou, depois de estar a quatro anos na Marinha, ele tinha aparecido na casa dos meus pais. Desde esse dia, minha mãe jurava que ele estava procurando por mim, mas nossas famílias tinham se aproximado, então eu duvidava que esse era o caso. Eu tinha me mudado aos dezoito anos e não estava lá, mas quando meus pais me ligaram e imploraram que eu fosse para casa, eu estava esperando que algo horrível tivesse acontecido, porque minha mãe pareceu com alguém que estava há segundos de um ataque cardíaco. Eu não tinha ideia de que Reece estava em casa e ele me deu... oh wow, o melhor abraço de todos. E apesar da amizade que construímos desde que ele virou um oficial, ele nunca tinha ficado tão bravo.

Seu ódio absoluto por mentiras tinha começado antes mesmo de conhecê-lo e era culpa do seu pai. Eu não sabia os detalhes, mas eu imaginava que envolvia traição, porque ele tinha se mudado com sua mãe e seu padrasto enquanto seu pai era um mulherengo.

Então, yeah, mentir para Reece era como jogar a merda do ano no ventilador.

Reece me encarou, esperando por uma resposta, e eu não tinha nenhuma. Tantas vezes durante esses onze meses eu quis gritar a verdade em sua cara. Que não tínhamos transado, mas a dor que ele criou na manhã seguinte era demais, depois ainda me ignorando por semanas, somada ao fato que ele tinha ficado tão bêbado para pensar que tinha transado comigo. Essa dor era profunda.

Eu estava com vergonha – aterrorizada, na verdade – e se Charlie estivesse ciente da situação, ele provavelmente teria batido na minha cabeça. Porque eu deveria saber melhor, mas eu não sabia e tinha pagado por isso com ferro e fogo. Dias se passaram enquanto eu estava na influência de um coma induzido por sorvete. Semanas que eu pensei que cairia no choro sempre que seu nome era mencionado. Por meses eu não pude olhar para Reece sem meu rosto virar uma bola vermelha.

E toda essa dor ainda estava aqui.

Juntando a dor e a humilhação, eu as segurei perto enquanto inalava profundamente. “Como eu disse, Reece, não há nada para se falar sobre isso. Eu mal me lembro daquela noite também.” Mentira! Tudo mentira! Eu forcei a dar de ombros. “Nada para se contar.” Ele levantou uma sobrancelha. “Eu não acredito em você.” “Você acha realmente que sua performance na cama é tão espetacular que eu lembraria de estar com você bêbado?” eu retruquei.

“Não.” Seus lábios se curvaram em um pequeno sorriso e eu não podia acreditar que ele ainda estava parado ali. “O que estou dizendo é que você obviamente lembra muito mais se você esteve me evitando durante esse tempo todo.”

Inferno, ele tinha um bom argumento. “Na verdade, é mais como eu-prefironão-lembrar-de-nada.” No momento que essas palavras saíram da minha boca, eu queria pegar elas de volta, porque elas era malvadas. Apesar de ter evitado ele a todo custo e ter sido bem mal criada com ele, não era algo que eu gostava.

Seus lábios ficaram retos enquanto ele inclinava sua cabeça para o lado. A luz florescente brilhava além da curva da sua bochecha. Um momento se passou e eu esperava que ele fosse retrucar. Eu merecia isso depois do que tinha dito, mas não foi isso que recebi. “Eu desejo poder dizer que sei que isso foi bom para você e babe, eu podia ter feito tudo muito bom para você,” ele disse, sua voz ficando mais baixa de novo e aquela bola na minha barriga virou ainda mais rápida.

Memorias me invadiram, me fazendo perder a respiração. Mesmo chapado, ele tinha o seu jeito de fazer aquilo se destacar. Do tipo que eu nunca iria me esquecer daquela noite. Meus lábios se afastaram enquanto um pequeno calor

invadia minhas veias. Seu olhar se moveu para minha boca e meu peito levantou bruscamente. Seu olhar ficou tempo suficiente para que uma ideia vívida explodisse em meu cérebro, como a rainha de todas as ideias, porque obviamente quando eu tinha uma ideia louca na minha cabeça, ela terminava sendo epicamente ruim. Mas esse conhecimento não fez nada para me impedir de se segurar.

Eu pensei que Reece queria me beijar enquanto seu olhar sombrio focava na minha boca. E quando eu respirei a seguir, eu não tinha certeza se eu o impediria. O que isso dizia sobre mim exatamente? Eu era faminta pela dor.

Ele limpou sua garganta enquanto seu olhar voltava para o meu. “Mas sabendo o quão chapado eu estava, eu não tenho certeza de nada disso. Eu não...” “Eu preciso voltar lá para fora.” Não havia como continuar essa conversa. Eu precisava sair dali antes que uma mistura de desejo e necessidade de fazê-lo se sentir melhor me invadisse. Eu comecei a passar por baixo de seu braço mas ele se moveu. Tão alto e forte quanto ele era, não tinha como eu conseguir passar por ele.

“Santo Deus, pare de fugir de mim.” Minhas mãos se fecharam ao meu lado. “Eu não estou fugindo.” Seus olhos encontraram os meus, mais uma vez, e eu estava presa enquanto ele cuidadosamente colocava seu dedo contra o centro dos meus óculos e os empurrava para cima do meu nariz. Meu coração pulou em resposta a esse gesto que ele costumava fazer o tempo todo.

“Eu preciso levar eles para concertar”, eu diria, e ele sempre respondia com “Nah, eu gosto de ser seu ajustador de óculos oficial.” Deus, eu lembrava que isso fazia meu coração saltar.

“Eu fiz... eu fiz alguma coisa errada para você Roxy?” Eu enrijeci como se aço estivesse caído nas minhas costas. “O que?” Tudo sobre a postura de Reece mudou. Ele ainda estava perto, suas mãos ainda estavam na prateleira em cada lado meu, mas sua arrogância que parecia sair de cada poro seu tinha ido embora. Cada parte dele estava alerta e tensa. “Eu te machuquei de algum modo?”

Minha boca caiu aberta. Ele tinha me machucado? Sim. Ele tinha ferido meu coração, quebrado ele em pedaços, mas não acho que isso foi o que ele quis dizer. “Não, Deus, não. Como você pode pensar isso?".

Seus olhos fecharam um pouco enquanto ele exalava bruscamente. “Eu não sei o que pensar.” Oh Deus, meu peito inteiro apertou. Eu precisava contar a verdade a ele, porque não importava o quão mal meus sentimentos e orgulho estivessem feridos, eu não podia deixar ele pesando algo desse tipo sobre si mesmo. As palavras se formaram na ponta da minha língua.

jeito.” “Nunca deveria ter acontecido,” ele continuou. “Você e eu... não desse

As palavras se perderam na minha língua, saindo como uma rajada. Eu sabia o quão ruim era estar desapontada assim, porque ele disse que não deveria ter acontecido quando, na verdade, não tinha mesmo, mas era o significado por trás disso tudo. Um conjunto diferente de palavras saíram da minha boca. “Você realmente se arrepende, não?” Minha voz soou rouca demais. “Eu sei que não devo ser a primeira mulher que você ficou bêbado demais...” “Que eu não lembrasse de nada?” ele interveio. “Yeah, você é a única menina que eu fiz isso.” Eu não sabia se devia estar aliviada por isso ou realmente insultada. Balançando minha cabeça, eu fui invadida por uma mistura de emoções. “Você... você deseja que nunca tivesse acontecido, certo?” “Yeah, desejo.” A honestidade crua veio como um tiro direto no meu peito. “Porque eu esta...” A porta do estoque abriu de repente. “Cara, eu tenho um péssimo timing quando se trata disso,” Nick disse, “Desculpe... yeah, interromper. Eu só precisava pegar algumas... coisas.” Minha saída veio na forma alta e negra, e eu não iria olhar os dentes do cavalo dado. Eu usei a distração em meu benefício. Reece tinha abaixado seu braço enquanto se virava para Nick, que estava pegando guardanapos com o logo do Mona’s

impresso neles. Eu corri para longe de Reece e passei pela porta aberta. Eu não olhei para Nick e o sangue que fazia minhas orelhas pulsarem impediu que eu ouvisse o que estavam falando.

Aquela queimação estranha na minha garganta devia ter algo a ver com uma alergia. Provavelmente ao mofo que tinha em algum lugar no prédio, isso foi o que eu me disse enquanto voltava para atrás do bar e me forçava a sorrir quando eu vi as meninas sentadas ali.

“Vocês precisam e bebidas?” Eu perguntei animada, pegando quase que automaticamente uma garrafa.

“Estamos bem,” O olhar de Calla passou para meu ombro, e eu não precisava olhar para saber que Reece tinha saído do estoque. Eu o vi nos próximos segundos, cruzando o chão do bar. Ele se sentou em uma cadeira vazia ao lado de Cam, seu rosto estoico.

“Você está bem?” ela pergunto, sua voz baixa e sincera.

Meu sorriso iria fazer minhas bochechas explodirem. “Claro.” Dúvida passou pelo seu rosto enquanto eu me virava e empurrava meus óculos no lugar. Eu disse a mim mesma para me recompor. Essa era a sua noite – sua e de Jax. Eu não precisava que ela se preocupasse comigo. Esfregando minhas mãos sobre meu rosto, eu provavelmente acabei tirando o que havia sobrado da minha maquiagem. Oh, bem, isso não importava nessa altura do campeonato. Eu ajustei meus óculos e me virei.

Calla, Tess e Avery estavam me encarando.

Eu inalei profundamente e cocei minha garganta, pegando a barra da minha camiseta e a esticando. “Então vocês querem saber por que a Lufa-lufa é a melhor?” Avery sorriu enquanto se inclinava para frente. “Nós queremos mesmo

saber?”

Eu concordei animada. “Oh, sim – sim vocês querem.” Tess deu um pulinho, muito mais animada para ouvir meus motivos de ser escolhida para a Lufa-lufa, e eu acho que me apaixonei por ela naquele momento,

mas não consegui enganar Calla. Ela mordeu seu lábio inferior enquanto me olhava encher o copo de refrigerante de Avery. E eu não pude me impedir de olhar para onde todos os caras estavam. Cam e Jax, que aparentemente estavam na beira de um bromance11 épico, estavam entretidos em uma conversa com Jase, mas no momento que meu olhar passou pela mesa, eu me esqueci do que estava fazendo com a forma de gelo. Puta merda, eu nem me lembrava de ter pegado isso. Por que eu o estava segurando?

Os olhos de Reece encontraram os meus e ar escapou dos meus pulmões. A intensidade que seu olhar viajou toda a distancia entre nós. Isso me atingiu – por que ele tinha escolhido essa noite para finalmente cruzar a distância entre nós. Não que isso importava, mas eu estava curiosa.

Eu não precisava ter a habilidade de Katie – ela estava convencida de que quando caiu do poste de pole dance enquanto, um, dançava e tinha batido sua cabeça, ela tinha desenvolvido poderes psíquicos – para saber no que ele estava pensando e o poder concentrado em seu olhar significava. Eu posso ter conseguido escapar dele na sala do estoque, mas ele não tinha terminado seu assunto comigo.

Olhos azuis vibrantes, da cor do céu minutos antes que a noite roubasse todas as cores, espiavam por uma camada grossa de cílios castanho escuro cercados por uma pele dourada. Aqueles olhos estavam fora do lugar em um rosto que ainda tinha um pouco do charme de menino, mas a linha dura de seu maxilar, teimosa e dominante, e aqueles bem desenhados lábios gritavam masculinidade. Uma beleza que era tão forte quanto majestosa.

Meu olhar se moveu para a tela e, então, para o pincel que estava em minha mão, à ponta das cerdas manchadas de azul.

Puta merda numa cesta. E não o tipo barato de cesta, aquelas grandes tipo as que minha mãe colecionava.

Eu tinha feito de novo.

11 Um tipo de amizade coloria entre melhores amigos do sexo masculino.

Resistindo a urgência de jogar o pincel direto na pintura, eu imaginava se a ponta seria afiada o suficiente para me fazer uma lobotomia, porque sério, essa era a única resposta plausível para eu ter pintado o rosto de Reece.

De novo.

Do tipo, mais de uma vez.

Eu não era só patética, mas também era meio perturbada, agora que pensei sobre isso. Quero dizer, eu duvidava que ele apreciaria saber que eu estava pintando um esboço do seu rosto. Eu surtaria se soubesse que um cara estava secretamente pintando meu rosto, em tinha várias versões dele escondidas em meu armário. A não ser que fosse Theo James ou Zac Efron. Eles poderiam pintar meu rosto à vontade e um pouco mais. Reece provavelmente não gostaria de saber que eu acordei essa manhã com seus olhos gravados nos meus pensamentos porque eu tinha sonhado com ele de novo.

Também, algo que tinha feito mais de uma vez.

Talvez ele não se importasse, uma voz maldosa sussurrou. Depois de tudo, na noite passada na sala do estoque, ele estava todo em cima do meu espaço pessoal. Ele totalmente tinha ajustado meus óculos para mim. Houve um momento quando eu pensei que ele poderia me beijar.

Ele, também, tinha me dito que a noite em que ele pensava que havíamos transado nunca deveria acontecer de novo.

Então, aquela pequena voz maldosa era uma puta mentirosa que gostava de agitar a merda.

Arrumando meus óculos no meu nariz, eu suspirei e soltei o pincel ao lado nos pequenos potes de aquarela que estavam no topo da cômoda, que parecia como tivesse levado um banho de uma cartela de cores primárias.

Eu realmente precisava parar de pintar o seu rosto.

Por que eu não conseguia ser uma artista normal e pintar montanhas e vasos de flores ou algo assim estupido e abstrato? Oh não, eu tinha que ser o tipo de artista que tinhas tendências à perseguição.

Saindo do banquinho, eu limpei minhas mãos nos meus shorts jeans e cuidadosamente tirei a tela aquarelada livre da moldura. Algumas pessoas gostavam de pintar em papel reciclado mas eu sempre preferi a textura e a aparência da tela, e tudo que você tinha que fazer era endurecer a tela para que a aquarela funcionasse.

O que eu precisava fazer era enrola-la e jogar fora para que ninguém no mundo a encontrasse, mas cada vez que eu colocava uma imagem na tela, não importando o quão vergonhosa fosse, eu não podia me desfazer dela.

Pintar, assim como desenhar, bem... isso se tornou parte de mim.

“Eu sou uma idiota,” eu balbuciei enquanto levava a pintura praticamente seca para o varal que ia de um canto ao outro do quarto que eu tinha transformado em estúdio.

Eu pendurei o retrato com pregadores e voltei para o quarto, fechando a porta atrás de mim e me prometendo que se alguém um dia entrasse naquele quarto e visse aquela pintura – ou qualquer uma das outras – eu iria me enrolar em uma bola do meio da interestadual.

O barulho suave vindo da TV na sala atiçou meu ouvido enquanto eu andava pelo pequeno corredor. Desde pequena, eu não gostava de silêncio, e isso só piorou depois do que aconteceu com Charlie. Uma TV ou o rádio sempre tinham que estar ligados. À noite, eu sempre tinha um ventilador ligado, não por causa do calor, mas pelo barulho.

Dois passos me levariam para o quarto e mais um para o único banheiro. Meu apartamento era pequeno mas era bom. Térreo, assoalho de madeira, um espaço aberto que combinava a cozinha com a sala e uma porta que levava da cozinha para um deck e uma pequena área verde, assim como a entrada da frente.

Não era exatamente em um condomínio de apartamentos. Apenas uma grande casa no estilo vitoriano no meio de Plymouth Meeting, uma cidade há alguns quilômetros de Philly. A casa havia sido remodelada no começo dos anos 2000 e convertida em quatro apartamentos de dois quartos. Charlie teria chamado isso de retro e ele teria amado.

Um casal de senhores, Sr. e Sra. Silver, moravam no outro apartamento térreo e algum cara que eu raramente via tinha se mudado para o apartamento acima do meu há alguns meses atrás, e James, um cara que trabalhava na seguradora local, vivia no último apartamento com sua namorada Miriam.

Meu celular tocou, chamando minha atenção para onde eu o tinha deixado no braço do sofá assim que cheguei em casa do bar. Eu vi que era uma mensagem de texto.

Eu me contorci e quase me escondi atrás do sofá quando vi que era de Dean e tudo que dizia era:

“Adoraria de ver de novo.”

Caramba, de repente eu me sentia com nojo. Eu nem queria mais tocar meu

celular.

Semana passada, quando eu trouxe Dean para cá – o cara do Olive Garden que tinha uma barbicha de acordo com Melvin – as coisas não tinham saído como eu esperava.

A noite tinha terminado com alguns beijos. Beijos em um lugar bom, do lado de fora do pequeno deck, com as estrelas acima de nós, mas nada além. Provavelmente tinha a ver com Sr. Silver saindo para o deck que compartilhávamos com o apartamento ao lado. O velho parecia que iria bater no pobre coitado.

Mas mesmo se ele não tivesse interrompido, nada mais iria acontecer entre Dean e eu. Ele era um bom rapaz, talvez um pouco falante demais, mas quando eu pensava nele, eu não sentia nada.

Talvez tivesse a ver com o fato de... Deus, eu precisava terminar esse pensamento? Esse beijo que eu compartilhei com Dean era triste porque não era nada como o jeito que Reece havia me beijado – merda! Eu realmente terminei esse pensamento.

Isso era engraçado, eu não queria realmente sentir algo em primeiro lugar, então de uma forma Dean era uma aposta segura. Ele era uma pessoa legal de se sair e não havia chance no mundo que meu coração estaria envolvido, mas isso não era justo para ele.

Eu suspirei enquanto passava pelo sofá, deixando meu celular no mesmo lugar. Dean era legal mas não haveria um segundo encontro. Eu tinha que achar minhas bolas femininas e dizer isso a ele, mas eu precisava cochilar antes disso. Talvez uma bacia de batatinhas e...

Meu estômago revirou assim que parei na sala de jantar, olhando para a cozinha. Movimentos do lado de fora da pequena janela chamaram minha atenção. Foi rápido – uma sombra cinza ou marrom escura, mas foi embora tão rápido para eu conseguir ver direito, mesmo com meus óculos. Quando eu cheguei à janela, eu me apoiei na pia de metal e me estiquei na ponta dos pés. Olhando pela janela, a única coisa que vi foi uma cesta de flores rosa que eu comprei no mercado semana passada, colocava na mesa de ferro que já tinha visto melhores dias, suas pétalas balançando pela brisa. Eu pensei que ouvi uma porta se fechando mas eu desapoiei e balancei a cabeça.

Agora eu estava vendo coisas.

Virando-me, eu me apoiei contra a pia e inalei profundamente enquanto movia meu pescoço de um lado para o outro. Ter fechado o Mona’s na noite passava significava que eu cheguei em casa depois das três da manhã e eu tinha acordado cedo demais.

Acordado, com uma sensação estranho no estômago... aquele vazio horrível que tinha realmente uma causa real. Apenas ali, me deixando inquieta e irritada. Isso tinha ficado até que eu peguei o pincel mas sabia que isso iria voltar.

Sempre voltava.

Afastando-me da pia, eu peguei uma banana da triste fruteira que estava cheia com pedaços de chocolate logo que uma batida soou na minha porta. Uma olhada no relógio perto da geladeira me disse quem era.

Todo sábado, desde que eu me mudei quando tinha dezoito anos, há quatro anos, minha mãe, às vezes minha família toda, apareciam ao meio dia. Assim como toda a sexta eu visitava Charlie.

Graças a Deus eu tinha fechado a porta do estúdio porque a última coisa que precisava era que alguém da minha família – minha mãe, pai ou um dos meus dois irmãos, visse as pinturas de Reece. Eles sabiam quem ele era.

Todos sabiam quem ele era.

Destrancando a porta, eu a abri para ter uma onda de calor batendo em mim e um galão de um liquido marrom empurrado na direção do meu rosto. Eu cambaleei para trás. “Mas que...?” “Eu fiz chá doce,” minha mãe anunciou, colocando o container de plástico ainda quente em meus braços. “Imaginei que o estoque teria terminado.” Eu poderia fazer qualquer drink conhecido pelo homem no bar, mas eu não conseguia fazer chá doce nem se salvasse minha vida. Por alguma razão, eu não conseguia dosar certo a quantidade de sachês de chá com o açúcar, e isso me impressionava.

“Obrigada.” Eu segurei o container contra meu peito enquanto minha mãe entrava na casa como um tornado de 1,60cm com cabelo castanho curto. “Só você hoje?”

Ela fechou a porta com um giro e ajustou seus óculos vermelhos. Não só minha falta de altura vinha da minha mãe, mas minha péssima visão também. Yay, genética! “Seu pai foi jogar golfe com seu irmão.” Eu imaginava que “seu irmão” seria meu irmão mais velho, Gordon, porque o meu irmão mais novo, Thomas, está passando por uma fase gótica e não chegaria nem a 5 metros perto de um circuito de golfe.

“Ele vai acabar tendo um ataque cardíaco por causa desse calor, sabia? É absolutamente ridículo que ele está lá fora. A mesma coisa com o Gordon.” Ela continuou, indo para o segundo sofá que eu comprei quando mudei para esse apartamento há quatro anos. Ela se sentou. “Ele precisa ser mais responsável – seu irmão, desde que meu neto está a caminho.” Eu não fazia ideia de como jogar golfe em Agosto tinha algo a ver com sua esposa estar grávida de três meses, mas eu deixei isso de lado e levei a jarra para a geladeira. “Quer algo para beber?” “Eu bebi tanto café que estou surpresa que não vim boiando até aqui.”

Enruguei meu nariz enquanto abri a porta. Dando um passo para trás, eu encarei a geladeira, meus dedos apertando a alça da jarra. “Mas que...?” eu murmurei.

“O que você está fazendo querida?” Perturbada, eu olhei fixamente para a geladeira. Na prateleira de cima, perto do pacote de refrigerante, estava o controle remoto da TV. Eu nunca na minha vida, nem acidentalmente, coloquei o controle ou qualquer coisa não consumível na geladeira. Eu não conhecia alguém de verdade que tinha feito isso, mas aqui estava eu, encarando a prateleira como uma tarântula prestes a atacar.

Eu olhei para a janela em cima da pia, meu estômago revirando enquanto eu pensava na sombra que eu tinha visto do lado de fora mais cedo. Era nada de mais, e eu provavelmente estava mais cansada do que pensei, mas ainda assim era estranho – muito estranho.

Balancei minha cabeça enquanto pegava o controle remoto da geladeira que eu estava começando a achar que era a mesma de Ghostbusters II12 e guardei o chá.

Se virando no sofá, minha mãe deu uns tapinhas na almofada ao seu lado. “Sente-se aqui comigo, Roxanne. Nós não conversamos há um tempo.” “Nós conversamos no telefone ontem,” eu a lembrei enquanto fechava a porta da geladeira e trazia o controle de volta para onde ele precisava ficar, na mesa de centro, como um bom controle remoto.

Seus olhos castanhos, assim como os meus, reviraram. “Isso foi a muito tempo, querida. Agora traga sua bunda para cá.” Eu levei a minha bunda para lá e no momento que me sentei, ela moveu sua mão magra e gentilmente cutucou o rabo de cabalo bagunçado que eu estava usando. “O que aconteceu com as mechas vermelhas?” Dando de ombros, eu levantei minha mão e peguei o elástico do meu cabelo. Ele era longo, alcançando meus inexistentes seios. Além das mechas roxas, meu

12 Os Caça-Fantasmas 2

cabelo era de um castanho escuro. Eu mudava tanto ele que estava surpresa dele não ter caído da minha cabeça ainda. “Eu enjoei delas. Você gostou do roxo?” Ela concordou enquanto estreitava seus olhos atrás dos óculos. “Sim, muito você. Combina com as manchas de tinta na sua camiseta.” Olhando para minha camiseta velha do Twilight13 , eu vi que havia algumas manchas roxas na frente dela, pelo rosto do Edward. “Rá.” “Então...” minha mãe prolongou a palavra de um jeito que fez soar meus sinos de alerta. “Você sabe que a oferta ainda está de pé. Certo?” Minha coluna enrijeceu enquanto eu encontrava seu olhar carinhoso. A oferta. Ugh. Essa oferta era uma praga que eu, às vezes – okay, praticamente sempre – queria aceitar. A oferta era voltar para casa, aos meus vinte e dois anos, largar a faculdade de design gráfico, o trabalho no bar e os freelances que eu fazia de vez em quando e devotar 100% do meu tempo para minha paixão real.

Pintar.

Eu era muito sortuda por ter pais que estavam dispostos a apoiar uma pobre artista, mas eu não podia fazer isso. Eu precisava da minha independência. Era o motivo deu ter me mudado e o porquê estava me levando milhões de anos para terminar minhas aulas na faculdade comunitária.

“Obrigada,” eu disse, fechando sua mão na minha. “Eu estou sendo sincera. Obrigada, mas você sabe...” Ela suspirou enquanto soltava sua mão e a colocava na minha bochecha. Se inclinando, ela beijou a minha testa. “Eu sei, mas eu só precisava ter certeza que você não tinha esquecido.” Se afastando, ela inclinou sua cabeça para o lado enquanto passava seu dedão logo abaixo dos meus óculos. “Você parece tão cansada, desgastada.” “Geez, mãe. Obrigada.” Ela me deu um olhar direto. “Que horas você saiu do Mona’s?”

13 Crepúsculo

“Três da manhã.” Eu suspirei enquanto me inclinava contra a almofada, deixando ela me engolir. “Eu acordei cedo.” “Não conseguia dormir?” Seu tom estava cheio de simpatia.

Minha mãe me conhecia. Eu concordei.

Houve uma pausa enquanto ela colocava uma perna sobre seu joelho. “Você viu Charlie ontem?” Eu concordei novamente.

“Claro que viu,” ela disse com a voz baixa. “Como está meu menino?” Ouvir ela se referir a Charlie desse jeito fez a ferida de vê-lo ainda mais difícil. Meus pais... Deus, eles eram uma figura paterna maior para Charlie do que seus próprios foram. Suspirando, eu contei a ela sobre minha visita a Charlie e como ele não tinha me reconhecido novamente. Preocupação encheu seus olhos escuros, porque ela também se lembrava do que aconteceu antes.

Quando terminei, ela tirou seus óculos e se moveu, nervosa. “Eu soube sobre Reece.” Meus olhos arregalaram até que um pensamento veio em minha cabeça. Ela soube sobre Reece? Sobre nossa noite que não foi realmente uma noite? Minha mãe e eu compartilhávamos muito, mas eu defini a linha.

“Eu achei legal da parte dele ir te encontrar ontem e contar sobre Henry,” ela continuou e eu fiquei aliviada.

Obrigada, Deus. Ela não estava se referindo ao shenanigans14 . “Como você soube sobre isso?” Ela sorriu. “Sua mãe me contou ontem à noite.” Sua expressão ficou misteriosa. “Eu acho que ele saiu da sua rotina para fazer isso. Saiu do seu caminho, Roxy. Hmm, não acha isso interessante?” “Oh, mãe.” Eu revirei meus olhos. Claro que ela sabia que eu tinha uma grande queda por ele desde o momento que ele se mudou para a casa ao lado. Eu

14 Pegação. Deixei o original porque é bem engraçado ;)

tinha certeza que ela e a mãe de Reece tinham planejado me juntar com Reece no Thanksgiving 15do ano passado, porque elas estavam dando dicas sobre nós estarmos tristemente solteiros ao ponto que o irmão de Reece quase se engasgou com o purê de batatas de tanto rir.

“Ele é um bom menino, Roxy.” Minha mãe continuou, soando como um comercial sobre Reece. “Ele lutou pelo seu país, voltou para casa e conseguiu um emprego onde precisa colocar sua vida em risco. E o que aconteceu ano passado, com aquele menino. Ele teve que fazer uma coisa difícil...” “Mãe,” eu gemi.

Eu consegui mudar a conversa sobre Reece para o primeiro neto. Quando chegou a hora de me arrumar para meu turno no Mona’s, eu ganhei um abraço caloroso e apertado da minha mãe.

Enquanto ela se afastava, ela olhou diretamente nos meus olhos. “Nós não falamos muito sobre Henry e o que ele quer, mas eu queria que você soubesse que seu pai e eu te apoiamos no que quer que você decida.” Lágrimas se formaram e eu pisquei para afastá-las. Aw cara, eu amava meus pais. Eles eram bons demais para mim. “Eu não quero falar com ele. Eu nem quero ver seu rosto.” Seu sorriso era triste enquanto ela concordava e eu sabia no que ela estava realmente pensando. Eles queriam que eu largasse essa grande bagagem de ódio que estava em meus ombros. “Se é isso que você quer, então estamos com você.” “É,” eu confirmei.

Ela acariciou minha bochecha e saiu da casa do mesmo jeito que havia entrado e, enquanto eu fechava a porta atrás dela, eu percebi que não ia ter tempo para um cochilo.

O que era uma coisa boa porque eu provavelmente terminaria sonhando sobre Reece de novo e essa era a última coisa que eu precisava agora. Exatamente nesse segundo, eu desenvolvi uma lista de prioridades.

15 Feriado de Ação de Graças.

Primeiro: eu precisava tomar banho. Pequenos passos.

Segundo: eu precisava parar de sonhar sobre ele. Mais fácil dito do que feito, mas que seja. Isso era algo prioritário na lista.

rosto. Terceiro: eu, também, precisava parar de pintar seu estúpido – porém sexy-

E finalmente, quarto: eu precisava encarar Reece na próxima vez que eu o visse e contar a verdade sobre aquela noite. Eu podia fazer isso, pelo menos. Largar essa bagagem de ódio. Eu precisava, porque eu não conseguia parar de pensar sobre o que ele tinha me perguntado.

Eu te machuquei?

Pressionando meus lábios juntos, eu tentei ignorar a ponta de culpa que se formava na minha barriga enquanto eu andava pelo corredor. Reece tinha lidado com culpa suficiente. Ele não precisava me adicionar a isso. Uma vez dentro do meu quarto, eu me despi, deixando minhas roupas onde elas haviam caído enquanto meus pensamentos giravam em torno de como contar essas novidades.

Eu suspeitava que ele não iria ficar feliz comigo.

Mas se eu soubesse que ele pensava algo assim durante esse tempo todo, eu teria esclarecido as coisas mais cedo. Sério. Eu estar machucada com isso não chegava nem perto dele pensar que ele tinha feito algo realmente ruim.

Mordendo meu lábio inferior, eu cruzei o quarto, indo para o armário. As portas estavam abertas, um ar gelado que percorreu a pele nua do meu estômago, criando uma onda de calafrios pela minha pele. Uma coisa ruim sobre esse apartamento era a temperatura, mesmo no verão. Sr. Silver uma vez contou que haviam passagem secretas na casa desde o primeiro dia, caminhos sobre as escadarias e portas escondidas nas paredes.

Pensando nisso, a escadaria que costumava levar ao segundo andar ficava no meu quarto.

Me virando, como uma idiota, eu fechei rapidamente as portas do armário. Totalmente sem sentido considerando que eu estava completamente nua, mas eu fiz mesmo assim.

Enquanto me arrumava para o trabalho, eu voltei a pensar na sessão de confissões que eu teria de ter com Reece. Lá no fundo eu sabia que não iria terminar bem e eu não deveria me importar sobre isso, mas eu me importava.

E eu sabia que ele não só iria se arrepender da noite que nunca deveria realmente ter acontecido, mas uma vez que ele percebesse que eu tinha mentido, ele iria terminar me odiando.

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