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Sustentabilidade

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Energia

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O CAMINHO PARA A SUSTENTABILIDADE

por João Loureiro Rodrigues, Sustainability Officer (CSO), NOVA 4 The Globe

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NOVA 4 The Globe | Sustainability at NOVA

A Universidade NOVA de Lisboa, como jovem instituição generalista de ensino superior público, orgulha-se do seu dinamismo e proatividade no combate aos grandes desafios do século XXI. No centro da sua atividade estará sempre a educação de jovens talentos, bem como a promoção de investigação colaborativa e interdisciplinar, fundamental e aplicada. A NOVA tem 9 Unidades Orgânicas que trabalham em torno de diversas áreas do conhecimento, nomeadamente Saúde, Ciências, Tecnologias, Engenharia, Matemática e Ciências sociais. Alinhada com a sua missão, a Universidade criou o NOVA 4 The Globe, uma plataforma interdisciplinar que promove o diálogo entre os membros da Comunidade NOVA e as diferentes áreas de conhecimento, com vista a contribuir para a sustentabilidade. Ancorada na excelência do conhecimento científico e competências que as Unidades Orgânicas da NOVA produzem e transmitem, a plataforma é a expressão do seu compromisso com os desafios globais. Para além de estimular o diálogo entre investigadores, com foco na sustentabilidade, ela procura também identificar e amplificar o impacto societal da Universidade nas comunidades locais e facilitar a transformação organizacional em torno nas melhores práticas sustentáveis. Alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e o Pacto Ecológico Europeu, a Universidade NOVA de Lisboa ambiciona ser uma referência, entre as jovens universidades europeias, no compromisso com uma política de sustentabilidade inovadora e orientada pelo conhecimento, que promova o impacto científico, tecnológico, económico, ambiental e social. O planeta é um sistema de agentes interdependentes, como mostra a mais recente pandemia. Tendo em conta as diferenças entre si, o grande desafio da sociedade será encontrar a base de confiança e motivação que os fará convergir para um foco coletivo. As universidades podem aqui desempenhar um papel importante, ajudando-os a ver para além dos seus modelos mentais previamente estabelecidos, facilitando o diálogo, promovendo investigação de ponta e educando as futuras gerações de cidadãos mais responsáveis. Elas são responsáveis por estabelecer uma relação cada vez mais próxima entre a investigação e os interesses da sociedade, estreitando relações com a indústria e o setor público. A Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, adotada por todos os estados-membros das Nações Unidas em 2015, reforça a necessidade desta ação coletiva. Ancorada nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), ela reconhece o valor do pensamento sistémico nos desafios globais e convida a um compromisso transversal, que envol-

va também organizações e cidadãos. Contrariamente à agenda definida pelos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, esta ultrapassa o contexto político e as fronteiras geográficas dos países em desenvolvimento. Ela sublinha que o fim da pobreza, por exemplo, deverá estar de mãos dadas com estratégias que melhorem a saúde e educação, ao mesmo tempo que é promovido o crescimento económico. Tudo isto enquanto são enfrentadas as mudanças climáticas e se trabalha na preservação dos oceanos e florestas. Estes são de facto desafios globais com os quais todos estamos familiarizados, e só trabalhando em conjunto poderemos fazer a diferença. Embora algumas organizações tenham a sustentabilidade no centro dos seus valores, e em alguns casos perfeitamente contextualizada na sua missão, é importante reconhecer que este processo implica uma transformação organizacional profunda que nem todas estão dispostas a seguir. Em alguns casos, ela faz apenas parte de uma estratégia de marketing, não estando minimamente integrada na cadeia de valor dos produtos comercializados. Só identificando e avaliando as motivações e investimento necessários para levar a cabo este empreendimento, poderão iniciar o caminho da sustentabilidade de forma verdadeiramente eficiente e relevante. Refletindo sobre o principal tópico desta edição da revista, a neutralidade carbónica, sublinharia a importância de compreender o grau de preparação para o processo de transformação organizacional, nomeadamente as motivações por trás da vontade de mudança. É uma longa caminhada, que exige planeamento e compromisso, e uma avaliação prévia à pegada carbónica das organizações é aconselhada. Uma vez definido o ponto de partida, é possível escolher entre as diferentes opções disponíveis, que vão desde a simples mitigação do contributo negativo para o ambiente, à profunda reestruturação da cadeia de valor. O planeta, por seu lado, pode não avaliar contribuições positivas e negativas para as emissões carbónicas utilizando uma escala única. De facto, variando de indústria para indústria, se as intenções da empresa vão para além da imagem que passam para os seus clientes, plantar árvores como um programa de compensação da pegada carbónica pode ficar aquém das necessidades do planeta. Apesar da ideia de neutralidade que essa ação pode sugerir, vale a pena refletir no efeito verdadeiramente devastador que algumas indústrias podem ter no ambiente e na sociedade. Só um pensamento sistémico poderá acautelar de forma holística todos os valores da sustentabilidade.

A NOVA está comprometida com os desafios globais e trabalha focada nos 17 ODS. O site do NOVA 4 The Globe, bastante intuitivo, é uma oportunidade para descobrir as diferentes iniciativas e investigação levadas a cabo pela Universidade. Curiosamente, até na área da cerâmica a NOVA está bastante ativa. A NOVA School of Science and Technology é parceira de um novo projeto Erasmus + para preservar as tradições na arte da cerâmica. “CRAFT: Activating Pedagogy for Ceramic Education Futures” é uma resposta à crescente perda de tradições em cerâmica, uma das formas de artesanato mais antigas da história da humanidade. Durante três anos, as instituições envolvidas pretendem mapear o estado atual das competências artesanais e industriais, e reunir o conhecimento fragmentado existente no setor. Tem como objetivo criar um programa de ensino inovador em educação artística, com foco no desenvolvimento de novas formas de transferir conhecimento e tradições, e criar um repositório sólido de práticas de produção. Este projeto espera contribuir para a sua preservação, trazendo essas práticas para audiências e alunos, e salvaguardar o futuro da fabricação de cerâmica. Entre as prioridades estabelecidas pela NOVA, está um forte compromisso com a agenda internacional das mudanças climáticas e com a neutralidade carbónica. Visando o ODS 13, Ação Climática, a Universidade colabora a nível europeu para acelerar a transição para o uma economia neutra em carbono e uma sociedade climaticamente resiliente. O maior pilar desta ação está no contributo da NOVA School of Science and Technology para a definição da estratégia de longo prazo para a neutralidade carbónica da economia portuguesa, em 2050. A nível europeu, a NOVA colabora no projeto EIT Climate-KIC, uma plataforma de conhecimento e inovação para acelerar a transição que identifica e apoia inovação que ajuda a sociedade a mitigar os efeitos das alterações climáticas. O NOVA 4 The Globe, por seu lado, estimula a interdisciplinaridade na investigação e o envolvimento comunitário, alinhando também a sua ação com as cinco missões definidas pela União Europeia no contexto do Horizonte Europa, o maior programa transnacional de sempre que apoia a investigação e inovação. O Horizonte Europa oferece um importante apoio às mudanças sistémicas necessárias para assegurar uma Europa verde, saudável e resiliente. Apoia também a investigação colaborativa relacionada com os desafios societais e reforça as capacidades tecnológicas e industriais através de agregados temáticos. O agregado “Clima, Energia e Mobilidade”, por exemplo, irá aumentar os recursos da investigação e inovação em domínios relacionados com o clima e assegurar que as empresas europeias têm acesso às tecnologias e aos dados de que necessitam. Este programa é uma oportunidade para universidades e empresas, mas sobretudo para o planeta.

NEUTRALIDADE CARBÓNICA E A INDÚSTRIA PORTUGUESA – ELEMENTOS DE LEITURA

por Pedro Martins Barata, CEO na Get2C

No início do século XXI, as alterações climáticas são um dos principais, se não mesmo o principal desafio com que a Humanidade se confronta. Sabemos já que a mudança no clima implicará mudanças profundas a nível planetário em todos os aspetos das nossas sociedades. Os impactes que já se fazem sentir vão aumentar, seja através de mudanças imediatas e visíveis, como sejam a maior frequência e intensidade de fenómenos climáticos extremos, seja através de tendências lentas, mas inexoráveis, como a subida do nível do mar ou a migração de ecossistemas inteiros. Em 2015, a pressão destas evoluções e a coincidência do momento político combinaram-se para a celebração do Acordo de Paris, o qual veio a tornar-se efetivo em tempo recorde. Peça fundamental do Acordo de Paris foi o reconhecimento de que o objetivo final da Convenção-quadro das Alterações Climáticas – a estabilização do sistema climático a níveis seguros – só poderia ser alcançado com uma redução drástica das emissões globais, a qual atingisse a “neutralidade carbónica” na segunda metade do século XXI. Dadas as responsabilidades especiais dos países desenvolvidos, tal reconhecimento implica a adoção de metas de neutralidade carbónica em 2050. Portugal foi um dos primeiros países a nível internacional a anunciar publicamente esse objetivo e a colocá-lo nos seus instrumentos de planeamento. Perspetiva-se agora que o mesmo seja traduzido em letra de lei, na futura lei do Clima, em discussão na Assembleia da República.

Do Acordo de Paris à Estratégia de Longo Prazo

O Acordo de Paris foi por isso a espoleta para o planeamento climático de longo prazo em Portugal. O Roteiro de Neutralidade Carbónica assumiu o objetivo traçado pelo Governo e consubstanciou-o numa estratégia que tem três vetores fundamentais: a) a eletrificação dos consumos de energia, acompanhado de b) a construção de um sistema elétrico completamente renovável, ao mesmo tempo que c) promove a utilização cabal do potencial de sequestro de carbono nacional, nomeadamente através de uma gestão florestal sustentável (ver figura 1 sobre resultados do Roteiro para a Neutralidade Carbónica).

Resumo dos resultados Figura 1 - dos cenários do Roteiro Neutraidade Carbónica

Evolução recente das emissões Figura 2 - de GEE em Portugal

Evolução das emissões Figura 3 - por sector no cenário Camisola Am arela do RNC

Evolução do custo da energia solar Figura 4 - fotovoltaica A tendência da descarbonização, senão mesmo a estratégia, está já claramente em curso: a desativação das duas centrais térmicas a carvão, bem como os leilões de energia solar e a expansão da eólica em Portugal permitem prever um sistema elétrico cada vez mais renovável (ver figura 2 sobre evolução recente das emissões em Portugal). No que diz respeito à eletrificação dos transportes, em particular dos transportes urbanos, Portugal acompanha a tendência europeia, situando-se no pelotão da frente da adoção de frotas elétricas. No entanto, tal como nos outros países europeus, a descarbonização em Portugal passará inevitavelmente por lidar com sectores e atividades de maior custo de mitigação/descarbonização. No Roteiro, os últimos sectores a descarbonizar – e nem sempre a 100% - são justamente os sectores industriais (juntamente com o transporte marítimo e aéreo), onde as opções de descarbonização custo-eficazes aparentam ser reduzidas (ver figura 3 sobre repartição do esforço sectorial da redução de emissões).

Quais as opções para uma descarbonização industrial?

Elas passam sobretudo por, por um lado, eletrificar ao máximo os consumos energéticos onde a densidade e intensidade do consumo energético é relativamente baixa. Contudo, em sectores industriais como o cimento, o aço ou a cerâmica, os processos industriais não são facilmente eletrificáveis, se o são de todo. Se por um lado, é possível identificar em muitas situações opções de descarbonização através da mudança dos próprios processos e produtos industriais – por exemplo, através da incorporação de materiais biológicos na construção ou através do aligeiramento das estruturas de construção, tal é, em muitas situações, impossível. É, contudo, necessário não tomar o conjunto de possibilidades tecnológicas como fixo. Pelo contrário, a história recente da inovação e disponibilização da tecnologia renovável e de mobilidade elétrica mostra como a mudança tecnológica disruptiva pode acontecer a velocidades não antecipadas (ver figura 4 sobre inovação tecnológica e mobilidade eléctrica). A necessidade de altas densidades de energia implica neste momento a impossibilidade de eletrificar estes consumos industriais, mas não implica o afastamento destes sectores do esforço climático global. Há essencialmente duas formas em que esse esforço se irá fazer: através da sua inclusão no mecanismo de comércio de emissões, por um lado, e através do

reforço do esforço de investigação e desenvolvimento na procura de alternativas de processo ou produto para estas emissões “inevitáveis”. Finalmente, e muito no âmbito de iniciativas voluntárias empresariais, os sectores industriais serão sempre entre os primeiros na procura de unidades de compensação de emissões (“offsets”) que lhes permitam, de uma forma credível, apresentarem-se como “neutros em carbono”.

bono A competitividade industrial e o preço de car-

Para todos estes sectores industriais, a sua inclusão no mercado de carbono poderia levar muito possivelmente a distorções competitivas significativas – assumindo que os produtos que comercializam estão expostos à concorrência internacional (já que a concorrência europeia está assegurada pelo mercado comum de carbono e a sujeição a um preço único europeu, com condições de acesso igualitárias entre empresas do mesmo sector). Importa reconhecer que o argumento da perda de competitividade das empresas europeias por terem que pagar um preço de carbono só é válido para aqueles sectores onde o preço de carbono afeta significativamente o preço final do produto, ou seja, sectores intensivos em emissões de carbono, e que tenham uma proporção de vendas significativa fora da Europa, ou seja, produtos verdadeiramente transacionáveis. Falta dizer também que a União Europeia já não é um “player” único a nível mundial no mercado de carbono, e que muitas das mais importantes geografias concorrentes a nível industrial da Europa já têm preços de carbono, em alguns casos superiores ao prelo europeu. Finalmente, durante os primeiros anos de vigência do mercado, o custo de carbono foi em regra relativamente baixo, o que minou também por essa via a ideia da distorção competitiva. A ideia de uma indústria europeia acossada pelos altos custos de carbono não é historicamente comprovada pelos factos. Ainda assim, a União Europeia estabeleceu um mecanismo de proteção aos sectores vulneráveis, que se baseou na alocação gratuita de licenças de emissão. Efetivamente, uma alocação gratuita de uma licença que tem valor no mercado é um subsídio à exploração que contraria a ideia de um custo acrescido. A questão que atualmente se coloca, em face da evolução a política internacional de clima é o grau de sustentação deste mecanismo, e a sua compatibilidade com um outro mecanismo, ainda mais agressivo de proteção – a imposição de ajustamentos fiscais na fronteira europeia a produtos por via do seu conteúdo em carbono. Prima facie, tal imposição deveria imediatamente levantar alertas na Organização Mundial de Comércio (OMC), onde não é legítimo, em princípio, levantar barreiras que discriminem produtos na base do seu processo ou método de produção. Contudo, as conversações em curso entre a Comissão Europeia e a própria OMC levam a Comissão a ter uma razoável certeza de que há formas de desenhar a taxa aduaneira de uma forma que seja compatível com as disciplinas da OMC. Tal poderá passar, por exemplo, por sujeitar os importadores de produtos de sectores sensíveis oriundos de fora da Europa à obrigação de comprar direitos de emissão europeus (não os podendo comercializar posteriormente e sendo a receita assegurada revertida para o orçamento da União Europeia). Tal asseguraria que para muitos sectores o “playing field” seria um pouco mais equilibrado. Importa, contudo, dizer, que este ajustamento fiscal na fronteira deverá ditar a prazo a possibilidade de acesso à distribuição gratuita de licenças de emissão e será utilizado apenas em circunstâncias-limite. Por um lado, porque o mercado de carbono está rapidamente a expandir-se a nível mundial (ver figura 5 sobre expansão do mercado mundial de carbono). Por outro, porque a tensão gerada entre as grandes economias, que tal mecanismo pressupõe, só é compatível com a criação de um “clube de carbono” entre as grandes economias que reconheçam entre si a validade dos seus preços de carbono. É nesse sentido que se irá caminhar nos próximos anos. À indústria portuguesa importará seguir com atenção este tema. Se as previsões de preços de carbono de €100 na retoma económica se concretizarem, este deixa de ser apenas um tema esotérico de ambientalistas em cimeiras internacionais, e passará a afetar diretamente a competitividade e a viabilidade de muitas empresas e operações.

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