10 OS ÓRFÃOS DA VALE As catástrofes podem ocasionar perdas materiais e humanas imensuráveis. Nesse universo de danos causados em Brumadinho, as pessoas perderam familiares, amigos, casa, animais de estimação, estruturas de apoio comunitário, trabalho e outros bens afetivos e de valor para a sobrevivência, estando assim expostas a um contexto social vulnerável, incerto e, consequentemente, a um grande estresse individual e coletivo (REYES, 2006; BRITTON, 1986)1. Os órfãos da tragédia de Brumadinho são muitos. Mais que as 105 crianças que perderam pai, mãe ou ambos. Sentem-se órfãs também pessoas que tiveram suas vidas interrompidas abruptamente e até pessoas que sonhavam em entregar um currículo para a empresa. São órfãos da Vale S.A. os que trazem sequelas das tragédias em seu corpo e seu espírito e, mesmo assim, não são reconhecidos como vítimas. Sentem-se órfãos os que perderam sua terra e seu modo de vida, uma multidão de amigos, os lugares da infância e da memória. Uma tragédia desse porte provoca uma alteração de todo o ambiente, atingindo costumes e tradições, interrompendo hábitos e rotinas de pessoas de qualquer idade. O efeito disso raramente é percebido por levantamentos superficiais ou preenchimento de questionários formais. Ninguém melhor do que os próprios atingidos e aqueles que se engajaram diretamente na solidariedade ao povo de Brumadinho e região para dar testemunho dos impactos provocados na vida das pessoas e comunidades pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão: “São centenas de famílias que não dormem nem comem desde as 12 horas, 28 minutos e 25 segundos do dia 25 de janeiro. Ser mãe é ter o coração batendo no do filho. Lá a Vale enterrou meu coração, meu amor. Por isso, continuo presa à lama do dia 25.”2 Andresa Aparecida Rocha Rodrigues Perdeu seu único filho, o engenheiro Bruno Rocha Rodrigues, morto aos 30 anos. ____________________ “Em meu aniversário, quem vai estar comigo? Quem vai me trazer uma flor? Sempre ensinei que ele tinha de ter responsabilidade. Até falaram para não ir trabalhar naquele dia, porque era seu aniversário, mas ele foi, era responsável.”3
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