Eliane Souza da Cunha
Da Casa à Comunidade: Propostas de Requalificação para a Ocupação Olga Benário
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário Senac como exigência para obtenção do grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.
Orientação: Profª Ms. Rita de Cássia Canutti Centro Universitário Senac São Paulo,2018
Elaborada pelo sistema de geração automática de ficha catalográfica do Centro Universitário Senac São Paulo com dados fornecidos pelo autor(a). Cunha, Eliane Souza da Da Casa à Comunidade: Propostas de Requalificação para a Ocupação Olga Benário / Eliane Souza Cunha - São Paulo (SP), 2018. 25 f.: il. color. Orientador(a): Rita de Cássia Canutti Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo) - Centro Universitário Senac, São Paulo, 2018. requalificação urbana, recuperação ambiental, habitação social, assentamentos precários I. Canutti, Rita de Cássia (Orient.) II. Título
AGRADECIMENTOS Agradeço a minha família, pelo apoio, compreensão e incentivo. Principalmente à minha mãe, por todo carinho e dedicação. A todos que me acompanham nesses anos na instituição, colegas
de classe, de trabalho, professores e funcionários. O apoio que recebo continuamente tornou-se fundamental na minha trajetória. A minha orientadora, por todo conhecimento compartilhado e por me guiar ao longo desta etapa. Ao Projeto Rizoma, pela oportunidade de vivenciar experiências transformadoras, que agregaram um valor inestimável ao meu processo de pesquisa e ao meu crescimento pessoal. Por fim, a todos os amigos que seguem ao meu lado, enriquecem minha vida, compartilham alegrias, tristezas, e fazem a vida valer à pena.
ABSTRACT
RESUMO
This work consists of a proposal of urban requalification for the
Este trabalho consiste em uma proposta de requalificação urbana para
Olga Benário community region, located in Capão Redondo, based
a região da comunidade Olga Benário, localizada no Capão Redondo,
on the premise of meeting the demand for housing and public
partindo da premissa em atender a demanda habitacional e de
equipment, in balance with the need for environmental recovery
equipamentos públicos, em equilíbrio com a necessidade de
and preservation.
recuperação e preservação ambiental.
Keywords: urban regeneration, environmental preservation, social housing,
Palavras-chave: requalificação urbana, preservação ambiental, habitação social,
precarious settlements
assentamentos precários
SUMÁRIO 1. Introdução 10 1.1.Objetivos 10 1.2. Justificativa 10 2. Breve panorama sobre os assentamentos precários na Subprefeitura do Campo Limpo 12
3.5. Problemas e potencialidades 30 3.6. Buscando o desenvolvimento 32 4. Proposição 35 4.1. Premissas de intervenção 36 4.2. O Projeto 38
2.1. Desenvolvimento e expansão urbana 14 2.2. Déficit habitacional e ocupação dos últimos espaços 14
2.3. Os avanços da legislação urbanística no reconhecimento dos assentamentos precários 16 2.4 A permanência de ocupações irregulares em áreas frágeis 18 2.4.1. O território consolidado do Capão Redondo 18
3. A ocupação Olga Benário 23 3.1. Histórico 24 3.2. Situação atual da ocupação 26 3.3. Perfil socioeconômico 28 3.4.Condições atuais do território 29
4.2.1. Habitação 42 5. Considerações Finais 44 6. Referências bibliográficas 46 Anexos
1. Introdução De acordo com o Censo de 2010, a subprefeitura do Campo Limpo ocupa o 3º lugar no ranking de densidade demográfica da cidade de São Paulo, precedido por Sapopemba e Itaim Paulista, também regiões periféricas. Essa posição foi alcançada majoritariamente
através da ocupação informal, loteamentos irregulares e da autoconstrução ao longo das últimas décadas. Consequentemente, a ausência de planejamento urbano resultou numa região que carece de infraestrutura adequada para atender sua população. Inserida nesse contexto, e iniciada há aproximadamente 11 anos, a comunidade Olga Benário ocupa um terreno às margens do córrego do Engenho, no distrito do Capão Redondo. Local de muitos conflitos, já enfrentou desapropriações, disputas, e carrega um histó-
rico complicado junto aos moradores da região desde a época em que era um terreno vazio, cujos usos ilícitos retratavam estatísticas que, apesar de significativa melhora, ainda hoje apontam o distrito como o 2º mais violento da capital (SSP-SP). Atualmente, aproximadamente 700 famílias residem no local que, além de diversas nascentes, possui parte do terreno classificado como Área de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA). Ao passo que propostas para o projeto de reurbanização não se concretizam, a comunidade avança sobre as áreas verdes, aumentando o desmatamento e degradação dos cursos d’água.
10
1.1.Objetivos O trabalho tem como objetivo discutir um modelo de reurbanização para um assentamento precário que tenha como premissa estabelecer um equilíbrio com os diversos aspectos ambientais que o terreno apresenta, pensando a ocupação do espaço de forma que atenda não tão
somente a demanda habitacional latente, mas que possua potencial de significativa transformação nas relações com o entorno e com o território geográfico em que se insere.
1.2.Justificativa O tema do trabalho nasceu a partir de uma inquietação pessoal. Moradora da região, acompanhei os diversos episódios de ocupação e desapropriação de um local, que, por seu histórico, já era evitado e estigmatizado por grande parte dos moradores dos seus arredores. Dentro da escola de arquitetura tive acesso ao conhecimento que me permitiu entender aspectos sociais, urbanos, históricos e ambientais que levaram a ocupação do espaço como é hoje. A proposta do projeto foi construída com base na aplicação desses conhecimentos no que se reconhece pessoalmente como um ideal de ocupação, na qual o olhar se direciona para além
da produção habitacional como forma de integrar os moradores da Olga Benário, enxergando a necessidade de se criar espaços públicos de qualidade que permitam o compartilhamento de vivências que contribuam para a noção de pertencimento, e fortaleçam as relações da comunidade no geral, tendo como norteadora a premissa de que enfrentar os problemas ambientais é essencial para uma produção de cidade mais justa e sustentável.
2. Breve panorama sobre os assentamentos precários na Subprefeitura do Campo Limpo Figura 1 - Distrito do Campo Limpo . Fonte: Google Earth/ Elaboração da autora
13
2.1. Desenvolvimento e expansão urbana
O processo de ocupação da região do distrito do Campo Limpo teve início no fim da primeira metade do século XX, mais precisamente após a
publicação do Decreto N. 6.983 de 1935, que extinguiu o município de Santo Amaro, anexando-o a capital paulista. Este, que previa um crescimento do setor turístico na região, precedeu a ampliação da infraestrutu-
Figura 2 - Evolução da mancha urbana de São Paulo . Fonte: Csaba Deak, USP.
ra viária e posterior ocupação da região por grandes indústrias, fatores que impulsionaram a ocupação da região do antigo município pela classe
Evolução da mancha urbana da região metropolitana de São
operária. Neste momento em que se intensifica o espraiamento da me-
Paulo. É possível notar a partir da década de 5o o espraia-
trópole, as terras do Capão Redondo são abertas para loteamento e se
mento da cidade e a escalada da ocupação na zona sul.
tornam destino das classes mais baixas. Com um estado incapaz de atender à demanda habitacional existente, o distrito foi se urbanizando por meio de loteamentos irregulares, pela autoconstrução e informalidade.
2.2 Déficit habitacional e ocupação dos últimos espaços “O distrito de Capão Redondo, após a década de 50, abre suas terras
Fugindo à lógica dos investimentos públicos, o espraiamento urbano e
ao processo de loteamentos, pois lá ainda se concentravam as cháca-
sua consolidação por meio da produção de habitação por contra própria
ras que foram incorporadas ao crescente mercado. Nele, reproduzir-
foi a resposta imediata encontrada frente à crise habitacional enfrentada
se-á o modelo de autoconstrução, principalmente destinado às clas-
no país.
ses trabalhadoras, sendo que os bairros crescem em número.” (CARRIL,2006, p.120)
14
“Autoconstruir em loteamentos precários e distantes, sem infraestrutura e transporte, não seria alternativa massiva se houvesse outra opção. Não havia e, assim, proliferou o auto empreendimento da casa própria. Com sacrifícios épicos, o trabalhador se tornou proprietário e a cidade se estendeu sem fim, reproduzindo loteamentos des-
contínuos e desarticulados da malha urbana. Viabilizou-se uma solução barata de moradia mas as consequências para a cidade foram definitivas.” (BONDUKI, 1998, p.276)
Dentro dessa lógica de ocupação, na qual a infraestrutura urbana passa a ser a consequência e não a causa da urbanização, não é surpresa que as questões ambientais sejam ainda mais negligenciadas em uma cidade já habituada a virar as costas aos seus mais de 300 cursos d'água. Com o crescimento econômico e o preço da terra cada vez mais alto, as camadas mais pobres da população passam a ocupar com maior intensidade áreas de preservação, encostas e margens dos rios e córregos através
Figura 3– Mapa dos assentamentos precários no distrito do Campo limpo.
Fonte dos dados: Habisp/ Elaboração da autora.
dos loteamentos irregulares e assentamentos precários. Entre as décadas de 60 e 80 a subprefeitura do Campo Limpo viu sua população cres-
De acordo com dados do Sistema de Informações para Habitação Social –
cer 750%, indo de 34,8 para 261,3 mil habitantes.
Habisp, em 2017 havia 1709 favelas em São Paulo. Mais de 80% estão nas periferias- 183 na subprefeitura do Campo Limpo, e 90 no distrito do Capão Redondo. 15
2.3 Os avanços da legislação urbanística no reconhecimento dos assentamentos precários
Dentro desse perfil de ocupação, a chegada da infraestrutura acontece não pelo viés do planejamento, mas pela necessidade de contenção de danos ou atendimento de demandas já existentes. As ações do estado vieram atuar de maneira a prover infraestrutura e regulamentar o uso e ocupação do espaço resultante. A primeira medida aplicada no distrito do Capão Redondo sob a política habitacional adotada a partir da década de 70 ocorreu em 1987, quando grande parte do terreno do Instituto Adventista foi desapropriado para a
produção de habitação, momento em que surgiu a COHAB Adventista¹. UNASP
Durante esse período, os avanços na criação dos instrumentos que respaldam as políticas públicas habitacionais impulsionados pelos movimentos sociais resultaram no Plano Diretor Estratégico de 2002, que reconheceu grandes porções do território como Zonas Especiais de Interesse Social. Figura 4– Mapa das ZEIS no distrito do Campo limpo. Fonte dos dados: Geosampa/ Elaboração da autora.
Desde então, mais 6 empreendimentos SEHAB foram entregues, com um total de 1417 unidades, e 7 outros empreendimentos COHAB. Cabe aqui introduzir que a comunidade escolhida para o desenvolvimento do traba-
16
¹ Os primeiros sinais de ocupação significativa na região do Capão Redondo datam 1915, ano em que foi criado o seminário adventista numa área de 145 hectares. Na ocasião, o lo-
lho não consta nos mapeamentos públicos ou pesquisas do IBGE, uma vez
cal relativamente próximo ao centro de Santo Amaro foi escolhido pelo seu isolamento e
que no ano em que foram realizados os últimos levantamentos (2010) a
imersão na natureza. Atualmente o local é ocupado pelo Centro Universitário Adventista
ocupação não estava ativa.
de São Paulo -UNASP.
Os programas de urbanização No entanto, em rápida análise desses empreendimentos implantados da região é possível identificar muitas vezes a falta de conexão com o espaço público, tratamento pouco qualificado das áreas verdes e ausência de equipamentos de lazer. É o caso da COHAB Adventista, que ocupa uma área de mais de 800 mil m². Sua implantação à margem da estrada de Itapecerica e em um terreno com trechos de alta declividade gerou diversos recordes nos quais as áreas verdes livres se tornaram apenas espaços residuais subutilizados.
Figura 9– Mapa dos conjuntos de habitação social produzidos no distrito do Campo limpo. Fonte dos dados: Habisp/ Elaboração da autora.
Figuras 5, 6, 7 e 8– Entorno da COHAB Adventista. Fonte: Google Earth.
17
2.4 A permanência de ocupações irregulares em áreas frágeis De acordo com dados do Sistema de Informações para Habitação Social – Habisp, em 2017 havia 1709 favelas em São Paulo. Mais de 80% estão nas periferias- 183 na subprefeitura do Campo Limpo, e 90 no distrito do Capão Redondo. Estima-se um total de 22.910 domicílios em favelas somente neste último. Além disso, existem aproximadamente 50 áreas de loteamentos irregular mapeadas. A ineficiência em atender tamanha demanda favorece a consolidação da informalidade, o que dificulta cada vez mais a viabilização de programas de requalificação, necessários em praticamente todo o território, salvo suas proporções.
2.4.1 O território consolidado do Capão Redondo Com uma área de 13,6 Km² e população de 268.729 habitantes, o distrito possui uma densidade habitacional de 197,59 hab/ha – o 4º mais populoso e 6º mais denso de São Paulo. Sob administração da subprefeitura do Campo Limpo, assim como os distritos Campo Limpo e Vila Andrade, está situado entre as subprefeituras de M’Boi Mirim, ao sul, e faz divisa com os municípios de Embu a oeste e de Itapecerica da Serra, a sudoeste.
Figura 10– Gráfico do Crescimento demográfico no distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Censo2010, IBGE/ Elaboração da autora.
18
Figura 11– Mapa de Densidade demográfica do distrito do Capão Redondo. Figura 12– Mapa de Vulnerabilidade Social do distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Geosampa/ Elaboração da autora.
Empregos
Característica diretamente ligada ao seu processo de formação, a região apresenta um elevado índice de vulnerabilidade social em várias áreas do distrito. Essa vulnerabilidade pode ser melhor compreendida ao analisarmos as informações a respeito da
Indústria de Transformaç ão 1.305
escolaridade, renda e emprego do distrito, tanto isoladamente quanto em relação
Construção Civil 1.322
Comércio 6.706
aos índices do município, pois ilustram também a situação de exclusão social a qual a população periférica de maneira geral está submetida.
50%
Escolaridade
47%
Capão Redondo
38%
40%
Município de São Paulo 26% 27%
30% 20% 18%
20%
Pirâmide etária
16%
10%
6%
1% 1%
0% Sem instrução e fundamental incompleto
Médio incompleto
Superior incompleto
Superior completo
Não determinado
Renda por domicílios 50%
42%
40%
Capão Redondo São Paulo
34%
30%
24% 16%
20%
8% 6%
10%
1% 1% 0%
Serviços 8.808
16%
20%
80 ou mais 75 a 79 70 a 74 65 a 69 60 a 64 55 a 59 50 a 54 45 a 49 40 a 44 35 a 39 30 a 34 25 a 29 20 a 24 15 a 19 10 a 14 5a9 0a 4 15000
11% 3%
6% 6% 6% 0%
10000
5000
0
5000
10000
15000
Figura 13– Gráfico dos índices de escolaridade. Figura 14– Gráfico dos índices de renda. Figura 15– Gráfico do numero de empregos por área. Figura 16-Pirâmide etária Fonte dos dados: Censo2010, IBGE/ Elaboração da autora.
19
É notável que, até 2010, 47% da população não havia concluído o Ensino
Quanto as áreas verdes , possui dois parques públicos, sendo eles o Parque
médio e apenas 6% possuía nível superior. Paralelamente, 36% dos domi-
Santos Dias, com uma área de 134.000 m² e o Parque Linear Feitiço da Vi-
cílios possuía renda inferior a dois salários mínimos, a renda média per ca-
la, às margens córrego Capão Redondo com 38.124,96 m². Somadas, essas
pita era de R$ 541, menos da metade da média municipal, R$ 1126. Quan-
áreas representam menos de 1,5% do território.
to à oferta de emprego, 49% está ligada à prestação de serviços, o que mostra o distrito com uma economia 86% ligada ao terceiro setor.
O distrito está inserido na bacia do rio Pinheiros e é banhado pelas micro-
bacias do Córrego do Pirajussara e Córrego Morro do “S”. Além destes, os principais córregos da região são Moenda Velha, Capão Redondo e o EnMeio Físico
genho, vizinho à área de intervenção.
O distrito está inserido entre as Macrozonas de Estruturação e Qualificação Urbana e de Proteção e Recuperação Ambiental, e entre as Macroáreas de Redução de Vulnerabilidade Urbana e Recuperação Ambiental,
devido sua proximidade à APRM do Guarapiranga.
Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana Macrozona de
No entanto, atualmente possui escassas áreas não edificadas em todo seu território, apontado com uma taxa de 100% de urbanização. Figura 17– Mapa das Macrozonas de São Paulo. Fonte dos dados: Geosampa/ Elaboração da autora.
20
Figura 18– Mapa das bacias hidrográficas e dos parques públicos do distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Geosampa/ Elaboração da autora.
De acordo com os dados da Secretaria Municipal de Finanças, 60% do solo
conectada às linhas 1-Azul e 2-Verde. Além deste, a região possui um ter-
tem uso residencial, com o predomínio Horizontal Baixo Padrão (41%). Em
minal intermunicipal com linhas que conectam principalmente aos municí-
destaque também o uso de comércio e serviços, que corresponde a 17% da
pios de Embu e Itapecerica da Serra, e um terminal urbano, Capelinha, res-
área total.
ponsável pela conexão centro-sul.
Uso do Solo Outros usos (Uso e padrão não previsto) 1%
Coletivo (Cinema, Teatro, Clube, Etc.) 6%
Comércio e Serviço 16%
A principal via do distrito é a estrada de Itapecerica, que vem do município homônimo e liga a região à Avenida João Dias e à Marginal Pinheiros. Uma
Terren os Vagos* 13%
das principais medidas de melhoria na região foi a abertura da Avenida Carlos Cardeira Filho, que possibilitou uma segunda alternativa de coneResidencial 60%
Escola 2%
Especial (Hospital, Cartório, Etc.) 1% Armazéns e Depósitos 1%
xão. Outro grande fluxo se concentra na Avenida Carlos Lacerda, que se conecta à Estrada do Campo Limpo e zona oeste da cidade.
Industrial 2%
Figura 19– Grafico do uso do solo no distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Secretaria Municipal de Finanças/ Elaboração da autora.
Por ter enfrentado um crescimento desordenado, o distrito possui poucas vias devidamente estruturadas para garantir o acesso da população ao transporte e locomoção. As vias principais que recebem o fluxo e possibili-
tam o acesso ao transporte público coletivo de maior porte como corredores de ônibus e metrô se mostram muitas vezes insuficientes para o escoamento adequado. O principal agente da infraestrutura de mobilidade local é o metrô da linha 5-Lilás, que conecta o Capão Redondo ao polo de Santo Amaro e a malha ferroviária. Inaugurada em setembro/2018, sua expansão está em pleno funcionamento até a estação Chácara Klablin, e finalmente Figura 20– Mapa da rede de transporte público do distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Geosampa/ Elaboração da autora.
21
3. A Ocupação Olga Benário
Figura 21– Ocupação Olga Benário. Fonte : acervo da autora.
23
3.1. Histórico
Em outubro de 2009, tanto o terreno ocupado quanto o terreno a frente,
A comunidade Olga Benário teve início em 2007, quando coordenadores
que está sem uso, já estavam declarado por meio de decretos-lei como de
do Movimento Frente de Luta por Moradia decidiram ocupar o terreno
interesse social.
pertencente à Viação Campo Limpo (atualmente Viação Campo Belo) lo-
Uma vez que não ocorriam avanços na concretização do projeto, em abril
calizada na Rua Ana Aslan, Parque do Engenho, que estava abandonado
de 2014 o movimento resolveu voltar a ocupar o terreno e nele permane-
há mais de 20 anos. A empresa, que esteve envolvida em diversos escân-
cem. Atualmente há aproximadamente 700 famílias morando no local.
dalos devido à sonegação de impostos, acumulava uma dívida de mais de R$ 7 milhões no terreno. Na época da Ocupação, a região de mais de 45.000m² era evitada pela população local por sua falta de segurança e práticas ilegais (o local já foi apontado como área de tráfico de drogas, prostituição, cativeiro, desova de cadáver, descarte de entulho, entre outros). Líderes do movimento atraíram a população dos bairros vizinhos e em pouco mais de um ano já havia cerca de 1.000 famílias instaladas. Neste mesmo período, a viação Campo Limpo entrou com o pedido de reintegração de posse que tramitou até agosto 2009, e após diversas tentativas de negociação, resultou no primeiro despejo. Amplamente divulgado pela mídia, esse episódio foi marcado pela truculência policial e pelo descumprimento dos acordos entre a população e o estado, que àquela altura já haviam decidido por uma reintegração pacífica. Após a ação, a secretaria da habitação realizou o cadastramento das famílias que permaneceram na rua e um total de 570 passou a receber o bolsa-aluguel.
Área de estudo
Área ocupada Figura 22– Área de estudo . Fonte: Elaboração da autora.
24
2002
2008
2012
2014
2010
2016
Figura 23-Evolução da ocupação. Fonte dos dados: Google Earth/ Elaboração da autora.
25
3.2. Situação atual da ocupação No segundo semestre de 2016, em uma ação conjunta de movimentos de moradia, parte do terreno vizinho foi ocupada, como forma de pressionar os órgãos públicos. A ação foi organizada para que a ocupação não invadisse as áreas de preservação ambiental, pois a degradação já está bastante avançada. Em junho de 2017 ocorreu a reintegração de posse deste segundo terreno por solicitação da CDHU. Devido à natureza da ocupação, os moradores evitam realizar investimentos nas moradias, pois uma nova desapropriação pode ocorrer a qualquer momento. As casas possuem acesso a rede de água e energia elétrica por meio de ligações clandestinas. Por estarem muito próximos
ao córrego, são recorrentes episódios de alagamento em períodos de chuva. Ainda, as divergências de organização dentro da ocupação, e a descrença de parte dos moradores na concretização de projetos para a área enfraqueceu o movimento. Em contato com uma das coordenadoras, a informação recebida é de que não conseguem precisar exatamente quantas famílias fazem parte atualmente, pois muitas deixaram de participar das reuniões, e abandonam ou ocupam os barracos sem notificálos. A crescente presença do tráfico e do crime organizado soma-se aos fatores que dificultam o levantamento de informações mais aprofundadas sobre a ocupação. Figura 24– A ocupação em 2018. Fonte dos dados: Google Earth/ Elaboração da autora.
26
Figura 25– A ocupação em 2018. Fonte dos dados: Google Earth/ Acervo e elaboração da autora.
27
3.3. Perfil socioeconômico Como citado anteriormente, os dados específicos da ocupação não estão incluídos nos levantamentos oficiais do IBGE, desta maneira, as informações apresentadas a seguir foram reunidas pela ONG TETO Brasil nas atividades de mapeamento da comunidade. Foram visitadas 413 casas e reunidos os dados de 1195 moradores.
Moradores Indígena 2%
Etnia
Alfabetização
R$ 1.126
Sabem ler e escrever R$ 390 86%
Mulheres 602 Branca
Homens 586
Renda Média
Não declarado 2%
21%
Preta/parda 75%
Naturalidade
Faixa etária 0 a 9 anos
94 108
10 a 19 anos 20 a 29 anos
303
Outros estados 21%
Capão Redondo
São Paulo
Inclusão digital
Fonte de renda
São Paulo 50%
Acesso à internet 92% Possui 58%
205
30 a 39 anos 40 a 49 anos
Olga Benário
R$ 541
215 267
Bahia 29%
50 anos ou mais Figura 26– Gráficos da situação socioeconômica dos moradores. Fonte dos dados: TETO Brasil/ Elaboração da autora.
28
3.4 Condições atuais do território Após levantamento diagnóstico e passar a entender grande parte dos as-
Para melhor compreensão e domínio do terreno e sus fragilidades, foi pro-
pectos que envolvem o local de estudo, minha pesquisa se baseou em bus-
duzida uma maquete topográfica considerando as curvas mestras de seu
car entender as necessidades e demanda específicas da comunidade. A
perfil natural.
região está definida como ZEIS 2, que são as Zonas Especiais de Interesse Social caracterizadas por serem não edificadas ou subutilizadas e que são adequados à urbanização. Ainda, seu entorno imediato está mais de 50% classificado com ZEIS 1, que por definição são “áreas caracterizadas pela presença de favelas, loteamentos irregulares e empreendimentos habitacionais de interesse social, habitados predominantemente por população de baixa renda, onde haja interesse público em manter a população moradora e promover a regularização fundiária e urbanística, recuperação ambiental e produção de Habitação de Interesse Social. ” (Geosampa) O sítio possui características bastante especificas que condicionaram significativamente as propostas de projeto. A primeira delas foi o córrego e as nascentes. O córrego do engenho é um curso d’água natural de ordem 2 que pertence a microbacia do Córrego Pirajussara. Em diversos pontos do
terreno existe linhas de talvegue paralelas de nível 1. Outra característica é a declividade acentuada do terreno em diversos pontos. O lado ocupado possui uma topografia menos acidentada, já a segunda área possui um desnível superior a 35 metros. Além disso, parte deste é bioma remanescente da Mata Atlântica, e sua preservação é foi uma das premissas assumidas no meu partido. 29 Figura 27– Mapa das condicionantes do terreno. Fonte dos dados: Geosampa/Elaboração da autora.
3.5. Problemas e Potencialidades A etapa seguinte foi a de levantamento de problemas e potencialidades das diferentes áreas do território. Em um primeiro momento, o método ajudou a levantar uma série de possibilidades e questões a serem enfrentadas, e após isso, a quantificar o número de demandas e abordagens possíveis, para que posteriormente fosse ser realizado o recorte de prioridades a serem trabalhadas e que mais se adequam à proposta de trabalho. Esse levantamento resultou num punhado de apontamentos que serviram de norte para o desenvolvimento da proposta apresentada.
Figura 28– Maquete de estudo. Fonte: acervo da autora. Figura 29– Mapa hipsométrico do distrito do Capão Redondo. Fonte dos dados: Emplasa/ elaboração da autora Figura 30– Principal via de acesso da ocupação. Fonte: Acervo da autora. Figura 31– Levantamento de problemas e potencialidades locais. Fonte: elaboração da autora
30
31
3.6. Buscando o desenvolvimento Na ausência do poder público, os avanços da comunidade se dão por meio
Num primeiro momento, tive muitas ressalvas sobre a maneira que o pro-
de ações sociais. Apesar de conflitos de lideranças e entre os próprios mo-
jeto era desenvolvido. Duas horas de um domingo me pareciam pouco pa-
radores, o movimento FLM realiza reuniões mensais para posicionar os in-
ra engajar qualquer transformação efetiva em crianças que vivem em situ-
tegrantes sobre andamento de processos, discutir a respeito da ocupação
ações de extrema vulnerabilidade social. Mas, após 9 meses participando,
e auxiliar os moradores. Pessoalmente, tive contato com duas ONGs que
tive a oportunidade de acompanhar a melhora nos relacionamentos famili-
atuaram ativamente no local este ano: TETO Brasil e Base Colaborativa
ares de muitas delas, no desempenho escolar, e no próprio comportamen-
com o projeto Rizoma.
to. E muito disso está associado ao processo de reapropriação da
“Há 10 anos no Brasil, o TETO é uma organização internacional presente
“escolinha”.
na América Latina e Caribe, que trabalha pela defesa dos direitos de pessoas que vivem nas favelas mais precárias e invisíveis, diminuindo sua vulnerabilidade por meio do engajamento comunitário e da mobilização de jovens voluntários. [...] o TETO busca construir moradias mais dignas, promover a educação de crianças por meio de oficinas de leitura, formar lideranças comunitárias e envolver toda comunidade em projetos de melhoria para seus bairros. ” (TETO Brasil) “O Rizoma é um projeto para crianças e adolescentes com foco no desen-
volvimento de competências socioemocionais (empatia, autonomia, resolução de problemas, criatividade e resiliência) habilidades essenciais nos relacionamentos interpessoais. É possível aprender essas habilidades, praticá-las e ensiná-las. ” (Base Sociedade Colaborativa) Ao longo do ano acompanhei as atividades do Rizoma e pude estar em contato com a comunidade, o que enriqueceu muito o avanço do trabalho. 32
Figura 32– Praça da ocupação. Fonte: acervo da autora.
Figura 33– Processo de reforma da escolinha. Fonte : acervo da autora.
Dentro da comunidade, há uma edificação construída nos mesmos mol-
ção da escolinha, que agora conta com uma biblioteca e estrutura mínima
des das casas, mas que foi pensada para ser usada para atividades contra-
para que espaço possa ser usado para aulas de alfabetização e reforço es-
turno por um projeto anterior da Base, o Oasis. No entanto, durante a ulti-
colar ao longo da semana (próxima meta do projeto).
ma ação de Reintegração de Posse (realizada somente no segundo terre-
De fato, o Rizoma por si não tem estrutura suficiente para prover muito do
no) o local foi ocupado por famílias e assim permaneceu por alguns me-
que se faz necessário num local que carece desde saneamento básico, mas
ses, até a relocação dentro da própria comunidade. Neste meio tempo, as
acompanhá-lo me possibitou ver a aplicação prática, mesmo que numa
atividades com as crianças foram realizadas na rua. Quando espaço foi
pequena escala, das teorias que aprendi no percurso acadêmico, desde a
retomado, sua composição e a relação dos moradores da comunidade
importância do processo participativo e de envolver as comunidades na
com o local estava mudado, e foi neste período que comecei a acompa-
construção diária dos espaços, ao papel social da arquitetura na essência
nhar o trabalho. Ao longo do ano foram realizadas pequenas e sequentes
de sua ciência. E foi através desta experiência que pude solidificar minhas
reformas, sempre envolvendo as crianças e os pais, para incentivar o senti-
intenções de projeto a serem apresentadas no próximo capítulo.
mento de pertencimento. Em outubro de 2018 realizamos a reinaugura-
33
4. Proposição
Figura 34– Estudos iniciais. Fonte: acervo da autora.
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4.1.Premissas de Intervenção Pensar em viabilizar um projeto para um local com tantos problemas foi um desafio que optei por enfrentar com a intenção de discutir temas que costumam ser antagônicos dentro do planejamento urbano: a preservação ambiental e a ocupação do solo urbano. Como tratar as necessidades da sociedade pelo direito fundamental à moradia e as de proteção das áreas de preservação, dentro de um território consolidado que possui demandas urgentes em ambas as frentes? Como pensar a ocupação do espaço de maneira a combinar e estabelecer uma relação de equilíbrio entre esses aspectos, buscando maximizar os benefícios para a população local e a cidade? Foi a partir destes questionamentos que defini as quatro premissas fundamentais da intervenção:
O tratamento dos cursos d’água: além do córrego degradado, existem diversas nascentes ao longo do terreno ocupado. Atualmente, a maioria delas está assoreada/soterrada pelo processo de ocupação. O curso principal recebe esgoto não tratado de boa parte das casas. Como parte do planejamento de infraestrutura de saneamento básico, promover a recuperação desses cursos d’água seria essencial para mudar a relação estigmatizada que se identifica na cidade de dar as costas para as águas urbanas, vendo-as como um percalço no avanço do desenvolvimento e constante fonte de proliferação de doenças e tragédias. 36
Figuras 35,36, 37 e 38 – A ocupação em 2018. Fonte: acervo da autora.
A manutenção do verde: Como dito anteriormente, as áreas verdes remanescentes compõem um dos poucos respiros existentes num distrito extremamente adensado. Segundo Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, na subprefeitura do Campo Limpo o índice de áreas verdes por habitante em dezembro/2011 era de 0,90 m²/hab. A recomendação mínima é de 15 m²/hab, segundo a Sociedade Brasileira de Arborização
Urbana. Preservar esse recurso natural está diretamente associado tanto a preservação das águas a longo prazo, quanto a manutenção da qualidade de vida na região. Pensar em usos que estimulem a preservação e valorização dessa área pela comunidade foi a premissa para a intenção de criar um parque com um programa que se desenvolva em torno de grandes maciços, minimizando a intervenção nesses biomas após recuperação de partes já desmatadas, e desestimulando o reassentamento nesses trechos.
O tratamento dos espaços públicos e de uso coletivo: Assim como as áreas verdes, o índice de áreas de lazer em parques não ultrapassa 1m²/
hab. A oferta de equipamentos públicos é escassa, e dessa maneira o lazer acontece de maneira improvisada nos mais diversos espaços. O beco, a viela, o escadão, a calçada e a rua. O sistema viário é muitas vezes o único espaço público existente em bairros inteiros, e é deles que as comunidades legitimamente se apropriam para se reunir, fazer festas, churrascos, brincadeiras e praticar esportes. 37
Ainda que de maneira consequente à um cenário desfavorável, nas periferias e principalmente dentro das favelas a conexão com os espaços coletivos tem uma intensidade muito positiva. Essa foi a principal característica que busquei reforçar no tratamento dos espaços públicos. Criar um passeio que conectasse os bairros e o miolo das quadras, estimulando seu uso pelos moradores das edificações projetadas e também pelas comunidades vizinhas foi a base dessa premissa.
4.2. O Projeto Tendo em vista a dualidade presente no projeto, a definição das premissas e o tempo disponível para realização do trabalho, o foco foi direcionado à provisão habitacional, considerando o histórico de remoções e reocupações da área de maneira precária, o que aumenta o nível de degradação do meio ambiente, além da necessidade básica de acesso à moradia digna por parte das famílias assentadas. Como mencionado anteriormente, em um último levantamento havia aproximadamente 700 famílias vivendo na ocupação. Essa foi a faixa considerada durante a elaboração do projeto, uma vez
que pautada pelas premissas apresentadas, optei por não edificar grande parte do terreno, mantendo-o como parque de preservação. Dada a condição das moradias, a necessidade de infraestrutura, e de recuperação dos cursos d’água, a decisão tomada foi a de remoção completa da ocupação para a execução do projeto. A partir disso o terreno foi reloteado.
Figura 39– Área de remoção. Fonte: Google Earth/ Elaboração da autora.
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O sistema de circulação foi definido a partir dos levantamentos sobre os principais fluxos existentes. As vias a serem abertas foram pensadas para conectar o bairro ao sistema existente, aumentando a permeabilidade.
O principal elemento dos espaços livres é um passeio ao longo do córrego, que atua como elemento conector entre o parque, as habitações e os bairros vizinhos. 39
Áreas do parque/preservação
Área de uso institucional
Passeio público
Quadras de uso misto: habitação, comércio e serviço
Quadra de uso residencial
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A implantação foi pensada a partir das
características
naturais
do
terreno. O córrego teve seu curso corrigido próximo ao perfil natural e o canal ampliado para melhorar a vazão, uma vez que são recorrentes os episódios de enchentes. Os olhos d’agua
antes
assoreados,
foram
recuperados e seus cursos liberados. Buscando um melhor aproveitamento
do terreno, os equipamentos de lazer foram alocados nos miolos das quadras, com acesso livre pelo passeio do córrego, e os edifícios implantados em lâminas ao longo das vias. No lado de maior declive, os edifícios foram escalonados e posicionados de maneira a permitir a livre circulação entre as quadras.
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4.2.1 Habitação
Unidade tipo –2 dormitórios Área: 48m²
Unidade tipo –3 dormitórios Área: 70m²
5m
1m
As unidades foram resolvidas com estrutura modular, o que permite maior O tipo escolhido para as edificações foi o de lâminas de 5 pavimentos, com adaptação de acordo com o terreno. Além do corredor externo, todas as uso comercial em todo o andar térreo dos edifícios voltados para a rua casas contam com varanda externa, que melhora as condições de insolação principal. e ventilação dos edifícios. Para atender a demanda existente, foram implantadas 768 unidades, sendo:
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576 unidades de 2 dormitórios
192 unidades de 3 dormitórios
54 unidades tipo comercial
Planta tipo do pavimento residencial—unidades de dormitórios 10m 1m
Planta tipo do pavimento residencial—unidades de 32dormitórios
O restante dos desenhos encontra-se no anexo ao final do caderno.
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5. Considerações Finais Lidar diretamente com o desenho urbano é sempre um desafio. Principalmente por se tratar de uma metrópole com as dimensões e características que São Paulo tem. Optar por realizar um trabalho desta dimensão me causou receio por não me sentir completamente preparada para lidar com todas as problemáticas que o envolvem, mas consigo enxergar que o mais importante ao longo deste ano foi o processo. Nos últimos meses aprimorei meus métodos de pesquisa, aprendi a utilizar novas ferramentas de trabalho, a respeitar meus próprios prazos e absorvi muito entre leituras, conversas e orientações. Por mais que a insegurança esteja quase sempre presente, me sinto satisfeita com o trabalho que desenvolvi. Principalmente por ter aceitado me desafiar nessa reta final e abraçar questões tão sensíveis à nossa sociedade e ao país que vivemos. No meio do processo encontrei o Rizoma e muitas respostas vieram juntas, pois muitas vezes é difícil não pensar que querer trabalhar com urbanismo é passar a vida correndo atrás do prejuízo, pois como individuo não somos capazes de mudar muita coisa. Mas todos os encontros me mostraram o contrário. Estar ali, atuando diretamente em uma realidade que eu gostaria de mudar, fez eu me dar conta de problemas que eu dificilmente pensaria a respeito pois não são a minha realidade, ou de aspectos que pensava serem grandes problemas, mas que na verdade não tem tanta importância assim. Aprendi que é um dever de todos que buscam construir uma sociedade mais justa fazer o possível para usar suas habilidades e competências para tal. Desde o inicio meu objetivo era chegar ao final deste trabalho com uma proposta de possibilidades válidas para a comunidade, que fossem mais gentis com a cidade e que oferecessem maior qualidade de vida para as pessoas, alternativas ao modelo usual de produção de habitação social no Brasil e a maneira que nos relacionamos com o meio ambiente. Ainda que esta seja apenas uma proposta inicial diante da complexidade do território e das questões que o envolvem, enxergo-a como uma conversa importante sobre a cidade informal e o papel da arquitetura no processo de inclusão dos cidadãos que a ela habitam. Por fim, um trecho que me ajudou a traduzir internamente as questões que me levaram a escolha do meu tema de trabalho e a uma reflexão sobre a qual pretendo seguir me debruçando neste novo ciclo que se inicia: 44
“[...] Os problemas ambientais urbanos nas cidades brasileiras não são novos, entretanto, o que está mudando é a consciência social de que muitos deles poderiam ser evitados e a importância que a solução desses problemas assume para a sociedade. Em um território urbanizado, onde prevalecem a escassez de terra adequada e acessível para o assentamento das populações de baixa renda e a precariedade nas periferias em um quadro de exclusão e pobreza, dificilmente poderão ser equacionados os problemas ambientais, sem uma política habitacional. Construir "cidade" é tarefa social complexa, que requer investimentos públicos e privados,
projetos e programas de intervenção e justiça na distribuição dos benefícios urbanos. Não basta abrir ruas e parcelar glebas em lotes, assim como para introduzir qualidade ambiental na cidade informal não basta regularizar loteamentos ou urbanizar as favelas. Entretanto, a grande dificuldade nos processos de integração da cidade informal na cidade propriamente dita está no fato de a regularização fundiária e urbanística não ser suficiente para a integração social e econômica destas áreas. Os programas devem promover a possibilidade de combinação de ações econômicas, sociais, urbanísticas e ambientais e, principalmente, deslocar a ótica da atuação pública: de um loteamento ou favela, para a reconstrução de bairros precários; do proprietário do lote, para a comunidade beneficiada. Enfim, atender aos interesses dos moradores e à necessidade dos bairros, condicionados pelos interesses difusos da população e da cidade.”
Marta Grostein -Metrópole e expansão urbana: a persistência de processos "insustentáveis", 2001.
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5. Referências BONDUKI, Nabil Georges. Origens da habitação social no Brasil. São Paulo: Estação Liberdade, 1998.
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1m
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