EDIFICIO CEU EM DESCONSTRUCAO
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KELLY RODRIGUES
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U R B A N A
T R A M A S
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“Dizem que antes de um rio entrar no mar, ele treme de medo. Olha para trás, para toda a jornada que percorreu, para os cumes, as montanhas, para o longo caminho sinuoso que trilhou através de florestas e povoados, e vê à sua frente um oceano tão vasto, que entrar nele nada mais é do que desaparecer para sempre. Mas não há outra maneira. O rio não pode voltar. Ninguém pode voltar. Voltar é impossível na existência. O rio precisa de se arriscar e entrar no oceano. E somente quando entrar no oceano é que o medo desaparece, porque apenas então saberá que não se trata de desaparecer no oceano, mas tornar-se oceano.” (Osho)
CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC KELLY RENATA RODRIGUES
TRAMAS URBANAS Edifício CEU em desconstrução
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro Universitário SENAC como requisito à obtenção do grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo. Orientador: Prof. Dr. Nelson José Urssi
RODRIGUES, Kelly Renata. Tramas Urbanas: Edifício CEU em desconstrução. São Paulo, 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacherelado em Arquitetura e Urbanismo) Centro Universitário SENAC, 2018. Orientador: Prof. Dr. Nelson José Urssi 1. Âncoras Culturais 2. Requalificação Urbana 3. Urbanismo Social 4.Equipamentos Públicos 4. Efeito Bilbao
RESUMO
O presente trabalho tem como finalidade compreender como a arquitetura mani-
festada através de traços, formas e espaços pode atuar como elemento transformador do ambiente urbano. Para tanto, utilizará dos edifícios âncoras de cunho cultural e social como base analítica para discutir os reais impactos do projeto arquitetônico, associado também ao planejamento urbano, na vida das pessoas e da cidade. A partir das questões levantadas, o produto final da pesquisa surge na forma de um projeto que abrange a escala urbana e arquitetônica, fundamentado no conceito dos Centros Educacionais Unificados (CEU’s) e alinhado com as estratégias de requalificação do Urbanismo Social. Palavras-Chave: Âncoras culturais, Requalificação urbana, Urbanismo social, Equipamentos públicos, Efeito Bilbao
ABSTRACT
This work aims to understand how architecture, expressed through traces, forms
and spaces, can contribute as transforming element of the urban environment. To that end, it will use the urban anchors buildings, mainly the cultural and social ones, as an analytical basis to discuss the real impacts of the architectural design, associated also with urban planning, in the people and the city lifes. Based on the contents raised, the final product of the research arises in the form of an urban and architectural scale project based on the concept of Unified Educational Centers (CEU’s) and aligned with requalification strategies of the Social Urbanism.
Keywords: Cultural anchors, Urban requalification, Social urbanism, Public Equipment, Bilbao effect
SU MÁ RI O
Intro du ção
1.
Arquitetura, cidade e urbanismo 1.1.
Contextos sociais e estratégias urbanas
2. Ân c ora s Cul turai s 2.1.
3.
E q u i p am e nto s Ânco ras So ci ai s
3.1. 3. 2 .
4.
Repercussão Mundial
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13 17
27
Estudos de caso
32
Programa CEU
37
C E U A m e r i canó po l i s , um edi fí c io em d esconstruçã o
4.1. 4.2. 4.3.
01
43
Proposição
45 49
Projeto
51
Levantamento
5.
C on si de raçõ es Fi nai s
84
6.
B i bl i og raf i a I Li s ta Abrevi aturas e Fig ura s
88
INTRODUÇÃO
Tão complexo quanto estudar o ser humano é estudar seus feitos. A cidade
analisada como tal, possui um alto grau de complexidade exatamente pelo fato de ser o cenário principal da vida em sociedade. Arquitetura e urbanismo se mostram presentes também nesse contexto, uma vez que nascem de uma necessidade humana e, com o tempo, se desenvolvem em reflexo à cultura social.
Se analisarmos os projetos de requalificação urbana, pensados até então, per-
ceberemos que a arquitetura foi (e ainda é) um dos principais meios utilizados para alcançar tal fim. Os edifícios que melhor exemplificam esse fato são aqueles de cunho cultural, conhecidos como âncoras culturais, que são projetados com a difícil tarefa de promover melhorias em seu entorno.
Entende-se que tais âncoras geram diversos tipos impactos na malha urbana e
na vida da população, entre eles esta, como um tipo de “efeito colateral”, a gentrificação. Diante desse contexto, a pesquisa abordará as seguintes questões: Esses edifícios âncoras são pensados para quem? Quais são os agentes urbanos que influenciam na sua elaboração? Como eles afetam no cotidiano da cidade e da população real?
Em resposta a esses questionamentos a pesquisa se estruturou em quatro par-
tes onde, primeiramente, conceitua-se os três elementos base deste trabalho (arquitetura, cidade e urbanismo) e os agentes intrínsecos a eles, para através disso realizar um recorte temporal das estratégias e métodos usados pelos arquitetos-urbanistas no diversos planos urbanos. No segundo capítulo nos aprofundamos no contexto da crise urbanística, na segunda metade do século XX e no conceito do Planejamento Estratégico, utilizando dos estudos de caso das âncoras culturais espalhadas pelo mundo para entender a real capacidade de ressonância dessas obras arquitetônicas na malha urbana.
A partir da critica acerca do impacto e da funcionalidade destas obras na ci-
dade, seguindo o ponto de vista da sustentabilidade social, é que se desenvolveu o capítulo seguinte, encontrando no Urbanismo Social de Sérgio Farjarro estratégias de requalificação urbanas pontuais e planejadas para a cidade real, apresentando diversos exemplos de equipamentos âncoras pensados para a população mais carente. Edifícios
esses que serão usados aqui como estudo de caso, onde atentaremos para a questão da permeabilidade urbana e a função social do edifício, que serviram de parâmetros projetuais para a proposição final desse trabalho.
Por fim, a proposição final é feita através de um projeto experimental de reestru-
turação urbana, que usará de uma parcela do bairro Americanópolis, no Distrito Jabaquara, como “corpo de prova” para aplicação de todas as discussões apresentadas. O projeto utilizará como referência projetual o programa Centros Educacionais Unificados (CEU’s), onde iremos explodir o programa multifuncional contido dentro um único edifício e distribuir seus agrupamentos funcionais pelo território, através de pequenos projetos voltados ao uso cultural, multiuso e de esportivo.
Desta maneira, desconstruímos o conceito de unificação dos módulos progra-
máticos, encarados quase como um pacote de soluções aglutinado, e readequamos do programa às estratégias de requalificação urbana do Urbanismo Social.
Apesar de cada um dos projetos aqui elaborados apresentarem cada qual suas
singularidades na busca da adequação à real condição do seu entorno, é de interesse do partido projetual que as partes apresentem evidências de um todo comum através da constância dos mesmos materiais construtivos e da presença marcante de espaços públicos com áreas verdes que permeiam os lotes e sedem à cidade uma parcela de seu terreno.
Utilizando desses parâmetros projetuais o intuito da proposta se mantem criando
assim uma trama urbana que juntamente com os equipamentos já existentes ofereça um ambiente digno para população local, promovendo uma autoestima social e suprindo principalmente a demanda por equipamentos públicos numa região onde há um grande adensamento populacional.
1 .
ARQUITETURA, CIDADE E URBANISMO
A arquitetura, como a arte responsável pela criação de ambientes que abrigam
as diversas atividades humanas, pode impulsionar diversos impactos tanto na esfera urbana quanto na psicológica do indivíduo. Em nossas casas pode oferecer sensações de conforto e privacidade. Na catedral gótica, lembra o homem de sua pequenez diante de Deus. Nas cidades pode provocar a reconstrução de áreas degradadas e esquecidas pelo Estado. É precisamente sob a luz deste último fato que a pesquisa se desenvolveu, buscando compreender os impactos da arquitetura aliada ao urbanismo, na cidade real e vice-versa.
Durante essa busca nos deparamos com um labirinto sinuoso, onde percebeu-
-se que por trás desses três elementos (arquitetura, urbanismo e cidade) e suas relações intrínsecas existem inúmeros agentes urbanos que influenciam e direcionam suas ações, fato que se confirma quando analisamos as estratégias de requalificação urbana pensadas até então. A partir desse contexto sentiu-se a necessidade de antes compreender o conceito e a origem de cada um desses elementos, para assim investigar a interação entre eles ao longo dos anos.
Dentre todos, o conceito de cidade se apresenta como o mais complexo, acredi-
ta-se que seja pelo fato do substantivo “cidade” não qualificar apenas um ambiente material como também imaterial, segundo Lynch (1960, p.01), “Nas cidades a todo instante há mais do que o olho pode ver, mais do que o ouvido pode ouvir [...].”. Entretanto, para fins de análise usaremos a definição mais simples, aquela dada pelo dicionário, onde a cidade é caracterizada como “aglomeração humana, localizada numa área geográfica circunscrita e que tem numerosas casas, próximas entre si, destinadas à moradia e/ou as atividades culturais, mercantis, industriais, financeiras e; a outras [...].” (HOUAISS, 2001).
Esse aglomerado que até a primeira metade do século XVIII se organizava de
maneira orgânica, quase espontaneamente, de acordo com a necessidade da população começou a entrar em disfunção em algumas cidades da Europa, na segunda metade do século, quando se iniciou na Inglaterra um processo de grande transição política, econômica e social, conhecida como Revolução Industrial (BEZERRA, 2017).
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Marcada pelo processo de substituição da força do homem pela da máquina e
do produto artesanal pelo fabril, esse período histórico não foi apenas um dos maiores divisores de águas na vida da civilização como também foi o propulsor de novas problemáticas e, com isso, quase como numa relação de causa e efeito, exigiu a formulação de novas técnicas, estudos e soluções.
O modo de produção baseado no ideal capitalista e o aumento da produtividade
fez com que um grande número de pessoas viesse do campo para trabalhar nas grandes indústrias da cidade, gerando assim o aumento demográfico e territorial. Segundo Choay (1965), nesse período a população londrina praticamente quintuplicou em menos de um século.
Diante dessa expansão desordenada, a cidade industrial chegou a uma situação
caótica. As regiões com maior infraestrutura começaram a ficar saturadas e com isso os operários que chegavam eram obrigados a se estabelecer em áreas afastadas onde as condições de vida eram extremamente precárias. Como resultado desse afastamento, um enorme contingente de trabalhadores começou a ter que percorrer diariamente longas distâncias para chegar às indústrias. Além disso, a falta de infraestrutura urbana (relacionada ao abastecimento de água, coleta de lixo e esgoto) gerou um ambiente insalubre onde as epidemias começaram a se espalhar.
Figura 1- Londres Revolução Industrial
Figura 2- Paris antes de Haussmann
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Diante desse cenário, surge a necessidade de novos profissionais que se de-
diquem a estudar e propor soluções para cidade, com intuito de melhorar a qualidade do ambiente urbano, da saúde e da circulação de pessoas. Nasce nesse momento a ciência que Bardet (1990) denomina como “Arte urbana” e Choay (1965) como “pré-urbanismo.” Sendo assim o princípio do urbanismo, que Agache (1931 apud. Santos, 2006, p.07), conceitua como “Uma ciência, uma arte e, sobretudo uma filosofia social. O urbanismo como um conjunto de regras aplicadas ao melhoramento das edificações, do arruamento, da circulação e do descongestionamento das artérias públicas.”
Consequentemente, a arquitetura como conceituada no início desse capítulo
passa por diversas transformações e os espaços criados por ela também. Esse fato ocorre, segundo Dallastra et al. (2011, p. 671), pois: “A arquitetura, mais do que uma profissão, ou forma de arte é também produto cultural, [...]. À medida que o homem vai evoluindo, a arquitetura acompanha este processo, adaptando-se as necessidades daquele, possibilitando grandes modificações estéticas, formais e funcionais aos edifícios [....]”
Se atentarmos aos conceitos dados a esses três elementos, os quais são a base
analítica deste trabalho, nota-se que, apesar de terem significados e funções diferentes, tanto a cidade como a arquitetura e o urbanismo nasceram a partir de uma necessidade humana. No entanto, esse princípio que os conectava ao longo dos anos foi mudando na medida em que surgiam novas ideologias e com elas novos agentes sociais e urbanos. Mesmo com esse ciclo, a única ideologia que visivelmente vem vencendo o tempo e atravessando os séculos é a capitalista, que fixou suas raízes na cultura da civilização desde a Revolução Industrial. Junto com ela novos agentes urbanos se fixaram na sociedade, como é o caso da elite capitalista (nova classe dominante), do mercado imobiliário e dos trabalhadores que são doutrinados, diante desse contexto, a seguir a lógica do rendimento e lucro máximo.
Diagrama produzido pela autora com base no estudo feito 05
Por fim, diante dos elementos e agentes urbanos apresentados até então, é
possível perceber que através das mudanças provocadas pela Revolução Industrial no campo sócio-político, econômico e espacial, novas ideologias, materiais e técnicas surgem também em resposta ao contexto. Com base nesse fato, será possível perceber a seguir que, na medida em que novos contextos urbanos vão se apresentando na história, novas respostas vão sendo dadas e por vezes provocam rupturas no vínculo entre arquitetura, cidade e urbanismo.
1.1 CONTEXTOS SOCIAIS E ESTRATÉGIAS URBANAS
A partir do momento que entende-se como é constituída e construída a tríade
apresentada, juntamente com seus atores sociais, é possível perceber que toda manifestação no espaço urbano é antes de tudo um reflexo do contexto social da época, segundo Brandão (2002): “A história tem estabelecido relações nítidas entre os espaços urbanos, o tempo e as sociedades nas quais foram construídos. [...], o espaço urbano é também uma obra de arte na qual um momento específico da cultura humana é retratado.”
Em vista a esse fato, a história servirá aqui como fio condutor para o estudo das estratégias de planejamento urbano pensadas até então, utilizando como base os textos da autora Françoise Choay (1965) acerca da trajetória do urbanismo e das cidades. O intuito é realizar recortes esquemáticos que ajudem na montagem de um quadro de estratégias, buscando evidências como suporte para crítica aos problemas atuais do planejamento urbano, atentando sempre para as tentativas, erros e acertos cometidos no decorrer dos anos.
Em seu livro O urbanismo, Choay organiza a trajetória dessa ciência em basica-
mente dois momentos: Pré-Urbanismo (até o século XIX) e Urbanismo (pós-século XIX), que se diferem por conta do tipo de profissionais de cada época e pela escala urbana de seus feitos.
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Dentro desse recorte, é possível destacar quatro importantes contextos sócio-
-espaciais (Revolução Industrial, Movimento Moderno, Período Entre guerras e Globalização) e através destes examinar os planos urbanos mais significativos, usando como ponto principal do estudo as estratégias e meios utilizados para alcançar determinada finalidade.
Na Revolução Industrial, os problemas relacionados à desorganização territorial,
a segregação social, a dificuldade de locomoção dos trabalhadores e a insalubridade, resultaram na elaboração de diversos planos urbanos onde dois se destacaram:
A Reforma de Paris, que foca na insalubridade e na circulação urbana,criada
por Barão Haussmann, que se fundamentou na construção de largas avenidas, novas estações de trem, novos sistemas de abastecimento de água e esgoto e grandes parques públicos. Além de instituir a uniformização da estética da cidade e das construções arquitetônicas através de regras específicas de gabarito de altura e até mesmo de cor de fachadas.
A Cidade-Jardim, por Ebenezer Howard, formulada com base na condição dos
aglomerados humanos e na conexão da cidade com o campo. Para Howard, a estratégia da conexão cidade-campo harmonizaria as oportunidades do meio urbano, com a beleza e os prazeres do rural (ANDRADE, 2003). Além disso, a organização setorial dos aglomerados humanos junto à indústria e ao campo seriam conectados por extensas vias de acesso arborizadas que garantiriam aos operários um ambiente saudável, resultando assim em vantagens para a indústria.
No contexto do Movimento Moderno, após Primeira Guerra Mundial, com o sur-
giram novos debates acerca do problema habitacional e do modo produção industrial, que ”fizeram com que a sociedade reformulasse seus valores e os artistas fossem em busca de novas técnicas e teorias a serem experimentadas na arquitetura e todas as artes.”. (BRASIL, 2009). Esse fato associado à consolidação do modelo funcionalista resultou no nascimento da ciência do urbanismo, que a princípio “[...] deslocou-se das estruturas econômicas e sociais para as estruturas técnicas e estéticas.” (CHOAY, 1965, p.20). 09
Dessa maneira, a Ville Radieuse, de Le Corbusier, se mostrou como um manifes-
to modernista, que aflorou do ideal higienista e de zoneamento. Com o intuito de oferecer meios eficientes de transporte, espaços verdes e luz solar em abundância, e na divisão da cidade em áreas comerciais, de lazer e residenciais, etc., através da rigorosa ordem simétrica que levou ao desenvolvimento de novas tipologias de habitação de alta densidade (MERIN, 2016). A repercussão das ideias e proposta de Corbusier culminou na elaboração da Carta de Atenas em 1933, no IV CIAM (Congresso Internacional de Arquitetura Moderna).
Durante o período Entre guerras, o regime totalitário se firmou em diversos pa-
íses da Europa. Hitler ao assumir a liderança alemã buscou, através da reconstrução da capital Berlim, impor seu ideal nazista de maneira megalomaníaca. Para isso contou com o trabalho do arquiteto Albert Speer, que apresentou o plano urbanístico para a nova capital com base no ideal do City Beautiful, onde as manifestações urbanísticas tinham “[...] total concentração no monumental e no superficial, na arquitetura como símbolo de poder; [...]. Era o planejamento de ostentação, arquitetura como teatro, projeto para causar impacto.” (HALL, 1988, p.236)
No contexto contemporâneo da globalização, o processo de expansão e padro-
nização mundial da economia e da cultura tem gerado um grande aumento na concorrência entre mercados e países. Em consequência dessa realidade surge, com base nos ideais mercadológicos do urbanismo americano, “Uma nova geração de politicas de planejamento urbano, uma terceira geração, normalmente designada por planejamento estratégico.” (MARQUES, 1994, p.145). Segundo Hall (1988, p.408): “[...] no decorrer da década de 70, o movimento urbanístico começou a plantar bananeira e virar do avesso, [...]. Cidades, a nova mensagem soou em alto e bom som, eram máquinas de produzir riqueza; o primeiro e principal objetivo do planejamento devia ser agora o de azeitar a máquina.”
O plano 22@ Barcelona se mostra como um claro exemplo desse cenário tra-
çado. O projeto resultou da parceria entre indústrias, governo e universidades, com o intuito de promover a transformação de uma área industrial, quase abandonada, em um distrito inovador. 10
Para isso, as estratégias urbanas se voltaram para oferta de espaços modernos
criados através da implantação de áreas verdes, de novos modais de mobilidade, de novas habitações subsidiadas, de melhorias dos espaços públicos, da implantação de infraestrutura avançada e da implantação de parques tecnológicos e laboratórios de ponta.
Diante do cenário traçado acima, é possível elaborar um extenso quadro de es-
tratégias/métodos utilizados pelos diversos arquitetos-urbanistas como meios necessários para concretizar suas propostas. Vale antes salientar que na raiz dessas diferentes propostas (que por vezes se assemelham) duas questões se mostram quase que fixas na trajetória do planejamento urbanístico.
A primeira é relacionada aos problemas urbanos que vem se arrastando desde
o boom demográfico da Revolução Industrial, caracterizados pela: distribuição desigual de infraestrutura urbana (generosa no Centro e escassa na Periferia), a habitação insalubre, falta de coleta de lixo, mobilidade urbana, abastecimento de água e esgoto e segregação de espaços públicos e privados. A segunda diz a respeito à essência estratégica de todos os planos urbanísticos, onde se pode afirmar (com base nos fatos levantados) que se encontra na busca do rendimento máximo e da qualidade estética da cidade.
Diagrama produzido pela autora com base no estudo feito. 11
As estratégias ligadas ao rendimento máximo (no que diz a respeito da eficiência
na produção e no desempenho urbano) variam muito pelo fato de que, segundo Harvey (1980), o urbanismo está sempre ligado a divisão do trabalho e a ordem hierárquica das atividades que são, por sua vez, reflexos do modo de produção dominante da época. Já as estratégias voltadas à estética urbana, variam de acordo com o ideal artístico e cultural de uma determinada sociedade, em determinado período.
Ainda utilizando do estudo feito aqui, é importante perceber que no decorrer da
trajetória histórica das cidades a Arquitetura e o Urbanismo, apesar de sempre estarem correlacionadas, se amarram e soltam inúmeras vezes, oscilando juntamente com o contexto social. Se no Pré-urbanismo a arquitetura e o ofício do arquiteto são deixados em segundo plano, na Terceira Geração Urbanística ela volta, de maneira onipotente, a ser protagonista dos planos e reformas urbanas.
Diagrama produzido pela autora com base no estudo feito.
Dessa forma, o urbanismo e o desenho urbano passam por uma grande crise onde, segundo Koolhaas (1995, p.29): “[...] o urbanismo está prestes a se tornar um grande vetor da imaginação. Redefinido, o urbanismo não será apenas, ou principalmente, uma profissão, mas um modo de pensar, uma ideologia: aceitar o que existe. Nós estávamos fazendo castelos de areia. Agora nós nadamos no mar que os varreu.” 12
2 .
Ă‚ncoras Culturais
O urbanismo, inaugurado como ciência pelo Movimento Moderno, começou a
entrar em colapso na segunda metade do século XX quando diversos questionamentos e críticas se levantaram contra modo de pensar e “fazer” a cidade modernista. O movimento oposicionista, gerado pelo Grupo Metabolista e pelo grupo de pensadores do Urbanismo Culturalista, marcou o auge da desestruturação dessa ciência, pois segundo Hall (1988), nesse momento os estudos urbanos e o planejamento urbano começam a convergir para lados opostos até chegar ao ápice de sua ruptura total.
Posteriormente a essa separação, o planejamento urbano encontra no proces-
so de globalização mundial uma alternativa para seu redesenvolvimento baseado nos ideais mercadológicos americanos, marcando assim, ainda segundo Hall, o surgimento das Cidades Empreendimentos.
O Plano Estratégico (PE) desenvolvido pela prefeitura de Barcelona em 1986 se
destaca nesse cenário por ter importado o modelo de Cidade-empresa americana com o objetivo de, segundo Santacana (1988 apud. Pasquotto, 2016, p.82) se estabelecer no cenário turístico e econômico europeu, projetando uma visão futura de metrópole europeia dinâmica, oferecendo uma qualidade de vida socialmente equilibrada e culturalmente solidificada.
Para disseminar essa nova imagem da cidade surgiu uma nova subdivisão do
PE “[...] o marketing urbano, que utiliza de diversas ferramentas isoladas e complementares para ações competitivas no mercado mundial. São elas a arquitetura icônica [e] os eventos emblemáticos [...].” (PASQUOTTO, 2016, p.32)
A arquitetura volta a ser usada agora como instrumento de propaganda, assim
como no regime totalitário de Hitler, para promover um ideal político, social e econômico através de grandes projetos assinados por importantes arquitetos do Star System, como Frank Gehry, Santiago Calatrava, Norman Foster, Richard Rogers, etc.
O caráter icônico e monumental, consquistado através do uso de mate-
riais e estruturas sofisticadas, da estética high-tech e de tecnologias construtivas de ponta, é usado também pelo planejamento urbano contemporâneo com o intuito 15
de requalificar áreas degradadas da cidade como, por exemplo, bairros industriais abandonados, regiões portuárias e até mesmo a cidade como um todo. Segundo Koolhaas (2014, p.22) “[...] a atração pela Grandeza está no seu potencial de reconstruir o Todo, ressuscitar o Real, reinventar o coletivo, reivindicar a possibilidade máxima.”.
Com a ascensão da indústria do turismo no cenário global os equipa-
mentos arquitetônicos que mais contribuiram para o desenvolvimento e requalificação das cidades foram os culturais como, museus e centros de arte. Através da assinatura de profissionais da elite arquitetônica, sua nova missão passa a ser atrair os turistas, instigando o consumo por meio da sedução pela imagem. Esses equipamentos, conhecidos também como âncoras culturais:
“Aliados ao planejamento urbano [...] teriam incumbência de promover a revitalização de seus arredores. O papel de “âncora” tem inspiração em experiências ocorridas pelo mundo afora, onde transformações urbanas se produziram a partir de grandes intervenções arquitetônicas.” (KARA, 2007, p.198)
16
2.1 REPERCUSSÃO MUNDIAL
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18
CENTRO GEORGES POMPIDOU
Figura 13- Relação da tipologia de Paris com o Centro Pompidou.
19
O Centro Georges Pompidou foi resultado de um concurso internacional organi-
zado pelo governo francês em 1970, que previa a construção de um centro cultural no coração de Paris. Esse edifício serviria como ponto de partida para intervenção urbana na região de Marais, segundo Meireles (2012), essa região que, após a Segunda Guerra Mundial, tornou refúgio do proletariado e se caracterizava pela presença de prédios históricos extremamente degradados e pela insalubridade diante da falta de infraestrutura.
Apesar dessa estratégia de intervenção urbana ter sido traçada duas décadas
antes da elaboração do PE, muitos pontos estratégicos contidos nela fazem com ambos se assemelhem, nesse contexto Pedro (2015, p.125) ressalta que: “Mais uma vez, esta intervenção surgiu de uma vontade política e demonstra o poder que um equipamento cultural tem para a revitalização urbana, tornando a cidade num local de trocas culturais multidisciplinares ao mesmo tempo em que revitaliza outros setores como o comércio, a restauração e outras atividades turísticas associadas.”
Ao final do concurso “o júri escolheu os vencedores Renzo Piano e Richard
Rogers, que apresentaram uma proposta que se fundamentava em dois princípios: sofisticação tecnológica e flexibilidade espacial.” (PASQUOTTO, 2011, p.56). Esses dois princípios propostos pelos arquitetos se materializou com sua construção, em 1977, através do uso da estética arquitetônica denominada de High-tech, marcada pelo uso de materiais industriais.
A forma de construção baseada num sistema de conexões, tubos e cabos de
aço possibilitava as pessoas reconhecer nitidamente a função de cada um dos componentes do edifício e também permitia estruturalmente que seu interior fosse plenamente livre e acessível. Hoje em dia, o Centro Pompidou é uma das obras mais visitadas na França, segundo Choay (1965), seu sucesso mediático decorre do fato de ter uma imagem apelativa, fácil de difundir e de memorizar, centrada no simbolismo mecânico que, aparentemente, converteu-se, aos olhos do público, na representação da modernidade técnica. 20
A praça construída em frente à fachada principal se tornou também um grande atrativo tanto para os turistas quando para os parisienses, nela diversos artistas de ruas, músicos e bailarinos se apresentam ao público, gerando assim um ambiente de lazer e descanso. As pedonais que bifurcam dessa praça, também passaram a abrigar os bares e restaurantes mais frequentados de Paris. Entretanto, é importante salientar que, segundo Pedro (2015, p.123): “Falar do Centro Nacional de Arte e Cultura Georges Pompidou é falar de um símbolo da cidade Paris que, como todos os ícones, foi admirado e odiado de forma expressiva, atraindo uma forte visibilidade mediática durante toda a sua construção.”
Nos anos 80 o choque da população diante desse edifício foi enorme, principal-
mente pelo fato do seu desenho, suas formas e materiais se destoarem completamente do seu entorno. Outro fator que gerou grande critica acerca desse projeto na época, e até mesmo atualmente, foi a mudança do perfil social das pessoas que moravam e viviam nessa região, pois com a valorização imobiliária gerada pela presença desse ícone arquitetônico muitas delas tiveram se sair de suas casa pelo fato de não conseguirem mais bancar os custos impostos pelo valor da terra.
21
Figura 14- Vazio urbano onde foi construído o Centro Pompidou.
Figura 15- Contraste entre o Centro Pompidou e as construções ao seu redor.
22
MUSEU DO AMANHÃ
Figura 16- Relação entre a cidade e o Museu do Amanhã. 23
No Brasil, a influência do Planejamento Estratégico e dos edifícios âncoras cul-
turais se disseminou nos anos 90 a partir do momento que o governo de Fernando Henrique Cardoso ajustou e consolidou a politica e a economia neoliberal no país. Segundo Weffort (1996, p.07, grifo nosso): “O pouco ou quase nenhum estímulo que foi dado até esse momento ao grande potencial criativo [cultural] não obstou o País de conquistar, pelo esforço de seus talentos, posição de destaque no exterior, seja na música, literatura, artes plásticas, cinema ou televisão; fonte de prestígio internacional, mas, sobretudo portas abertas para negócios promissores, a cultura brasileira é uma marca forte.”
Com isso, diversas metrópoles brasileiras como o Rio de Janeiro, Salvador, São
Paulo, Recife, etc., passaram a investir na cultura e na construção de edifícios culturais como meio de se reinserir no contexto global e também como requalificar de maneira “eficiente” suas regiões mais degradadas.
No momento em que o Rio de Janeiro é escolhido para sediar as Olimpíadas
Rio2016, o governo passou a elaborar diversos projetos de revitalização urbana, através de Parcerias Público-Privadas (PPP’s). A região do porto, assim como em Barcelona nas Olimpíadas de 92, foi o foco desses projetos que poderiam alavancar o desenvolvimento da cidade.
Surge nesse momento, a Operação Consorciada Porto Maravilha, que “foi a
maior parceria público-privada da história do Brasil, com custo de mais de R$ 8 bilhões.” (Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (Cdurp), 2015).
O Museu do Amanhã projetado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, em
2015, partiu dessa operação urbana buscando se tornar um: “Novo ícone da Região Portuária, explorando possibilidades de construção do futuro. Erguido sobre a Baía de Guanabara, como âncora cultural do projeto de revitalização da Região Portuária, o museu é o símbolo mais eloquente do renascimento de uma área de cinco milhões de metros quadrados, parte da história do Rio e que enfrentava décadas de atraso e abandono.” (Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro, 2015) 24
O museu que parece pousar no píer carioca, buscou através do apelo visual
projetar um desenho orgânico, inspirado na analogia as bromélias do Jardim Botânico, onde a composição do prédio se forma através de painéis solares e de um sistema de captação de água, que se torna peça chave para o projeto de conforto térmico e ambiental do edifício.
Entretanto, a crítica principal ao edifício se volta para as ostensivas desapropria-
ções que foram feitas e também pelo montante de dinheiro gasto na obra. O Rio de Janeiro é uma das metrópoles brasileiras com maior índice de segregação sócio-espacial, marcada pela abundância de infraestrutura urbana na Zona Sul e Centro e pelo abandono da Zona Oeste e Norte, diante desse fato os investimentos em âncoras culturais desse porte reforça, segundo Otília Arantes (2012, p.17):
“a arquitetura do espetáculo, com sua sensação de brilho superficial e de prazer participativo transitório, de exibição, de efemeridade [...]. Não sem razão, é definida não só pela estetização bastarda mas pelo impacto nulo sobre a pobreza e demais déficits sociais.”
Figura 18- “Rio te amo” na Praça Mauá. 25
Figura 17- Montagem da maquete eletrĂ´nica com a tipologia da cidade 26
3 .
E Q UI PAM ENTO S ÂNCORAS SOCIAIS
Encerrando o primeiro dia da Brazil Conference, organizada pela Universidade
de Harvard e MIT (Massachusetts Institute of Technology), a cantora Anitta, criada no bairro carente Honório Gurgel, no Rio de Janeiro, participou de uma entrevista1 onde um dos pontos levantado foi o debate acerca da petição pública para descriminalização do funk, considerado como “crime de saúde pública”. Em resposta, a cantora afirmou: “[...] é muito difícil você cantar ‘o barquinho vai, a tardinha cai’ [re-
ferência à canção da Bossa Nova, O Barquinho] se você nunca viu essas coisas. O funkeiro canta a realidade dele. Se ele acorda, abre a janela e vê gente armada e se drogando, gente se prostituindo, essa é a realidade dele, para mudar as letras do funk, você tem que mudar antes a realidade de quem está naquela área.”
Esse relato feito pela cantora reforça a repercussão real dos impactos gerados
pela segregação social e pela exclusão territorial que gera a falta de acesso da população de baixa renda as áreas de vitalidade, marcadas pela abundante oferta de infraestrutura, qualidade de vida, oferta de bons equipamentos urbanos. Segundo Molotch (1976, p.318): “Tendências emergentes tendem a enervar as máquinas de cresci-
mento local. Há a crescente suspeita de que em muitas áreas, em muitos momentos históricos, o crescimento e o desenvolvimento urbano beneficia apenas uma pequena proporção de moradores locais.”
Dentro desse contexto, outro fenômeno urbano vêm reforçando tal fato é a gen-
trificação. Essa manifestação urbana diz a respeito ao processo de mudança do perfil social de uma dada região gerada pela construção de edifício âncoras, que apesar de promover a revitalização local também promovem o aumento do valor da terra e com isso a população de baixa renda não consegue se manter mais nessa região. Segundo Arantes O. (2012, p.20), as âncoras culturais se inserem nesse cenário, pois: “[...] à medida que a cultura passava a ser o principal negócio das cidades em vias de gentrificação fica evidente para os agentes envolvidos na operação que era ela, a cultura, um dos mais poderosos meios de controle urbano no atual momento de reestruturação[...].” Entrevista fornecida pela cantora Anitta, em 06 de julho de 2018. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/geral-43671316>. Acesso em 01 de maio de 2018. 1
29
Esses fenômenos de segregação urbana, que ressaltam a falta de ações social-
mente sustentáveis, chegaram a um ponto tão alarmante no contexto mundial que chamou a atenção da Organização das Nações Unidas (ONU). O órgão, buscando propor um conjunto de novas ações que direcionem a melhora a qualidade de vida da população mundial, elaborou a Agenda 2030, em 2015, que é composta por 17 objetivos de desenvolvimento sustentável.
Dentro desses objetivos está o das “cidades e comunidades sustentáveis”, que
ressaltamos aqui dois de seus pontos principais dentro da linha de estudo dessa pesquisa: ▪
“[...] proporcionar o acesso universal a espaços públicos seguros, inclusivos,
acessíveis e verdes, particularmente para as mulheres e crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiência.” ▪
“[...] aumentar a urbanização inclusiva e sustentável, e as capacidades para o
planejamento e gestão de assentamentos humanos participativos, integrados e sustentáveis, em todos os países.“ (Organização das Nações Unidas, 2015)
Na Colômbia, o governo da cidade de Medellín começou a integrar esses con-
ceitos de sustentabilidade urbana dentro do Planejamento Urbano 10 anos antes da divulgação da Agenda 2030. O prefeito da cidade Sergio Farjaro juntamente com o diretor de Projetos Urbanos Alejandro Echeverri desenvolveram, durante seu mandato de 2004 a 2007, o plano urbanístico que foi titulado como Urbanismo Social.
Esse plano se desenvolveu fundamentado nas estratégias do PE, porém direcio-
nando suas ações nas áreas mais adensadas e carentes. A raiz da proposta se encontrar nas intensões de: promover o reequilíbrio sócio-territorial, direcionar investimentos privados e públicos para áreas de maior vulnerabilidade social, proporcionar a participação social, oferecer o acesso integral à cidade através de uma rede transporte público de qualidade. 30
Essas intensões se concretizaram na cidade através da construção de um siste-
ma interligado e acessível de transporte público, que interligava as redes de metrô, ônibus, ciclovias e até mesmo o teleférico construído; E principalmente através da criação de espaços públicos de educação e cultura, que utilizaram da arquitetura, assim como nas âncoras culturais, como meio de promover mudanças urbanas.
Acredita-se que esses espaços públicos construídos através reconheci-
mento do território existente e a promoção de infraestrutura nas áreas mais precárias e adensadas demograficamente, foram a peça-chave para o sucesso desse plano urbanístico, viabilizando o desenvolvimento urbano socialmente sustentável para a cidade e a população real (não mais para o mercado mundial e os turista, como no PE) com ênfase na demanda urbana e na inclusão sócio-espacial.
O ex-prefeito de Medellín explicou, durante uma entrevista feita por Hernán
(2017) para o Archdaily, que: “O urbanismo social tem a ideia de pensar a cidade com uma concepção mais holística - desenvolvendo uma transformação física voltada para os espaços públicos, recuperando a confiança nos espaços públicos e promovendo a transparência. Ao mesmo tempo, tenta incluir e desenvolver diferentes estratégias sobre educação, cultura e colaboração comunitária.”
Essa concepção holística, se concretizou ao longo do território através de inter-
venções pontuais, que associaram a arquitetura do espaço público com o planejamento urbano, formando uma grande trama urbana que se mostrou ser muito mais eficaz, do ponto de vista da sua capacidade de gerar um vasto campo de alcance dos projetos de requalificação.
Por fim, a seguir utilizaremos dois estudos de caso de projetos, cons-
truídos em Medellín e em São Paulo, que se mostram como denominamos aqui: equipamentos “âncoras sociais”, se caracterizando principalmente pela oposição ao modelo das âncoras culturais, pois se fundamentam no contexto social existente nas áreas onde existe mais necessidade de intervenção. 31
3.1 ES T U D O DE CA S O
BIBLIOTECA ESPANHA
Figura 19- Vista do edifício Biblioteca España.
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A Biblioteca Espanha, projetada em 2007, pelo arquiteto Giancarlo Mazzanti,
faz parte do conjunto de intervenções holística, como Fajarro denomina, onde se usou de projetos denominados de Parques-bibliotecas, que nada mais são que bibliotecas públicas que oferecem uma grande permeabilidade urbana uma vez que se insere dentro de um parque. Para formar essa trama urbana, esses parques-bibliotecas foram espalhados ao longo da cidade estrategicamente seguindo o critério imposto pelo plano urbanístico para a escolha do local de implantação como: a proximidade com o transporte público, permitindo que ele se torne acessível através da conexão com a cidade; a viabilidade de integrar espaços públicos ao projeto e principalmente que o local esteja inserido numa área demograficamente adensada e com grande vulnerabilidade social.
Figura 20- Inserção do Edifício Biblioteca Espanha na trama urbana de Medellin. 33
O edifício está implantado no bairro Santo Domingo, que durante os con-
flitos do narcotráfico foi considerado como bairro mais perigoso da cidade. Hoje em dia, a mudança causa pela presença desse projeto o tornou um ícone de metamorfose urbana, onde através da promoção de práticas educativas, culturais e sociais atraiu não só a população local e da cidade para participar de suas atividades e utilizar de seus espaços como também os turistas. Além disso, seu impacto também possibilitou a redução da violência que tanto marcava esse bairro.
Composto por três blocos inseridos no alto do morro, ele se destaca na
paisagem por meio de suas formas orgânicas, remetendo a imagem de três rochas, e a cor escura que contrasta com as residências de alvenaria ali presentes. Segundo Salazar (2003 apud.Capillé, 2007), o apelo estético do projeto tem a intensão de “ativar o poder da estética como motor para a mudança social.”.
O programa que é composto por diversos usos como biblioteca, sala de trei-
namento, sala de administração, salas para cursos de informática, administração de pequenos negócios, idiomas, artes etc. e auditório. Esses usos foram distribuídos em três blocos e conectados por uma plataforma de baixo que possibilita a flexibilidade e autonomia, melhorando a integração do público, considerando que cada volume funciona de forma independente.
Figura 21- Volumetria e materialidade do Edifício Biblioteca Espanha. 34
Figura 22- Inserção do Edifício Biblioteca Espanha no bairro.
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3.2 PROGRAMA CEU
O Centro Educacional Unificado (CEU) foi arquitetado dentro da divisão de Pro-
jetos do Departamento de Edificações (EDIF) da prefeitura de São Paulo, durante o governo de Marta Suplicy. Coordenado pelos arquitetos Alexandre Delijaicov, André Takiya e Wanderley Ariza, esse projeto revolucionário foi desenvolvido em paralelo a uma série de políticas públicas elaboradas no Brasil na década de 90 com intuito de diminuir a desigualdade social através da educação democrática e da reinterpretação do espaço da escola como um centro comunitário integrador.
O projeto chave para o entendimento desse modelo de educação escolar são as
chamadas escolas-parques, idealizadas pelo educador Anísio Teixeira e materializadas pelas mãos dos arquitetos Hélio Duarte e Diógenes Rebouças.
O principal conceito destas instituições era fornecer á população mais carente
um ensino completo, em tempo integral, que extrapole os limites das salas de aula, onde só se estuda as matérias impostas pela base comum curricular, e proporcione o contato do aluno com outros campos de conhecimento através de atividades complementares.
Para isso, Anísio organiza as escolas-parque em quatro escolas-classes, que
abrigam tais atividades, como educação física, artística, social e industrial e criam na escala urbana e arquitetônica um espaço intra-lote permeável destinado ao encontro, a socialização e a troca de experiências. Segundo Anelli (2004): “A concepção programática de Anísio Teixeira encontrou uma forma arquitetônica moderna nos projetos realizados por Hélio Duarte e Diógenes Rebouças nas cidades de São Paulo e Salvador. Adeptos do movimento liderado por Lúcio Costa, esses arquitetos conceberam uma escola parque. Em meio a uma grande área verde, a transparência das salas de aula tornava obsoletos os prédios escolares da época, até então enclausurados em suas pesadas alvenarias.” Figura 1 - Escola-parque ou Centro Educacional Carneiro em Salvador, de Diógenes Rebouças Disponível em: http://au17.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/178/artigo122877-1.aspx. Acesso em 18 de setembro de 2018. Figura 2 - Croquis das escolas-classe (1948), em São Paulo, de Hélio Duarte Disponível em: http://au17.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/178/artigo122877-1.aspx. Acesso em 18 de setembro de 2018.
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figura 01
figura 02
O projeto CEU, por sua vez, se ergue nesse contexto sócio-político carregando
consigo experiências anteriores e unindo diversas estratégias que tiveram sucesso no passado, como a integração criada entre os edifícios e seu entorno através do partido projetual de permeabilidade urbana do lote e a possibilidade de oferecer ensino de qualidade em tempo integral para a população situada nas zonas de alta vulnerabilidade da metrópole. “Reconhece-se uma base conceitual que, anterior à execução desses projetos, é de extrema importância para o CEU’s, que apresentam a maturidade e o passo mais recente dentro de uma longa história de interação entre arquitetos e educadores. Desenvolveu-se uma metodologia para a localização dos equipamentos, definindo-os, simultaneamente, como unidades locais de importância no bairro e como uma ampla rede social organizada em escala metropolitana. Essa prática ilustra o pensamento de um urbanismo em rede, aplicado a São Paulo.” (PADILHA; SILVA, 2004, p. 35)
Essa metodologia de implantação, entretanto, passou por diversas fases de or-
ganização e execução de acordo com as mudanças de governo na prefeitura. Na primeira etapa do programa, durante o governo de Marta Suplicy, buscou-se pulverizar esses equipamentos em todas as zonas da cidade de São Paulo sem muitas exigências. Porém, na segunda etapa a Secretaria Municipal de Educação passou a estabelecer algumas premissas para a implantação do edifício, sendo a principal delas a localização em áreas carentes de equipamentos educacionais, de esporte e cultura, como foi o caso das primeiras unidades construídas nos bairros Penha, Jabaquara e Butantã. 38
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Outra premissa importante, e que muitas vezes impediu a implantação do CEU
em áreas com grande necessidade de intervenção urbana, foi a escolha de apenas terrenos suficientemente grande para abrigar o extenso programa e a disponibilidade de uso do terreno ou a possibilidade de desapropriação.
Durante seus 15 anos de existência já foram construídas mais de 25 unidades
do CEU em São Paulo, todas pensadas com o intuito de servir à população com um equipamento público e promover atendimento de qualidade, elaborando assim diversos polos de desenvolvimento e educação continuada nas regiões mais se precisa e, como podemos observar nos mapas a seguir, normalmente situadas nas áreas afastadas do grande centro.
A solução arquitetônica proposta pelos arquitetos responsáveis se deu
através de um projeto básico padrão, concebido a partir de elementos construtivos pré-fabricados de concreto. Cada conjunto tem núcleo escolar (para ensino infantil e fundamental), uma creche, um núcleo para atividades culturais e quadras esportivas, e alguns ainda contam com um parque aquático composto por três piscinas.
Dentro desses núcleos, denominado de “agrupamentos funcionais” pela
SME, poderão também abrigar, de acordo com a demanda da população, serviços de assistência social, oficinas culturais de apoio ao desenvolvimento dos coletivo do bairro, polos da Universidade Aberta do Brasil (UAB), atividades do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), entre outros.
Agrupamentos funcionais do CEU.
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Disponível em: http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/territoriosceuprojetos/. Acesso em: 28 de maio de 2018
Ainda no campo educativo, a recente aderência das escolas municipais ao Pro-
grama Mais Educação possibilitou a ampliação das possibilidades de uso desses equipamentos para as atividades extracurriculares necessárias para a oferta de uma educação em tempo integral. Potencializando ainda mais a conexão dos novos CEUs aos equipamentos do entorno, abrindo assim as barreiras impostas pelos muros das escolas e ajustando espaço ampliado de educação através do chamado Território CEU.
Território CEU Grajaú. Disponível em: http://gestaourbana. prefeitura.sp.gov.br/territoriosceuprojetos/. Acesso em: 28 de maio de 2018
Por fim, podemos perceber que o êxito do CEU ao longo dos anos dependeu de
diversas adaptações durante as execuções dos projetos. Alguns problemas surgiram devido à complexidade dos edifícios e topografias existentes, por isso a PMSP e a SME vem procurando garantir um diálogo com a comunidade, uma vez que a participação comunitária é identificada com elemento fundamental, tanto na aceitação do projeto como para o desenvolvimento do programa.
Figura 23.
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4 .
CE U Americanópolis, um edifício em desconstrução
4.1 LEVANTAMENTO
A fundamentação conceitual permitiu a compreensão e a crítica acerca dos im-
pactos sócio-espaciais dos projetos âncoras culturais, utilizados como instrumento de requalificação pelo planejamento urbano contemporâneo. Através dessa percepção foi possível traçar critérios para proposição de três pequenos projetos de equipamento público que juntos formarão uma rede de ambientes urbanos com intuito experimental de requalificar um dado espaço urbano. Para isso foi escolhida uma área no Distrito Jabaquara, que servirá como “corpo de prova” para essa experimentação.
A escolha dessa área resultou da busca por um local que apresentasse alta
densidade demográfica, alta vulnerabilidade social e uma carência de equipamentos urbanos públicos de qualidade. Dessa forma, o Jabaquara se encaixou perfeitamente com as características urbanas buscadas, mostrando ser um terreno propício para aplicação do projeto.
Antes da analise pontual da área, foi feito um apanhado geral de problemas e
potencialidades do distrito com o intuito compreender melhor a região. Através deste, foi possível destacar como principais potencialidades a grande oferta de transporte público e a presença de importantes vias de estruturação urbana, como a Avenida Washington Luís e a Rodovia dos Imigrantes, que dão acesso ao ABC Paulista e à Baixada Santista.
Diante dessa grande oferta de transporte e acessos, houve um grande incha-
ço populacional associado à construção desenfreada de assentamentos formais e informais. Com isso surgiram diversos problemas urbanos, como novos aglomerados subnormais, deficiência na oferta de espaços e equipamentos públicos de qualidade voltados ao lazer, esporte e cultura, congestionamento das grandes vias por conta do deslocamento massivo da população e falta de acessibilidade para pedestres nas ruas.
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Apesar desse quadro de problemas serem usados para descrever uma condição
na escala do distrito, podemos facilmente usa-los na escala da cidade para descrever a condição geral da metrópole São Paulo, principalmente no que diz respeito às regiões periféricas.
A particularidade problemática do Jabaquara é pelo fato de se apresentar como
um vazio assistencial, onde há ausência ou baixo atendimento de equipamentos da rede básica de educação, cultura e assistência social (SECRETARIA MUNICIPAL DO DESENVOLVIMENTO URBANO, 2016), principalmente no bairro Americanópolis.
Localizada numa parcela deste bairro, a área escolhida fica longe da zona vi-
talidade que acompanha a linha do metrô, desde a estação Jabaquara até a Avenida Paulista, oferecendo uma diversidade de usos e uma dinâmica urbana.
A área é caracterizada por ser predominantemente residencial e apresentar alta
densidade demográfica e alguns pontos de alta vulnerabilidade, nela existem diversas zonas que são marcadas pelo Plano Diretor como ZEIS 1, 2 e 3. Além disso, conta com apenas dois equipamentos públicos de recreação de qualidade: o Parque Nabuco e o Clube de Comunidade (CDC) Ferradura e é bem servido de escolas infantis, de ensino médio e fundamental.
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4.2 PROPOSIÇÃO
A partir da compreensão do terreno como vazio assistencial o projeto experimen-
tal, que trabalha na escala da arquitetura e do planejamento urbano, foi desenvolvido buscando atender a demanda da população por espaços públicos de lazer e cultura. O objetivo é oferecer pequenos equipamentos voltados a essas necessidades, utilizando os parâmetros urbanísticos estratégicos do Território CEU que contêm os seguintes direcionamentos: ▪
Requalificar o vazio assistencial.
▪
Integrar os equipamentos urbanos novos aos existentes.
▪
Utilizar de componentes construtivos flexíveis e variados.
▪
Projetar equipamentos permeáveis urbanisticamente.
Diante disso, serão projetados três pequenos equipamentos públicos que se-
guem o projeto básico e padrão do sistema de agrupamentos funcionais dos CEU’s. A ideia é explodir esse projeto multifuncional (pré-projetado em blocos aglutinados num único edifício) e espalhar seus módulos programáticos ao longo da área de intervenção em concordância e articulação com os equipamentos já existentes.
A proposta é formar uma trama de usos e usuários mistos, enfrentando os pro-
blemas locais e apresentando novas possibilidades de articulação urbana. Foram escolhidos três usos para cada um dos pequenos projetos: Edifício Multiuso, Edifício Cultural e Edifício Esportivo.
De maneira simples, esses edifícios serão implantados em regiões estratégicas
onde se tem maior densidade populacional e vulnerabilidade, buscando assim promover um ambiente dinâmico e acessível onde todos possam ter acesso à cultura, tecnologia, lazer e esportes, evitando também que a população local tenha que percorrer grandes distâncias para ter acesso a equipamentos desse tipo.
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AGRUPAMENTOS FUNCIONAIS CEU’S
Diagrama programático do CEU’s, elaborado pela autora a partir da cartilha Território CEU. Disponível em: http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/territoriosceuprojetos/. Acesso em: 28 de maio de 2018 50
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4.3 PROJETO
O projeto tem como intuito promover uma re-
estruturação urbana no trecho mais carente do bairro Americanópolis através de uma readequação do programa Centros Educacionais Unificados às estratégias de requalificação do Urbanismo Social, estudado anteriormente. Para isso o projeto busca desconstruir o conceito de unificação dos módulos programáticos do CEU, implantando três projetos, sendo eles o cultural, multiuso e esportivo ao longo do território escolhido.
Cada um dos projetos busca se adequar da
melhor maneira possível à realidade do seu entorno, identificando problemas, propondo soluções e possibilidades de ocupação e uso público. A topografia bastante acidentada, que inicialmente se apresentou como um grande desafio em todos os terrenos se mostrou ao longo das experimentações projetuais com maquete física e eletrônica um elemento balizador dos espaços públicos dos três edifícios que ora se torna arquibancada, ora plateia.
Apesar de suas singularidades tanto na ques-
tão das formas quanto na questão dos programas é Diagrama produzido pela autora com base no estudo dos terrenos apresentados
de interesse do projeto que as partes ofereçam evidências de um todo comum, para isso a constância dos materiais construtivos como concreto, aço e vidro e a presença das áreas verdes foram utilizados como estratégia de uniformização visual, ainda que reinterpretada em cada um dos projetos.
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E D I F Í C I O ESPORT I V O
Módulo programático: Esportivo Área Terreno: 3.000m² Localização: Rua Emilio de Souza Docca, Jabaquara – São Paulo
No projeto esportivo a topografia natural
se apresentava como uma arena que se direciona para a cota mais baixa, no nível da Rua Emilio de Sousa Docca.
Com isso, o partido inicial foi dividir esse
terreno em dois, mantendo e remodelando a área em forma de arena em um lado e levantando o edifício a partir da menor cota em outro, fazendo assim que a semi-arena se voltasse para o edifício e para a pista de skate projetada.
O projeto abriga uma piscina semio-
límpica, duas quadras de tênis, duas salas de ginastica, uma área destinada à aulas de judô demarcada por um tatame, uma quadra poliesportiva e um refeitório no ultimo pavimento que é marcado por uma grande sacada que da vista para a cidade e permite criar um espaço de estar e um refeitório ao ar livre. 56
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maquete eletrĂ´nica 63
estudo volumétrico - experimentações projetuais
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ED I F Í C I O M U LT I U SO
O edifício multiuso tem como implantação a região de maior vulnerabilidade social e na cota mais alta do território demarcada no estudo. O terreno se apresenta quase todo em declive e com uma pequena área razoavelmente pla-
Módulo programático: Multiuso
na. Tendo em vista essa condição e seu entorno, o
Área Terreno: 1.5000m²
projeto se desenvolveu a partir da cota mais alta e
Localização: Rua João de Lana,
plana, liberando quase toda a topográfica em de-
Jabaquara - São Paulo.
clínio para uma arquibancada verde acompanhada por uma escadaria que leva o pedestre até o nível do térreo, que está nivelado com um trecho da Rua Soares Passos. No térreo é criada uma pequena praça interna onde se encontram o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e o refeitório. Os demais pavimentos se desenvolvem envolta de um vazio central, onde emana luz natural que vem do rasgo zenital e voltados para o exterior. Por se situar quase que no topo de um território onde o gabarito dos edifícios quase não passam de dois pavimentos, todos os pisos do edifício apresentam pequenas varandas com painéis de vidro virados para a rua, buscando assim permeabilidade e interação visual com a cidade. O edifício também abriga diversas salas de múltiplo uso, laboratórios de ciências e biologia, salas de estudos, uma unidade da Universidade Aberta do Brasil (UAB), administração, uma pequena biblioteca que se encontra no ultimo pavimento em balanço fechado por painéis de vidro, um Fab Lab e um pequeno auditório que pode ser usado tanto para palestras do Fab Lab, quanto do CRAS e da UAB. 66
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~~~Fry-King~~~
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~~~Fry-King~~~
~~~Fry-King~~~
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maquete eletrĂ´nica 73
estudo volumétrico - experimentações projetuais
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ED I F Í C I O C U LT U R A L
A área do projeto cultural é marcada por
uma topografia em declive extremamente acidentado. Que se caracteriza por apresentar duas grandes descidas laterais, com uma parcela do terreno na cota mais baixa e uma parcela que se assemelha muito a forma de um teatro grego.
Diante dessa característica topográfica,
o projeto se desenvolveu através de quatro pa-
Módulo programático: Cultural
vimentos em forma de lâminas dispostas de ma-
Área Terreno: 6.000m²
neira horizontal que permeia o fragmento do ter-
Localização: Rua Dr. Ruy de Azevedo,
reno que recebe as caídas. Dessa forma, libera
Jabaquara – São Paulo
o espaço para uma plateia que foi traçada em alusão ao teatro grego, citado anteriormente, porém com linhas ortogonais e com a presença da grama, criando assim um local que pode servir tanto para um espetáculo a céu aberto, quanto para uma praça que permita encontros e uma pequena pausa no cotidiano dos moradores.
O projeto abriga um teatro fechado, uma
biblioteca que se desenvolve verticalmente através de largos degraus onde se criam mesas de leitura individual, uma galeria de artes com três ateliers, salas de teatro, dança, música e circo e uma pequena administração. Todas as salas de arte ficam voltadas para a praça central e envolvidas por um painel de vidro que permite que as pessoas que estão na praça possam ver os bailarinos, músicos, artistas e atores em ação, tornando-se assim uma apresentação de todas as artes. 76
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maquete eletrĂ´nica 82
estudo volumétrico - experimentações projetuais
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. CO NSIDE RAÇÕ ES
FI NAI S
A pesquisa apresentada partiu de uma inquietação pessoal em entender como
os projetos de arquitetura influenciam, através da estética, das formas e dos materiais, a dinâmica econômica e social das cidades no cenário do planejamento urbano. Para tanto, utilizou-se da análise dos edifícios âncoras culturais como “instrumentos” criados pelo planejamento urbano contemporâneo, com base no uso da arquitetura para a promoção da imagem da cidade para o mundo, observando o diversos tipos impactos positivos e negativos na malha urbana e na vida da população.
Diante dessa compreensão diversas questões foram levantadas como: Para
quem esses projetos são feitos? Como eles se inserem no contexto urbano existente? Com base nesses questionamentos, percebemos que na trajetória urbana duas tipologias de edifícios âncoras se apresentaram. As âncoras culturais, pensadas para a cidade globalizada e as âncoras sociais, pensadas para as pessoas e a cidade real.
É exatamente nesse último conceito que a proposição final se fundamentou nesse
trabalho, encontrando no Urbanismo Social uma estratégia urbana socialmente sustentável: as tramas urbanas de requalificação nas quais os equipamentos públicos âncoras, como as Bibliotecas-parques de Medellín se apresentam como pontos de amarração. No Brasil, um equipamento âncora semelhante as bibliotecas-parques é CEU, que se apresenta um grande potencial de atuação e transformação urbana por conta do seu extenso programa de usos voltados para o desenvolvimento da população mais carentes.
O produto final por sua vez se deu em forma de um projeto experimental, que
usa do bairro Americanópolis, como corpo de prova para o rebatimento das questões e os estudos levantados até aqui. A proposta se fundamenta na desconstrução dos agrupamentos funcionais do CEU com a intenção de espalhar três pequenos módulos programáticos, voltados ao uso cultural, esportivo e multiuso, ao longo da área de intervenção em concordância e articulação com os equipamentos já existentes.
O projeto trabalhou na escala da arquitetura, através da experimentações pro-
jetuais feitas com maquetes físicas e eletrônicas, que permitiram a readequação do programa proposto pelo CEU as necessidade do entorno. E também na escala do 86
planejamento urbano, através da elaboração desta trama urbana composta pelos equipamentos proposto e existentes. Pensada com o intuito de promover a reestruturação urbana, o projeto busca também atender a demanda da população, demograficamente densa e socialmente vulnerável, por espaços públicos de lazer e cultura.
Por fim, através da pesquisa e do projeto experimental que se desenvolveu
através da associação entre o campo da arquitetura e do urbanismo foi possível notar a importância dos espaços públicos intra-lote, que oferecem benefícios através da permeabilidade urbana tanto para o edifício e seus usuários quanto para a cidade.
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B IB L IO G R A FIA
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LISTA DE ABREVIATURAS CEU’s- Centros de Educacionais Unificados CEI- Centro de Educação Infantil CIAM- Congresso Internacional de Arquitetura Moderna CDC- Clube da Comunidade CDURP- Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro. EMEI- Escola Municipal de Educação Infantil EMEF- Escola Municipal de Ensino Fundamental IPVS- Índice Paulista de Vulnerabilidade Social ONU- Organização das Nações Unidas PE- Plano Estratégico PPP’s - Parcerias Público-Privadas SMDU- Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano SME- Secretaria Municipal de Educação de São Paulo ZEIS- Zonas de Interesse Social
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LISTA DE FIGURAS Figura 1- Londres Revolução Industrial. Disponível
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nha-rio-janeiro>. Acesso em 08 de abril de 2018 Figura 18- “Rio te amo” na Praça Mauá. Disponível
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Figura 22- Inserção do Edifício Biblioteca España no bairro. Disponível
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