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Celina Yamauchi

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Quem é quem?

Quem é quem?

Sem título (tríptico) I 2002 I fotografia e desenho sobre filme fotográfico, 30,0 x 75,3 cm I Foto: Ivan Sayeg

Celina Yamauchi: falsas narrativas1

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tadeu chiarelli curador

Se analisada em separado, cada foto de Celina Yamauchi parece se comportar dentro de um único eixo. Nítidas, elas descrevem pedaços de realidade circundante (trechos de paisagem, partes de objetos). No entanto, aí existiria uma bifurcação. A nitidez que as caracteriza nem sempre confere a todas objetividade, a relação “orgânica” com o referente.

Se em muitas o observador detecta, e rapidamente desvenda, o que representam (um vegetal, uma criança, um muro), em outras, por retratarem pedaços do mundo em uma frontalidade quase absoluta, transformam em índice impreciso aquilo que deveria (ou poderia) ser uma imagem de fácil decodificação. Algumas são fotos de desenho, e outras, desenhos realizados pela artista sobre filme fotográfico.

No processo de construção de seus trabalhos, Celina quase nunca apresenta essas imagens isoladas. Pelo contrário: tem sempre como prática acoplar duas ou três fotos de origens diversas aparentemente formando curtas narrativas. Em alguns trabalhos acrescenta interferências gráficas a uma das fotos.

O uso reiterado de três imagens para a produção de peças remete a produção da artista para o universo da narrativa, mas igualmente

1 Nota da organizadora: texto atualizado pelo curador em 15 de junho de 2009 a partir do original publicado no fôlder da exposição de Celina Yamauchi no Projeto Mezanino de Fotografia do ano de 2004, no Itaú Cultural, em São Paulo/SP (de 22 de setembro a 24 de outubro de 2004), e no catálogo da exposição conjunta de todos os artistas selecionados para esse projeto (Alline Nakamura, Celina Yamauchi e Edu Marin Kessedjian, artistas selecionados em São Paulo/SP; Albert Nane, Fernanda Preto e Michelle Serena, artistas selecionados em Curitiba/PR), realizada de 12 de novembro a 21 de dezembro de 2004, na Casa Andrade Muricy, em Curitiba/PR. A revisão do texto atualizado segue as normas do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

para aquele da montagem cinematográfica e, desse último, para outros universos mais antigos e, talvez, mais proximamente relacionados à sua memória ancestral: o ideograma chinês e o haicai japonês.

Analisando os trabalhos de Celina, nota-se que nenhuma das imagens de seus trípticos pode ser entendida como “consequência” ou como “síntese” das outras duas. Talvez mais próximas dos ideogramas, as “centelhas” percebidas em seus trabalhos – ou seja, a imagem que parece ter sido detonada pelas outras duas – não necessariamente são a última (se fossemos perceber os trípticos a partir de uma leitura ocidental, realizada da esquerda para a direita). Em muitos deles, a “centelha” pode ser a segunda ou mesmo a primeira.

Tal característica permite pensar que os trabalhos não podem ser entendidos como pequenas histórias, ou como textos, no sentido convencional do termo. Estariam mais próximos, é verdade, dos ideogramas, e não propriamente das narrativas, uma vez que não possuem essa temporalidade requerida pela literatura ou pelo cinema convencionais.

Falsas narrativas, o uso de mais de uma imagem fotográfica não significa, no caso dos trípticos de Celina, que a artista busque suprir em seus trabalhos supostas carências da fotografia. Para ela, a junção de imagens, mais do que contar uma história, de narrar uma fábula, constitui caracterizações de imagens poéticas, flashes de lirismo que se concretizam em imagens e por causa delas.

Nenhum de seus trípticos se explica através de outro, como tendem a se explicar as fotos que compõem ensaios convencionais. Cada uma é um, todos são únicos. Nada é supérfluo, fruto de meras divagações. O estágio poético alcançado nesses trabalhos às vezes se dá pelo acaso, sempre tão proteico para a arte (todos podem imaginar as inúmeras possibilidades que a artista testa em seu ateliê antes de optar por determinada combinação). Mas desse acaso não está descartado o olho sensível que enquanto joga edita, enquanto edita faz poesia em forma de imagens.

Sem título (tríptico) I 2003 I fotografia, 30,0 x 60,7 cm I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia e giz dermatográfico sobre fotografia, 30,0 x 112,6 cm I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia, 30,0 x 112,3 cm I Col. Sérgio Carvalho I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia, 30,0 x 113,8 cm I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia, 30,0 x 127,0 cm I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia e giz dermatográfico sobre fotografia, 30,0 x 135,3 cm I Foto: Ivan Sayeg

Sem título (tríptico) I 2004 I fotografia, 30,0 x 99,6 cm I Col. Sérgio CarvalhoFoto: Ivan Sayeg

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