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Michelle Serena

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Quem é quem?

Quem é quem?

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I 2002 I Sem título (da série Encounter)

Os encontros de Michelle e Serena1

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tadeu chiarelli curador

A série Encounter, de Michelle Serena, traz outra dimensão da fotografia para a esfera desta série de exposições: o autorretrato. No entanto, os autorretratos apresentados por ela não se enquadram com facilidade no conceito mais comum desse gênero fotográfico. Eles não se apresentam apenas por meio de closes expressivos, capazes de supostamente transmitir os sentimentos mais íntimos da artista.

De fato, essas fotos nas quais se representa Serena são encenações em que o tema é sua própria identidade. São performances de cunho narrativo e autobiográfico, onde ela se toca, se funde com sua memória (também fotográfica), se encontra com a natureza e nela se dissolve.

Nesse universo fechado (onde até a fusão da artista com a natureza ocorre como uma espécie de espelhamento), cabe ao observador assumir o papel de testemunha desse encontro entre Michelle e Serena, uma busca de toque e fusão entre a artista e sua imagem. E como a artista leva a cabo esse diálogo consigo mesma e sua circunstância, utilizando-se da linguagem fotográfica? Como instrumentaliza esse meio tradicionalmente tido e utilizado para a fixação da exterioridade plena da realidade aparente, sem aberturas muito evidentes para propiciar exercícios de introspecção como o que a artista propõe?

Para a representação desses encontros consigo mesma, para a encenação dessa busca de um sentido para o seu aqui e agora – ações que transcorrem no espaço e no tempo mesmo que metafórico ou virtual –, Serena não segue a trilha de vários de seus colegas, igualmente preocupados com a fixação, pela fotografia, do tempo narrado.

Ao invés de, por exemplo, justapor horizontalmente as fotos, repetindo, na parede, a sequência de fotogramas de um filme, a artista opta por outra estratégia: sobrepõe dois (ou mais) diapositivos, criando outra “profundidade de campo”, mais próxima da pintura do que do

1 Nota da organizadora: texto atualizado pelo curador em 27 de julho de 2010 a partir do original publicado no catálogo da exposição conjunta de todos os artistas selecionados para o Projeto Mezanino de Fotografia do ano de 2004 (Alline Nakamura, Celina Yamauchi e Edu Marin Kessedjian, artistas selecionados em São Paulo/SP; Albert Nane, Fernanda Preto e Michelle Serena, artistas selecionados em Curitiba/PR), realizada de 12 de novembro a 21 de dezembro de 2004, na Casa Andrade Muricy, em Curitiba/PR. A revisão do texto atualizado segue as normas do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

cinema ou muito menos da fotografia “clássica”.

Pode-se dizer então que, para resolver seu problema de expressão dentro da fotografia, a artista dá as costas para o “devir” dessa linguagem – o cinema –, voltando-se para aquele meio que a antecedeu – a pintura.

O trabalho de Serena, no entanto, não está ligado ao pictorialismo tradicional da passagem do século XIX para o XX. A artista, de fato, está mais próxima de uma vertente neopictorialista que tomou conta de parte significativa da fotografia contemporânea no último final de século. Uma fotografia hibridizada, que já não acreditando nas potencialidades e na autossuficiência da straight photography buscou, na acoplagem de várias linguagens dentro do fazer fotográfico, outras possibilidades para esse meio de expressão.

Serena, deixando evidentes os “truques” usados para a elaboração de suas fotos – o uso de diapositivos, a saturação das cores etc. –, apropria-se de certas estruturas pictóricas para desenvolver uma poética que efetivamente tem sua origem mais próxima das artes cênicas, do teatro, da performance, da dança.

Testemunhamos seu diálogo consigo mesma e os movimentos sensuais de partes de seu corpo, por meio de transparências e “veladuras”, por desdobramentos de imagens que, muito à semelhança de certas estratégias pictóricas (respaldadas e reforçadas pelo colorido denso das imagens da artista), fundem formas do primeiro plano com aquelas mais afastadas, criando novas possibilidades de sentidos.

Teatro e pintura, fotografia e teatro, fotografia e pintura, os Encounters de Michelle Serena atestam como a preocupação com o registro do tempo dentro da fotografia pode alcançar configurações imprevistas quando a serviço de sensibilidades plenas de inquietações.

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I I 2002 Sem título (da série Encounter)

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I I 2002 Sem título (da série Encounter)

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I 2002 I Sem título (da série Encounter)

Sem título (da série Encounter) I 2003 I fotografia cor, 81 x 56 cm I Col. da artista I Foto: Michelle Serena Sem título (da série Encounter) I 2003 I fotografia cor, 81 x 56 cm I Col. da artista I Foto: Michelle Serena

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I 2003 I Sem título (da série Encounter)

Foto: Michelle Serena I Col. da artista I fotografia cor, 81 x 56 cm I 2001 I Sem título (da série Encounter)

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