A influência da estética jornalística na fotografia publicitária. (Mon.)

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Bruno Arthur Oliveira

A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário Senac – Campus Santo Amaro, como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharelado de Publicidade e Propaganda.

Orientadora Profª Tatiana Pontes

São Paulo 2013


O482i Oliveira, Bruno Arthur A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo. / Bruno Arthur Oliveira. -- São Paulo, 2013. 55f.:il.;color. Orientador: Tatiana Pontes. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Publicidade e Propaganda) – Centro Universitário Senac, Campus Santo Amaro, São Paulo, 2013. 1.Fotografia 2.Publicidade 3.Fotojornalismo 4.Intertextualidade I. Pontes, Tatiana (orient) II.Título CDD 778


Bruno Arthur Oliveira A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo

Aprovado em ______ de ________________ de ________

Banca Examinadora ____________________________________________________ Professora Tatiana Pontes (Orientadora)

____________________________________________________ Professora Camila Gracia (Avaliador I)

____________________________________________________ Professora Sônia Avallone (Avaliador II)


D e d i c a t ó r i a

Dedico este trabalho às pessoas mais importantes da minha vida: meus pais, Sergio e Gisele, avós paternos, Francisco Matias e Maria Conceição, avós maternos, Fausto Silva e Maria Helena e minhas irmãs Beatriz e Laura, que confiaram no meu potencial para esta conquista. Não conquistaria nada se não estivessem ao meu lado. Obrigada, por estarem sempre presentes a todos os momentos, me dando carinho, apoio, incentivo, determinação, fé, e principalmente pelo Amor de vocês.


A g r a d e c i m e n t o s Grato a Deus pelo dom da vida, pelo seu amor infinito, sem Ele nada sou. Agradeço aos meus pais, Sérgio e Gisele, meus maiores exemplos. Obrigado por cada incentivo e orientação, pelas orações em meu favor, pela preocupação para que estivesse sempre andando pelo caminho correto. À professora Tatiana Pontes que, com muita paciência e atenção, dedicou do seu valioso tempo para me orientar em cada passo deste trabalho. Pela contribuição na minha vida acadêmica e por tanta influência na minha futura vida profissional. Aos meus avós parternos e maternos que tanto amo, em especial ao meu avô Francisco por ser um grande guerreiro, chefe, líder, homem e que sempre torceu por mim. À minha namorada Vitória Gonçalves ofereço um agradecimento mais do que especial, por ter vivenciado comigo passo a passo todos os detalhes deste trabalho, ter me ajudado, durante toda a coleta, por ter me dado todo o apoio que necessitava nos momentos difíceis, todo carinho, respeito, por ter me aturado nos momentos de estresse, e por tornar minha vida cada dia mais feliz. Aos meus grandes exemplos, Silvana Oliveira e Sandra Oliveira, que tanto me ajudaram nesse período. Obrigado pelas oportunidades, por me mostrar o quanto o entusiasmo é importantes na vida. Aos meus amigos de classe e aos amigos de infância, a quem aprendi a amar e construir laços eternos. Obrigada por todos os momentos em que fomos estudiosos, brincalhões e cúmplices. Porque em vocês encontrei verdadeiros irmãos. Obrigado pela paciência, pelo sorriso, pelo abraço, pela mão que sempre se estendia quando eu precisava. Esta caminhada não seria a mesma sem vocês.


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A melhor maneira de nos prepararmos para o futuro é concentrar toda a imaginação e entusiasmo na execução perfeita do trabalho de hoje. Dale Carnegie


RESUMO

ABSTRACT

Este trabalho se propõe a verificar a influência da estética do jornalismo nas campanhas publicitárias do segmento esportivo, já que a publicidade desse segmento simula essas características em busca de aproximar o produto com as vivências do público e cria imagens que apresentam a ficção/sedução típicas da publicidade, mas que simule a credibilidade do fotojornalismo. Partindo de um estudo teórico sobre fotografia jornalística e publicitária desse segmento – a partir dos estudos de SUSAN Sontag, BORIS KOSSOY, Henri Cartier-Bresson, JEAN Baudrillard entre outros e de uma análise de campanhas publicitárias das marcas, Topper, Nike, Adidas e Reebok - a fim de reconhecer as características presentes nessas fotografias e, ao final, observar como se dá a influência estética de uma linguagem para outra.

This study aims to investigate the influence of the aesthetics of journalism in the advertising campaigns of the sports segment, as this segment advertising simulates these characteristics in pursuit of bringing the product to the experiences of the public and creates images that present the fiction / seduction typical advertising, but that simulates the credibility of photojournalism. From a theoretical study of journalistic photography and advertising the segment - from studies SUSAN Sontag, BORIS Kossoy, Henri Cartier-Bresson, among others JEAN Baudrillard and an analysis of advertising campaigns of brands, Topper, Nike, Adidas and Reebok - to recognize the features present in these photographs, and the end, observe how the aesthetic influence from one language to another.

Palavras chaves: fotografia; publicidade; fotojornalismo; intertextualidade.

Keywords: intertextuality.

photography,

advertising,

photojournalism;


A linguagem fotográfica Lista de imagens

Imagem 10 – Fotografia de Caio Guatelli – 2007. Disponível e m : h t t p: / / c a i o. p h o t o s h e l t e r. c o m / g a l l e r y / B r a z i l -X- E n g l a n d / G0000N0vNGKMjppw/, acesso 17/09/13.

Imagem 01 – Campanha Adidas, “All in”, 2011. Disponível em: http://www.futebolmarketing.com.br/2011/adidas-2/, acesso em 19/09/13

Imagem 11 – Campanha Topper, “El corazón manda”, 2009 Disponível em:http://www.3960diariodeportivo.com/2009/05/topper-ysu-nueva-campana-el-corazon_31.html, acesso 17.09.13.

Imagem 02 – Campanha Nike, “Mostre sua grandeza”, 2012. Disponível em: http://www.inovahouse.com.br/blog-inova/campanhada-nike-encontre-sua-grandeza/, acesso em 17.09.13.

Imagens 12 e 13 - Campanha Topper, “El corazón manda”, 2009 Disponível em: http://www.3960diariodeportivo.com/2009/05/topper-ysu-nueva-campana-el-corazon_31.html, acesso 17.09.13.

Imagens 03 e 04 – Fotografias de Roger Fenton – Guerra da Crimeia, 1855. Disponível em:http://veja.abril.com.br/blog/sobreimagens/classicos/roger-fenton-e-a-guerra-da-crimeia/, acesso 17/09/13.

Imagens 14 e 15 - Campanha Reebok, “Run Easy”, 2007. Disponível em: http://magazine.enlightennext.org/2009/04/23/do-wereally-need-to-take-it-easy/, acesso 17/09/13.

Imagem 05 – Reportagem de Mário de Moraes e Ubiratan de Lemos O Cruzeiro, ano XXVIII. Disponível em: http://ims.uol.com.br/ ocruzeiro/reportagem.html, acesso 17/09/13. Imagem 06 – Fotos de José Medeiros – O Cruzeiro, ano XXIII. Disponível em: http://ims.uol.com.br/ocruzeiro/versus.html, acesso 17/09/13. Imagens 07 e 08 – Fotografias de Henri Cartier-Bresson 1932. Disponível em: http://www.magnumphotos.com/C. aspx?VP3=CMS3&VF=MAGO31_10_VForm&ERID=24KL53ZMYN, acesso 17/09/13 Imagem 09 - Campanha da Anistia Internacional com fotos de Gustavo Germano. Disponível em: http://iconica.com.br/ blog/?p=4193, acesso 17/09/13

Imagens 16 e 17 - Campanha Reebok, “I am what I am”, 2005. Disponível em:http://www.ibelieveinadv.com/2006/10/reebok-i-amwhat-i-am/,acesso 19/09/13 Imagens 18 e 19– Campanha Adidas, “All in”, 2011. Disponível em: http://www.futebolmarketing.com.br/2011/adidas-2/, acesso em 19/09/13 Imagens 20 e 21– Campanha Adidas, “Impossible is nothing”, 2008. Disponível em: http://shoffillustrated.com/tag/illustrated-sports/, acesso em 19/09/13. Imagens 22 e 23 - Campanha Nike, “Encontre sua grandeza”, 2012. Disponível em:http://www.inovahouse.com.br/blog-inova/ campanha-da-nike-encontre-sua-grandeza/, acesso em 17.09.13.


Sumário Sumário

A linguagem fotográfica

Introdução

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1. A linguagem fotográfica

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1.1 A linguagem do fotojornalismo 1.2 O momento decisivo 1.3 A linguagem publicitária e a fotografia

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2. A intertextualidade de estéticas 3. A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo

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Considerações finais

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Referências

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INTRODUÇÃO Introdução O estímulo para esta pesquisa está relacionado à minha percepção enquanto estudante de publicidade e propaganda e público alvo de determinadas marcas esportivas. Ao observar algumas campanhas publicitárias desse segmento percebi uma possível referência do conceito do “momento decisivo” de Henri Cartier-Bresson e uma possível influência estética do fotojornalismo nessas fotografias publicitárias. A fotografia é uma técnica que se espalhou nos meios de comunicação e hoje encontramos um leque grande de publicações em diferentes tipos de veículos. Ela está presente em revistas, jornais, publicidades e sua função em cada um desses meios pode variar, desde mostrar uma identificação com o consumidor em determinada campanha, vender ou informar. Alguns autores como Susan Sontag, por exemplo, comentam sobre porque a fotografia pode ser entendida como uma representação da realidade e, portanto, servia para ratificar os fatos: Tais imagens são de fato capazes de usurpar a realidade porque, antes de tudo, uma foto não é apenas uma imagem, uma interpretação do real; é também um vestígio, algo diretamente decalcado do real, como uma pegada ou uma máscara mortuária. (SONTAG, 2004, p. 170).

Assim, podemos observar o importante papel que a fotografia tem como linguagem de representação, quando adquire um poder de supostamente comprovar um fato e se tornar fundamental como documentação. Desde o século XIX, se discute como a fotografia não pode

ser vista simplesmente como uma representação imparcial da realidade, e sim, uma interpretação. Ela é capaz de dar uma versão do acontecimento, e a luz, o enquadramento e, até mesmo, o meio onde ela está sendo veiculada, contribuem para essas diferentes interpretações. Percebe-se hoje, que a fotografia publicitária esportiva sofre influência do discurso jornalístico, que é o tema desta pesquisa. Basta observarmos campanhas de esporte que circulam no mercado que rapidamente surgirão diversos exemplos de fotografias publicitárias que incorporam as características da fotografia jornalística. Já que no segmento esportivo a fotografia publicitária está cada vez mais se apropriando da estética do jornalismo, do momento do acontecimento, como se fosse feita sem planejamento, sem produção e da forma mais isenta possível. Mas devemos perceber que a publicidade em geral está se travestindo de realismo, buscando tornar as campanhas mais próximas aos olhos do público. A fotografia jornalística esportiva é um desafio para o fotógrafo. Para fotografar qualquer esporte, o mais importante é conhecer seu funcionamento. Quais posições são importantes para uma jogada decisiva ou qual jogador é reconhecidamente mais habilidoso podem servir para determinar o momento “certo”. Um dos conceitos importantes a ser discutido é o “instante decisivo”, este conceito foi criado pelo francês Henri Cartier-Bresson, que se tornou um marco no jornalismo e fotodocumentarismo. Este conceito está apoiado na ideia de que o olhar do fotógrafo pode selecionar momentos únicos, instantes com uma pequena duração de tempo. Caso o fotógrafo não consiga esse instante, a possível obra será perdida de forma irreversível. Sempre buscando capturar a vida humana, Bresson regis10


INTRODUÇÃO tra a vida em seus passageiros instantes. Segundo ele, a foto não seria a mesma um milésimo de segundo antes ou depois de apertar o disparador. Quando esse conceito foi formulado, Bresson certamente não estava se referindo especialmente ao esporte, mesmo porque seu objetivo não era focar este tema. Foi neste sentido que esta investigação caminhou, buscando entender o porque e como a fotografia publicitária do segmento esportivo se apropria da estética do fotojornalismo. Para que esse desenvolvimento fique claro é necessário primeiramente traçar uma linha de raciocínio teórico. O capítulo 1 consiste em um estudo sobre a linguagem fotográfica. A partir desse momento será necessário analisar a fotografia dentro da sociedade, seus possíveis usos e sua relação com a realidade e ficção, a partir de definições de Susan Sontag, Gisele Freund e Boris Kossoy. O capítulo apresenta as características da linguagem fotojornalística e o conceito do momento decisivo de Cartier Bresson, já que a fotografia publicitária do segmento esportivo poderia estar se apropriando de algumas características estéticas do fotojornalismo como o momento decisivo. Essa apropriação de estética poderia acontecer em busca de uma aproximação da campanha publicitária e o produto com as vivências do público consumidor ou até mesmo para criar fotografias que apresentem a ficção/sedução típica da publicidade, mas que simule a credibilidade do fotojornalismo. O segundo capítulo trata de analisar uma possível intertextualidade de estéticas a partir de definições dadas no capítulo anterior. Jean Baudrillard e seu conceito de simulação, também será abordado, já que estamos lidando com a hipótese da fotografia publicitária do segmento esportivo simular as características estéticas da fotografia jornalística, como uma estratégia planejada para simular credibilidade e se aproximar do público. Desse modo, a fotografia publicitária se apresenta travestida,

ou seja, se apropriando da estética da fotografia documental e amadora. No terceiro capítulo são analisadas campanhas publicitárias das marcas: Reebok, Topper, Adidas e Nike presentes na mídia impressa. Essas campanhas têm uma estética diferente das imagens fantasiosas produzidas em estúdio, pois simulam o momento do acontecimento e se aproximam da estética jornalística como podemos verificar nas imagens a seguir. Essa análise foi realizada com o objetivo de apurar os conceitos, teorias discutidas e verificar a influência de possíveis características da estética jornalística para a fotografia publicitária no segmento esportivo. Imagem 1 - Campanha Adidas, “All in”, 2011.

Imagem 02 – Campanha Nike, “Mostre sua grandeza”, 2012.

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A l i n g u a g e m F O T O G R Á F I C A

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A linguagem fotográfica 1. A linguagem fotográfica A linguagem tem papel fundamental para a comunicação e é um instrumento que possibilita a elaboração de significados que possam ser compartilhados em sociedade. Pode-se dizer que as cavernas pré-históricas possuem as primeiras coleções de imagens. A partir daí muitas formas de linguagem foram criadas pelo homem para se expressar em seu meio social. Com papel fundamental nesta pesquisa, pode-se destacar a fotografia. Do ponto de vista acadêmico e social, é importante discuti-la, pois está cada vez mais presente nos veículos de comunicação e faz parte da nossa vida. A invenção da fotografia, no século XIX, foi uma grande criação humana, uma linguagem de representação e arte que teve impacto na forma do homem comunicar-se e questionar a sociedade em que vive. Foi contestada no que diz respeito ao seu valor como expressão artística. Claramente ela foi de encontro a um meio artístico que não era acostumado a uma forma de reprodução tão realista, e foi entendida como uma linguagem que substituiria a pintura. E assim, foi assumindo o papel que a pintura exercia no campo da documentação. De acordo com Susan Sontag (1986), o seu caráter documental tornou-se uma “arma de poder”: Enquanto uma pintura, mesmo quando se equipara aos padrões fotográficos de semelhança, nunca é mais do que a manifestação de uma interpretação, uma foto nunca é menos do que um registro de uma emanação (ondas de luz refletidas pelos objetos), - um vestígio material de seu tema, de um modo que nenhuma pintura pode ser. (SONTAG, 1986, p. 170).

Ou seja, a fotografia foi considerada uma extensão da realidade, como uma prova que confirmava o acontecimento. A pintura uma interpretação artística, enquanto a fotografia um registro do real. Ainda segundo Susan Sontag (1986, p. 171) “Possuir uma fotografia seria como ter um prego da Santa Cruz”. Dessa forma, o uso da fotografia criava a possibilidade de gerar efeitos da verdade, provando a existência e comprovando um fato. Gisele Freund (1995, p. 20) afirma que “o seu poder de reproduzir exatamente a realidade exterior – poder inerente a sua técnica – empresta-lhe um caráter documental e fá-la aparecer como o processo de reprodução mais fiel, o mais imparcial da vida social”. A fotografia aqui é considerada como fonte para história, como um meio de provar a existência do conteúdo retratado. Por outro lado para Boris Kossoy (2001) apesar do caráter documental da fotografia o fotógrafo é um filtro cultural, pois segundo ele: O registro visual documenta, por outro lado, a própria atitude do fotógrafo diante da realidade; seu estado de espírito e sua ideologia acabam transparecendo em suas imagens, particularmente naquelas que realiza para si mesmo enquanto forma de expressão pessoal. (KOSSOY, 2001, p. 43).

Com isso, podemos perceber que embora a fotografia capture a realidade e tenha uma incrível semelhança com ela, a fotografia não deixa de ser uma interpretação. A linguagem fotográfica é a linguagem do olhar, mas o fotógrafo coloca par13


A linguagem fotográfica te dele em sua imagem através de conhecimento, sentimento, costumes e ideologias que acabam fazendo parte de sua obra. Quando fotografamos queremos dividir nossa percepção do mundo e nossa sensibilidade com as outras pessoas. Segundo Kossoy (2001, p. 27), o mundo se tornou de certa forma familiar após o advento da fotografia. O homem passou a ter um conhecimento mais preciso e amplo de outras realidades que lhe eram, até aquele momento, transmitidas unicamente pela tradição escrita, verbal e pictórica. Ou seja, fotografia é imagem. Mas não apenas. É a possibilidade de eternizar um instante no tempo. Captar um momento, uma realidade, uma história. A fotografia adquire opiniões e objetivos diferentes de época para época, de pessoa para pessoa, seja por sua condição técnica ou por sua forma de aproximar pessoas. A fotografia enquanto presença tem uma forte relação com o real, quando fotografamos não apenas “congelamos” determinado momento, mas criamos uma relação de posse desses momentos e pessoas realizando uma determinada “aquisição” através da imagem. Sejam quais forem as atividades fotografadas o que importa é que as fotografias sejam tiradas e conservadas com carinho. (Susan Sontag, 1986). Diante disso, percebemos os vários usos e funções da fotografia, desempenhando um papel em várias atividades humanas. Podemos perceber a relação das pessoas com essas imagens, que por vezes são tratadas como uma aproximação do real. Antigamente os povos primitivos acreditavam e temiam que a câmara poderia roubar uma parte do seu ser, segundo Sontag (1986): Poucas pessoas nesta sociedade compartilham o pavor primitivo das câmeras que de-

corre de pensar a foto como uma parte material delas mesmas. Mas algum vestígio da magia perdura: por exemplo, nossa relutância a rasgar ou jogar fora a foto de uma pessoa amada, sobretudo quando morta ou distante. Fazer isso é um gesto cruel de rejeição. (SONTAG, 1986, p. 177).

Percebemos assim que queimar ou rasgar uma fotografia de uma pessoa que amamos seria o mesmo que estar fazendo aquilo com a própria pessoa. Quando fazemos isso sentimos como se estivéssemos rejeitando aqueles que nos magoaram. Por outro lado, guardamos com carinho as fotografias da nossa infância e daqueles já falecidos guardando imagens como se fossem a presença, pedaços de nossos sentimentos e memórias. Desde seu surgimento a fotografia confronta diversos discursos sobre seus estilos, seus gêneros e seus possíveis usos. A fotografia tem importância fundamental para diversas áreas de estudo, Kossoy (2001), diz: Toda fotografia é um resíduo do passado. Um artefato que contém em si um fragmento determinado da realidade registrado fotograficamente. Se por um lado, este artefato nos oferece indícios quanto aos elementos constitutivos (assunto, fotógrafo, tecnologia) que lhe deram origem, por outro lado o registro visual acerca daquele preciso fragmento de espaço/tempo retratado. (KOSSOY, 2001, p. 45).

O que podemos concluir, de acordo com as palavras de Kossoy, que a fotografia é um pedaço do passado. Por outro lado, uma mesma fotografia pode ser objeto de estudos e parte integrante em diversas áreas e atividades humanas. 14


A linguagem fotográfica Quase não existe uma atividade humana que não a empregue, de uma maneira ou de outra (FREUND, 1995, p. 20). As imagens fotográficas contêm em si realidades e ficções. Segundo Kossoy (2007): Toda fotografia resulta de um processo de criação; ao longo desse processo, a imagem é elaborada, construída técnica, cultural, estética e ideologicamente. Trata-se de um sistema que deve ser desmontado para compreendermos como se dá essa elaboração, como, enfim, seus elementos constituintes se articulam. (KOSSOY, 2007 p. 32).

Ou seja, toda fotografia tem sua parcela de ficção por ser produzida a partir da visão do fotógrafo, e também uma parcela de realidade por ser feita a partir de algo existente. A imagem está sujeita a identificações e interpretações. Essa interpretação varia conforme o olhar de cada pessoa, pois cada um enxerga e sente o mundo de forma diferente.(inclusive o fotógrafo). Através da fotografia, é possível “voltar” ao passado e recordar “o momento vivido, congelado pelo registro fotográfico, é irreversível” (KOSSOY, 2001, p.137). Com isso, o autor nos mostra que a fotografia não é um simples registro. Para ele, a imagem é uma representação sobre o real, mas sempre intermediada pelo fotógrafo. Quando o fotógrafo escolhe determinado enquadramento já está recortando parte do real e mostrado só o que considera interessante ou relevante. Fazendo uma simples mudança, pode-se alterar o sentido de uma foto. Sendo assim, uma mesma realidade pode ter diferentes imagens dependendo de cada fotógrafo. Segundo Kossoy (2001, p. 20) “A atuação do fotógrafo enquanto filtro cul-

tural; seu talento e intelecto influirão no produto final”. Assim, podemos perceber como uma fotografia pode transformar a realidade e influenciar pessoas. Segundo Gisele Freund (1995) A importância da fotografia não é somente em ser uma criação, mas no fato de ela ser um dos meios mais eficazes de influenciar comportamentos. A fotografia é uma forma do homem se comunicar visualmente, imagens que podem contar ou criar uma história. Esses entendimentos serão primordiais, já que a seguir vamos abordar duas estéticas de fotografias diferentes, abordando a credibilidade da fotografia jornalística e a ficção/sedução da fotografia publicitária.

1.1 A linguagem do fotojornalismo A fotografia foi uma criação inovadora, uma nova possibilidade no que se diz a respeito do conhecimento e da informação. Segundo Kossoy (2001, p. 26) “A expressão cultural dos povos exteriorizada através de seus costumes, habitação, monumentos, mitos e religiões, fatos sociais e políticos passou a ser registrado pela câmara”. Ou seja, as pessoas começaram a conhecer o mundo em detalhes, tiveram a possibilidade de receber informações de povos e acontecimentos diferentes. A possibilidade de conhecer o mundo, através da realidade da representação que a fotografia proporciona. A fotografia então começa a registrar frações da realidade, com seu poder de congelamento agregando-se aos jornais, revistas e documentos. E podemos observar isso nas palavras de Jorge Pedro Sousa (1998): “Nascida num ambiente positivista, a fotografia já foi encarada quase unicamente como o registro visual da verdade. Foi nesta condição sido adotada pela im15


A linguagem fotográfica prensa”. Aqui mais uma vez percebemos que as fotos já eram consideradas representações da realidade, além de apresentarem informações sobre os fatos ocorridos, também eram importantes para imprensa já que eternizavam o “passado”. Segundo Kossoy (2001) a fotografia tem preservado a memória visual de inúmeros fragmentos do mundo. Justamente com o poder de registrar o passado, podemos guardar informações visuais de acontecimentos, personagens e das transformações que o mundo passa. Essas imagens podem nos transmitir sentimentos de amor e ódio ou nos transportar para determinada época, são documentos para história e por esse motivo até hoje revistas e jornais são guardadas como prova de acontecimentos. Mesmo assim, ainda se questionava a possibilidade de analisar e interpretar uma fotografia enquanto documento, já que segundo Kossoy (2001) à medida que se distancia da época em que a fotografia foi produzida, mais difícil a possibilidade de suas informações serem resgatadas. É fundamental ressaltar que apesar desse questionamento Kossoy entende a fotografia como documento histórico. Segundo Charles Samaran (apud KOSSOY, 2001, p. 31), “Não há histórias sem documentos” e continua “Há que tomar a palavra ‘documento’ no sentindo mais amplo, documento escrito, ilustrado, transmitido pelo som, a imagem, ou de qualquer outra maneira”. Segundo Gisele Freund (1995): A introdução da fotografia na imprensa é um fenômeno de uma importância capital. Ela muda a visão das massas. Até então o homem vulgar apenas podia visualizar fenômenos que se passava perto dele, na rua, na sua aldeia.

Com a fotografia, abre-se uma janela para o mundo. Os rostos das personagens políticas, os acontecimentos que têm lugar no próprio país de fora de fronteiras tornam-se familiares. (FREUND, 1995, p.107)

Percebemos assim, que a fotografia jornalística fez com que as pessoas conhecessem o mundo. As fotografias nos jornais criaram a possibilidade de enxergar o mundo de uma maneira mais ampla, a imagem possibilitou uma visão do mundo que antes era impossível. No início do século XX as fotografias tornaram-se um forte meio de propaganda que era controlado segundo os interesses dos proprietários da imprensa. Gisele Freund (1995) aponta que desde o princípio a fotografia tenta fixar o acontecimento, mas a técnica que ainda era primitiva, apenas permitia imagens isoladas. Assim o fotógrafo inglês Roger Fenton foi um dos primeiros a experimentar a fotografar uma guerra e já podemos perceber os grandes passos que a fotografia estava percorrendo. Em Fevereiro de 1955, Fenton embarca com quatro assistentes para guerra da Crimeia. Ainda segundo Gisele Freund (1995, p. 108) “Essas imagens dão uma ideia muito falsa da guerra, pois representam soldados bem instalados por detrás da linha de fogo”. Além da dificuldade em capturar o instante, já que a exposição oscilava entre 2 e 20 segundos, um outro fator é relevante para essa pesquisa. O fato que a expedição de Fenton tinha sido encomendada na condição de que ele jamais fotografasse os horrores da guerra, para não assustar as famílias dos soldados. (FREUND, 1995).

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A linguagem fotográfica Imagens 3 e 4 – Guerra da Crimeia, Roger Fenton, 1955

Diante disso podemos perceber a ambivalência entre realidade e ficção, presente mesmo na linguagem da fotografia jornalística, que tem como objetivo mostrar o acontecimento e dar credibilidade. Nestas imagens de Fenton fica evidente como toda fotografia é sempre mostrada pelo recorte, poses e condições impostas para o fotógrafo, que mostra uma realidade fictícia, mostrando através das imagens a guerra enquanto um “piquenique” (FREUND, 1995 p. 108). A quantidade de variedades fotográficas que se reclamam do fotojornalismo leva-me a considerar, de forma prática, as fotografias jornalísticas como sendo aquelas que possuem “valor jornalístico” e que são usadas para transmitir informação útil em conjunto com o texto que lhes está associado. (SOUSA, 2002, p. 7).

Ou seja, existe uma grande dificuldade de delimitar o campo do fotojornalismo devido os diferentes gêneros. “A finalidade primeira do fotojornalismo, entendido de uma forma Iata, é informar”.(SOUSA, 2002, p. 8). Por outro lado, a pesquisadora Helouise Costa 1 afirma que somente no século XX houve uma mudança conceitual dessas fotografias deixando de ser apenas ilustrações, para serem definidas como uma interpretação do mundo. Neste trabalho vamos observar aquelas que possuem o valor jornalístico utilizando a finalidade da informação e a transmissão da credibilidade. O fotojornalismo também recorre ao texto, ou seja, quando estamos falando da linguagem fotojornalística devemos perceber que fotografia e texto trabalham em conjunto. 1 Afirmação em palestra “Um olhar sobre o Cruzeiro”, realizada no Centro Universitários Campus Santo Amaro no dia 16 de Abril de 2013.

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A linguagem fotográfica Segundo Sousa (2002) “A fotografia é ontogenicamente incapaz de oferecer determinadas informações, daí que tenha de ser complementada com textos que orientem a construção de sentido para a mensagem.” Um exemplo claro e presente nesse trabalho são as imagens da guerra da Crimeia, que foram utilizadas anteriormente, se o texto não informa aonde e quando a fotografia foi tirada muitas pessoas não saberiam de qual guerra se tratava. Essas imagens poderiam se apresentar como uma outra guerra da época, mas com o texto dando apoio à fotografia fica evidente de qual guerra estamos tratando. Os fotojornalistas no início da fotografia operavam com máquinas consideradas muito grandes se comparadas às atuais e, além disso, com flash de magnésio que faziam com que as pessoas tivessem certo receio. Com essas diversas restrições os fotojornalistas começaram a trabalhar com a foto única. Segundo Jorge Pedro Sousa (1998): De qualquer modo, as diversas constrições terão levado, pela imitação e pela necessidade (competição), ao aparecimento de uma das convenções mais perenes no fotojornalismo: o cultivo da foto única. Esta convenção, segundo pensamos, levou os fotógrafos a procurar conjugar numa única imagem os diversos elementos significativos de um acontecimento (a fotografia como signo condensado) de forma a que fossem facilmente identificáveis e lidos (planos frontais, etc.).

Com isso percebemos a importância do momento fixado conter informações suficientes para que a imagem seja entendida e significativa. Não simplesmente congelar um momento, mas trazer elementos que conte uma história com elementos

identificáveis para o receptor. Podemos observar a importância de sintetizar todos esses elementos em uma foto única. Segundo Sousa (2002) “A convenção da foto única levou os fotógrafos a procurar conjugar numa única imagem os diversos elementos significativos de um acontecimento”. Após a Primeira Guerra a Alemanha se torna o país com mais revistas ilustradas. Essas revistas tinham grandes tiragens e com isso um enorme público atingido. É ai o nascimento do fotojornalismo moderno, pois se trabalhava de forma diferente que segundo Sousa (2002): A forma como se articulava o texto e a imagem nas revistas ilustradas alemãs dos anos vinte permite que se fale com propriedade em fotojornalismo. Já não é apenas a imagem isolada que interessa, mas sim o texto e todo o “mosaico” fotográfico com que se tenta contar a história. (SOUSA, 2002 p. 17)

Ou seja, as fotos na imprensa mudam aparecem as fotografias espontâneas e os ensaios fotográficos com várias fotografias. Isso se dá devido à aparição de novos flashes e câmeras menores facilitando o manuseio e fazendo com que as pessoas se sentissem mais a vontade. Para Sousa (2002) os fotojornalistas precisam reunir intuição e sentido de oportunidade: Os fotojornalistas trabalham com base numa linguagem de instantes, numa linguagem do instante, procurando condensar num ou em vários instantes, ‘congelados’ nas imagens fotográficas, toda a essência de um acontecimento e o seu significado. Portanto, o foto-repórter tem de discernir a ocasião em que os

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A linguagem fotográfica elementos representativos que observa adquirem um posicionamento tal que permitirão ao observador atribuir claramente à mensagem fotográfica o sentido desejado pelo fotojornalista. (SOUSA, 2002 p.10).

Imagem 5 - “Uma tragédia brasileira – Os paus-de-arara” Reportagem de Mário de Moraes e Ubiratan de Lemos O Cruzeiro, ano XXVIII

Com isso, o fotógrafo busca condensar nas imagens tudo aquilo que quer transmitir, buscando o momento correto para que os elementos necessários estejam posicionados. Mesmo com a evolução dos equipamentos fotográficos já vinham ganhando na época os fotógrafos ainda tinham dificuldades como a revelação em banhos especiais, a profundidade de campo que ainda era limitada, a necessidade de utilizar o tripé para realização de algumas fotos. Ainda existia uma dificuldade de registras um mesmo objeto por diversas vezes, segundo Sousa (2002): Raramente se conseguiam obter várias fotos de um mesmo tema, pelo que a foto que se obtinha devia “falar por si”. Assim, começa a insinuar-se, com força, no “fotojornalismo do instante”, a noção do que, mais tarde, Henri-Cartier Bresson classificará como “momento decisivo”. (SOUSA, 2002, p. 19).

Imagem 6 - As noivas dos deuses sanguinários” Fotos de José Medeiros; texto de Arlindo Silva - O Cruzeiro, ano XXIII.

A revista O Cruzeiro foi uma das revistas que trouxe a mais completa e moderna publicação do gênero produzida no Brasil, procurava interagir com o público trazendo em suas páginas diversas fotografias jornalísticas. Nessa lógica, o fato era apresentado como uma “historia em quadrinhos”, trazendo um plano geral para mostrar do que se falava, fotografias menores como uma narrativa fotográfica e outras para dramatizar e emocionar. 19


A linguagem fotográfica 1.2 O momento decisivo Henri Cartier-Bresson foi um fotógrafo francês considerado por muitos como o pai do fotojornalismo e um dos fotógrafos mais significativos do século XX. Criador do conceito denominado “momento decisivo” que se tornou marcante dentro do fotodocumentarismo. Este conceito está apoiado na ideia de que o olhar do fotógrafo pode selecionar momentos únicos, instantes com uma pequena duração de tempo. Caso o fotógrafo não consiga esse instante, a possível obra será perdida de forma irreversível. Segundo Bresson: De todos os meios de expressão, a fotografia é o único que fixa um instante preciso. Brincamos com coisas que desaparecem, e quando elas de fato desapareceram é impossível fazê-las viver de novo (BRESSON, 2004).

momento em que o fotógrafo é criativo. (BRESSON. 1957).

Imagem 7 - Hyeres, France, 1932

Imagem 8 - Gare St Lazare, Paris, 1932

O “Momento Decisivo” impregnou-se em toda a obra de Bresson e pode-se resumi-lo nas palavras do próprio fotógrafo em entrevista ao jornal Washington Post2: Há uma fração de segundo criativo quando você está tirando uma foto. Seus olhos devem ver uma composição ou uma expressão que a própria vida oferece a você, e você deve saber com intuição quando clicar na câmera. Esse é o 2 Entrevista disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2013/01/04/henri-cartier-bresson-os-momentos-decisivos-481037.asp

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A linguagem fotográfica Diante dessas palavras, podemos reforçar ideias tratadas anteriormente como a presença do fotógrafo na imagem e o capturar dos momentos em que se têm elementos chaves para composição. Quando Bresson (2004) fala “(fotografar) é colocar na mesma mira a cabeça, o olho e o coração”, está se referindo ao interior do fotógrafo e nos mostrando mais uma vez que a fotografia conta com uma parcela particular de cada pessoa. Quando esse conceito foi formulado, Bresson certamente não estava se referindo ao esporte, mesmo porque a fotografia esportiva não era seu foco de trabalho. Mas devemos perceber que este trabalho trata do segmento esportivo e independentemente de qual seja o esporte, as ações acontecem de uma maneira veloz e imprevisível. Nos deparamos com momentos rápidos como um gol ou ponto decisivo, um lance em que a bola é arremessada rapidamente, uma disputa ou outros tantos instantes de impacto que o esporte proporciona. No entanto, os momentos mais importantes são justamente esses “decisivos”, que podem definir a história de uma partida ou campeonato. “Numa reportagem fotográfica, a gente vem contar os lances, um pouco como um árbitro, e chega fatalmente como intruso” (BRESSON, 2004, p.19). Com isso, o fotógrafo esportivo deve contar uma história com uma foto, reforçando um momento importante do jogo, como se estivesse ali bem perto dos jogadores narrando o acontecido. Uma das primeiras evidências percebidas que a fotografia publicitária poderia estar assumindo características estéticas da fotografia jornalística foi justamente a presença referencial do momento decisivo em campanhas publicitárias de determinadas marcas esportivas. Antes de analisarmos algumas dessas campanhas devemos primeiramente entender a linguagem publicitária e é isso que vamos abordar a seguir.

1.3 A linguagem publicitária e a fotografia A publicidade em seu início servia apenas para dar informações de preço ou características de determinado produto. Hoje quando se analisa a linguagem publicitária quase sempre se fala em manipulação. Segundo Nelly de Carvalho (1996) Devemos considerar que, na realidade, a linguagem publicitária usa recursos estilísticos e argumentativos da linguagem cotidiana, ela própria voltada para informar e manipular. Falar é argumentar, é tentar impor. (CARVALHO, 1996, p. 09).

Ou seja, há uma base real informativa que manipulada serve para fazer com que o público aceite essa mensagem. Relacionando o produto com os sonhos e desejos do consumidor e criando a necessidade através de elementos simbólicos como a felicidade. Com o passar do tempo a publicidade passou a ter uma linguagem própria, substituindo a objetividade da informação pela sedução e persuasão, gerando um maior consumo e a fidelização de consumidores. Dessa forma, a publicidade tenta inserir a marca na vida das pessoas, com o objetivo de estabelecer um relacionamento duradouro. A fotografia transformou-se em um elemento importante e essencial nas campanhas publicitárias. Afinal a fotografia é uma linguagem que nos meio impressos consegue sintetizar ideias, mostrar o fato e trabalhar com a sedução. O foco, luz, composição e as manipulações digitais são elementos da fotografia que podem destacar o produto e a mensagem publicitária. 21


A linguagem fotográfica A linguagem publicitária também tem importância fundamental dentro de uma sociedade, já que segundo Carvalho (1998): O papel da publicidade, vista aqui em termos gerais, como sinônimo de propaganda, é tão importante na sociedade atual, ocidentalizada e industrializada, que ela pode ser considerada a mola mestra das mudanças verificadas nas diversas esferas de comportamento e da mentalidade dos usuários/receptores. (CARVALHO, 1998 p.10).

Ou seja, acredita-se que a publicidade causa efeitos dentro de uma sociedade como é o caso dos padrões de beleza e os modelos a serem seguidos. Algo importante para se pensar quando falamos de campanhas de marcas esportivas é o corpo. Pois geralmente em campanhas deste tipo encontramos uma fotografia de corpos atléticos e muitas vezes já manipulados. Devemos lembrar que uma campanha não vende somente um produto, mas vende um posicionamento de marca e muitas vezes uma ideologia. Segundo Cleide Riva Campelo (2003) o corpo-mídia é um corpo criado pela publicidade como um suporte sígnico para fortalecer o que a marca quer vender e que muitas vezes é colocado como o ideal de corpo. Este corpo é mostrado nas campanhas e nas fotografias como algo real, possível, maravilhoso e que acaba agoniando nosso corpo biocultural (corpo vivo do homem contemporâneo). Com isso, um terceiro corpo já estaria emergindo, o desejo da busca em transformar nosso corpo biocultural em o corpo projetado pela publicidade. Campanhas de marcas esportivas também colocam esse

corpo como o saudável, jovial, corpo cuidado, o corpo feliz e através desses argumentos cria uma necessidade. Segundo Harry Pross (apud CAMPELO, 2003) “déficits emocionais buscam forçar o consumo de produtos que prometem”. Ou seja, a publicidade cria necessidades através de seus slogans, depoimentos e fotografias para fazer com que o consumidor primeiramente se identifique com características do corpo mídia e a partir disso criar uma necessidade para buscar aquilo que a campanha tem objetivo de vender. Por outro lado há quem discorde como o publicitário David Olgivy. Para ele, a publicidade não influencia no comportamento, pelo contrário, é um reflexo deste. Ou seja, para ele a publicidade não cria essas necessidades, mas vende produtos que são reflexos de comportamentos que o público já possui. Podemos assim perceber o poder que a publicidade causa dentro de uma sociedade, já que é uma linguagem da sedução e trabalha com esses comportamentos. Ao contrário de um panorama caótico e de noticias catastróficas nos jornais, a publicidade exibe o mundo da ficção e da fantasia. Segundo Carvalho (1998) a publicidade exibe o mundo da perfeição e do encanto, mas concilia com o da realidade, quando indica que determinado produto deve ser comprado para se obter determinado sucesso. É o encontrar algo extraordinário em algo banal. Possuir determinado produto é sinônimo de felicidade e realização. As campanhas publicitárias muitas vezes não vendem o “produto” e sim características simbólicas como o êxito e o conforto. “Sem a auréola que a publicidade lhes confere, seriam apenas bens de consumo, mas mitificados, personalizados, adquirem atributos da condição humana” (CARVALHO, 1996. p.13) A mensagem tenta concentrar o receptor em si próprio 22


A linguagem fotográfica dizendo a importância dos bens que ele adquire comprando determinado produto. Muitas vezes utiliza textos autoritários (slogans) e imagens (fotografias) para determinar ordens e persuadir o consumidor a ações determinadas. Aqui percebemos a importância do trabalho conjunto entre escrita e imagem na publicidade que reforça e pode direcionar o sentido de uma informação. A fotografia publicitária deve fortalecer os atributos que a campanha publicitária quer passar e dar essa visão ao consumidor. Devemos reforçar que diferentemente do instante da fotografia jornalística a fotografia publicitária é preparada e pensada, desde o cenário, garoto propaganda, luz e outros tantos fatores. Ou seja, na fotografia jornalística há uma interpretação dos fatos na qual o fotógrafo faz essa busca, na fotografia publicitária tudo é construído com a intenção (inclusive a produção de fatos) para entendimento do público. Com isso, as manipulações de imagens para fantasiar ou reforçar uma idéia tornam-se indispensáveis, as cores exaltadas, os cortes, as correções e outras possibilidades com os programas de tratamento de imagens. Na fotografia jornalística também se trabalha com cortes e correções, mas diferentemente da fotografia publicitária. No jornalismo é necessário que através dessas escolhas o fotógrafo interprete um fato e informe, na publicidade o fotógrafo deve criar pensando em potencializar a interpretação do público. Aqui já percebemos uma semelhança com o fotojornalismo devido a ambivalência de realidade e ficção. Mesmo nos anúncios mais fantasiosos é necessário mostrar parte do real para que o público crie a identificação. Essa intertextualidade o modo como a publicidade se apropria e simula a linguagem do fotojornalismo para se beneficiar de sua credibilidade será estudada nos próximos capítulos da monografia. 23


A INTERTEXTUALIDADE de estéticas

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2. Intertextualidade de estéticas A temática deste trabalho é o estudo da fotografia publicitária e jornalística, especificamente procurar saber como e o porque a publicidade se apropria de características estéticas do jornalismo. De fato já vimos no capítulo anterior que ambas exercem funções diferentes, mas já se percebeu que a ambivalência faz com que a linguagem fotográfica tenha uma parte de realidade (o objeto/cena) e uma parte de ficção (participação/ criação do fotógrafo). Por isso, o conceito de intertextualidade é importante para que se possa perceber a influência dos dois tipos de fotografias analisadas. Segundo Júlia Kristeva: A linguagem é uma cadeia de sons articulados, também uma rede de marcas escritas ou de um jogo de gestos. Em sua simultaneidade é o que exprime o modo de ser do pensamento, permitindo que englobe aquilo que aparentemente vai escapar da mente e por isso é o principal instrumento de comunicação social. (KRISTEVA, 1969, p. 17).

Com a evolução da linguagem foram surgindo novas formas de textos em diferentes áreas da comunicação. A intertextualidade teve sua origem na Teoria Literária, esse conceito foi reutilizado por Julia Kristeva em 1969 para explicar o dialogismo backtiniano de Mikhail Bakhtin, afirmando que de cada texto se constitui um intertexto numa sequência de textos já escritos ou

que ainda serão escritos. Segundo Bakhtin: Aquele que usa a língua não é o primeiro falante que rompeu pela primeira vez o eterno silêncio de um mundo mudo. Ele pode contar não apenas com o sistema da língua que utiliza, mas também a existência dos enunciados anteriores [...] cada enunciado é um elo na cadeia complexa e organizada de outros enunciados. (BAKHTIN, 1986, p. 69).

Ou seja, qualquer texto é um conjunto de outros textos caracterizado por citar ou servir como base para que seja escrito e o intertexto é aquilo que percebemos da relação desses dois ou mais textos. “Todo texto se constrói como um mosaico de citações, todo texto é a absorção e transformação de um outro texto”. (KRISTEVA, 1969, p. 85). Segundo artigo de Maranúbia Pereira Barbosa-Doiron: Em se tratando de textos não verbais, nos quais se insere a fotografia, o produtor empregará elementos de ordem visual/plástica, tais como a composição da luz, as cores, o contraste, a simetria, a perspectiva, entre outros. O destinatário – que pode ser o leitor, ouvinte ou observador - procurará estabelecer no texto significação e coerência, partindo de dados disponibilizados pelo produtor e ativando seu próprio conhecimento de mundo. (BARBOSA-DOIRON, 2010, p.174).

Com isso, a intertextualidade na fotografia se dá quando o 25


leitor reconhece ou estabelece uma relação da imagem com sua vivência. Isso pode acontecer quando o fotógrafo resgata características antigas ou trabalha com características estéticas presente em outro tipo de fotografia levando ao leitor a reconhecer esses traços. Dessa maneira, é possível que um estilo se misture com outro, num processo de intertextualidade resultando numa imagem com características de ambos. Ou seja, podemos elaborar algo novo a partir de algo existente. Como por exemplo, textos que “conversam” entre si, através de referências. Na publicidade também podemos notar campanhas que conversam com outras campanhas ou estéticas. Nesse sentido, o pesquisador e fotógrafo Ronaldo Entler3 afirma que os publicitários, com o caráter impuro e utilitário de sua atividade sabem inserir suas criações na vida das pessoas mais do que a média dos artistas. Tanto para o bem quanto para o mal, a publicidade vai ocupando sem pudor cada espaço que esteja ao alcance do olhar. Em contrapartida o fotógrafo diz que falta à publicidade assumir mais claramente seus diálogos. Essa crítica se dá principalmente por campanhas que não admitem uma referência de algo anterior ou que são assumidas com certo desconforto como, por exemplo, a campanha da anistia internacional da Agência Lowe Ginkgo de Montevidéu. O anúncio que ganhou várias premiações em Cannes informava que as imagens foram desenvolvidas pelo fotógrafo Gustavo Germano no projeto “Ausências”. Quando essas imagens foram para o blog da Agência o nome do fotógrafo foi tirado das imagens.

Iimagem 09 - Campanha da Anistia Internacional com fotos de Gustavo Germano

3 Texto: “Diálogos mal assumidos entre a arte e a publicidade” disponível em http://iconica.com.br/blog/?p=4193 acesso em: 15 de Agosto de 2013.

A citação confirma ou altera o sentido do dis-

Devemos notar que a Agência utilizou as imagens com o mesmo layout e conceito que o fotógrafo, sendo assim poderia tratar essa experiência como um apoio dado ao projeto do artista. Segundo Lucy Figueiredo: A opção em utilizar os procedimentos intertextuais deve-se, em boa parte, à tentativa de reciclar essa enxurrada de imagens que nos asfixiam, invadem nossa memória diariamente e se transformam em dejetos imagéticos. (LUCY, 2007, pág. 22).

Desse modo, o uso da intertextualidade muitas vezes é utilizado para criar o novo, utilizando informações anteriores que já tenha uma identificação com o receptor. Segundo artigo de Ricardo Zani (2003), a intertextualidade ocorre por meio de três processos: citação, alusão e estilização.

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curso mencionado e faz-se presente também em outros meios, como no teatro que cita as artes plásticas, no cinema que recorre ao teatro e nas artes plásticas que citam a própria História da Arte. A citação firma-se por mostrar a relação discursiva explicitamente e todo o discurso citado é, basicamente, um elemento dentro de outro já existente. Por sua vez, a alusão não se faz como uma citação explícita, mas sim, como uma construção que reproduz a idéia central de algo já discursado e que, como o próprio termo deixa transparecer, alude a um discurso já conhecido do público em geral. Por fim, a estilização é uma forma de reproduzir os elementos de um discurso já existente, como uma reprodução estilística do conteúdo formal ou textual, com o intuito de reestilizá-lo. (ZANI, 2003, p. 03)

No caso da referência estética que as fotografias das campanhas esportivas que serão analisadas no capítulo a seguir tem da fotografia jornalística, ao sair de casa e se deparar com uma banca de jornal ou mesmo receber o jornal na residência o leitor é “bombardeado” com imagens enormes e chamativas que estampam a frente do jornal. Imagens que seguem as características jornalísticas do instante, retratando os momentos cruciais de uma partida de futebol, corrida ou qualquer outro esporte. Devemos lembrar que essas imagens estão inseridas em uma mídia de credibilidade e que levam as informações diárias. Quando uma nova fotografia publicitária é realizada com a função de persuasão e se apropria de elementos estéticos do jornalismo, já podemos observar assim a intertextualidade por meio da alusão que não ocorre por uma citação explícita, mas

utilizando esses elementos de conhecimento do público. A publicidade utiliza isso como estratégia, uma tentativa de reciclar essas imagens que já possuem uma identificação com o leitor (fator de extrema importância no público-alvo da publicidade) e para trazer a credibilidade da informação jornalística para um produto ou marca. Quando se investiga uma imagem podemos nos deparar com características estéticas resgatadas que foram deslocadas para outro repertório e significado. Assim, essas imagens passam a ser reaproveitadas na criação de novas fotografias. “Desse modo, o procedimento nos permite recuperar o que é antigo ou muito familiar, em algo novo e desconhecido”. (LUCY, 2007, pág 67). É fundamental neste ponto perceber que o uso da intertextualidade pode beneficiar um texto ou criação, mas que seu uso indevido pode se tornar o plágio. A principal diferença esta no ponto tênue entre referenciar e se apropriar de determinado autor ou trabalho. Segundo o neurocientista Oliver Sacks4: “Plagiar” é roubar de forma intencional e consciente o trabalho intelectual de terceiros. Mas “criptomnésia” é outra coisa: esquecermos as fontes do que lemos, deixando que a memória construa a sua própria “originalidade” sobre elas. (Oliver Sacks apud João Pereira Coutinho).

Ou seja, o plágio é uma apropriação consciente de determinado trabalho, mas muitas vezes de forma inconsciente 4 Texto do colunista João Pereira Coutinho Originalmente publicado na Folha de São Paulo -Ilustrada - 05/03/2013

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apresentamos como nossos os conceitos, criações e ideias que nasceram de outros autores. Segundo João Pereira (2013) “A nossa memória é ambígua porque toma como verdade o que por vezes não foi verdade”. Na criptomnésia não é somente trabalhos literários que são apropriados de forma inconsciente, em outros casos acreditamos ter vivido experiências não vividas. Ainda segundo Oliver Sacks (apud João Pereira Coutinho): A “criptomnésia” é fundamental para qualquer atividade criativa. Se o nosso cérebro fosse um arquivo rigoroso, catalogando cada experiência ou referência com precisão mecânica, nós seríamos incapazes de funcionar ou criar. Não pela consciência insuportável de que nada é nosso. Mas pelo motivo mais básico de que todas as informações, mesmo as mais desprezíveis, ocupariam todo o “espaço” mental. (Oliver Sacks apud João Pereira Coutinho).

Com isso, percebemos que a Criptomnésia e a intertextualidade são fundamentais para a criação. Muitas vezes nós damos de frente com criações de autores como um texto, uma história ou mesmo uma fotografia que a nossa memória armazena por ser significativa. Nossa memória conserva essas informações, para que um dia possamos voltar e fazer nossas criações e significações a partir delas. Outro ponto fundamental a ser discutido o conceito de simulação, já que determinadas campanhas do segmento esportivo simulam características estéticas do jornalismo. Segundo Jean Baudrillard:

[...] a era da simulação inicia-se, pois, com uma liquidação de todos os referenciais – pior: com a sua ressurreição artificial nos sistemas de signos, material mais dúctil que o sentido; na medida em que se oferece a todos os sistemas de equivalência, a todas as oposições binárias, a toda a álgebra combinatória. Já não se trata de imitação, nem de dobragem, nem mesmo de paródia. Trata-se de uma substituição no real dos signos do real, isto é, de uma operação de dissuasão de todo processo real pelo seu duplo operatório, máquina sinaléticamataestável, programática, impecável, que oferece todos os signos do real e lhes curto-circuita todas as peripécias. (BAUDRILLARD, 1991 p. 9).

Baudrillard aponta em sua teoria de que na pós-modernidade as pessoas dão mais importância para os símbolos e que eles tem mais eficácia do que a própria realidade. Segundo ele a realidade em que vivíamos foi substituída, pois hoje vivemos a era da representação, ou seja, simulação da realidade. A definição de simulação para o Baudrillard (1991, p.9) “é fingir ter o que não se tem” (ausência), diferente da dissimulação que é “fingir não ter o que se tem” (presença). Segundo Baudrillard: Mas é mais complicado, pois simular não é fingir: “Aquele que finge uma doença pode simplesmente meter-se na cama e fazer crer que está doente. Aquele que simula uma doença determina em si próprio alguns dos respectivos sintomas.” Logo fingir, ou dissimular, deixam intacto o principio da realidade: a diferença

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continua a ser clara, está apenas disfarçada, enquanto que a simulação põe em causa a diferença do “verdadeiro” e do “falso”, do “real” e do “imaginário”. (BAUDRILLARD, 1991, p. 9).

cipalmente que mostre um ambiente que se aproxime com o cotidiano das pessoas, fazendo com que esses consumidores confiem no que estão vendo.

Ou seja, é preciso entender que simular não é fingir, pois fingir preserva sua diferença com o real deixando claro que está apenas disfarçando. Por outro lado, a simulação produz uma substituição do real. Quando estamos falando da fotografia publicitária que utiliza estratégias para seduzir o público, devemos perceber que geralmente se trabalha com imagens fantasiosas e “efeitos especiais” realizados principalmente pelo uso de programas de computadores. Essa estratégia pode ser vista como uma forma de sedução que faz com que o público acredite em algo inexistente, configurando assim campanhas claramente fantasiosas que podem gerar uma ausência da credibilidade. Com isso, é preciso que a publicidade também trabalhe com fotografias mais “realistas” e que simule “ter o que não se tem”, neste caso a credibilidade e aproximação do público com a imagem. Para Baudrillard as pessoas colocam a imagem em um lugar superior à realidade, ou seja, transformam imagem em fato. Com isso, nessas campanhas que serão analisadas no próximo capítulo vamos observar que a marca se utiliza dessas imagens para simular o realismo. A marca esportiva utiliza em suas campanhas e fotografias a imagem do produto em evidência, já que o objetivo final é fazer com que o consumidor adquira uma nova chuteira, uma bola, determinada camisa de um time e principalmente que acredite no conceito no qual a marca quer se enquadrar. Além disso, se utiliza da presença de atletas com corpos esculturais ou personalidades que seduzam o público e prin29


Imagem 10 - fotografia jornalística Brazil X England– Caio Guatelli 2007

Imagem 11 - Campanha “El corazón manda”,2009

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A primeira fotografia (imagem 10) foi produzida pelo fotojornalista Caio Guatelli no jogo entre Brasil e Inglaterra, uma imagem que mostra o momento do acontecido, que se aproxima do conceito do “momento decisivo” e que tem objetivo de informar. Facilmente vemos imagens como esta estampada na primeira página de um jornal com uma chamada e as informações de como foi o decorrer do jogo. A imagem mostra uma cobrança de falta em que os jogadores pulam na barreira tentando desviar a bola, podemos observar a expressão desses jogadores que não estão posando para uma fotografia e também a presença dos torcedores ao fundo. O movimento também é um elemento fundamental fazendo com que nossos olhos façam o percurso da bola visualizando primeiro o chute do jogador e estimulando nosso imaginário a continuar esse caminho e criar um final para esse lance. Já a segunda imagem (imagem 11) é da campanha Topper, “El corazón manda” e trás elementos muito semelhantes ao da fotografia jornalística anterior. Podemos observar que o instante retratado também é o momento em que o jogador cobra uma falta, momento esse que faz despertar nossa curiosidade com o que vem depois, o gol? O desvio da barreira? A grande defesa do goleiro? Não sabemos exatamente de que forma essa fotografia foi tirada, já que temos diversas possibilidades, seja uma fotografia tirada no momento de um jogo e depois tratada em algum editor de imagens, uma fotografia em estúdio e a colocação dos outros elementos ou até mesmo uma imagem jornalística utilizada em uma campanha publicitária. Independente disso devemos perceber que as expressões dos jogadores também não são posadas ou podem estar simulando o instantâneo. O enquadramento e o movimento são elementos muito próximos nas duas imagens e a fotografia da

campanha publicitária também trás informações semelhantes daquela que estampa uma matéria de jornal. Com isso, percebemos a simulação das características que supostamente o jornalismo possui, pois já vimos no capítulo anterior que mesmo as fotografias jornalísticas possuem sua parte de ficção. A estratégia da publicidade nesse segmento esportivo é colocar essas imagens o mais próximo possível do realismo, como o momento do acontecido e fazer com que o público olhe a imagem e se veja presente. Isso de fato é uma estratégia publicitária para trazer credibilidade para a fotografia, para o produto e para marca. O objetivo do capítulo seguinte é justamente se aprofundar na análise de fotografias publicitárias de quatro grandes marcas esportivas.

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A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo

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3. A influência da estética jornalística na fotografia publicitária do segmento esportivo Neste capítulo vamos analisar campanhas publicitárias de quatro marcas esportivas, Reebok, Topper, Adidas e Nike. Partindo da teoria de três autores: Donis A. Dondis, Boris Kossoy e Vilém Flusser, com objetivo de refletir sobre o uso de características jornalísticas nas campanhas publicitárias e avaliar a composição dessas imagens, já que segundo Dondis: Os resultados das decisões compositivas determinam o objetivo e o significado da manifestação visual e têm fortes implicações em relação ao que é recebido pelo espectador. É nessa etapa vital do processo criativo que o comunicador visual exerce o mais forte controle sobre seu trabalho e tem a maior oportunidade de expressar em sua plenitude, o estado de espírito que a obra se destina a transmitir. (DONDIS, 2003, p. 29)

Sabemos da importância que as escolhas do fotógrafo exercem diante daquilo em que se deseja transmitir, ainda mais na publicidade em que o uso de cada elemento visual deve ser pensado para entendimento e identificação de determinado público. Ainda Segundo a autora (2003), quando se cria uma imagem não se pode ter a certeza de um entendimento compartilhado mesmo porque não existem regras absolutas, mas existem determinadas ordenações que permitem com que se organize e orquestre o meio visual. Diante disso, a autora em sua teoria utiliza o que chama de “ordenações” para facilitar o entendimento visual, dividindo a imagem em elementos básicos.

Ainda segundo Dondis (2003), os significados nas criações visuais não se encontram apenas nos efeitos cumulativos da disposição dos elementos básicos, mas também no mecanismo da percepção humana. Ou seja, a partir de um significado que queremos compartilhar relacionamos cores, texturas, tons e proporções relativas criando um design. “O resultado é a composição, a intenção do artista, do fotógrafo ou do designer. É seu input”. Para a autora as escolhas do fotógrafo se resumem principalmente nos elementos que estão visíveis na imagem. Neste capítulo vamos usar alguns desses elementos para analisar as campanhas publicitárias escolhidas, mas devemos ressaltar que como já vimos nos capítulos anteriores, que a fotografia está sujeita à múltiplas interpretações, ou seja, diferentes leituras que cada pessoa faz, levando em consideração “seus repertórios pessoais culturais, seus conhecimentos, suas concepções ideológicas/estéticas, suas convicções morais, éticas, religiosas, seus interesses econômicos, profissionais, seus mitos” (KOSSOY, 2002, p.44). Ainda segundo Kossoy: Através da análise iconográfica buscamos detectar seus elementos constitutivos (fotógrafo, assunto, tecnologia) e suas coordenadas de situação (espaço, tempo). Tentávamos, assim, estabelecer um paradigma visando a reconstituição do processo que originou a representação, a partir de indicadores constantes nas imagens fotográficas: a pesquisa extensiva acerca de quem, que, como, quando e onde, de forma a individualizar cada documento fotográfico, estabelecer sua identidade e unicidade. (KOSSOY, 2007, p. 46)

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Diante disso, percebemos que quando se analisa uma imagem devemos sim considerar os elementos visíveis, mas não podemos acreditar que apenas esses fatores vão decifrar uma imagem. O que o autor chama de “informações implícitas” tem papel fundamental para compreender uma fotografia, pois são elementos ocultos da representação relativos à história e ao contexto que envolve o tema registrado. Para Kossoy (2007) “Toda fotografia tem atrás de si uma história; é este o enigma que procuramos desvendar”. Com isso, percebemos que as “ordenações” consideradas por Dondis são importantes na linguagem visual, mas que até mesmo a intenção da existência de determinada fotografia deve ser considerada para atribuir seu significado. Isso também é evidenciado nas palavras de Vilém Flusser: O significado da imagem encontra-se na superfície e pode ser captado por um golpe de vista. No entanto, tal método de deciframento produzirá apenas o superficial da imagem. (FLUSSER, 2002 p. 7)

Segundo o autor para entendimento completo da imagem devemos vaguear por sua superfície, conceito que ele define como “scanning”. Ou seja, “andar” com o olhar pela imagem, mas que segundo Flusser (2002) “O traçado do scanning segue a estrutura da imagem, mas também os impulsos no íntimo do observador”. Diante disso, percebemos que por mais que a imagem encaminhe nosso olhar para determinados elementos, cada receptor vai receber aquilo de determinada forma dependendo do seu íntimo. O significado vai depender tanto do emissor quanto do receptor. Já que segundo Flusser:

O vaguear do olhar é circular, tende a voltar para contemplar elementos já vistos. Assim, o “antes” se torna “depois”, e o “depois” se torna “antes”. [...] Ao circular pela superfície, o olhar tende a voltar sempre para elementos preferenciais. Tais elementos passam a ser centrais, portadores preferenciais do significado. (FLUSSER, 2002, p. 8)

Ou seja, as relações significativas são muito específicas, cada pessoa pode entender a imagem de uma forma, já que cada olhar pode dar preferência a determinado elemento. Antes de chegar finalmente às campanhas é fundamental ressaltar que essa análise será realizada através de um olhar. Sendo assim, vivências, costumes, a relação com a publicidade, com todos os autores colocados neste trabalho e com as marcas esportivas serão consideradas. Nada pode ser colocado como verdade absoluta e nem seria possível, já que sabemos que cada fotógrafo e cada pessoa interpreta uma imagem de forma diferente. Apesar dessa abertura que a imagem propõe, a publicidade tem o objetivo de comunicar de forma precisa, então as campanhas tem uma carga de objetividade que visa o consumo.

“El Corazón Manda” Campanha Topper A Topper em 2009 iniciou um novo posicionamento na América Latina com o conceito “Coração Manda” no Brasil e “El Corazón Manda” nos outros países latinos. A campanha mostra a intensidade de diferentes atletas e a emoção do ganhar ou 34


perder. Segundo o diretor de artigos esportivos Fernando Beer5: “A garra e a irreverência fazem parte do DNA da Topper. Por isso essas duas características latinas serão a base da nossa plataforma de comunicação multinacional”. A campanha contou com um vídeo principal de 60 segundos e outras duas versões do filme, além de mídia impressa e material no ponto de venda. Deve-se ressaltar já neste ponto que foram escolhidos os anúncios latinos, pela simulação das características do fotojornalismo presentes nas fotografias, como o momento do acontecido.

Imagens 12 – Campanha Topper, “El corazón manda”, 2009

5 Texto: “Diálogos mal assumidos entre a arte e a publicidade” disponível em http://iconica.com.br/blog/?p=4193 acesso em: 15 de Agosto de 2013.

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Imagens 13 – Campanha Topper, “El corazón manda”, 2009

A campanha de mídia impressa tem um tom emocional e mostra a intensidade dos sentimentos dos diferentes tipos de atletas. As fotografias seguem um padrão visual de elementos em planos, à frente os jogadores em determinado momento importante da partida, seja na enterrada de uma bola no basquete, ou a corrida em direção ao ponto no rugby. Outros jogadores fazem parte de um segundo plano evidenciando o primeiro jogador e ao fundo a torcida e o técnico que reforçam o momento decisivo. O movimento é um elemento presente em vários pontos da imagem, segundo Dondis: A sugestão de movimento nas manifestações visuais estáticas é mais difícil de conseguir sem que ao mesmo tempo se distorça a realidade, mas está implícita em tudo aquilo que vemos, e deriva da nossa experiência completa de movimento na vida. (DONDIS, 2003, p. 80)

Diante disso, para não perder o “realismo” que é uma das fortes estratégias da campanha, o efeito do movimento está no congelamento de elementos como na cesta do basquete, as pernas e braços dos jogadores, seus olhares e expressões faciais. A escolha desses “momentos decisivos” cria uma expectativa do andamento desses fatos, assim como um filme que se interrompido em determinado momento buscamos decifrar seus próximos capítulos. Além disso, a presença de frases “escritas à mãos” localizadas próximas a cabeça do jogador principal dão a ideia do que estão pensamento naquele momento, muito semelhante às histórias em quadrinhos. Outro fato de extrema importância e que nos dá ainda 36


mais indícios de que essa campanha busca simular características do fotojornalismo em busca do “realismo” na imagem, está na escolha do fotógrafo que realizou esse trabalho. Thierry Des Fontaines é natural da França e começou como fotógrafo de moda, mas acabou focando seu trabalho no esporte, explorando movimento e ângulos diferenciados com uma abordagem documental. É evidente que a escolha desse fotógrafo foi pensada e faz parte da estratégia publicitária, já que todos os elementos devem “conversar” e se relacionar. Sendo assim, poderiam ter escolhido um fotógrafo publicitário e ressaltar que a fotografia deveria simular características documentais. Mas, ao escolher um fotógrafo especialista em documentar esportes, a campanha se tornou ainda mais “realista” e próxima ao que o leitor está acostumado a encontrar em jornais. A imagem conta ainda com o logo da marca e slogan “El corazón manda”, conceito que busca mexer com a emoção do consumidor e criar uma aproximação, mostrando que temos que acreditar na nossa vontade de vencer. Diferentemente da fotografia jornalística a fotografia publicitária utiliza a representação da realidade como estratégia, mas devemos lembrar que em determinados anúncios não existe esse compromisso e que também são utilizadas imagens fantasiosas. Imagens essas que o fotógrafo publicitário pode montar a cena e fazer quantos disparos forem necessários para o efeito desejado. Ao contrário da fotografia jornalística que em geral busca retratar o momento do acontecido e o instante. Com isso, a estética da fotografia jornalística remete à representação da realidade e, por isso, vem fazendo parte de campanhas do segmento esportivo que através da simulação e da intertextualidade, utiliza características da publicidade e do jornalismo para conseguir a credibilidade de determinado público para

sua marca. Assim, através da intertextualidade essas ”novas” imagens são construídas com a mistura da linguagem publicitária e jornalística.

“Run easy” Campanha Reebok A princípio o posicionamento “I am what I am”, foi lançado em 2005 e contava com ícones da música como Jay-Z, 50 Cent e atletas consagrados como o goleiro Iker Casillas. A campanha encorajava o jovem a assumir suas individualidades. Em 2007 a marca continuou com o mesmo posicionamento na nova campanha “Run easy”, tendo o propósito de motivar as pessoas a correrem por diversão, mostrando que correr é um esporte não apenas destinado aos maratonistas. Essa foi a saída encontrada pela agência Mcgarrybowen/ 180 Amsterdam para desafiar a Nike. Os anúncios impressos são visto por muitos, como uma provocação a concorrente Nike, já que carrega a mensagem “What are you Just doing? Run easy”. Enquanto o slogan da Nike era “Just do it”. Os vídeos da campanha sugerem ainda que os produtos são para homens comuns e destaca hábitos sociais, como o prazer de correr com amigos e ter boas conversas. A ação atinge as mídias convencionais e é apoiada por um site, que funciona como uma rede social, com direito a blog e fotolog.

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Imagens 14 e 15 – Campanha Reebok, “Run Easy”, 2007

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A mídia impressa traz imagens agressivas, fazendo com que o leitor se sinta agoniado e que pense o porquê dessa aflição. Essas fotografias apresentam corredores que estão em situações nada confortáveis, já que o primeiro aparece exausto e a segunda com a expressão de dor. É fundamental perceber que o texto da campanha está em primeiro plano, pois para entendermos os motivos de tamanho desconforto é necessário que texto e imagens trabalhem juntos. Sim, desconforto seria talvez um dos pontos fundamentais dessa fotografia, já que nessa campanha a Reebok deixa de lado o posicionamento de desempenho e mostra o lado negativo do famoso, “no pain, no gain” (sem dor, sem ganhos), utilizado por diversos atletas e marcas. Outro elemento importante para ressaltar a ideia de cansaço e que faz com que nosso olhar percorra toda a imagem é o contraste, que segundo Dondis: As variações de luz ou de tom são os meios pelos quais distinguimos oticamente a complexidade da informação visual do ambiente. Em outras palavras, vemos o que é escuro porque está próximo ou se superpõe ao claro, e vice-versa. (DONDIS, 1997, pag. 61).

cado. As imagens são como flagras, como se estivéssemos no local olhando a dor desses atletas, essas imagens se aproximam da estética do jornalismo como o momento do acontecido. Esse momento é reforçado com a presença da garrafa e do copo que possivelmente o atleta tinha acabado de tomar e ainda o pano que o cobre. Esses objetos provavelmente seriam retirados em uma campanha publicitária tradicional para construção de uma imagem limpa e com um ambiente idealizado, mas nessa fotografia simulam a despreocupação para enfatizar a simulação do flagrante do fotógrafo. Já na segunda imagem a presença de um colaborador do evento ou até mesmo o técnico, já que apresenta uma credencial em seu pescoço e que tenta ajudar a corredora caída. Apesar de um mesmo posicionamento da marca devemos perceber que do início desse discurso em 2005 até a campanha “Run easy” em 2007, foram apenas 2 anos. Mas, que a estética fotográfica dessas duas campanhas são muito diferentes. Imagens 16 - Campanha Reebok, ““I am what I am”, 2005.

O uso de uma imagem com contraste faz com que nosso olhar diferencie cada elemento na cena e que vá e volte como o “scanning”. Olhamos o chão asfaltado, a vestimenta do atleta, sua expressão e cada músculo de seu corpo. Com isso, as imagens se tornam ainda mais dramáticas, já que esses elementos reforçam que o atleta passou de seus limites. Ainda segundo Dondis (1997), o contraste, como estratégia visual para aguçar o significado, não é só capaz de estimular e atrair a atenção, mas também choca e dramatiza este signifi39


Imagens 17 - Campanha Reebok, ““I am what I am”, 2005.

Desse modo, a intertextualidade dessas duas linguagens é utilizada para criar o “novo” (uma nova imagem com características da fotografia publicitária e do fotojornalismo). Ou seja, utilizar imagens que o público está acostumado para trazer essa credibilidade para uma campanha publicitária.

“All in” Campanha Adidas

Diferentemente dos “flagras” das primeiras imagens, a campanha em 2005 contou com fotografias posadas. Além disso, o tratamento e a montagem das imagens são evidentes, já que conta com diferentes cenas contrapostas, a coloração e iluminação certamente retocadas em pós-produção. É necessário mais uma vez ressaltar que as fotografias das duas campanhas apresentam realidades e ficções (Kossoy), mas que a diferença principal entre elas está em admitir o uso da ficção através de uma imagem totalmente sedutora ou simular “o real” através das características do jornalismo. O fundamental neste trabalho não é comparar a eficácia das duas campanhas, pois sabemos que elas são de anos e possuem objetivos diferentes. Mas deve-se perceber que assim como a campanha “I am what I am”, utiliza garotos propaganda famosos e os efeitos gráficos para seduzir o público, a campanha “Run easy”, utiliza a simulação das características do fotojornalismo também como uma outra estratégia publicitária.

A marca lançou em 2011, a campanha global “Adidas All In”, estrelada por famosos cantores e jogadores. O conceito da campanha explora a conexão através da música e o esporte na vida das pessoas. A campanha mostra a presença da marca em diferentes esportes, unindo todas suas linhas de produtos e submarcas em uma identidade única, comprovando sua abrangência e diversidade. A agência Sid Lee, de Montreal, criou e produziu a campanha mundialmente. Já no Brasil, a Lew Lara/TBWA e ID/TBWA adaptaram a campanha e o plano de mídia para o mercado local. Segundo o membro do conselho executivo responsável por marcas globais Erich Stamminger6 : Nos últimos dez anos tivemos muito sucesso dividindo a companhia em três fortes subcategorias: Sport Performance, Originals e Sport Style. Agora estamos orgulhosos em mostrar nosso alcance e profundidade com esse esforço global, “All adidas” é a nossa maior cam6 Entrevista disponível em: http://www.revistafatorbrasil.com.br/ver_noticia. php?not=149853, acesso em 30 de Setembro de 2013.

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panha já executada. Seu conceito criativo traz toda nossa diversidade em uma só mensagem. Das quadras às passarelas, dos estádios às ruas, estamos apresentando uma declaração autêntica com toda a credibilidade que só a adidas tem.

Já é fundamental perceber que termos como “declaração autêntica” e “credibilidade” são usados como discurso dos responsáveis pela marca. Sendo assim, é evidente que a estratégia fotográfica e toda a comunicação da campanha tragam esse conceito. No Brasil, a campanha se destacou pelo grande volume de anúncios que foram veiculados. Além dos anúncios impressos, inserções em grandes emissoras de TV e a internet foram fundamentais para divulgação.

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Imagens 18 - Campanha Adidas, “All in”, 2011.

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Imagens 18 - Campanha Adidas, “All in”, 2011.

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Todas as fotografias dessa campanha apresentam uma identidade visual muito semelhante, sempre um personagem principal ao centro da imagem congelada em um momento de comemoração. Em ambos os anúncios apresentados, predominam as cores dos uniformes e a fotografia com fundo desfocada chamando a atenção do leitor para o jogador em evidência. Já as expressões faciais dos jogadores, seus cabelos no ar e até mesmo as dobras de seus uniformes são elementos que reforçam o movimento na imagem. O slogan da campanha acompanhado do logotipo da marca, as três listras em branco no centro da imagem criam uma linha, que segundo Dondis (1997):

imagem fantasiosa, quanto uma que utiliza principalmente a simulação do real para também seduzir o público. Imagens 20 e 21 – Campanha Adidas, ““Impossible is nothing”, 2008

Também poderíamos definir a linha como um ponto em movimento, ou como a historia o movimento de um ponto, pois, quando fazemos uma marca continua , ou uma linha, nosso procedimento se resume a colocar um marcador de ponto sobre uma superfície e movê-lo segundo uma determinada trajetória, de tal forma que as marcas assim formadas se convertam em registro. (DONDIS, 1997, p. 35)

Com isso, o movimento da imagem se torna ainda mais forte, como se na primeira imagem essas listras estivessem marcando a trajetória do jogador Messi em sua comemoração, já na segunda, o movimento é construído pelo cruzamento do jogador Ola Toivonen em direção contrária às listras. Outro ponto chave dessa análise é mostrar suas diferenças com uma campanha anterior, já que assim podemos perceber as características tanto de uma campanha que utiliza uma 44


Essas imagens são da campanha criada pela agência TBWA da China, para comemoração das olimpíadas de Pequim em 2008. Nas peças é ressaltado o sentimento de apoio vivido pelos chineses, como se estivessem ajudando ao atleta. A campanha chamada “Impossible is nothing” (em português, Nada é impossível), tem muito aver com a personalidade, a paixão dos chineses pelo esporte e em especial a enorme população do país. Os anúncios também contam com o congelamento de um momento importante em cada um dos esportes, mas esse momento é destacando por um jogador e utiliza as expressões e corpos para enfatizar o movimento na imagem. Mas, apesar dessas similaridades com as características da campanha “All in”, é fundamental perceber que as fotografias contam com efeitos gráficos, um exemplo disso é perceber que a grande torcida é retratada quase como um desenho rabiscado. Apesar da imagem também contar com a ideia do momento decisivo, esse elemento é colocado de forma diferente em cada uma das campanhas. Percebemos que o atleta está congelado como uma estátua, diferentemente da campanha “All in” em que os jogadores apesar de congelados sugerem um movimento com suas expressões e gestos. Devemos perceber que a primeira campanha trabalha com celebridades mundialmente conhecidas como os jogadores Lionel Messi e Ola Toivonen, característica principalmente da fotografia publicitária. Ao mesmo tempo simulam o momento decisivo do jornalismo, assim podemos perceber mais uma vez a intertextualidade entre as duas linguagens.

“Encontre sua grandeza” Campanha Nike A Nike é uma marca de produtos esportivos conhecida mundialmente, famosa por suas grandes campanhas e patrocínio em grandes eventos e campeonatos ao redor do mundo. A campanha “Find Your Greatness” criada nos jogos olímpicos de 2012 ganhou uma versão nacional intitulada “Mostre sua grandeza” realizada pela agência Wieden+Kennedy. A campanha mostra uma visão da marca sobre o esporte no Brasil, valorizando os amantes de diversos esportes e ressaltando que se você é um atleta profissional ou amador, vai encontrar sua grandeza. Conta ainda, com a participação de atletas amadores e de famosos patrocinados pela marca, entre eles estão o lutador Anderson Silva e o jogador de futebol Neymar. Segundo Henry Rabello7 , diretor de marketing da Nike no Brasil: É uma campanha que fala a todos os brasileiros. Atletas como eu e você. Ela traz uma mensagem local forte e aumenta a conexão da marca com o País, seus atletas, a enorme fatia da população que se exercita e aqueles que carregam o vírus da paixão pelo esporte. Acreditamos que todos podem encontrar sua grandeza, basta querer e fazer com que isso aconteça.

7 Entrevista disponível em: http://portalimprensa.uol.com.br/cdm/ caderno+de+midia/55242/nova+campanha+da+nike+exalta+grandez a+dos+atletas+brasileiros, acesso em 26 de Setembro de 2013.

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Seu lançamento em Dezembro de 2012 contou primeiramente com um vídeo principal de 60 segundos e outros nove vídeos de 30 segundos, destinados a diversas modalidades desde futebol, corrida, boxe, natação e surf. Além desses vídeos a campanha contou com os anúncios impressos que serão analisados a seguir e uma ação de mídia social no twitter com a hastag #grandeza que era utilizada para o público compartilhar seus desafios, quebras de recordes e missões traçadas nas redes sociais.

Imagens 22 – Campanha Nike, “Encontre sua grandeza”, 2012.

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Imagens 22 – Campanha Nike, “Encontre sua grandeza”, 2012.

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As fotografias dessa campanha sempre mostram um personagem principal praticando determinado esporte, o grande texto ao lado trás mensagem de incentivo ao atleta e contribui para enfatizar o conceito de buscar o seu melhor, se esforçar, acreditar e encontrar sua grandeza. O primeiro elemento que chama atenção na imagem é uma aparente falta de qualidade, como um ruído muito semelhante às fotografias de baixa resolução. É evidente que essa escolha não é por acaso, já que isso aproxima o público do ambiente do atleta, como se o público estivesse fotografando com seu celular. A primeira imagem do jogador Neymar, conta com um momento de explosão como se ele estivesse comemorando um gol ou uma conquista de campeonato. A luz que vem em direção ao rosto, corpo e está presente até mesmo no cabelo do jogador até poderia ser vista como um elemento trabalhado em pós-produção e assim perder a força da simulação das características do jornalismo, mas já que Neymar é considerado um garoto prodígio essa luz é vista como uma iluminação divina que o atleta possui. O texto presente na imagem também é importante para mostrar que o jogador escolheu a grandeza. Já a segunda imagem é muito parecida com uma fotografia documental e são evidenciados elementos como os músculos e o suor do lutador Anderson Silva. Diferente da luz divina de Neymar o texto que acompanha a imagem do lutador sugere que para ser grande não é preciso talento e sim suor, fazendo também uma ligação com a vida do atleta que é considerado um dos maiores da categoria e que sempre está treinando em busca do melhor. Devemos perceber que em praticamente todas as campanhas o corpo tem papel fundamental para a construção do

movimento na imagem, através de gestos congelados e reconhecidos pelo leitor, segundo Gunter Gebauer (2006): Gestos são imagens de movimento formadas. Em um sentido especial, são formas estereotipadas constituídas por movimentos e que são utilizadas de forma semelhante a palavra, como, por exemplo, os gestos que acompanham uma conversa, apontam para algo, expressam reconhecimento, etc.

Ou seja, quando olhamos e reconhecemos esses gestos decisivos e congelados das campanhas, geramos um movimento como se criássemos a continuação da cena. Já vimos anteriormente que cada pessoa carrega informações e vivências dentro de seu cérebro como uma gaveta que guarda documentos. Já que segundo Gunter Gebauer (2006): Há aparentemente uma conexão interna entre a memória motora e a de imagens, onde, além de aspectos visuais, emoções, significados sociais e valores são também guardados.

Com isso, percebemos que o movimento em determinada imagem também depende da interpretação e da relação do leitor com o que está visualizando, mas que as marcas utilizam os gestos do corpo em suas imagens buscando despertar o movimento em cada pessoa. Outro aspecto importante é que apresentam gestos típicos de um herói, que segundo Gunter Gebauer:

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Arremessar é o gesto da ira divina; o levantamento tem caráter heracliano; o arremesso de peso é uma tarefa sobre-humana; saltar é o ato de guerreiros astutos, que se superam por flexibilidade. A elevação do adversário antecede ao derrubar que o põe em contato com a terra e, com isso, o faz perder seu poder. Todos os gestos atléticos são uma questão de força, flexibilidade e sutileza da execução do movimento.

Sendo assim, esses gestos muitas vezes reforçam o conceito da marca, colocando seus produtos como parte desses guerreiros. Percebemos também que muitos atletas famosos são utilizados nas campanhas analisadas, já que além de serem personalidades que estampam as capas de jornais e que são mundialmente conhecidos trazem credibilidade para marca, são vistas como ícones, com poderes e como heróis.

Considerações finais Desde a escolha do tema, que sem dúvida deve-se a interesse pessoal e a relação com a publicidade e a fotografia, as estratégias fotográficas de determinadas marcas esportivas sempre instigaram a desvendar os elementos que constituem seus anúncios. Neste trabalho alguns aspectos desta curiosidade foram satisfeitos, na medida em que a proposta de analisar as características da fotografia jornalística e da fotografia publicitária e verificar seus pontos em comum foi concretizada. Outros pontos como a importância da fotografia dentro da sociedade e o fotógrafo como um filtro participante da imagem através das suas vivências e costumes, foram fundamentais para verificar até que ponto a fotografia é uma representação da realidade e deve ser entendida assim, já que mesmo o jornalismo possui imagens fictícias pela ambivalência do real e do fictício presentes em todas fotografias. Ao final das análises e de todo o estudo realizado é possível verificar a intertextualidade e simulação de elementos do fotojornalismo na fotografia publicitária, como um recurso estratégico de criar sentidos para o receptor, neste caso o efeito de realismo. Uma das características fundamentais para essa percepção foi o conceito do momento decisivo de Henri Cartier-Bresson, ou seja, constata-se que a linguagem publicitária do segmento esportivo vem incorporando aspectos usados na fotografia jornalística. Imagens que simulam as características do fotojornalismo, entre eles o momento do acontecido e menos uso de efeitos fantasiosos. Uma estratégia de persuasão do discurso publicitário para trazer credibilidade para sua fotografia e conseqüentemente para sua marca. Essa intertextualidade entre as estéticas jornalística e publicitária gera uma nova imagem com características de ambas, 49


assim um novo meio para comunicar e seduzir o público e que pode ser um possível caminho que as campanhas esportivas continuem seguindo daqui por diante. Com o desenvolvimento deste trabalho, e principalmente com os autores e teorias trabalhadas, foi possível conciliar aspectos de todo universo de conhecimento construído no decorrer do curso. É fundamental ressaltar que essa pesquisa não termina aqui, já que outras interrogações surgiram e podem abrir novas perspectivas de investigação, entre elas, como e porque se dá a intertextualidade das características estéticas da fotográfica publicitária nas imagens de noticias jornalísticas.

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