CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC
Rodrigo Martins Seixas
Brasil, ame-o ou…ria dele! Um estudo das charges no período da ditadura militar brasileira.
São Paulo
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2013 Rodrigo Martin Seixas
Brasil, ame-o ou…ria dele! Um estudo das charges no período da ditadura militar brasileira.
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário Senac – Campus Santo Amaro, como Exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Publicidade e Propaganda. Orientador: Profª Maria Cândida Almeida
São Paulo
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2013
Rodrigo Martins Seixas Brasil, ame-o ou…ria dele! Um estudo das charges no período da ditadura militar brasileira Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro
Universitário
Senac
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Campus
Santo
Amaro, como Exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Publicidade e Propaganda. Orientador: Profª Maria Cândida Almeida A banca examinadora dos Trabalhos de Conclusão, em sessão pública realizada em ___/___/___, considerou o(a) candidato(a): 1) Orientadora(a) 2) Examinador(a)
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Para aqueles que me fizeram viver no mundo da lua olhando para uma folha de papel.
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AGRADECIMENTOS A minha orientadora que me mostrou como um bom pesquisador faz uma boa pesquisa e que o importante não está naquilo que se referencia, mas no que criamos a partir delas. A minha namorado pela paciência e incentivo. Aos meus amigos que mesmo na ausência estiveram presentes. Ao meu pai pelo apoio e ao meu irmão pelas guerrilha psicológica. Finalmente a minha mãe que me apresentou primeiramente ao prazer da leitura e posteriormente pelo interesse por essa época tão sombria da historia brasileira.
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Eu posso não ter ido para onde eu pretendia ir, mas eu acho que acabei terminando onde eu pretendia estar. Douglas Adams
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RESUMO Este trabalho tem como objetivo analisar as charges feitas no período da ditadura militar do Brasil. Essa analise foi feita para se descobrir se esse material publicado tinha como função uma ampliação da consciência das massas contra o regime militar e assim tentar convencer o povo a lutar pelos seus direitos ou se essa era a maneira que os artistas que criavam essas narrativas acharam para apaziguar o peso dessa época. O trabalho também busca discutir como era possível nesse período de tanta dor se fazer rir sem que o humor fosse banalizado. Além da analise do objeto foram feitas pesquisas sobre a historia da ditadura militar no Brasil, para descobrir quais personagens e momentos históricos poderiam ter uma maior proximidade com o tema. Para complementar o trabalho proposto, existe também a criação de um projeto experimental no formato de vídeo documentário que complementa a trabalho escrito para a elucidação das questões já apresentadas. A criação deste documentário tem um embasamento teórico sobre cinema, linguagem videográfica e política dentro do próprio documentário. Assim este trabalho está dividido em três capítulos: o primeiro onde se discute as questões teóricas do documentário. O segundo que trata do período da ditadura militar no Brasil e o terceiro capitulo que mostra a evolução do projeto experimental criado.
Palavras-chave: 1. Quadrinhos. 2. Ditadura militar no Brasil. 3. Vídeo documentário.
ABSTRACT
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SUMÁRIO Introdução: ..................................................................................................................................... 10 Objeto delineado ........................................................................................................................... 11 Recorte ............................................................................................................................................. 12 1. Linguagens do vídeo documentário .................................................................................. 13 1.1. A origem ............................................................................................................................................. 13 1.2. A Linguagem do vídeo ................................................................................................................... 19 1.3. O vídeo documentário ................................................................................................................... 24 1.3.1. Serguei Eiseinstein ................................................................................................................................... 24 1.3.2. Dziga Vertov ................................................................................................................................................ 27 1.3.3. O Vídeo documentário, da descrição a linguagem. ..................................................................... 30 1.4. Os documentários políticos brasileiros .................................................................................. 34 2. O Desenho da Ditadura .......................................................................................................... 39 2.1. A Ditadura ......................................................................................................................................... 39 2.1.1. O Pré Golpe ................................................................................................................................................... 39 2.1.1.1. O Brasil Militar ........................................................................................................................................ 43 2.1.1.2. A linha dura .............................................................................................................................................. 46 2.1.1.3. A Ditadura Oficializada -‐ A.I. 5 ........................................................................................................ 49 2.1.1.4. O Começo do Fim ................................................................................................................................... 57 2.1.2. É proibido – A Censura e suas caras ...................................................................................... 59 2.1.3. É Proibido proibir -‐ A Liberdade Contra a Ditadura ....................................................... 63 2.2. O Desenho ......................................................................................................................................... 68 2.2.1. O Gênero Charge .......................................................................................................................... 68 2.2.2. A Politica do Riso ......................................................................................................................... 73 3. Recontando a História ...................................................................................................................... 74 3.1. PRÉ-‐ROTEIRO ................................................................................................................................... 74 3.1.1. INDICAÇÃO DO TEMA ............................................................................................................................. 74 3.1.2. DESCRIÇÃO DO PROBLEMA ................................................................................................................. 74 3.1.3. ELEIÇÃO E DESCRIÇÃO DOS OBJETOS ............................................................................................. 75 3.1.4. ELEIÇÃO DE PESQUISA E ENTREVISTADOS ................................................................................. 76 3.1.5. ELEIÇÃO DE LOCAIS ................................................................................................................................ 79 3.1.6. ELEIÇÃO DE IMAGENS ............................................................................................................................ 81 3.1.5. ELEIÇÃO DE PRODUTOS AUDIOVISUAIS ........................................................................................ 87 4. Referências ................................................................................................................................. 89
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Introdução: A história do Regime Militar no Brasil já foi vista de vários ângulos, a grande maioria deles relatos pesados e tristes sobre uma época em que a vida não foi fácil. São livros, filmes, peças, várias histórias contadas nas mais diferentes plataformas, mas, na sua maioria, com o mesmo ponto em comum: mostrar a perseguição, a tortura e falta de liberdade política e de expressão. Talvez, essa foi a forma que autores e criadores, dessas histórias, acharam para, não só mostrar a todos os horrores dessa época, mas também homenagear àqueles que sofreram algum tipo de violência e assim libertar seus demônios. Entre tantas manifestações artísticas, esta pesquisa foca nas mídias de massa impressas, que tinham o mesmo objetivo de outras mídias, o de revelar a real situação do país, porém de forma mais inteligente e mais humorada, Esse tipo de produção conseguiu atingir um número muito maior de público sem sofrer tanta opressão do regime militar, que muitas vezes acabava não entendendo o conteúdo camuflado e de duplo sentido escondido nesse tipo de mídia. As pessoas responsáveis por essa visão diferenciada eram os cartunistas e chargistas que usavam as mídias de massa impressas para passar sua mensagem de uma forma que o grande público pudesse absorver, tanto consciente como inconscientemente, e assim criar ou fortalecer um senso crítico contra o regime. Apesar da força e da mensagem tão persistente quanto das outras mídias, a perseguição contra essa forma de protesto teve um atraso e até certo tipo de “leveza” durante o regime. A visão criada por esses “ilusionistas”, mestres da síntese, conseguiu na pior fase da história recente do Brasil com que muitos sorrissem ou lutassem rindo. Este trabalho tem como proposta analisar os cartuns produzidos durante a ditadura no Brasil com o objetivo descobrir se essa produção humorística antiregime militar foi construída para ampliar a consciência da massa e instigar o povo na luta contra a ditadura ou era a forma que esses artistas encontraram para aliviar o peso dessa época tão conturbada. Além disso, busca-se discutir, ainda, como era possível diante da dor fazer rir sem banalizar o humor.
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Com o estudo desses quadrinhos e do background da época, o projeto também tem como produto final a construção de um documentário audiovisual que vai se aprofundar nos relatos vividos de cartunistas, sociólogos e militantes para conseguir tirar uma conclusão sobre as motivações que levaram os cartunistas a fazer esse trabalho de humor sociopolítico. Para isso, entrevistas com alguns desses cartunistas, que criavam a arte nos jornais e revistas; de estudiosos da área da sociologia e de pessoas que estiveram diretamente ligados com a luta contra o regime militar é fundamental. Alguns autores chaves serão trabalhados para cada área de interesse. No caso do áudio visual o principal nome será o de Arlindo Machado, grande estudioso brasileiro da sétima arte no mundo e no Brasil. Suas duas obras escolhidas como referencias para a pesquisa devem auxiliar não apenas a criação do documentário, mas também servir como um olhar de um especialista dentro da área do áudio visual sobre o período da ditadura. Para o capitulo sobre os quadrinhos partiremos dos estudos e trabalhos de Will Eisner; além de levantamentos de jornais e revistas que abriram espaço para tais publicações. Entre as varias fontes, a principal escolhida foi o jornal que era referencia na luta contra a ditadura de forma bem humorada e que usava os quadrinhos como principal arma, o Pasquim. Essas são as fontes escolhidas como principais referências e pontos de partida para o estudo do tema. Objeto delineado O objeto de estudo desse projeto experimental são os cartuns e charges que foram publicadas durante o período da ditadura militar no Brasil. Consequentemente, faz parte deste objeto os principais personagens e pontos de destaque da historia brasileira que de alguma forma foram importantes para diminuir a força do regime militar durante os anos de 1964 até 1985. Assim a análise da conjuntura histórica é ponto fundamental para entender quem são os artistas de maior destaque dentro do tema e do recorte proposto, e que podem agregar muito conteúdo ao documentário. Só depois do estudo e da síntese desse objeto será possível começar a produção do audiovisual em forma de documentário.
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Recorte Apesar do tema aparentemente apresentar certa abrangência e o contexto ser considerado longo (1969 até 1974) o recorte delimitado propõe um foco sobre o tema. Isso porque o objeto de pesquisa passa a ser em determinado momento sobre três nomes do cartum brasileiro, que serão escolhidos no decorrer do projeto. Apesar de essa escolha ser feita mais para frente uma pré-seleção já foi feita e conta com nomes: Ziraldo, Glauco, Henfil, Adão, Angeli, Caco, Laerte, Jaguar, Ota, Reinaldo, Nani entre outros que no decorrer da pesquisa pareçam relevantes ao trabalho.
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1. Linguagens do vídeo documentário Esse primeiro capítulo tem como objetivo analisar e discorrer não apenas sobre a linguagem do documentário, mas também apresentar uma parte da história do cinema e do vídeo, passando pelo chamado pré-cinema quando a linguagem sonora ainda não estava plenamente integrada ao produto cinematográfico. Tempo este, em que a chamada sétima arte começou a ser descoberta pelo público até chegar nas vanguardas cinematográficas e por fim na montagem soviética, onde o gênero documentário ganhou força dentro do cinema, através das experiências de Dziga Vertov (02/01/1896 – 12/02/1954) e Serguei Eisenstein (23/01/1898 – 11/02/1948). É parte integrante, ainda, das nossas discussões, o levantamento e abordagem da utilização do videodocumentário no trato e representação das manifestações e mudanças sócio-políticas, especialmente, no contexto brasileiro recente. Especificamente, tratamos, aqui, do contexto da ditadura militar (1964 – 1984), período em que o país vivenciou um forte controle do Estado sobre a população. 1.1. A origem Toda a história tem um começo, um ponto de partida que traz, na maioria das vezes, a primeira referência do objeto estudado. Esse começo é delimitado não apenas para elaborar uma linha cronológica de acontecimentos que podem influenciar esse estudo no decorrer dos anos, mas também para mostrar que algumas vezes a pesquisa, por mais recente que ela pareça ser, pode começar a alguns milhares de anos atrás. O vídeo é um desses casos. Descendente direto do cinema, o vídeo adquire contornos próprios da sua linguagem, na medida em que suas características se ligam a várias outras expressões artísticas, dando ao vídeo um caráter híbrido de linguagem. No entanto, afirma-se com toda clareza, que a sua origem está diretamente ligada à evolução da linguagem cinematográfica. Linguagem, esta que alguns estudiosos apontam um possível nascimento do discurso cinematográfico (mais especificamente, o uso da imagem em movimento) na própria história da humanidade.
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Podemos buscar referências, inspirações e aproximações voltando a era pré-histórica, dentro do Paleolítico Superior, conforme nos alerta Machado (2011)1. O período magdalenense2 foi rico no que diz respeito às pinturas rupestres. Essas pinturas que antes eram consideradas apenas relatos cotidianos feitos por aqueles “homens das cavernas”, agora são vistas em alguns casos como sessões de “cinema”. Isso por que foi constatado por pesquisadores e cientistas que questionavam a superposição das formas e o porquê dessas pinturas terem sido feitas no fundo das cavernas. A resposta, segundo Arlindo Machado é que: [...] à medida que o observador se locomove nas trevas da caverna, a luz de sua tênue lanterna ilumina e obscurece parte dos desenhos: algumas linhas se sobressaem, suas cores são realçadas pela luz, ao passo que outras desaparecem nas sombras (MACHADO,2011, p. 16).
Apesar dessas constatações não se pode dizer que o cinema começou ali, essa forma de entretenimento foi criada porque era a única forma que os homens pré-históricos conheciam para contar suas histórias. E até onde se sabe nunca houve pretensão para que o processo evoluísse. Porém, como disse Wachtel (1993 apud MACHADO, 2011, p.16) “os artistas do Paleolítico tinham os instrumentos do pintor, mas os olhos e a mente de um cineasta. Numa palavra, eles já faziam cinema underground”. Apesar do olhar cinematográfico ter nascido tão cedo ele acabou morrendo e por muito tempo foi esquecido pelo homem quase que por completo. Alguns relatos desses olhares diferenciados de um cineasta apareceram, algumas vezes, durante a história antiga. Na Grécia o mito da caverna de Platão pode ser interpretado como umas das primeiras tentativas, mesmo que apenas narradas, de se criar um aparato para “reproduzir” a vida de forma animada. Mas se a concepção do pré-cinema começa tão antigamente por que a história dá um salto tão longo para onde os pesquisadores chamam de início do cinema? Cinema é 1
No livro Pré-cinemas e Pós-cinema, Arlindo Machado traz uma importante contribuição sobre a origem histórica da linguagem do cinema. Principalmente quando encontra em outros pesquisadores uma relação entre os desenhos rupestres e uma linguagem que poderia ser considerada cinematográfica, no sentido de apresentar a mesma técnica de ângulos de câmera, enquadramento e narrativa do cinema. 2 O período Magdalenense é a ultima subdivisão do Paleolítico Superior, ocorreu entre os anos de 17.000 a.C a 9000 a.C.. Foi durante esse período que se desenvolveu a arte de desenhos nas paredes de cavernas, e gravações e esculturas em pedras e ossos.
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ci.ne.ma, sm (abrev de cinematógrafo) 1) Arte ou ciência da cinematografia. 2) Estabelecimento ou sala de projeções cinematográficas. C. falado: projeção cinematográfica em que se ouve a fala dos atores, os sons decorrentes da própria ação e outros, criados pelo diretor, para produzir certos efeitos; cinema sonoro. C. mudo: projeção cinematográfica não acompanhada dos sons que caracterizam o cinema falado. C. sonoro: o mesmo que cinema falado (MICHAELIS, 2010 p.383).
Definição tirada do dicionário ajuda a estabelecer como hoje identificamos as principais características do cinema moderno e assim estabelecer um paralelo para descobrir quando elas começaram a aparecer no decorrer da história. Foi no século XIX quando o “cinema” não passava de um aparelho técnico para cientistas decomporem o movimento e um espetáculo para as massas em feiras e circos que os primeiros protótipos do cinema moderno foram surgindo. Isso não ocorreu abruptamente e muito menos de forma pensada e elaborada. Sua evolução aconteceu por acaso por causa dos avanços tecnológicos e principalmente por causa de homens de visão que olharam para uma máquina de “animar fotos” e viram nela a oportunidade de colocar um pouco de “ação” na vida. Uma das primeiras “máquinas” que ajudaram a fazer o cinema surgir foram as projeções de lanterna mágica, “nas quais um apresentador mostrava ao público imagens coloridas projetadas numa tela, através do foco de luz gerado pela chama de querosene, com acompanhamento de vozes, música e efeitos sonoros” (COSTA, 2006, p.18). Depois dessa, vieram inúmeras outras que de alguma forma contribuíram para a evolução. Porém, é importante lembrar de duas delas: a fotografia e do interesse de homens da ciência pelo uso, por exemplo, do cronofotógrafo3 criado pelo francês Etienne-Jules Marey para estudar os movimentos dos seres vivos, “decompondo-os e congelando-os em uma sequência de registros” (MACHADO, 2011, p.17). Essa segunda máquina, o cronofotógrafo, teve relevância na história do cinema, pois apesar de ter sido inventada para que estudiosos analisassem imagens separadas de uma mesma ação também oferecia a oportunidade de recompor cada frame em uma tela para recriar o movimento. Apesar de parecer interessante essa função não servia para os objetivos dos cientistas, considerado por alguns como 3
O cronofotógrafo inventado pelo fisiologista Etienne-Jules Marey, era uma maquina criada para a analise do movimento. Para isso ela decompunha o movimento em vários frames e assim congelava cada frasão do movimento para que ele pudesse ser estudado. Porem para o inventor do cronofotografo recompor cada frame “novamento numa tela, para fazer a imagem do animal “se mover”, era para ele uma total idiotice. Não era mais fácil olhar diretamente para o próprio animal?” MACHADO, 2011, p.17).
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uma idiotice. Porém, para outras pessoas essa funcionalidade oferecida pelo cronofotógrafo era exatamente o que procuravam. Os pioneiros do cinema foram Thomas A. Edison, americano que em 1893 patenteou nos EUA o quinetoscópio e os irmãos franceses Luis e Auguste Lumière. Edison sem data precisa, deve ter exibido seu filme entre 1894 e 1895, já os irmãos Lumière tiveram sua exibição em Paris no dia 28 de dezembro de 1895. Apesar de não terem sido os únicos e provavelmente muito menos os primeiros foram os que nesse início tiveram o maior reconhecimento pela sua realização. Nesses primeiros anos as “sessões de cinema” eram apresentadas, no caso dos irmãos Lumière, em cafés. Esses locais eram ponto de encontro entre amigos que iam até lá para ler jornais, beber, assistir a apresentações teatrais e musicais. Nos EUA esses mesmos cafés eram chamados de vaudevilles e tinham quase que as mesmas características dos cafés franceses. A única diferença é a que esses espaços, diferentemente da França, não foram criados com o principal objetivo de se tornar um ponto de encontro para as pessoas, mas sim para serem um local onde a classe média podia encontrar entretenimento barato e diverso. Os vaudevilles tiveram sua origem nos salões de curiosidades, que segundo Flavia Costa, “podiam incluir atrações variadas: performances de acrobacia, declamações de poesia, encenações dramáticas, exibições de animais amestrados e sessões de lanterna mágica” (COSTA, 2006, p.20).
As características desses locais acabaram por se transformar em referência de projeção para os filmes que eram criados para se adequar a esse espaço cultural. O reflexo está no tipo de material cinematográfico apresentado para o público, normalmente sem uma narrativa dentro das histórias e feitos com uma única tomada. Esse produto visual era perfeito para encaixar dentro da programação tão variada desses espaços. E ainda para aumentar as chances de venda dos filmes, os produtores vendiam cada plano separadamente como filmes individuais, deixando a escolha do exibidor quais comprar, como fazer a montagem do filmes, escolhendo a ordem dos rolos, quais seriam os “efeitos sonoros” criados ao vivo e até a velocidade das cenas apresentadas. Esses primeiros filmes foram mais caracterizados com produtos históricos e não tanto como produções naturais. Isso porque o modo “primitivo” como foram
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filmados não se importava tanto para que a câmera fosse a representação do olhar de uma pessoa. Normalmente a visão da câmera é a visão de narrador que presencia certos momentos, percorrendo o olhar para o que chama mais a atenção ou se aproximando da ação para não perder nenhum detalhe, para assim depois contar para os outros. Porém, esses primeiros filmes tinham um olhar estático, como o de quem olha pela fechadura e só pode esperar para que os personagens acabem passando por aquela área que é o seu campo de visão. Segundo Noël Burch esses filmes apresentavam: Composição frontal e não centralizada dos planos, posicionamento da câmera distante da situação filmada, falta de linearidade e personagens pouco desenvolvidos. Os planos abertos e cheios de detalhes, povoados por muitas pessoas e várias ações simultâneas, são a marca desse tipo de representação (BURCH, apud MACHADO, 2006, p.23)
É importante perceber que essa falta de linearidade das narrativas não é considerada um déficit para a época, simplesmente porque o objetivo dos filmes não era contar histórias complexas, mas sim mostrar tudo que possivelmente iria agradar o espectador. Às vezes, a explicação da filmagem era sabida pelo próprio público e em outros casos um mediador fazia o papel de locutor/professor. Assim, por conta dessas características o cinema dessa época ficou conhecido como “cinema de atração”, onde os cineastas estavam mais preocupados em mostrar essa novidade ao público e não importava tanto se existia conexão entre os planos ou se a história acabava não tendo começo ou fim. Assim, o grande triunfo dos “diretores” era prender a atenção do público na tela, fazendo com que ele se assustasse e se deliciasse com essa nova experiência. Essas atrações podiam ser representadas como filmes de encenações de fatos reais, como guerras ou catástrofes; cotidiano, como fatos recentes e passagem por outros lugares; vaudeville e até pequenas passagens de peças famosas. Um dos grandes exemplos desses filmes de “mostragem”, onde a narrativa não tinha grande importância para os objetivos do cineasta porque a relevância estava no ato de surpreender o público foi “ L'Arrivée d'un train à La Ciotat” (A chegada do tem na estação), um dos primeiros filme dos irmãos Lumière que foi apresentado na famosa estreia em Paris no ano de 1895. Na ocasião desta apresentação a plateia foi a loucura, literalmente, quando na tela a projeção
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começou a mostrar um trem vindo na direção das pessoas. As primeiras exibições deste filme foram acompanhadas de gritos e muita correria, pois para aquelas pessoas que estavam vendo pela primeira vez uma projeção o trem era real e assim suas vidas dependiam da fuga. Isso mostra que neste primeiro momento o cinema e seus criadores estavam mais preocupado em mostrar todo o “potencial” que o cinema poderia oferecer ao publico. Essa primeira época que teve início por volta dos anos de 1890 com os Lumière e Edison e durou até 1906, 1907 e foi chamada, como dito antes, de período cinematográfico de “atrações”. Após essa primeira etapa os pesquisadores passaram a chamar os filmes produzidos entre 1907 e 1915 de “transicionais”. Esse segundo período teve esse nome, pois é exatamente a fase em que os cineastas e diretores começam a perceber que aquele buraco de fechadura pode ser muito maior do que eles haviam imaginado. Foram nesses anos de transição que a técnica, propriamente dita, do cinema evoluiu. A principal evolução não veio da técnica e sim de como os cineastas começaram a criar suas histórias. Uma das razões para essa evolução foi que pela primeira vez as produtoras de cinema começaram a se organizar de forma industrial. Essa mudança propôs uma nova organização das etapas de produção e exibição para que houvesse uma arrumação maior, colocando um “especialista” em cada área para que o trabalho fosse mais elaborado. Com essa divisão das etapas os cineastas puderam finalmente se concentrar na criação de filmes mais elaborados. Com o tempo maior para pensar, os homens por trás das câmeras conseguiram com que os filmes fossem ganhando mais conteúdo. Foram as narrativas mais elaboradas, que necessitam de técnicas evoluídas para serem contadas, as grandes culpadas. Com mais tempo de duração, os cineastas perceberam que os filmes precisariam ser feito com mais planos, personagens mais elaborados, com motivações e vontades, enquadramentos diferentes e uma montagem clara para que o espectador entendesse essa narrativa. Não é preciso dizer que nos primeiros anos grande parte do público não entendia e encontrava certa dificuldade para visualizar todas essas novas características que formavam uma história só.
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Para que o público entendesse a mensagem a montagem cinematográfica teve que passar por inúmeras transformações. Logo no início das experimentações três tipos ficaram mais conhecidos e consequentemente foram os mais usados. A montagem alternada era utilizada para mostrar ao espectador ações que aconteciam ao mesmo tempo, porém em espaços diferentes. A montagem analítica tem a intenção de “fracionar a cena” como diz Flavia Costa e... (...)acontece quando se fraciona um espaço em vários enquadramentos diferentes. Em geral, adicionam-se planos aproximado (cut-in) a planos mais abertos, com intenção de tornar claro para o espectador detalhes que não podem ser vistos no plano geral (COSTA, 2006, p.45)
E por último a montagem em contiguidade usada para passar a ideia de que o plano atual é a continuidade ou um lugar perto do plano anterior. Entre vários nomes que começaram a se destacar em relação à montagem cinematográfica um americano ganhou mais reconhecimento. David Llewelyn Wark Griffith fez mais de 400 filmes durante 5 anos e ficou conhecido não apenas por fazer uma montagem que misturasse vários planos, mas principalmente pela forma como esse trabalho criava, segundo Flavia Costa (2006, p.47), “contrastes dramáticos” que auxiliavam no aperfeiçoamento psicológico dos personagem e construindo julgamentos morais, tudo isso através da montagem. Nos filmes de Griffith percebemos “a mão do narrador, à medida que ele nos leva de um lugar para outro tecendo uma nova continuidade narrativa” (GUNNING, opus MACHADO, 2006, p. 47). Essa intervenção mascarada servia e ajudava o público a entender melhor a história através de uma narrativa onde as motivações dos personagens ficassem mais aparentes. Por conta do talento de Griffith na montagem, os filmes norte americanos seguiram seu estilo, em que a montagem era o instrumento fundamental. Inversamente, na Europa, preferiam “usar a profundidade do espaço e jogar com a encenação dentro do plano” (MACHADO, 2006, p.48). Isso porque a preocupação dos europeus estava na construção interna dos planos fazendo atuações mais elaboradas e cenários aprimorados para que várias ações pudessem acontecer dentro de um mesmo plano. E assim esse modelo perdurou por muito tempo. 1.2. A Linguagem do vídeo
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O modo de fazer cinema “popularizado” por Griffith teve seu reinado por longos 50 anos. Durante esse tempo o filme cinematográfico era praticamente produzido com os mesmos moldes, linguagens e estrutura. Em meados dos anos 60 o cinema ainda reinava, embora outros formatos audiovisuais já tivessem sido experimentados. Essa dominância da linguagem cinematográfica não era por causa de falta de tecnologia ou meios técnicos insuficientes para criar outro tipo de produção audiovisual, mas sim uma questão de popularização. O cinema de película ainda era a menina dos olhos de ouro, que conseguia levar “multidões”, principalmente nos EUA e na França, esperando para ver seus sonhos acontecerem diante da tela. O público era a principal causa dessa estagnação criativa, já que a grande maioria desconhecia o vídeo e os que conheciam preferiam o mundo do imaginário em que a maior parte da produção cinematográfica estava focado. Porém alguns “renovadores” buscaram no vídeo uma alternativa para mostrar a sua arte. Em meados da década de 60, os trabalhos de “vídeo-arte, de um lado e as alternativas militantes (ou comunitárias), de outro” “experimentaram soluções de linguagem francamente opostas aos modelos praticados nos canais televisuais”
(MACHADO,
2011,
p.176).
Provavelmente
o
que
levou
a
experimentação dessa nova produção audiovisual foram as novas características que a linguagem videográfica apresentava. Uma das diferenças físicas mais marcantes entre o vídeo e o cinema, segundo Machado era que: No filme, a imagem é inscrita em fotogramas separados: entre um quadro e outro, o obturador se fecha impedindo a entrada de luz, e uma nova porção de película virgem é empurrada para a abertura. Esse movimento fragmentário, que denuncia a base fotográfica do cinema é dissimulado, entretanto por um dispositivo técnico, para que se possa recompor a ilusão de movimento. O vídeo, porém retalha e pulveriza a imagem em centenas de milhares de retículas, criando necessariamente outra topografia que, a olho nu, aparece como uma textura pictórica diferente, estilhaçada e multipontuada (...) (MACHADO apud CARVALHO, 2008, p.58).
Esse desmembramento da imagem resulta em uma “qualidade inferior” em relação à película já que agora ela, imagem, não passa de um aglomerado de pontos e linhas, expressas em limites de resolução. E por essa diferença de qualidade a linguagem utilizada não poderia ser mais a mesma. Por isso no nascimento da linguagem videográfica, os planos precisam ser diretos, com close, mostrando detalhes em cenas mais fechadas. Além disso, o número de figurantes que podem aparecer ao mesmo tempo durante um plano também fica reduzido, pois
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quanto mais informação na tela, maior a chance das figuras se transformarem em borrões. Vale lembrar, também, que diferente da linguagem cinematográfica que predispõe de determinados padrões pré-fixados, o vídeo não impõem nenhum tipo de “regulagem” para orientar a criação videográfica. As características “imperfeitas” que vem junto do vídeo, como a qualidade da imagem, também servem em muitos casos para fazer parte do trabalho, como no caso do filme Passagens no. 1 (1974), “de Anna Bella Geiger, em que a artista sobe lentamente uma escadaria. Dependendo do ângulo e da distância que a câmera enquadra a mulher, a escada lembra remotamente as precárias linhas de varredura do primeiro dispositivo de vídeo” (CARVALHO, 2008, p. 59). Ou então no caso do documentário Coríntios 14:23 (2001) de Cândida Almeida e Ricardo Lanza onde a falta de iluminação do vídeo feito no “morrão” de Belo Horizonte durante a madrugada acaba deixando a qualidade inferior ao normal, porém essa escolha era fundamental para que o espectador sentisse a mesma sensação de quem estivesse do outro lado da lente da câmera. Ou seja, optar por aumentar um déficit “natural” do vídeo foi mais do que necessário para transmitir a mensagem. Além disso, por consequência do tipo de material criado através da linguagem videográfica (ao menos no início), uma banda magnética juntava áudio e vídeo em um único produto, tendo como resultado o “verbo”. O vídeo podia brincar com o que Santaella (2000) chama de matrizes de linguagem e pensamento que exercem “um papel fenomenológico em produções criativas” (ALMEIDA, 2012, p.100). Essas matrizes além de darem o auxílio para a criação videográfica e várias outras, têm como função serem “alicerces para outras formas perceptivas como o olfato, tato, paladar, de maneira mediada, ou seja, como uma sugestão, uma sinestesia” (ALMEIDA, 2012, p.101). Assim quando algum sentido seu é ativado, como quando você vê um pequeno “take” de um delicioso chocolate derretido sendo esparramado quase que no mesmo instante é possível sentir o gosto do chocolate na boca mesmo que não exista nenhum tipo ativador. Assim podemos supor que alguns desses sentidos trabalhados pelas matrizes de linguagem e pensamento estão fazendo um trabalho de substituição. Ou como Santella (2001, p.78) explica: “Os processos perceptivos que não fazem linguagens, porque são mais moventes,
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sutis, viscerais, encontram moradas transitórias nas linguagens do som, da visão e do verbal”. O vídeo é considerado, por Arlindo Machado, um “sistema híbrido” que não apenas agrega outras linguagens e códigos vindos do cinema, teatro, literatura, rádio e posteriormente da computação gráfica, mas também é uma ferramenta que “reprocessa as formas de expressão colocadas em circulação por outros meios, atribuindo-lhes novos valores, e a sua “especificidade” (...)” (MACHADO, 2011, p.175). Por isso podemos dizer que a marca forte do vídeo é, justamente, abrir-se a experimentações, uma vez que ela possibilita misturas sígnicas na natureza da linguagem. Decorre daí o fato de o vídeo originar tantas derivações, como o vídeo documentário, vídeo arte, vídeo clipe, entre outros. O autor ainda enxerga que algumas “tendências” estão presentes em um número considerável de vídeos e uma delas é a limpeza de códigos dentro da linguagem. Isso porque, como já foi falado anteriormente, o vídeo no seu início tinha várias diferenças com o material cinematográfico, principalmente em relação à qualidade do produto final. Assim, para suprir esse déficit, segundo Machado (2011) “a maneira mais adequada e mais comunicativa de trabalhar com ela é pela decomposição analítica dos motivos”. Conclui-se, portanto que técnicas de aproximação, como o close up, eram fundamentais, pois o resultado dessa decomposição são relatos de um todo através do detalhe, (enquadrado pela câmera) do fragmento que “são articulados para sugerir o todo, sem que esse todo, entretanto, possa jamais ser revelado de uma só vez” (MACHADO, 2011, p. 175). Consequentemente por causa dessa grande frequência de planos fechados, o enquadramento videográfico é, em sua maioria, minucioso onde cada detalhe tem importância para a montagem do trabalho. Por outro lado, aquilo que não traz importância
tem uma estilização abstrata deixando tudo mais compreensível,
quando esse é o objetivo. É exatamente essa escolha de mostrar apenas o que importa e tentar fazer desaparecer aquilo que é irrelevante que pode ser chamada de limpeza de códigos. Ela acontece não apenas no âmbito visual, mas também no áudio que acompanha a imagem.
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Para que essa limpeza seja eficiente as figuras de linguagem que predominam na linguagem videografica são a metáfora e a metonímia4, já que a primeira é usada para que as imagens mostradas sejam colocadas de forma a induzir o espectador a encontrar ali algum tipo de relação imaterial. A segunda é utilizada para mudar o sentido entre as imagens ou até para que certa imagem consiga “representar” outra. Assim os diretores podiam chegar a um novo conceito juntando duas imagens de significados opostos. Por exemplo, fazendo uma sobreposição de imagens de nuvens com pessoas nervosas, provavelmente o resultado para o espectador será que de que uma tempestade o aguarda nos próximos minutos de filmes. Esse processo muito parecido com o modelo de escrita oriental5 foi criado por Serguei Eisenstein e tinha a função de fazer o espectador se sentir estimulado a “ler” as articulações dos planos e forçar a emergência do “olho intelectual”. (MACHADO, 2011, p.179) E o autor continua: “se o quadro se esvazia, se o seu conteúdo tende a estilização ou a abstração, a significação migra necessariamente para fora de seus limites, ou seja, para a relação entre um quadro e outro[...]”. Quando esse estímulo chega de forma correta ao espectador essa montagem eisensteiniana faz com que a articulação das imagens possa ser criada por quem vê. E também proporciona a criação de novas ideias abstratas que não estão visíveis, tudo isso através do jogo entre metáforas, e metonímias e as imagens (CARVALHO, 2008, p.62). Assim, podemos dizer que nesse processo tanto a sinestesia já comentada antes, quanto a utilização das duas figuras de linguagens revelam-se como um importante instrumento de amplificação das propriedades estéticas da poética, tornando a relação público-obra uma relação mais aberta (sistêmica), uma troca, em que o público deverá debruçar-se perceptiva e cognitivamente para alcançar sua interpretação. Não falamos do esforço intelectual, mas de processos
4 Segundo Romam Jakobson em seu livro Linguística e Comunicação metáfora e metonímia pode ser explicadas da seguinte maneira: “Uma semelhança parcial entre dois significados pode ser representada por uma semelhança parcial entre os significantes [...], ou, ainda, por uma identidade total entre os significantes [...]. Astro (star) significa ou um corpo celeste ou uma pessoa — ambos dotados de um brilho soberano. A hierarquia instituída entre dois sentidos — um primário, central, próprio, independente do contexto; e o outro secundário, marginal, figurado, emprestado, ligado ao contexto — constitui um traço característico deste gênero de pares assimétricos. A metáfora (ou a metonímia) é a vinculação de um significante a um significado secundário, associado por semelhança (ou por contigüidade) com o significado primário” (JAKOBSON, 2007, p.57). 5 Esse conceito é praticamente idêntico ao modelo de escrita das línguas orientais, onde cada ideograma tem um significado diferente, porem quando dois ou mais sinais pictográficos são unidos eles formam um novo. Como comenta Arlindo Machado: "no chinês, entretanto, pode-se chegar ao conceito…operando combinações de sinais…Por exemplo: para anotar o conceito de "amizade", a língua chinesa combina os pictogramas de "cão" (símbolo da fidelidade) e de "mão direita" (com a qual se cumprimenta o amigo)” (MACHADO, 2011, p.179).
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em princípios emocionais que a partir das sensações provocadas, levarão o espectador ao um novo processo de significação (ALMEIDA, 2012, p.102).
Isso mostra que a linguagem videográfica tem um objetivo de se aproximar mais do publico para que o vinculo criado seja a ponte para o entendimento do que é visto. Assim o vídeo tende a usar mais ferramentas sensoriais para que o choque dessa relação ultrapasse o visual e atinja outros sentidos. 1.3. O vídeo documentário Não se pode falar em vídeo documentário sem citar dois nomes, Serguei Eisenstein e Dziga Vertov. Os dois russos, os dois jovens, os dois soldados do exército vermelho e os dois nomes mais influentes na criação da linguagem videográfica e do vídeo documentário. Depois da revolução de 1917 a indústria cinematográfica Rússia estava tão destruída quanto o governo do último czar Nicolau II, os donos dos estúdios e trabalhadores da área acabaram fugindo do país com medo de perder mais que o seu dinheiro. Para não ficar sem essa “arma” social o novo estado russo se viu obrigado a reorganizar a indústria cinematográfica. Essa decisão teve dois lados bens distintos, mas que foram fundamentais para a evolução do cinema e das posteriores linguagens audiovisuais, pois “por um lado possibilitou uma radical reinvenção da atividade cinematográfica, como talvez nenhum outro momento da história, por outro, os caminhos dessa nova era ficaram a mercê das disputas políticas” (SARAIVA, 2006, p.109). 1.3.1. Serguei Eiseinstein Nesse cenário que o ex-estudante de engenharia Serguei Eisenstein viu a oportunidade de mudar. Largou tudo e foi trabalhar no exército, na organização de peças e espetáculos teatrais para os soldados. Só depois da guerra civil que o jovem cineasta começou a se envolver com a linguagem cinematográfica. Trabalhou no Proletkult (primeiro teatro operário), onde começou a desenvolver o que ele chamava de “teatro de agitação”. Esse teatro tinha como objetivo ser mais dinâmico e até certo ponto excêntrico para que o público se sentisse mais “incomoado” com o que se passava em cima do palco, tanto positivamente, quanto negativamente. Por isso o uso dos estímulos sensoriais e emocionais eram muito fortes nesses espetáculos criados por Eisenstein.
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O tempo que passou no teatro serviu para que ele evoluísse tecnicamente e consolidasse um estilo próprio que marcaria suas produções com técnicas como a montagem do cine-punho 6que funcionava através de choque dos estímulos no público. Para Eisenstein “a bela palavra “montagem” significa a ação de armar algo. O conjunto das unidades, que, associadas num todo, recebem essa dupla significação [...] (EISENSTEIN apud SARAIVA, 2006, p.118). Isso mostra o quão era importante para o cineasta a montagem e como ele já pensava em uma forma diferenciada de apresentar a narrativa ao público. Essas narrativas criavam várias cenas que, quando associadas, transformava o conjunto em outra significação. A montagem criada por Eisenstein tinha o propósito de mobilizar o público emocionalmente e até fisicamente para que no final quem estivesse assistindo conseguisse identificar o caráter ideológico de tudo que foi exposto durante a apresentação. Atingir o público no seu âmago é função de vários aspectos considerados “violentos” ao espectador, como a personalidade muito “forte” de um personagem, um toque para atingir os tímpanos ou até a caracterização espalhafatosa de uma roupa. “Ou seja, todo elemento que submete o espectador a uma
ação
sensorial
ou
psicológica,
experimentalmente
verificada
e
matematicamente calculada, com o propósito de nele produzir certos choques emocionais [...] (SARAIVA, 2006, p.120). O “cine-punho” era o resultado desse choque, que além de impactar o público tinha a intenção de abrir os “olhos intelectuais” e como foi dito anteriormente, forçar a leitura das articulações dos planos através da metáfora e da metonímia, entre outras. Criando assim um cinema de impacto escrachado. Em “A greve” (1925), o primeiro longa-metragem de Serguei Eisenstein, ele experimenta os conceitos já citados para a criação de um “estudo sobre a greve como momento privilegiado de autoconsciência proletária” (SARAIVA, 2006, p.120). 6
Cine-punho foi um termo criado por Serguei Eisenstein para denominar o tipo de cinema criado por ele. O cine-punho tinha como objetivo forçar ao extremo o entendimento do publico sobre sua montagem cinematográfica. Para isso o cineasta criava um "choque reflexologico" (STAM, 2000, p.57). Que através de uma montagem de atrações "propunha um estética carnavalesca que favorecia os pequenos blocos em forma de esquete, as viradas sensacionais e os momentos mais agressivos como o rufar de tambores, saltos acrobáticos e clarões repentinos de luz, os quais eram organizados em torno de temas específicos e concebidos para provocar um choque salutar no espectador […] Eisenstein falava em "Uma abordagem dialética a a forma cinematográfica", falava de "conflito": "No domínio artístico, o principio dialético da dinâmica corporifica-se no conflito, como fundamento da existência de toda e qualquer obra de arte ou forma artística". (STAM, 2000, p.57).
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O filme conta a história de uma greve que começa após o suicídio de um operário que estava sendo acusado injustamente de um roubo. A narrativa é composta em cima de seis “blocos”: a agitação, estopim para greve, fábrica parada, inatividade e miséria dos grevistas, provocações dos infiltrados e repressão violenta. Logo no início, dentro do bloco da agitação, podemos perceber a forma “caricaturizada” como os donos das fábricas e seus “apoiadores são representados. São glutões que fumam charuto e bebem whisky representando o capitalismo como um gordo. Nessa cena é possível ver o uso do “cine-punho”, pois é criada uma metáfora muito boa para os comunistas, associam tudo que pode existir de ruim nas pessoas ao capitalismo, criando não só uma repulsa a figura física do capitalista gordo como também ao conceito. Quando a greve está para começar “a imagem de uma roda girando é sobreposta a imagem de três operários. Quando eles cruzam os braços a roda para. A junção destas duas imagens simboliza o início da greve. E a imagem da roda girando no primeiro plano com os trabalhadores atrás pode evidenciar que eles estão presos na engrenagem do sistema sócio industrial” (CARVALHO, 2008, p. 53)
Essa cena mostra de forma clara o uso da metonímia na montagem, pois a sobreposição das imagens com significados diferentes acaba criando um conceito novo (máquina + trabalhador = greve) (CARVALHO, 2008 p.53). Eisenstein foi o pioneiro nesse tipo de montagem onde utilizava do princípio da multiplicação para compor os planos e construir um novo significado. Essa era a principal contraposição ao estilo, até então, “clássico” de montagem “Griffithniano” em que os planos partiam do princípio da adição. No último bloco do filme, a “repressão violenta” é apresentada com auxílio da metáfora, pois em nenhum momento aparece os trabalhadores sendo agredidos. Essa violência é insinuada com quadros de perseguição entre o exército e os operários e com um plano de um touro sendo sacrificado em um matadouro. Só após a morte de o touro ser concluída que vemos o resultado da repressão para acabar com a greve, ou seja, os corpos dos trabalhadores mortos. Apesar do caráter político e de certa maneira verídico da maioria dos filmes de Eisenstein eles não apresentam “como tarefa reproduzir o real, sem intervir, mas ao contrário, devem refletir esse real atribuindo a ele, ao mesmo tempo certo juízo ideológico” (AUMOUNT apud CARVALHO, 2008, p.52). A importância desse
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cineasta para a criação da linguagem vídeografica é muito relevante, pois é a partir de suas experimentações com a montagem usando as técnicas de sobreposição, os conceitos de cine-punho, entre outras que a linguagem cinematográfica foi tomando forma e se consolidando. 1.3.2. Dziga Vertov Se Serguei Eisenstein tem um peso maior em relação ao desenvolvimento da linguagem videográfica, Dziga Vertov é o nome quando falamos dos pioneiros do vídeo
documentário.
Antes
de
ser
cineasta
“trabalhou
nos
noticiários
cinematográficos do front e nos primeiros trens de propaganda, equipados para filmagem e exibições” (Saraiva, 2006, p.109.) Diferente de seu compatriota Eisenstein que tinha a intenção de incorporar o passado burguês na cultura cinematográfica atual, Vertov viu a revolução como a oportunidade de um novo início para criar assim uma linguagem contemporânea que ainda não existia no cinema. Apesar disso usava alguns conceitos iguais a Eisenstein como a construção do pensamento através do cinema e o uso das metáforas e metonímias. Vertov era um dos maiores críticos do colega, assim como Eisensteins era dele. Isso acontecia principalmente pelo fato da montagem e das construções de Vertov serem consideradas complexas demais para o público absorver todas. Esse ponto era tão discutido que usando de ironia, Eisenstein falava de “intervalos inaudíveis”, criticando a “teoria dos intervalos” de Vertov” (SARAIVA, 2006, p.137). Essa crítica, apesar de verdadeira, não representava uma ameaça para Vertov, pois a função de seus filmes, segundo Ananda Carvalho era “mostrar o que esta por trás das relações sócio culturais” (CARVALHO, 2008, p. 46) e “uma maneira nova de observar o mundo através da reelaboração industrial dos acontecimentos” (XAVIER apud CARVALHO, 2008, p.46). Esse novo olhar foi o que Vertov denominou em seu manifesto teórico como “cine-olho”, “que buscava documentar a realidade socialista através dos fragmentos da realidade, subvertendo tanto a visão ilusionista do cinema como ficção, como a visão ingênua do cinema como registro documental” (CARVALHO, 2008, p.46). Para Vertov só a “máquina cine-olho” é que estava apta a capturar esse novo tipo de olhar. Os homens não estão preparados
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para enxergar essa realidade, “pois o olhar natural dos seres humanos está condicionado por “deformações psicológicas”” (CARVALHO, 2008, p.46). Ao entendermos que o “cine-olho” é uma evolução que o diretor usa para aprimorar um dos sentidos dos homens, vemos que as críticas de Eisenstein perdem a força, pois, já que os filmes de Vertov são feitos pelo déficit das pessoas não conseguirem ver o que a câmera mostra é de se imaginar que mesmo com o olhar da câmera guiando o espectador, alguns simplesmente não consigam enxergar. Talvez pela falta de costume ou pela novidade que esse tipo de linguagem apresentava, o importante é notar que a para Vertov a função do “cine-olho” era expandir a linguagem cinematográfica através de um novo ponto de vista real da realidade em que,
segundo Leandro Saraiva, o que nos é exibido através da
“análise do “cine-olho” é o próprio tecido institucional da sociedade, em seus fluxos construídos por relações transitivas e sempre passíveis de reconstrução” (SARAIVA, 2006, p.135”. Para a criação desse novo ponto de vista real Vertov fazia suas montagens seguindo “o princípio do “cine-verdade”, ou seja, avesso a qualquer encenação” (SARAIVA, 2006, p.135), pois para ele a montagem não podia ser feita usando uma vertente teatral em que se seleciona “fragmentos” de um filme para construir uma cena ou então uma vertente literária em que
os “fragmentos” já filmados são
escolhidos para montar a legenda. Segundo Carvalho, para Vertov “montar significa organizar os pedaços filmados (as imagens) num filme, “escrever” o filme por meio das imagens filmadas” [...] (VERTOV apud CARVALHO, 2008, p.46). Vertov considerava a montagem tão importante que dispunha de vários profissionais espalhados pela Rússia para a captura das imagens. Ele só “virava diretor” na hora da montagem, porém seu trabalho de montagem não começava após as filmagens. Isso porque, segundo o manifesto do “cine-olho”, a montagem tinha que servir de base desde a seleção do tema até a edição final. O próprio Vertov afirma o quão era importante para ele a montagem ao dizer: eu monto quando escolho um tema (ao escolher um dentre os milhares de temas possíveis), eu monto quando faço observações para o meu tema (realizar a escolha útil dentre as mil observações sobre o tema).
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eu monto quando estabeleço a ordem de sucessão do material filmado sobre o tema (fixar-se, entre as mil associações de imagens possíveis, sobre a mais radical, levando em conta tanto as propriedades dos documentos filmados, quanto os imperativos do tema a tratar) (VERTOV apud MACHADO, 2008, p.47).
A sua obsessão pela montagem o levou a fazer um grande número de experimentações como aceleração, inversões temporais da projeção, sobreposição, justaposição infinitesimais, choque de angulações, variações rítmicas, entre outras. Outra marca desse cineasta é a reflexibilidade que a maioria dos filmes transmite. Vertov propõe ao espectador que imagine o filme sendo mais que um filme, ele tenta fazer com que o público reflita sobre a relação do filme com o que acontece por trás das câmeras, criando assim uma metalinguagem ou simplesmente um filme dentro de um filme. Isso para lembrar ao público o mérito da “máquina” cinematográfica para a elaboração e criação da “realidade fílmica”. Essa reflexividade fica mais claro no filme “O homem da câmera” (1929) em que no prólogo do filme vemos o processo dentro da sala do cinema que antecede a projeção. Também temos essa característica quando a cena de uma carruagem em velocidade congela e se revela um fotograma, então vemos a sala de montagem e todos os bastidores da criação cinematográfica. Nesse filme também encontramos várias das experimentações citadas anteriormente como em quase todas as cenas de tráfego em que existe a sobreposição de imagens ou então o uso da metáfora para a criação de novos conceitos como na justaposição da cena de um enterro e de uma mulher dando a luz. A criação de Vertov, principalmente em “O homem da câmera” apresenta um ritmo acelerado, construído por planos curtos em sequências ritmadas. O que mostra que os filmes de Vertov em sua “narrativa” representavam também a realidade da época. Uma época em que a revolução industrial ainda tinha força e incentivava a criação de métodos onde o tempo gasto e a eficiência do processo produtivo fossem cada vez mais aperfeiçoados. A importância desse homem para o vídeo é clara, “os mecanismos inovadores utilizados por Vertov –fusões, janelas múltiplas, alterações de velocidade de captação, congelamento de imagens, etc. – marcam o início da construção de uma linguagem que só se tornaria mais recorrente décadas depois através do
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desenvolvimento do vídeo. Também é importante mostrar que sua maior criação o manifesto do “cine-olho” pode ser considerado o “manual” mais antigo da linguagem do vídeo documentário, mostrando que esse tipo de produto audiovisual não é o reflexo do mundo, mas sim a reflexão que podemos fazer dele. 1.3.3. O Vídeo documentário, da descrição a linguagem. Apesar da pequena descrição citada anteriormente, o terno vídeo documentário não é tão simples de ser explicado ou definido. Isso porque sua definição, além de muito abrangente e variada, é muito dependente da comparação ou da relação mais específica do que estamos analisando. Apesar disso é possível encontrar características que são comuns a todos os tipos de documentário. Antes
de
o
termo
documentário
ser
usado
dentro
do
repertório
cinematográfico e videográfico ele foi muito usado no século XIX para representar “um conjunto de documentos com a consistência de “prova” a respeito de uma época” (TEIXEIRA, 2006, p.253). Ou seja, um documentário tinha grande apelo histórico e mostrava os fatos “reais” ou provas que aconteceram durante um espaço e tempo definidos marcados para sempre através desse material documental. Apenas no meio dos anos 1920 que o termo começou a ser utilizado pelos especialistas em cinema. Ainda sim, nesse início os documentários eram definidos como “tratamento criativo da realidade”, provavelmente essa a melhor maneira de resumir a definição de documentário, como se verá a seguir. O que podemos dizer primeiramente é que documentário não é a reprodução da realidade, pois o termo realidade não tem o mesmo significado para todos. Muito menos a forma como essa realidade é vista, absorvida e traduzida é igual
para
todos
os
indivíduos
que
param
para
pensar
no
assunto.
Consequentemente por existirem “inúmeras realidades” sempre que alguém tentar reproduzir a “sua realidade” outra pessoa irá discordar do ponto de vista proposto, alegando que aquela replica da realidade não lhe pertence. Sendo assim quando um documentarista faz seu filme ele está elegendo uma realidade como sendo a principal ou expondo seu ponto de vista da realidade para os outros. Além disso, sua presença física durante as filmagens gera uma “alteração na realidade”. Como JeanCalude Bernadet explica: [...]
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o filme capta o que é, mas gera intencionalmente uma situação específica, provoca uma alteração no real, e o que se filma não é o real como seria independentemente da filmagem, mas justamente a alteração provocada. A ação do documentarista sobre o real leva a uma situação nova, criada em função da filmagem e sem a qual ela não existiria. O real não deve ser respeitado em sua intocabilidade, mas deve ser transformado, pois o próprio filme coloca-se como agente da transformação (BERNADET, 2003, p.75).
Essa definição indireta de Bernadet sobre uma característica desse estilo deixa claro que não existe reprodução da realidade através do documentário. Porém estudiosos como Fernão Ramos veem essa relação da manipulação da realidade pelos cineastas do documentário de forma diferente, deixando um pouco de lado esse fato e focando na função do documentário para defini-lo. [...] podemos afirmar que o documentário é uma narrativa basicamente composta por imagens-câmera, acompanhadas muitas vezes de imagens de animação, carregadas de ruídos, música e fala (mas, no início de sua história, mudas), para as quais olhamos (nós, espectadores) em busca de asserções sobre o mundo que nos é exterior, seja essa mundo coisa ou pessoa. Em poucas palavras, documentário é uma narrativa com imagens-câmera que estabelece asserções sobre o mundo, na medida em que haja um espectador que receba essas narrativa como asserção sobre o mundo (RAMOS, 2008, p.22).
Vendo pela referência de Fernão Ramos pode-se perceber que o importante é deixar claro qual asserção7 (ponto de vista) o documentarista pretende mostrar para o público, independente do fator realidade. Juntando essas duas definições podemos dizer que os documentários podem ou não mostrar a verdade sobre um fato histórico, entendendo essa verdade como a realidade criada através da câmera. Sendo assim pode-se considerá-los como “re-apresentações” ou representações da realidade criada, pois a forma como o documentário é apresentado faz com que ele se torne parte do universo em que fez parte. Desde a sua elaboração até sua finalização ele mostra como aquele universo é alterado por si só e por ele mesmo, deixando de ser uma janela para o mundo e se integrando a este novo mundo. Diferentemente a reprodução é a tentativa de refletir o mundo da mesma maneira, uma cópia que por mais fidedigna que seja nunca será igual à matriz. Pois apesar de tentar mostrar o mundo sem influenciá-lo ou sem que haja alteração isso não aconteceu realmente porque a idéia da reprodução dentro do documentário “é pautada na convicção de que a verdade 7 Significado de Asserção: s.f. Afirmação, proposição que se tem como verdadeira: os fatos justificaram-lhe as asserções.
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está nos fatos” (CARVALHO apud SANTAELLA, 2008, p.38). Quando na realidade segundo a mesma autora os fatos são influenciados “pelas percepções e pelas molduras da visão e do pensamento impostos pelo tempo, espaço e posição nas relações sociais que ocupamos”. O que faz com que a realidade seja tão influenciável quanto os fatos em que ela se baseia. A representação cria conteúdo, conversas e retóricas sobre um novo ponto de vista, o que aguça a curiosidade das pessoas. Por isso “julgamos uma representação mais pela natureza do prazer que ela proporciona, pelo valor das ideias ou do conhecimento que oferece e pela qualidade da orientação ou da direção, do tom ou do ponto de vista que instila” (NICHOLS, 2012, p. 47). Isso deixa claro que a representação é muito mais interessante e empolgante tanto para o público quanto para quem produz do que a reprodução. A partir dessa análise sobre a definição de documentário podemos perceber que eles, “buscam indicar apontar para os objetos e situações fora deles que estão neles retratados. Desse modo, esses vídeos e filmes pretendem mostrar ao espectador as paisagens, cenas e situações que eles registram” (CARVALHO, 2008, p.31). E assim como em uma aula de história, em que “esperamos aprender ou nos emocionar, descobrir as possibilidades do mundo histórico ou sermos persuadidos dela” (NICHOLS, 2012, p.47), os documentários acabam se tornando influenciadores de opinião. Para que esse objetivo seja alcançado a linguagem documentaria precisa criar um elo muito mais forte do que o filme ficcional. Por isso muitos estudiosos consideram que dentro da linguagem documental a câmera “não existe”. Para Fernão Ramos a câmera passa a ser, o que ele chama de “imagem-câmera”. Uma forma de mostrar que a subjetividade é quem reina nessa forma de linguagem, já que não existem mais barreiras entre o espectador e aquilo que é retratado na tela. Para Ramos “as imagens-câmera nos remetem à circunstância do mundo que deu origem a elas” (RAMOS, 2008, p.78). Mostrando que aquela visão está em primeira pessoa representando o espectador que assiste a tudo aquilo como se fizesse parte do filme. Em outro momento Ramos exemplifica a função dessa imagem-câmera através de dois personagens fictícios, João e Joana:
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“João é o sujeito-da-câmera que sustenta a máquina-câmera e lhe concede a subjetividade da presença, na circunstância da tomada. É através da presença de João que a imagem vai existir para Joana, e é para seu olhar-câmera na tomada que ela se lança e é recebida. É o maquinismo da imagem-câmera, matéria que dá atualidade é sua forma, que permite a atividade intersubjetiva e transcendental do sujeito na tomada, fundando a recepção espectatorial e realizando-se através dela” (RAMOS, 2008, p.79).
Percebe-se então que segundo Ramos a linguagem documental funciona através do olhar relatado pela câmera. Assim quem está presente no ato da filmagem não existe mais, acaba se tornando parte do equipamento e some. Depois de sumir então é o espectador quem acaba se transformando em sujeito-câmera e assumindo o papel de “personagem”. Quando isso acontece, quem sofre com a ação dentro do documentário passa a ser quem está assistindo. Por exemplo, quando o repórter cinematográfico, sujeito-câmera, entra no meio de um tiroteio e acaba tomando o tiro a câmera não para de gravar. Quem vê a esse tipo de cena sabe que provavelmente ele está ferido ou morto, mas a imagem-câmera continua sua função independente do estado de quem a transporta. Para quem assiste, o impacto da bala transcende a tela onde o filme está sendo exibido e acaba atingindo também o público que passa de mero espectador passível para personagem, olhar-câmera. Essa transformação, quando realizada de forma eficiente, significa que a linguagem documental atingiu seu objetivo. Mostrou a asserção daquele momento para um número maior de pessoas, isso faz com que o público sinta empatia com aquela imagem-câmera, para o bem ou para o mal. A linguagem do documentário também tem influência direta através da voz que é utilizado no decorrer do filme. É a voz que vai defender a causa, apresentar o argumento ou ponto de vista, é ela quem faz a asserção do mundo documentado. Pelo fato da voz ter uma importância variada e peculiar a cada documentário, em cada caso se cria uma voz própria. É ela quem informa e orienta a narrativa do documentário. Quando se fala em voz a primeira característica que vem à cabeça são os dois principais tipos de locução: a voz-off e comentário-over. O primeiro também conhecido como a “voz de Deus” é usado sempre que o orador é ouvido, mas nunca visto. Já o segundo tem um orador presente, que é ouvido e visto pelo público. Nos
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dois casos a “voz” tem um caráter totalitário, uma onisciência de quem vê o universo do filme de fora. Tem os conhecimentos necessários para guiar o espectador pelo caminho correto enfatizando a objetividade do documentário. Bill Nichols comenta que “a tradição da “voz de Deus” fomentou a cultura do comentário com a voz masculina profissionalmente treinada, cheia e suave em tom e timbre, que mostrou ser a marca de autenticidade” (NICHOLS, 2012, p.142). Isso mostra que em muitos documentários,
apesar
de
estarem
re-apresentando
a
realidade,
existem
características de encenação inseridas para que a asserção do diretor seja entendida de forma correta. Claro que a forma mais explícita e fácil de transmitir um ponto de vista ao público é através da citada acima, que também pode ser escrita (legendas), porém a voz abrange outras características além da “língua”. A voz, segundo Nichols é muito mais do que “é dito verbalmente pelas vozes de “deuses” invisíveis e “autoridades” plenamente visíveis que representam o ponto de vista do cineasta – e que falam pelo filme – nem pelos atores sociais que representam seus próprios pontos de vista – e que falam no filme” (NICHOLS, 2012, p.76). Ela tem que estar inserida em todos os outros meios que criam o documentário, a voz é a escolha do cineasta sobre o direcionamento que ele vai dar para que o público entenda sua visão. A escolha entre planos compostos ou o tipo de enquadramento, a hora certa de cortar ou fazer a montagem, se o filme será colorido ou preto e branco, usar o som natural da filmagem ou inserir trilha sonora e efeitos na pós-produção, apenas apresentar o material filmado pelo diretor ou usar imagens e filmagens feitas por terceiros. São esses elementos que dão o tom a voz do documentário e mostram a personalidade do cineasta. Isso mostra que a linguagem do documentário é criada para colocar o ponto de vista do cineasta a mostra do público para que esse tenha conhecimento de um novo olhar sobre um universo, que algumas vezes já é do seu conhecimento, mas que nunca tinha sido analisado sobre esse ângulo que o diretor apresenta. Ela (linguagem) também é que guia e mostra a direção para qual o espectador deve olhar, fazendo com que ele preste a atenção naquilo que realmente importa para que no final o filme seja entendido. 1.4. Os documentários políticos brasileiros
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Se os documentários têm o objetivo citado acima podemos classificá-los como possíveis “armas culturais” que quando bem utilizadas conseguem, não apenas transmitir um ponto de vista, mas também fazer com que o espectador siga aquela visão. Bill Nichols cita exatamente isso quando diz que um dos potenciais do cinema documental é “ajudar a construir uma nova realidade visual e, com ela, uma nova realidade social” (NICHOLS, 2012, p.182). O autor ainda explica que esse uso do filme documental era muito usado pela máquina cultural do novo governo soviético e que foi adotado pelos britânicos quando John Grierson, cineasta considerado por alguns autores como pai do documentário, “convenceu o governo britânico a fazer com o cinema, na década de 1930, o que o governo soviético fizera desde 1918: utilizar uma forma de arte para fomentar um sentimento de identidade nacional e de comunidade compartilhada proporcionais a seu próprio programa político.” (NICHOLS, 2012, p.185). Se os documentários serviram tanto para o governo britânico e soviético como “arma cultural” nada impedia que eles servissem para quem estava do outro lado da moeda, o povo. E no Brasil essa visão dos cineastas direcionada para os menos desfavorecidos fica evidente, como comenta Fernão Ramos: “No conjunto da produção artística brasileira, o cinema tem se mostrado particularmente sensível às questões éticas e políticas que envolvem a reprisa da alteridade social que chamamos de povo, espaço do outro que não é o mesmo de classe. A imagem do povo é um traço recorrente no documentário brasileiro contemporâneo” (RAMOS, 2008, p.205)
Essa citação ganha mais força a partir do final dos anos 50, quando o cinema novo brasileiro surgiu e ganhou força como movimento artístico cinematográfico. Esse cinema que segundo Maria do Socorro Carvalho pretendia “ser “novo” no conteúdo e na forma, pois seus novos temas exigiriam também um novo modo de filmar” (MASCARELLO, 2006, p.290) tinha como objetivo retratar as perspectivas históricas, principalmente do povo brasileiro. E montar uma asserção sobre as várias realidades encontradas no âmbito social, cultural e político. Vale ressaltar que o aspecto político nesse caso não está necessariamente relacionado com “processos de agregação, consentimento, organização dos poderes e sistemas de legitimação” (GUIMARÃES, 2011, p.81). A política não é o exercício do poder ou luta pelo poder (partidário, por exemplo) como comenta o autor
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referindo-se às definições do filósofo Rancière, mas sim “o conflito para determinar os objetos que fazem ou não parte para dessas ocupações, os sujeitos que participam ou não delas” (RANCIÈRE apud GUIMARÃES, 2011, p.81), ou ainda “é a atividade que rompe a configuração sensível na qual se definem as parcelas e as partes ou a sua ausência a partir de um pressuposto que por definição não tem cabimento ali: a de uma parcela dos sem-parcela” (RANCIÈRE apud GUIMARÃES, 2011, p.81). E é aí que arte e política se encontram e se amplia o conceito de o documentário político que obtém o “nome” não só pela sua temática, mas sim pela capacidade de reconfigurar o comum de uma comunidade. Ou seja, pela sua força em romper pensamentos comuns ao coletivo e realocar uma nova realidade daqueles que em uma sociedade não são considerados pertencentes, mostrando o conflito entre esses dois lados no processo documental. Sobre essa definição de política utilizada acima que o curta documentário “Maioria Absoluta”(1966) é trabalhado. Produzido e dirigido por Leonel Hirszman, um dos cineastas engajados no novo cinema brasileiro. O documentário retrata a questão do analfabetismo no Brasil durante a década de 60 que marginalizava mais de 40 milhões de brasileiros, praticamente metade da população da época. No início do curta é explicado que as opiniões sobre o tema serão provenientes de “pessoas que vivem em diferentes níveis o problema brasileiro”. Deixando para o espectador que ele próprio se classifique em um dos níveis apresentados no curta, fazendo com que quem assiste acabe escolhendo um dos entrevistados para ser. O primeiro grupo de entrevistados é da “classe-média que revelam desconhecimento e má-fé em relação à situação do povo” (BERNARDET, 2003, p.41). O filme tenta mostrar o quão ruim é a opinião dessas pessoas e tenta mudar o pensamento daqueles que estão se “classificando” como esse primeiro grupo de entrevistados que é a grande maioria do público alvo do documentário. Além disso, o filme “nos incita a uma ação que transforme essa situação que agora, espectadores do filme, não teremos mais desculpas para ignorar. Não agir seria cumplicidade com esse estado de coisas” (BERNARDET, 2003, p.41). Esse é um dos fatores políticos, pois tenta “reconfigurar o comum de uma comunidade”, ele apresenta uma informação e agora espera que nos tomemos uma atitude sobre esse fato. O diretor cria dramaticamente um sentimento de culpa que tenta fazer com quem assiste ao filme a agir.
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Outro fator político do documentário é a classificação daqueles que são o tema do filme, os analfabetos. Segundo alguns dos entrevistados eles são “ignorantes” que não têm a capacidade intelectual para distinguir o certo do errado, o que leva a conclusão do locutor de que se os analfabetos não têm essa habilidade cognitiva não podem votar. Essa questão, dentro do filme, mostra que esse grupo de pessoas que “estão proibidas de votar” não podem se representar. Eles são a “parcela dos sem-parcela”, definição dita antes e enquadrada no conceito de política de Rancière. Seguindo a linha de pensamento do filósofo o documentário se enquadra na temática da política quando o diretor dá voz a esses analfabetos para que eles mesmos se expressem. No filme essa cena é introduzida através da locução em off que diz: “Passemos a palavra aos analfabetos. Eles são a maioria absoluta”. Depois disso o primeiro entrevistado é um homem idoso, que sentado na frente da sua casa treme incontrolavelmente e não diz nada além de sons incompreensíveis. Para Bernardet essa cena pode ter dois significados, o primeiro: “A força expressiva do doente, cuja imagem enche a tela, e a relação com a locução do plano anterior: passamos a palavras e só vem gagueira. Os analfabetos não tomam a palavra; ela lhes é outorgada e mesmo assim não têm condição de falar[...] (BERNARDET, 2003, p.45).
O segundo significado é que: “”passemos a palavra” indica ainda que o filme gostaria que eles falassem” (BERNARDET, 2003, p.45). E finalmente o autor conclui que existe uma “contradição do intelectual progressista que espera que o povo fale e aja, mas, como ele elabora uma imagem passiva desse povo, toma ele a palavra, por enquanto...” (BERNARDET, 2003, p.45). Apesar de em um primeiro momento o diretor se classificar como voz no decorrer do filme os depoimentos dos analfabetos vão se tornando mais fortes e ganhando uma consciência própria. É importante lembrar que o filme foi filmado quase que no mesmo período do Golpe militar de 64,
o que acarretou na paralisação da produção do
documentário que só teve seu término entre os anos de 64 e 65. Por causa desse fato podemos criar alguns paralelismos entre aspectos do filme e a crítica ao regime militar. Essas percepções são pessoais do autor que escreve em relação ao curta e aos argumentos de Jean-Claude Bernardet sobre o mesmo documentário. Bernardet cita que “o filme não nos faz vislumbrar nenhum canal político de ação. Implicitamente, pode-se deduzir: procurem, criem o canal” (BERNARDET, 2003, p.452). O mesmo pode ser pensado sobre a busca de uma solução contra o regime
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militar, um problema social/nacional da maioria, mas ignorado naquele período inicial. A questão dos votos, que já foi citado antes, também tem muita relação com esse problema já que da mesma forma como os analfabetos foram proibidos de votar, a sociedade brasileira sofreu o mesmo mal depois de abril de 64. Por fim a imagem dos analfabetos que Bernardet extrai do documentário, que é “de um povo passivo, injustiçado, que não consegue agir em seu interesse e aguarda soluções de outras áreas da sociedade” (BERNARDET, 2003, p.46). Imagem essa que pode ser transportada para todo o povo brasileiro na época do golpe.
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2. O Desenho da Ditadura Nesse capitulo serão analisados os fatos mais marcantes da historia da ditadura do Brasil. Desde seu inicio, os motivos que levaram os militares aplicarem o golpe de 64, passando pelos anos de chumbo até a abertura do governo militar, chegando finalmente na volta da democracia. Também pretende-se destacar as principais formas de arte que estavam ligadas diretamente a política e que consequentemente faziam o papel da oposição ao regime militar. Esse tópico tem como objetivo mostrar dentro da musica, do cinema, das artes plásticas, teatro e dos quadrinhos quais eram as ferramentas e os propósitos de se tentar criar uma oposição intelectual que atuasse através da cultura para desestabilizar, satirizar e informar o povo sobre o golpe militar. Pretende-se também mostrar como a censura funcionava a favor do governo militar para impedir que esse tipo de material fosse publicado e chegasse aos olhos e ouvidos do publico. E também de que forma ela era burlada pelos artistas. Por fim chegamos no objeto propriamente dito deste trabalho, ao final do capitulo iremos selecionar alguns quadrinhos que tenham uma mensagem política forte para analisar de que forma era retratada a ditadura, qual o tipo de humor usado nessas curtíssimas narrativas e quais figuras de linguagens eram utilizadas para mascarar a mensagem. 2.1. A Ditadura No ano de 1964 um golpe militar depõem o então presidente do Brasil João Goulart. Durante os próximos 21 anos os brasileiros veem a liberdade e a democracia se distanciarem cada vez mais do pais. Nessas duas décadas os abusos foram muitos, os direitos foram poucos, mas alguns tentaram resistir a tudo isso. As próximas paginas contam um pouco da historia recente que o Brasil viveu. O que levou o golpe, as primeiras ações dos militares no poder, o pior período dessa época e como tudo foi acabando. Esses são alguns tópicos que conduzem a narrativa de um dos momentos mais difíceis para o Brasil e seu povo. 2.1.1. O Pré Golpe Antes de introduzir as principais motivações que culminaram com o golpe militar de 64 no Brasil é preciso fazer um breve levantamento da atual situação do mundo durante alguns poucos anos que antecederam esse fator que mudou a historia do Brasil.
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No inicio da década de 60 o planeta terra estava em frenesi. Essa foi a época das mudanças e de misturas, o “Quintal dos Estados Unidos” abriga o regime comunista de Fidel Castro em Cuba [...] os Beatles e os Rolling Stones explodem nas paradas de sucesso [...] a minissaia de Mary Quant, e a pílula anticoncepcional são armas de afirmação feminina [...] o movimento negro Black Panter protesta. A Revolução Cultural na China cultura o “Grande Timoeiro” [...] protestos estudantis explodem no mundo todo. Um grafite em Berkeley proclama: “A felicidade é o poder estudantil” [...] e o Muro de Berlim é o símbolo da divisão mundial (ROCHA, 2000, p.100).
Era uma época onde os jovens tinham voz para dizer e fazer o que achavam certo. Um tempo muito bom para aqueles que queriam se “tornar” alternativo e fazer parte de alguma das contra culturas que estavam nascendo e também um mundo marcado por dois lados. Um lado americano, capitalista e imperialista, de outro a união soviética, comunista e socialista. Apesar da guerra fria ter começado em 1945 foi na década de 60 que a relação entre os dois países piorou muito, principalmente em 62 com a crises dos mísseis em Cuba. No meio de tudo isso está o Brasil, o pais que teve um crescimento econômico considerável nos últimos anos. Isso por causa de um projeto que pretendia desenvolver o pais “50 anos em 5”. Esse era o objetivo do governo de Juscelino Kubitschek que tinha como ferramenta para garantir esse crescimento o “seu Plano de Metas, elaborado com o economista Roberto Campos. Apoiava-se num tripé formado pelo capital nacional, pelo capital internacional e pelo Estado” (ROCHA, 2000, p.87). Mas que teve no seu final de seu governo uma queda de popularidade, exatamente por não alcançar esses objetivos, o que levou nas eleições de 60 a derrota de seu sucessor e a eleição de Jânio Quadros. Esse é o ponto inicial para o golpe de 64, a eleição de Jânio. Por causa de “seu carisma e um estilo excêntrico, combinados com uma postura autoritária, fascinaram platéias e patrocínios” (ROCHA, 2000, p.89). Porem apesar de ser amado pelo povo ele não tinha muito tato político e nenhuma “proposta contra a inflação e a divida externa” (ROCHA, 2000, p.89). Com isso acabou perdendo o apoio da UDN (União Democrática Nacional), partido que tinha encabeçado a coligação que o elegeu. Ainda para piorar sua situação, principalmente com os militares, a direita e os Estados Unidos, Jânio condecora “Che” Guevara com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul e ainda “ensaiou uma ofensiva exportadora nos mercados dos países socialistas em pleno apogeu da Guerra Fria. O Brasil assumiria, assim, uma postura de não-alinhamento com os EUA” (ROCHA, 2000,
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p.90). Assim, sem apoio político de nenhum partido e sofrendo pressão por causa de sua política externa, em 25 de agosto de 1961 Jânio Quadros renuncia a presidência da republica. Com isso o seu vice João Goulart, o “Jango” assume seu cargo. Porem essa sucessão criou um problema muito maior “militares golpistas não admitiam sua posse. De outra parte, militares legalistas exigiam o respeito à Constituição. Para evitar um confronto armado foi adotado o parlamentarismo. Jango assumiu
a
presidência, mas sem poderes para governar” (ROCHA, 2000, p.90). Apenas em 1963 através de um Plebiscito que acaba com o parlamentarismo no Brasil que Jango começa a colocar em pratica seu plano governamental e paralelamente os militares agilizavam a organização do seu golpe. Durante seu pouco tempo como presidente da republica Jango propôs uma serie de reformas de base ao congresso, elas “eram um amplo programa de reformas agrária, tributaria, eleitoral, bancaria, educacional, etc” (ROCHA, 2000, p.91). Essas reformas acabaram por chamar a atenção da direita que considerava o governo de Jango esquerdista, que ele “estaria preparando um regime sindicalista [...] e abria espaços para o avanço comunista” (ROCHA, 2000, p.91). Não apenas a direita mas também os militares começaram a entender as atitudes do presidente como um possível aliado da união soviética e dos ideias comunistas, principalmente apos uma viagem em 61 de Jango para a União Soviética e a China Comunista onde se tornou clara e patente sua incontida admiração ao regime desses países, exaltando o êxito das comunas populares”. A “exaltação” janguista não passou de uma menção em discurso proferido na China, onde, diplomaticamente, expressou “profundo apreço aos trabalhadores, tanto do campo como da cidade, por sua heroica e extraordinária participação na edificação de uma nova China livre e poderosa (VILLA apud TOMAIM, 2008, p.139).
Essa citação foi um manifesto escrito pelo coronel Golbery do Couto e Silva em nome de vários ministros militares e mostra quão grande era o receio de que o Brasil se tornasse um pais comunista através da liderança de João Goulart. Esse “medo” era alimentado pelos americanos que marcavam presença muito forte nas forças armadas brasileiras, principalmente a partir de 49 quando o governo do Brasil fundou a ESG, Escola Superior de Guerra. A ESG teve colaboração muito presente dos EUA desde sua abertura “o que foi determinante para cultivar nos formandos os traços da guerra ideológica que dividira o mundo em
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dois, alimentando a ideia de que o comunismo era uma ameaça presente na América Latina [...]” (TOMAIM, 2008, p.134). Depois de implantar essa ideologia anti-comunista dentro das forças armadas o segundo passo era transmitir essa mensagem para o povo. A mensagem foi transmitida aos poucos. Umas das ferramentas usados pelos militares para propagar a anti-comunismo era a “cartilha” da Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento que entre outras pontos exaltava a existência de um plano soviético “que objetivava dominar progressivamente o Brasil, agindo a partir de grupos comunistas infiltrados em nossa sociedade“ (TOMAIM, 2008, p.135). Além disso era possível encontrar dentro do manual básico da ESG uma explicação detalhada do funcionamento desses infiltrados no Brasil. Segundo a esse manual: A guerra revolucionária comunista tem como característica principal o envolvimento da população do país-alvo numa ação lenta, progressiva e pertinaz, visando à conquista das mentes e abrangendo desde a exploração dos descontentamentos existentes, com o acirramento de ânimos contra as autoridades constituídas, até a organização de zonas dominadas, com o recurso à guerrilha, ao terrorismo e outras táticas irregulares, onde o próprio nacional do respectivo país-alvo é utilizado como combatente. (MANUAL BÁSICO da ESG apud ALVES apud TOMAIM, 2008, p.135).
Foi através da assimilação da população do medo do comunismo que os militares tiveram certeza que o golpe daria certo. Essa assimilação foi fortemente conduzida por “grupos femininos de pressão, que funcionavam como “caixa de ressonância, uma maquina poderosa e de grande alcance” para difundir na sociedade brasileira o temor da “ameaça vermelha”” (TOMAIM, 2008, p.137). Isso mostra que apesar do golpe ter sido executado pelos militares “a derrubada de João Goulart do poder teve apoio de setores da sociedade civil, que viam no avanço da esquerda uma perigosa ameaça para o país. Assim, Igreja, empresários, a classe média e a imprensa teriam sido cúmplices do golpe que conduziu o Brasil ao regime ditatorial” (TOMAIM, 2008, p.139). Esse apoio ficou claro depois do dia 19 de março de 1964 quando a Marcha da Família com Deus pela Liberdade levou as ruas de São Paulo aproximadamente 500 mil pessoas para “protestar contra as idéias defendidas por João Goulart” (TOMAIM, 2008, p.138). É importante lembrar que a maioria desses movimentos femininos contra Jango eram financiados, organizados e
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orientados politicamente pelos militares e que esse apoio foi usado como principal “desculpa” para o golpe acontecer. Como comenta o marechal Cordeiro de Farias: Sempre faço questão de deixar claro que nós, os militares, fomos a retaguarda da Revolução de 1964. a vanguarda foi a opinião pública e, dentro dela, as mulheres. Minas Gerais terá sido a única exceção. Mesmo assim, a frente militar mineira somente se articulou em virtude da mobilização civil prometida pelo governador Magalhães Pinto. Nesse sentido, a Revolução não foi obra do Exército, mas uma reação espontânea iniciada pelas mulheres, e por elas alimentada até o fim. Em Minas e em São Paulo as mulheres fizeram o diabo! (CORDEIRO DE FARIAS apud CAMARGO & GÓES apud TOMAIM, 2008, p.138).
Apesar dos militares defenderem essa idéia de que foi o povo que clamou pelo golpe hoje bem se sabe que ele foi um “produto de um amplo e bem elaborado plano conspiratório“ (TOMAIM, 2008, p.139) que começou, como dito antes, anos antes. Assim em 31 de março de 1964 os militares colocaram o plano em pratica e o que começou como um levante de tropas contra Jango em Juiz de Fora (MG), terminou no dia 1º de abril com a fuga do atual presidente do Brasil, João Goulart para o Uruguai. Nas palavras de Franklin Martins, militante político que dá seu relato no documentário “Ditadura – Tempo de Resistência (2005): “o golpe para mim foi uma decepção profunda, pois não houve nenhuma resistência, ou seja o governo caiu sem dar um tiro” (3’05’’). O resultado “para os vencedores uma revolução democrática; para os vencidos, apenas mais um reacionário golpe de Estado” (ROCHA, 2000, p.91). O que ninguém imaginava era que essa situação seria vivida pelos próximos 20 anos. 2.1.1.1. O Brasil Militar O golpe militar que foi orquestrado pelo o alto escalão das forças armadas do Brasil que desde o inicio do ano de 64 “organizavam um “Estado-Maior Informal” para garantir a vitória da chamada “revolução”. Este “Estado-Maior” tinha um líder importante, o marechal Humberto Castello Branco” (TOMAIM, 2008, p.140). Assim nada mais normal do que ele ser o escolhido pelo Supremo Comando da Revolução para guiar o pais nessa “Nova Ordem”
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e garantir que os interesses militares
fossem mantidos. Para que esses interesses fossem mantidos em 09 de abril de 1964, apenas 8 dias após o golpe militar, foi publicado o AI-1 (Ato Institucional nº1). Esse foi o 8
Termo usado por Rocha, 2000, p.94.
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primeiro Ato Institucional de cinco que chegariam para abalar a vida de todos, principalmente daqueles que eram contra a ditadura que se instaurava no Brasil. O AI-1 estipulava , em seu artigo 2º, sua vigência até 31 de janeiro de 1966 [...] deixava evidente a preponderância do Poder Executivo sobre os demais [...] Além disso, tratava de suspender por 6 meses as garantias legais de vitaliciedade e estabilidade, o que permitia ao Estado demitir, aposentar e colocar em disponibilidade todos os funcionários públicos, civis e militares, que de acordo com seus critérios, poderiam configurar algum tipo de perigo ao regime militar (artigo 7º). Ainda autorizava a cassação de mandatos legislativos e federais, estaduais e municipais, a suspensão de direitos de cidadãos por 10 anos [...] (PRADO, 2004, p.33).
Apesar disso Castello Branco era considerado erroneamente um militar mais brando que “respeitava”, ao menos no inicio, a constituição (TOMAIM, 2008, p.144). Esse percepção é dado pelo fato de após sua brusca tomada ao poder Castello Branco não fechou o Congresso e deixou o poder Judiciário funcionando. Porem o que se esquece é que o general Castello Branco foi um dos cérebros que arquitetaram a revolução e diferente do que muitos acreditavam, não estava ali para comandar um governo transitório e moralizador, mas sim uma ditadura que pretendia ficar no poder muito mais do que os 20 anos que se sucederam. Nós primeiros anos, o governo militar tinha como objetivo: “arrumar a casa, eliminar o que julgavam serem vícios populistas do Estado, mobilizar apoio para o programa de abertura econômica ao capital estrangeiros [...] (ROCHA, 2000, p.95). Porem nem todos concordavam com esse projeto criado pelo novo governo e o povo que tinha aprendido com o populismo a se mobilizar foi a rua reivindicar seus direitos. Assim nasce o SNI, Serviço Nacional de Informação, órgão responsável pela vigilância do povo brasileiro que ao passar do tempo se transformou “na cabeça mais violenta maquina repressiva criada no Brasil” (ROCHA, 2000, p.95). Pior ainda acabou por ser “uma instância consultiva, autônoma até mesmo para vetar nomes sugeridos para cargos públicos” (TOMAIM, 2008, p.159). Isso dava ao SNI poderes ilimitados para investigar na vida de qualquer um com os motivos mais banais possíveis. Antes da criação da SNI, ainda em 64, o presidente Castello Branco já havia
criado os IPMs (Inquéritos Policiais-Militares). Essa ferramenta era usada
como “instrumento de investigação e criminalização de responsáveis pela subversão da ordem social e politica durante o regime militar no Brasil” (CZAJKA, 2008, p.35).
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Esses documentos eram a forma de “legalizar” e justificar os atos de repressão cometidos pelos militares já que segundo Maria Helena Moreira Alves: os IPMs constituíam o mecanismo legal para a busca sistemática de segurança absoluta e eliminação do “inimigo interno” [...] Carentes de qualquer fundamentação jurídica formal, os IPMs não se submetiam a regras fixas de comprovação [...] O testemunho da “opinião pública era suficiente, em certos, casos, para provar as atividades subversivas ou revolucionarias que justificavam a punição [...] A simples acusação num IPM bastava para desencadear uma serie de perseguições que podiam incluir prisão e tortura. (Maria Helena Moreira apud CZAJKA, 2008, p.36).
Pode-se notar que apesar de legal, os IPMs não precisavam ter nenhum embasamento real com os fatos, já que suas fonte poderiam ser forjadas facilmente. O uso dos IPMs combinado com o SNI fez com que o governo militar criasse uma caça as bruxas sem igual, onde todos eram suspeitos e a sentença dependia muito menos do que de quem você realmente era e mais de como o governo lhe via. Em 1965, para piorar a situação do pais, o governo militar instaurou o Ato institucional nº2 que fortalecia ainda mais o poder Executivo. Assim esse Executivo fortalecido podia decretar estádio de sitio e intervir nos Estados [...] suspender as garantias constitucionais de funcionários públicos e militares reintroduzia-se a possibilidade de cassação de direitos políticos de qualquer cidadão brasileiro por dez anos e, [...] tornavam-se indiretas as eleições presidenciais dali por diante (TOMAIM, 2008, p.148).
As novas características mostravam que o governo militar aos poucos foi impondo meios legais para garantir seus objetivos. Mas foi a instituição de um sistema bipartidário no cenário politico brasileiro, onde todos os outros partido foram extintos que deixou ainda mais claro que a intenção dos militares era de um governo duradouro e não transitório. A partir do AI-2 foram criadas apenas duas agremiações politicas “sem a denominação de “partidos”: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Na boca do povo, um era o partido do “sim” e o outro, o partido do “sim, senhor” (ROCHA, 2000, p.95). Esse bipartidarismo era mais uma arma para o governo militar controlar todo o sistema politico brasileiro, já que no papel a ARENA era a direita e o MDB era a “esquerda”. Isso facilitaria a fiscalização dos ideais políticos e na repreensão daqueles mais “ousados”. Como resultado desse alto controle dentro dos partidos vários políticos debandaram para grupos de resistências ilegais, alguns armados
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outros não. A esses grupos se juntaram também estudantes, religiosos e artistas que formavam a ultima fonte de oposição e protesto. Essas ações do governo de Castello Branco foram a “base para a institucionalização da repressão” (TOMAIM, 2008, p.145) construídas por um regime considerado, posteriormente, brando, mas que tinha intenções truculentas e que estava prestes a mudar de mal para pior. Apesar do General Castello Branco ter criado e deixado praticamente pronto todos os aparatos de censura e repreensão para que seus sucessores apenas os aperfeiçoassem, ele “era considera um “fraco” para os radicais do regime” (TOMAIM, 2008, p.144). E assim em 1967 começa o chamado “golpe na Revolução” (ROCHA, 2000, p.96). Castello Branco é afastado do governo e seu substituto, o marechal Artur da Costa e Silva toma posse do poder colocando o Brasil na fase mais violenta do regime militar.
2.1.1.2. A linha dura A sucessão de Castello Branco aconteceu pela votação de “um Colégio Eleitoral previsto no texto do AI-1 de 1964” (ROCHA, 2013, e-mail). Enquanto um grupo dentro do governo militar, “liderados” por Castello Branco, chamado de “moderados” via que os objetivos de “arrumar a casa, eliminar [...] vícios populistas do Estado, mobilizar apoio para o programa de abertura da economia ao capital estrangeiro” (ROCHA, 2000, p.95) estavam quase que completos. Já uma outra parte deste mesmo governo, chamada de “linha dura”, discordava e acreditava que ainda tinham muito trabalho a fazer antes de colocar um presidente civil udenista
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no Poder. Essa foi uma das razões que fizeram com que o próximo presidente do Brasil fosse um militar ligado a essa “linha” mais dura. Outro fator para essa “troca” de poder dentro das forças armadas foi que o governo militar ainda não tinha criado o “milagre econômico”, “um dos componentes do programa de atração de investimentos estrangeiros estava falhando (ROCHA, 2000, p. 96). Isso criou uma barreira para novos investimentos no Brasil, pois passava a impressão de um pais instável tanto economicamente, quanto politicamente. Essa estabilidade se transformou em desconfiança do povo e “arma” 9
Udenistas eram aqueles “políticos afiliados ao extinto partido UDN (União Democrática Nacional) e tem uma denotação de um discurso político marcado pelo moralismo” (ROCHA, 20013, e-mail).
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da oposição que acabou aumentando seus protestos somando esse novo argumento. Para alguns militares essas novas manifestações mostravam que o “inimigo interno” ainda resistia e ao contrario do que os castelistas pensavam não era hora de abrir o regime, mas sim endurece-lo. Assim o próximo a assumir o poder foi marechal Costa e Silva que não esperou muito tempo para mostrar que estava disposta até as ultimas consequências para “endireitar” o Brasil e acabar com qualquer tipo de “ameaça” contra a nação. Como dito antes, Castello Branco apesar de ser considerado um militar “mais brando” ao sair já deixou pronto as ferramentas para o fechamento total do regime, mas foi Costa e Silva quem colocou em pratica essas ferramentas tendo apenas o trabalho de aperfeiçoa-las. Dois dias antes de passar a faixa presidencial Castello Branco assinou a LEI No 5.250 ou “Lei de Imprensa” que “oficializava a censura prévia em todas as redações, emissoras de rádio e televisão do país. Agentes do Estado ficavam encarregados de decidir o que seria ou não divulgado, criando nas redações jornalísticas um clima de terror” (TOMAIM, 2008, p.166). Com essa lei o governo militar tinha como intenção controlar os meios de comunicação de massa e seus colaboradores. Pois atingia diretamente os jornalistas através de penas mais duras em casos, por exemplo, de difamação, injuria e calunia. “Controlar” os jornalistas e consequentemente os meios de comunicação facilitou ainda mais a “utopia autoritária”10, termo que consiste na utilização da repressão e da propaganda para eliminar os inimigos e depois fazer com que ele nunca mais voltem. Ou seja A primeira, em uma perspectiva saneadora (“Operação Limpeza”) se encarregava de eliminar — e, como bem sabemos, não excitava — a oposição ao regime, em especial o “câncer do comunismo”; já a segunda, de visão pedagógica, tratava de “educar” o brasileiro nas normas e condutas sociais, ensinando-lhe os valores morais e cívicos aceitáveis para o regime e os militares no poder (TOMAIM, 2008, p.150).
Essa “utopia” era um pensamento uniforme dentro do governo militar, pois apesar das diferenças entre os grupos dentro do regime quando se tratava de defender a permanência do poder e “o movimento revolucionário de 31 de março de 1964 [...] e impedir qualquer rearticulação autônoma do campo politico os militares tratavam de reiterar a união de suas forças” (TOMAIM, 2008, p.150). E assim os 10
Termo criado pelos historiadores Maria Celina D’Araujo, Celso Castro e Gláucio Ary Dillon Soaresdas,
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militares trabalhavam para fortificar essa “utopia autoritária” como componente unitário de pensamento entre seus membros. Por isso quando o objetivo era “proteger” a nação, os militares tinham um consenso: tudo era valido. Assim nessa troca de poderes interno uma das ferramentas mais absurdas da ditadura brasileira começou a ser frequentemente usada: a tortura. Apesar de já ser utilizada anteriormente ao golpe de 64 “pela policia [...] contra os marginais e delinquentes pobre” (TAVARES, 2012, p.32) a tortura acabou virando ferramenta cotidiana, sádica e perversa contra os presos políticos. Não apenas para adquirir informações, mas também como cita Cássio Tomaim “um método de controle politico da sociedade em geral” (TOMAIM, 2008, p.151). Isso por que a tortura levava medo a todos. Não só aqueles que eram torturados, mas também a quem sabia de sua existência dentro dos porões da ditadura. Esse medo era uma das formas de intimidação do regime militar que sabia que uma sociedade amedrontada é uma sociedade em inercia, sem coragem de levantar nem um dedo contra seu opressor. A tortura era considera pelos militares como um mal necessário, até militares mais moderados como o ex-presidente Ernesto Geisel11 eram a favor da tortura, como o próprio admite em entrevista aos historiadores Maria Celina D’Araújo e Celso Castro: Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária, para obter confissões [...] Não justifico a tortura, mas reconheço que há circunstâncias em que o indivíduo é impelido a praticar a tortura, para obter determinadas confissões e, assim, evitar um mal maior! (D’ARAÚJO e CASTRO apud TOMAIM, 2008, p.151).
Apesar desse terror psicológico que a tortura gerava não foram todos que decidiram ficar parado e uma parta da população foi as ruas protestar. Em 68 o clima de confronto era constante, principalmente entre os estudantes contra o regime e seus controladores. O ápice foi no final de março, quando o estudante Edson Luís de Lima Souto foi morto no Rio de Janeiro durante um protesto contra o regime militar. O que desencadeou uma “onda de manifestações estudantis que foi, então violentamente reprimida” (ROCHA, 2000, p.96). Além disso, alguns políticos em exercício como o Marcio Moreira Alves não abaixaram a cabeça. Deputado pelo MDB Alves fez críticas publicas, onde colocava o atual governo militar como responsável por todos os males que aconteciam no pais. Também pediu a 11
Militar e Ex-presidente da republica durante o regime no período de 1974 a 1979.
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população que protestasse “contra a ditadura nos festejos de 7 de Setembro12” (ROCHA, 2000, p.96). E foi além, na mesma ocasião em que chamou a população contra o golpe, no dia 2 de setembro, enquanto discursava na câmara disse: “Quando poderemos ter confiança naqueles que devem executar e cumprir as leis? Quando não será a polícia um bando de facínoras? Quando não será o Exército um valhacouto
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de torturadores?" (ALVES, acesso: 8, jul. 2013) e um dia após esse
discurso continuou com o mesmo tom, porém dessa vez convocando as mulheres a “negar seus carinhos aos militares envolvidos em torturas” (ROCHA, 2000, p.97). O que não agradou nenhum pouco os militares que imediatamente “exigiram licença do Congresso para processar o deputado” (ROCHA, 2000, p.97). A Câmara dos deputados negou o pedido, o que fez com que o governo militar achasse outra desculpa para piorar a situação democrática do pais e instaurar de vez da ditadura militar no Brasil. 2.1.1.3. A Ditadura Oficializada - A.I. 5 Foi no final de 68, no dia 13 de novembro que o então Presidente Costa e Silva assinou o Ato Institucional nº 5. O AI-5 foi a maneira de dar um basta nos calos que
ainda
incomodavam
os
militares,
pois
legalizava
varias
ferramentas
inconstitucionais para dar poderes excepcionais ao governo militar. Ele tinha como premissas, sanções que iam da prisão a pena de morte, para qualquer que fosse a contestação ao governo. Através dele estabelecia-se o fim do habeas corpus, e a paralização completa de todas as atividades de denuncia e reivindicações. Com o AI-5, o presidente concentrava todos os poderes e decisões, podia decretar o recesso do Congresso, das Assembleias estaduais e das Câmaras municipais, podendo intervir nos estados e municípios. Pelo decretos, a imprensa é censurada, não poupando nem o ex-aliado do governo, o jornalista Carlos Lacerda, que tem seus direitos cassados por dez anos, dias apos a decretação do Ato, bem como muitos outros funcionários públicos, trabalhadores liberais, operários, estudantes, militares e políticos (RIBEIRO, 2005, p.71).
A “mecânica” do AI-5 transformou o governo militar em uma ditadura. Para os militares era ótimo pois dava o poder necessários para acabar com qualquer tipo de oposição ao governo, que no final de 68 começava a se proliferar rapidamente. Para o povo era o fim da liberdade individual e o começo do terror, “situa-se nesta segunda fase do regime militar a maior concentração de denuncias de tortura, perseguições politicas, morte e desaparecimentos, correspondendo a cerca de 70% 12 13
Dia da Independência do Brasil ou Dia da Pátria. Palavra que significa refúgio, abrigo, asilo.
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dos casos noticiados” (PRADO, 2004, p.41). Esse aumento na violência contra os opositores poderia ter gerado um grande desconforto para a imagem publica do governo militar, infelizmente essas ações covardes aplicados sadicamente sobre os presos políticos não eram de conhecimento geral da população. Que também era bombardeada com informação da mídia negando tais atos. Todo esse controle ajudou a ditadura a implementar as fundações do que ficou conhecido como “milagre brasileiro”. O “milagre econômico” foi um dos mais exaltados pela propaganda pró governo e tinha como grande projeto o 1º Plano Nacional de Desenvolvimento. O PND foi a forma dos militares de aplicar seus projetos para o desenvolvimento nacional. O governo já havia tentado antes, mas faltava poder. Agora o poder era absoluto e não existia quem os pudessem impedir. O principal objetivo do PND eram “atrair investimentos estrangeiros maciços para o pais” (ROCHA, 2000, p.94), para isso o governo se responsabilizava em melhorar a infra estrutura das estradas, portos, telecomunicação e energia. Também adotou o congelamento salarial para oferecer uma mão-de-obra barata. O resultado foi que em “1973, o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) atingiu 14% ao ano. E a inflação girava, oficialmente, em torno dos 13% anuais.” (ROCHA, 2000, p.97). Outro milagre promovido pela propaganda foram as conquistas esportivas. Em 1970 o Brasil se tornava tricampeão mundial, tinha o Rei do futebol nos campos e o primeiro campeão da Formula 1, Émerson Fittipaldi. Todo esse nacionalismo exaltado pelo “milagre brasileiro” ajudou a ditadura a encontrar um apoio popular que aquela altura ia diminuindo. Principalmente nas classes médias que estavam muito contentes com o aumento do consumo gerado pela alta da economia. Para que tudo funcionasse corretamente e o desenvolvimento fosse alcançado era preciso, segundo os militares, de segurança. E esse era um dos lemas do então Presidente Emílio Garrastazu Médici. Ele assumiu o poder em 69, escolhido por uma junta militar após o afastamento de Costa e Silva vitima de uma trombose que o levaria a morte meses depois. Médici era outro militar considerado linha dura que ia até as ultimas consequências para garantir os interesses da ditadura militar. Claro que os interesses da ditadura nem sempre eram do interesses de todos, muitos menos das varias frentes legais ou clandestinas que faziam oposição a dominação militar. Por isso a “segurança” era necessária ao governo, pois calava a boca daqueles contra o regime e reprimia a sociedade (ROCHA, 2000,
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p. 98). O Ato Institucional número 5 foi o trunfo da ditadura no quesito segurança pois cumpria esse papel de controle sobre tudo e todos. Apos o decreto do AI-5 Flavio Tavares comenta que se “prendeu a esmo, numa gigantesca caça as bruxas que não ocorrera sequer em 1964 na derrubada do presidente João Goulart” (TAVARES, 2012, p.26). O resultado além das prisões arbitrarias foi uma migração ao exílio daqueles que ainda eram livres, principalmente dos lideres políticos. Para os militares a missão de garantir a segurança para que o desenvolvimento acontecesse estava se concretizando. Os inimigos internos ou estavam sendo presos ou fugiam do pais. “Brasil, Ame-o ou deixe-o” dizia o slogan que “não foi criação da Aerp14, órgão responsável pela propaganda politica do regime militar, mas da própria Oban15” (TOMAIM, 2008, p.161). Que mostrava o nível de tolerância mínimo aos “traidores da pátria”. Mas nem todos aqueles que ainda acreditavam que o Brasil ainda poderia voltar a ser uma democracia justa estavam dispostos a “lutar” no exilio. Porem com o AI-5 os caminhos dentro da politica para lutar contra o regime foram praticamente extintos. A oposição não via maneiras legais de se conseguir qualquer tipo de reinvindicação, assim “a falta de canais normais de atuação politica [...] levaram, então, as organizações clandestinas de esquerda a discutir a opção armada” (ROCHA, 2000, p.98). Além disso já estavam fartas dos abusos do regime que com o passar do tempo ficava mais rígido, mais violento e menos constitucional. Assim vários
grupos
clandestinos
como
a
Var-Palmares
(Vanguarda
Armada
Revolucionaria Palmares), COLINA (Comando de Libertação Nacional), POLOP (Politica Operaria) MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), AP (Ação Popular), ALN (Ação Libertadora Nacional), entre outras, além do Partido Comunista do Brasil (PC do B). Essas organizações entendiam que era necessária pegar nas armas já que “a luta revolucionaria seria de libertação nacional” (RIBEIRO, 2005, p.142), pois acreditavam que a luta que eles começariam iria sensibilizar a opinião publica e faria com que o povo desse continuidade. Ilusão que foi percebida logos nos primeiros anos de luta armada. 14
Assessoria Especial de Relações Públicas, “foi criada durante o governo Costa e Silva com o objetivo de centralizar os órgãos governamentais de propaganda. Composta basicamente por sociólogos, psicólogos e jornalistas, foi utilizada pelo regime com maior intensidade durante o período de governo do general Médici” (MARTINS, 1999, p.76). 15 Operação Bandeirantes, “concentrada em São Paulo com a finalidade de combater a guerrilha urbana” (Prado, 2004, p.39),
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Esses grupos clandestinos eram compostos por uma miscigenação de ideologias, nem todos eram comunistas ou socialistas como comenta Carlos Eugenio Paz ex-militante da ALN (Ação Libertadora Nacional), “muitos integrantes eram nacionalistas, padres dominicanos e muitos militantes almejavam somente acabar com a ditadura militar no Brasil que havia sido promovida pelo imperialismo norte-americano, não havendo a intenção de parcelas de seus quadros de chegar ao socialismo (RIBEIRO, 2005, p.142). Seus objetivos tinham uma unidade maior, porem os meios para atingi-los eram amplos. Para financiar suas ações esse grupos praticavam assaltos a bancos e outros tipos de “expropriações”, como comenta Flávio Tavares: “as organizações da resistência não roubam, mas expropriam16, Nenhum centavo vai para o bolso de nenhum integrante de nenhuma organização” (TAVARES, 2012, p.64). As armas em alguns casos também vinham de expropriações feitas em quarteis do exercito, como o caso de janeiro de 1968 onde militantes da VPR (Vanguarda Popular Revolucionaria) invadiram o Hospital Militar de Cambuci (RIBEIRO, 2005, p.79). Algumas ações mais violentas aconteceram, principalmente vindas da ALN (Ação Libertadora Nacional). Entre as mais violentas estão a “explosão de um carro bomba no Quartel General do II Exercito” (RIBEIRO, 2005, p.79) e o “justiçamento”/assassinato do capitão Charles Rodney Chandler por ser agente da Central Inteligency Agency - CIA - e representante do imperialismo americano; haver lutado no Vietnã; ter orientado, na Bolívia, os chefes do Exercito boliviano na repressão às guerrilhas, ação que culminou com a morte de "Che" Guevara; ter apoiado a guerra americana no Vietnã e, finalmente, estaria realizando um levantamento no Brasil (TARDE, 1969).
Esses grupos armados contra a ditadura também tinham missões praticamente suicidas como a libertação de presos, inclusive dentro de prisões. Uma delas aconteceu no presidio Lemos de Brito do Rio de Janeiro. Flávio Tavares que estava entre os organizadores do resgate e participou da ação conta que Tudo tinha durado menos de três minutos. As 18 horas, em ponto, dessa tarde de maio de 1969, ao concluir o recreio e em vez de voltarem as celas, nove presos transpuseram a porta principal [...] Nenhum gesto de força, nem sequer um empurrão. Só astúcia (TAVARES, 2012, p.49).
16
Tirar legalmente a alguém a posse ou a propriedade de.
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Meses depois o próprio Tavares se encontraria na condição de preso. Prisão essa que durou 30 dias e só não foi prolongada e mais trágica, pois seu cativeiro provavelmente só iria terminar com sua execução, por que ele foi um dos 15 prisioneiros trocados no sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick. Dentre os objetivos dos sequestradores, realizado por dois grupos armados o MR-8 e a ALN, no dia “4 de setembro de 1969, estavam a propaganda armada e a libertação de quinze presos que seriam enviados ao México” (Ribeiro, 2005, p.93). Essa ação, uma das mais ousadas, realizada pela oposição ao governo militar foi a primeira, mas não a ultima. No ano de 1970 houveram ainda mais ações envolvendo embaixadores no Brasil. “No Em março, foi a vez do cônsul japonês Nabuo Okuchi [...] Em junho, capturaram o embaixador Ehrenfried von Holleben, da Alemanha Ocidental [...] Em dezembro, foi o embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher” (BUCCI e AFFINI, 1994). Além das ações armadas outra tática importante para esses grupos era a propaganda armada. Que tinha como proposito denunciar sobre “a penetração do capital estrangeiro como domínio imperialista sobre o pais. [...] a falta de liberdade de expressão e do livre debate sobre o desenvolvimento. [...] a desvalorização dos salários e a queda da qualidade de vida da maioria da população" (ROCHA, 2000, p.99). Essa propaganda era realizada dentro das “ações de campo”, como nos sequestro dos embaixadores. Onde uma das exigências era a leitura de um manifesto (TAVARES, 2012, p.127). Outra forma de propaganda armada era a panfletagem. No Rio de Janeiro uma das células mais ativas contra o regime militar usava a tipografia de um presidio, “na única tipografia que jamais seria vasculhada pela policia” (TAVARES, 2012, p.100). O autor ainda conta que durante as festas juninas, “os detentos soltavam balões que, ao arder no ar, faziam cair sobre a cidade milhares de volantes com criticas a situação econômica social” (TAVARESM, 2012, p.100). Isso mostra o quão versátil eram as ações desses grupos para tentarem desestabilizar o regime militar, infelizmente como veremos a seguir eles não estavam tão preparados assim para enfrentar um inimigo maior, mais organizado e muito mais equipado. Com todas essas ações da oposição efervescendo ao olhos do povo o governo militar tinha a preocupação imediata para acabar de uma vez por todas com o tão procurado “inimigo interno”. E agiu rápido para que o sonhado objetivo da revolta popular não fosse alcançado. A resposta chegou primeiro a São Paulo onde
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surgiu a OBAN (Operação Bandeirantes). Segundo Cássio Tomain, no seu inicio, a OBAN era um “dispositivo extralegal” (2008, p.155) e tinha como objetivo combater a guerrilha urbana. Porem mais que isso, a operação bandeirantes centralizou as atividades repressivas. Qualquer preso político ou suspeito de atividades subversivas deveria ser encaminhado para lá. Criava-se, então, um corpo de polícia dentro do Exército que contava com oficiais e subalternos das três Armas e da Força Pública de São Paulo, além de delegados, investigadores e pessoal burocrático da Secretaria de Segurança. Instalada nas dependências de uma delegacia desocupada, o 36o Distrito Policial, a Oban tornava a rua Tutóia, em São Paulo, o endereço do centro de tortura mais famoso do Brasil (TOMAIM, 2008, p.155).
Dessa forma o governo militar se organizava “dentro da lei” para garantir que a “contra-revolução” tivesse um fim rápido, mas não indolor. Segundo a visão dos militares, a OBAN foi tão bem sucedida que o projetopiloto que se iniciou em São Paulo deveria ser aplicado em todo o pais. Para o regime “os resultados atingidos foram excepcionais. Os assaltos a bancos foram diminuindo até a ausência total, da mesma forma que terminaram os assaltos aos quarteis e os sequestros de autoridades” (SILVA apud TOMAIM, 2008, p.156). Assim menos de um ano depois da elaboração da Operação Bandeirantes em 1969 o governo militar decide expandir a OBAN para todo o território nacional, criando os DOIs (Destacamento de Operações e Informações), subordinados aos CODIs (Centro de Operação de Defesa Interna). Essas bases operacionais espalhadas pelas grandes cidades do Brasil se tornaram os locais de maior violência, onde a “tortura aos presos políticos tornou-se pratica comum” (ROCHA, 2000, p.99). Apesar de nunca ter sido oficialmente pelas forças armadas a pratica da tortura se transformou em ação corriqueira para alguns oficiais e um prazer sádico para outros. O tipo de tortura variava de acordo com a resistência do torturado, quanto mais difícil de “quebrar” mais forte se tornava a tortura. No entanto era o nível de sadismo do torturador que comandava as seções de horror. Dentro dos porões do DOI/CODI existiam “celas climatizadas, para submeter prisioneiros a baixas ou elevadas temperaturas, ou sonorizadas para expor as vitimas a barulhos e gritos” (TOMAIM, 2008, p.152). Dormir era impossível, principalmente para os recém chegados que passavam varias horas sendo “interrogados” com pequenas pausas apenas para aumentar o terror. As seções de tortura não agrediam apenas o físico e o psíquico dos presos, a humilhação era uma das formas preferidas para acabar
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com a moral e a integridade daqueles que estavam sendo torturados. Como comenta Flávio Tavares: A grande humilhação, símbolo da derrota e do ultraje, é despir-se. “Vai tirando a 17 roupa”, diz o chefe do PIC , e já um dos sargentos agarra-se na camisa ou puxa a calça ou a saia e a primeira reação, instintiva é gritar, num ingênuo gesto de defesa: Não me bota a mão. Deixa que eu tiro”. É o momento da mutua corrupção entre a vitima e o algoz. Na crença de que se defende , o prisioneiro obedece e se despe [...] mas de fato se desnuda, como o torturador quer. O preso se dobra ao carrasco, na ilusão inconsciente de tentar corrompe-lo e atenuar a tortura seguinte [...] E o carrasco corrompe mostrando poder, para que saiba que ele comanda a vida do prisioneiro e pode torturar mais ou menos (TAVARES, 2012, p.33).
Dentro do regime a pratica da tortura era difundida como um meio de se obter informação de maneira rápida dos presos políticos, principalmente por que eram poucos os que aguentavam as varias sessões de choques elétricos, espancamentos e as condições precárias que se encontravam nas celas enquanto não eram torturados. Entretanto para muitos militares a tortura era um “esporte”, tanto que o “Centro de Informações do Exercito (CIE) concedia aos torturadores a Medalha do Pacificador18” (TOMAIM, 2008, p.153). Isso mostra que muitas das vezes as atrocidades vinham sem motivos. Muitos suspeitos de integrarem grupos clandestinos contra o regime eram presos com denuncias falsas ou inexistentes. Uma das acusações mais absurdas era a “cumplicidade familiar”, um “crime” não previsto sequer na totalitária Lei de Segurança Nacional, mas constante dos manuais de tortura elaborados na School of the Americas [...] se algum “suspeito” fugisse ou não fosse encontrado, em seu lugar prendiam-se os parentes mais próximos, para força-lo a entregar-se (TAVARES, 2012, p.35).
Para piorar a situação o AI-5 havia banido o direito legal da vitima de socorrer-se ao habeas corpus. Fazendo com que o torturado ficasse preso durante o tempo que fosse necessário para que os militares obtivessem todas as suas respostas ou saciassem seu sadismo. Para quem ficou preso nos porões criados pela ditadura para serem o purgatório dentro na Terra o sonho da liberdade era distante e dolorido, pois “torturar é a dinâmica desse purgatório perene, onde tudo se sofre e nada se purga” (TAVARES, 2012, p.29). Diferente de Tavares alguns
17 Pelotão de Investigações Criminais
18 A medalha era o reconhecimento pelos “atos de bravura ou de serviços relevantes prestados ao Exercito [...] em São Paulo, noventa medalhas foram concedidas em três anos” (TOMAIM, 2008, p.153)
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militares, como o delegado Sérgio Fleury
19
e o capitão Mauricio Lopes Lima,
gostavam de chamar os “porões da ditadura” de “sucursal do inferno” (BATISMO DE SANGUE, 2006) onde a única coisa a se sentir era a dor. Levar o inferno para as ruas também era a intenção de alguns militares de estrema direita. Entre os planos mais violentos e malucos estava o de fazer com o Rio de Janeiro o que Nero fez em Roma. Em 1968 o brigadeiro Burnier da Aeronaltica “tentou literalmente dinamitar e incendiar a cidade do Rio de Janeiro e logo, por a culpa de tudo nos “comunistas subversivos”, para ter com isso o pretexto de perpetrar um “banho de sangue com matança geral” na área da oposição” (TAVARES, 2012, p.110). O plano perfeito teve apenas uma falha: “convocou o Parasar 20para incendiar a cidade e “Sergio Macaco” negou-se a cumprir a ordem e denunciou tudo” (TAVARES, 2012, p.111).
A
violência aumentava com o passar do tempo e proporcionalmente ao poder que o governo dava aos seus militares para proteger a nação, mal sabiam ele que tais abusos provocariam sua própria queda. Em meados da década de 70 a violência exercida pelo governo era enorme, parte da população já sabia das torturas, das perseguições e do terror que estava acontecendo de maneira cada vez maior no Brasil. Isso por que “o aparato repressivo crescera a tal ponto que, frente aos movimentos contrários ao regime militar, chegara a perder o próprio referencial que separava a legalidade da ilegalidade” (PRADO, 2004, p.41). Com oficiais sem discernimento entre do certo e do errado e cada vez mais sádicos, o governo acabou não conseguindo controlar todos e em outubro de 1975 sofreu um dos maiores revés. Vlado como era conhecido Vladimir Herzog entre os amigos e familiares nasceu na antiga Iugoslávia, mas era naturalizado brasileiro. Se formou em filosofia na USP em 59 e começou sua carreira como jornalista. Trabalhou em grandes meios de comunicação como O Estado de S. Paulo, BBC e na TV Cultura, que foi o seu ultimo trabalho em vida como diretor de jornalismo. Era membro do PCB, entretanto não participava ativamente das atividades do partido. No dia 24 de outubro de 75 19 Apesar de não ser militar, Sergio Fleury foi um dos mais sádicos e lunáticos agente da ditadura que
passou pelo DOI/CODI. Foi acusado inúmeras vezes de tortura e assassinato e é apontado como líder do Esquadrão da Morte em São Paulo durante a década de 70. Foi um dos torturadores do Frei Tito, junto com o capitão Mauricio Lopes Lima. 20 Grupo de busca e salvamento da FAB, fundado e comandado pelo capitão Sérgio Moranda de Carvalho, “Sérgio Macaco”.
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os agentes da repressão foram até a emissora para prender Vlado, mas foram demovidos por outros jornalistas que alegavam que ele não poderia abandonar a redação com o telejornal em pleno andamento. Herzog se apresentou voluntariamente na manhã seguinte no DOI-CODI, onde conheceria a tortura, a humilhação e a morte horas depois. (TOMAIM, 2008, p.157).
Assim um dia após a sua ida ao DOI-CODIS o governo militar anunciou a sua morte. O fato provocou uma enorme mobilização, houveram protestos com repercussão nacional e internacional, o maior deles com a participação de oito mil pessoas na Catedral da Sé. Tudo isso não apenas pela morte do famoso jornalista, que durante o tempo que foi o “responsável pelo telejornal da TV Cultura de São Paulo. Imprimiu a programação um tom de denuncia dos problemas vividos pela população” (ROCHA, 2000, p.109). Mas principalmente pelo fato de que junto as manchetes declarando a morte de Herzog uma foto ilustrava a versão de suicídio que o exercito alegava como verdadeira. Repudiado por diversos setores da sociedade, a versão de suicídio foi empurrada goela a baixo pelo governo e só foi realmente “corrigida” em 2013 com um novo atestado de óbito. A ditadura pagou um preço alto por esse tipo de exposição e para piorar sua própria situação três meses depois do caso Herzog a mesma historia iria se repetir. Dessa vez a morte do metalúrgico Manuel Fiel Filho é manchete dos jornais e mais uma vez o governo repete a versão de suicídio. A revolta da população aumenta, fazendo com que o atual presidente Ernesto Geisel tome uma “solução imediata e o general Ednaldo D’Avilla Mello é exonerado do cargo” (TOMAIM, 2008, p.159). Nesse momento por mais que o próprio governo negasse os atos de violência e a tortura, o mundo e principalmente os próprios brasileiros começavam a perceber o que de fato acontecia nos “porões da ditadura”. 2.1.1.4. O Começo do Fim Além da aparente violência, das torturas e abusos, outros fatores influenciaram o fim do regime que alguns acreditavam que nunca iria acabar. O atual presidente, o general Geisel, acreditava que “a abertura politica deveria acorrer de forma “lenta, gradual e segura”” (ROCHA, 2000, p.109). Isso mostra que para alguns militares já era hora de voltar para a caserna. O povo também já não apoiava tanto o governo militar, reflexo do péssimo momento da economia no final da década de 70. A fonte de dinheiro vinda do estrangeiro secava cada vez mais, fazendo com que a divida externa explodisse, aumentando a inflação de forma exponencial. Isso fez
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com que finalmente as pessoas percebessem que “durante o período do “milagre brasileiro”, os pobres ficaram mais pobres e os ricos mais ricos” (ROCHA, 2000, p.108). Os opositores do regime ganhavam cada vez mais aliados, pois “ao endurecer-se [...] a direita militar rompeu o próprio esquema civil que a havia apoiado e ampliou o leque opositor” (TAVARES, 2012. p.39). Já o governo militar perdia “apoiadores” importantes. O presidente James Carter21 democrata tinha uma politica externa de não apoiar regimes ditatórias, principalmente na América Latina o que dificultava ainda mais a entrada do capital estrangeiro. As mídias de massas também começavam a mostrar certa rebeldia e publicavam no lugar das meterias cesuradas receitas de bolo ou cantos de Os Lusíadas. Todos esses problemas fizeram com que o governo e o então presidente Geisel adiantassem seus planos de abertura politica e assim no dia 31 de dezembro de 1978 foi revogado o AI-5, dez anos após entrar em vigor. Isso contrariou muitos militares linha dura que tentaram voltar ao poder na “eleições” de 79. Entretanto o candidato do presidente Geisel acabou vitorioso e em março de 79 o general João Figueiredo foi eleito presidente da republica. Assim como seu antecessor continuou com o projeto da abertura politica e no mesmo ano de sua posse assinou a Lei n° 6.683 ou Lei da anistia, como ficou conhecida. Lei essa que diz: Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares (LEI No 6.683, DE 28 DE AGOSTO DE 1979).
Contudo mais do que anistiar seus antigos “inimigos” o governo pretendia anistiar a si próprio, pois imaginava que o povo não iria perdoar os militares pelas ações cometidas durante os anos da ditadura depois que esses deixassem o poder. Essas medidas também tinham como objetivo mudar a visão das pessoas sobre o Presidente Figueiredo, por ser este o “representante” do governo militar, a imagem de ditador precisa ser mudada para a de um “líder” mais próximo do povo. Ironicamente esse objetivo foi difícil de ser alcançado, principalmente pelas gafes cometidas pelo próprio Figueiredo. Em uma de suas primeiras entrevistas após tomar posse da presidência, “Figueiredo declarou alto e bom som que preferia cheiro 21 39º Presidente do Estados Unidos, exerceu seu mandato entre 1977 e 1981.
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de cavalo a cheiro de povo. Noutra, a uma criança que lhe perguntou o que ele faria se ganhasse um salário mínimo para viver, disparou “eu dava um tiro na cuca”” (ROCHA, 2000, p.110). Com isso o ultimo presidente do regime militar acabou se transformando para o povo em um ícone da época, mais pela sua língua solta do que pelo regime. Em 1981 a reforma partidária acontecia e acabava com o bipartidarismo imposto pelo AI-2. Partidos como p PT, PDT, PDS e PMDB foram criados e a democracia já não parecia tão longe como antes. Apesar disso os mais extremistas da direita militar não estavam nem um pouco satisfeitos, planejavam voltar ao poder e instaurar novamente um regime de opressão, violência e medo. Foram vários os atentados a bancas de jornais e aos prédios da OAB. Entre os mais famosos está o caso do Riocentro, onde “no dia 1º de maio de 1981. Um sargento do Exercito morreu e um capitão ficou ferido quando uma bomba explodiu no automóvel que ocupavam. Ambos eram agentes dos órgãos de repressão no Rio de Janeiro” (ROCHA, 2000, p.110). O caso ficou famoso pois o objetivo dos militares era explodir a bomba dentro de um show em comemoração ao Dia dos Trabalhadores. Felizmente a bomba explodiu antes da hora e além de estragar o plano assassino também impediu que os militares de extrema direita conseguissem forjar provas para uma nova tomada ao poder. Nenhum desses esquemas funcionou e assim em 1984 começaram as campanhas das Diretas Já que acabaram por enterrar de vez o regime e a ditadura militar no Brasil vinte anos após o seu inicio. 2.1.2. É proibido – A Censura e suas caras Apesar da ditadura usar da força, violencia e, principalmente, do medo para controlar os grupos contra o regime e seus participantes, os militares entendiam que para controlar as grandes massas seria preciso controlar os meios de comunicação. Assim podendo controlar os jornais, os radios e as televisões seria quase impossivel que um levante popular fosse projetado através dessas midias de massa. Por isso mesmo que em plena madrugada do dia 31 de março para 1 de abril alguns grande veiculos de informação já sentiam como seria o futuro dali em diante. Flavio Tavares, reporter do jornal Ultima Hora comenta que ao ligar para a redação no Rio de Janeiro teve um “relato sucinto do que ocorrera. O jornal fora invadido e parcialmente drestuido por grupos de extrema-direita, apoiados pela polícia carioca”
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(TAVARES, 2012, p.147). E tentando alertar outros meio de comunicação o autor comenta que: “Tive ainda frustradas conversações com a Radio Nacional e a TV Excelsior, que – ocupadas pela polícia estadual da Guanabara – haviam passado, pela força, às mãos de jornalistas vinculados ao CCC, o Comando de Caça aos Comunistas” (TAVARES, 20012, p.147). Isso mostra a rápida reação dos “golpistas” em controlarem aqueles que poderiam atrapalhar os planos de conquistas naquele momento inicial. Entretanto o recem governo militar não podia encarceirar os meios de comunicação para sempre. Isso provavelvente atrapalharia sua imagem perante a opnião publica que ainda não tinha ideia que o golpe de 64 era, naverdade, uma ditadura disfarçada. Une-se a isso o fato de que no inicio do regime “a ditadura ainda se envergonhava de reprimir e, mesmo dura, transigia, buscava aparecer como bem comportada e obedecia a justica, que pelo menos no ambito do Supremo Tribunal atuava com independencia” (TAVARES, 2012, p.25). Isso mostra que a censura não era utilizada com todas as forças no começo da ditadura. Claro que a censura já existia, sua origem no Brasil vem desde os 30, quando o governo de Jetulio Vargas criou o “Serviço de Censura dos filmes cinematograficos” (KUSHNIR, 2001, p.174). Esse primeiro orgão censorio tinha uma função mais classificatoria sobre os filmes e determinavam entre outras coisas "o melhor publico para assisti-lo” (KUSHNIR, 2001, p.175). Porem esse primeiro Serviço de Censura já mostrava entre os itens a serem observados que “ferir a dignidade nacional, a ordem publica, as forças armadas ou as autoridades” (KUSHNIR, 2001, p.175) eram motivos para interdição do material. Esse sistema perdurou durante os anos que antecederam o golpe, mas não foi motivo de grandes preucupações por parte dos artistas e jornalistas da epoca. Entretanto com a ascenção dos militares logo se percebeu que “tempos de intolerancia e policialismo” (TAVARES, 2012, p.149) estavão por vir. Infelizmente alguns perceberam tarde demais, por que sorateiramente o governo golpista mascarava seus atos e aos poucos ia endurecendo o regime. Assim quando as pessoas menos percebessem já estariam em plena ditadura. Essas “doses de autoritarismo” vieram aos pouco, com os Atos Institucionais para controle “macro” e para uma abrangencia mais “micro” outras leis, mais especificas foram criadas. Um desses casos de controle “micro é anterior à censura, para controlar os meios de comunicação os militares criaram a, já citada, Lei de Imprensa. O objetivo era claro, controlar aqueles que criavam as
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noticias, os jornalistas, editores, chefes de redação, etc. Atraves do medo e de possiveis acusações que poderiam se transformar em crimes politicos. Esse tipo de ação “legal” fez com que o trabalho da censura fosse realizado pelos proprios jornalistas. A “Autorcensura” (KUSHNIR, 2001, p.187) era a melhor forma de não correr o risco de ser considerado inimigo do governo militar. Apesar disso esse “metodo” não era visto com bons olhos dentro dos meios de comunicação, principalmente daqueles que faziam oposição a ditadura. Martins Alonso censor e Secretário de Redação do Jornal do Brasil por 40 anos comenta que A autocensura era repelida como um insulto pela propria direção dos jornais. Ela era tambem um ofensa ao espirito: -Além de seu caráter espúrio, ela deixava marcas que só apareciam com o tempo: empobrecia intelectualemnte os reportes e estrangulava a criatividade nas redações (KUSHNIR, 2001, p.188).
Ainda sim era muito utilizada e insentivada por quase todos os censores dentro dos jornais (KUSHNIR, 2001, p.180), principalmente por que alguns agentes do governo achavam essa estrategia mais eficiente. A censura interna, “plantada” dentro dos jornais, foi consequencia do AI-5. Com poderes “ilimitados” o governo poderia fazer o que bem entendesse para controlar a tudo e todos. Assim além dos itens já citados o AI-5 tinha, como função, “estabelecer a censura da imprensa, da correspondencia, das telecomunicações e das diversões publicas” (CRUZ, Sebastão C. Velasco e, MARTINS, Carlos Estevam apud MARTINS, 1999, p.65.). A partir do AI-5 foi oficializada esse tipo de ação do governo. O então ministro da Justiça Gama e Silva justificou a censura em um depoimento a edição do dia 24 de Janeiro de 1969 no jornal Folha da Tarde e disse: Logo após a edição do AI-5, se tornou necessaria, por motivo da segurança nacional em defesa da ordem pública, a censura à imprensam. Porem, de acordo com a decisão do presidente da Republica, posso afirmar categoricamente que não há censura à imprensa [...] A crítica da imprensa não nos atemoriza. O que desejamos, exclusivamente, é que ela seja autenticamente verdadeira; que use a liberdade com responsabilidade. Qualquer abuso que venha a ser praticado será reprimido com toda a energia pelo Ministério da Justiça” (KUSHNIR, 2001, p.270).
Dessa forma a censura mais represiva dava as caras no Brasil, apesar de no principio do AI-5 não ter sido “percebida” publicamente.
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O objetivo da censura era claro, controlar os canais que poderiam manipular o povo a favor ou contra sua imagem. Os militares sabiam que com o controle desses veiculos nas mãos poderiam colocar mais peso a favor na balança da opnição publica. Apesar das pessoas lembrarem dos censores como os “cães de guarda” (KUSHNIR, 2001) do governo militar que riscavam com seus lapis vermelho. O aparato censor foi além e tinha entre suas ferramentas o usa da chantagem para garantir que o controle. Isso acontecia “através de uma politica de concessão de licenças ou registros para a atuação de emissoras de televisão, jornais, revistas etc.” (MARTINS, 1999, p.15). Assim já que o aval de funcionamento desses meios de comunicação vinham por autorização do governo nada mais “justo”, segundo o pensamento militar, do que essas midias “retribuissem o favor”. E apoiassem o governo no conteudo apresentado ou então fechar as portas. Esse tipo de “chantagem” trazia alguns beneficios”. Obviamente, controlar o tipo de mensagem que sairia desses veiculos era o mais importante. Mas também ter um “aliado” falando a favor do governo militar por “conta propria”. Fator fundamental para os militares que acreditavam que essa estrategia proporcionaria “ao regime uma propaganda "favorável", sem que o governo tivesse que responder publicamente por ela, neutralizando assim as possíveis comparações com o DIP22” (MARTINS, 1999, p.10). Para os militares negar esse tipo de comparação era essencial para se distanciar do governo que tinha sua principal característica o populismo e assim não cair em contradição entre seus atos e sua imagem passada ao povo. Assim a censura usava esse dois canais que se complementavam para que o processo de controle sobre os meios de comunicação fosse pleno. O objetivo era garantir ao militares a divulgação de “seus feitos e, principalmente, para criar junto a sociedade uma imagem “positiva “de si, ao mesmo tempo que impunha extrema censura à imprensa, impossibilitando-a de divulgar ao público nacional opiniões que destoavam da mística do “Brasil grande”” (MARTINS, 1999, p.74). Assim “bloqueando” certas informações e enaltecendo outras a censura construía terreno para manter a opinião publica a seu favor. Terreno esse fundados em algumas mentiras e muitas verdades manipuladas. Pois segundo Octavio Costa “a arte de comunicar não é a arte de vender a imagem ótima... de um governo, mas a arte de apresenta-la verdadeira” (FICO apud MARTINS, 1999, p.81). Isso mostra a 22
Departamento de Imprensa, criado durante a ditadura de Getulio Vargas em 1942.
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estratégia do governo em não admitir seus verdadeiros atos e manipular a mídia criando um tipo propaganda politica implícita. Esse tipo de estratégia era concebido pelo alto escalão da ESG, já o trabalho “braçal” da censura, junto com toda a culpa por esse tipo de trabalho recaiu por pessoas que hora eram chamadas de policia, hora de jornalistas: os censores. Essas pessoas responsáveis diretas pelos riscos vermelhos eram a linha de frente do governo militar para silenciar os meios de comunicação e a cultura no Brasil. O censor era definido como “o critico – no sentido de quem encerra um julgamento -, o funcionário publico encarregado da revisão e da censura de obras literárias ou artísticas, ou do exame critico aos meios de comunicação de massa...” (KUSHNIR, 2001, p.160). O papel dele para o governo militar era idêntica a de um perito criminal e exigia “do individuo vasto conhecimento do assunto, excelente nível intelectual” (KUSHNIR, 2001, p.182), e que com esses tipos de faculdades deveria zelar pelos “bons costumes” que a ditadura pregava. Para os que foram rabiscados de vermelho o censo era um “tira”, mero policial considerado intelectualmente inferior por entre outros fatos a falta de atenção em “deixar passar” certas mensagens nada subliminares. De fato havia a “existência de jornalistas que foram censores federais e também policiais enquanto exerciam a função de jornalistas nas redações” (KUSHINIR, 2001, p.26). Essa dupla profissão, policial/jornalista ou jornalista/policial, que alguns censores tiveram durante o período do regime militar mostra o quanto era incoerente e indecisa as funções dos censores. 2.1.3. É Proibido proibir - A Liberdade Contra a Ditadura Se por um lado existiam jornalista simpatizando com a ditadura a ponto de defende-la como um censor, por outro em proporções muito maiores estavam os que eram contra. Não apenas contra a censura dentro dos jornais, a opressão e o medo, mais do que isso perceberam que o governo militar estava se voltando “contra a Cultura, em sua base mais autentica: a liberdade” (LIMA apud CZAJKA, 2009, p.215). E assim sem liberdade de expressão e até sem liberdade
de
pensamento algumas pessoas perceberam que mais do que seus direitos individuais estavam em jogo, colocando até certo ponto a evolução artística, intelectual e, claro, cultural em cheque no Brasil.
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Para combater essa situação todos aqueles insatisfeitos com o regime militar resolveram lutar, cada um a sua maneira, cada um com a sua melhor arma. A violência armada foi uma das maneiras usada por ambos os lados, tanto militares quanto militantes achavam que os problemas poderiam ser resolvidos mais rapidamente se armas fossem usadas para “defender sua ideologia”. Entretanto a brutalidade da “tortura e da censura foi monopólio do governo ditatorial” (BRESCIANI apud KUSHINIR, 2012, p.13). A pensadora Hannah Arendt diz que: diferentemente do poder, a violência é muda, e começa exatamente aonde a palavra é calada” (BRESCIANI apud KUSHNIR, 2012, p.13) isso explica por que a censura e a tortura foram tão usadas durante a ditadura no Brasil. Já que esses dois tipos de violência eliminavam qualquer chance para o dialogo ou debate acontecer. Aqueles ligados aos meios de comunicação, jornalistas, cronistas e claro chargistas tentavam a sua maneira “lutar” contra a violência imposta pelo governo militar e a primeira batalha era travada contra a própria censura que ao “negar ao outro o direito de acesso a determinados temas; vigiar pessoas; ditar normas de condutas; excluir palavras do vocabulário [...] (KUSHNIR, 2012, p.36) acabava construindo uma realidade totalmente mentirosa. Para burlar aqueles que encarceravam a verdade varias artimanhas foram sendo utilizadas por jornalistas como Tonico Ferreira do jornal Folha da Tarde que relata: Dois policiais passaram a ler nosso material. Começamos o penoso aprendizado de enganar censores, mandar textos tipo “boi de piranha para serem cortados” e assim, salvar o texto mais brando que de fato queríamos publicar “ (FERREIRA apud KUSHNIR, 2001, p.269).
Essa estratégia saciava o ímpeto do censor de usar seu lápis vermelho riscando o artigo com “abusos” explícitos quase emocionais contra os mandamentos militares e deixando passar aquele texto mais racional que usada varias técnicas para esconder sua real mensagem. Isso contribuiu diretamente para criar a imagem de burro que acabou de fixando ao censor desta época. A metonímia era uma das figuras de linguagem mais utilizada. Um dia após ser decretado o AI-5 (14/12/1968) o Jornal do Brasil publicou uma pequena nota em sua primeira pagina sobre as previsões meteorológicas do dia. Nela o jornal era claro: “Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O pais esta sendo varrido por fortes ventos. Máz.: 38º em Brasilia. Mín.: 3º em Laranjeiras” (KUSHNIR, 2012, p.40). Vendo que situação do país estava prestes a piorar o jornal lançou essa pequena
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nota que passaria desapercebida por qualquer leitor mais desavisado. A única provável estranheza seria os 3º nas laranjeiras, referencia direta ao Palácio das Laranjeiras no Rio de Janeiro, sede do governo militar e onde os termômetros não deveriam estar marcando tão baixa temperatura em pleno verão carioca. Algumas vezes, não era possível escapar da censura e a estratégia mudava. Assim o objetivo passa a ser uma tentativa de mostrar para quem estivesse lendo determinado artigo que ali estava uma matéria com conteúdo censurada. Um dos mais famosos casos é a “publicação de Os Lusíadas, de Camões, nas páginas de O Estado de S. Paulo, ou das receitas culinárias, no outro jornal do grupo da família Mesquita, o Jornal da Tarde”(KUSHNIR, 2012, p.39). Existiam também meios de comunicação que eram totalmente contrários ao governo militar e que não tentavam disfarçar sua insatisfação. Uma das primeiras revistas de oposição foi a Pif-Paf que alguns meses após o golpe de 64 circulava pelas ruas e vendia cerca de 40 mil exemplares (KUSHNIR, 2012, p.22). Criada por Millôr Fernandes com colaboradores como Jaguar, Ziraldo e Fortuna, a mesma “patota” que anos depois formaria o Pasquim. Um dos primeiros meios de comunicação a se opor a ditadura militar conseguiu em seu curto tempo de vida mostrar que era possível combater os militares através do humor e mostrar os problemas políticos e sócias da época. Por isso acabou incomodando muito os militares e apenas quatro meses após sua inauguração acabou fechando as portas em sua oitava edição por pressão do governo (Perreira, 2008, p.2). Ironicamente em sua ultima edição Millôr deu um conselho aos militares que seguiram a risca a dica do chargista: Quem avisa, amigo é: se o governo continuar deixando que certos jornalistas falem em eleições; se o governo continuar deixando que determinados jornais façam restrições à sua política financeira; se o governo continuar deixando que alguns políticos teimem em manter suas candituras; se o governo continuar deixando que algumas pessoas pensem por sua própria cabeça; e, sobretudo, se o governo continuar deixando que circule esta revista, com toda sua irreverência e crítica, dentro em breve estaremos caindo numa democracia (FERNANDES apud KUSHNIR, 2012, p.22).
A Pif-Paf acabou porém seus criadores não deixaram a vontade de lutar sumir. Assim no ano de 1969, meses apos ser decretado o AI-5 e o governo militar se transformar em uma verdadeira ditadura, a mesma patota que anos antes criou a Pif-Paf colocava para circular nas ruas o Pasquim. Esse jornal semanal que ficou
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conhecido por cutucar nas feridas da ditadura com humor contava também com nomes de peso vindos das mais diversas da cenas culturais, como Jó Soares, Chico Buarque, Glauber Rocha e Odete Lara. O Pasquim nasceu com os mesmo objetivos da sua antecessora, porem com muito mais força e mais malicia para sobreviver nos tempos difíceis em que o Brasil estava afundado. Durante 5 anos de sua existência o jornal semanário sofreu a censura previa (KUSHNIR, 2012, p.43), apenas no final de 1975 é que o Pasquim foi liberado para “escrever o que quisesse”. Durante o período em que esteve sob a mira do lápis vermelho a patota que participava do jornal aprenderam como burlar alguns dos vários censores que por ali passaram. A primeira censora que “cuidou” do jornal era chamada carinhosamente de “dona Maria” (KUSHNIR, 2012, p.196) e apesar da aparente afetividade quando Jaguar e o resto dos colaboradores do Pasquim descobriram seu ponto fraco trataram logo de usá-lo contra a censora, como lembra o próprio chargista: “”[...] nós descobrimos que [ela] tinha um ponto fraco: gostava de beber. Todo dia a gente botava um garrafa de scotch na mesa dela e depois da terceira dose ela aprovava tudo. Resultado: foi despedida...””(KUCINSKI apud KUSHNIR, 2012, p.197).
Outros censores passaram pelo jornal e sofreram com a turma que escrevia por lá. Durante uma viagem a Florença Ziraldo enviou um cartão postal para as três censoras que estavam vigiando o Pasquim na época. O postal mostrava a imagem da escultura de Michelangelo, Davi, de costas. O “texto assinado pelo cartunista explicava: “Tô mandando ele de costas por que, se estivesse de frente vocês cortavam o p... dele”. Quando Ziraldo voltou, não encontrou maias as três censoras” (KUSHNIR, 2012, p.198). Essa proximidade era mal vista pelo auto escalão da censura que consideravam a amizade entre censores e censurados um perigo, já que aqueles que eram vigiados poderiam realizar uma “espécie de lavagem cerebral nos censores” (KUSHNIR, 2012, p.198). Esse foi um dos motivos que levou o governo militar a transferir a censura do pasquim para Brasília. Isso aconteceu com outros veículos de comunicação e “visava quebrar o jornal, já que o obrigava a fechar com muita antecedência, afastando ainda mais os anunciante e fazendo com que chegasse às bancas “meio velho e requentado”” (KUSHNIR, 2012, p.198). Não funcionou, o jornal continuou com suas criticas acidas e bem humoradas a ditadura militar. Mesmo quando em 1970 grande parte da redação do Pasquim foi presa e solta apenas 3 meses depois o jornal continuou circulando.
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Em 1975 quando no 300 numero do Pasquim foi as bancas uma questão foi levantada em seu editorial por Millôr Fernandes. No texto “que notificava ao publico leitor que, desde 24 de março daquele ano, o tabloide se encontrava livre da censura prévia” (KUSHNIR, 2012, p.17) e “agora a responsabilidade é de vocês” (KUSHIR, 2012, p.17) como foi comunicado por telefone pelo ultimo dos censores que passou pelo Pasquim. O debate levantado por Millôr era sobre essa tal responsabilidade que agora era “reconduzida” a redação do jornal. Pois dava a entender que o fim da censura era um “presente, que deveria ser pago “com responsabilidade”. E sua aceitação era sinônimo de gratidão e cumprimento de um acordo “velado”” (KUSHNIR, 2012, p.19). Logo se os colaboradores do Pasquim usassem a autocensura para cumprir o acordo estariam indo contra a posição ideológica
do
próprio
jornal,
porem
se
usassem
essa
liberdade
com
responsabilidade o jornal poderia sofre mais uma vez na mão da ditadura. Para Millôr essa responsabilidade ainda não era plena já que o jornal estava livre apenas da censura previa, mas continuava sobre a mira do governo militar e dos órgãos censores. Assim o chargista “terminou o editorial afirmando que “sem censura não quer dizer com liberdade”” (KUSHINIR, 2012, p.19). Millôr estava tão certo ao escrever essa afirmação que dias depois o exemplar numero 300 do Pasquim foi recolhido das bancas por ordem da Censura Federal e Millôr sem liberdade de para se expressar acabou deixando O Pasquim.
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2.2. O Desenho Apesar da origem do desenho estar diretamente relacionada a evolução do homem na pré-história onde os desenhos rupestres feitos pelos “primitivos deixaram para o futuro o testemunho de sua época”(ANSELMO,1975, p.40), o “desenho” que se pretende abordar dentro deste trabalho tem um trajetória mais recente. Estamos falando do gênero da charge que teve sua primeira aparição no Brasil na data de “14 de dezembro de 1837, sob o titulo A Campainha e o Cujo, feita por Manuel Araujo Porto-Alegre (1806-1879)” (MOYA, 1986, p.220). Esta primeira ilustração que se encaixa ao gênero estudado era vendida avulsa e tinha como objetivo denunciar as propinas que um funcionário do governo ligado ao Correio Oficial estava ganhando. A segunda parte deste capítulo foca exatamente no objeto de estudo deste trabalho, as charges sobre o período da ditadura no Brasil. Aqui serão tratados as definições do gênero da charge, sua linguagem, o humor e a politica. Além disso nas páginas seguintes será feita uma analise de 6 charges de três artistas diferentes, Henfil, Angeli e Latuff, em épocas diferentes, para assim entender melhor qual é, afinal, o objetivo social das charges na ditadura militar brasileira. 2.2.1. O Gênero Charge Segundo a definição do dicionário Aurélio da Língua Portuguesa o termo charge tem a seguinte definição: Charge (Fr) s.f. Representação pictórica de caráter burlesco e caricatural, em que se satiriza uma ideia, situação ou pessoa (MICHAELIS, 2010 p.383). Apesar dessa definição estabelecer especificidades sobre o que é uma charge, o tipo de conteúdo apresentado por ela e até a linguagem, o gênero charges é muito mais complexo. Esse estilo é composto por um hibridismo linguístico que faz o uso, tanto, do discurso verbal, quanto da ilustração para criar sua narrativa. Além disso as charges estão quase sempre ligadas diretamente as figuras de linguagem como a metonímia e a metáfora (FLORES, 2002, p.25), responsáveis quase sempre pelo humor que é característico dessa linguagem. Claro que existem ainda muitos outros conteúdos que formam um charge, dessa forma por ser um campo amplo de estudos não será possível abordar todos eles neste trabalho. Primeiramente é importante destacar as relações articuladas entre três elementos que compõem uma charge: o narrador, os personagens e o autor. É essa
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dependência que onde cada um desses três pontos se complementam e completam para desta forma criar uma “replica a respeito de um dado evento social, supostamente publico e notório, envolvendo quem assina, quem narra e as personagens [...] reunindo instancias discursivas textuais e extratextuais” (FLORES, 2002, p.14). Isso significa que a interação entre texto e imagem dentro desses três fatores são cumplices na elaboração da charge e fundamentais para que sua mensagem seja passada de forma inteligível ao leitor. Para isso cada um dos três elementos citados acima tem um papel diferente dentro da linguagem de uma charge. Sendo o narrador o elo principal entre o leitor e a mensagem a ser passada, é ele o responsável por “compor o texto, distribuir desenho e escrita, estabelecer os graus de participação de casa linguagem, tipificar e definir personagens, enfim dar voz, expressão e personalidade a suas criações” (FLORES, 2002, p.14). Dessa forma é o narrador quem estreita as conexões entre texto e o cenário social que a charge pretende retratar, além disso cabe a ele a asserção do momento que a charge ira representar. Ele também se destaca na forma com que aparece dentro do quadro da charge. Pois diferentemente dos personagens que tem, usualmente, balões ligando sua fala ao correspondente, o narrador tem seu discurso dentro de retângulos, externos aos quadros onde a ação acontece. Fato esse que acaba por transforma o próprio narrador em personagem e não em autor. Os personagens por sua vez, além das falas dentro de um balão que ocupa o quadro da charge, tem como função dar vida a charge. Já que suas “características e comportamentos, inclusive as falas, compõem o conteúdo que preenche a charge”(FLORES, 2002, p.14). São eles que retratam o contexto da época apresentada na charge. E apesar serem observados, em um primeiro momento, como criações ficcionais na realidade podem se mostrar com uma veracidade maior ou menor em relação a uma “persona” no mundo real, dependendo da intensidade com que o autor o coloca dentro da charge. Por fim o autor, aquele quem tem percepção social para se fazer ser ouvido dentro dos vários tipos de mídia por onde as charges circulam, sejam eles jornal, revista ou internet. O autor é nesse caso uma instancia discursiva extratextual decisiva, cabendo-lhe pôr em cena o narrador – instancia discursiva textual. O autor não se manifesta diretamente, a não ser através de sua assinatura. [...] Indiretamente, entretanto, dá rumo à narrativa, estabelecendo de que modo e através de que recursos o narrador fará o(s)
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comentário(s), o estilo do texto, o seu desenrolar, o enfoque assumido e a temática abordada (FLORES, 2002, p.15).
Ou seja apesar de quase nunca “aparecer” dentro de suas próprias charges o papel do autor é fundamental. Não apenas por ser ele o criador que da vida as personagens, mas também por ser ele quem mostra suas próprias asserções sobre o mundo e assim, como um diretor de cinema documentário, tenta passar para o leitor um ponto de vista pessoal. Segundo Onici Flores a criação de uma charge envolve tambem um tipologia de produção sígnica igual a que Umberto Eco (1976) propôs para a criação e interpretação dos signos (FLORES, 2002, p.20). Segundo Flores essa tipologia tem 4 parâmetros e começa com o Reconhecimento. O Reconhecimento é quando um dado objeto ou evento, produzido pela ação do humana ou pela natureza é entendido pelo destinatário como expressão de um determinado conteúdo, ou por que uma correlação já houvesse sido estabelecida anteriormente ou por causa de sua possibilidade atual (FLORES, 2002, p.20).
Utilizando essa definição dentro da experiência da produção gráfica das charges, podemos associar o termo Reconhecimento de Eco com a pesquisa que os chargistas realizam antes da criação. Onde cada artista olha para o mundo em busca de um conteúdo reconhecível por ele. O segundo parâmetro é a Ostenção que segundo a autora acontece “quando um dado objeto ou evento, produzido pela natureza ou pelo homem, e existente de fato num mundo de fatos é selecionado por alguém e apontado com representante da classe de objetos da qual é membro” (FLORES, 2002, p.20). Esse segundo parâmetro tem um paralelismo com a percepção dos chargistas apos terrem encontrado um objeto para servir de base de suas criações artísticas. Pois assim que tal “assunto” é encontrado cabe ao autor introduzi-lo ao publico de forma que tal espectador possa compreende-lo como ícone pertencente ao seu mundo. O terceiro parâmetro é a Replica, “espécie de imitação realista ou modelo parcialmente reproduzido” (FLORES, 2002, p.20). Esse seria o momento onde o chargista utiliza dos signos já existentes para que o leitor não fique perdido, pois essas copias de modelos signicos já existentes facilitam uma hibridização de velhos modelos com novos e assim facilitam a decodificação por meio da associação. O ultimo é a Invenção, definida pela autora como um modo de produção em que o agente da função sígnica veicula um novo continuum material ainda não segmentado para os fins em que vai ser utilizado, e
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propõe uma nova maneire de dar-lhes forma, transformando no e pelo processo os elementos pertinentes de um tipo de conteúdo, instituindo um vinculo sem precedentes, tornando-o aceitável (FLORES, 2002, p.20).
Ou seja, neste ultimo parâmetro o chargista usa os outros três para realizar a criação de uma nova charge onde o conteúdo apresentado foi absorvido do mundo, selecionado e copiado para enfim ser criado de uma nova maneira. Porem é imprescindível notar que essa nova asserção do mundo com novos signos não surge do nada, mas sim através de uma base cultural já existente. A criação do que é falado de maneira “nova” nas charges é construída para que o “ainda não dito esteja envolvida pelo já dito” (FLORES, 2002, p.21). Só assim o receptor poderá entender o novo signo criado pelo autor. Esse entendimento sobre o conteúdo criado é fundamental para que exista cumplicidade entre o leitor e o chargista. Pois “ninguém ri da piada que você conta, se não existe um código prévio entre você e seus ouvintes” (MARINGONE, 1996, p.88). São esses códigos que garante o resultado de uma charge, seja esse resultado uma risada ou uma reflexão. Outro fator importante que acarretado a cumplicidade, que uma charge deve criar, é justamente o apoio que o publico pode fornecer a um chargista mais “radical”. Como o termo charges tem sua origem na “palavra que vem do francês carga, de “carga de cavalaria”” (MARINGONE,1996, p.86). Podemos perceber que muitas vezes a intenção de uma charge, principalmente as politicas, é exatamente passar por cima ou ultrapassa uma barreira. Ação que nem sempre agrada a todos então é imprescindível que a cumplicidade entre autor e leitor esteja ativa para que se crie uma proteção entorno do artista. Como dito antes para ser compreendida pelas pessoas é necessário existam ou sejam criados códigos para que se “associem acontecimentos que à primeira vista não possuem ligação alguma” (MARINGONE, 1996, p.88). Isso por que a charge “constitui-se, em sua face visível, de um amalgama de sentidos, de intenções, de crenças [...]” (FLORES, 2002, p.10), muita informação para apenas um quadro e apenas com códigos e signos “universais” conhecidos pelo publico é possível sintetizar todas essas mensagens e assim ser viável “captar a dinâmica do encontro entre a população e os “dizeres e pensares” coexistentes no entorno social” (FLORES, 2002, p.10). Ou seja esses códigos tem sua universalidade porem
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carregam também algumas particularidades locais sejam elas culturais e/ou emocionais. Para que a síntese desses elementos seja eficiente a metáfora e a metonímia são as figuras de linguagem mais trabalhadas dentro das charges. E de tão “corriqueiras e usuais, as metáforas passam quase que completamente em branco. Nós nem as notamos, pois, em geral, referem-se a coisas básicas à nossa sobrevivência (FLORES, 2002, p.21), fato que deixa ainda mais fácil a compreensão dessas quando utilizadas. O processo de absorção por qual o leitor passa para compreender uma metáfora é baseado no “repositório de nossas experiências anteriores, o lastro cultural sobre o qual estruturamos nosso viver” (FLORES, 2002, p.22). O resultado se manifesta em novas ideias sugeridas por outras opções de perceptivas sobre o mundo que o autor tinha em sua mente. Entretanto entre a absorção e o resultado existe um longo caminho onde a estruturação metafórica vai-se delineando aos poucos. Num primeiro momento, utilizamos nossa experiência anterior para exprimir abstrações, sutilezas, através da personificação; a representação concreta passa a indicar algo difícil de ser posto em palavras. Os conceitos abstratos são, dessa forma, representados por entidades. A esse processo chamamos de metaforizarão ontológica. O segundo deslocamento direciona-se à maior explicitação da relação estabelecida. Personificação do conceito e precisão das expressões linguísticas somam-se, formando um todo integrado. Por fim, no terceiro estagio ilustração e palavras aponta para uma decorrência da superposição de camadas se significação [...] (FLORES, 2002, p.25)
É a transferência de conhecimentos, do leitor com seu ambiente, do autor com seu contexto, do leitor com o autor e seu contexto e do autor com o leitor e seu ambiente que propicia o entendimento correto dessas metáforas. É uma troca conceptual e cognitiva por parte das metáforas e de reinterpretação através da metonímia, quando ela é utilizada. Outro código importante para o entendimento pleno da charge é o tempo. Já que toda a situação criado pelo chargista parte de um fato cotidiano e recente durante aquela semana ou mês. A maioria das charges são interessante durante o período em que seu conteúdo faz sentido. Salvo exceções, elas costumam atingir o público de forma eficiente apenas na época em que a memoria do publico lembra dos fatos nela apresentados. E essa característica é importante não apenas para estabelecer mais um código onde o leitor ira retirar outras referencias que possam esclarecer a mensagem, mas também por ser o “tempo” retratado na charge uma
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das muitas formas de se retratar uma época. Essa importância se da pela constituição dessa linguagem que é composta por um “amálgama de sentidos, de intenções, de crenças, permitindo-nos captar a dinâmica do encontro entre a população e os “dizeres e pensares” coexistentes no entorno social (FLORES, 2002, p.10). A charge assim como o filme documentário é uma asserção de uma época real onde o chargista coloca seu ponto de vista a mostra ao leitor. Sendo feita por fatos da “realidade” elas visam uma reflexão do real, resumindo “situações politicas que a sociedade vive como problemas” (GAWRYSZEWSKI apud KURTS, 2012, p.7). Por isso mesmo funcionam tão bem como veículos de documentação durante a historia, pois agenciam aquilo que é de mais relevante naquele momento através de “critérios de noticiabilidade, hierarquização, seleção e exclusão de fatos, agendamentos e, principalmente, enquadramentos” (HENN apud KURTZ, 2012, p.7). Sendo muito datada, a charge acaba se transformando com o passar do tempo em um registro bastante especifico de uma época, porem “dificilmente a graça permanece. A não ser, é claro, que se tenha uma explicação clara sobre os fatos do período. Mas, como todos sabem, explicação mata qualquer piada” (MARINGONE, 1996, p.89). Ou seja a importância da charge está também ligada ao futuro onde ela vai ser redescoberta. Principalmente por serem, em sua grande maioria, de caráter contestador. E assim como os documentários políticos apresentados nos capítulos anteriores, as charges ajudam a “construir uma nova realidade visual e, com ela, uma nova realidade social” (NICHOLS, 2012, p.182). A charge tenta mostrar aquilo que talvez não uma parte das pessoas não queira que seja mostrado, ela tenta mudar o status quo e dar voz a “parcela dos sem-parcela”. Ela força o leitor que não entendeu a mensagem logo após a primeira lida a uma reflexão, que pode levar a elucidação da charge ou não. Os que entendem são levados a um caminho onde se veem na obrigação“ de tomarem uma atitude para transformar a situação apresentada (BERNARDET, 2003, p.41). De toda a forma, entendendo ou não a charge lida, existe uma reflexão sobre algumas das ideias propostas naquele quadro único de desenho e é esse tipo de reflexão que pretende mudar o pensamento do leitor o principal objetivo da charge. 2.2.2. A Politica do Riso
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3. Recontando a História O terceiro e ultimo capitulo deste trabalho pretende discorrer sobre todo o processo de desenvolvimento do objeto experimental proposto, o documentário. Além de serem abordadas questões de pré-produção, criação e pós-produção este capitulo pretende mostrar quais as principais referencias que influenciaram o estilo que sera no documentário a ser desenvolvido e as formas que possivelmente poderiam contribuir para uma estética diferenciada. Também será discutida os meios e canais buscados para auxiliar na criação do documentário, como cursos, oficinas e conversar com especialistas e interessados em se produzir um documentário. 3.1. PRÉ-ROTEIRO 3.1.1. INDICAÇÃO DO TEMA Os cartuns/charges na época da ditadura. 3.1.2. DESCRIÇÃO DO PROBLEMA Os cartuns e as charges foram no Brasil um dos principais canais contra a ditadura. Ironizar, menosprezar, informar e agredir eram alguns dos superpoderes que as tirinhas de quadrinhos tinham. Porém, como qualquer outro tipo de forma artística que não se alinhava com os pensamentos do regime militar, elas também corriam o risco de serem censuradas e abolidas. Os quadrinhos têm uma força enorme, que maquia sua mensagem, escondendo seu propósito de ofender e satirizar todas as ideias, fatos e problemas que incomodam os cartunistas e assim confundir o atacado para o real objetivo daquele quadrinho. O ano de 69 foi a época mais ferrenha da ditadura, em que a liberdade foi encarcerada junto com outros tantos direitos que o povo tinha através do A.I. 5. Nesse ano nasce o principal meio de comunicação que usa os cartuns e as charges para se opor ao poder militar, o Pasquim. Entre seus principais colaboradores estão nomes de peso no mundo artístico, como Tom Jobim, Chico Buarque e Paulo Leminski que constantemente escreviam artigos e crônicas para o jornal. Porém a munição pesada contra a ditadura sai da ponta da caneta de Ziraldo, Jaguar e Henfil, os três cartunistas que viraram um pesadelo para o governo militar. Eles não foram os primeiros, mas foram os mais presentes e mais importantes cartunistas de uma época em que ser pego falando mal do
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governo podia gerar consequências horríveis. Mas o Pasquim nunca desistiu, nunca parou e só fechou as portas em 91, quase 10 anos depois do fim da ditadura. O Pasquim foi a principal fonte em que beberam diversos cartunistas hoje amplamente reconhecidos. Angeli, Laerte, Adão, Glauco, entre outros, são exemplos de profissionais que viam no jornal uma referência de como mostrar sua opinião de forma bem humorada contra um estado que não estava de acordo com os seus ideais. Mas esse documentário tem como pretensão criar uma duvida sobre a função desses quadrinhos anti regime. Afinal elas eram criadas para divertir? Para aliviar, ao menos um pouco, toda a dor e sofrimento provocados pela repressão da ditadura? Ou eram essas charges armas disfarçadas? Armas culturais que tinham a intenção de colocar o povo contra o regime militar?
3.1.3. ELEIÇÃO E DESCRIÇÃO DOS OBJETOS Objeto 1 – O Pasquim. Impossível falar de quadrinhos na ditadura sem falar do Pasquim, jornal semanal que tinha uma linha não conformista em relação ao governo militar e usava o humor como principal arma. Contrariando o período, o Pasquim nasceu pouco tempo depois do A.I.5 que suprimia com todos os direitos constitucionais dos cidadãos brasileiros e elevava definidamente o governo militar ao status de ditadura. Foi nesse período quando o cerco fechava para todos aqueles que se colocavam contra o regime, que a censura era mais ferrenha que alguns amigos decidiram lutar contra essa realidade. Então por que começar um jornal que estaria fadado a ser fechado? Como surgiu a ideia de se fazer um jornal com grande veiculação para bater de frente com o governo militar e como a ditadura foi driblada durante tanto tempo para que o Pasquim durasse mais do que sua arquiinimiga? Objeto 2 – O Humor O humor era a melhor arma para ser usada contra a ditadura. Principalmente por poder camuflar seu teor satírico, além disso, o uso de ironia ajudava e muito a confundir a censura. Porém quais eram os objetivos desse
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humor? Alegrar ou incentivar a população contra o regime militar? E como fazer isso sem banalizar a situação no país? Quais eram as melhores formas de se “gozar” da ditadura e qual seria a “criptônita” desse humor?
Objeto 3 – Arma cultural Apesar da discussão é evidente o uso das charges como produção humorística anti-regime militar construída para ampliar a consciência da massa e instigar o povo na luta contra a ditadura. Mas era esse o principal motivo? O que instigava esses humoristas a tal ato, que poderia ser considerado praticamente suicídio? Existia algum tipo de aliança com as forças clandestinas que lutavam, em alguns casos armadas, contra o regime? E de que forma esse espírito influenciou a nova geração?
3.1.4. ELEIÇÃO DE PESQUISA E ENTREVISTADOS Objeto 1 – Ziraldo Teve seu início de carreira como cartunistas nos anos 50. Em 1969 fundou com outros humoristas o Pasquim, principal jornal oposicionista ao regime militar. Além de cartunista é também pintor, jornalista, teatrólogo, chargista, caricaturista e escritor. Objeto 2 – Henfil Em 1969 focou seus trabalhos em dois jornais, o Pasquim e o Jornal do Brasil. Principalmente no primeiro seu trabalho de cartunista ganhou destaque com os personagens, “Os Fradinhos”, “Capitão Zeferino", a "Graúna", e "Bode Orelana", tipicamente brasileiros e que retratavam as situações da época fizeram enorme sucesso. Aliado a isso Henfil usava um tom sarcástico e crítico para se opor a ditadura e que não ficava apenas nos quadrinhos. Participou de alguns movimentos políticos e sociais que além do fim da ditadura reivindicavam a anistia dos presos políticos e as Diretas Já. Objeto 3 – Angeli
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Cartunista que teve seu primeiro desenho publicado quando tinha 14 anos, Foi contratado pelo Jornal Folha de São Paulo em 1973 onde trabalha até hoje. Seu humor urbano e anarquista foi a marca dos quadrinhos dos anos 80. Grande crítico da política nunca teve um “lado”, hora “zoa” a esquerda, hora a direita, tudo depende de quem está no poder apontando o dedo. Apesar de não ter começado junto com o Pasquim, acabou bebendo da fonte que o jornal ofereceu para as pessoas e não cansou de tirar “onda” da ditadura. Objeto 4 – Laerte Cursou jornalismo na Universidade de São Paulo em 1969, porém não terminou o curso. Optou pelos quadrinhos e teve seu início na revista Sibila em 1970. Logo em seguida fundou, junto com outros cartunistas, a revista Balão, pioneira no gênero de publicações de quadrinhos undergrounds. Foi associado ao PCB e em 1974 produziu o material de campanha para o MDB. Um ano depois foi um dos responsáveis pela criação de cartões de solidariedade no movimento de auxílio aos presos políticos. Objeto 5 – Waldir Cauvila Doutor em História. Bacharel em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, Licenciado em Ciências Sociais pela Faculdade de Educação da USP. Mestre em História do Brasil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Doutor em Educação pela Faculdade de Educação da USP. Professor aposentado da Faculdade de Educação da USP. Objeto 6 – Fernando Henrique Cardoso Sociólogo,
professor
universitário
e
pesquisador,
ex-presidente
da
Republica. Formou-se na Universidade de São Paulo onde em 1952 se tornou professor. Sempre interessado na política brasileira teve de se exilar no Chile e na França após o golpe de 64.
Voltou em 68 para pouco tempo depois ver sua
aposentaria forçada e seus direitos políticos cassados por causa do A.I. 5. Participou das Diretas Já e da candidatura do primeiro presidente civil após o fim do regime militar. Objeto 7 - Elza Lobo
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Ex-militante da Ação Popular (AP), trabalhava na Secretaria da Fazenda quando foi presa. Exerceu a função de Secretaria Executiva do Conselho Estadual de Saúde de São Paulo. Objeto 8 – Iara Prado. Formada em História com pós-graduação em História Social pela USP. Foi secretaria da Educação do MEC. Foi militante da organização política VAL PALMARES, que era composta, na sua grande maioria, por militante jovens que lutavam contra a ditadura imposta pelo regime civil-militar brasileiro, após 1964. Em 1970 foi presa em Porto Alegre e transferida para a Operação Bandeirante. Posteriormente foi levada para a ala feminina do Presídio Tiradentes.
Objeto 9 – Reinaldo Morano Filho. Nascido em Taquaritinga/SP, é bacharel em direito, médico especialista em saúde pública, psiquiatra e psicanalista. Em 1969, foi presidente do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina da USP e aderiu a Ação Libertadora Nacional (ALN). Vítima da repressão ficou preso durante seis anos e meio. Objeto 10 – Carolina Guaycuru Arquiteta e designer gráfica, foi responsável pela curadoria da exposição “Ocupação Angeli”, realizada no Itau Cultural nos meses de Julho e Agosto de 2012. Objeto 11 – Jaime Prades Formado em Letras pela USP, Universidade de São Paulo, na década de 1980. Prades destacou-se, nessa mesma época, por seu trabalho de intervenção artística nas ruas de grandes metrópoles, como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. Autodidata, integrava o grupo Tupinãodá - responsável pela criação do primeiro coletivo brasileiro de arte urbana: a primeira geração de grafiteiros. Na década de 1980, munido de giz, tinta e spray, Prades transformava, as ruas em laboratório para suas intervenções. Diferente da linguagem do grafite de hoje, que dá importância a soluções pictóricas e detalhistas, seus trabalhos são representantes da linguagem iconográfica.
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Objeto 12 – Sergio Gomes Formado em Jornalismo pela ECA (Escola de Comunicação e Arte da USP). Em 1970, quando entrou na universidade e viveu os "anos de chumbo", ele e amigos fundaram o jornal semanal dos centros acadêmicos A Ponte, inspirado na canção de Tapajós e Pinheiro. Sem perder essa característica de luta política, em 1978 ele e mais nove pessoas fundaram uma cooperativa de jornalistas e artistas, entre eles o cartunista Laerte Coutinho, para colaborar com os movimentos sociais e de trabalhadores urbanos na realização de sua imprensa própria, com produção de jornais, boletins, revistas e campanhas. Assim nasceu a Oboré. Sérgio Gomes da Silva foi preso pouco antes de Vladimir Herzog. Já havia sido torturado também na cadeira do Dragão – instrumento de tortura utilizado no assassinato do diretor da TV Cultura. Sérgio foi submetido à tortura por meio de choques elétricos, enquanto o saco que cobria sua cabeça era empapado de amoníaco, de forma que, durante a tortura fosse também prejudicada sua respiração. Objeto 13 – Ivo Herzog Filho do jornalista Wladimir Herzog assassinado em 75 dentro do DOI-CODI em São Paulo. Ivo é um dos diretores do INSTITUTO VLADIMIR HERZOG, Instituição sem fins lucrativos com o objetivo de preservar a memória da época em que viveu Vladimir Hezog, promover o reconhecimento dos jornalistas que produzam material ligado às questões da Anistia e Direitos Humanos e contribuir para a reflexão e produção de informação que garantam o Direito à Vida e o Direito à Justiça. 3.1.5. ELEIÇÃO DE LOCAIS Objeto 1 – Memorial da resistência É um museu que tem como objetivo preservar as memórias da resistência contra os períodos em que a repressão era palavra de ordem no Brasil. O museu fica no antigo prédio do Deops/SP (Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São
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Paulo), responsável por inúmeras prisões e assassinatos de militantes contra o regime militar de 64.
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3.1.6. ELEIÇÃO DE IMAGENS Objeto 1 – Memorial da resistência
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Objeto 2 – O Pasquim
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3.1.5. ELEIÇÃO DE PRODUTOS AUDIOVISUAIS 4. Referências ALMEIDA, Cândida. Som, imagem, verbo e sugestão: processos interpretativos em poéticas audiovisuais. Curitiba: CRV, 2012. ALVES, Márcio Moreira. Comenta declaração do Presidente da República. Refere-se ao conceito histórico das Forças Armadas perante o povo brasileiro. Disponível
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