Gabriela Ingegneri
RELAÇÕES DE BOLSO OS DESDOBRAMENTOS DO MUNDO VIRTUAL
CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC
Gabriela Ingegneri
RELAÇÕES DE BOLSO OS DESDOBRAMENTOS DO MUNDO VIRTUAL
São Paulo 2015
CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC
Gabriela Ingegneri
RELAÇÕES DE BOLSO OS DESDOBRAMENTOS DO MUNDO VIRTUAL
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro Universitário Senac Santo Amaro, como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Publicidade e Propaganda sob a orientação do Profº Nelson Urssi.
São Paulo 2015
Ingegneri, Gabriela Relações de Bolso: os desdobramentos do mundo virtual/ Gabriela Ingegneri - São Paulo (SP), 2015. 67 f.: il. color. Orientador(a): Nelson José Urssi Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Publicidade e Propaganda) Centro Universitário Senac, São Paulo, 2015. 1. Conectividade 2. Virtualidade 3. Redes sociais 4. Mídias sociais. I. Urssi, Nelson José (Orient.) II. Título
Aos meus pais, que sempre me apoiaram, aos meus orientadores que acreditaram em mim e aos meus amigos que me ajudaram sempre que precisei.
“Estamos todos numa solidão e numa multidão ao mesmo tempo.” Zygmunt Bauman
RESUMO Este trabalho tem como objetivo analisar o impacto do uso dos aplicativos e redes sociais no comportamento da sociedade, mostrando como as identidades podem ser moldadas por meio do Facebook, a maneira a qual os relacionamentos podem ser fragilizados com o uso do Tinder e ao mesmo tempo o afastamento entre as pessoas que estão fisicamente próximas e aproximação entre as que estão longe. Visa também chamar a atenção para os efeitos decorrentes da necessidade de estar conectado a todo o momento e como esse comportamento modificou as formas de agir, se expor e se relacionar. Foi constatado que esse comportamento impactou fortemente nas formas de relacionamento e interações pessoais, como também impactará na próxima geração, que provavelmente virá mais conectada ainda. PALAVRAS CHAVE: Conectividade, virtualidade, redes sociais, mídias sociais.
ABSTRACT This work aims to analyze the impact of using apps and social networks on the behavior of society, showing how identities can be shaped through Facebook , the manner in which relationships can be weakened using Tinder while the gap between people who are physically close and approach among those who are far away. It also aims to draw attention to the effects arising from the need to be connected the whole time and how this behavior has modified the ways of doing things, expose oneself and interact. It has been observed that this behavior has impacted heavily on forms of relationship and personal interactions , but will also impact on the next generation, which is likely even more connected. KEYWORDS : Connectivity, virtual , social networks, social media.
Introdução...........................................................................14 Capítulo 1 - Mundo Virtual.................................................17 1.1 O que é a virtualização?..................................................................................................18 A virtualização do corpo......................................................................................................18 Tempo........................................................................................................................................19 1.2 Comunidades....................................................................................................................19 1.3 Conversações..................................................................................................................20 O ambiente da conversação.............................................................................................22 1.4 Relações.............................................................................................................................23 1.5 Identidades.......................................................................................................................25
SUMÁRIO
Capítulo 2 - Necessidade de estar conectado..................29 2.1 Conectividade..................................................................................................................30 2.2 Solidão..............................................................................................................................42
Capítulo 3 - Tinder e os relacionamentos virtuais...........45 3.1 Fragilização dos sentimentos.....................................................................................47 3.2 Relações de bolso........................................................................................................50
Capítulo 4 - Facebook: Sobre exposição e identidade.....53 4.1 Identidade e exposição.................................................................................................54 4.2 O ego no Facebook .....................................................................................................57
Considerações finais.........................................................61 Referências bibliográficas................................................65
INTRODUÇÃO Esta pesquisa tem como objetivo analisar o impacto do uso das tecnologias de informação e comunicação (TIC’s) em particular nos perfis, comportamentos e relações pessoais no mundo contemporâneo. Para discutir sobre esse assunto serão utilizados como referenciais as ideias de Zygmunt Bauman, Raquel Recuero, Pierre Lévy, John Thompson, Manuel Castells, André Lemos e Marcos Palacios e Dominique Wolton. Novas formas de relacionamento surgiram com o mundo digital, onde basta ter um computador ou celular para conseguir pesquisar, conversar, assistir, ouvir, participar e aprender. Estar conectado aparentemente não é mais algo casual como acontecia antigamente, as TIC’s, como por exemplo, os computadores e celulares, eram utilizados basicamente para trabalhar e pesquisar, hoje fazem parte de nossas necessidades. Esta nova forma de relacionamento estaria afetando a maneira como agimos e construímos nossas identidades, visto que esse mundo virtual está ao mesmo tempo aproximando pessoas e fragilizando laços por meio das mídias e aplicativos sociais.
Para entender os impactos causados pelo mundo virtual, será analisado o aplicativo Tinder, que tem como função, permitir a paquera virtual e possibilitar o encontro pessoal. Será analisada também a rede social Facebook, que é meio importante na construção e exposição de identidades que o usuário pode criar. O fato das pessoas se conectarem e ao mesmo tempo se distanciarem umas das outras, coloca em questão os formatos dos relacionamentos pessoais O mundo digital e a sua conectividade apresentam vantagens e desvantagens, analisaremos quais são elas e de que forma a sociedade é influenciada, seja na construção da sua identidade e comportamento, seja nas relações pessoais. No capítulo 1 veremos o que é o mundo virtual, como ele se dá, como as comunidades são formadas e, principalmente, de que forma os relacionamentos acontecem neste espaço e as identidades são construídas. O capítulo 2 trata da necessidade de estar-
mos conectados, será discutido como a tecnologia mais a conectividade afetaram e modificaram a vida contemporânea. No capítulo 3 analisaremos o aplicativo Tinder e como as relações acontecem, visto que as pessoas buscam ferramentas para facilitar a maneira de conhecer o outro. No capítulo 4 veremos a forma como a sociedade se expõe, e de que forma as redes sociais são o principal meio de construção de identidades.
CAPÍTULO 1 MUNDO VIRTUAL
O virtual, segundo Pierre Lévy (apud Lemos 2010), pode ser entendido como um descolamento do “aqui e agora”, um lugar onde o real acontece em uma atmosfera diferente, ou seja, em outro lugar que não é físico, pois acontece por meio de diversas tecnologias, onde o físico é composto por uma camada de informação digital. Nesse espaço existem comunidades, relacionamentos e identidades virtuais, no qual as pessoas se comunicam, aprendem, ensinam, relacionam-se, entre outras coisas.
Para as pessoas comuns, há uma grande dificuldade ao tentar diferenciar o real do virtual, pois normalmente o virtual é entendido como algo que não existe fisicamente, já a “realidade” é colocada como algo material, algo que está presente. Pode-se dizer que o virtual é uma plataforma diferente onde o real não deixa de existir, apenas adquire novas extensões onde até mesmo as pessoas são virtualizadas.
A virtualização do corpo ocorre devido a ubiquidade como por exemplo, quando estamos fisicamente em um lugar, mas também estamos acessando o celular conversando com outras pessoas. Estamos em dois lugares, um físico e um virtual, ao mesmo tempo. A partir da análise de Lévy (2003, p.33), entende-se que ao estar em uma plataforma virtual, o corpo ganha uma vida ilimitada. Uma pessoa pode estar fisicamente em algum lugar conversando com alguém, mas pode estar ao mesmo tempo acessando redes sociais e conversando com outra pessoa virtualmente. É o que chamamos de ubiquidade, quando se está em vários lugares ao mesmo tempo ou quase ao mesmo tempo. (Lévy, 2003, p. 33). A virtualização do corpo funciona como uma extensão do corpo humano em outra plataforma. Segundo Lévy (2003, p. 21), quando uma pessoa, por exemplo, se virtualiza, torna-se “não-presente”, deixa-se de ocupar um território.
Nessa plataforma, encontramos redes de comunicações e de conhecimentos, os corpos são virtualizados assim como a comunicação. Segundo Pierre Lévy (2003, p. 11), a virtualização afeta tanto a informação e a comunicação, quanto os corpos, a economia e até mesmo o exercício da inteligência.
Quando ocorre a virtualização, a unidade de tempo não pertence a uma unidade de lugar, isso acontece nas interações em tempo real por meio das redes digitais, transmissões ao vivo e sistemas ubíquos. O virtual não é algo inexistente, Lévy (2003, p. 21) acredita que a sincronização faz com que o território seja
O que é a virtualização?
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A virtualização do corpo
substituído, e a interconexão modifica a unidade de tempo assim, o virtual não é imaginário, ou seja, o fato de não estar acontecendo no mundo físico, não quer dizer que não esteja acontecendo e não tenha valor como experiência. Trata-se de um território diferente, é a vida acontecendo em dois lugares, como por exemplo, se duas pessoas conversam virtualmente, as ações estão acontecendo de fato. No mundo virtual, a linguagem também se altera, novas formas de comunicações e maneiras de se expressar surgem. Para Lévy (2003, Pág. 71), a linguagem mantém aquilo que está vivo, aqui e agora, virtualizando o tempo real, o tempo como uma extensão da sua própria consistência. O caráter da virtualização é quando se deixa apenas o aqui e o agora e novos espaços e velocidades surgem. Novos territórios virtuais são acessados com apenas um toque. Com o celular em mãos, ligações, pesquisas, conversas, entre outras coisas, podem acontecer de forma rápida, enquanto na vida física, essas ações demandariam tempo maior para que pudessem acontecer, ou seja, o tempo físico dá a sensação mais lenta aos acontecimentos.
Tempo Não é só a linguagem, o corpo e os contextos virtualizados que sofrem modificações, o próprio tempo também é alterado nesse ambiente virtual.
O “estar conectado” dá a impressão de que os internautas estão em um espaço-tempo sem duração, como analisa Wolton (2007, p. 105). Isso se dá ao fato do tempo no mundo virtual parecer muito mais veloz que no mundo físico. O tempo virtual parece nos permitir fazer muito, como se durasse mais ou fosse até um tempo infinito quando comparado ao tempo “real”.
Comunidades As comunidades virtuais basicamente significam um grupo no qual as pessoas com interesse em comum se unem no ambiente virtual. A palavra “nós” foi modificada pela virtualização, o estar junto ganhou outras dimensões com as comunidades virtuais, empresas virtuais e a democracia virtual. “Enquanto tal, a virtualização não é nem boa, nem má, nem neutra.” (Lévy, 2003, pág. 11). Uma comunidade virtual pode organizar seus membros com base nos seus núcleos de interesse, compartilhando paixões, projetos, problemas e amizades. A virtualização de relacionamentos torna complexa a cultura humana. A religião, a ética, o direito, a política e a economia assumem novos estados. “A concórdia talvez não seja um estado natural, uma vez que, para os humanos, a construção social passa pela virtualização”. (Lévy, 2003, pág. 78), ou seja, as rela-
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ções virtuais começam a influenciar a cultura como um todo, no qual até a formação social passa a acontecer também no mundo virtual. Segundo Castells (2003, p. 98) a Internet trouxe afirmações conflitantes sobre os novos padrões de interação social. As comunidades virtuais que se formaram, basearam-se na comunicação on-line, geraram a desvinculação entre localidade e sociabilidade na comunidade. Novos padrões de relações sociais surgiram e substituíram as formas de interação humana, que eram antes, territorialmente limitadas. Os grupos apresentam a ideia de pertencimento, mas ao navegar na internet, esse sentimento é perdido. Segundo Charles Handy (apud Bauman, 2005), as comunidades virtuais criam uma ilusão de intimidade e uma simulação de comunidade. As comunidades virtuais não sustentam a identidade pessoal, e sim tornam complexa a questão de encontrar o seu “eu” próprio. Dentro deste espaço de convivências, constata-se que as pessoas frequentemente iniciam relações, formam grupamentos, criam ligações fortes em intensidades por vezes bastante significativas. A particularidade deste espaço está centrada no fato de possibilitar ao navegante a exploração de novos aspectos existenciais, cognitivos e experienciais a partir de um ambiente desterritorializado. (2001, p.142)
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As novas configurações de comunicação acontecem nas comunidades virtuais, Lemos
(2001, p. 141), onde é possível observar o surgimento de vínculos sociais, a partir do momento que grau de afinidades e interesses em comum são traçados. Isso acontece sem que os indivíduos tenham qualquer interação física ou contato visual. O mundo virtual surge como mundo alternativo, onde não é necessário realizar as interações face a face.
Conversações A conversação mediada pelos dispositivos faz parte do cotidiano de muitas pessoas e vem aos poucos modificando a vida de todos. Raquel Recuero (2012, p. 9) salienta a importância de observar a conversação como um gênero essencial, que pode ser afetado por seu contexto imediato e pelas tecnologias que, além de sustentar, registram e atualizam as reelaborações que esse gênero passa. A partir do momento que essas ferramentas foram se popularizando para se comunicar e conectar, o uso de computadores, notebooks, celulares, entre outros, passou a fazer parte do cotidiano de milhares de pessoas no mundo inteiro. Com isso, essas tecnologias passaram a proporcionar espaços conversacionais, ou seja, espaços onde a interação com outros indivíduos adquire contornos semelhantes àqueles da conversação, buscando estabelecer e/ou manter laços sociais, Passam
a representar um espaço de lazer, lugares virtuais onde as práticas sociais começam a acontecer, seja por limitações do espaço físico, seja por limitações da vida moderna, seja apenas pela comodidade da interação sem face. (2012, p. 16)
É possível notar que essas novas formas de interações causaram impactos tanto nas relações pessoais quanto nas formas de “ser” das pessoas. “Tratam-se de novas formas de “ser” social que possuem impactos variados na sociedade contemporânea a partir das práticas estabelecidas no ciberespaço” (Recuero, 2011, p.17). Há diversas redes e aplicativos que podem proporcionar a conversação, algumas mais públicas, e outras mais privadas. Segundo Recuero (2012, p. 17), as conversações que ocorrem no Twitter, Orkut, Facebook e em outras ferramentas com as mesmas características são mais públicas, permanentes e rastreáveis em comparação a outras. Tudo que acontece nessas redes sociais pode ser visto por todos. Foram criadas justamente para que o indivíduo exponha suas informações. A partir do momento que informações pessoais são divulgadas, comunidades com interesse em comum são formadas. “Essas características e sua apropriação são capazes de delinear redes, trazer informações sobre sentimentos coletivos, tendências, interesses e intenções de grandes grupos de pessoas” (Recuero,
2012, p. 17). Nas redes e aplicativos sociais, seja público ou privado, os impactos gerados tomam proporções extensas, pois a partir do momento que uma mensagem pode ser visualizada por todos, e compartilhada, a sociedade tece linhas de interações coletivas, que podem atingir o mundo inteiro. Essas conversas públicas e coletivas que hoje influenciam a cultura, constroem fenômenos e se espalham. A sociedade passou a debater e se organizar, criticar e acompanhar a política no mundo virtual. A partir dessa conversação mediada pela tecnologia, as pessoas tecem a identidade cultural, que pode ser modificada a todo o momento. “É nessa conversação em rede que nossa cultura está sendo interpretada e reconstruída” (Recuero, 2012, p. 18). A conversação se tornou característica do mundo virtual, pois hoje é possível que isso aconteça, mas antigamente as tecnologias não eram usadas como espaços de conversação. O computador, por exemplo, “[...] mais do que uma ferramenta de pesquisa, de processamento de dados e de trabalho, é hoje uma ferramenta social, caracterizada, principalmente pelos usos conversacionais” (Recuero, 2012, p. 21). Hoje é possível notar a evolução da tecnologia como meio de conversação e como essa evolução é importante para a construção da sociedade.
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Podemos notar que a comunicação acontece a partir de uma ferramenta e da maneira que os atores as utilizam, podendo influenciar a forma de se comunicar. Segundo Recuero (2012), a comunicação mediada pelos computadores é influenciada tanto pelas suas próprias ferramentas, quanto pelos atores sociais que ressignificam essas ferramentas quando as utilizam em seus cotidianos. Podemos estender essa ideia a comunicação mediada não somente pelos computadores, mas também pelos celulares, onde a troca de informações e conversas também acontecem de forma semelhante ao do computador. Os computadores e as tecnologias digitais permitiram que esses espaços conversacionais fossem criados. Para Jones (1995 apud Recuero, 2012) a comunicação mediada pelos computadores é também um motor de relações sociais, que além de estruturar relações, apresenta um ambiente para que essas práticas aconteçam. As tecnologias digitais – dispositivos e aplicativos - são ferramentas que juntas constituem o espaço para que as conversações virtuais aconteçam e as relações sejam estabelecidas. “A Comunicação Mediada pelo Computador é, assim, um conceito amplo, aplicado à capacidade de proporcionar trocas entre dois interagentes via computadores”. (Recuero, 2012, p. 24). As TIC’s trouxeram formas diferentes de relacionamentos pois coisas que antigamente
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eram feitas de uma maneira, hoje são feitas de modos diferentes, como por exemplo a conversa que antes era principalmente pessoalmente e hoje pode ser também virtual.
O ambiente da conversação Para que seja possível ocorrer a conversação, é necessária uma plataforma, que graças ao mundo virtual, hoje não precisa ocorrer em um ambiente físico com espaço limitado, mas em um espaço ilimitado onde é mantido e construído pela nossa percepção de espaço, assim como percebe Fragoso (apud Recuero, 2012, p. 41), o espaço é sempre construído, e não é universal, No mundo virtual, muitas coisas acontecem de forma diferente quando comparadas ao mundo e físico. Essa mediação, a passagem do físico para o virtual, acontece por meio da tecnologia e segundo Boyd (2010, apud Recuero, 2012, p.42) gera diferentes elementos para os mais variados públicos, que são totalmente diferentes dos públicos. Isso ocorre, pois são plataformas diferentes e todas as ações, sejam físicas ou virtuais, acontecem de forma diferente. A mediação por meio da tecnologia permite coisas que até anos atrás não era possível. Os suportes tecnológicos permitem a gravação,
a transformação, a distribuição de um áudio, uma imagem ampliando assim seu alcance. “Por isso, diz-se que a mediação acrescenta, assim, a persistência ao espaço público, já que as capacidades físicas de comunicação dos indivíduos são ampliadas por esses elementos” (Recuero, 2012, pág. 43). O corpo virtual também pode se apresentar de forma anônima. Segundo Recuero (2012, p.44) esse anonimato só ocorre por meio da mediação, pois o corpo físico que é o elemento essencial da interação não participa do processo mediado. O anonimato é gerado por meio dessa percepção, assim as audiências são invisíveis, invisíveis até certo ponto, pois a partir do momento que um perfil é feito em uma rede social, o anonimato deixa de existir e a identidade começa a ser construída. Ao construir uma identidade, linguagem e conceitos, a presença mesmo virtual, acontece e permite a interação.
Relações No mundo virtual é possível se relacionar com várias pessoas, sejam elas conhecidas ou não, por meio de redes sociais. Novas formas de relacionamento surgem com o advento das TIC’s e a conectividade, como analisa Lemos (2001, p.143), os indivíduos do mundo virtual constroem nesse espaço virtual novas
teias de relação que pouco a pouco vão sendo reconhecidas como parte de uma nova realidade. Para Lemos (2001, p. 148), o indivíduo se empodera de escolher com quem ele quer conversar, e ainda mais quando ele quer conversar, determinando o momento mais adequado e conveniente. O mundo virtual coloca o indivíduo no controle de tudo que ele deseja fazer. Com o advento da conectividade ficou fácil conversar com pessoas de outros estados e países. O namoro virtual tornou-se muito comum, onde as pessoas podem passar meses e até anos sem nunca terem se visto, e ainda assim falarem que estão namorando. Namorar virtualmente é muito mais prático, a partir do momento que não se quer mais a pessoa, não é necessário marcar um encontro complicado para terminar tudo, basta apenas enviar uma mensagem ou, em alguns casos, nem enviar nada. O namoro pela internet, Bauman (2004, p. 85), traz vantagens que os encontros pessoais não têm: no encontro pessoal o gelo pode ser quebrado e continuar assim ou derreter-se todo enquanto que no namoro virtual isso não acontece. Segundo France (apud Bauman, 2004, p. 85), os usuários do namoro pela internet podem namorar com segurança, pois sabem que se quiserem, podem voltar ao mercado para outra rodada de compras, se referindo ao fato de conhecer outras pessoas e poderem começar outros relacionamentos. “Terminar quando se deseja – instantane-
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amente, sem confusão, sem avaliação de perdas e remorsos – é a principal vantagem do namoro pela internet.” (Bauman, 2004, p. 85). Assim como é fácil também manter um relacionamento virtual, pois nada é exposto. Não há pessoas comentando, apenas o usuário sabe que está namorando e se quiser se expor ou não depende de sua vontade, já no mundo físico isso não acontece, pois o casal pode ser visto em vários lugares por pessoas conhecidas, logo o namoro seria facilmente divulgado. Nesse mundo instável, as ações também se tornaram inconstantes, e assim Bauman observa:
pela internet. Os dois atores do programa investigam a outra pessoa virtual e tentam contato para entender porque a pessoa nunca pôde se encontrar pessoalmente. No final do programa, a maioria desses encontros acaba muito mal, exatamente porque o outro parceiro muitas vezes é alguém diferente da foto, ou até de outro sexo, que estava apenas brincando com a outra pessoa por meio de um perfil falso. No mundo virtual, as pessoas podem criar perfis e identidades falsas, e manter por muito tempo até serem descobertas ou não. A tecnologia veio para melhorar a vida de todos, porém há aqueles que ainda não souberam usar essa ferramenta da melhor forma.
Reduzir riscos e, simultaneamente, evitar a perda de opções é o que restou de escolha racional num mundo de oportunidades fluidas, valores cambiantes e regras instáveis. E o namoro pela internet, ao contrário da incômoda negociação de compromissos mútuos, se ajusta perfeitamente (ou quase) aos novos padrões de escolha racional. (2004, p. 85)
Como o mundo está instável e cheio de possibilidades infinitas, até o conceito de relacionamento mudou, Bauman (2004, p.111), o compromisso com as outras pessoas do tipo compromisso incondicional ou “até que a morte nos separe” está hoje abalado. A existência de possibilidades de conhecer novas pessoas a todo o momento que põe em questão se realmente vale a pena se prender a um relacionamento estável. Num mundo instável, de infinitas possibilidades, depender de alguém já não é algo desejável, a flexibilidade modificou as relações, como analisa Bauman:
O namoro virtual traz outras questões como podemos observar no programa da MTV, CatFish, no qual uma dupla de amigos desvenda os mistérios de alguns namoros virtuais. Vários desses relacionamentos se estenderam por anos, e após tentativas frustradas de encontrar o parceiro virtual, a pessoa em questão pede ajuda ao programa CatFish, enviando um e-mail e contando a história do seu namoro
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Uma inédita fluidez, fragilidade e transitoriedade em construção (a famosa “flexibilidade”) marcam todas as espécies de vínculos sociais que, uma década atrás, combinaram-
se para constituir um arcabouço duradouro e fidedigno dentro do qual se pôde tecer com segurança uma rede de interações humanas. (2004, p.112)
Identidades No mundo virtual, surgem as identidades que podem ser moldadas e modificadas. Lemos (2001, p.145) relata sobre como os indivíduos podem criar de forma fragmentada vários sujeitos imaginários, ou identidades virtuais, que se constroem de forma gradativa. Isso acontece pois o mundo virtual trouxe a possibilidade das pessoas poderem experimentar vários “eus” e várias experiências, a fim de escolherem uma ou algumas identidades para fazerem parte do mundo virtual. Os indivíduos podem escolher experimentar e trocar de identidades quantas vezes acharem melhor seja por diversão seja pelo fato de escolherem identidades diferentes para serem aceitos em certos grupos. O indivíduo é responsável por ele mesmo, como observa Wolton (2007, p. 87), ele pode livremente desenvolver a sua competência, corresponder-se e criar
relações. Isso ocorre, pois o indivíduo se empodera no mundo virtual, é ele quem escolhe o que vai acontecer e quando irá acontecer. A sociedade contemporânea enfrenta mudanças ocasionadas pela modernidade instável, uma delas é a construção e manutenção da identidade. No mundo atual, as pessoas vivem em busca de uma ou várias identidades e “[...] se veem invariavelmente diante da tarefa intimidadora de “alcançar o impossível.” (Bauman, 2005, p.16). Tarefas impossíveis que não serão realizadas em “tempo real”, e sim na infinitude do tempo. Os grupos são formados por identidades, e para Bauman (2005, p.17) as identidades são expostas nas comunidades que são constituídas por um conjunto de ideias e princípios. É necessário ter idéias para manter a comunidade unida. Assim como a sociedade é instável em relação aos seus comportamentos, ideias e atitudes, as identidades também não estão estáveis. Elas mudam e são mudadas diariamente, seja pela transformação natural de identidade ou para ser aceito em um grupo. Há pessoas que criam identidades apenas para pertencer à um grupo, como por exemplo, quando fotos são expostas nas redes sociais e esbanjam joias e roupas caras propositalmente. Servem como uma construção da identidade de quem quer aparentar ser de uma classe social elevada, embora muitas vezes não seja, apenas para adquirir popularidade.
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Tornamo-nos conscientes de que o “pertencimento” e a “identidade” não tem a solidez de uma rocha, não são garantidos para toda a vida, são bastante negociáveis e revogáveis, e de que as decisões que o próprio indivíduo toma, os caminhos que percorre, a maneira como age – e a determinação de se manter firme a tudo isso – são fatores cruciais tanto para o “pertencimento” quanto para a “identidade”. (Bauman, 2005, p.17)
A ideia de “pertencimento” faz com que a identidade não possa ser moldada e construída apenas uma vez, visto que, existem diversas comunidades e para cada uma é preciso ter uma identidade diferente. Hoje, podemos pertencer a uma comunidade, amanhã, podemos querer pertencer à outra. Assim as identidades estão em constante transformação e adaptação e não são apenas modificadas por nós, mas também estão sob influência diária de todos que estão ao nosso redor. A busca da identidade plena é praticamente incansável, pois causa a sensação de precisar pertencer a algum lugar.
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Bauman (2005, p.21) chega a uma explicação interessante sobre identidade: não é algo a ser descoberto, mas sim inventado. Até porque não existe uma identidade que é a correta ou a que se adapta melhor ao indivíduo. A identidade é um conjunto de infinitas possibilidades que podem ser modificadas, reformuladas e inventadas. Para Bauman (2005, p.23) o que antes era algo que não chamava tanta
atenção, hoje é assunto que deve ser debatido e analisado por se tratar de algo muito importante pois a identidade chega até a ser um dos maiores problemas do mundo moderno, o que chamamos de “crise de identidade”. Quem sou eu? Do que realmente gosto? A que grupo devo pertencer? Entre outras perguntas que fazem parte da vida de milhares de pessoas. Afinal de contas, perguntar “quem você é” só faz sentido se você acredita que possa ser outra coisa além de você mesmo; só se você tem uma escolha, e só se o que você escolhe depende de você; ou seja; só se você tem de fazer alguma coisa para que a escolha seja “real” e se sustente. (Bauman, 2005, p.25)
Segundo Castells (2003, p.99) a representação de papéis e a construção de identidade como sustentação da interação on-line representam uma proporção muito pequena de sociabilidade baseada na Internet. Esse tipo de prática aparenta estar ligada fortemente aos adolescentes exatamente por que estão na fase de descobrir suas identidades, fazer experimentações e descobrirem quem realmente gostariam de ser. Um campo vasto de pesquisa para o entendimento da construção e experimentação da identidade. Com o surgimento de estudos sobre esse assunto, ocorreu uma distorção na percepção pública da prática social da Internet que acabou mostrando-a como um espaço para a realização de fantasias pessoais, porém ela não
é necessariamente isso, mas a extensão da vida como ela é, em todas as suas dimensões e modalidades. Thompson (2014, p. 265) chama a atenção para como o surgimento das sociedades modernas afetaram a construção do self, significando o “eu”, a personalidade do indivíduo. O self se tornou mais dependente dos recursos que os próprios indivíduos utilizam para construir a identidade no mundo virtual. Ao mesmo tempo que o surgimentos das novas tecnologias tornaram possível a construção do “eu” a partir de várias possibilidades, também tornaram as pessoas dependentes do uso dessas ferramentas. O self como analisa Thompson (2014, p.268) é um projeto que o indivíduo constrói ativamente e redefine a sua identidade pela trajetória da sua vida. As tecnologias impactam de forma muito significativa a maneira que a identidade é construída. Antigamente a identidade era construída face a face, também relacionada aos lugares que eram frequentados, hoje com a tecnologia e o mundo virtual, a identidade pode ser construída de diversas formas. Assim como o self, ou seja, a identidade e o nosso “eu” também é influenciado pela tecnologia. Para Bauman (2005, p.32), nós buscamos manter a nossa “identidade” em movimento para nos juntarmos aos grupos os quais também são móveis e velozes.
Nesse mundo acelerado, as identidades não podem ser sólidas, estáveis e rígidas pois não funcionam em meio ao mundo líquido moderno. A identidade, como diz Bauman (2005, p.35) vem do desejo de “estar seguro”. A sensação de não pertencer a um lugar provoca medo e aumenta mais ainda a ansiedade por querer de alguma forma ter uma identidade que torne possível o pertencimento a algum grupo. Assim como no mundo líquido moderno, não se pode mais ser fixo e ser facilmente identificado, é necessário ser flexível, maleável e mutável para se adaptar a todas as mudanças que ocorrem no mundo acelerado. Assim como analisa Bauman (2005, p.37) as pessoas tendem a trocar a identidade que seria escolhida apenas uma vez por uma “rede de conexões”. Na sociedade contemporânea, não é possível manter uma identidade apenas. Assim como analisa Bauman (2005, p.96) as identidades foram feitas para usar e exibir, e não para manter e armazenar por uma vida toda. Não podemos colocar a culpa nos celulares ou grupos de bate-papo pela situação atual. Nós somos praticamente obrigados a tecer e moldar as nossas identidades e não nos é permitido que apenas uma identidade nos pertença.
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CAPÍTULO 2 NECESSIDADE DE ESTAR CONECTADO
Conectividade A conectividade surgiu a partir do momento que a internet se propagou e chegou a todos, como diz Dominique Wolton (2007, p.85) que para muitos a quantidade de computadores conectados à Internet parece o índice mais importante para definir o grau de desenvolvimento de um país, podemos estender isso aos celulares conectados também. Estar conectado só é possível a partir do momento em que temos uma tecnologia e uma rede de Internet, sem elas não podemos habitar o mundo virtual. “Estar conectado”, como observa Wolton (2007, p.86), simboliza a liberdade e a capacidade de dominar o tempo e o espaço. Isso porque o indivíduo tem autonomia para fazer e conversar com quem quiser no tempo que quiser. “A Web torna-se uma figura de utopia, de uma sociedade onde os homens são livres, capazes de se emancipar por eles mesmos” (Wolton, 2007, p.87). A conectividade sem excessos trouxe muitos benefícios, ainda mais aos tímidos que hoje se sentem inclusos no mundo virtual e podem criar laços com outras pessoas com o mesmo estilo de vida, pensamentos e ideias. Hoje ninguém mais está excluído, todos podem pertencer a algum grupo. Estar conectado não diminuiu as chances de ser rejeitado, mas
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as tornou quase insignificantes, pois em uma lista de contatos quase infinita, ser rejeitado por uma pessoa torna-se algo sem motivo de preocupações, há várias outras pessoas nessa lista que se pode enviar mensagens ou fazer ligações. Pense nisto (quer dizer, se houver tempo para pensar): é absolutamente improvável chegar ao fim de seu catálogo portátil ou digitar todas as mensagens possíveis. Há sempre mais conexões para serem usadas – e assim não tem grande importância quantas delas se tenham mostrado frágeis e passíveis de ruptura. (Bauman, 2004, p.79)
Por mais que a tecnologia e a conectividade tenha proporcionado diversas vantagens, seu uso em excesso, o que é muito comum hoje, está provocando diversas mudanças no cotidiano da sociedade. O comercial da Vivo – “Vamos falar sobre isso? Celular #UsarBemPegaBem”, exemplifica o momento que a sociedade está passando e questiona se as pessoas realmente estão usando o celular da maneira correta em diversas situações do cotidiano e como o uso dessa tecnologia tem afetado as pessoas.
Falta de interresse nos momentos a dois. Fonte: Youtube
Falta de interação entre amigos. Fonte: Youtube 3
Um casal assiste filme no cinema, mas o homem está distraído com o celular, o que aborrece sua mulher, pois é um lugar onde normalmente as pessoas costumam esquecer um pouco da vida, desligam o celular e prestam atenção no filme, mas o que acontece é o contrário. Enquanto a mãe está dirigindo e usando o celular, o seu filho, que está no banco do passageiro, retira gentilmente o celular de sua mãe, pois sabe que não é o correto e a narradora questiona o fato das pessoas saberem que não se pode usar o celular enquanto se está dirigindo, mas mesmo assim fazem, basta observar o carro ao lado no trânsito para perceber que a maioria das pessoas também utilizam o celular en-
1 - http://bit.ly/1I2Rczd. 2 - Idem. 3 - Idem. 4 - Idem.
1
Uso inapropriado do celular na direção. Fonte: Youtube 2
Celular interferindo nos momentos de lazer. Fonte: Youtube 4
quanto estão dirigindo. É mostrado um grupo de amigas reunidas, no qual apenas uma delas não está usando o celular e está se sentindo entediada, pois todas as amigas estão interagindo apenas com o celular e não entre elas. Essa situação é bastante frequente em bares e até em baladas. O uso do celular mesmo em lugares de lazer tem se tornado cada vez mais comum. Um casal está aparentemente curtindo as férias, mas o celular do homem toca e ele atende para resolver. O vídeo chama a atenção para o fato do uso do celular nos empoderar de resolver tudo com facilidade mas questiona se tudo é realmente urgente para ser resolvido na hora.
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Formas de aprender por meio do celular. Fonte: Youtube 5
Novas formas de se comunicar e conversar. Fonte: Youtube 6
Apreciando a arte no mundo moderno. Fonte: Youtube 7
Garantindo o registro de todos os momentos. Fonte: Youtube 8
Um homem aprende a tocar piano com a ajuda do celular e o comercial afirma que é possível aprender muitas coisas assim, mas questiona se as pessoas realmente precisam aprender tudo a toda hora. Um casal está deitado na cama, e os dois conversam apenas quando um deles resolve mostrar algo que viu no celular. O comercial questiona se digitar é melhor que conversar ou se digitar virou a nova forma das pessoas conversarem. Em outra situação pode-se observar como o uso do celular nos afeta, em um museu as pesso-
as estão tirando foto de um quadro e a narradora afirma que compartilhar é bom mas questiona se essa situação não é estranha, pois as pessoas parecem mais preocupadas em garantir a foto do que realmente apreciar a arte. Uma das situações mostra uma festa de criança, onde as pessoas estão tirando fotos e gravando vídeos a fim de não deixarem de capturar cada momento da festa. A narradora acaba nos questionando se não estamos esquecendo o mundo fora, pelo fato de estarmos conectados a todo o momento.
Ausência do diálogo entre casais. Fonte: Youtube 9
Celular interferindo na infância. Fonte: Youtube 10
O uso do celular em todos os momentos especiais. Fonte: Youtube 11
Um casal está jantando num restaurante, mas não estão conversando. A narradora chama atenção para o fato de aparentarem estar brigados ou apenas distraídos demais com o celular a ponto de não conversarem, dando a impressão de não estarem se importando um com o outro. Em outro momento algumas crianças estão brincando em um parque e uma delas está afastada usando o celular. A narradora do vídeo afirma que ficamos mais espertos com o celular mas questiona se não há uma idade certa para usá-lo.
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O comercial termina perguntando o que é o certo e o que é o errado, nos fazendo refletir no uso dessa tecnologia e nos conscientizando sobre o uso excessivo dela ao relacionar a frase do vídeo “UsarBemPegaBem” ao fato das pessoas precisarem usar o celular com o bom senso. O comercial ilustra o momento que a sociedade contemporânea está passando, onde em muitas situações, as pessoas têm deixado de dar atenção às pessoas que estão ao redor delas para interagirem com seus celulares.
33 5 - http://bit.ly/1I2Rczd. 6 - Idem. 7 - Idem. 8 - Idem.
9 - http://bit.ly/1I2Rczd. 10 - Idem. 11 - Idem.
Segundo Castells (2003, p.98), alguns críticos da Internet e reportagens da mídia, que se baseiam em estudos de pesquisadores, acreditam que a propagação da Internet está levando as pessoas ao isolamento pessoal, conflitando com a comunicação social e vida familiar. Os indivíduos abandonam as interações face a face nos ambientes reais. Notouse também a importância ao analisar as novas identidades falsas e representações de papéis que surgiram. Deste modo, a Internet para Castells (2003, p. 98) foi considerada responsável por impulsionar de forma gradativa as pessoas a viverem suas fantasias on-line, formando uma cultura afetada pela realidade virtual à medida que as pessoas começaram a fuga da vida real. A identidade é construída não só na internet, mas também por quem utiliza essas tecnologias. Os jovens usam a internet para se diferenciarem dos adultos construindo suas identidades e criando suas comunidades onde os adultos não participam. Os adultos, e incluamse os idosos, também já estão conectados no mundo virtual, usando as mesmas redes sociais, expondo fotos e idéias, contribuindo para essa exposição pessoal. A identidade virtual atingiu a todos e “Diante do computador, todo mundo está em pé de igualdade” (Wolton, 2007, p.89). A maioria das pessoas tem a necessidade de estar conectada, como se estivessem viven-
34 1 - http://bit.ly/1iLGrso
do em um mundo próprio. Parecem solitárias, pois as interações humanas acabam sendo afetadas. Há casos inclusive de acidentes de trânsito e pessoas que foram atropeladas por estarem usando o celular, chegou a um ponto onde o celular parece ter virado o principal personagem, e não a própria vida. Como observa Andy Hargreaves (apud Bauman, 2005): Em aeroportos e outros espaços públicos, pessoas com telefones celulares equipados com fones de ouvido ficam andando para lá e para cá, falando sozinhas em voz alta, como esquizofrênicos paranoicos, cegas ao ambiente ao seu redor. A introspecção é uma atitude em extinção. Defrontadas com momentos de solidão em seus carros, na rua ou nos caixas de supermercados, mais e mais pessoas deixam de se entregar a seus pensamentos para, em vez disso, verificarem mensagens deixadas no celular em busca de algum fiapo de evidência de que alguém, em algum lugar, possa desejá-las ou precisar delas.
Falta de interesse em museus. Fonte: Trabajemos.Cl 12
É evidente como a tecnologia e o fato de estar conectado impactou a vida da sociedade. Podemos observar pessoas praticamente em todos os lugares, até mesmo em velórios, museus e vários lugares inusitados com seus celulares. Hoje não existe mais a possibilidade de ficar solitário, seja onde for, basta acessar um celular, contatar algum amigo e essa falsa impressão de companhia virtual alimenta por algum tempo a sensação de companhia. Basta estar na rua para perceber que, na verdade, estão todos cada vez mais sozinhos. Menos interações acontecem, menos conversas são iniciadas e menos flertes são notados, talvez a própria vida física tenha ficado em segundo plano. A partir do momento em que cada pessoa começa a construir a sua identidade, temos grande dificuldade em mantê-la. Novas identidades são constituídas a todo momento, pois a tecnologia permite que diversas delas sejam montadas e recriadas. A mudança é uma necessidade, nas palavras de Bauman, ele mostra que esse mundo líquido não trouxe soluções: Manter-se em alta velocidade, antes uma divertida aventura, transforma-se em uma tarefa exaustiva. O que é mais importante, aquela incerteza desagradável e aquela confusão aflitiva, das quais você pensava ter se livrado graças à velocidade, se recusam a abandoná-lo. A facilidade do desengajamento e do rompimento não reduz os riscos, apenas os distribui, junto com as ansiedades que exalam, de modo diferente. (2005, p.38)
Vivemos na era do imediatismo, o mundo mesmo parece estar mais rápido, as pessoas parecem estar mais ocupadas ainda vivendo em constante correria contra o tempo. Logo, a sociedade precisa de ferramentas que se adaptem e supram a necessidade do imediatismo, pois em um mundo onde o tempo é escasso, o celular veio de vez para ficar, resolve quase todos os problemas imagináveis, você pode pagar uma conta ao estar conectado, conversar com alguém, pesquisar, estudar. Seria possível dizer que a maioria das pessoas não abriria mão dessa tecnologia mesmo ao saber que ela pode estar contribuindo com a fragilização das relações pessoais.
Para Bauman (2001, p.139) as pessoas que andam e agem com maior rapidez são as que mais tem poder, a instantaneidade virou o objetivo da sociedade. “A dominação consiste em nossa própria capacidade de escapar, de nos desengajarmos, de estar em “outro lugar”, e no direito de decidir sobre a velocidade com que isso será feito [...]”. Essa ideia de instantaneidade pode ser percebida no cotidiano da sociedade na qual o imediatismo e o instantâneo estão presentes. Basta enviar uma mensagem on-line para alguém que a resposta chegará senão na hora, muito em breve. A sociedade vive em função do “aqui e agora”, pode-se pesquisar algo na internet, obter o resultado na hora e para isso basta estar conectado.
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A instantaneidade faz parte do cotidiano da sociedade atual, com o surgimento de computadores, celulares, tablets e aparelhos de última geração.. Para Bauman (2001, p. 145), a instantaneidade faz com que todos os momentos pareçam ter capacidade infinita, isso significa que não há limites. É algo que pode ser extraído a qualquer momento por mais breve e “fugaz” que seja. “Uma vez que a infinidade de possibilidades esvaziou a infinitude do tempo de seu poder sedutor, a durabilidade perde sua atração e passa de um recurso a um risco” (Bauman, 2001, p.146). As pessoas passam muito tempo conectadas, segundo o gráfico, realizado pela agência de marketing social We Are Social (2015), há mais celulares do que pessoas no Brasil. São 204 milhões contra 276 milhões de conexões de celulares. Dos 204 milhões de indivíduos, 110 milhões são usuários ativos de internet.
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Gráfico sobre conectividade no Brasil. Fonte: E-commerce Brasil13
13 - http://bit.ly/1XY0nZ5. 14 - Idem.
O gráfico seguinte mostra o tempo que as pessoas passam na internet. O Brasil é o terceiro país no mundo que passa o maior tempo na internet:
Gráfico sobre o tempo passado na internet. Fonte: E-commerce Brasil 14
Esse excesso de tempo que as pessoas passam conectadas impacta totalmente no cotidiano gerando ansiedade ao usuários da internet. Ao acordar, por exemplo, a maioria das pessoas verifica o WhatsApp e o Facebook a fim de saber se alguém enviou mensagens ou se algo interessante aconteceu enquanto a pessoa estava dormindo. E esse ato não para por aí, essa verificação acontece constantemente e se estende por todo o dia, na escola ou faculdade, no trabalho, a caminho de casa, no trânsito, em bares, reuniões familiares e até em velórios. As pessoas não conseguem se desconectar exatamente pelo fato de ao estarem conectadas, sentirem a sensação de pertencer a algum lugar. Um lugar de todos onde tudo o que acontece no mundo e na
vida social pode ser acessada e encontrada apenas com um celular e uma rede wi-fi ou paga. “Uma mensagem brilha na tela em busca de outra. Seus dedos estão sempre ocupados: você pressiona as teclas digitando novos números para responder às chamadas ou compondo suas próprias mensagens.” (Bauman, 2004, p.78) Segundo o blog do Estadão15, há um fenômeno que explica essa ansiedade chamada FOMO “fear of missing out”, as pessoas têm medo de perder alguma coisa e por esse motivo estão sempre checando as notificações e atualizando os conteúdos para verem as novidades. Essa ansiedade se dá ao fato da velocidade a qual as informações estão chegando, a cada minuto, e às vezes até segundos, um novo acontecimento aparece no mundo virtual, fazendo com que as pessoas acessem seus celulares ou computadores a todo o momento, sempre há uma nova notificação. As pessoas permanecem conectadas praticamente 24 horas por dia, “[...] mesmo estando em constante movimento, e ainda que os remetentes ou destinatários invisíveis das mensagens recebidas e enviadas também estejam em movimento [...]” (Bauman, 2004, p. 78). As vidas se estendem ao mundo virtual, e assim como na vida “real”, na vida virtual o tempo também não para, é como se fosse uma plataforma diferente e extensiva onde a vida “real” também acontece, onde muitos
15 - http://bit.ly/1M0dZgP. 16 - http://bit.ly/1S9KwTe.
podem acessar e ser acessados. “Os celulares são para pessoas em movimento” (Bauman, 2004, p. 78). O problema da conectividade em excesso foi o fato de ter chegado a um nível onde as pessoas praticamente não estão mais interagindo entre si, mesmo quando estão frente a frente. Esse problema se mostra presente em vários lugares, como por exemplo, na frase abaixo, de algum estabelecimento, que mostra o quanto a interatividade foi prejudicada:
Apelo para que as pessoas conversem. Fonte: Click Camboriú 16
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Basta sair de casa para perceber a maneira a qual a tecnologia está afetando a vida da sociedade, a maioria das pessoas está com um celular na mão e provavelmente com fones de ouvido, criando uma espécie de bolha invisível que a separa do mundo físico compartilhado por outras pessoas. Um exemplo é andar em um trem, metrô ou ônibus para reparar como todos aparentam estar isolados em um mundo apenas seu, como sugere a foto seguinte:
Todos estão conectados. Fonte: Blog Aberto até de madrugada 17
As pessoas chegaram a um ponto, onde se tornaram tão dependentes que não saem de casa sem o celular, mesmo que seja por pouco tempo a ausência, se sentem na necessidade de levarem consigo o celular.
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Você nunca perde de vista o celular. Sua roupa de jogging tem um bolso especial para ele, e você nunca sai com aquele bolso vazio, da mesma forma que não vai correr
17 - http://bit.ly/1HAZiwL.
sem o seu tênis. Na verdade você não iria a nenhum lugar sem o celular (“nenhum lugar” é, afinal, o espaço sem um celular, com um celular fora de área ou em bateria). Estando com o seu celular, você nunca está fora ou longe. (Bauman, 2004, p.78)
Não importa onde as pessoas estão, basta estarem conectadas para ampliarem as suas extensões, que para Bauman (2004, p. 79) são as suas conexões. Por mais que todas as outras pessoas estejam em movimento também, as mensagens e ligações poderão ser enviadas e respondidas, feitas e atendidas. Segundo Urry (apud Bauman, 2004), “as relações de copresença sempre envolvem contiguidade e afastamento, proximidade e distância, sensatez e imaginação”. Essa ideia se deve ao fato das tecnologias e a conectividade terem de fato conectado as pessoas que estavam distantes. O comercial produzido pela Y&R para a operadora telefônica Tailandesa Dtac mostra o uso da tecnologia no cotidiano e como simples ações que podem ser feitas pessoalmente foram ofuscadas pela maneira a qual a sociedade normalmente usa as tecnologias para resolver tudo.
Entretendo o filho com o celular. Fonte: Portal MakingOf 18
Mãe tentanto distrair o filho. Fonte: Portal MakingOf 19
Pai notando que o celular não resolve tudo. Fonte: Portal MakingOf 20
Pai emocionado por acalmar o filho. Fonte: Portal MakingOf 21
Um pai está cuidando de seu filho quando ele começa a chorar. O pai sem saber como proceder liga para a sua mulher e pergunta a ela o que deve fazer. Ela então sugere que ele tente entreter o filho com algum vídeo de desenho animado. Após uma tentativa sem sucesso, a mãe tenta por meio de uma vídeo conferência, na qual a câmera do celular mostra em tempo real a pessoa do outro lado da tela, entreter o bebê com a voz dela e uma série de brincadeiras, mas o filho continua a chorar. O pai então percebe por um momento que o
celular não irá ajudar em nada, e resolve fazer algo simples, que não havia pensado ainda, envolvendo nos braços o filho, que pouco a pouco começa a se acalmar. O pai se emociona ao ver que bastava segurar o filho para que ele parasse de chorar. Do outro lado da tela a mãe que também está assistindo a tudo, se emociona ao ver a cena. O comercial chama a atenção para o fato da tecnologia não ser capaz de substituir tudo e que às vezes as pessoas deixam de realizar ações simples por acharem que a tecnologia pode resolver tudo.
39 18 - http://bit.ly/1MiAkEi. 19 - idem. 20 - Idem. 21 - Idem
Em um bar, assim como em vários outros lugares, pode-se observar grupos de amigos que estão unidos e ao mesmo tempo distantes. Uma situação em que a tela do celular vira o centro das atenções, enquanto a conversa deveria ser a principal personagem.
Amigos não estão interagindo em bares. Fonte: Blog Coisas que eu aprendi com a vida 22
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Uma reunião familiar, onde primos distantes que não se veem há tempos, trocam o que deveria ser algo especial por um afastamento ocasionado pelo uso do celular. Por outro lado, o celular assim como o computador trouxeram muitas vantagens. Pessoas que moram distantes podem conversar virtualmente, fazer ligações até mesmo com a câmera do computador ou celular. A conectividade de fato veio para agregar muitas coisas positivas na sociedade porém há muitas pessoas que usam essas ferramentas tecnológicas de forma excessiva fazendo com que a vida física se afaste cada vez menos das experiências reais.
22 - http://bit.ly/1MFmlrw.
Para Bauman (2004, p.81) a proximidade não exige mais a contiguidade física exatamente porque “estar próximo” não tem o mesmo significado. Hoje pode-se estar próximo virtualmente mesmo distante fisicamente. As conexões de fato acontecem e aproximam as pessoas umas das outras. A dúvida existente é se a conectividade tem afastado mais do que conectado as pessoas, pois se alguém está em um lugar que não quer, com pessoas que não quer conversar e interagir, basta ter um celular e facilmente conseguirá se desconectar fisicamente do lugar que não lhe é conveniente. Há muitos anos, desconectarse de um lugar não era possível, se um aluno por exemplo não estivesse gostando da aula, não poderia fazer algo a respeito. Hoje, basta se conectar (escondido do professor) e não se vê mais obrigado a assistir uma aula. Hoje é fácil ignorar algo fisicamente, seja um lugar, pessoa ou situação que não interessa, basta ter uma rede Wi-fi a disposição ou até mesmo usar a internet paga, que esse problema pode ser resolvido. Atualmente, encontrar-se com um amigo ou até mesmo um namorado tornou-se banal, para Bauman (2004, p.82), a proximidade virtual tornou as conexões humanas mais intensas e breves. Tornaram-se breves e banais demais para conseguirem constituir laços estáveis e duráveis. Os laços podem ser desfeitos com o apertar de um botão, algo ou alguém que não é conveniente podem ser
descartados com a maior facilidade. Nesse mundo líquido as chances das pessoas quererem manter relações estáveis estão cada vez menores. “Estar conectado” é menos custoso do que “estar engajado” – mas também consideravelmente menos produtivo em termos da construção e manutenção de vínculos” (Bauman, 2004, p.82). É muito mais fácil manter uma relação virtual, seja amorosa ou afetiva, do que se arriscar a manter laços pois as consequências são bem menores se algo não der certo. Pode-se descartar ou ser descartado por alguém e a vida segue, novas conexões estão prontas para serem feitas, dependendo das duas pessoas que estão conversando, apertarem ou afrouxarem os laços. A vida foi afetada pela grande flexibilidade que o virtual trouxe, onde as regras se tornaram instáveis. Devemos prestar atenção ao fato de que são as pessoas que utilizam essas ferramentas tecnológicas. A maioria das pessoas fizeram com que o excesso de conectividade a tornasse refém do mundo virtual. Bauman entende que são os indivíduos que operam as ferramentas tecnológicas:
Seria tolo e irresponsável culpar as engenhocas eletrônicas pelo lento mas constante recuo da proximidade contínua, pessoal, direta, face a face, multifacetada e multiuso. E no entanto a proximidade virtual ostenta características que, no líquido mundo moderno, podem ser vistas, com boa razão, como
vantajosas – mas que não podem ser obtidas sob as condições daquele outro tetê-àtête, não virtual. (2004, p. 84)
A conectividade trouxe uma zona de conforto, pois aparentemente não é necessário se expor fisicamente, nem correr riscos que poderia correr pessoalmente. Porém é preciso lembrar que a vida virtual também impacta na vida física, os riscos também existem, se algo errado for dito, as consequências poderão ser as mesmas, ou até piores, visto que no espaço virtualizado milhares de pessoas podem ter acesso a algum acontecimento. No mundo virtual você pode escrever o que quer, de forma pensada, com menos chances a passar vergonha por dizer algo errado, o que não quer dizer que as consequências não surgirão se algo não der certo. Temos uma falsa impressão de que no mundo virtual as pessoas são inatingíveis, quando na verdade é contrário, são até mais vulneráveis à exposição.
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Solidão O excesso de conectividade aparentemente está tornando a sociedade mais solitária visto que até os relacionamentos estão se tornando virtuais e as pessoas conversando menos pessoalmente. Como observa Wolton (2007, p.104), as pessoas agora estão vivendo em um mundo onde não há regras e obrigações. A prova da solidão que é real devido à grande dificuldade em conseguir entrar em contato com o outro. O autor relata que os professores dizem que os alunos que se saem melhor em computação são os que têm mais dificuldade em se relacionar, isso se deve ao fato das “ferramentas” estarem sendo utilizadas de maneira errada: o celular ou o computador e a Internet. “Milhares de indivíduos saem assim, celular à mão, correio eletrônico conectado e a secretária eletrônica ligada como a última medida de segurança! Como se tudo fosse urgente e importante, como se fosse morrer caso não pudesse ser encontrado a qualquer instante” (Wolton, 2007, p. 104).
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Por mais dependentes que as pessoas estejam das tecnologias e conectividade, ainda não existe uma maneira de driblar qualquer tipo de interação, em algum momento, a interação com outras pessoas há de acontecer,“[...] sempre chega o momento em que
é preciso desligar as máquinas e falar com alguém.” (Wolton, 2007, p.104). Um fotógrafo chamado americano Eric Pickersgill (2015) fez um ensaio de fotos, removendo os celulares e tablets das pessoas em momentos do cotidiano para chamar a atenção ao vício nessas tecnologias e como ela está impactando as interações humanas. Para o fotógrafo, as pessoas estão dividindo o mesmo ambiente mas estão se relacionado com pessoas e conteúdos diferente de outros lugares Em suas fotografias, casais e famílias estão cada vez mais distante, o que era pra ser um momento de conversa tornase um momento onde todos estão ocupados e vidrados em outra coisa. Essa série de fotos causa um estranhamento e dá a sensação das pessoas estarem distantes umas das outras aproveitando mais o que seria o mundo virtual e as tecnologias e interagindo menos com pessoas que estão ao lado. As pessoas aparentam estar solitárias, de cabeça baixa, como se estivessem vivendo em mundos diferentes, desaprendendo a interagir com as outras pessoas, afetando a maneira de se relacionar, pois estão acostumados a se relacionarem virtualmente principalmente.
Juntos, mas separados. Fonte: O Globo 23
Namorados próximos e distantes. Fonte: O Globo 24
Família unida que não interage. Fonte: O Globo 25
Tão perto e tão longe. Fonte: O Globo 26
43 23 - http://glo.bo/20ESB8z. 24- Idem. 25 - Idem. 26 - Idem.
CAPÍTULO 3 TINDER E OS RELACIONAMENTOS VIRTUAIS
O aplicativo Tinder, criado por Mateen, Sean Rad, Jonathan Badeen e Christopher Gulczynski surgiu em 2012, mas apenas 2013 ficou conhecido. Até o conceito de paquera que costuma acontecer pessoalmente mudou. Como a maioria das pessoas está hoje sem tempo, o Tinder veio como um meio facilitador para promover encontros virtuais e posteriormente físicos caso o interesse permaneça. O aplicativo funciona como um catálogo. Após escolher as suas preferências como, por exemplo, sexo, idade e distância limite de onde a pessoa deve morar, o aplicativo localiza usuários que se encaixam no perfil desejado. Fotos dos usuários aparecem e, caso a pessoa goste do perfil apresentado, pode curtir a foto ou descartá-la. As duas pessoas só poderão conversar se houver interesse mútuo, ou seja, se curtirem a foto uma da outra, aparece a palavra “match”na tela do celular e então ambos podem começar a conversar:
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Combinação entre as pessoas no Tinder. Fonte: The Washington Times 27 27 - http://bit.ly/1M0d7c0
De acordo com Bauman (2001, p.137) o mundo instantâneo e sem substância do software é também um tempo que não apresenta consequências. Essa instantaneidade foi percebida no surgimento das tecnologias, onde tudo acontece de forma rápida em tempo real ou quase em tempo real, e causa a sensação de realização imediata “[...] mas também exaustão e desaparecimento do interesse” (Bauman, 2001, p.137). Essa ideia pode ser identificada no uso do Tinder que por ser uma forma de catálogo de pessoas, pode provocar interesse imediato e ser levado adiante. Há a possibilidade de se transformar em algo momentâneo pois em um mundo de infinitas possibilidades o aplicativo sempre apresenta novas pessoas para conhecer. Essa não existência de limites faz com que o usuário tenha a impressão de que pessoas mais interessantes ainda estão por vir. No Tinder, o usuário escolhe as pessoas de acordo com o que mais lhe agrada, após uma primeira conversa a pessoa pode ser descartada e a busca pela pessoa ideal continua pois nenhum laço precisa ser criado e mantido, pode-se simplesmente “devolver” o outro como se fosse um produto. De tal forma, Bauman nota o possível descarte de pessoas na internet: Ou, de qualquer maneira, é assim que a pessoa se sente ao conseguir parceiros na internet. É como folhear um catálogo de reembolso postal que traz na primeira página o aviso “compra não obrigatória” e a garantia ao consumidor da “devolução do produto caso não fique satisfeito. (2004, p. 85)
Fragilização dos sentimentos
O amor, assim como vários sentimentos foram impactados com o surgimento das novas tecnologias e formas de se relacionar. Em um mundo onde as redes e aplicativos sociais trouxeram infinitas possibilidades, oportunidades de conhecer milhares de pessoas de diversos lugares sem necessariamente a interação pessoal, pode-se notar o grande crescimento de relações virtuais e ao mesmo tempo a fragilização dos laços sociais. Notase uma conexão e afastamento nas relações na sociedade. Para Bauman (2004, p. 19) a definição “romântica” do amor como “até que a morte nos separe”, está fora de moda. Isso se dá ao fato do amor tanto quanto a paixão e sentimentos de interesse, nesse mundo virtual, estarem desgastados e cada vez mais procurados em redes e aplicativos sociais. Com infinitas possibilidades as pessoas acreditam que terão facilidade em encontrar o amor por meio dessas ferramentas tecnológicas o que não necessariamente seja verdade. Há casos de pessoas que se conheceram vir-
tualmente e chegaram até a se casar assim como pessoas que passaram anos sem se interessar por alguém e continuam em busca da pessoa ideal. Em vez de haver mais pessoas atingindo mais vezes os elevados padrões do amor, esses padrões foram baixados. Como resultado, o conjunto de experiências às quais nos referimos com a palavra amor expandiuse muito. Noites avulsas de sexo são referidas pelo codinome de “fazer amor”. (BAUMAN, 2004, p.19).
As pessoas passaram a achar que amar e apaixonar-se é “[...] uma habilidade que se pode adquirir, e que o domínio dessa habilidade aumenta com a prática e a assiduidade do exercício” (Bauman, 2004, p.19). Essa ideia se deve ao fato das pessoas terem a impressão de estarem se relacionando bastante a medida que fazem mais amigos e paqueras virtuais. Porém, olhando por outro lado, pode ser que essa interação tenha se tornado quantitativa e não qualitativa como deveria ser. Hoje pode-se conhecer dezenas de pessoas virtualmente em uma noite, sem necessariamente ter conhecido uma a uma intensamente. Há quem defenda a ideia que as tecnologias trouxeram a possibilidades de facilitar as relações pessoais, mas também há pessoas, como Bauman, que acreditam na fragilização dos laços justamente pela impressão de não conhecer ninguém a fundo no mundo virtual
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e tecnológico. O uso do Tinder pode explicar a ideia de Bauman, ao acreditar que o acúmulo de experiências aumenta a sensação de achar que o próximo será mais interessante ainda que a experiência atual, um ciclo que parece não ter fim:
Pode-se até acreditar (e frequentemente se acredita) que as habilidades do fazer amor tendem a crescer com o acúmulo de experiências; que o próximo amor será uma experiência ainda mais estimulante do que a que estamos vivendo atualmente, embora não tão emocionando ou excitante quanto a que virá depois. (2004, p. 19)
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O Tinder causa várias sensações e uma delas é a de achar que num mundo de infinitas possibilidades alguém mais interessante está sempre por vir. Por esse motivo Bauman acredita estarmos vivendo em um mundo líquido onde as relações não são estáveis e duradouras. Por outro lado, há pessoas que mesmo no mundo virtual conseguem conhecer outras pessoas e criar laços estáveis. Atualmente é comum ouvir dizer que duas pessoas que estão namorando ou irão casar se conheceram em redes ou aplicativos sociais. É um mundo que veio para facilitar, mas que também pode ter vindo para dificultar e fragilizar os laços. Bauman (2004, p. 20) defende a ideia de que esse mundo líquido esteja fragilizando as relações pois muitas pessoas que buscam re-
lacionamentos, muitas vezes não conseguem mantê-los ao pensar que há outras oportunidades a serem conhecidas:
É claro. Relacionamentos são investimentos como quaisquer outros, mas será que alguma vez lhe ocorreria fazer juras de lealdade às ações que acabou de adquirir? Jurar ser fiel para sempre, nos bons e maus momentos, na riqueza e na pobreza, “até que a morte nos separe”? Nunca olhar para os lados, onde (quem sabe) prêmios maiores podem estar acenando? (2004, p. 29)
De acordo com Bauman os relacionamentos são como ações, porém nesse caso, não existe um mercado em operação e ninguém fará o trabalho de analisar as probabilidades e chances. Dessa maneira, terá que seguir por conta própria. Estar em um relacionamento “significa muita dor de cabeça, mas, sobretudo uma incerteza permanente. Você nunca poderá estar plena e verdadeiramente seguro daquilo que faz – ou de ter feito a coisa certa ou no momento preciso” (Bauman, 2004, P.29). Esse mundo instável trouxe além da sensação de poder conhecer novas pessoas a todo o momento, também medo, incertezas, onde muitas pessoas apresentam dificuldade em saber se devem ou não manter um relacionamento. Como saber se o próximo que está por vir não pode ser melhor e mais interessante? A verdade é que não tem como saber isso a não ser que duas pessoas se apaixonem inten-
samente a ponto de não restar dúvidas do sentimento que entre elas existe, do contrário esse mar de incertezas continuará a rondar até que a pessoa em questão decida por arriscar ou voltar para o mundo das infinitas possibilidades, torcendo para que essa tal desejada “pessoa mais interessante” apareça o quanto antes.
Você busca o relacionamento na expectativa de mitigar a insegurança que infestou sua solidão; mas o tratamento só fez expandir os sintomas, e agora você talvez se sinta mais inseguro do que antes, ainda que essa “nova e agravada” insegurança provenha de outras paragens (BAUMAN, 2004, p. 30)
A visão de investir em um relacionamento, de acordo com Bauman (2004, p. 30), pode não ser seguro, pois a tendência é ele continuar sendo inseguro, por mais que as pessoas desejem o contrário, o relacionamento passa a ser uma dor de cabeça, e não um remédio. Muitas pessoas não conseguem manter relações no Tinder, por exemplo, talvez justamente por esse medo de não saber se é seguro, se o outro parceiro também abrirá mão de conhecer outras pessoas, torna-se um futuro incerto onde as chances de dar certo são mínimas. Por outro lado, há pessoas que conseguem manter relações, desenvolver relacionamentos estáveis e até casamentos no
mesmo aplicativo que oferece a oportunidade de conhecer milhares de pessoas. Talvez seja uma questão de sorte ou a verdadeira vontade de conhecer alguém. O medo da solidão e a ansiedade da sociedade contemporânea transformam a maneira de se relacionar na atualidade. Talvez o aplicativo Tinder sirva tanto para conhecer pessoas quanto para preencher um vazio ocasionado pela solidão, as pessoas provavelmente estão com tanta necessidade de criar relacionamentos a todo o momento para não se sentirem sozinhas que a maioria não consegue manter laços estáveis e duradouros, simplesmente pelo fato de estarem sempre buscando a necessidade de serem preenchidos por alguém. A partir do momento que alguém deixa de suprir essa carência partem em busca de outro alguém. O problema se dá quando surge a impressão que a solidão continuará mesmo em um relacionamento, o medo de se sentir solitário faz com que todos continuem a procurar novas pessoas até sentirem certeza, o que pode demorar muito. “A solidão produz insegurança – mas o relacionamento não parece fazer outra coisa. Numa relação, você pode sentir-se tão inseguro quanto sem ela, ou até pior. Só mudam os nomes que você dá à ansiedade”. (Bauman, 2004, p.30)
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Relações de bolso Segundo Jarvie (apud Bauman, 2004), as “relações de bolso” são relações práticas via celular pois você as guarda facilmente de modo a poder lançar mão delas quando achar necessário. Essas relações de bolsos são muito comuns na sociedade contemporânea, com aplicativos como o Tinder. As pessoas podem conversar a hora que preferirem e quando não quiserem mais, por algum motivo, podem guardar o celular no bolso e voltar a acessá-lo quando julgar conveniente. Para Bauman (2004, p.36), uma “relação de bolso” é a encarnação da instantaneidade mais a disponibilidade.
Não que o seu relacionamento vá adquirir essas assombrosas qualidades sem que algumas condições tenham sido previamente atendidas. Observe que é você quem deve atendê-las – outro ponto favorável a um relacionamento “de bolso”, sem dúvida, já que é você e só você que está no controle, e nele permanece por toda a curta vida dessa relação. (Bauman, 2004, p.37)
Relacionando hipotecas a relacionamentos, Bauman (2004, p. 37) diz que quanto menor a hipoteca, menos insegura a pessoa irá se
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sentir quando for exposta às flutuações do mercado imobiliário futuro, ou seja, quanto menos investir em um relacionamento, menos insegura a pessoa se sentirá quando as suas emoções futuras forem expostas. Nesse mundo líquido é exatamente isso que passa pela cabeça de várias pessoas. Os sentimentos podem mudar totalmente daqui há algum tempo então por que investir em um relacionamento sem a certeza do seu sentimento ser estável com tantas opções e diferentes pessoas para conhecer? “Assim, não deixe o relacionamento escapar à supervisão do chefe, não lhe permita desenvolver sua lógica própria e, especialmente, adquirir direito de propriedade – não deixe que caia do bolso, que é seu lugar. Fique alerta.” (Bauman, 2004, p.37) As relações de bolso agora funcionam como negócios, que são agenciados no início, e ao perceber que as coisas estão saindo de controle, ou conforme planejado, pode-se apenas descartar o outro e continuar com outra relação que se adéque às expectativas e regras do outro. Ao mesmo tempo que a pessoa não quer investir totalmente nessa relação, ela a mantém por perto por não ter certeza de como será o dia seguinte, se novas relações irão aparecer ou se vai continuar sentindo vontade de prosseguir. Como se a relação de bolso fosse sustentada por um nó, que pode ser reforçado ou afrouxado quando
for mais conveniente, e caso for necessário, o nó pode ser cortado também sem a menor dificuldade. “Mantenha o bolso livre e preparado. Logo vai precisar pôr alguma coisa nele e – cruze os dedos – você vai conseguir...” (Bauman, 2004, p.37) Romper relacionamentos supera a arte de constituir relacionamentos e mantê-los, para Bauman (2004, p.39). A maioria das pessoas não quer passar por todas as consequências de quando se rompe um relacionamento, tais como, sofrer e precisar de um tempo para se curar das feridas, afastamento de amigos, entre outros. Constituir um relacionamento exige coragem, esforço de ambos os lados, certeza do que o outro sente (que hoje, nesse mundo líquido, é mais difícil), certeza até do que a própria pessoa sente. São questões que dificultam o surgimento de relacionamentos estáveis.
ria: quem escolhe as pessoas e tem a oportunidade de convidar o outro para um encontro é o próprio usuário. Será que o aplicativo que fragiliza os laços ou são as próprias pessoas que desacostumaram a manter as relações pessoalmente. É verdade que estamos em um mundo onde as infinitas possibilidades aparecem a todo o momento mas vale das pessoas tentarem superar isso e começarem a manter os relacionamentos menos virtuais e mais pessoais. Quem sabe talvez assim, os relacionamentos ganhem forças e consigam sobreviver em meio a tantas incertezas.
As pessoas buscam “envolver-se em relacionamentos” a fim de escapar à aflição da fragilidade, só para descobrir que ela se torna ainda mais aflitiva e dolorosa do que antes. O que se propunha, ansiava, esperava ser um abrigo (talvez o abrigo) contra a fragilidade revela-se sempre como a sua estufa (Bauman 2004, p.41)
Analisando o aplicativo Tinder, muitos o apontam como um aplicativo que fragiliza os laços, porém podemos olhar o outro lado da histó-
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CAPÍTULO 4 FACEBOOK: SOBRE EXPOSIÇÃO E IDENTIDADE
Exposição e identidade
Além da linguagem e do tempo se alterarem no mundo virtual, a ideia de espaço público e privado também sofrem modificações. Essa alteração pode ser notada também nas redes sociais, onde a vida do usuário se torna parcialmente pública aos seus amigos e conhecidos. O privado que passa a ser público e a transformação do interior ao exterior são atributos da virtualização, o que antes era privado e interno, passa a ser público e externo. “Mas isto é igualmente verdade no outro sentido: quando escutamos música, olhamos um quadro ou lemos um poema, internalizamos ou privatizamos um item público”. (Lévy, 2003, p. 73). Com o surgimento das novas tecnologias, foram criadas as redes sociais, que são “[...] as estruturas dos agrupamentos humanos, constituídas pelas interações, que constroem os grupos sociais” (Recuero, 2012, p. 16).
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No Facebook, o usuário tem um perfil e escreve nele todas as suas informações. Ele pode escolher quais publicações serão visíveis e quais serão privadas, onde apenas amigos da rede poderão ter acesso. Por meio das fanpages, páginas criadas por empresas, marcas ou pessoas que tem o mesmo interesse, as pessoas podem se reunir e ter acesso à outros
perfis. Os usuários podem visualizar perfis de seus amigos, conhecidos e até desconhecidos, podendo adicionar qualquer usuário ao seu ciclo de amizade. Nota-se que Facebook alterou bastante a forma como se faz amizade hoje, pois hoje não é preciso conhecer necessariamente alguém para poder conversar. Basta ter alguns amigos em comum com alguém aparentemente desconhecido, que o convite de amizade pode ser enviado naturalmente e uma conversa iniciada em minutos. O advento das redes sociais trouxe a ideia das pessoas passarem muito tempo conectadas, compartilhando fotos que muitas vezes podem não ser reais tornando-as superficiais, e o fato das pessoas aparentemente estarem deixando de conviver com os amigos e famílias pessoalmente A campanha da Oi mostra o contrário, relatando a rotina do surfista Gabriel Medina e a sua relação com a tecnologia no cotidiano, além da opinião do jovem sobre como é estar conectado nas redes sociais.
Registrando a diversão entre amigos. Fonte: Youtube 28
Dividindo os acontecimentos. Fonte: Youtube 29
Vídeos descontraídos nas redes sociais. Fonte: Youtube 30
Compartilhando os melhores mometos. Fonte: Youtube 31
Medina começa o vídeo relatando que há pessoas que dizem que os usuários de rede social, não aproveitam a vida e não convivem com as pessoas, mas ao mesmo tempo mostra fotos provando o contrário, que ele aproveita a vida e se diverte com os amigos. O surfista diz que há pessoas que acreditam na rede social como algo que tudo é artifical, mais bonito e gostoso, mas mostra o contrário ao compartilhar fotos dele machucado, por exemplo, e de muitas pessoas desejando que ele melhore.
Medina diz que pensam que todos são mais inteligentes, mas que ele compartilha fotos dele se divertindo, sem se preocupar em mostrar inteligência ou não. O jovem encerra dizendo que as pessoas podem fazer várias coisas no dia para torná-lo mais legal, e que ele gosta de compartilhar tudo, pois gosta de ver o que os amigos dele estão compartilhando e diz que a vida está aí para ser curtida, ou seja, a redes social é uma forma de aproximar as pessoas e permitir que cada um possa saber o que o outro está fazendo.
28 - http://bit.ly/1NCC4gi. 29 - Idem. 30 - Idem. 31 - Idem
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O Facebook permite que as pessoas possam se informar sobre diversos assuntos, de lugares e pessoas diferentes, porém, segundo a ilustração abaixo de Pawel Kuczynski, ele critica o uso da rede social para aqueles que deixam de observar o mundo afora e se importam em observá-lo apenas em partes pelo Facebook, deixando assim de aprender mais do que poderiam.
Vendo o mundo por meio do Facebook. Fonte: Designerd 32
56 32 - http://bit.ly/1oySKEc. 33 - Idem
Kuczynski critica também em outra ilustração o fato das pessoas usarem as redes sociais como uma espécie de confessionário, onde compartilham todas as idéias e sentimentos tornando-as públicos, sejam eles de felicidade, raiva ou tristeza, como se fosse um diário onde todos podem ler, curtir e comentar o texto ou foto compartilhada. A exposição nas redes sociais muitas vezes deixa de ter um filtro, do que deveria ou não estar sendo exposto, deixando a vida do usuário totalmente exposta.
Uso do Facebook como diário pessoal. Fonte: Designerd 33
O ego no Facebook Por meio das interações, publicações, comentários, fanpages e outras ferramentas do Facebook, os usuários começam a construir o “seu eu”, que pode ser moldado e exposto aos outros, assim como, os perfis e identidades das outras pessoas também são expostas ao usuário. A partir do momento que alguém compartilha um texto, música, foto e pensamento, o “eu” do usuário é construído aos poucos, podendo receber curtidas e comentários de terceiros que aprovam ou não a postagem. Pode-se dizer que as pessoas também moldam a sua identidade por meio do Facebook, pois as postagens podem ser construídas a fim de serem aceitas pelos outros e parecerem interessantes de acordo com os ideais de outros usuários. É muito comum que as pessoas postem fotos, ideias e compartilhem assuntos variados no Facebook, e a partir dessa exposição, outros usuários podem visualizar e curtir a foto ou ideia. Há fotos que chegam a dez curtidas, ou outras que chegam a 500. E de certa forma os likes, ou as curtidas, constroem e mantém o ego do indivíduo. É como se as pessoas sentissem necessidades de serem aprovadas nesse mundo virtual e por meio dos likes é possível saber o quanto popular um usuário é em sua rede de amigos. Há quem poste fotos
34 - http://bit.ly/1kiQHtJ
justamente para obter o máximo de curtidas possíveis, pois ao ver que várias curtidas e comentários surge um sentimento de felicidade e aprovação, e esse ciclo de postar e esperar curtidas nunca acaba, pelo contrário, o ego sempre irá querer mais e mais. Nesse mundo de exposição, há aqueles que se sujeitam a postar fotos provocativas afim de chamarem o máximo de atenção possível. Até a popularidade que antigamente era reconhecida na escola como aquele que mais tinha amigos e era reconhecida também acontece no mundo virtual, no qual o usuário com mais de mil amigos, sejam eles conhecidos ou não, passa uma imagem de popularidade alta, e quanto mais “amigos”, mais curtidas a foto ou o post em si recebe.
Quanto mais likes, maior o ego. Fonte: Blog O Povo 34
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No Facebook, a identidade também pode ser modificada, por meio de uma foto postada, a pessoa pode passar a imagem de alguém que ela não é, ou simplesmente postar uma foto montada na hora para mostrar algo que está fazendo, quando na verdade não está.
A ilustração seguinte mostra a diferença entre como os aniversários eram antigamente e como são hoje, no primeiro quadro mostra amigos se divertindo e o aniversariante dizendo “Olha todos esses presentes!”, empolgado também com a presença dos amigos. No segundo quadro mostra o aniversariante dizendo “Olha todas essas notificações...”, aparentemente não tão feliz e sem nenhum amigo por perto, pois as situações do cotidano mudaram bastante com o mundo virtual. Antigamente as pessoas recebiam telefonemas de várias pessoas, hoje recebem principalmente muitas notificações, não só de amigos, mas tabém de conhecidos que estão nas redes sociais.
meiro desenho mostra a foto da versão do indivíduo na rede social, que é imaginária ou montada pela própria pessoa, já no segundo desenho, mostra como será a versão real da pessoa, mostrando justamente como uma rede social pode maquiar a imagem de
No mundo virtual a identidade também pode ser moldada, na ilustração seguinte é possível notar a brincadeira feita com a construção da identidade que o Facebook pode permitir, no primeiro desenho mostra a foto da versão do indivíduo na rede social, que é imaginária ou montada pela própria pessoa, já no segundo desenho, mostra como será a versão real da pessoa, mostrando justamente como uma rede social pode maquiar a imagem de alguém e transformar a identidade em algo mutável a partir da vontade do indivíduo.
Aniversário antes e agora. Fonte: 9GAG 35
alguém e transformar a identidade em algo mutável a partir da vontade do indivíduo. Essa busca pela identidade perfeita pode até ocasionar em problemas identitários, onde a pessoa deixa de se conhecer e foge da sua identidade real, mostrando ser alguém que não é.
Versão real e virtual por meio do Facebook. Fonte: Equilibio.net 36
No mundo virtual a identidade também pode ser moldada, na ilustração é possível notar a brincadeira feita com a construção da identidade que o Facebook pode permitir, no pri-
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59 35 - http://bit.ly/1QcCZWf
36 - http://bit.ly/1WK56eg
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O surgimento do mundo virtual e o advento das TIC’s trouxeram de fato muitas vantagens e permitiram à sociedade ter acesso a uma infinidade de informações, como também aproximou pessoas que estavam longe geograficamente. Infelizmente para grande parte da sociedade provocou o afastamento entre as pessoas próximas tornando algumas até solitárias por estarem tão preocupadas com seus smartphones, tablets ou qualquer outra tecnologia. No mundo virtual a maioria das coisas acontece de uma melhor forma, a velocidade a qual se pode interagir com alguém, pesquisar algum assunto, ler matérias, estar por dentro de todas as novidades que acontecem no mundo e na vida dos que estão ao redor faz com que quase todo assunto possa ser resolvido por meio de um smartphones. O tempo no mundo virtual é ágil e se difere totalmente do tempo no mundo físico, provocando ansiedade em massa na sociedade, fazendo com que todos levem seus smartphones consigo como se fizesse parte do corpo, tornando-os dependentes e fazendo com que não consigam deixar de checar cada notificação nova no celular. Estamos vivendo a era do imediatismo onde tudo precisa acontecer agora. Para observar todas as mudanças causadas na sociedade, basta passar um tempo em trens, metrôs, no trânsito, em bares e baladas
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e até mesmo em reuniões familiares ou dentro de casa. O comportamento das pessoas foi modificado com o uso excessivo dessas tecnologias. Todos parecem estar sozinhos, envoltos de uma bolha que os separa do mundo físico, onde podem criar virtualmente o mundo ideal como uma forma de fuga da realidade física. As interações virtuais estão cada vez mais rápidas e as pessoais cada vez mais escassas e banais. As próximas gerações provavelmente serão de pessoas (mais) distantes, frias e isoladas pois as pessoas não estão se preocupando com esse distanciamento, parecem até preferir o mundo virtual. O surgimento dos aplicativos sociais também impactam significamente para os distanciamento entre as pessoas. Há aplicativos por exemplo que permitem a paquera virtual, fragilizando os relacionamentos e tornando-os desgastados pois permitem que as pessoas conheçam uma infinidade de possibilidades amorosas, fazendo com que percam o interesse em manter alguma relação sólida. As pessoas também estão desaprendendo a se relacionar pessoalmente pois vivem vidradas nos seus smartphones, deixando de aproveitar cada momento. Não só o comportamento foi modificado, como também as identidades. As redes sociais por exemplo permitem ao usuário moldar a sua identidade e muitas vezes mostrar ser alguém que não é simplesmente para mostrar
o que as pessoas gostariam de ver, buscando uma forma de aceitação e engrandecimento do ego. Hoje, basta enviar uma mensagem para falar com alguém, pode-se comprar uma diversidade de coisas e basicamente resolver várias questões da vida pela internet. Será que chegaremos a um ponto em que as pessoas não sairão mais de casa? Observando a maneira a qual as coisas estão funcionando agora, não é algo difícil de acontecer, para se divertir, por exemplo, os jovens estão deixando de sair para ficarem em casa jogando videogames. A geração atual já não sabe o que é brincar na rua. Se a tecnologia continuar evoluindo do jeito que está e as pessoas continuarem a interagir pessoalmente cada vez menos, a sociedade pode aguardar uma geração de pessoas que não conseguirá ou não saberá se relacionar no mundo físico. As pessoas serão frustradas e inseguras tanto na vida pessoal quanto profissional por terem dificuldade de entender sua identidade, tal como o medo de viverem em um mundo que pode se tornar mais líquido ainda, onde as coisas serão feitas para não durar. Vivemos cada vez mais sozinhos e só caberá a nós mesmos conseguir reverter essa situação. A dúvida é: será que realmente queremos reverter isso?
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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