51 minute read
Sumário
from DIGNUS nº1
by cie
NESTA EDIÇÃO
REPORTAGEM “Fazemos das emoções as ferramentas diárias do nosso trabalho” Centro Comunitário da Gafanha do Carmo
Advertisement
P.45 DOSSIER SOBRE ENVELHECIMENTO ATIVO Envelhecimento x Longevidade: O que nos faz feliz?
P.23 MENTE ATIVA CORPO ATIVO Hidroginástica e os seus benefícios na Terceira Idade
P.30
ÍNDICE
02 Editorial Nasceu a DIGNUS
03 Nota do Editor O Esquiço virou Obra!
04 Espaço ERPIS O papel do Centro de Dia na ocupação dos utentes: Boas práticas (1.ª Parte)
07 Espaço Associação Nacional de Cuidadores Informais Cuidar de quem cuida
08 Espaço Associação Coração Amarelo Associação Coração Amarelo inicia uma parceria com a revista Dignus
09 Espaço RUTIS Universidades Seniores: O impacto na vida dos mais velhos
11 A Voz de 11 José Manuel Silva - Caregivers Portugal 12 Carla Ribeirinho - [Trans]formação dos profissionais na área do envelhecimento: Desafios e oportunidades
16 Dossier sobre Envelhecimento Ativo 16 Envelhecimento activo… Envelhecimento saudável 18 Sarcopenia: envelhecimento e exercícios físicos para uma longevidade mais saudável 20 Velhices LGBT: Desafios para o envelhecimento ativo 23 Envelhecimento x Longevidade: O que nos faz feliz?
26 Mente Ativa Corpo Ativo 26 Envelhecimento saudável: Intervenções para prevenção do declínio cognitivo e demência 29 Memória & Animação Terapêutica: Não deixar o cérebro “enferrujar” 30 Hidroginástica e os seus benefícios na Terceira Idade 32 Envelhecer de forma ativa musicando com arte 34 Envelhecimento ativo e a música 36 Especialidades Médicas 36 Envelhecimento saudável: Fatores de risco para o declínio cognitivo e demência 38 O papel do Médico de Família na demência: Prevenir antes de diagnosticar 40 Psicologia e Pós Geronto: A união que deu certo sob o olhar de quem faz 42 Geriatria e Gerontologia: Alguns conhecimentos médicos pessoais no tratamento de idosos 44 Odontogeriatria: O avanço da medicina dentária em resposta ao envelhecimento ativo
45 Reportagem 45 Centro Comunitário da Gafanha do Carmo: “Fazemos das emoções as ferramentas diárias do nosso trabalho” 47 4.º Congresso Nacional “Voz aos Cuidadores”: “O cuidador tem a capacidade de nos tirar da solidão”
50 Entrevista José Eduardo Pinto da Costa: “Quando tinha 20 anos corria para apanhar o autocarro, hoje não corro, mas faço exatamente o mesmo percurso”
54 Case Study 54 Envelhecimento ativo versus Demência 56 A importância de reabilitar em casa 57 “O Cuidador, EU”
58 Turismo Sénior e Lazer Viagens de proximidade e o território da saudade
60 E Depois A vivência da perda do cônjuge na Terceira Idade: Algumas reflexões
62 Notícias
69 Atividades 69 Atividades 70 Importância dos jogos cognitivos aplicados aos Idosos
Cláudia Guedes da Costa Diretora
Nasceu a DIGNUS
Caríssimo leitor,
Queremos dignificar o envelhecimento! Nasceu a DIGNUS.
Esta revista resulta da reflexão que se tem realizado sobre o envelhecimento e as distintas consequências no idoso, no cuidador e sobretudo na ausência de informação específica reunida numa só revista.
A amplificação da longevidade desafia um olhar multidisciplinar constituindo um universo heterogéneo, no qual a geriatria e a gerontologia assumem um papel predominante. Discorrer sobre a inveteração é algo que nos remete para uma reflexão profícua sobre nós mesmos onde teremos que dar um novo significado ao envelhecimento.
Envelhecemos desde que nascemos. Biologicamente interpretado como envelhecimento celular e aparecimento de transtornos de saúde que, por sua vez, fazem diminuir as probabilidades de sobrevivência à medida que a idade avança. O ritmo de declínio das funções orgânicas varia não só de órgão para órgão, como também entre pessoas da mesma idade. Estamos perante a senescência.
A degenerescência social traduz uma mutação no status do idoso e no relacionamento dele com a sociedade. A crise de identidade, a passagem à reforma, a mudança de papéis, a diminuição dos contactos sociais e as diversas perdas levam-nos à reflexão sobre as consequências sociais do envelhecimento.
A falta de motivação, a dificuldade em planear o futuro, a necessidade de limar as perdas orgânicas, afetivas e sociais, a adesão a tratamentos de doenças neurodegenerativas, a diminuição da autoestima e da imagem corporal e as doenças mentais são o corolário da degenerescência psicológica. A habilitação para o futuro é imperativa, pois esse futuro também nos pertence.
Estaremos perante o desmoronamento de um modelo de proteção social? Como podemos contribuir para a independência biopsicossocial à medida que envelhecemos?
De que forma a qualidade de vida pode ser potenciada? Em que medida se pode harmonizar o papel da família e do Estado relativamente à assistência dos idosos? A sageza impera! A desconceitualização de estereótipos associados ao envelhecimento e o conceito de envelhecimento ativo, tema deste primeiro número, assumem empoderamento.
Então, caríssimo leitor, bem-vindo à revolução da longevidade. Termino com votos de uma agradável leitura e com uma pirrónica: envelhecer ativamente significa olhar para o passado com os olhos do presente ou vice-versa?
FICHA TÉCNICA
DIGNUS 01 2.º trimestre
DIRETORA Cláudia Guedes da Costa · claudia.dignus@gmail.com
CONSELHO EDITORIAL Ana Araújo, Ana Isabel Martins, Ana Monteiro, António Palha, Carlos Wehdorn, Cláudia Moura, Elisa Serôdio, Filipa Menezes, Helena Costa, Horácio Firmino, Ilda Gois, Janinéri Cordeiro, Joana Monteiro, Joana Sousa, José Manuel Silva, José Reis, Luís Jacob, Madalena Pinto, Manuel Viana, Márcio Vara, Margarida G. Resende, Ricardo Pocinho, Sandra Penêda Patrício, Sérgio Ferreira
CORPO EDITORIAL Diretor Executivo: Júlio Almeida T. +351 225 899 626 · julio.almeida@dignus.pt Marketing: André Manuel Mendes T. +351 225 933 964 · redacao@dignus.pt Redação: Helena Paulino T. +351 220 933 964 · redacao@dignus.pt
DESIGN E WEBDESIGN Ana Pereira · a.pereira@cie-comunicacao.pt · T. +351 225 934 633
ASSINATURAS T. +351 220 104 872 · assinaturas@booki.pt · www.booki.pt
COLABORAÇÃO REDATORIAL Cláudia Guedes da Costa, Júlio Almeida, Mónica Teixeira, Ana Soares, Catarina Teixeira, Isabel Marques, Sandra Mourinha, Luís Jacob, José Manuel Silva, Carla Ribeirinho, Joana Rodrigues de Sousa, Ivan de Oliveira, Alfredo Villardi, Diego F. Miguel, Milton R. F. Crenitte, Janinéri Cordeiro, Ana Monteiro, Bruno Trindade, Ricardo Pocinho, Pedro Miguel Neves, Miguel Rivotti, Patrícia Dias, Madalena Pinto, Elisa Serôdio, Francisco F. F. de Oliveira, Glauco de Lorenzi, Filipa Meneses, Catarina Leandro, Sandra Penêda Patrício, António Marques, Patrícia Protásio, Patrícia Valente, Carlos Wehdorn, Rui Ribeiro, Anderson Amaral, Adriana Limeira, Juliana Ohy
PROPRIEDADE, REDAÇÃO E EDIÇÃO
CIE - Comunicação e Imprensa Especializada, Lda. ®
Empresa jornalística Reg. n.º 223992 NIPC: 509 870 104 Grupo Publindústria Praça da Corujeira, 38 Apartado 3825, 4300-144 Porto T. +351 225 899 626/8 geral@cie-comunicacao.pt · www.cie-comunicacao.pt
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO Júlio Almeida, António Malheiro e Publindústria – Produção de Comunicação, Lda.
PUBLICAÇÃO PERIÓDICA Registo n.º 127253 Tiragem: 5000 exemplares Periodicidade: Trimestral INPI: Registo n.º 602419
IMPRESSÃO E ACABAMENTO acd print Rua Marquesa d´Alorna, 12 A | Bons Dias, 2620-271 Ramada
Estatuto editorial disponível em www.dignus.pt
O Esquiço virou Obra!
Júlio Almeida Diretor Executivo e Editor
Nota: Texto escrito de acordo
com a antiga ortografia
Passado sensivelmente um ano, eis que surge a revista Dignus, a primeira revista técnica na área da Geriatria e Gerontologia.
Pretendemos com esta publicação preencher algumas lacunas e mitos que existem em torno do envelhecimento saudável e activo, dando voz aos Cuidadores Formais e Informais, assim como a um conjunto alargado de especialidades médicas, que interagem com esta realidade. A Dignus é um projecto inclusivo, 360º graus, transversal desde os cuidadores até ao idoso e vice-versa.
Para nós CIE – COMUNICAÇÃO E IMPRENSA ESPECIALIZADA, Lda., trata-se de um projecto fora da caixa, completamente arrojado, que nos obrigou a alargar os nossos horizontes e capacidade critica.
Deixo um desafio às empresas e instituições que diariamente lidam com a questão do envelhecimento, para que participem de forma activa e crítica na Dignus.
Não posso deixar de agradecer à minha equipa, que desde o primeiro momento aceitou este desafio, como sendo seu, acrescentando uma experiência, know-how e capacidade crítica que muito engrandeceu a Dignus!
Ao conselho editorial e a todos os colaboradores da primeira edição, a minha gratidão eterna, sem eles o projecto não ganhava forma.
Last but not the least, um agradecimento sentido à Directora da revista Dignus, Dra. Cláudia Costa Guedes, que desde o primeiro momento me ouviu e abraçou sem restrições o projecto.
Certos de que deixamos uma pegada positiva em torno do envelhecimento, espero por todos vós na próxima edição!
ESTATUTO EDITORIAL
TÍTULO “DIGNUS – Revista Técnica de Geriatria e Gerontologia”
OBJETO Informação e tecnologias direcionadas a todos os interlocutores na área da Geriatria e Gerontologia, sejam eles os cuidadores, idosos, pessoal médico, técnicos, psicólogos, instituições e empresas.
OBJETIVO Difundir informação, tecnologias, produtos e serviços para a valorização pessoal e profissional de todos os afetos às áreas em questão.
ENQUADRAMENTO FORMAL A revista “DIGNUS – Revista Técnica de Geriatria e Gerontologia” respeita os princípios deontológicos da imprensa e a ética profissional, de modo a não poder prosseguir apenas fins comerciais, nem abusar da boa-fé dos leitores, encobrindo ou deturpando informação.
CARATERIZAÇÃO Publicação periódica especializada.
ESTRUTURA REDATORIAL Diretor – Profissional com experiência na área da formação. Coordenador Editorial – Formação académica em ramo da geriatria afim ao objeto da revista. Colaboradores - Profissionais e técnicos que exerçam a sua atividade no âmbito do objeto editorial, instituições de formação e organismos profissionais.
SELEÇÃO DE CONTEÚDOS A seleção de conteúdos tecnológicos é da exclusiva responsabilidade do Diretor. O noticiário técnico-informativo é proposto pelo Coordenador Editorial. A revista poderá publicar peças noticiosas com caráter publicitário nas seguintes condições: » Com o título de Publi-Reportagem; » Formato de notícia com a aposição no texto do termo Publicidade.
ORGANIZAÇÃO EDITORIAL Sem prejuízo de novas áreas temáticas que venham a ser consideradas, a estrutura de base da organização editorial da revista compreende:
Sumário Editorial Nutrição Espaço Opinião Educação Física e Desporto – Ser idoso não significa ser sedentário. Consultório Técnico Turismo Sénior e Lazer Bem-estar Espaço ERPIS Notícias Reportagens Entrevistas Dossiers temáticos
Legislação Casos de estudo Mercado Informação Técnico-Comercial Espaço Dignus – Espaço do leitor Figuras e instituições em destaque Bibliografia Calendário de eventos e formação Passatempos Publicidade
ESPAÇO PUBLICITÁRIO A Publicidade organiza-se por espaços de páginas e frações, encartes e Publi-Reportagens. A Tabela de Publicidade é válida para o espaço económico europeu. A percentagem de Espaço Publicitário não poderá exceder 1/3 da paginação. A direção da revista poderá recusar Publicidade cuja mensagem não se coadune com o seu objeto editorial. Não será aceite Publicidade que não esteja em conformidade com a lei geral do exercício da atividade.
PROTOCOLOS Os acordos protocolares com estruturas profissionais, empresariais e sindicais, visam exclusivamente o aprofundamento de conteúdos e de divulgação da revista junto dos seus associados.
O papel do Centro de Dia na ocupação dos utentes
Boas práticas » 1.ª Parte
1 Mónica Teixeira, 2 Ana Soares e 3 Catarina Teixeira
1 Diretora de serviços do Centro de Apoio Social
de Vila Nova de Monsarros
2 Equipa técnica do Centro de Apoio Social
de Vila Nova de Monsarros
3 Gerontóloga
O Centro de Dia em Portugal permite ao indivíduo a permanência no seu contexto comunitário através da disponibilização de serviços diversificados. Destes a ocupação é o tema central em análise, tendo a resposta social um papel primordial na sua realização. Assim, aborda-se a temática da planificação de atividades e monitorização das mesmas nas vertentes: anual, mensal, semanal, diária e individual e coletiva, através de exemplos práticos e experienciados no Centro de Dia em análise.
Introdução O Centro de Dia em Portugal apresenta-se, na atualidade, como uma resposta social, desenvolvida em equipamento, que se fundamenta na prestação de um conjunto de serviços que contribuem para a manutenção do indivíduo no seu meio sociofamiliar. A resposta disponibiliza, aos seus utentes, uma diversidade de serviços tais como refeições, convívio/ocupação, cuidados de higiene, tratamento de roupa e férias organizadas (Bonfim & Saraiva, 1996). O tema central explorado no presente trabalho é o funcionamento do serviço de ocupação num Centro de Dia. Deste modo, os autores, através da sua experiência empírica, descrevem as suas práticas diárias num Centro de Dia dimensionado para 30 utentes, integrado em meio rural, situado na beira litoral e que se encontra acoplado a outras respostas sociais direcionadas à Terceira Idade e outras direcionadas à infância.
O trabalho em causa pretende dar a conhecer, de forma despretensiosa, as boas práticas realizadas ao nível da ocupação dos mais velhos para que possam ser replicadas em Centros de Dia similares.
Deste modo, o presente artigo divide-se em duas partes: a primeira delimita de modo concetual o modelo de Centro de Dia existente em Portugal e uma segunda parte na qual são exploradas aprofundadamente experiências empíricas ao nível da ocupação com idosos. Assim, a segunda parte foca-se na planificação e execução de atividades em Centro de Dia. A planificação engloba a metodologia usada para estruturar atividades de ocupação nas amplitudes: anual, mensal, semanal, diária e individual e coletiva assim como a sua monitorização. No que concerne à execução foram elencados exemplos práticos experimentados no contexto prático em análise, nas mesmas amplitudes da planificação.
Por fim, no último ponto, serão realizadas algumas considerações centrais sobre a importância do Centro de Dia na dinamização da ocupação dos utentes/utilizadores da resposta social.
Centro de dia em Portugal uma abordagem concetual
Definição e objetivos do Centro de Dia Centro de Dia surge, em Portugal, como estrutura comunitária e implanta-se progressivamente a partir da década de 70 (Serdi, 1975). Apresenta como objetivo inicial a rentabilização dos recursos existentes na comunidade, de modo a satisfazer as necessidades dos indivíduos. Deste modo, o Centro de Dia começa por se definir como um “conjunto de serviços no qual e/ou pelo qual, são organizadas atividades agrupadas que permitem às pessoas conservarem-se no seu meio familiar e social” (Serdi, 1975). Esta primeira definição foca
© Pixabay
se essencialmente, no nosso entender, numa ideia basilar que os cuidados podem ser prestados aos indivíduos sem os retirar do contexto em que vivem, isto é, da sua comunidade. Nos anos 90 uma nova tentativa de definição de Centro de Dia, mais abrangente que a anterior e na qual o Centro de Dia é entendido como uma resposta social, desenvolvida em equipamento que se fundamenta na prestação de um conjunto de serviços que contribuem para a manutenção do indivíduo no seu meio sociofamiliar (Bonfim & Saraiva, 1996).
Para além destas não se evidenciaram na literatura nacional outras tentativas de definição da resposta, no entanto, Quaresma (1996) reforça as definições anteriores, apresentando, de um modo concreto e operacional, os objetivos do Centro de Dia. O aconselhamento individual é um destes e traduz-se no acolhimento e informação necessários ao utente. Salienta-se igualmente a importância da ajuda na readaptação individual, que se baseia em apoiar o idoso a fazer, de forma satisfatória, os reajustamentos necessários à aceitação dos seus próprios condicionalismos. O incentivo e a implementação de ações diversificadas que promovam as relações interpessoais dos idosos entre si e, destes, com outros grupos etários a fim de evitar o isolamento. O favorecimento ao acesso das pessoas mais velhas às diversas formas de ajuda adequadas à sua situação, que não se encontrem acessíveis na comunidade local e se situem no âmbito deste tipo de equipamento. O autor destaca ainda a deteção e análise das necessidades dos idosos, com vista ao planeamento dos serviços. Por fim, acrescenta como objetivo de intervenção, ainda que indiretamente, o apoio aos Cuidadores Informais. Deste modo, no nosso entender, o autor apresenta os objetivos do Centro de Dia em dois prismas diferenciados: um restrito (individual) e um alargado (cuidadores). Estudos internacionais vão de encontro às ideias elencadas anteriormente. Assim sendo destacamos que o estudo de Arrazola et al. (2003) atribui ao Centro de Dia os seguintes propósitos: oferecer aos seus utilizadores um ambiente protetor de modo a prevenir e responder às necessidades básicas; fomentar a manutenção do grau de autonomia através da estimulação e reeducação das atividades de vida diária (AVD´s); atrasar a institucionalização através da coordenação de recursos existentes; controlar e promover a saúde dos utilizadores através de ações que conduzam a esse propósito, e por fim, estimular as pessoas à participação em atividades individuais e coletivas evitando a inatividade e o isolamento. O Centro de Dia revela ser, ainda segundo Rodriguez e Rodriguez (2007), uma alternativa adequada para o aumento da qualidade de vida do núcleo familiar no qual vive uma pessoa dependente, uma vez que o mesmo, ao disponibilizar uma resposta integral e terapêutica, apoia e alivia a família cuidadora. Apresenta-se, deste modo, o Centro de Dia como uma estrutura de referência “formativa e informativa” com o fim de apoiar as famílias nas
© Matthias Zomer
tarefas de cuidado, assim como na prevenção e resolução de conflitos que se poderão originar no núcleo familiar decorrentes da permanência da pessoa com dependência.
Modelos de funcionamento A implantação inicial do Centro de Dia teve subjacentes duas estratégias principais: a criação da resposta integrada num equipamento já existente ou a criação de uma estrutura autónoma, tendo por base o levantamento das necessidades da população de uma determinada área (Serdi, 1975). Deste modo, o Centro de Dia pôde desenvolver a sua intervenção em espaço próprio e de funcionamento independente ou surgir integrado numa estrutura existente quer esta seja lar de idosos, centro comunitário ou outra (Bonfim & Saraiva, 1996). Terá sido, no nosso entender, a partir desta dualidade de organização que poderemos tentar definir dois modelos de funcionamento que se baseiam nos recursos existentes decorrentes da agregação ou não do Centro de Dia a outra estrutura (ou estruturas) já existente e em atividade. Em virtude disso, expomos como modelos de funcionamento de Centro de Dia em Portugal os seguintes: o Centro de Dia “Isolado”, o Centro de Dia “Agrupado” e o mais recente o modelo de Centro de Dia para “Doentes de Alzheimer”. Este último modelo nasce como resultado do trabalho desenvolvido pela Alzheimer Portugal que, em 2003, implementa o primeiro Centro de Dia dirigido unicamente para pessoas com demência (Alzheimer Portugal, 2009). Um estudo efetuado pelo Instituto da Segurança Social, IP (Gil & Mendes, 2005), sobre a situação social dos doentes de Alzheimer em Portugal, revela que a população auscultada considera haver uma total desadequação das estruturas existentes (entre as quais o Centro de Dia) às particularidades da demência, reforçando, deste modo, o movimento associativo responsável pela promoção e desenvolvimento da resposta social direcionada para a demência.
Serviços disponibilizados pelo Centro de Dia aos utentes No desenvolvimento inicial do Centro de Dia, a resposta social disponibiliza uma diversidade de serviços que foram sendo ajustados e readaptados ao longo da sua implantação e desenvolvimento. O manual de instalação (Serdi, 1975) integra como áreas de apoio a prestar pelo centro as seguintes: tempos livres e convívio, alimentação, ocupação, balneário, tratamento de roupa, cuidados de saúde, ajuda doméstica e preparação para a reforma. Os serviços referidos poderão ser desenvolvidos nas instalações da resposta social, no domicílio dos utentes ou em outras estruturas presentes na comunidade em que está integrado. O serviço de alimentação divide-se em três vertentes de apoio das quais fazem parte o fornecimento de refeições confecionadas em local adequado (inclui instalações do centro ou outras existentes na comunidade); fornecimento de refeições confecionadas no domicílio; e a distribuição de géneros alimentares aos utilizadores. O serviço de balneário engloba, para além da higiene corporal, os cuidados de mãos, pés e cabelos, podendo ser
integrado o seu funcionamento em estruturas da comunidade. O serviço de saúde, prestado por estrutura implantada na comunidade, assenta a sua intervenção nas áreas preventivas, curativas e de reabilitação, podendo a intervenção ser extensível ao domicílio dos utentes. O serviço de auxílio doméstico efetua-se no domicílio dos utentes e inclui as seguintes tarefas: higiene e conforto, trabalhos de limpeza e arrumação, aquisição de géneros alimentícios e/ou outros artigos, preparação de refeições e tratamento de roupa (desenvolvido nas instalações do Centro de Dia, estrutura da comunidade). Salientamos por fim, que o documento de criação e instauração do Centro de Dia pressupõe, ainda, uma flexibilização no desenvolvimento e planeamento da resposta e dos serviços disponibilizados de acordo com as solicitações dos utentes. De acordo com Quaresma (1996) foi realizada em Portugal uma primeira avaliação referente à resposta social que incidiu sobre a relação entre os serviços disponibilizados pelo Centro de Dia e as necessidades sentidas pelos indivíduos que o frequentam. Esta avaliação permitiu verificar o elevado grau de satisfação dos utilizadores, o reconhecimento dos serviços mais importantes e úteis desenvolvidos pela resposta (refeição, lavandaria e apoio ao domicílio).
Marcadamente de âmbito social, o Centro de Dia contemporâneo, em Portugal, tende a disponibilizar (Bonfim e Saraiva, 1996) como serviços base: refeições, convívio/ocupação, cuidados de higiene, tratamento de roupa e férias organizadas. No entanto, a oferta tende a depender de fatores externos, como por exemplo, os centros localizados em meios rurais dispõem de um orçamento mais reduzido e, consequentemente, menos pessoal e atividades; por sua vez o Centro de Dia implantado em centro urbano é condicionado pela área em que se insere e pela possibilidade de trabalhar com parceiros (Martin et al., 2007). Neste âmbito, Quaresma (1996) considera que a implantação da resposta social deverá ter em consideração a área de localização e a população a quem se dirige. Deste modo, considera relevante a localização dos centros em áreas onde a densidade da população idosa seja significativa e, tal como defendem os estudos internacionais, salienta a necessária análise das especificidades da população a ser apoiada pela resposta.
Ocupação de idosos em período diurno em Centro de Dia A integração dos indivíduos em contexto institucional conduz inevitavelmente a uma alteração na sua rotina pessoal. As instituições disponibilizam aos seus utentes uma panóplia de serviços diários que permitem aos indivíduos e suas famílias a satisfação das suas necessidades através da prestação dos mesmos. Tal como referenciámos anteriormente o modelo de Centro de Dia português disponibiliza aos seus utentes refeições, cuidados de higiene, tratamento de roupa, férias organizadas e convívio/ocupação (Bonfim e Saraiva, 1996). No que concerne à ocupação em Centro de Dia, a promoção de atividades apre
© millionairessaying
senta-se como tema central do presente trabalho, uma vez que de acordo com a experiência empírica dos autores, a ocupação oferece aos idosos oportunidades de participação em diversas atividades com diferentes objetivos. Permitindo, deste modo, aos utentes da resposta social que, durante período de utilização da mesma, estejam integrados numa dinâmica individual ou numa coletiva. Esta operacionaliza-se através da realização de atividades diárias prazenteiras e que contribuam para o bem-estar do idoso. Neste âmbito, de acordo com Martins (2010), sobretudo na Terceira Idade há a necessidade de manutenção dos interesses ocupacionais dos indivíduos, assim como, o aumento das atividades recreativas de modo a que se ocupe na totalidade o tempo, tornando esta fase da vida satisfatória e produtiva. Os programas de ocupação promovidos em ambiente institucional vão de encontro a este pressuposto uma vez que, permitem, no nosso entender, o desenvolvimento de ações de cariz recreativo, educativo, cultural e social dirigidas aos utilizadores. Benet (2002) ao analisar as atividades socioculturais desenvolvidas num Centro de Dia verificou que estas se limitavam a oficinas de trabalhos manuais, jogos de mesa e celebrações festivas. Neste sentido, o mesmo autor, destaca na sua investigação a necessidade de mudança nesta área de intervenção, considerando pertinente que a dinamização de atividades pelos utentes, contemple uma avaliação dos interesses dos mesmos, as aspirações e capacidades dos indivíduos.
Referências bibliográficas 1. Alzheimer Portugal. (2009). Plano Nacional de Intervenção Alzheimer: Trabalho Preparatório para a conferência Doença de Alzheimer: Que Políticas?. Lisboa. 2. Arrazola, F.J., Méndez, A. U. & Lezaun, J. J. (2003). Centros de Día: Atención e Intervención Integral para Personas e Mayores Dependientes e con Deterioro Cognitivo. Departamento de Servicios Sociales: Fundación Natía Gizartekintza. 3. Benet, A. S. (2002). La dinamización sociocultural en los centros de día para mayores. Nuevas perspectivas en el trabajo socioeducativo con personas mayores. Educación social. Revista d’intervención socioeducativa, (22), 97-110. 4. Bonfim, C. J., Teles, M. A. C., Saraiva, M. E. & Cadete, M. H. (1996). A População Idosa, Análise e Perspectivas - A Problemática dos Cuidados Intra familiares. Lisboa: Direcção Geral da Acção Social - Núcleo de Documentação Técnica e Divulgação. 5. Bonfim, C. J. & Saraiva, M. E. (1996). Centro de Dia (Condições de localização, instalação e funcionamento). Lisboa: Direcção Geral de Acção Social. 6. Equipa Técnica do SERDI, Conselho Técnico criado por despacho do secretário de Estado da Segurança Social de 29/12/75. (1976). Centros de Dia. Serviço de Reabilitação e Protecção aos Diminuídos e Idosos. Lisboa. 7. Gil, A. & Mendes, A. (2005). Situação Social dos Doentes de Alzheimer: um estudo exploratório. Fundação Montepio Geral e Instituto da Segurança Social, I.P. 8. Martín, I., Gonçalves, D., Paúl, C. & Pinto, F. (2007). Políticas Sociais para a Terceira Idade. In A. R. Osório & F. C. Pinto (Eds.), As pessoas idosas - contexto social e intervenção educativa. Lisboa: Instituto Piaget - Colecção Horizontes Pedagógicos. 9. Martins, R. (2010). Os Idosos e as Atividades de Lazer. Educação Ciência e Tecnologia, Revista do ISPV, (38), 243-251. Retrieved from www.ipv.pt/millenium 10. Quaresma, M. L. (1996). Cuidados Familiares às Pessoas muito Idosas. Lisboa: Direcção Geral da Acção Social - Núcleo de Documentação Técnica e Divulgação. 11. Rodriguez, M. T. M. & Rodriguez, P. (2007). Centro de Día para Personas Mayores con Dependencias. Gobierno del Principado das Asturias e Consejería de Asuntos Sociales.
Cuidar de quem cuida
Isabel Marques Representante no Norte da ANCI
A Associação Nacional de Cuidadores Informais – Panóplia de Heróis (ANCI) registada em 13 de junho de 2018 é fruto da luta de muitos Cuidadores Informais, unidos por uma causa: dar voz e dignificar o Cuidador Informal. Num espaço de pouco mais de dois anos fizeram-se encontros a nível nacional onde se foram dando passos importantes de proximidade com a sociedade civil e política.
Por várias vezes viemos para a rua, cuidadores e ex-cuidadores, familiares e amigos de pessoas das mais diversas patologias, alertar para esta realidade. A 12 de outubro de 2016, um grupo de Cuidadores Informais entregou a petição pela criação do Estatuto do Cuidador Informal, com cerca de 14 000 assinaturas online e em papel. Existem em Portugal cerca de 800 000 Cuidadores Informais. Homens e mulheres que se dedicam a tempo inteiro, ou parcialmente, a cuidar de um familiar ou vizinho que por situação de doença crónica, deficiência ou dependência, depende de outro para as suas tarefas diárias. Em Portugal estima-se que esse trabalho não reconhecido possa rondar os 4 mil milhões de euros em cada ano.
Diariamente deparamo-nos com situações de alta hospitalar e os Cuidadores ficam sem resposta para uma situação de dependência. Muitos optam por pedir baixa médica e em muitos casos deixam mesmo de trabalhar. A questão que colocamos: será mais barato pagar a baixa médica destes Cuidadores ou dar-lhes condições para que os mesmos possam conciliar o emprego com a prestação de cuidados? Outra dificuldade é a falta de conhecimento técnico (principalmente no caso de idosos) para lidar com as alterações da vida diária da pessoa dependente. Uma situação de dependência pode prolongar-se no tempo o que leva ao desgaste físico, psicológico, social e, o mais preocupante, à pobreza das famílias. Realidade que já constatamos afetar muitas famílias que entram em contacto com a Associação. É urgente capacitar o Cuidador e que o descanso do Cuidador seja uma realidade.
No passado dia 8 de março o Estatuto do Cuidador Informal esteve em debate na reunião plenária. Nas iniciativas legislativas sobre o Estatuto do Cuidador Informal a Proposta de Lei 186/XIII (Governo) estabelece medidas de apoio ao Cuidador Informal e regula os direitos e os deveres do Cuidador e da pessoa cuidada.
Todas estas medidas não são o que a ANCI pretende. Defendemos a criação de um Estatuto que proteja e dê condições a cada Cuidador Informal que se debate no seu dia a dia com situações de pobreza, limitações ao nível de respostas para melhor cuidar e que o desgaste físico e psicológico não seja o estado normal daqueles que cuidam.
Em entrevista à Rádio Renascença no passado dia 16 de março, Sofia Figueiredo, Presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais, defende que “a proposta do Governo está aquém das expectativas e das necessidades, desde logo porque não contempla a criação de um Estatuto do Cuidador Informal porque só um Estatuto poderia prever intervenções nas três áreas em que é preciso atuar: saúde, segurança social e área laboral”. No entanto, diz Sofia Figueiredo, a proposta do executivo de António Costa “prevê apenas medidas avulsas” que numa primeira fase apenas serão aplicadas em projectos-piloto que vão abranger 15% do território nacional.
“Nós não concordamos com os projectos-pilotos”, diz Sofia Figueiredo. A Presidente da Associação Nacional de Cuidadores Informais defende ainda que “o Governo devia começar por criar medidas de protecção laboral dos Cuidadores Informais” e não levar o assunto à concertação social, onde os cuidadores nem sequer estão representados. Há ainda os projetos dos outros partidos em que o BE, o CDS-PP e PSD que preveem a criação de um Estatuto.
Na opinião da associação estão em falta medidas que deveriam ser acrescentadas ao conjunto de medidas da proposta de lei:
“Para a associação seria importante um Estatuto e não medidas de apoio. Deve constar na proposta do governo o descanso do Cuidador no domicílio. A flexibilidade, redução de horário e recurso ao teletrabalho. A atribuição de licenças de emergência aos cuidadores sem perda de remuneração. Seria importante também que, para utilizar o descanso do Cuidador na Rede Nacional Cuidados Continuados, reformulassem a forma de cálculo. Actualmente são contabilizados os rendimentos do agregado familiar e não são contabilizadas as despesas desse mesmo agregado”, afirma a Presidente da ANCI.
Enquanto isso, a ANCI continuará a promover diversas iniciativas sempre com o objectivo de chamar atenção da Sociedade Civil e Política para as carências de vida dos Cuidadores Informais. Temos também Gabinetes de Apoio ao Cuidador Informal (para já na Amora e no Barreiro), para esclarecer, encaminhar e dar o apoio que está nas nossas mãos. Contamos que em breve possamos estar, também, ao dispor noutros espaços, em diferentes zonas do país.
A ANCI tem um lema “Cuidar com amor, qualidade e conhecimento”. Para tal queremos divulgar o papel do Cuidador Informal junto das populações, queremos fazer chegar a todo o país, conhecimento e apoio, para que não se sintam tão sós. Queremos um Estatuto do Cuidador Informal!
Sandra Mourinha Presidente da Delegação de Lisboa da Associação Coração Amarelo
A Associação Coração Amarelo - Delegação de Lisboa inicia no presente ano uma parceria com a revista Dignus. Esperamos que seja frutuosa e contribua para enriquecer e entreter os leitores a quem faremos companhia em todas as edições!
Procuraremos trazer temáticas que venham ao encontro das expetativas dos leitores, na esfera de intervenção social em voluntariado junto da população idosa.
A missão da Associação Coração Amarelo (ACA) é apoiar e acompanhar pessoas idosas que se encontrem em situação de solidão e/ou isolamento, ou em risco de virem a estar. Sendo uma entidade enquadradora de voluntariado, assegura esta missão através da ação de voluntários, os quais se deslocam ao local de residência das pessoas apoiadas, seja em domicílio ou em estruturas residenciais para pessoas idosas, com os objetivos de fazer companhia, conversar e ouvir. Algo tão difícil nos dias que correm!
O objetivo que move a organização de uma resposta social em voluntariado visa potenciar um processo de envelhecimento ativo e participativo da população apoiada, através da ação de voluntários formados, enquadrados, acompanhados e supervisionados por uma equipa de profissionais, nomeadamente:
“Convidamos, por fim, os leitores a visitar o website da instituição (...) e quem sabe, a juntarem-se à nossa causa!” »
Concretizar a finalidade do exercício do voluntariado; Enquadrar, com recurso ao trabalho de profissionais, o voluntariado; Confirmar o voluntariado como resposta social; Contribuir para o bem-estar da população idosa apoiada, procurando satisfazer as suas necessidades em termos emocionais e socio- -relacionais; Desenvolver um trabalho de parceria com entidades da área da saúde e da ação social com vista à construção de respostas integradas e diferenciadas; Apostar na formação contínua dos voluntários assim como no enquadramento, acompanhamento e supervisão da sua ação, com vista à diferenciação da resposta, tendo em conta as necessidades específicas de cada pessoa apoiada.
Acreditamos que a intervenção social só pode acontecer quando está devidamente enquadrada e supervisionada por profissionais experimentados e que se dediquem a sua atuação, em exclusivo, ao planeamento desta resposta.
No âmbito do trabalho em rede têm vindo a verificar-se o reconhecimento e valorização, de forma crescente, da complementaridade do voluntariado como resposta a outras formas de intervenção social. A intervenção junto da população idosa, num contexto de contínuas mudanças sociais e tecnológicas que, muitas vezes, desencadeiam desajustamentos nas formas de estar e/ou fazer habituais, impõe a definição clara dos limites de atuação do voluntário numa dupla perspetiva: por um lado, a promoção da autonomia da população idosa, compreendendo a necessidade desta manter uma atividade socio-relacional e de assim, se mitigarem os efeitos de desadaptações sociais; por outro, a assunção de que o voluntário da ACA atua numa esfera muito específica mas absolutamente determinante para a definição de uma intervenção que perspetive a satisfação de diferentes níveis de necessidades do ser humano, conforme Maslow definiu há mais de um século através da, por todos conhecida, “Teoria da Hierarquia das Necessidades” (1973). Convidamos, por fim, os leitores a visitar o website da instituição de modo a conhecerem melhor a ação desenvolvida, e quem sabe, a juntarem-se à nossa causa!
Luís Jacob Professor Adjunto no Instituto Politécnico de Bragança e Presidente da RUTIS
Com o atual e progressivo envelhecimento da população no ocidente (no qual Portugal não é exceção), o aumento da esperança de vida e o crescente interesse dos seniores pela educação ao longo da vida, surgiu a urgência de criar um modelo teórico e educativo específico para os adultos mais velhos, em que a objetivo profissional não é o mais importante.
Surgem as ideias da gerontopedagogia ou da gerontologia educativa, conforme os autores. Segundo Osório, “o propósito [da gerontologia educativa] é prevenir o declínio prematuro, facilitar o desenvolvimento de papéis significativos para as pessoas seniores, fomentar o desenvolvimento psicológico, de modo a prolongar a saúde e os anos produtivos e aumentar a qualidade de vida das pessoas seniores” (2005, p. 280). A gerontopedagogia visa a conceção e desenvolvimento de modelos e programas de educação, estimulação, enriquecimento pessoal, formação e instrução dirigidos aos maiores de 55 anos. A educação para idosos tem sido objeto de várias investigações e presentemente são aceites duas teorias complementares: uma que concebe a educação como estratégia de “socioterapia”, promovendo e estimulando a integração social (e nesse caso a educação é um instrumento de promoção e integração social), sendo a segunda perspetiva a que entende um envelhecimento melhor para aqueles que mantêm a mente ativa através de atividades educativas. Nesta visão, a educação é simultaneamente uma espécie de ginástica mental, que evita o deterioramento das capacidades cognitivas e um instrumento para aquisição de novos conhecimentos.
Entre a educação para adultos e a educação para idosos, há significativas diferenças, como os objetivos e a motivação (mais profissional e qualificativa nos adultos, mais lúdica e prazenteira nos idosos), a duração das aulas ou cursos e os métodos a utilizar.
Neste envolvente surgem as Universidades Seniores (US), que são um exemplo maior de cidadania, formação, inclusão social, voluntariado, conhecimento, aprendizagem e desenvolvimento comunitário. Existiam em dezembro de 2017 em Portugal 326 US registadas na RUTIS (Associação Rede de Universidades da Terceira Idade), segundo o website da CASES, e perto de 50 000 alunos e 5500 professores voluntários.
As Universidades Seniores surgiram em 1972 em França como movimento específico de ensino para os seniores na Universidade de Toulouse, com Pierre Vellas (médico e investigador, 1930-2005). O modelo rapidamente cresceu e chegou a outros países que o adaptaram à sua realidade. Atualmente há dois grandes modelos de organização das US: o modelo francês e o modelo inglês. O modelo francês associa as US às universidades formais, enquanto o modelo britânico desenvolveu-se tendo por base o voluntariado, as associações sem fins lucrativos ou grupos auto-organizados. Além destes dois grandes modelos existem vários modelos mistos e com pequenas variantes.
As Universidades da Terceira Idade ou US são as “respostas socioeducativas que visam criar e dinamizar regularmente atividades nas áreas sociais, culturais, do conhecimento, do saber e de convívio, a partir dos 50 anos de idade, prosseguidas por entidades públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos”, segundo a Resolução do Conselho de Ministros 76/2016).
Em abril de 2016 no protocolo entre a RUTIS e o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social pode-se ler o seguinte texto esclarecedor da importância das US:
“Os resultados da ação das Universidades e Academias Sénior são inquestionáveis quanto ao bem-estar que propiciam, quer no reforço das perspetivas de inserção e participação social, quer na melhoria das condições e qualidade de vida das pessoas que as frequentam.
Verifica-se igualmente que a frequência destas estruturas tem impacto na alteração dos modos de vida, proporcionando benefícios a vários níveis: aumento dos conhecimentos adquiridos, nomeadamente através do aumento da cultura geral e da perceção da melhoria contínua das capacidades de aprendizagem, assim como da promoção de estilos de vida saudáveis, através da prática de exercício físico e de hábitos de alimentação equilibrada.
As mais-valias não se situam apenas na manutenção de atividades de índole intelectual e física e na aquisição do conhecimento em si mesma, mas é, igualmente, primordial o seu cariz de sociabilização e de manutenção de contactos sociais.
Se, por um lado, os estímulos à capacidade de aprendizagem e de participação podem contribuir para a sociedade se distanciar de alguns estereótipos e imagens negativas atribuídas ao envelhecimento e à velhice, por outro lado, e do ponto de vista individual, ajudam a perspetivar projetos e objetivos futuros, promovendo, assim, o aumento da esperança de vida com qualidade e dignidade”.
“As Universidades Seniores proporcionam regularmente aulas, palestras, eventos e roteiros culturais, oficinas temáticas, tertúlias, sessões de divulgação e informação, rastreios, ações de voluntariado e solidariedade, espetáculos, jogos florais, concursos, seminários, jornadas intergeracionais e visitas a museus, teatros e monumentos a todos os seniores interessados, independentemente do seu nível académico, económico ou social” (Luís Jacob, 2017). Vários estudos científicos e académicos demonstram e confirmam que frequentar uma US aumenta a qualidade de vida dos seus frequentadores, melhora o seu estado geral de saúde, diminui os sentimentos de depressão e isolamento, diminui o consumo de medicamentos e aumenta a inserção social (ver Jacob, 2009; Jesus, 2010; Pocinho, 2015 ou Rebelo, 2016).
Ou confirmadas num estudo mais recente de Luís Jacob (2019) baseado num inquérito aplicado a 1016 alunos seniores em todo o país, em modo de preenchimento presencial e digital, no qual se utilizou um inquérito de perguntas fechadas e a escala de depressão geriátrica com 15 itens (GDS15). Através deste estudo concluiu-se que as US em Portugal são frequentadas essencialmente por mulheres, entre os 65-75 anos, reformadas ou domésticas, casadas, de todos os extratos socioeconómicos e de graus de habilitações diversos. Frequentam em média quatro disciplinas
semanalmente e vão três dias por semana à US. Ao nível das habilitações académicas e capacidade financeira os alunos são muito heterogéneos. O maior número de alunos tem o 5.º e 7.º ano e entre o 10.º e 12.º ano. No caso dos rendimentos pessoais mensais as maiores percentagens vão para os rendimentos entre os 700 e 900 euros.
A influência positiva destas organizações na vida dos seniores é notória. Encontrou-se uma melhoria da perceção do estado de saúde físico e mental dos alunos, o número de contactos sociais aumentou e consequentemente o sentimento de solidão diminuiu; houve uma redução da medicação antidepressiva tomada; os níveis de depressão são substancialmente mais baixos do que a população em geral; aumentou o nível de conhecimentos; a autoestima subiu e os alunos sentem- -se mais ativos e inseridos na comunidade. Outro dado, muito importante, retirado do inquérito foi o aumento nos conhecimentos de informática e a diminuição da iliteracia digital.
Quadro 1. Evolução dos conhecimentos de informática nos alunos seniores em Portugal.
Conhecimentos de informática Portugal ANTES de frequentar as US:
Nenhuns conhecimentos 19,8% Poucos conhecimentos 18,8%
Alguns conhecimentos 46,5% Bons conhecimentos 14,9%
DEPOIS de frequentar as US: Nenhuns conhecimentos 6,3%
Poucos conhecimentos 15,6% Alguns conhecimentos 52%
Bons conhecimentos 26%
Referências bibliográficas 1. Almeida, Isabel (2009), Trabalho em Pedagogia da Formação de Adultos, Universidade Aberta. 2. CASES, Cooperativa António Sérgio para a Economia Social, www.cases.pt. 3. Florindo, Graça, (2008), Transição para a reforma no concelho de Évora: Assimetrias sócio-educativas entre urbanidade e ruralidade, dissertação de Mestrado em Educação na FCSH da Universidade Nova de Lisboa. 4. Jacob, Luis (2019), Universidades Seniores: Contributos para uma vida melhor, Programa de doutoramento em Formação na Sociedade do Conhecimento da Universidade de Salamanca. 5. Jacob, Luis (2018), A formação para seniores in Felicidade 100 idade, Edição APPEAS, pp 54-69. 6. Jacob, Luis (2012), Universidades Seniores: Criar novos projectos de Vida, Edição RUTIS 7. Jacob, Luis et all (2012), Perfil dos Professores das Universidades da Terceira Idade, Estudo realizado pela RUTIS. 8. Jesus, A. (2010), A importância da universidade sénior na qualidade de vida e solidão dos seniores em Gondomar, dissertação de Mestrado em Gerontologia Social do Instituto Superior de Serviço Social do Porto. 9. Melo, António; Federighi, Paolo (1999), Glossário de Educação de adultos na Europa, Associação Europeia para a Educação de Adultos. 10. Neto, Arthur, (2010), Da vida laboral à reforma: Expectativas de ocupação, Tese de Doutoramento da Universidade Portucalense Infante D. Henrique. 11. Osório, Agustin (2005). Educação Permanente e educação de adultos. Horizontes pedagógicos. Edições Piaget. 12. Petró, Vanessa (2012), O programa Maiores de 23 na Universidade de Lisboa: Análise do perfil dos candidatos, Universidade de Lisboa. 13. Pires, Ana (2002), Educação e formação ao longo da vida: Análise crítica aos sistemas e dispositivos de reconhecimento e validação de aprendizagens e competências, Dissertação apresentada para obtenção do Grau de Doutor em Ciências da Educação, pela Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências e Tecnologia. 14. Pocinho, Ricardo (2015), Seniores em contexto de aprendizagem: caracterização e efeitos psicológicos nos alunos das Universidades Seniores em Portugal, Euedito. 15. Protocolo entre a RUTIS e o MSTSS de Abril de 2016. 16. Rebelo, Bruno (2016), Universidades Seniores, uma visão sobre o envelhecimento activo, Livpsic. 17. RUTIS Gestão, Programa de Gestão de US disponível em www.gestaoutis.eu. 18. Silva, N. (2016), Educação na Terceira Idade: inclusão social e inovação pedagógica na Universidade. Aracaju. Editora Edise. 19. Silvestre, Carlos (2011). Educação e formação de adultos e idosos: Uma nova oportunidade. Horizontes Pedagógicos. Editora Piaget. 20. Simões, António (2006), A nova velhice, Edição Âmbar. 21. UNESCO (2010), Relatório global sobre aprendizagem e formação de adultos, Hamburgo. 22. UNESCO e ONU, documentos diversos.
ACaregivers Portugal, Associação Portuguesa de Cuidadores foi criada com o objetivo principal de representar os cuidadores e cuidadoras, de se bater pela criação de uma carreira profissional que reconheça a especificidade técnica e humanística destes profissionais e lutar por tabelas remuneratórias justas que os retribuam de acordo com as suas elevadas responsabilidades e competências profissionais.
Convém clarificar que se entende por cuidador pessoal alguém que ajuda outrem, privado parcial ou totalmente de autonomia nas suas atividades de vida diária. Os cuidadores podem ser familiares que não auferem remuneração, ou profissionais remunerados e, dentre estes, os que possuem qualificações específicas considerados formais, e os que cuidam de alguém sem possuírem qualificações, embora possam ter mais ou menos experiência, designados informais.
É sabido que esta caraterização não gera unanimidade e que há autores que utilizam outros critérios para definir categorias de cuidadores. No quadro cada vez mais profissionalizado em que se tem de agir, e tendo em consideração a necessidade de clarificar o exercício desta atividade progressivamente a evoluir para uma verdadeira profissão, é esta a nossa aposta, e é neste sentido definidor de um novo enquadramento do exercício da atividade de cuidador/a pessoal que a Caregivers Portugal orienta a sua ação.
À semelhança de muitas outras profissões que há décadas exigiam baixos níveis de formação e cujos profissionais eram muito mal remunerados, e pagandistas das causas sociais fraturantes que se pode não falar até de família, no singular, mas tanto quanto se alcança, é difícil imaginar sociedades sem famílias como já hoje as conhecemos, em que os meus, os teus e os nossos, configuram modelos diferenciadores, nem melhores nem piores, apenas diferentes de um passado mais padronizador.
Acresce que falar em cuidadores familiares diminui o impacto da exigência remuneratória, pois todos aceitam, ou quase todos, para sermos mais rigorosos, que as famílias têm obrigação de cuidar dos seus filhos, dos seus doentes, dos seus idosos, dentro de certos limites, naturalmente, e de acordo com o modelo e condições concretas de desenvolvimento de cada sociedade.
Para a economia do processo importa que o debate se clarifique, se desmistifiquem ideias que não têm qualquer suporte na realidade e se afronte o problema, porque de facto existe um gravíssimo problema social em torno da prestação dos cuidados pessoais, sendo urgente conferir aos cuidadores familiares apoios que lhes são devidos por um Estado Social. Nesta matéria este falha em toda a linha, reconhecendo também às famílias que não têm meios ou condições para tratar dos seus entes queridos o direito a beneficiarem de apoios que lhes permitam remunerar cuidadores contratados para o efeito, assim se legislando no sentido da criação de um Estatuto dos Cuidados Pessoais Familiares e não dos Cuidadores Informais.
Esta medida teria amplas repercussões sociais e económicas, tanto mais que constituiria um sinal concreto de que à institucionalização rotineira de quem precisa e de quem é forçado, se estaria a optar por formas financeiramente mais flexíveis e de uma humanidade incomparavelmente superior. Relativamente aos cuidadores profissionais só se antevê uma solução justa e digna, a criação de um Estatuto de Carreira que enquadre esta atividade profissional, defina as qualificações que os diversos patamares da mesma exigem e os níveis remuneratórios aplicáveis.
Evidentemente que medidas como as que se preconizam, pelos impactos pessoais, sociais e financeiros que determinam, necessitam sempre de períodos de adaptação e de medidas complementares de apoio à adoção de novos padrões organizacionais, mas não se duvida de que o caminho será por aqui e que quanto mais cedo se começar a percorrer, melhor para todos.
A Caregivers Portugal quer ser parceira neste processo, contribuindo para um debate aberto e descomprometido relativamente a ideologias e forças de pressão, alinhado com as melhores práticas internacionais, fomentando a articulação entre o ensino superior, os investigadores e os profissionais e reforçando a massa crítica desta área técnico- -científica em desenvolvimento. José Manuel Silva que hoje se impõem a administrações e governos, a profissão de cuidadores pessoais, pela missão que lhes está cometida e pela crescente exigência de quem é objeto de cuidados em ser tratado por profissionais cada vez mais qualificados, tende a transformar-se numa profissão com elevados níveis de qualificações técnicas e humanas, a que terão de corresponder níveis remuneratórios crescentemente elevados.
É esta a realidade que se esconde por detrás de uma aparente anomia relativamente a encarar de frente um problema que não tardará a agitar a opinião pública e a provocar um incalculável impacto em muitas organizações e instituições, bastando apenas que a evolução rápida da situação portuguesa em matéria de cuidados pessoais alcance o nível de exigência que outras sociedades mais desenvolvidas já conhecem para esta questão se tornar imparável.
Quanto aos chamados informais, registe-se que se foge a falar de cuidadores familiares, que serão a maioria, usando-se aqui o condicional por ninguém ter números fiáveis, sendo razão bastante o facto de um setor dos que se debruçam sobre esta matéria entender que se deve desvalorizar o papel da família e reforçar o do Estado.
Para aqueles, a família parece ser uma abencerragem do passado, uma tralha a aguardar reciclagem ou mesmo aterro, não ocorrendo a esses proCaregivers Portugal Fundador e Presidente da Caregivers Portugal
Desafios e oportunidades
Professora e consultora na área do Serviço Social e da Gerontologia Social Carla Ribeirinho
Apesar das crescentes transformações sociodemográficas a que assistimos, a intervenção na área do envelhecimento tem vindo a ser negligenciada a vários níveis. A atualidade tem sido marcada pelo aumento e complexidade dos problemas sociais e pela escassez de recursos na resposta às necessidades dos cidadãos. Neste contexto, a intervenção profissional é cada vez mais orientada para uma gestão por objetivos e para o controlo das atividades desenvolvidas sob o lema da eficiência e da eficácia. As organizações tuteladas pelo Estado com utilizadores de serviços cada vez mais exigentes, são, neste contexto, confrontadas com vários dilemas a que têm de responder continuamente, como por exemplo: atender às necessidades emergentes com recursos escassos;
promover a melhoria dos processos de trabalho e a qualidade das respostas; a participação dos utilizadores nas decisões e a qualificação dos profissionais. É neste cenário que faz sentido refletir sobre a importância da (trans)formação dos profissionais na área do envelhecimento.
Abordar o tema da importância da formação dos profissionais que trabalham com pessoas idosas, implica partir da aceção de que se trata de um território de intervenção com grande exigência ao nível dos conhecimentos, da ética, dos direitos, das metodologias e das técnicas.
Prestar cuidados a uma pessoa idosa em situação de doença e/ou dependência representa um grande desafio para os cuidadores quer sejam
informais, quer sejam formais. Ocupamo-nos aqui especialmente dos Cuidadores Formais, embora possam existir aspectos generalizáveis a ambas as situações 1 . Cuidar envolve esforço mental, físico e psicológico e prestar cuidados a uma pessoa idosa, embora possa envolver emoções positivas, transforma-se, não raras vezes, numa tarefa complexa, podendo gerar sentimentos de angústia, insegurança e desânimo. Além de ter de saber lidar com o processo de envelhecimento e suas especificidades, o cuidador tem de conviver com a subjetividade associada às relações humanas (Ribeiro et al., 2008). A pessoa idosa tem uma determinada personalidade, forma de estar/ver o mundo, história de vida, valores, cultura, expetativas, sendo o processo de prestação de cuidados dinâmico e complexo. São, desta forma, requeridos conhecimentos e capacidades ao profissional, para satisfazer as necessidades que podem ir das mais básicas às instrumentais da vida diária da pessoa idosa.
O Cuidador Formal é um profissional a quem se exigem competências, desde as mais elementares, como o conhecer as necessidades da pessoa idosa, saber distingui-las, saber lidar com doenças e seus sintomas cognitivos ou problemas sociais, de personalidade ou de ordem familiar e contextual (Sequeira, 2010). Para além do apoio na realização de actividades diárias básicas, como a higiene e a alimentação, as pessoas idosas podem ainda necessitar de assistência específica ao nível da saúde e requerer recuperação/ reabilitação, encontrarem-se em fases terminais de uma doença, ou então, sofrer de múltiplas condições crónicas, deficiências cognitivas e funcionais, entre outras (Spilsbury, et al., 2011). Neste sentido, a prestação de cuidados requer organização e esforço contínuo do cuidador, determinadas competências e qualidades.
Ao assumir a responsabilidade pelos cuidados, o profissional frequentemente depara-se com dificuldades e situações constrangedoras ou de tensão que lhe podem provocar algum desconforto, desgaste e mal-estar. Neste sentido, é essencial uma formação técnica que abranja aspetos teóricos, humanos e éticos, a par de uma sólida e diferenciada formação humana. De fato, a formação é essencial para que os profissionais atualizem os conhecimentos adquiridos por via da sua formação inicial ou experiencial. Com a formação, os profissionais aprendem a desenvolver novos conhecimentos e competências, para fazer face a um contexto cada vez mais complexo e exigente no qual a inovação e criatividade e a necessidade de mudança são uma constante.
Todos os profissionais que trabalham neste campo devem, assim, ter uma elevada preocupa
1
A designação cuidadores formais habitualmente, integra diversos profissionais, desde os devidamente qualificados - enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas diversos, entre outros - aos que não têm necessariamente uma formação específica para o desempenho deste papel.
ção de atender às complexas e multidimensionais necessidades das pessoas idosas e/ou em situação de dependência, que variam nos seus requisitos de cuidado, assistência e tratamento.
Por outro lado, a coexistência de exigentes condições de trabalho neste campo pode conduzir os profissionais a uma situação de exaustão física e emocional ou mesmo de burnout - síndroma de stress ocupacional que envolve o desenvolvimento de um auto conceito negativo, atitudes negativas em relação ao trabalho e uma diminuição ou perda de preocupação e sentimentos pelos utentes. Tal reside num desequilíbrio persistente entre as exigências e os recursos, ou quando existe um conflito entre o trabalho desenvolvido e os valores organizacionais. O burnout tem sido definido como uma reacção de exaustão, resultado de uma pressão emocional constante ou repetida, associada a um envolvimento intenso com pessoas, ao longo de um determinado período de tempo (Kadushin e Harkness, 2014).
É, assim, indispensável, que as instituições prestem suporte emocional e forneçam (in)formação adequada aos profissionais com o objetivo de aumentar o seu desenvolvimento pessoal e profissional, e também aumentar a satisfação e o bem-estar dos utentes/clientes.
Aos profissionais com responsabilidades de coordenação/gestão de equipas cuidadoras, sugere-se a implementação de medidas (trans)formativas que as ajudem a desenvolver estratégias de enfrentamento e superação das adversidades subjacentes à sua prática profissional diária. A este nível podemos considerar algumas áreas de especial atenção: I. manter a motivação dos profissionais através de estímulos permanentes ao desenvolvimento de uma boa prática profissional e à melhoria da qualidade de vida das pessoas idosas; II. estimular a formação permanente dos profissionais; III. criar oportunidades de intercâmbio de experiências e conhecimentos entre profissionais internos e externos, para enriquecer as práticas institucionais (por exemplo comunidades de práticas ou grupos de intervisão/peer group); IV. desenvolver em todo o pessoal o sentimento de pertença e de responsabilidade no fazer profissional, através de técnicas de trabalho em equipa (González, 2003; Ribeirinho, 2013).
Uma vez que, como vimos, os cuidadores são fortes candidatos a elevados níveis de stress e insatisfação laboral, devido à dependência e frequentes distúrbios comportamentais que acompanham algumas doenças, para além de muitos outros fatores já referenciados, têm vindo a ser desenvolvidos programas de formação para Cuidadores Formais de natureza diversa. Contudo, estes programas de formação centram-se frequentemente na informação e aquisição de conhecimentos e competências, desvalorizando (ou subvalorizando) os aspectos relacionais dos cuidados, bem como o stress e a sobrecarga emocional a que os profissionais são sujeitos (Barbosa, et al., 2011). A formação enquanto processo de aquisição e renovação de conhecimentos é um elemento fundamental para conseguir que os recursos humanos de uma instituição desenvolvam um trabalho de qualidade junto dos seus utentes. Para os trabalhadores permite melhorar a prestação dos cuidados e serviços, uma maior
estabilidade, melhores relações interpessoais, diminuição de conflitos, melhorar a relação com os utentes, ou seja, uma maior qualidade global do seu trabalho. Para a instituição as vantagens da formação situam-se numa maior implicação do pessoal, maior coesão, melhor clima organizacional, aumento da responsabilidade pelo trabalho por parte de cada profissional, e, em suma, uma melhoria da qualidade geral na instituição (Ribeirinho, 2013).
Neste sentido, postulamos a necessidade do desenvolvimento de programas que visem não só a promoção de conhecimentos e competências específicas no contexto dos cuidados, mas também para o desenvolvimento de estratégias que promovam o autocuidado, a gestão de stress e da sobrecarga emocional.
Argumentamos que as pessoas são o mais importante recurso, o princípio e o fim dos serviços e instituições. Neste sentido, o desenvolvimento de competências das equipas de profissionais/cuidadores de pessoas idosas é umfator chave para o seu próprio bem-estar e qualidade de vida, dos destinatários do seu trabalho e para a qualidade global do trabalho da própria instituição. Não obstante, é frequente verificar-se um desajuste entre o que é exigido a estes profissionais e as condições de formação e de trabalho que as instituições lhes proporcionam. Apesar da imposição legal da existência de formação, muitas vezes o investimento na formação dos profissionais é ainda negligenciado.
A participação em processos de formação contínua estimulantes e mais “formais” é fundamental, mas consideramos igualmente que os profissionais podem também adquirir saber(es) na experiência da partilha, da construção de críticas fundamentadas em relação com outros profissioÉ preciso querer e poder traduzi-lo em ação. Defendemos que todos os espaços de formação em exercício se podem constituir como oportunidades de desenvolvimento profissional, o qual desempenha um importante papel para realizar um trabalho com eficiência e qualidade. Para tal, precisamos de nos preocupar em ajudar os profissionais a (re) aprender o que eles precisam de saber para que desempenhem o seu trabalho eficazmente. A “matéria-prima” é precisamente o desempenho do profissional, perspetivado de forma sistemática e crítica. Se educarmos o olhar neste sentido, o contexto de trabalho quotidiano pode constituir-se como um valioso espaço e tempo de produção e de recomposição de saberes, embora muitas vezes isto seja pouco valorizado como recurso pelos próprios profissionais e dirigentes (Ribeirinho, 2019).
nais, proporcionados pela participação em espaços de supervisão, de trabalho em equipa e de trocas e aprendizagens com os outros agentes da intervenção. A supervisão, por exemplo, pode ser considerada um espaço de autoformação, na medida em que permite a reconfiguração dos saberes, a partir da interação dos conhecimentos prévios com os conhecimentos emergentes, resultantes da análise das situações e temas nela discutidos. Pode, igualmente, constituir-se como um espaço de formação, porque ao atualizar os referenciais (éticos, políticos, teóricos, metodológicos e pedagógicos) reformula e transforma os comportamentos e as atitudes pessoais e profissionais (Ribeirinho, 2019). Os profissionais não adquirem um conhecimento profissional apenas nas instituições formais universitárias, mas também no quotidiano, com o seu trabalho (training on the job).Por outro lado, não basta ter conhecimento. A aposta na formação dos profissionais deve deixar de ser vista como uma atividade extra profissional e como uma perda de tempo e dinheiro, e cada vez mais ser encarada como investimentos com retorno na dignificação do trabalho no campo da Gerontologia. Investir na formação deve ser efetivamente percecionado como veículo de exigência e de excelência na valorização do capital humano e não confinar-se apenas ao cumprimento da legislação do código do trabalho em vigor (e por vezes nem isso).
No contexto da intervenção na área da Gerontologia verificam-se, muitas vezes, técnicas de trabalho tomadas como certas e eficazes, mas que rapidamente se foram tornado obsoletas. É neste quadro que assume particular relevância a formação dos profissionais, essencial para que estes possam ter acesso a informação mais atualizada e adaptada às especificidades dos diferentes con
© freepik
textos de intervenção, bem como dos diferentes perfis de pessoas.
Em suma, num contexto de intervenção tão complexo e multidesafiante, urge a criação de ambientes formativos estimulantes, analíticos, interpretativos, questionadores de mitos e preconceitos, críticos e reflexivos, os quais se consubstanciem como uma mais-valia diferenciadora e assumam um papel determinante no alavancar de uma intervenção com maior qualidade nesta área.
Referências bibliográficas 1. Barbosa, A. et al. (2011). Cuidar de idosos com demência em instituições: competências, dificuldades e necessidades percepcionadas pelos Cuidadores Formais. Psicologia, Saúde & Doenças, 12(1), 119-129. 2. Kadushin, A. e Harkness, D. (2014). Supervision in Social Work (5.ª ed.). New York: Columbia University Press. 3. Ribeirinho, C. (2013). Serviço Social gerontológico: Contextos e práticas profissionais in Carvalho, M., Serviço Social no Envelhecimento, Lisboa: Pactor, pp.177-200. 4. Ribeirinho, C. (2016). Gestão das emoções e afetos no cuidar: a supervisão emocional das equipas de cuidados in Moura, Cláudia (org.), Novas competências para novas exigências no cuidar, Porto, EUedito, pp. 219-234. 5. Ribeirinho, C. (2019). Supervisão Profissional em Serviço Social - Ao encontro de uma prática reflexiva, Lisboa, Pactor. 6. Ribeiro, M. et al. (2008). Profile of caregivers of elderly in long-term care institutions in Belo Horizonte-MG. Ciência & Saúde Coletiva, 13(4), 1285-1292. 7. Sequeira, C. (2010). Cuidar de idosos dependentes. Porto: Quarteto. 8. Spilsbury, K., et al, C. (2011). The relationship between nurse staffing and quality of care in nursing homes: a systematic review. International Journal of Nursing Studies, 48, p.732- -750.