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Entrevista

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Dica de Manejo

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Mortalidade de porcas nos atuais sistemas de produção suína: como interpretar importantes indicadores

PhD Carlos Piñeiro - Médico-veterinário - Consultor

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Diretor PigCHAMP Pro Europa SL pigchamp@pigchamp-pro.com

Segundo a experiência e visão do médico-veterinário e Dr. Carlos Piñeiro, o incremento de mortalidade de porcas em granjas de suínos é um indicador da qualidade do sistema de produção que elas são submetidas

Médico-veterinário formado pela Universidad Complutense de Madrid, Carlos Piñeiro possui diploma de Estudos Avançados em Produção Animal pela Universidad Politécnica de Madrid e é PhD pela Universidad de Meiji-Tokyo-Japão. Também é Diplomado pelo European College of Porcine Health Management, especialista em Avaliação de Impacto Ambiental pela Universidad Politécnica de Madrid, membro do Grupo de Trabalho Espanhol para a discussão da Diretiva de Emissões Industriais e membro do Grupo de Gestão Ambiental na Produção de Suínos, coordenado pela Universidad Autónoma de Mexico, Unidade de Xochimilco. Há 20 anos, é diretor da empresa PigCHAMP Pro Europa S.A. Protagonista de uma brilhante carreira profissional, Dr. Carlos Piñeiro comandou mais de 20 projetos de pesquisa aplicada, mais de 26 artigos em revistas científicas, 137 comunicações em conferências científicas e cinco capítulos em livros especializados sobre produção, sanidade, ambiência e bem-estar animal. Além disso, com frequência, publica artigos técnicos/científicos para revistas, mídias sociais e sites, no seguimento de suinocultura. Nesta entrevista, Dr. Carlos Piñeiro relata sua vasta experiência neste importante tema, e das lesões macroscópicas encontradas nas necropsias e como estabelecer um protocolo para a solução do problema.

S&C: A suinocultura é dinâmica e se mantém em constante evolução. Como entender o incremento da mortalidade de porcas nos atuais sistemas de produção de suínos?

CP: Nos últimos sete anos, a mortalidade tem se elevado continuamente nos grandes sistemas de produção de suínos, com um aumento geral entre 80 a 100% quando comparamos com décadas passadas. O que era de 3 a 6%, hoje se reflete em índices superiores à 10%. Embora nenhuma causa principal possa ser atribuída a essa situação, é provável que estejamos acumulando mais fatores de risco do que nunca; fatores que, por sua vez, até agora não eram bem conhecidos ou descritos. Um suíno, seja uma fêmea reprodutiva ou um animal de abate, não morre ou será sacrificado repentinamente. Se isso ocorre, significa que o animal acumulou diferentes tipos de fatores de estresse, até que, por fim, não tenha mais sido possível superálos. A mortalidade reflete, na maioria dos casos, de como se encontra a qualidade dos seguimentos de um sistema de produção suíno.

S&C: Atualmente, a produtividade da matriz suína ultrapassa mais de 32 leitões desmamados/porca/ano. Existe alguma relação entre essa produtividade e a mortalidade?

CP: Até o momento não foi demonstrada nenhuma relação consistente entre esses dois fatores, embora haja indícios de que essa associação possa ser um elemento de influência. Alta produtividade implica numa alta demanda por padrões sanitários, nutricionais e de bem-estar. Na medida em que eles não sejam totalmente respeitados, assumimos um risco maior de esgotamento dos recursos do animal. O estresse imunológico, devido a doenças, exige a ativação do sistema imune, produção de anticorpos, citoquinas e de proteínas de fase aguda, que em termos fisiológicos demanda muita energia e nutrientes. O estresse metabólico, em determinadas fases da produção, como no final de gestação e durante a lactação, também é muito elevado. E o estresse social, devido a outros animais ou tratadores, também pode comprometer o sistema imunológico por meio da liberação de

corticosteroides e hormônios hipofisários. Assim também funciona o estresse pelo calor. O acúmulo desses fatores em animais já altamente demandados parece aumentar o risco de problemas, descartes precoces, eutanásias e mortalidade.

S&C: Quais as principais causas do “por quê

morrem as porcas”? O estresse social, devido a outros animais ou CP: Publicações de qualidade sobre esse tratadores, pode comprometer o sistema imune assunto são escassas devido ao baixo percentual de necropsias realizadas em porcas. Além disso, assumir como reposições anuais normais aquelas não existe um sistema padronizado para esse tipo acima de 55% e, como média de idade para desde avaliação. E assim, cada veterinário realiza a carte, valores ao redor de ou abaixo de quatro seu modo. Outro problema é a falta de normatiza- partos. Estas não me parecem as melhores opções ção na coleta de dados a esse respeito, o que faz em termos de amortização. Para se ter um número com que algumas informações sejam ignoradas, fácil de lembrar, cada 1% de melhora na mortalisubestimadas ou superestimadas. Por exemplo, é dade de porcas, se traduz em 0,25 leitões a mais muito comum que se anuncie a causa da morte por porca coberta ano, ou 0,22 dólares por leitão súbita sem que se tenha feita uma necropsia. produzido. Não é um impacto pequeno. Morte súbita devido a que, torção intestinal, septicemia, úlceras gástricas, outras causas? Também S&C: Existe relação entre mortalidade e ordem é frequente que se considere como causa da baixa de parto? produtividade em porcas os diferentes graus CP: Um padrão claro de mortalidade está de problemas de aprumo, os quais diminuem o sendo definido em 'u' (mais elevado em P 0 a 1, desempenho ao longo de suas vidas produtivas. O motivo correto seriam os problemas de aprumo e em P 5+), tanto na gestação quanto na lactação, propriamente ditos e não o baixo desempenho, embora os percentuais gerais sejam maiores nessa mas não é frequente que se faça os registros dessa última fase. forma. Além disso, quando se anotam os problemas de S&C: Há evidências de maior aprumo, raramente são dife- "O estresse imunológico, mortalidade de porcas por renciados uns dos outros, osteocondrose, crescimento devido a doenças, exige fase de produção (vazia, gestação ou lactação)? excessivo dos tendões, fissu- ativação do sistema CP: Os momentos de ras horizontais ou verticais, imune, produção de maior risco estão sendo claralaminite infecciosa ou artrite, o que torna a análise ainda anticorpos, citoquinas, mente definidos no periparto: semana pré-parto e de 2 a 3 mais difícil. Mesmo assim, e de proteínas de fase semanas pós-parto. Também segundo alguns autores (Ala- aguda, que em termos logo após o desmame, em Kurikka, 2017), problemas cardiogênicos e inflamações fisiológicos demanda que se concentram, principalmente, as eutanásias. Parece do aparelho locomotor são muita energia e que se espera retirar primeiro considerados mais frequentes em fêmeas de primeiro parto; nutrientes." a leitegada, antes de sacrificar a porca. É claro que o parto em e inflamações, ocorridas em si é um estresse muito forte, outras localizações, são mais frequentes em por- que em combinação com outros fatores, como cas adultas, sendo 48% do total de mortes, com altas temperaturas ou doenças, aumenta muito o predomínio de peritonite. risco de morte.

S&C: Como calcular o custo da mortalidade de porcas em um sistema de produção de suínos?

CP: Essa questão do custo tem vários pilares. Em primeiro lugar está o custo do animal: ele morre e, portanto, se perde totalmente. Em segundo lugar existe o custo de oportunidade, ou seja, o que esse animal teria gerado na sua vida produtiva e que não teremos mais, o que também afeta os fluxos de produção. E em terceiro lugar estão o custo e o risco, acrescidos de uma reposição maior de entrada de animais. Passamos a

S&C: Existe relação de mortalidade quanto à estação do ano?

CP: No sul da Europa, com estações muito marcadas, o maior risco está nos meses mais quentes. Já nos meses com temperaturas mais amenas, esse risco diminui significativamente. Trata-se de um fator de risco muito importante, mas devemos lembrar que não é o único. Além disso, esse fator também nos chama a atenção para a importância de outras situações, como o controle da temperatura nas maternidades.

Cada 1% de melhora na mortalidade de porcas traduz-se em 0,25 leitão a mais por porca/ coberta/ano, ou 0,22 dólares por leitão produzido

S&C: Quais as principais causas que levariam à eutanásia de porcas?

CP: Parecem estar relacionadas, na sua maioria, a problemas de aprumo, como mostra o organograma abaixo entre a relação das lesões de cascos e o rendimento produtivo. E também devido a graves perdas nas condições corporais normais, por pouca, ou nenhuma ingestão de alimento, indicando um problema geralmente não diagnosticado. Como já foi comentado anteriormente, essas ocorrências se concentram principalmente após o desmame.

S&C: Em alguns casos, quando possível, pode-se usar a ferramenta de necropsia como diagnóstico. Quais as principais lesões encontradas nessas necropsias?

CP: É surpreendente o fato de se encontrar, com frequência, lesões compatíveis com a morte dos animais (peritonites, torções, lesões hepáticas relacionadas ao C. novyi). São encontradas também, frequentemente, lesões antigas associadas que agregam informações muito valiosas. Observa-se também que mais de 60% das porcas apresentam osteocondrose em diferentes graus de comprometimento e 71% apresentam algum tipo de problema dentário, de origens e graus variados, demonstrando episódios de dor característicos desse tipo de lesão. Cortes na pele e úlceras, assim como cistite, também são frequentemente descritos. De maneira geral, destacam-se muitas porcas sem sintomas claros de um problema específico, embora submetidas a processos dolorosos, os quais provavelmente comprometem o seu desem-

penho em diferentes graus.

Relação entre lesões de cascos e rendimento produtivo

Mais de 70% das porcas apresentam algum tipo de problema dentário, de origens e graus variados, demonstrando episódios de dor característicos desse tipo de lesão

S&C: O que se pode fazer para controlar esse problema?

CP: Devemos fazer uma aproximação do problema, do geral ao concreto; ver qual é a taxa de mortalidade que temos atualmente; como evoluiu a granja ou a empresa nos últimos anos; quais as taxas de retenção que temos ao longo do tempo; que causas observamos e se elas definem os problemas com precisão; estudar os padrões temporais, épocas do ano, ciclo produtivo e número de partos, para que tenhamos uma primeira imagem do processo como um todo; e rever partes muito específicas do processo produtivo, incluindo sanidade, manejo nutricional e instalações, para tentar identificar os problemas a partir de suas consequências. Não é uma operação simples, mas que vai requerer um trabalho inicial de análise detalhada para, posteriormente, se adotar um acompanhamento criterioso. A Suínos & Cia gostaria de agradecer, parabenizar e homenagear aos dois importantes profissionais Dr. Carlos Piñeiro e Dr. Yuso Koketsu pela dedicação de tantos anos através de estudos, trabalhos e publicações científicas relacionados às porcas de hiperprolificidade que são as verdadeiras protagonistas nos atuais sistemas de produção suína.

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