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CONEXÃO

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MUITO ALÉM DA última milha

O atendimento das empresas de internet deixou de ir apenas até o conector fixo do cabo nas instalações do cliente e passou a incorporar outras funcionalidades. Os provedores ampliaram o portfólio de atuação – e também o faturamento.

ESTÁ FICANDO PARA TRÁS o tempo em que as prestadoras de serviços de internet ofereciam apenas conexão. Os provedores avançaram e, hoje, estão presentes dentro das residências e das empresas. Ao mesmo tempo em que passaram a oferecer mais funcionalidades, expandindo o portfólio de atuação, eles vislumbraram um faturamento que, antes, não era fácil de imaginar. Para chegar a esse ponto, as empresas de internet ouviram os usuários e alinharam seus produtos e serviços à demanda de mercado. Se inovar é palavra de ordem para as empresas bem-sucedidas, apostar em produtos que solucionem problemas é o motor propulsor da inovação.

Foi assim na Life, que iniciou suas atividades na época da internet discada, evoluiu, em 2003, para fornecimento via rádio e migrou para cabo e fibra ótica. “Em 2010, fizemos a primeira cidade 100% de fibra ótica, mas, na época, não tinha GPON. Comprávamos switches óticos e colocávamos armários nos postes para chegar com a fibra ótica à casa do cliente e depois Ethernet. Fizemos em Garça e depois Marília [ambas cidades no estado de São Paulo]”, conta o diretor-administrativo, Alair Mendes Fragoso.

Em 2011, após o governo liberar para as empresas o provimento de telefonia fixa, a Life deu mais um passo ao obter licença para STFC (Serviço Telefônico Fixo Comutado) e começar a operar com telefonia fixa. A licença para SeAc (Serviço de Acesso Condicionado) veio em 2014, quando o provedor expandiu o portfólio, incluindo IPTV. “Fomos uns dos primeiros a trabalhar com IPTV no Brasil”, ressalta.

De dois anos para cá, a Life decidiu mudar a estratégia e ofertar outros serviços. “Vimos que passar cabo não estava dando mais, porque toda cidade tem provedores e lugares que não têm mais onde passar cabo no poste”, aponta Fragoso.

Antes da pandemia, a empresa lançou um serviço de monitoramento de câmeras, começando pelo setor público, com as prefeituras. A ideia da oferta surgiu a partir da observação do mercado. “Percebemos que o pessoal que instala câmera IP vendia o serviço, mas não fazia a manutenção, não tinha suporte”, conta, explicando que o modelo da Life é por assinatura e que, conforme o plano, os clientes podem acessar as imagens das câmeras, que ficam armazenadas em servidores da Life.

A Life não parou aí. Olhando para o mercado doméstico, a provedora lançou um serviço de gerenciamento das redes internas. Com o aumento de dispositivos conectados ao Wi-Fi, a configuração é chave para que a velocidade contratada seja a percebida pelos clientes dentro de suas casas. “Lançamos um produto de configuração e suporte para cuidarmos da rede da casa da pessoa. Por exemplo, há casas que precisam de mais de um roteador ou de redes mesh. É o Home Life, e temos planos diferentes, de acordo com a quantidade de equipamentos ou suporte que o cliente precisa”, detalha.

A oferta foi lançada no fim de 2019 e, com a necessidade de isolamento devido à Covid-19, caiu no gosto dos clientes. “Antes da pandemia, as pessoas ficavam vendo WhatsApp, Facebook no celular, mas, quando foram todos trabalhar e ter aulas em casa, o negócio ‘pegou’ para as redes. Tivemos uma demanda grande”, relata Alair Fragoso.

Em 2020, segundo o diretor-administrativo, a Life aumentou em 50% sua base de assinantes. A estratégia consiste em melhorar a experiência do cliente com a internet contratada. Para tanto, são feitos análise e um projeto da casa para saber quantos roteadores são necessários para montar uma rede que atenda ao consumo. “Instalamos, monitoramos e cuidamos da rede, inclusive, remotamente. Estamos trabalhando e melhorando os sistemas para que, se o cliente tiver qualquer problema, um alarme soe para nós antes de o cliente sequer notar”, completa Fragoso.

Em paralelo, a Life criou uma solução para condomínios autônomos, nos quais é o próprio morador que faz o controle de acesso, abre o portão, acompanha a movimentação pelas câmeras etc. “Temos avançado neste mercado e agora estamos acertando também para IPTV, com essa abertura que a Anatel e a Ancine propuseram, que a TV por streaming é SVA (Serviço de Valor Agregado) e não SCM (Serviço de Comunicação Multimídia)”, adianta.

O CAMINHO DA EXPANSÃO

A evolução dos provedores de internet vai em direção da expansão do escopo e do portfólio. Essa abertura de serviços e produtos faz o tíquete médio aumentar, além de levar a uma fidelização maior. Até porque, com a chegada das redes neutras, cedo ou tarde, a presença física de redes enormes de fibra ótica não será mais um diferencial. “Cuidar da última milha, da assinatura do cliente, é mais difícil do que ter a rede”, enfatiza Alair Fragoso.

Além disso, o aumento da concorrência no provimento unicamente do acesso à internet tende a cair em uma briga de preço. Ao entrar nessa seara, o provedor se vê diante de um tíquete médio que vai se reduzindo mês a mês. Por isso, é importante contar com outros produtos para superar essa queda nos preços. “Acredito que os provedores vão precisar buscar novos produtos e serviços para ter pacote para assinante”, pondera Fragoso, da Life, que também está entrando na telefonia móvel a partir de parceria com a Surf Telecom.

“O provedor de internet tem de ir além do telhado (wireless) e do muro (fibra ótica)”, resume Fabiano André Vergani, CEO da Bitcom, que também se reinventou para “invadir” a casa do cliente provendo serviços

“Os provedores vão precisar buscar novos produtos e serviços para ter pacote para assinante.”

ALAIR FRAGOSO Diretor-administrativo da Life

inteligentes, como a transformação da televisão convencional em inteligente, fechadura digital e assistente virtual. Mas tudo, ressalta Vergani, precisa estar muito bem conectado a um bom Wi-Fi.

A Bitcom apostou no roteador mesh Twibi,da Intelbras, um sistema Wi-Fi inteligente que distribui sinal com mais alcance de cobertura, eliminando os pontos cegos onde a conexão não chega. O provedor, que tem 26 anos de atuação, começou comercializando equipamentos como computadores, na sequência entrou na oferta de conexão internet e por muitos anos esteve focado no acesso.

“Em 2012, entendemos que estávamos fazendo errado e que precisávamos voltar a estar na casa do cliente, porque somente assim poderíamos fidelizá-lo. Usamos nosso antigo conhecimento de informática, de compra e venda de equipamentos. O cliente não tem dono, mas tem necessidades; e as casas inteligentes precisam de pessoas que conheçam tecnologia para instalar tudo, e é um técnico de TI e não de telecom quem faz isso”, explica, ressaltando que a Bitcom é, desde seu surgimento, uma empresa de TIC (Tecnologia da Informação e Comunicação).

Mais recentemente, de uns cinco anos para cá, a Bitcom começou a surfar a onda da Internet das Coisas. “Vamos além do cabo, adentramos a casa do cliente, seja com ferramentas como inteligência artificial, fechaduras digitais, Wi-Fi de ultra velocidade... Fazemos projetos para as casas terem Wi-Fi em todos os cômodos e temos expertise porque somos TIC”, enfatiza Vergani.

A Bitcom conta com dois tipos de profissionais: o de telecom tradicional e o especializado em TIC. A empresa criou, inclusive, uma nomenclatura para chamar o técnico especialista: é o Doutor Bitcom. A expansão abrangeu ainda a venda de equipamentos para casa digital em marketplace desde 2018. A empresa comercializa produtos Intelbras. “A indústria nacional ‘tropicaliza’ os produtos e eles cabem melhor no bolso do brasileiro”, justifica o CEO.

Hoje, a Bitcom é um grupo com atuação em diversos segmentos: para além do provimento do acesso à internet, há loja em formato de container com showroom de serviços e produtos da casa digital em Caxias do Sul (RS), atendimento para transformação das residências para se tornarem inteligentes e também um braço que atende ao mercado corporativo.

O CEO diz que não vai parar de prover o acesso, mas quer ser o ‘Posto Ipiranga’, não vendendo apenas internet, mas todo o entorno dela. “Na minha opinião, 95% do mercado – para não dizer mais – é de empresas focadas apenas no acesso, mas o acesso é commodity, é comum e, hoje, você tem à frente da sua casa umas três, quatro empresas para fazer isso. Estamos colocando esforço em não ficar apenas no acesso e, desde 2012, temos diversificado o business, trazendo multiprodutos e serviços, com os pilares sendo a internet e a tecnologia”, detalha Vergani.

O CEO da Bitcom sublinha que essa guinada é essencial para os provedores de internet saírem da briga pelo menor preço no acesso. “Indo para o serviço de valor agregado, não vamos mais falar de preço, mas de valor. Temos de ser alguém reconhecido como resolvedor de problemas, e por isso colocamos o nome Doutor Bitcom. Se o cliente não visualizar o valor e você entregar valor, sua empresa será vista como mais uma na prestação de serviço e será avaliada por preço”, diz.

Entregar muito mais do que commodity é o caminho

“O provedor de internet tem de ir além do telhado (wireless) e do muro (fibra ótica).”

FABIANO ANDRÉ VERGANI CEO da Bitcom

“Estamos começando a olhar para dentro da casa do cliente.”

BASILIO R. PEREZ Presidente da BCMG Internet

que prestadoras de serviços de internet têm percorrido para se manterem relevantes, fidelizando clientes e aumentando faturamento.

EXTENSÃO DA OFERTA

Assim como nos casos da Life e Bitcom, a trajetória da BCMG Internet foi marcada por identificar nichos de mercado e expandir os serviços. Basilio R. Perez, presidente, conta que a empresa começou em 1995 com acesso discado e passou por todas as tecnologias e tipos de serviços que vieram da internet. Indo além do acesso (que era discado no início), o provedor tem oferta de hospedagem e colocation em datacenter.

Atualmente, depois da migração do rádio para fibra ótica, quase a totalidade dos acessos é por meio da fibra. Em rádio, sobraram alguns clientes corporativos e poucas dezenas de clientes pessoa física em locais onde não há opção de levar fibra ótica.

“Estamos começando a olhar para dentro da casa do cliente. Chegamos com fibra e velocidades altas, mas têm problemas com roteador”, diz. Sem a configuração adequada e mesmo uma análise da rede interna, a velocidade pode ficar reduzida e o cliente não usa toda a velocidade que contratou. “Tem ficado frequente reclamarem que a velocidade não alcança. Por isso, começamos a oferecer o roteador na casa do cliente e a fazer conexões de cabo de rede, por exemplo, se o cliente é gamer. Esse serviço na casa faz o cliente ter resposta e satisfação melhores”, destaca Perez.

Ele conta que, hoje, mais da metade da base da empresa está sendo atendida por esse serviço, mas ressalta que são necessários investimentos para tanto. “Tem de colocar roteador bom, não adianta levar roteador barato. Temos tentado levar roteadores que são gerenciados pelo provedor, são mais caros e exigem investimentos altos, mas o resultado é bom. Notamos que o cliente fica satisfeito e podemos dar um suporte melhor, por exemplo, entrando no roteador, vendo quantos dispositivos estão conectados e resolvendo problemas.”

Orientar o usuário, aliás, tem sido papel dos provedores de internet desde o começo da conectividade de dados. “Levamos o cliente pela mão para mostrar como funciona. Quando começamos a internet no acesso discado, isso era ainda mais frequente. Tínhamos de ir à casa do cliente configurar o Windows. Hoje em dia, o suporte remoto faz muita coisa”, lembra.

Com relação ao modelo de negócios, Perez explica que os planos atuais incluem roteador compatível com a velocidade contratada. Contudo, se o cliente quiser usar o roteador dele, fica sem o suporte. “Mas não é a maioria; a maioria prefere saber que o provedor está cuidando da rede Wi-Fi dele”, diz.

Segundo Perez, 100, 200 megas ou 1 giga não é o mais importante. “O uso não está relacionado à velocidade contratada. Normalmente, esses clientes usam a mesma quantidade. É a experiência e a latência que contam. Por isso que o foco na casa do cliente é muito importante para levar a percepção de qualidade e garantir que a casa esteja coberta pelo Wi-Fi”, destaca.

A chegada dos equipamentos prontos para Wi-Fi 6 deve melhorar ainda mais esta percepção. Outro ponto levantado por Perez é com relação à interferência – e para isso o trabalho do provedor é essencial. “O problema é a interferência, por exemplo, com apartamentos do lado, mas as novas frequências de Wi-Fi vão dar mais canalização e será possível ter canais dentro da residência que não vão conflitar com equipamentos do lado, de cima”, analisa. •

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