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Entramos em campo pela primeira vez a 12 de outubro de 2020, num jogo que irá ser repetido a cada dois meses. Envergamos a camisola dos adeptos, sempre acompanhados pela bandeira, que é o símbolo de uma cultura comum a todos nós. O nosso cântico é a comunicação e a nossa mensagem une as vozes da expressão cultural, do passado ao presente, acrescentando a vontade de construir um futuro. Foram vários os projectos que nos antecederam, projectos fortes e historicamente importantes, tanto na divulgação como na construção em prol dos movimentos dos adeptos, essencialmente na subcultura Ultra. Quantos não sentiram a força da sua influência? E ainda hoje temos nesses projectos pedaços da nossa memória colectiva. Mas este é um campeonato duro e essas equipas nem sempre conseguiram os apoios que mereciam, talvez porque é mais fácil apontar o dedo do que partilhar os esforços, talvez por outros motivos. Seja como for, a todos eles prestamos o nosso reconhecimento pelo valioso contributo à nossa cultura. A fanzine Cultura de Bancada, apresenta-se num formato digital e nasce da necessidade de alguns adeptos quererem combater a lacuna que temos na comunicação da nossa cultura. Hoje mais do que nunca, temos acesso a todo o tipo de informação, mas na nossa opinião não estamos a tirar o melhor proveito dessa vantagem. Com o aparecimento das redes sociais alterou-se totalmente o paradigma da comunicação, só que nem assim a expressão do adepto tem tido grande evolução. Acreditamos por isso que o adepto tem algo mais a dizer e esperamos que este projecto consiga responder, em parte, a essa vontade.
Que comece o jogo!
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COLABORADORES
J. Lobo L. Cruz G. Mata J. Sousa R. Martins J. Monteiro J. Leite S. Frias
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Apresentação da Fanzine
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Colaboradores
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Editorial
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História do movimento organizado de adeptos em Portugal
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História dos campos e estádios de futebol
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História das fanzines portuguesas sobre adeptos
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À conversa com a APDA
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Memórias da bancada
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Resumo época 2019/2020
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Entre o céu e o inferno
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Uma lei com cartão
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Cultura de adepto: Livro “Claques de Futebol”
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O COVID 19 visto da bancada
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Nesta primeira edição escolhemos uma série de temas para servirem como ponto de partida ao nosso projecto. Falamos sobre o início do movimento organizado de adeptos em Portugal, como da casa de todos os adeptos, os estádios, mais propriamente as bancadas. Passamos a uma revisão histórica das fanzines de adeptos em Portugal. Em seguida, entrevistamos a APDA, associação que trabalha em prol da representação e defesa dos adeptos. Não deixamos de rever momentos passados dos adeptos. Trouxemos duas visões paralelas, mas com sentidos inversos, de dois adeptos de clubes com história em Portugal. Depois, um artigo informativo sobre o Cartão do Adepto, intitulado de “Uma lei com cartão”. Houve ainda tempo para um espaço que fará parte das próximas edições, dedicado à expressão da cultura do adepto, desta vez escolhemos o livro “Claques de futebol”, da autoria de Daniel Alves Seabra. Quase a terminar, deixamos um artigo de opinião sobre a realidade que o Covid-19 criou e finalizamos com um “cantinho” destinado aos colaboradores deste projecto. Este é o nosso contributo para a causa do adepto. Do adepto, para adepto... por uma bancada mais forte!
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final dessa competição e mobilizaram-se de forma histórica. Associaram uma letra criada por eles, ao som de uma música popular, tirada de um filme nacional, algo que foi difundido pela cidade através de altifalantes suspensos num jipe. Foram espalhados cerca de 10 mil cartazes com um programa de organização da deslocação até Lisboa, que serviu de guia para um cortejo que se iniciou no Terreiro do Paço
No nosso País a tradição do Futebol desde cedo foi grande, entusiasmando o povo e movimentando sempre um número considerável de adeptos e curiosos. Mesmo assim, fruto das dinâmicas de comunicação da época, poucos registos existem em relação ao “jogo jogado” fora das quatro linhas. Dentro das nossas possibilidades, iremos revelar algumas curiosidades dos anos em que o “passa a palavra” era o processo mais influente. Em junho de 1943, o Vitória Futebol Clube disputou a final da Taça de Portugal, no Campo das Salésias, frente ao Benfica. Era a segunda vez que os adeptos sadinos iriam ver o seu clube a disputar a
e terminou na Praça dos Restauradores, onde depois os setubalenses apanharam eléctricos e autocarros até às Salésias. De registar que de Setúbal também partiu um barco a vapor cheio de vitorianos. “Reza a lenda” que em 1961, no dia em que se disputou a final da Taça de Portugal, no Estádio das Antas, entre o Porto e o Leixões, houve uma imensa romaria leixonense que percorreu a pé os cerca de 10 quilómetros, que dividem o centro de Matosinhos das Antas, para poderem apoiar o seu clube. São histórias que nos levam a crer que nelas estão representadas alguns dos primeiros grandes cortejos de adeptos em deslocação. Pelo que nos foi possível apurar, foi no início dos anos 70 que chega a Portugal o conceito de grupo organizado de adeptos, que tinham como objectivos o apoio e o embelezamento da bancada,
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por influência das “torcidas” que já existiam no Brasil O relato que encontramos é sobre “um grupo de estudantes brasileiros que tinham o nome de Vapores do Rego e que animava os jogos do Sporting Clube de Portugal com o seu alegre ritmo na bancada superior sul do saudoso estádio José de Alvalade em Lisboa”. Este grupo também seguia o clube de Alvalade fora de portas, tanto em Portugal como no estrangeiro, em viagens que eram feitas em comboios, autocarros e aviões. Poucos anos depois,
no ano de 1976, após a ideia ser fomentada entre amigos do Colégio São João Brito, dois filhos do então presidente do S.C.P. (João Rocha) fundaram a Juventude Leonina. Inspirados no espectáculo que viam através dos seus antecessores e das torcidas brasileiras, inicialmente tinham como imagem de marca o entusiástico apoio vocal e uso de bandeiras. A Juventude Leonina também inspirou vários grupos de jovens de outros clubes a seguir o mesmo caminho, como é prova os nomes que surgiram logo no início dos anos 80. Em 1979, através de um grupo de dissidentes, apareceu uma nova claque. Eram jovens adolescentes, que até aí eram membros activos da J.L., mas queriam fazer mais e melhor no apoio ao S.C.P., dando assim início à Força Verde. Estes trouxeram algumas novidades para
o espectáculo de bancada, como as bandeiras gigantes hasteadas em canas da Índia, efeitos de fumos feitos com farinha e póde-talco e registos de associados. A primeira “trasferta” feita de “bus” organizada por uma claque deveu-se a uma pareceria entre Força Verde e Juve Leo, que mobilizou 100 elementos ao Bessa em 2 autocarros, isto em fevereiro de 1984. No início dos anos 80 deu-se o boom dos grupos organizados de adeptos com o aparecimento da Juventude Bracarense (1981), Diabos Vermelhos (1982) Dragões Azuis (1982), Força Azul (1982), Labuta Juventude Vitoriana (1983), Torcida Verde (1984), Fúria Azul (1984) Panteras Negras (1984), os Marafados (1984) e a lista podia continuar. A partir daí, a influência do movimento Ultra, proveniente de Itália, começou a ser mais sentida do que a influência das torcidas brasileiras. Isso sem esquecer o movimento Hooligan, inspirado em Inglaterra, que também teve o seu peso na matriz de alguns grupos. Os anos 80 e 90 a revelarem-se como um período importantíssimo na evolução deste movimento, com o aparecimento de muitos novos grupos, nas diversas divisões. Os grupos históricos com maior longevidade, que permanecem no
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activo são: Juventude Leonina de 1976, Diabos Vermelhos de 1982, Torcida Verde, Fúria Azul e Panteras Negras de 1984; Mancha Negra e Alma Salgueirista de 1985; Super Dragões de 1986, Desnorteados e Fama Boys de 1990, Ultras Ermesinde, No Name Boys e Red Boys de 1992, Insane Guys e South Side Boys de 1994; Colectivo Ultras de 1995. L. Cruz e J. Lobo
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Quando o futebol ainda estava a dar os primeiros passos, no caminho de se transformar naquilo que conhecemos hoje, os jogos decorriam em campos que habitualmente estavam inseridos em parques públicos. Porém, à medida que o jogo crescia em popularidade, os únicos locais preparados, onde os clubes de futebol podiam acomodar razoavelmente uma multidão, eram campos de críquete ou atletismo
criados para a prática desses desportos. O primeiro campo a ver uma partida de futebol foi o Sandygate, casa do Hallam FC, sendo reconhecido pelo Guinness Book of Records como o “campo mais antigo do mundo. Inaugurado a 1804 para a prática de cricket, acolheu em 1860, ano em que o Hallam FC cria a sua equipa de futebol, a partida que os pôs frente a frente com o Sheffield FC, um clube nascido a 1853, o primeiro clube de futebol do mundo. Por curiosidade, acrescento que o Field Mill, atualmente conhecido como One Call Stadium, afirma ser o campo de futebol mais antigo onde se praticou futebol. Há relatos que sugerem que o futebol já era jogado naquele campo em 1850. Embora seja geralmente aceite que 1861 é o primeiro ano em que se pode provar oficialmente que lá decorreu uma partida de futebol. No começo eram campos sem separações físicas das zonas dos adeptos, mas com o crescente número de adeptos, sofreram algumas alterações, começando pela construção de barreiras que funcionavam como separadores para entre o terreno de jogo e o público e posteriormente pela construção das primeiras bancadas. As primeiras bancadas teriam sido construídas em “degraus de terra” ou até em madeira, visto que eram materiais fáceis de ad-
quirir. Desta forma era possível que os adeptos que estavam mais atrás conseguissem elevar-se para visualizar o jogo de um modo decente.
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Mas fruto de alguns acontecimentos e do próprio processo evolutivo, essas frágeis plataformas, deram lugar a construções mais sólidas e seguras para poderem albergar grandes multidões. Um caso que ficou na história e teve peso para essa evolução foi a tragédia de Ibrox Park, casa do Rangers FC. Inaugurado em 1899, foi vítima de um grande desastre a 1902, durante um jogo que colocou frente a frente as selecções da Escócia e de Inglaterra. Com uma audiência a ultrapassar os 68.000, outras fontes falam em quase 80.000, que era a lotação do estádio, uma parte da bancada de madeira desabou, tendo provocado a morte a 25 adeptos para além de ficarem feridos mais de 500.
Fizemos uma pesquisa, dentro do contexto Português, e de seguida identificamos vários dos primeiros campos nacionais com bancada. Em seguida iremos apresentar essa lista, para dar a conhecer um pouco dos tempos em que os clubes começavam a crescer. A adquirir as suas próprias instalações, ou a simplesmente a melhorar as que já tinham. Mas na grande maioria dos casos deixando para trás os primeiros campos como por exemplo os matadouros, praças de touros, jardins públicos ou de conventos, hipódromos… A bancada é o nosso “habitat” e
sem ela o jogo não era o mesmo, a nossa vida não tinha o mesmo sentido. • Campo da Rua Rainha: Foi o primeiro campo do F.C. Porto, tendo o mesmo sido utilizado entre 1906 e 1912. Possuía um terreno de jogo com as medidas oficiais, uma bancada para cerca de 600 adeptos, uma pista de Atletismo, bufete, balneários, chegando mais tarde a receber um “court” de Ténis, um campo de Cricket e um ginásio.
• Campo do Sítio das Mouras: Inaugurado a 04/07/1907, este foi o segundo campo do Sporting C.P. Num pavilhão continha balneários, salão de jogos, sala de estar e cozinha. Além de campo de Futebol, tinha duas quadras de Ténis e pista de Atletismo. Cinco anos mais tarde, várias remodelações foram feitas, inclusive a construção duma bancada com capacidade para 600 adeptos. A partir de 1917, o S.C.P. destinou-o à utilização das camadas jovens, tendo lá jogado também a C.U.F. de Lisboa e o Lumiar-A. • Campo do Bessa: Perante cerca de 2 000 adeptos, no dia 11/05/1910, realizou-se a inauguração deste recinto, numa partida que pôs frente a frente o Boavista F.C.
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e o Leixões S.C.. Tinha uma tribuna feita de madeira, que era complementada por decorações em tecido, para pouco mais de vinte adeptos, tendo peão em redor do resto do campo. Em 1972, após várias remodelações, foi elevado a estádio, estando até hoje no activo e tendo recebido muitos jogos das competições europeias, incluindo alguns do Euro 2004. • Campo da Ínsua dos Bentos: Foi o primeiro campo da A. Académica de Coimbra, clube que disputou o seu primeiro jogo aí contra o Ginásio Club de Coimbra (1-0), em 28/01/1912. Um dos jogos mais emblemáticos lá disputados foi a meia-final do extinto Campeonato de Portugal (a actual Taça de Portugal), em 1923, entre Sporting C.P. e F.C. do Porto. • Campo da Constituição: Este campo foi inaugurado a 01/01/1913, sendo então o segundo campo do F.C. do Porto, em jogo frente ao Oporto Cricket and Lawn-Tennis Club. Palco dos primeiros títulos portistas, tinha uma bancada de madeira ao longo de toda a lateral esquerda do terreno. Recebeu também jogos de Andebol de 11, Hóquei em Campo, provas de Atletismo e jogos de Hóquei em Patins num ringue anexo. Em 1952, o mesmo já não tinha capacidade suficiente para receber todos os adeptos ao domingo, levando a que o F.C. do Porto deixasse de lá jogar.
• Campo de Sete Rios: A 12/10/1913, num “derby” contra o Sporting C.P., o S.L. Benfica inaugurava o seu terceiro campo, perante cerca de 5 000 adeptos. Nessa altura, o campo tinha pouco mais do que um “chalé” de madeira, onde estavam incorporadas instalações de banho para os jogadores e casas de banho. Em 1915, pela primeira vez na sua história, o clube dotou o recinto de bancada e também de um “court” de Ténis e piscina para a prática de Natação e Polo Aquático.
• Santo Stadium: Mandado construir por Manuel Santo (daí o seu nome original) em 1922, foi inaugurado em Maio de 1923, aquele que hoje em dia é chamado de Estádio de São Luís. A 24/06/1923 recebeu a final da segunda edição do Campeonato de Portugal, tendo o S.C. Farense começado a usar as instalações a partir de Setembro de 1924, algo que acontece até aos dias de hoje. • Campo do Ameal: Pertencente ao Sport Progresso, este campo foi inaugurado a 10/06/1923, numa cerimónia e jogos onde participaram o Boavista F.C., S.C. Salguei-
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ros e F.C. Porto. Tinha uma bonita bancada em madeira, onde se destacava um relógio no topo da cobertura. Lá jogaram-se desafios internacionais da selecção nacional de Futebol, tal como uma final do extinto Campeonato de Portugal. Acabou destruído pelos adeptos progressistas no ano de 1938, de forma a que o F.C. Porto perdesse o interesse em comprar o campo, numa altura de graves problemas do Sport Progresso. • Estádio do Lima: Propriedade do Académico F.C., foi inaugurado em 1924. Fruto das remodelações que recebeu em 1937, o clube portuense viu o seu espaço apetrechado com o primeiro campo relvado nacional, pista de Atletismo, pista de Ciclismo e de bancadas de cimento, algo incomum à data em Portugal. Durante vários anos, recebeu alguns jogos da selecção nacional de Futebol e do F.C. Porto. • Campo da Tapadinha: Esta foi a primeira casa do Carcavelinhos F.C.. A 27/07/1926, para comemorar a inauguração, vários jogos foram disputados entre os anfitriões, o Sporting C.P., o Casa Pia A.C. e o União de Lisboa. Ao centro de uma lateral estava localizada uma tribuna e à volta do resto do campo era o peão. Em 1945, foram realizadas modificações profundas, passando então ao belo estádio que é até hoje casa do Atlético C.P., “filho” do Carcavelinhos.
• Campo dos Barreiros: A actual casa do C.S. Marítimo, foi inicialmente posse do rival C.D. Nacional. Os alvinegros adquiriram o terreno em 1923 e dois anos depois deram início às obras. A 26/06/1927, este campo foi inaugurado em jogo contra o Vitória de Setúbal, contando então com um terreno de jogo com medidas oficiais, uma bancada central e outra atrás da baliza a sul. Em 1933, o Nacional acabaria por perder esse património por causa de problemas financeiros. Durante muitos anos o campo esteve ao serviço do desporto, sob jurisdição de dois empreiteiros e mais tarde tornou-se posse da Câmara Municipal do Funchal, que acabou por fazer profun-
das remodelações e inaugurou o Estádio dos Barreiros, com várias bancadas, com capacidade para receberem 17 000 adeptos, isto em 05/05/1957. • Campo das Salésias: Inaugurado a 29/01/1928, foi uma mítica casa d’Os Belenenses e da selecção nacional de Futebol. Desde logo teve bancadas em cimento, algo pioneiro em Portugal. Em 1935, construíram-se as coberturas das bancadas e dois anos depois oferecia condições para receber mais de 20 000 adeptos, além de ficar apetrechado com terreno relvado, casas de banho para ambos os sexos, balneários, posto de saúde, várias cabines de apoio, tal como um campo secundário,
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pista de Atletismo, pista de Ciclismo, ginásio, campos para outras modalidades e sala de troféus. Recebeu vários jogos da selecção nacional de Futebol, tendo recebido também o primeiro jogo internacional de Andebol realizado em terras lusitanas. Em 1956, os poderes públicos forçaram a saída do clube de Belém, ficando o campo inutilizado até 2016, quando ganhou nova vida, após a reabilitação para as camadas jovens d’Os Belenenses. • Campo do Benlhevai: Foi neste campo que o Vitória S.C. tornou ainda mais forte a ligação ao povo da sua cidade, a partir da sua inauguração em 24/1/1932. Nesse dia receberam o S.C. Salgueiros, perante cerca de 3 000 adeptos. O campo continha um balneário, vestiário, mictórios e bancadas.
• Campo de Santana: Inaugurado a 08/11/1936, tinha uma bancada de madeira ao longo de toda uma linha lateral, estando o resto do campo circundado de peão. Tinha capacidade para albergar mais de 10 000 adeptos e chegou a receber um jogo que figura até hoje nos recordes da UEFA, no qual o Leixões conseguiu fazer uma das maiores reviravoltas de sempre das competições europeias, em jogo a contar para a Taça das Cidades com Feira. J. Lobo e L. Cruz
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Segundo a definição, uma Fanzine é uma “publicação periódica alternativa, destinada aos fãs de determinada manifestação cultural.” O mundo Ultra, em Portugal, sempre teve os seus registos, mais ou menos organizados, em várias “Páginas Ultras”. Podemos dividir estas publicações em 2 grandes grupos, um mais generalista onde as publicações eram realizadas para todos os interessados independentemente dos grupos a que pertenciam e as outras que eram as fanzines dos próprios grupos, sendo que estas eram mais direcionadas para os elementos dos próprios grupos. De salientar que ainda hoje encontramos colecionadores que buscam estas publicações. Os primeiros registos surgiram em páginas de jornais, sendo que o pioneiro foi Luís Américo com a sua rubrica “A Voz das Claques” no jornal Record, decorria a época 1991/92, semanalmente o jornal dedicava uma página inteira aos Ultras. Posteriormente, o Jornal O Jogo também dedicou uma página às Claques, com “O Jogo das Claques”, durante um ano e meio, responsabilidade de Rodrigo Saraiva. O mesmo Rodrigo Saraiva, conjuntamente com Nuno salvador, foi responsável pela “Coluna
Ultra”, que durou apenas sete edições, na extinta Gazeta dos Desportos. De todos as páginas publicadas em jornais, a que mais durou foi a “Tribuna das Claques”, editada no jornal O Norte Desportivo e o principal responsável foi novamente o Luís Américo que posteriormente passaria para o Pipa e finalmente foi responsabilidade de um jornalista do próprio jornal. A nível regional, o Correio d´Almada, publicou dez números da página quinzenal “Sempre Fiéis”, o seu autor era Emanuel Lameira. Nas Caldas da Rainha, foi publicada, no Jornal das Caldas, ao longo de 38 semanas, a página “Mundo Ultra”, responsabilidade de Ricardo Pais; e na Gazeta das Caldas, 5 números da “Voz das Claques” cujo autor foi Filipe Azevedo, de salientar que em 1995, estas duas páginas foram compiladas numa fanzine (Super Zine) de formato A4. Também no estrangeiro, mais propriamente no jornal Noticias do Luxemburgo, foi publicada a rúbrica “Geração Ultra”. Passando propiamente às Fanzines, a primeira que conseguimos identificar foi a “Voz da Curva”, decorria o ano de 1991, realizada por Ricardo Costa e com 2 números lançados. Da fanzine “Fanáticos”, primeiro em formato fanzine e depois em formato revista, foram editados 3 números ao longo dos anos 1993 e 1994, estando a mesma a cargo de Jorge Costa, Jorge Paulo e Tuta & Lacas. A primeira “grande” publicação Ultra em Portugal, foi a conhecida “Ultra Um Modo de Vida”, que teve os primeiros 7 números em formato fanzine, de outubro de 1993 a setembro de 1995, passando depois a formato revista entre novembro de 1995 e setembro de 1996, com mais 5 edições, Miguel Saial foi o seu mentor. “Curva Europeia” era uma zine com muitas páginas, que muito prometia,
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mas que apenas teve um número, em janeiro de 1994, a mesma estava a cargo de João Alexandre, Hélder Rodrigues e Nuno Costa. Em Vila Nova de nasceu um projeto que saiu logo em formato revista, tinha por nome “Curvas” (mas apenas conhecemos o nº 0 de dezembro de 1994) e os responsáveis eram Cristiano Almeida e Paulo Teixeira. De Ermesinde, entre 1994 e 1995, a fanzine “Ultras”, que ao longo de 5 edições se apresentava como o jornal mensal do Mundo Ultra. Com pouca informação, temos 2 números da “Fanatic Mag”, não tendo referência dos anos em que foram editadas, os seus criadores foram João Bem e João Freire e é originária de Ílhavo. Entre fevereiro e abril de 1995 foram editados 2 números da “Ultras Magazine” responsabilidade de Bruno Correia, Hugo Santos e Sérgio Teixeira. Em abril de 1995 foi lançado o primeiro número (e julgamos que único pois os seguintes já seriam catálogos da loja) da zine “Portugal Ultra”, editada pela conhecida loja de material Ultra portuguesa. Bruno Correia e Sérgio Teixeira editaram uma edição, em 1995, do “Catálogo Ultra”. Idealizada pelo saudoso Gullit, saiu em agosto de 1995, o nº1 da revista “Sempre Presentes”, que ao que julgamos saber foi número único. De Leiria surgiu a fanzine que mais durou nesse formato, a “Sempre Fiéis” que entre 1995 a 1998 contou com 18 edições. Super Ultra, que surgiu em agosto de 1995 e durou ate outubro/novembro de 1999, 33 números que foram saindo com uma periocidade irregular, após os 4 primeiros números a fanzine passou a formato de Revista, foi provavelmente a revista mais importante no crescimento das claques em Portugal, o seu diretor era Nuno Manaia Costa. Pedro Miguel, de Aveiro, foi quem
realizou a “Mundo Ultra” que entre 1996 e 1998 contou com 10 edições. De Olhão surgiu a Ultra, com o seu primeiro número editado em setembro de 1998 e que durou até junho 2004, tendo apenas sido editados 10 números, em vários formatos e tamanhos, incluindo uma edição em papel de jornal, Miguel Saial foi o seu primeiro diretor, sendo que na última edição o diretor era Manuel Soares. Luís Monteiro e Manuel Soares foram os responsáveis pela criação da “Ultras Magazine” que contou com 7 números, entre fevereiro de 2000 a março de 2001. A fanzine/revista que contou com mais edições em Portugal foi a “Adeptos”, com mais de 50 edições, entre fanzines, revista e revista digital, entre fevereiro de 2003 e fevereiro de 2017, Luís Monteiro foi o seu criador. Já mais recentemente, em 2006 e 2007, através do blog Claques de Portugal, foram lançados 2 números de uma fanzine com o mesmo nome. Com 2 números lançados, em maio de 2009 e abril de 2010, no Porto temos a “Jogador 12”, sendo que ambas as edições foram em formato revista. Nos últimos anos assistimos ao decréscimo do número destas publicações, os motivos poderão ser vários, entre eles o “cansaço” de quem as realizavam e a falta de interesse e falta da “cultura do papel” da nova geração, que prefere usar os meios digitais para aceder às informações. A nível de grupos ainda existem algumas publicações ativas (sendo o Azulão da Fúria Azul a mais antiga ainda em atividade), no entanto Fanzines/Revistas generalistas, neste momento, em Portugal não temos nenhuma (ou melhor não tínhamos até ao surgimento da “Cultura de Bancada” que aproveita para parabenizar e desejar muito sucesso e acima de tudo muitos anos de vida). Raúl Rodrigues
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de dar a conhecer este projecto. A APDA nasce da vontade de um grupo de adeptos, que sentiu um vazio de representação naquilo que era uma série de preocupações nossas. Sentíamos que não tínhamos voz, não tínhamos nenhuma plataforma que falasse em nome dos adeptos, de forma independente. Para nós, havia um lugar vazio de representatividade relativamente aqueles que no fundo, são verdadeiramente a alma do futebol. Aos adeptos faltava uma voz.
A equipa Cultura de Adepto saúda a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, os nossos primeiros convidados para a rúbrica “À conversa com...”. É uma honra receber o vosso contributo. Fundada a 17/06/2016, têm como princípios a independência, o rigor e a união. A APDA tem expandido gradualmente o seu raio de acção, tendo estado presente por algumas vezes no parlamento a defender os adeptos, algo que fez igualmente nas entidades que tutelam o desporto e até mesmo em vários órgãos de comunicação social. A primeira manifestação nacional de grupos de apoio foi organizada por esta associação, estando neste momento em acção uma recolha de fundos para avançarem com uma acção no Tribunal contra a lei do Cartão do Adepto.
A APDA é uma associação de adeptos para adeptos, sentem ter legitimidade para defender os adeptos em geral? Somos um grupo de pessoas que trabalha em prol daquilo que acredita e que pode trazer melhorias a todos os que vivem da mesma maneira que nós. Sentimos ter legitimidade para falar, e para agir, se nos derem essa confiança e se sentirem em nós um apoio e uma ferramenta para que possam ser ouvidos. Não temos qualquer presunção que representamos todos os adeptos, nem é isso que queremos assumir. Representamos interesses e causas. E essas, são comuns a adeptos de todos os quadrantes clubísticos, de norte a sul.
Que balanço fazem do vosso trabalho nestes 4 anos de existência? O que mudou desde então? Mudou tanta coisa... Quando criamos a associação, tínhamos muitas ideias, muita expectativa. Algumas ideias facilmente percebemos que seriam difíceis de concretizar. Algumas expectativas caíram por terra. Ao passo que ganhámos consciência da realidade que nos rodeia, ganhámos Como e porquê nasce a APDA? com isso as ferramentas certas para traDesde já, obrigada pela oportunidade de balhar com essa mesma realidade. Talvez expor um pouco mais a nossa existência e tenhamos trocado as gigantes expectativas
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por passos mais curtos e coesos. Aprendemos muito uns com os outros, com os contactos que fomos criando, nacionais e internacionais. Alargamos o nosso espectro e rede de trabalho e com isto conseguimos, com estes passos curtos, levar a nossa causa a adeptos, instituições, comunicação social… fomos conseguindo que fosse visto por todos que todos os nossos interesses são legítimos e merecedores de atenção. E esses passos curtos tornaram-se neste passo gigante. Além disto, e é muito importante que se refira, que o núcleo de trabalho da APDA pouco se conhecia até então. Todos nós estamos espalhados pelo país e se for preciso só nós vemos três ou quatro vezes por ano. E nestes quatro anos criamos laços entre nós de amizade e companheirismo, e também é isto que queremos continuar a semear. Consideramos ser difícil agregar os adeptos portugueses, um pequeno reflexo disso é o caso do apoio à selecção nacional. Pensam que é possível ter lado a lado adeptos de diferentes quadrantes clubísticos e ideológicos, como os que aderiram à legalização ou cartão do adepto e os que não aderiram? Se em todos os outros países da Europa é possível, aqui também o será. Feliz ou infelizmente é nos momentos de maior tensão ou repressão que tendencialmente se vê a criação de grupos em prol de algo, precisamente porque acabam por se unir interesses e forças contra determinados cenários. Em vários contextos, a própria história prova-nos isso. E apesar de em Portugal a nossa realidade não poder sequer (ainda) ser comparada com a realidade de outros países a este nível, cremos estar no bom caminho para
que exista cada vez mais uma maior agregação de adeptos de quadrantes diferentes em prol de causas que lhes são comuns. Talvez na altura da legalização não tenha sido tanto assim, por motivos vários, mas com a recente introdução do cartão do Adepto, nós próprios temos tentando, através de difusão de informação séria, clara e objectiva, propagar a ideia que é mais fácil combater o poder instituído se estivermos “divididos nas cores e unidos nos valores”. Ninguém pede que sejamos todos amigos quando nos sentamos em bancadas diferentes. Mas nestes temas que jogam sempre a nosso desfavor, já todas as forças jogam também contra nós,por isso se estivermos unidos como uma só voz, hão de ter de nos ouvir. Qual a vossa relação com os grupos organizados de adeptos? Somos uma associação inclusiva que pretende apoiar adeptos, e como tal, as causas relativas aos grupos organizados de adeptos são causas que defendemos. Até porque notamos que o grande trabalho a desenvolver em termos de mudança de mentalidades em termos institucionais tem nos Goa a maior incidência. Temos vários membros de Goa nos nossos órgãos sociais e nos nossos grupos de trabalho. Temos muito boas relações com a maioria dos grupos organizados de adeptos e é um motivo de orgulho para nós poder congregar os interesses de todos. Recentemente anunciaram que a APDA está a fazer uma recolha de fundos para conseguir obter a prestação de serviço de um advogado, de forma a entrar com uma acção no Tribunal contra a lei do Cartão do Adepto. Qual foi o vosso percurso até ago-
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ra nesta luta? O que podem adiantar-nos desta iniciativa em concreto? Em 2018 fomos ouvidos na Assembleia da República quando se deu um debate sobre violência no desporto, e para nós, esse evento foi logo uma antevisão de uma alteração legislativa. Não podíamos estar mais certos. Acompanhamos desde então todas as fases desta nova lei e apresentamos o nosso contributo fundamentado por escrito. Fomos ouvidos em audiência parlamentar por diversos deputados dos vários partidos representados na AR. Fomos ouvidos na comissão de desporto. Fomos ouvidos numa audição parlamentar. E meses depois, a lei foi promulgada. Lutámos com armas sólidas. Com conhecimento de causa. Com exemplos das melhores practicas europeias. Mas não foi suficiente. Infelizmente, ao passo que contestámos a utilidade desta medida, lutámos contra forças políticas, contra o poder instituído e fizemo-lo com toda a nossa ambição e força. Mas a implementação de ideias novas e disruptivas ainda é mais difícil quando remamos contra a maré. Mas enquanto houver quem resista, nos cá estaremos para continuar a luta. E foi por esse motivo que organizamos o crowd funding para financiar os honorários de um excelente advogado que nos ajudará a travar mais esta guerrilha. Para já, preferimos não adiantar pormenores porque poderão colocar em cheque o trabalho dos nossos advogados, mas é certo que enquanto houver caminho, nós iremos continuar a caminhar.
Para nós, o futebol é, e continua a ser dos adeptos. É provável que este futebol não seja para nós, os líricos. É provável que a perda dessa democratização leve a que estejamos a remar em círculos….é bem provável que a perda da transparência neste desporto e a perversão dos valores que existiam em outros tempos nos leve muitas vezes a pensar que nunca ganharemos determinadas batalhas. Existe de facto uma perda de democratização no futebol como causa directa da sua “evolução”, porque os valores dessa evolução, no nosso entender, estão invertidos. Aqui está o nosso lirismo. Num exemplo muito claro. A evolução trouxe como maior interesse dos clubes o lucro proveniente da venda dos direitos televisivos ao invés de privilegiar o acesso livre e popular às suas bancadas. Hoje, para um Promotor desportivo da I Liga, é na óptica financeira, mais importante ter subscritores da Sport TV do que ter o estádio cheio. Então, como é óbvio é como consequência disso, é provável que tenha um lugar na sua mesa redonda para o operador televisivo. E será que há um desses lugares para os adeptos? Ao passo que assim é, a verdade é que mesmo os subscritores da sport TV não gostam de ver estádios vazios. Claro como água, a pandemia demonstrou-nos este ponto de vista e nunca os adeptos foram tão “queridos”. Com isto queremos dizer que, apesar da nossa consciência destas matérias, talvez esta nossa perspectiva mais purista seja o último reduto da alma dos recintos desporComo veêm a perda da democratização do tivos. De outra forma, se todos nos conforfutebol como consequência da evolução marmos e resignarmos com esta evolução, do mesmo? não nos poderemos surpreender se conSomos muitas vezes apelidados de líricos. tinuarem a fazer alterações na matriz pop-
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ular do desporto. De que forma têm contribuído as sessões de esclarecimento para a difusão da vossa mensagem? As sessões de esclarecimento têm sido cruciais no que têm sido palavras de ordem para nós, como o acesso à informação por parte dos adeptos, e a liberdade para trocar ideias em ambientes sérios, descontraídos e livres de estereótipos. Temos dito muitas vezes que adeptos informados são adeptos conscientes e sempre nos quisemos assumir um veículo de informação. Hoje em dia temos adeptos muito mais informados e isso leva a que consigamos cada vez mais ser tidos em conta. Por outro lado, sentimos um excelente feedback de que nos ouve e se identifica com este projecto. Como vêem a cultura de adepto em Portugal? Na nossa visão, temos uma cultura muito rica, e cada vez mais interessada e informada. Mais uma vez, a informação e a fluidez com que circula, e sobretudo os meios quase automáticos que temos ao nosso dispor levam a que o movimento dos adeptos ganhe tracção de forma qualitativa. Neste sentido, talvez hoje em dia seja muito fácil para os adeptos, como o é em vários tipos de movimentos, ter a real noção das questões e também procurar soluções, informações e mecanismos de resposta a esses problemas. Mais uma vez, o movimento em torno do cartão do Adepto é prova disso mesmo, em detrimento do que aconteceu em 2004 com a questão da legalização. Talvez se fosse hoje, a resistência e a contestação tivessem sido mais significativas.
O que acham das fanzines enquanto meio de comunicação? Consideram ter importância para o desenvolvimento desta cultura nas pessoas? As fanzines desde cedo que ocupam lugares muito especiais na estante de muitos adeptos. Desde uma altura em que o acesso à informação não acontecia com a fluidez com que hoje se verifica, as fanzines nacionais e internacionais sempre representaram e adicionaram conteúdo interessante, no que toca a temas do quotidiano dos adeptos: desde coreografias, artigos de opinião, practicas internacionais, grupos e actividades… julgamos que, apesar de hoje em dia a informação ser cada vez mais fácil de circular, as fanzines continuam a merecer um carinho especial por parte dos adeptos e como tal, uma ferramenta informativa que lhes é muito querida. Até porque aquilo que é feito de nós, para nós, agarra logo a atenção de maneira diferente. Uma mensagem final para os adeptos? Convidamos todos os que nos lêem a visitar as nossas plataformas e a que se juntem a este projecto. Com o número, também vem a força,e como tal lançamos também o repto a que se associem à apda. Muito obrigado pelo vosso contributo para o enriquecimento do nosso projecto e pela vossa luta pelos direitos dos adeptos nacionais.
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JUVENTUDE LEONINA A ACADÉMICA C vs SPORTING CP 87/88
NO NAME BOYS HAJDUK SPLIT vs SL BENFICA 94/95
PANTERAS NEGRAS BOAVISTA FC vs VITÓRIA SC 94/95
SOUTH SIDE BOYS SC FARENSE vs FC PORTO 94/95
ALMA SALGUEIRISTA VITÓRIA SC vs SC SALGUEIROS 95/96
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DESNORTEADOS SC ESPINHO vs SL BENFICA 92/93
DIABOS VERMELHOS VITÓRIA SC vs SL BENFICA 91/92
FAMA BOYS FC FAMALICÃO vs RIO AVE FC 94/95
FÚRIA AZUL FOTOMONTAGEM ANOS 90
INSANE GUYS VITÓRIA SC vs SL BENFICA 94/95
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Numa época atípica, com uma paragem a pouco mais do início da segunda metade da temporada e com um retomar sem adeptos, consideramos que foi uma época que ainda deu para bons momentos no que respeita aos grupos portugueses. Vários protestos organizados em simultâneo com números expressivos, bons momentos de pirotecnia, espectáculos em jogos nas competições europeias, etc. Deixamos em seguida, uma lista com vários momentos, organizados por ordem cronológica.
Coreografia e pirotecnia dos White Angels a abrir encontro europeu: Vitória SC x Eintracht Frankfurt | 03-10-2019 Num jogo frente a um adversário que conta com ultras num nível elevadísismo, os White Angels abriram o encontro de uma maneira que deixaram a Europa completamente rendida. Uma coreografia bem conseguida, a incentivar a próprio pirotecnia e com uma mensagem sublime: “Under fans skills, football is better!”. Não se ficaram por aí, usaram a amarelo as letras que pretendiam para deixar uma mensagem ainda melhor no meio dessa última: “Uefa kills football”. Ao mesmo tempo, surgia um autêntico festival de pirotecnia no seu sector.
Adeptos do Vitória SC não esquecem: Vitória SC x FCSB | 29-08-2019 “Não têm nada, absolutamente nada. Corto a minha cabeça se marcarem contra nós” Foram as palavras de Gigi Becali, presidente do FCSB, após o jogo frente ao Vitória SC, da primeira mão do playoff de acesso à fase de grupos da Liga Europa. No jogo da segunda mão, a equipa Portuguesa vence por 1-0. A claque White Angels não deixou passar em branco o momento, exibindo uma tarja onde se podia ler a seguinte mensagem: “CUT YOUR HEAD IDIOT”.
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Invasão dos adeptos do Vitória SC a Londres: Arsenal FC vs Vitória SC | 24-102019 Ver no estrangeiro um sector visitante praticamente lotado quando recebe uma equipa portuguesa, que não uma das três que tem mais adeptos, é sempre uma novidade. Então se estivermos a falar num estádio com a dimensão do Emirates, em Londres, ainda ganha um destaque maior! Frente a um adversário que costuma jogar com muitos adeptos, mas muito silenciosos, os ultras do Vitória tomaram conta do apoio e foram 90 minutos onde os cânticos portugueses imperaram em terras de Sua Majestade. De salientar as “erupções” vitorianas nos momentos dos seus golos e também a um pré-jogo muito animado no exterior do estádio.
Espectáculo pirotécnico dos No Name Boys em Lyon: Olympique Lyonnais x SL Benfica | 05-11-2019 Com deslocações à Rússia, França e Alemanha, era previsível que o jogo que provocasse maiores expectativas aos benfiquistas fosse no território gaulês. Um natural bom número de adeptos presentes no sector visitante, um bom apoio e fica sobretudo a registar este momento que teve o maior destaque do jogo no que às bancadas diz respeito. Uma tochada que fez por instantes toda a atenção do estádio se virar para aquele sector encarnado...
Contestação contra a absolvição dos polícias que cegaram Jota | Novembro de 2019 Jota, adepto do Boavista, foi barbaramente agredido em Guimarães, no início de Outubro de 2015, por vários polícias antes de um jogo frente ao Vitória local. Os danos físicos foram de tal ordem, que Jota ficou mesmo cego de um olho. No dia 7 de Novembro de 2019, onze agentes da PSP que estavam a ser julgados por terem cegado Jota foram absolvidos por um juíz de instrução criminal no Tribunal de Guimarães, que optou por um “raspanete” aos vários arguidos por se estarem a encobrir de forma silenciosa, ao invés da condenação que toda a gente esperava. Imediatamente nesse dia, o Braga jogava para a Liga Europa frente ao Besiktas, sendo que no seu sector ultra já surgia uma frase contra a justiça portugesa e a incentivar Jota [“Justiça que cega. Força J”]. Na jornada dos campeonatos nacionais que viriam logo a seguir, foram vários os adeptos de diferentes clubes que reclamavam justiça para o adepto boavisteiro. De destacar que era fim-de-semana de derby entre o próprio Boavista e o Porto, destacando-se, para além da previsivel tarja de contestação dos Panteras Negras, uma mensagem de incentivo do Colectivo 95 a Jota, em pleno Estádio do Bessa.
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O expoente máximo dessa união contra a injusta decisão foi mesmo no maior derby do Minho, em Guimarães, entre o Vitória SC e o Braga. Para além das mensagens para Jota de parte a parte, desde o minuto 30 até ao minuto 31, os ultras de ambos os conjuntos juntaram-se para o cântico que tem marcado a luta contra o sistema em Portugal: “Horários indecentes, violência da polícia... querem matar o futebol!”. Abertura do derby no Bessa: Boavista FC x FC Porto | 10-11-2019 Os jogos grandes no Bessa têm sempre bons espectáculos a vários níveis, principalmente pela dimensão do topo norte onde ficam os adeptos visitantes. Na última época, o derby foi um dos expoentes máximos do que estamos a referir e o derby da Invicta teve um dos melhores inícios que há memória. Os Panteras Negras ficaram na parte superior do topo sul e misturaram vários artefactos pirotécnicos com uma grande fumarada preta. Do lado portista, as várias tochas preencheram grande parte da bancada. Espectáculo pirotécnico da facção casual
sportinguista em território austríaco: LASK x Sporting CP | 12-12-2019 A deslocação dos adeptos sportinguistas até Linz acabou por se revelar uma boa surpresa. Nem tanto pelo número como é natural, pois estávamos a meio de Dezembro e os resultados da equipa não ajudavam (perderam 3-0 neste encontro, por exemplo). No entanto, para além de um bom apoio dos vários grupos presentes no sector visitante e ainda de alguns momentos de tensão com ultras da casa, a facção casual leonina acabou por protagonizar um bom espectáculo pirotécnico que deu um bom efeito visual à bancada onde estavam! Espectáculos proporcionados pelos vários
grupos em Guimarães: Vitória SC x SL Benfica | 04-01-2020 Provavelmente as tochadas com maior impacto de adeptos visitantes em Portugal na passada época. No Name Boys e Diabos Vermelhos fizeram, em momentos diferentes do encontro, dois espectáculos de pirotec-
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nia muito pouco habituais para a realidade portuguesa. Uma maneira de abrir em grande estilo o ano civil de 2020. Do lado dos No Name, uma chuva de tochas que provocou uma “explosão” na bancada também em termos de apoio. Do lado dos Diabos Vermelhos, um registo visual muito bom como as fotografias comprovam, com a curiosidade de terem exposto, ao mesmo tempo, material conseguido aos vimaranenses. Do lado vimaranense também houve pirotecnia, tanto no sector WA como na bancada nascente. O grupo Nova Gera apresentou uma coreografia com plásticos brancos, pretos e amarelos, acompanhados da frase: “Inconfundível na cor”. Espectáculo pirotécnico na Curva Sul no
derby: Sporting SC x SL Benfica | 17-012020 Num jogo em que a Juve Leo e o DUXXI fizeram protesto contra a gestão da direcção do seu clube, ambos os grupos estiveram em silêncio durante a primeira parte e realizaram um grande festival pirotécnico logo a abrir a segunda parte do derby lisboeta. Deu um efeito visual muito bonito à bancada sul de Alvalade, tendo parecido que nunca mais acabava devido à quantidade de artefactos, interrompendo o encontro durante cerca de cinco minutos...
Boicote dos ultras do Braga contra horário do jogo: FC Porto x SC Braga | 17-01-2020 Os ultras braguistas já tinham feito diversos protestos contra os horários dos encontros, principalmente aqueles que eram jogados durante a semana. Calhou novamente um jogo a uma 6ª feira à noite, daquela vez no Dragão. Os dois grupos, Red Boys e Bracara Legion, decidiram que era o momento de dizer basta e emitiram um comunicado a dizer que não se iriam deslocar ao Porto, anunciado que preferiam marcar presença no dia seguinte em Chaves para um duelo entre as equipas secundárias de cada um
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dos conjuntos. Prometeram e cumpriram ambas as decisões. O sector visitante do Estádio do Dragão esteve sem apoio organizado. Já em Chaves, estava uma boa moldura humana para um simples jogo do Campeonato de Portugal, graças à boa deslocação dos grupos do SC Braga. De registar a mensagem apresentada: “Não importa a divisão, só queremos viver a nossa paixão”. Ao mesmo tempo em que a expunham, abriam algumas tochas. O futebol popular tem de facto a sua beleza!
Manifestação na corrida do adepto | 25-01-2020 Durante a manhã do dia da final da Taça da Liga, realizou-se a 4ª edição da Corrida do Adepto, que contou, de forma previsível, com personalidades ligadas a altas instâncias do futebol, nomeadamente à Liga de Clubes, como Pedro Proença e Sónia Carneiro. O que provavelmente não contavam era com a presença de uma manifestação de ultras, composta maioritariamente por grupos do SC Braga, que estavam em casa, mas também de outros clubes do Minho, como do Vitória SC, CD Aves e também do FC Vizela. Foram entoados vários cânticos de protesto, aberta pirotecnia e uma tarja em que se podia ler: “Unidos resistiremos”. Quem estava por lá não ficou certamente indiferente...
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Espectáculo pirotécnico dos ultras braguistas na final da Taça da Liga: SC Braga x FC Porto | 25-01-2020 O Braga recebeu a ‘final-four’ da Taça da Liga novamente na sua cidade e acabou por vencê-la. No jogo da final, frente ao Porto, os seus ultras não ficaram aquém das expectativas e acabaram por protagonizar um dos momentos da época no que a pirotecnia diz respeito. A meio da primeira parte, um festival enorme de tochas no canto da bancada superior poente (a oposta à que habitualmente ficam), sector excepcionalmente destinado tanto na meia-final como na própria final. Não deixou ninguém indiferente!
Protestos contra o Cartão do Adepto Talvez o único destes momentos que não tenha propriamente uma data, uma vez que foram vários os protestos, as manifestações e a união entre grupos contra esta aberração que já todos ouvimos falar. O ponto alto foi mesmo em Fevereiro deste ano, embora não tenha sido o primeiro movimento de contestação ao cartão. Na altura da 20ª jornada da Primeira e da Segunda Liga, ficou marcado, de maneira geral, por um protesto organizado dos vários grupos contra o Cartão do Adepto. Ao minuto 12 dos encontros, foram muitos os grupos que levantaram a mensagem: “Por todos lançamos o repto: contra o Cartão do Adepto”. Enquanto expunham essa frase, entoava-se em uníssono o tal famoso cântico: “Horários
indecentes, violência da polícia... querem matar o futebol!”. Podemos dizer que houve uma grande parte dos grupos que aderiu a esse protesto organizado (os Panteras Negras não o fizeram, mas na jornada seguinte levantaram uma coreografia feita contra o cartão, exactamente com a mesma mensagem). Foi um fim-de-semana em que houve jogos “quentes” (clássico entre Porto e Benfica, por exemplo), no total 33 grupos não descuraram esse pequeno grande momento para um objectivov comum. Importa referir que a meados de Novembro de 2018, foi quando a verdadeira luta começou, no que diz respeito à união entre grupos diferentes. A Associação Portuguesa da Defesa dos Adeptos organizou uma manifestação conjunta em frente à Assembleia da República, que contou com adeptos de 13 clubes diferentes, com o lema: “Unidos nos valores, divididos nas cores”. Ainda sobre esta época, destacamos também outro protesto feito no dia 1 de Agosto, dia da final da Taça de Portugal 2019/20, que foi jogada em Coimbra e sem público. A mensagem era clara: “Legislar não é crimininalizar. O nosso cartão é o de cidadão!”. Foram muitos os grupos que expuseram mensagens nesse Sábado, desde o Norte até ao Sul do país, passando também pela Madeira. Em Coimbra, os ultras locais foram uns dos mais activos, aproveitando o facto do mediatismo ter estado centrado na sua cidade durante esse dia, colocaram muitas frases diferentes espalhadas pela cidade. Ao longo da época foram muitas as mensagens contra o Cartão do Adepto também metidas pelos grupos de forma independente, mas estas últimas acções que mencionámos foram o ponto alto no que a organização e união diz respeito!
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Acompanhamento dos grupos ultras às suas equipas nos jogos à porta fechada | Junho até ao final da época Numa altura em que os ultras se viram impedidos de fazer aquilo que, na generalidade, mais gostam, isto é, de acederem a um recinto desportivo e apoiarem a sua equipa, foi claramente de valorizar aquilo que muitos fizeram para continuarem a incentivar ou até apoiar à sua maneira. Os acompamentos e recepções aos autocarros das equipas aumentarem e até houve adeptos que arranjaram maneira de ver os próprios encontros, no exterior dos estádios. O destaque foi claramente os Super Dragões que se organizaram em todas as partidas para seguir e incentivar a sua equipa desde o hotel onde estagiavam ou até deslocando-se quando jogavam fora e arranjarem maneira de ver e apoiar no exterior de maneiras bastante improvisadas, seja em cima de edíficios ou até em simples quintais de habitações, como foi o caso nas Aves...
Protesto dos ultras do Braga antes do derby: SC Braga x Vitória SC | 25-06-2020 Foi em jeito de funeral que os ultras braguistas se apresentaram antes deste derby com sabor amargo por falta de público nas bancadas. No exterior do estádio, apresentavam-se com uma enorme
mensagem que dizia: “Aqui jaz o futebol do povo”. Pelo meio, invocavam as razões da degradação do futebol que tanto gostamos... “SAD’s”, “Corrupção”, “Cartão do adepto”, “Legislação opressiva”, “Ultras negócios”, “Olivedesportos”, “Horários indecentes” e “Violência policial” era o que surgia escrito como motivo justificativo para o funeral que apresentavam. Importa referir que, apesar de tudo ter sido feito de forma pacífica, as autoridades policiais presentes fizeram questão de identificar os vários elementos presentes que faziam valer o seu direito a uma simples manifestação... Espectáculo pirotécnico dos Super Dragões para festejarem o título de campeão nacional | 18-07-2020 A nível de dimensão, um dos maiores espectáculos pirotécnicos que há memória no nosso país. Foi com dezenas e dezenas de tochas, ao longo das margens do Rio Douro, tanto na Ribeira do Porto como no Cais de Gaia, atravessando a Ponte de D. Luís e com
fogo de artício pela cidade portuense, que muitos ultras dos Super Dragões decidiram comemorar o título de campeão nacional, alguns dias depois de se sagrarem matematicamente campeões. As imagens falam por si...
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Deslocação da Força Avense a Portimão: Portimonense SC x CD Aves | 26-07-2020 A nível sentimental, um dos melhores momentos dos últimos anos. Na última jornada, com os jogos à porta fechada, com a sua equipa já despromovida, numa época horrível para o Aves, com rescisões atrás de rescisões, com uma SAD completamente descredibilizada, com derrotas quase certas sempre que entravam em campo, com sucessivos protestos dentro do próprio relvado por parte dos jogadores... Enfim, uma infinidade de contrariedades para qualquer avense, mas o seu grupo fez questão de organizar uma longa viagem desde o Norte do país até Portimão para mostrar a sua vivacidade e incentivar numa última vez a sua equipa, que se despedia do principal escalão do futebol português, mesmo com o jogo sem público...
Graffiti dos Red Boys contra o Cartão do Adepto | Julho de 2020 Um momento como estes merece uma menção individual. Os ultras do Braga têm-se destacado positivamente na luta contra o sistema e contra o cartão discriminatório colocado recentemente em Diário da República. Uma contestação que tem sido de praticamente todos, mas os Red Boys elevaram o nível. Mais do que uma tarja, protesto ou cântico, colocaram mesmo em forma de pintura numa parede da sua cidade! G. Mata
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Convidamos dois adeptos, um do Belenenses e outro do Farense, para nos deixarem o seu testemunho acerca do “céu” e do “inferno”. Cenários que ambos os clubes tiveram de atravessar, embora com com direções inversas. É do conhecimento geral que há 2 épocas atrás o Clube de Futebol “os Belenenses” iniciou um novo trajecto no futebol nacional, essa decisão foi tomada pela esmagadora maioria dos seus associados, fartos de prepotência e desprezo pela sua instituição centenária por parte da empresa que tinha comprado à revelia da vontade dos associados a maioria do capital social da SAD do Clube. Os problemas ao longo dos anos foram-se avolumando e o descontentamento, que era cada vez maior, atingiu um dos seus expoentes quando a SAD resolveu rasgar o acordo que tinha com o clube, que permitia ao Belenenses recomprar a maioria da SAD. Passado algum tempo foi perguntado aos sócios do CFB o que pretendiam fazer, se continuarem subjugados a essa situação ou se queriam que o Clube começasse de novo com uma equipa própria de futebol na divisão que fosse possível. Convocou-se uma Assembleia Geral e nela os sócios decidiram seguir o caminho da honra, aquele que lhes devolvia o prazer de irem ao fute-
bol apoiarem o SEU clube de sempre. Iniciava-se então na época de 2018/2019 uma realidade diferente para todos os Belenenses, o seu clube iria jogar na última divisão do campeonato regional de Lisboa, impensável para muitos, que um dos maiores emblemas do desporto nacional andasse por esses lugares, uma descida aos infernos referiram alguns. As opiniões que se dividiam depressa se uniram e todos juntos iam enchendo os campos do distrito de Lisboa semana após semana, onde quer que o Clube de Futebol “os Belenenses” ia jogando. Ao mesmo tempo que a empresa que ficou com a B-SAD mudava de armas e bagagens para o estádio nacional, comprovando que eram e são uma empresa e não um clube, sem adeptos e sem qualquer entusiasmo pelo futebol que não sejam os de negócios obscuros. Iniciávamos um novo período na vida de bancada, principalmente no que diz respeito à repressão a que os ultras do Belenenses foram sujeitos durante largos anos. Sempre com o beneplácito da SAD a actuação das forças policiais foram quase sempre acima do que a lei lhes permitia, tendo a Fúria Azul desde há longos anos sido proibida de entrar com os seus materiais de apoio ou com qualquer referência ao nome do grupo numa atitude claramente anticonstitucional, e que sempre o grupo denunciou. Situações desprestigiantes e indignas para adeptos de futebol que passaram por revistas despropositadas e ilegais, adeptos impedidos de entrar com adereços com o nome do grupo, crianças proibidas de entrar com simples bandeiras do clube, adeptos a serem forçados a entrarem descalços no próprio estádio, adeptos acusados sem provas com idas à
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policia, ao IPDJ e tribunal sem que existissem quaisquer evidências ou verdade nas acusações, tentando quebrar a unidade do grupo. De referir ainda que tudo isto se passou contra um grupo que tem poucos registos de comportamentos violentos no nosso panorama futebolístico ao longo dos seus 36 anos de existência. Passou-se sobretudo como forma de reprimirem a opinião da Fúria Azul que sempre foi contra o registo do grupo junto do IPDJ, por entender essa medida como anticonstitucional e discriminatória enquanto cidadão da República, e sendo um núcleo oficial do Clube contando todos os seus membros como sócios do Clube que já possuía os seus dados pessoais. Durante estas duas épocas os sócios do Belenenses puderam viver o mais puro do desporto rei, enfrentando inúmeras dificuldades em campos que logicamente se distanciavam imenso do que estavam habituados, mas onde, ainda assim o ambiente criado é inexplicavelmente muito mais acolhedor e propicio a devolver a paixão pelo jogo a todos os que aos Domingos às 15h, sabem sempre que têm uma tarde de prazer com os seus companheiros de bancada enquanto veem o seu clube do coração jogar com uma cerveja na mão. Apesar do ambiente ser muito mais descontraído em termos repressivos do que na 1ª liga, a grandeza do Clube fez com
que os únicos momentos desagradáveis e de conflito tenham sido vividos com a polícia, e reparem que estou a falar de 2 épocas com zero incidentes contra adeptos rivais, em alguns campos fomos recebidos com contingentes completamente desproporcionados, inclusive com o corpo de intervenção ou com unidades de spotters, lembrem-se que estamos a falar de jogos na última divisão. Ainda nesta última época houve vários adeptos que foram levados a tribunal com inverdades, revistas fora do estádio, ameaças a alguns ultras da Fúria Azul, claro que com uma frequência menor do que a registada na 1ª Liga, mas completamente discriminatória em relação à realidade vivida no futebol no distrito de Lisboa. Será que não há nada de mais importante para fazerem do que irem vigiar e reprimir adeptos que não tiveram registo de nenhum incidente durante estas 2 épocas de futebol amador? Contudo, o que mais importa realçar, não são as tentativas falhadas dos que atrás referi de estragar a festa do futebol, mas sim enaltecer a festa do futebol, foram muitas as jornadas em que os adeptos do Belenenses encheram os campos onde se deslocaram e conviveram com os adeptos locais de forma extremamente salutar, com os convívios espontâneos a durarem largas
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horas após o apito final, em todo o lado nos receberam com alegria e entusiasmo, verdadeiros hinos ao futebol popular em cada deslocação da nossa equipa, das quais não posso deixar de destacar o confronto entre Estrela da Amadora e Belenenses que conseguiu reunir cerca de 9.000 espectadores na última divisão, o jogo que levou de novo a sua equipa principal a jogar no mítico estádio das Salésias, que foi antecedido de um cortejo com milhares de Belenenses pelas ruas de Belém, ou ainda o jogo da final de apuramento de campeão que lotou o Estádio 1º de Maio e que foi uma tarde, salvo as devidas distâncias, com o espírito da final da taça de Portugal. Os adeptos Belenenses e a sua claque Fúria Azul, grande impulsionadora desta onda azul, escolheram como lema para este novo percurso “A nossa paixão não tem divisão!” e é isto que provaram nestas 2 últimas temporadas, com uma enorme alegria Domingo após Domingo que o futebol pertence ao povo, aos sócios e adeptos dos clubes e não aos que olham para o futebol como um mero negócio ou uma oportunidade de lavarem dinheiro sujo. A resistência e a dignidade dos adeptos azuis tem provado que será possível criar um novo paradigma para os clubes que passam por problemas semelhantes (infelizmente são cada vez mais) e inverter a situação, recuperando o futebol de onde ele nunca deveria ter saído. Enquanto os processos se arrastam nos tribunais, façamos o nosso caminho caminhando, com a certeza de que só dando o passo em frente podemos sair de uma situação onde os adeptos contam zero, os sócios do Belenenses estão a fazer a sua parte para defender o desporto do povo, esperamos que mais e mais se juntem nesta luta contra o futebol negócio.
Mário Rodrigues (Fúria Azul, C.F. Os Belenenses) A história do meu clube na década de 90 é geralmente conhecida por quase todos os adeptos de futebol por este país fora! Todos conhecem e elogiam jogadores como Hassan, Hajry, Carlos Costa e principalmente o nosso grande treinador, Paco Fortes. A sua garra e a sua paixão pelo jogo era contagiante, e, foram valores como os que ele transmitia que me transformaram a mim a tantos outros Farenses! Naquele tempo, o Estádio de S. Luís era temido por qualquer equipa, o que o tornava num jogo muito apetecível para todos os Grupos! Foram tempos de ouro para o meu clube, conseguimos uma histórica ida à final da taça, uma histórica qualificação para a taça a UEFA, tínhamos sempre grandes equipas, o estádio quase sempre cheio e fazíamos frente a qualquer equipa que cá viesse! Mas, como em quase tudo na vida, nem tudo foi perfeito, e se agora cada vez mais é normal, nós fomos dos primeiros a ter problemas com SADs e má gestão dos clubes! Passámos por uma das piores fases do nosso clube, muitas dívidas, muitos ordenados em atraso, descidas da secretaria, jogadores impedidos de se inscrever, jogar com juniores ao sábado no campeonato de juniores, e ao domingo no campeonato de seniores, tudo nos aconteceu até que se terminou com o futebol sénior em Faro, no nosso Farense! Se para a maioria dos adeptos em geral foi o fim do Farense, para nós South Side Boys e também para alguns dos chamados adeptos dito “normais” foi apenas o início de uma nova era, e de mais uma “guerra” composta por muitas “batalhas” mas também o início de uma
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época de recomeço para os “South Side Boys! Foram épocas que a nível desportivo não era o que se queria, pois o nosso lugar não era o de competir nos distritais, nem nos campeonatos chamados “nacionais”, enquanto adeptos, enquanto ultras, foram épocas de ouro, não havia cá problemas de bebidas nos estádios, não havia problemas das pirotecnias, não havia problemas com bandeiras, não havia problemas com faixas, basicamente, olhando para trás, podemos dizer que o regional é o chamado futebol tradicional, o futebol dos adeptos onde o futebol é apenas futebol e a festa é verdadeiramente genuína! Enquanto grupo foi bom, pois com a descida ao último escalão do futebol português muitos adeptos (das vitórias e não do Farense) se afastaram e fez com que ficassem os que nunca desistem, os que realmente amam o Farense o que fez com que farense transportasse uma verdadeira festa do futebol por todos os cantos do Algarve, olhando para trás foi bom ter vivido esse futebol no seu estado mais puro! Mas puro a todos os níveis, a nível de festa nos estádios, puro a nível de sentimento dos adeptos, puro a nível de orgulho dos jogadores, a maioria deles oriundos de faro e arredores onde puderam representar a equipa sénior do Sporting Clube Farense e escrever a sua pequena pagina na história
do maior clube do Algarve! Como seria de esperar, O Farense foi subindo, e quanto mais se subia, mais o futebol se estragava. Nos campeonatos nacionais começaram as primeiras implicações com pirotecnia, depois as implicações com as bebidas no estádio… o futebol aos poucos ia deixando de ser festa! Com a subida aos profissionais, aparecem as primeiras implicâncias com as faixas, com as bandeiras que são grandes, com os tambores, com as blusas e cachecóis, tudo servia e serve para implicar! O subir à primeira era um sonho, voltar aos grandes palcos, “mostrar” e “provar”, não só aos outros, mas principalmente a nós próprios que os “South Side Boys” eram um dos melhores grupos a nível nacional, tanto a nível de fidelidade, de compromisso e essencialmente mentalidade para com o seu clube e para com a sua identidade Ultra. A subida à primeira liga foi um trajeto complicado, entre as muitas subidas e algumas descidas pelo caminho, tivemos problemas internos no clube, nomeadamente dívidas do passado que nos continuaram a atormentar, “encostaram-nos” à parede, pois tínhamos de vender o estádio para o clube poder sobreviver, entre muitos outros…Tivemos
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de lutar muito pelo nosso clube e pela nossa cidade, tivemos e temos de continuar a educar a nossa cidade para voltar a apoiar o nosso clube, e quando digo apoiar o nosso clube, não é apenas apoiar também o clube da nossa cidade, é apoiar única e exclusivamente o nosso clube! Foram muitos sacrifícios pessoais e profissionais que marcaram o nosso trajecto do distrital até aos dias de hoje, sacrifícios esses pelo tal regresso à primeira liga! Infelizmente por muita felicidade que subir à primeira liga nos trouxesse, foi uma subida bastante amarga, nós somos ultras, vivemos isto de uma maneira estranha aos olhos de muita gente, e, se a subida à primeira divisão é um dia de festa, nós, por tudo o que passámos merecíamos uma festa diferente, eu pessoalmente não queria subir daquela maneira, eu queria ter sentido a sensação do golo da subida, a sensação de ouvir o apito final do arbitro, abraçar aqueles que comigo fizeram tudo e mais alguma coisa por este clube, e de dizer que conseguimos, nós conseguimos quando quase todos nos diziam que estamos “mortos”! Infelizmente este Vírus, tirou-nos a cereja em de cima do bolo… Mas pronto da maneira correta ou não, justo ou não o que é certo é que chegámos ao patamar máximo do futebol português, e mais uma vez o vírus a estragar-nos os planos! Quando pensamos que fomos do inferno ao paraíso, fico a pensar que voltei ao Inferno! Com a chegada à primeira divisão aparecem mais restrições, se já tinham começado a implicar com pirotecnia, com bebida nos estádios, se por vezes já implicavam com bandeiras grandes faixas e tambores! Agora dizem-me que tudo isso é proibido, a não ser que me legalize (segundo sei já estou legalizado desde que nasci, eu e qualquer outro sócio do Farense) e que
também tenho de ter um cartão de adepto para poder ver um jogo de futebol de pé, com bandeiras do meu clube, dizemme também que para poder ir ao futebol apoiar a minha equipa, alguns dos meus amigos não podem ir comigo, pois os seus filhos com menos de 16 anos que vão ao futebol, connosco desde o distrital, agora estão proibidos de nos acompanhar! Isto não é futebol! Eu pessoalmente assumo-me contra tudo o que seja restritivo na festa do futebol, pois está à vista de todos, principalmente nos dias de hoje, que futebol sem adeptos e sem festa não é mesma coisa, não é futebol! Estas regras são complicadas, aceita-las não é fácil, é ceder a um sistema que nos quer controlar restringir e manipular mas, ao mesmo tempo, eu, como ultra, não vivo sem a minha faixa, eu fiz a sua projeção, eu pintei-a, eu carreguei-a, é a minha faixa, e um grupo ultra não faz sentido sem a sua faixa, sem o nosso cachecol, sem as nossas bandeiras, sem o nosso tambor! A Primeira Liga quer roubar-me tudo isto, quer roubar-me o meu modo de vida! “Ainda agora Cheguei à Primeira liga e já estou farto dela!” Cá estaremos para a luta seja de que forma for e assim que nos seja possível, e o possível nunca será com limitações e afastamentos dentro de um estádio de futebol! Avisem-me quando puder abraçar os meus amigos, quando for golo do Farense, quando for o apito final... num qualquer estádio deste país! Valter Ascenção (South Side Boys, Sporting Clube Farense)
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A aprovação da lei nº 113/2019, a 11 de Setembro do ano transato, é o mais recente instrumento legal utilizado pelo governo, na escalada de repressão que tem sido exercida sobre os adeptos portugueses, desde há vários anos a esta parte. A 26 de Junho foi publicada a portaria nº 159/2020 que define as normas para a emissão do «afamado» cartão do adepto, cartão esse que é requisito obrigatório para todos aqueles que quiserem marcar presença nas ZCEAP (Zonas com Condições Especiais de Acesso e Permanência de Adeptos). As ZCEAP são os únicos locais dos estádios onde se poderá entrar com instrumentos de propagação sonora (megafones, bombos, etc), material de apoio com dimensões superiores a 1x1 metros (bandeiras, faixas, estandartes) e aonde se poderão realizar coreografias de apoio. Para a requisição do dito cartão, é exigido que os requeredores cedam um sem fim de informações e documentos legais, bem como paguem o montante delineado pela APCVD (Autoridade para a Prevenção e Combate à Violência no Desporto) para a emissão do mesmo. Este espaço foi definido com a intenção de “segregar” (termo utilizado por João Paulo Rebelo, Secretário de Estado da Juventude e do Desporto) os adeptos, que vivam de forma especial o jogo, rotulando-os de delinquentes. A permanência
neste sector é proibida a menores de 16 anos, medida que impede um pai de trazer o seu filho para este espaço, como se da selva se tratasse. Numa era em que se espalham as ideias de defesa dos direitos dos animais (e bem), o adepto de futebol e o Ultra em particular, continua a ser tratado «abaixo de cão», privado de todo e qualquer direito e sendo constantemente enxovalhado e humilhado. Uma expressão popular nas bancadas brasileiras afirma que não é reprimindo a festa que se combate a violência, mas os nossos governantes insistem em andar na cauda da Europa, replicando um modelo que foi testado em vários outros países, e em todos se mostrou ineficaz. Em Itália, a afamada «Tessera del Tifoso» foi aplicada e em poucos anos revertida, em Inglaterra a ideia nem chegou a ver a luz do dia, tal foi a contestação sentida, e na Polónia mostrouse também um desastre. A promulgação desta lei, vem no seguimento do alarme mediático provocado pelo «Caso Alcochete», e com a intenção clara de agradar à opinião pública que clamava por «sangue», percebendo-se perfeitamente as intenções eleitoralistas por detrás destas medidas. O Princípio da Igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República e um dos pilares da nossa democracia é nitidamente atacado nesta lei, com a tentativa de enclausurar os adeptos apaixonados, separando-os dos restantes adeptos e deixando-os confinados em gaiolas como de doentes infeciosos se tratassem. Nota também para o artigo 17º da lei 113/119 que afirma que os recintos “são dotados de lugares sentados”, “sem prejuízo de o promotor do espetáculo desportivo poder definir áreas de assistência com lugares em pé (...) nas zonas com condições
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especiais de acesso e permanência de adeptos”, abrindo assim a porta para que os adeptos que se localizem fora das ZCEAP sejam forçados a estar sentados, e para que os estádios de futebol se pareçam cada vez mais com salas de cinema. J. Sousa
Em Janeiro do ano passado, foi lançado o livro “Claques de Futebol”, escrito pelo antropólogo Daniel Alves Seabra. Não é o primeiro livro português que aborda o mundo ultra, mas na forma como foi escrito é praticamente um exclusivo. O autor aproximou-se directamente dos quatro maiores grupos portuenses (Super Dragões, Colectivo 95, Panteras Negras e Alma Salgueirista), durante vários anos, e descreveu, seja através das entrevistas que foi conseguindo ou até das vivências que presenciou, como funcionam os seus grupos e como são eles representados. Daniel Seabra, actualmente com 52 anos, é portista e sempre teve o gosto pelo futebol e pelo espectáculo vivido fora das quatro linhas. Não surpreende portanto que tenha escolhido esta investigação para a sua tese de doutoramento, tendo depois daí surgido este livro. Optou pelos grupos ultras da cidade da qual é natural. Não apenas pelo
contexto futebolístico, mas também pelo contexto social, onde desejava fazer uma investigação às diversas zonas dessa área geográfica, procurando contextualizar a componente social e uma explicação para os próprios problemas conhecidos dos bairros sociais. O seu livro tem a particularidade de ter o prefácio de figuras como Vítor Baía, Luís Freitas Lobo e o orientador da sua tese, José Manuel Sobral. Define claramente o combate ao preconceito e à estigmatização como um dos grandes pilares da sua obra. Ao invés da comunicação social em geral, Daniel procura fazer mais do que uma simples análise rápida e básica. Integrou-se no seio das claques, relatou a forma como os seus elementos vivem e trabalham para ela e para o clube durante imensas horas ao longo de uma semana e procurou, para além disso, aperceber-se dos motivos (sociais, por exemplo) que podiam levar muitos dos seus elementos a terem atitudes ditas menos correctas pela sociedade em geral. De qualquer maneira, trata-se de um livro sem grandes filtros, onde reproduz directamente os episódios de violência, insultos e até as entrevistas de ódio pelos rivais. Está obviamente dividido em vários capítulos. No início aborda a história dos adeptos no mundo do futebol, dos vários momentos históricos que envolveram o hooliganismo e posteriormente o início do movimento ultra, contextualizando e enquandrando nas suas devidas áreas geográficas, partindo depois para o início dos grupos em Portugal. A partir daí, foca-se exclusivamente nos antigos e actuais grupos da cidade Invicta, expondo a sua história, como foram criados e falando de grupos já extintos que deram o mote (como os Dragões
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Azuis, do FC Porto). É um livro com imensos dados estatísticos, das análises feitas por parte do escritor, sobretudo à base de entrevistas. Um enorme leque de perguntas aos entrevistados dos quatro grupos, seja sobre a sua vida pessoal, familiar, contextos sociais, habilitações literárias, motivações políticas, religiosas e até os fundamentos que consideravam prioritários para integrarem no grupo. A partir daí formulou a sua análise sobre o que poderia levar, ou não, os ultras a terem determinadas atitudes. Fez também, à base de toda essa análise estatística, uma distinção entre os vários grupos, a forma como se comportavam e as suas diferentes ideologias. Porém, não foi apenas com as entrevistas a qualquer membro que criou essas distinções. Procurou também saber a forma como as direcções dos respectivos grupos geriam e se hierarquizavam para se organizarem da melhor maneira, falando também do papel dos núcleos de cada claque. Sobre o assunto da violência, nunca fez disso um tema tabu, não escondendo que é algo que está presente nos grupos, embora não com tanto ênfase como muitos jornalistas e comunicação social decidem expor. Chegou à conclusão que é algo que foi diminuindo ao longo do espaço temporal em que seguiu os grupos, muito por causa dos avanços da polícia. No entanto, também admite, já na parte final do livro,
que tem havido uma tendência para o aumento de grupos casuais, como resposta a um controlo cada vez mais agressivo e apertado por parte das autoridades policiais, tendo nos últimos anos (desde o fim da sua investigação até ao presente) havido um aumento de focos de violência como resultado disso. Uma obra que claramente sugerimos, pela forma completa como tenta abordar a grande maioria dos assuntos. Vermos uma relação entre o mundo do apoio nas bancadas e a antropologia é algo de valorizar, ainda por cima num país como o nosso, em que o interesse da sociedade em geral pelos grupos não é o maior! G. Mata
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O COVID chegou em Março a Portugal e por consequência directa quase todo o país parou. Desportivamente falando foi mesmo quase tudo que parou. Quase tudo, mas não o futebol “de topo”. Não deixa de ser curioso que um dos negócios que mais dinheiro gera, não consiga gerir-se três meses sem a sua actividade, o que nos leva a voltar a pensar na gestão que os clubes fazem e quanto o futebol vive acima das suas possibilidades. É perigoso andar no limite da sua existência e fruto disso é o que tem acontecido a vários clubes históricos no nosso país. Esta época já se abriram algumas portas e as várias modalidades começam a retomar as suas actividades desportivas. Algumas portas mas não todas. Há particularmente uma que tem sido fechada insistentemente a cadeados, a porta da bancada! Há bem poucos dias, começaram as tardias experiências para a possibilidade de os adeptos regressarem. Temos presente em nós o princípio da responsabilidade, mas o que estamos perante já não é desse domínio. Assistimos repetitivamente à retoma dos espectáculos de diversos quadrantes com o seu público, mas quando à questão do adepto de desporto,
existe uma discriminação injusta e perigosa. Sejamos sérios, o que se está a passar é desadequado numa sociedade que assenta em princípios primários como o da igualdade. As nossas queixas enquanto adeptos não se prendem apenas pelo campo emocional, mas também pelo campo económico, pois ao contrário do que as entidades responsáveis e governo parecem conhecer, há clubes que dependem quase que exclusivamente da actividade económica gerada pelo seu movimento associativo. Esta discriminação é uma “machadada” muito forte para o próprio futebol. Recentemente o Vitória Sport Clube e o Sport Lisboa e Benfica viram fracassadas as suas tentativas de trazer uma presença simbólica dos seus associados aos camarotes, de novo foram incompreensivelmente abafadas as suas intenções. Quem não se lembra do camarote cheio de figuras públicas na final da liga dos campeões em Portugal, será que há cidadãos de primeira e de segunda? Um pouco por toda a Europa assistimos ao regresso dos adeptos às suas bancadas, mas por cá continuamos reprimidos pelo estereotipo que veicula nos palcos políticos. Penso que é hora de repensar como deixamos que isto aconteça, é hora de aprender com as falhas do passado e encontrar soluções para prevenir o futuro. É na organização da nossa voz que nasce a solução para lutar frente a frente com estas e outras questões que afectam todos os adeptos. J. Lobo
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na sensibilização e consciencialização dos leitores para aquilo que são os seus direitos e deveres enquanto adepto, informando sobre atos repressivos, e apoiando as iniciativas de luta por um futebol melhor.
Terminamos a primeira edição da fanzine “Cultura de Bancada”, respondendo a uma série de questões autopropostas. Após a materialização das nossas ideias, esta foi a forma escolhida para deixar um pequeno enquadramento do nosso trabalho e também das nossas intenções. Como nasce o projecto? A ideia da criação desta fanzine surge a partir de um elemento, que tem um projecto próprio sobre o movimento Ultra nacional online. Inspirado por algumas zines, convida inicialmente mentores de outro projecto sobre o movimento Ultra online para cooperarem na criação do que veio a ser a Cultura de Adepto. A palavra foi passando e mais alguns membros foram adicionados a este projecto, de forma a que o mesmo fosse concretizado da melhor maneira a representar a nossa cultura e a preencher um vazio neste âmbito a nível nacional. Como nos organizamos? Sem experiência nesta área, sendo a primeira fanzine realizada por todos nós, optamos neste primeiro número por nos organizarmos de forma informal. Os temas foram divididos pelos elementos, tendo a equipa optado pela entreajuda quando sentimos ser necessário. O que acrescenta em termos de informação? Este projeto nasce com a intenção de reportar aquilo que é o ambiente nas bancadas dos campos de futebol e outras modalidades desportivas, sempre com atenção ao presente, mas nunca esquecendo aquilo que de melhor se fez no passado. Será também a nossa missão, apostar
Porquê uma fanzine? A paixão de ver a vida das bancadas documentada foi algo que cresceu de forma natural. Começou através dos jornais e fanzines, passando para as pesquisas na internet, nas página e blogs, nas reportagens em vídeo e até mesmo nos livros que foram possíveis adquirir. De geração em geração, de formas variadas, foi sendo incutida em muitos de nós, esta componente da cultura do adepto. Assim, perante a actualidade, sentimos que este era um dos passos que faltava ser dado. Voltando com isto a haver em Portugal uma memória viva em formato físico sobre a cultura do adepto. Porquê o formato digital? O formato digital, abre-nos a porta para difundir de um modo rápido e acessível a nossa paixão pela nossa cultura. Para além de permitir uma distribuição gratuita, também permite que esteja em qualquer ponto geográfico, a uma distância de um simples clique. A possibilidade de um longo alcance, corresponde à nossa vontade de informar e sensibilizar o maior número de adeptos possível. No futuro, existe a vontade de passar para um formato físico, mas só tempo e o nosso trabalho poderão ditar essa mudança. Quais as expectativas para a fanzine? A cultura de adepto em Portugal existe, mas na nossa opinião é subvalorizada e por consequência também pouco organizada. Cada movimento cultural tem a sua forma de sentir, pensar e agir, mas aparte do que nos chega através dos veículos regulares de comunicação, os adeptos carecem de uma fonte própria de expressão colectiva. É nesta lacuna que crescem as nossas intenções com as quais conjugamos a forte vontade de elevar a memória, debater o presente e visionar um futuro. Temos por isso a expectativa que a “Cultura de Bancada” consiga exercer uma influência positiva junto dos nossos leitores.
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