Livia Moro - CONSTRUÇÃO DES CONSTRUÇÃO: uma coleção de roupas Femininas transformáveis

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CONSTRUÇÃO DES CONSTRUÇÃO: UMA COLEÇÃO DE ROUPAS FEMININAS TRANSFORMÁVEIS

Lívia Casagrande Calomeno Moro1 Daniele Moraes Lugli2

RESUMO Este artigo descreve o processo de um projeto de moda que parte da compreensão das necessidades diárias das mulheres, como as transições de ambientes que muitas sofrem durante o dia, e seus anseios por mudanças no vestuário. Por meio de uma pesquisa bibliográfica, seguida de experimentações e prototipagem, quinze looks foram projetados a fim de atender necessidades de uma mulher urbana que não possui tempo hábil para se adequar às diferentes situações do dia-a-dia, ou simplesmente para aquelas que procuram peças de roupa que proporcionam maior diversidade em sua configuração. A aplicação dos princípios de roupas transformáveis potencializa o dinamismo nos guarda-roupas trazendo mais possibilidades para a mulher contemporânea.

Palavras-chave: mudanças, vestuário transformável, guarda-roupa.

1 INTRODUÇÃO Tendo em vista que nos tornamos a cada dia mais exigentes e ansiosos por novidades e mudanças, oferecer uma peça de vestuário que tenha apenas uma solução final não parece mais fazer sentido. Portanto, como o vestuário transformável pode transformar a relação da usuária com a peça? O estudo parte de uma revisão bibliográfica a fim de conhecer os principais conceitos e reconhecer possíveis desafios a serem estudados. Foram feitos mockups para melhor identificar possibilidades de uso e confecção para cada peça. A partir dessa análise, foi realizado o desenvolvimento dos produtos.

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Aluna do 6° período do Curso Superior de Design de Moda da Faculdade de Tecnologia Senai Curitiba Professora do Curso Superior de Design de Moda da Faculdade de Tecnologia Senai Curitiba


A coleção contempla peças que sofrem dois tipos de transformações: primeiramente peças que, através de uma modelagem mais elaborada, se transformam em outra (por exemplo: calça que se transforma em jaqueta sem nenhuma peça sendo destacada); outras com a característica de destaque na cintura e no quadril, para poderem ser utilizadas junto a outras com uma modelagem mais reta, ou ser usada independente, com ajustes feitos através de uma amarração na cintura ou no quadril. Dessa forma, o presente estudo tem o objetivo de estudar a moda e o comportamento a fim de desenvolver peças de vestuário feminino com maior possibilidade de uso, dando liberdade e poder de transformação para a usuária. Espera-se com esse projeto dar espaço para a criatividade e as sensações de cada consumidor, transformando a relação da vestimenta com a usuária.

2 RELAÇÕES DO HOMEM COM O VESTUÁRIO

Um dia os guarda-roupas eram enxutos, com peças que eram passadas de pais para filhos e assim por diante. Stallybrass (2012) relata bem em seu livro a relação de Karl Marx com seu casaco, um sobretudo. Este era um cartão de passagem para Marx na biblioteca de Londres, tinha um bom corte, de lã, preto. Mas Marx, diferente do que se imagina, teve uma vida árdua para conquistar seu espaço e sustentar sua família. Dependia das idas a biblioteca para consultar, obter referências e assim escrever e sustentar-se. Muitas foram as vezes que Marx penhorou seu casaco para poder pagar suas contas sendo, em diferentes ocasiões, impossibilitado de consultar os livros. Hoje vive-se outra realidade, difícil é encontrar peças que perduram um ano nos guarda-roupas. Com a industrialização e avanços tecnológicos, a relação com o vestuário se transformou. Encontra-se de um lado roupas com maior valor agregado, alto custo, para poucos – a Alta Costura; e do outro lado roupas feitas em segundos e em segundos descartadas – a confecção em massa, como descreve


Lipovetsky (2009, p.80). Hoje em dia é raro alguém passar por esta mesma situação, algo que era corriqueiro, como penhorar um casaco sobretudo. Outro fator que se enfrenta hoje é a globalização, que, para Ortiz (1994), refere-se aos modos de produção, distribuição e consumo de bens de serviços voltados para uma estratégia mundial, que acontecem de forma imediata, desterritorializada, e dependem da ciência, da tecnologia e do consumo. “A globalização fez com que surgisse uma cultura global, a qual é reconhecida em todo o mundo “ Avelar (2009). Isso intensifica essa memória coletiva, sendo este um pensamento massificado; são, por exemplo, as mídias sociais que por consequência influenciam na nossa percepção do vestuário.

3 VESTUÁRIO TRANSFORMÁVEL

Segundo o Dicionário Silveira Bueno (1996) transformar significa dar nova forma; tornar diferente do que era; metamorfosear; transfigurar; converter-se; disfarçar-se; dissimular-se. Tendo em vista a palavra transformável e seu significado, agora, pensando em vestuário transformável, uma palavra que o caracteriza é a adaptabilidade (FLETCHER; GROSE, 2011). E a adaptabilidade é encontrada com facilidade na natureza: animais se adaptam as adversidades que lhe aparecem, a cada evolução, seu corpo e forma se transformam para melhor viver em seu hábitat. A adaptabilidade no vestuário tem como função“ intensificar o uso para aumentar a eficiência com que cada peça de indumentária é usada” (FLETCHER; GROSE, 2011). “Os indivíduos que vestem roupa transformável ou reversível fazem mais do que simplesmente colocar ou retirar camadas, eles transformam a leitura da peça. ” (BOLTON, 2002, p.29). Segundo Quinn (2002) podemos encontrar três tipos distintos de vestuário transformável. O primeiro é transformado pela reorganização de sua superfície, como o vestuário destacável. O segundo é toda peça que pode ser transformada em


duas ou mais peças desde que se consiga trazê-la novamente para sua forma original. E o terceiro tipo é baseado na modularidade, que é uma roupa criada através de módulos manipuláveis, trazendo variadas formas e estruturas. A roupa transformável possui como características a forma e função realçando a maneira como é construída. Dessa forma é possível fazer uma analogia a Utilitas, Firmitas e Venustas, que são três palavras originadas do latim e foram utilizadas no período da Arquitetura Clássica para melhor descrever as estruturas das colunas gregas: Dóricas, Jônicas e Coríntias (PEREIRA; RAMÓN, 2010). Utilitas, significa utilidade, função, forma; Firmitas; significa estrutura, construção. Essas duas palavras unidas podem ser consideradas a essência do vestuário transformável. Mas, como foi na Arquitetura Clássica, o homem não criou colunas estruturalmente e funcionalmente perfeitas simplesmente. O homem necessita de estímulos visuais, beleza. Venustas significa beleza e a combinação dessas três palavras foram os princípios para a Arquitetura Clássica existir. Mesmo que Quinn (2002) tenha afirmado que a estética da roupa transformável é apenas o resultado da função da peça, através do exemplo da história da arquitetura, desde o surgimento dos Menires, que o homem se preocupava com a composição visual, a estética. Menir é uma das primeiras manifestações arquitetônicas do homem, são pedras cravadas na terra verticalmente. Menires, obeliscos e pirâmides carregam em si significados que transcendem suas funções, e ainda hoje, como afirmou Pereira as simbologias levantam importantes questões para o homem contemporâneo. Quando o homem habitou as cavernas-abrigo, por mais naturais que fossem, por mais que sua função fosse de abrigo, o homem pintava suas paredes para deixa-las esteticamente bonitas, e também porque as pinturas possuíam objetivos mágicos. A necessidade de apenas cumprir sua função não é o bastante (PEREIRA; RAMÓN, 2010).


FIGURA 1 – DESENHO DAS ORDENS CLÁSSICAS

FONTE: VIGNOLA. (1736, p. 6). Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=ptBR&lr=&id=b8k9AAAAcAAJ&oi=fnd &pg=PA5&dq=jonico+dorico+corintio&ots=2BEK5I5Rf&sig=vgC6axUq3YbZ xyLvFc3VTWXBAgI#v=onepage&q=jonico%20dorico%20corintio&f=false

3.1 aspectos do vestuário transformável

O vestuário transformável tem como principal característica sua construção, pois sua estética é resultado dela. Quinn (2002) descreve que a estética do vestuário transformável segue duas linhas: o da Reconstrução e o da Desconstrução. A desconstrução surgiu na moda por meio da arquitetura, que se utiliza dessa palavra para referir-se a estruturas aparentes, materiais expostos. Para a moda, significa criar peças novas com peças antigas. Já peças reconstruídas são aquelas que não expõem suas estruturas e utilizam-nas para melhor pensar no design das peças. É importante esclarecer que o usuário é como o operador do vestuário. Ele opera e a transforma conforme as mudanças criadas pelos designers, e essas mudanças são construídas propositalmente para maior interação entre ele e a peça.


Para quebrar a inércia do vestuário ao longo da história da moda, é necessário levar em conta que o cotidiano do homem contemporâneo é dotado de múltiplas tarefas, ambientes diferentes e pouco tempo para se trocar. Dessa forma, as roupas que vestem os corpos contemporâneos não suprem esta necessidade. As pessoas são instáveis e emotivas, volúveis e inconstantes, e vivem em uma sociedade cujos valores e crenças estão em contínua transformação. Embora a própria moda evolua com o tempo para refletir a sociedade e a cultura, os produtos fabricados em escala industrial, ainda que versáteis, são fisicamente estáticos. (GROSE apud FLETCHER, 2011, p.10).

O corpo deve ser visto como suporte criativo, segundo Avelar (2009). Isto é, para concebemos um produto de moda, o corpo e as funções a serem desempenhadas devem ser levadas em conta de maneira criativa, e não o contrário.

3.2 coleções transformáveis criadas por designers contemporâneos

Esses conceitos do vestuário transformável vêm sendo explorados por criadores contemporâneos. Seguem exemplos de designers de diferentes nacionalidades que constituíram roupas transformáveis de maneiras diversas, mostrando infinitas possibilidades de conceber o vestuário através do conceito transformável. Galya Rosenfeld, designer de moda Israelense, cria bolsas e roupas através da modularidade. Seu trabalho é realizado com feltro de lã e seus módulos baseiam-se em “pixels” de fotografia, quadrados que, encaixados, transformam-se em produto. Se manipulados, seu volume e forma mudam. Lembram também um Lego, o qual monta-se e desmonta-se conforme sua vontade, gerando interação e estimulando a criatividade do usuário (FLETCHER; GROSE, 2011).


FIGURA 2 – ROUPA DE QUADRADOS DE FELTRO POR GALYA R.

FONTE: (FLETCHER; GROSE, 2011, p. 84)

Glória Coelho, estilista brasileira com quase 40 anos de carreira, trabalhou com o vestuário transformável pela primeira vez em sua coleção denominada “Transformações”, no inverno de 1999. Em seguida, algumas peças mantiveram esse espírito, como a coleção “Armaduras” no verão 2004/2005. Nessa coleção, Gloria Coelho trabalhou a aviamentação exposta e, como mostra a figura 3, suas peças transformavam-se em duas ou mais opções de vestuário e acessório (FLETCHER; GROSE, 2011).


FIGURA 3 – COLEÇÃO TRANSFORMAÇÕES POR GLÓRIA COELHO

FONTE: (BARION, 2014, p. 178)

Deploy utiliza o conceito de modularidade como reconstrução. Suas peças são inspiradas na “alfaiataria antiga”, como descrevem Fletcher e Grose (2011) e “com fixações imperceptíveis”. Ou seja, diferentemente da coleção da Glória Coelho, a Deploy esconde seus meios de transformações.

FIGURA 4 – ROUPA DA DEPLOY

Fonte: (FLETCHER; GROSE, 2011, p. 81)


Daniela Pais, estilista portuguesa radicada na Holanda, criou uma coleção com o objetivo de permitir ao usuário escolher, improvisar e brincar (SALCEDO, 2014). Daniela seguiu com o conceito de transformação e buscou trazer um caráter mais sustentável na escolha da matéria-prima, trabalhando apenas com algodão, linho, alpaca peruana, lã merino orgânica e fibras reutilizáveis.

FIGURA 5 – PEÇA DA COLEÇÃO ELEMENTUM

FONTE: (SALCEDO, 2014, p. 49)

Por meio desses exemplos é possível perceber as diferentes abordagens empregadas ao design do vestuário de maneira a contribuir com este estudo com referências diversificadas (FLETCHER; GROSE, 2011).

4 O CONSUMIDOR CONTEMPORÂNEO

O homem, desde o princípio, buscou meios de expressar sentimentos, vontades, anseios e ideias. A fala, a expressão corporal, assim como a vestimenta, são resultado da busca por expressão, compreensão dos demais e meio também de situar-se no ambiente em que vive e compartilha. Assim, Castilho e Martins (2008, p.36) escreveram que “O sujeito, por meio do corpo como suporte e meio de expressão, revela uma necessidade latente de querer significar, de reconstruir-se por meio de artifícios inéditos”.


Tendo em vista a vida contemporânea, na qual cada minuto torna-se mais veloz, restaurantes podem ser classificados como fast-food, e o mesmo acontece com o consumo de moda. Observando o fast-fashion, é possível constatar a inconstância do momento. Como Bauman (2008) bem colocou, a sociedade vive com um sentimento esmagador de incerteza. A certeza do que se quer e gosta dura muito pouco, pois logo aparecerá um produto substituindo o anterior de maneira extremamente rápida, o que coloca em dúvida, se o consumido anteriormente é tão eficaz quanto o atual, por exemplo.

Os bens tendem a se tornar riscos, prêmios brilhantes viram emblemas de vergonha, as modas vêm e vão com espantosa velocidade, todos os objetos de desejo ficam obsoletos e são deixados de lado antes que tenhamos tempo para aproveitá-los por completo. Estilos de vida que hoje são chiques, amanhã se tornarão alvos de ridicularização. Se este é o caso, então, para evitar frustrações, faríamos melhor se freássemos o desenvolvimento de hábitos e ligações ou se assumíssemos compromissos duradouros. Os objetos de desejo são mais bem aproveitados imediatamente, depois são abandonados; os mercados fazem com que tanto a satisfação como a obsolescência sejam instantâneas. (BAUMAN, 2008, p.197,198).

Buscando entender o perfil do consumidor contemporâneo, pode-se afirmar que ele é, no geral, forçadamente acostumado com a obsolescência dos produtos, assim como a velocidade que eles vêm e vão. A ânsia pela inovação é muito forte e por isso o consumo de moda é tão grande (SVENDSEN, 2010). Uma peça de roupa supre poucas necessidades de estilo, o que faz com que o consumo de peças novas seja constante. Através da realidade veloz, da ânsia por novidades e inconstância naturalmente aderida nos dias atuais, é normal pensar que existem pessoas que buscam uma peça de roupa que seja menos limitada e traga mais para seus guarda-roupas pouco flexíveis as mudanças de estilo.


5 ADAPTABILIDADE

As cidades são organismos vivos que nós modificamos. Como Rogers (2012) esclarece, as cidades funcionam como imãs que atraem pessoas pela sua complexidade e oportunidades, elas desenvolvem cultura e refletem a sociedade que abrigam. São compostas por pessoas, com diferentes ideais e motivações, e que são extremamente complexas, assim como seus problemas. Como exemplo, temos o Plano Agache, primeiro plano Urbanístico da cidade de Curitiba, capital do Paraná. O Plano Agache foi feito por Albert Agache, francês, que propôs como solução segmentar a cidade em centros de necessidade. O bairro do Tarumã, virou o centro esportivo; o Centro da cidade, o centro comercial; a região do Mercado Municipal, o centro de abastecimento alimentício. Então se surgisse alguma necessidade seria necessário recorrer ao bairro “X”. Mas com o tempo, este plano foi modificado naturalmente. Todas as regiões se tornaram independentes e subsistentes. Este é um exemplo de que modificamos a cidade conforme nossas necessidades. Antes da cidade se desenvolver, atravessar a cidade para ir até o centro de abastecimento alimentício, por exemplo, era normal e não implicava em passar muito tempo no trânsito. Com o tempo, essa realidade mudou, e assim, criar regiões subsistentes pareceu o mais adequado para os moradores de cada região. Não depender do outro bairro, do carro, do tempo, do trânsito. Este é um exemplo de modificação que os próprios cidadãos realizaram sem perceber. Rogers (2012) considera extremamente importante o cidadão estar envolvido com o ambiente em que habita, cooperando com a sua evolução para o bem de toda comunidade. Mas o que acontece hoje, são cidades projetadas para o próprio enriquecimento, sem refletir os valores sociais e filosóficos comuns do imaginário coletivo. Nas cidades os ambientes se moldam conforme a necessidade do homem. Já na moda é o homem quem se modifica conforme os ambientes e ocasiões.


Embora os contextos homem versus cidade e homem versus moda apresentem situações inversas eles estão diretamente interligados. Por exemplo, numa determinada região faltam ambientes para a prática de esportes. As autoridades se mobilizam e constroem um novo espaço. A tendência é que haja um aumento no consumo de roupas e acessórios esportivos. Portanto, a cada nova intervenção urbana (a construção de um novo bar, de um novo museu, de uma nova praça) novas demandas por moda surgirão e haverá alteração e adaptação no modo como as pessoas se comportam e se vestem. Svendsen (2010) afirma que as mudanças que ocorrem na moda são simples e puramente pela mudança, sem nenhuma tentativa de aperfeiçoar a roupa conforme as reais necessidades do usuário. Isso não acontece só na moda, acontece também na arquitetura e no urbanismo. Em contrapartida à mudança pela mudança, existem aqueles que buscam maior adaptabilidade aos reais problemas do indivíduo. Afinal, este é um dos principais motivos pelo qual se cria objetos, para resolver um problema funcional. Caldas (2013) diz que se se sintetizássemos a moda em uma única palavra, essa palavra seria “mudança” adaptar-se é mudar-se, para estar mais adequado e adaptado as determinadas situações do dia-a-dia, das diferentes circunstâncias e momentos da vida. Caldas (2013) ainda diz que o consumidor contemporâneo não se identifica mais apenas com um estilo, mas com “n” estilos, variando claro de acordo com a vida e os interesses de cada um. Ao consumidor interessa ter um guarda-roupa diversificado, que responda às suas necessidades de acordo com as ocasiões que se apresentam no dia-adia. Assim, o conceito “de ocasião de uso” tornou-se central para uma coleção bem direcionada. (CALDAS, 2013).


6 DESENVOLVIMENTO DA COLEÇÃO

6.1 Experimentações Na fase de geração de alternativas a maior preocupação foi realizar peças com transformações eficazes, que trouxessem de fato benefício ao usuário. Um dos métodos utilizados para encontrar possíveis soluções foi um laboratório realizado com peças convencionais, como camisetas, shorts e saias. Estas peças foram descosturadas e alteradas de diversas formas, de modo que pudessem assumir uma nova configuração. Por exemplo, uma calça com a costura desmanchada transformou-se, com algumas alterações, em uma jaqueta. O maior desafio foi obter peças que obtivessem êxito em ambas as fases de uso, tanto no conforto e usabilidade quanto esteticamente. A etapa de experimentação foi determinante para se compreender os potenciais de transformação das peças.

6.2 Conceito O conceito surgiu durante a fase de experimentação. As peças tiveram sua costura desfeita (desconstrução) e, em seguida, foram submetidas a testes e experimentos resultando em uma nova forma (construção). Construir e desconstruir foi o processo que gerou as vestimentas transformáveis desse projeto. O trabalho do arquiteto-engenheiro Santiago Calatrava serviu de inspiração na construção das roupas, principalmente no momento de definir acabamentos. Isso porque Calatrava busca em suas obras valorizar o que é a engenharia aliada à arquitetura, e seus resultados são surpreendentes. Porém, os resultados obtidos por Calatrava, transferidos para moda, resultariam em um trabalho conceitual. Portanto, a ideia foi de usá-lo como referência apenas em sua essência: valorização da construção.

6.3 Resultado


Foram projetados quinze looks transformáveis e sete peças foram executadas. O objetivo foi obter peças de vestuário com boa usabilidade e estética em ambas as fases da transformação. A peça calça que se transforma em jaqueta, e a peça shorts que se transforma em blusa foram as mais desafiadoras pois transformam-se, sem nenhum destaque através de zíper, em outra peça. Estas exigiram mais protótipos e tentativas para se chegar ao resultado final, pois transferir as medidas da parte superior do corpo para a parte inferior requereu testes que as tornassem ergonomicamente usáveis. O resultado pode ser visto abaixo:

FIGURA 6 – PEÇA SHORTS QUE SE TRANFORMA EM BLUSA

FONTE: A AUTORA


FIGURA 7 – PEÇA CALÇA QUE VIRA JAQUETA

FONTE: A AUTORA

O casaco de inverno, ou sobretudo, é uma peça cujo o forro foi pensado para ser destacado, podendo assim, virar uma jaqueta esportiva. Porém, ao transformála em forro fora pensado em aproveitar o bolso da jaqueta para um bolso interno do casaco de inverno e para isso acontecer a peça foi confeccionada com os acabamentos embutidos para ser anexada do lado avesso ao casaco permitindo então a existência de um bolso interno para o sobretudo, como mostra a imagem a seguir:


FIGURA 8 – FORRO DESTACÁVEL COM BOLSO INTERNO

FONTE: A AUTORA A bolsa que se transforma em blusa foi projetada de modo que, como blusa, vestisse perfeitamente e, como bolsa, fosse funcional. E para isso acontecer o ponto de partida foi o “ H” que seria a alça da bolsa e a alça da blusa também. Foi este elemento que permitiu com que o funcionamento fosse eficaz. Como bolsa, essa alça permite três maneiras distintas de carrega-la e como blusa a alça torna-se um elemento de estilo diferenciado além de trazer segurança para quem a vestir.


FIGURA 9 – PEÇA BLUSA/BOLSA

FONTE: A AUTORA

Já as peças desenhadas com destaque na cintura ou no quadril, podem ser usadas conectadas entre si, para ser um vestido com uma modelagem mais reta, ou independentes, usadas mais ajustada ao corpo através de um ajuste com cordão, como mostra a imagem abaixo:

FIGURA 10 – ZÍPER DE LIGAÇÃO NO QUADRIL ALTO E AMARRAÇÃO

FONTE: A AUTORA


7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Para projetar esta coleção o estudo preliminar sobre as diferentes maneiras de construir um vestuário transformável ajudaram na construção do pensamento do que faria sentido para a usuária: mulher contemporânea, com menos tempo e rotina atarefada. Por isso, poucas funções foram anexadas à coleção se tornar esta um facilitador, e não o contrário. O processo todo fora muito positivo em toda a concepção da coleção, alguns ajustes foram feitos durante a confecção das peças pois, enquanto desenho e modelagem e prototipado em um tecido que não o real, funcionara, mas com os tecidos reais não. Os testes e a prototipagem guiaram o resultado final, com roupas transformáveis de fácil uso, comercias, que não corram o risco de confundir o consumidor por obter muitas funções e esteticamente harmônicas. Utilitas; funcionalidade, firmitas; estrutura e venustas; beleza presentes em todo o processo e no resultado final.


REFERÊNCIAS

BARION; R.; ELLE BRASIL: Liga dos Campeões. São Paulo: Abril, 2014. BOLTON, A.; The Supermodern Wardrobe. V&A Publications, 2002. CALDAS, D. ; Universo da Moda. São Paulo: Observatório de Sinais, 2013. E book FLETCHER, K. ; GROSE, L; Moda & Sustentabilidade: Design para Mudança. São Paulo: Senac São Paulo, 2011 LIPOVETSKY, G.; O Império do Efêmero: A moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Schwarcz S.A., 2013. PEREIRA, J. ; Introdução à História da Arquitetura: Das Origens ao Século XXI. Porto Alegre: Bookman, 2010. QUINN, B., Techno Fashion. New York: Bloomsbbury Academic, 2002 SALCEDO, E. Moda ética: para um futuro sustentável. São Paulo: G. Gili, 2014. STALLYBRASS, P. O Casaco de Marx: roupas, memória, dor. São Paulo: Autêntica, 2012. SVENDSEN, L. Moda: uma filosofia. São Paulo: Zahar, 2010.


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