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DIÁRIO DO NORDESTE FORTALEZA, CEARÁ - SÁBADO E DOMINGO, 8 E 9 DE OUTUBRO DE 2016
Contraplano JOVEM CLÁSSICO
CRÍTICA
Hey, Donnie! que não transformassem em um sentido mais subjetivo dentro do gênero que o filme se enquadra.
C Clássico cult “Donnie Darko” completa 15 anos de lançamento e ainda intriga o público com seus mistérios DIEGO BENEVIDES Crítico de Cinema
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ara começar a trajetória de uma nova coluna sobre cinema (e outros assuntos audiovisuais que me chamarem a atenção), viajei no tempo para refletir sobre os últimos 10 anos que me fizeram trabalhar profissionalmente com a sétima arte. A memória imediata que eu tive foi de uma sessão que fiz, em casa mesmo, do enigmático “Donnie Darko”, que me impressionou à primeira vista. Lançado originalmente em 2001, o filme só chegou ao Brasil algum tempo depois. São 15 anos alimentando o imaginário dos
cinéfilos e, o mais interessante, com uma concepção artística madura que envelheceu bem. Digo isso tanto na forma de contar uma história cheia de mistérios e com múltiplas interpretações, quanto a maneira como Richard Kelly, estreante no roteiro e direção de cinema, filmou a relação de Donnie com o macabro coelho Frank, cuja presença dá início a uma série de acontecimentos bizarros na vida de um jovem esquizofrênico.
Viral O filme ficou em cartaz pouco tempo, mas foi um sucesso na divulgação boca a boca. Não tinha como exigir uma bilheteria extraordinária, já que 2001 foi um ano triste e caótico para os americanos. Ainda era uma época sem serviços acessíveis de streaming, mas “Donnie Darko” conquistou seu próprio espaço pelo endeusamento dos fãs e pela disseminação de cópias
Jake Gyllenhaal interpreta um jovem ameaçado pelo inevitável fim do mundo
“Donnie Darko” ainda proporciona novas camadas de sentido a partir de uma proposta particular de narrar um mistério em VHS e DVD, gerando discussões intermináveis. Rever “Donnie Darko” nos dias atuais, com uma experiência cinematográfica acumulada, causa uma sensação diferente da primeira vez. A confusão da história, que não exige uma busca de sentido no enredo, não se resolve. Pelo contrário, se torna mais instigante. Nem mesmo Jake Gyllenhaal, protagonista do filme, faz ideia do que ele significa. Isso poderia ser um problema se os conflitos fossem meros acessórios jogados em tela,
DIEGO BENEVIDES caderno3@diariodonordeste.com.br
O novo e o clássico MOSTRADEINÉDITOSE RETROSPECTIVA Emnovembro, aprogramação especialdo CineteatroSão Luiz presentearáopúblico cearense com o pré-lançamentodeobras quesó devemestrearem circuito comercial em2017. Tambémserãoexibidos filmesclássicos restauradoscom exibiçãonoformatoDCP (digital cinemapackage), quegarante uma exibiçãodealtaqualidade,aindamais setratandoda sala icônica do SãoLuiz. Entreos títulosinéditos já confirmados pelacuradoriaestão “AMorte deLuís XIV”,deAlbert Serra;“Creepy”, de KiyoshiKurosawa, e“Apesarda Noite”,dePhilippe Grandrieux.Outros filmesdevemser negociadosnas próximassemanas. AMostratambém seráresponsável pelorelançamentodealgunsclássicos docinema, como “Blow-Up -Depois DaqueleBeijo”(1966), de MichelangeloAntonioni, indicadoa
“ESTRANHOSNO PARAÍSO”, deJim Jarmusch,seráexibidoem cópia restauradaem Fortaleza duasestatuetas doOscar; “O Homem queCaiu naTerra” (1976),dirigido por NicolasRoeg eestrelado porDavid Bowie,e“Estranhos noParaíso” (1984), quedeuao diretor JimJarmuschum prêmionoFestivaldeCannes,além do prestígioquerecebeu emimportantes eventoscomoos festivaisdeLocarnoe deSundance.
A diretora Anna Muylaert anunciou que vai tirar férias após uma temporada intensa de divulgação do filme “Que Horas Ela Volta?” pelo mundo, além de ter lançado recentemente outra obra, “Mãe Só Há Uma”. O filme estrelado por Regina Casé foi o grande vencedor do 15º Grande Prêmio Brasileiro em sete categorias: melhor longa-metragem de ficção, direção, atriz, atriz coadjuvante, roteiro original, montagem de ficção e júri popular. Ao receber o prêmio principal da noite, Muylaert falou sobre a importância política do longa-metragem, que dá voz às minorias que ainda vivem em um sistema opressor. A apresentadora Regina Casé também aproveitou o palco para revelar que já existe um novo projeto entre as duas para os próximos anos, sem contar detalhes sobre o que se trata.
Respostas No livro recém-lançado no Brasil pela Darkside Books, que traz o roteiro original de “Donnie Darko” e uma extensa entrevista com o criador Richard Kelly, Gyllenhaal escreve que responder sobre o que o filme se trata parece muito simples para um filme complexo. “De alguma forma, eu sempre o entendi. Para mim, a coisa mais incrível ao fazer esse filme foi o fato de que ninguém, incluindo o homem que viu a história emergir de sua mente, tinha uma resposta simples para esse pergunta. E, por ironia, esse é exatamente o sentido do filme. Nunca existe uma única resposta para qualquer pergunta”, escreve o ator, que ainda estava no início da carreira e hoje é um dos mais cotados do cinema. Depois disso, Richard Kelly lançou alguns filmes que nunca conseguiram muita projeção. “Southland Tales: O Fim do Mundo” (2006) até tentou se apropriar da atmosfera fatalista de “Donnie Darko”, mas não tinha o mesmo frescor ou pareceu meio esgotado. Sem falar da infame sequência“S. Darko”, lançada em 2009 e dirigida por Chris Fisher, que foi facilmente esquecida. A cada revisita a “Donnie Darko”, explodem ainda mais as referências de Richard Kelly a universos como o de Stephen King, David Fincher, Stanley Kubrick e Graham Greene, que inclusive é citado no longa. A intensidade da narrativa e a inesquecível persona de Frank como elemento essencial do filme sobrevivem à passagem do tempo e podem criar novos significados. O nosso mundo não acabou, como o coelho Frank ousou dizer, mas perceber o filme dentro de um contexto político atual também é uma forma de olhar nas entrelinhas. E, como deve acontecer, daqui a mais 15 anos, “Donnie Darko” certamente ganhará novas camadas que eu mal posso esperar para explorar.
A Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) assina o lançamento do livro “100 Melhores Filmes Brasileiros”, primeira publicação da entidade. O livro é fruto de uma pesquisa com os associados que votaram n as obras mais relevantes de todos os tempos para o cinema nacional. Com apoio do Canal Brasil, a obra está em pré-venda no site da Editora Letramento e em breve deve chegar às livrarias. O livro também contou com textos de cinco experientes críticos cearenses.
O Festival de Teatro Infantil (TIC), que segue em cartaz em diversos espaços culturais de Fortaleza, também oferece para a criançada o projeto TIC na Tela - Mostra ComKids. A programação especial traz curtas-metragens nacionais e internacionais que abordam temáticas como família, gênero, identidade, entre outros. As exibições são gratuitas e acontecem no Cinema do Dragão-Fundação Joaquim Nabuco hoje (8) e amanhã (9), além do dia 12, sempre em três horários: 16h (para crianças com até 6 anos), 17h e 18h (para crianças de 7 a 14 anos).
Após o sucesso estrondoso de “Cine Holliúdy”, o ator Edmilson Filho retoma a parceria com o cineasta Halder Gomes em “O Shaolin do Sertão”
Comédia sem surpresas
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cineasta Halder Gomes encontrou um nicho de filmes popular e lucrativo ao retratar os costumes dos nordestinos em “Cine Holliúdy”. O sucesso fez com que ele ganhasse grandes contratos, além de um orçamento generoso, cerca de R$ 4 milhões, para investir em “O Shaolin do Sertão”, que estreia no dia 13 de outubro. A sensação que dá ao assistir à nova aventura estrelada por Edmilson Filho é de que há um esgotamento prematuro da comédia de costumes nordestina proposta pelo diretor. Apesar das diferenças narrativas com “Cine Holliúdy”, a escolha de retratar o personagem interiorano cheio de chistes já não é novidade e pode nem ser tão engraçada assim. Talvez para quem é de fora seja mais fácil se relacionar com as brincadeiras. Daqui, a impressão é que o retrato feito dos personagens, aparentemente situados em uma bolha unidimensional, sem outros olhares daquela situação, não permite progressão. O cearense tem mesmo esse toque cômico, o sotaque mais “aberto”, o estilo “Seu Lunga” de ser, mas o roteiro formulaico não leva esse perfil a outro lugar além do que já se espera. Por outro lado, Halder aproveita a projeção de “O Shaolin
do Sertão” para apresentar alguns talentos locais, mesmo em personagens pequenos. É o lado contemplativo do cineasta que tem o compromisso de exaltar sua própria terra. A produção é bem cuidadosa, com a direção de fotografia fazendo um trabalho apurado e elegante, ao lado da direção de arte e do figurino que transformam o filme quase em um conto fantástico. O longa também se mostra um pouco mais inventivo, a tirar pelo prólogo que reproduz o aspecto VHS dos velhos filmes de luta que enchiam as prateleiras das locadoras. Por outro lado, a montagem alonga demais sequências como o próprio prólogo e a luta no final, que pode causar certo tédio com a repetição das piadas físicas e a falta de grandes sacadas. Pelo apelo popular, “O Shaolin do Sertão” tem tudo para arrastar mais uma grande bilheteria. Também não deixa de ser superior a outras comédias nacionais descartáveis, feitas sem apuro técnico algum e, principalmente, sem paixão pelo seu objeto de estudo. E eis que surge a grande vantagem do longa: Halder e Edmilson mostram o amor que sentem não apenas pelas artes marciais, mas também pelo próprio cinema e entregam um filme que tem mais coração do que graça. (DB)
RevisitarKubrick
RETROSPECTIVA Durante toda a semana, o Cineteatro São Luiz exibiu uma retrospectiva com algumas das principais obras do aclamado cineasta Stanley Kubrick. A Mostra termina hoje (8) com a projeção dos clássicos “2001, Uma Odisseia no Espaço” (13h), “O Iluminado” (16h) e Laranja Mecânica (19h). A distribuição dos ingressos acontece gratuitamente, sempre com meia hora antes de cada sessão. Segundo Duarte Dias, programador do São Luiz, cada filme exibido reuniu uma média de 200 espectadores, número que deve aumentar nas sessões deste sábado. O curador também confirma que uma retrospectiva do diretor Quentin Tarantino está no radar, mas só para o próximo ano.