Coluna Contraplano | Caderno 3 | Jornal Diário do Nordeste | 20/01/18

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DIÁRIO DO NORDESTE FORTALEZA, CEARÁ - SÁBADO E DOMINGO,20 E 21 DE JANEIRO DE 2018

CONTRAPLANO EM CARTAZ

NACIONAL

Uma delicada paixão de verão

Viagem para se reencontrar

Os atores Timothée Chalamet e Armie Hammer surgem impecáveis em adaptação de livro que retrata paixão avassaladora na Itália dos anos 1980

Delicadeza e sensualidade marcam a adaptação de “Me Chame Pelo Seu Nome”, de Luca Guadagnino DIEGO BENEVIDES Crítico de cinema

U

m dos destaques da temporada de premiação do cinema, “Me Chame Pelo Seu Nome” é o novo trabalho do diretor italiano Luca Guadagnino, a partir do livro escrito por André Aciman. A trama acompanha a jornada de autodescoberta de Elio, interpretado por Timothée Chalamet, um jovem de 17 anos que cria uma forte amizade com Oliver, papel de Armie Hammer, aluno de seu pai. Para registrar essa relação, em pleno verão italiano de 1983, Guadagnino opta pela sutileza narrativa, sempre preocupado em conferir um tom de naturalidade aos dois personagens.

É delicioso acompanhar os dois descobrindo seus sentimentos e seus corpos, sem problematizar em excesso a intolerância da época em relação à homossexualidade. O roteiro de James Ivory está preocupado, antes de tudo, em mostrar o florescer do sentimento. Puritanismo à parte, a empatia e a química de Chalamet e Hammer são essenciais para se apaixonar pelo casal. A subjetividade está sempre visível nos conflitos que os separam ou os unem, sem apelar para grandes verbalizações sobre aceitação. São dois jovens que descobrem que podem se amar, mesmo com prazo de validade.

Sentimental Os personagens periféricos, especialmente os pais de Elio, também são construídos com sensibilidade. A maneira com que eles entendem o que pode estar acontecendo entre os dois jovens é extremamente bonita. Há um leve e bem-vindo toque de humor em toda a película que equilibra as ten-

sões que se formam em mais de duas horas de projeção. A obra mostra o quanto o apoio familiar é importante, ainda que o filme deslize em seus minutos finais ao objetificar esse discurso fraterno, entregando ao público um desfecho tipicamente americano para uma obra europeia, onde é preciso explicar demais – quando o melhor seria deixar o público apreender os sinais. A câmera de Guadagnino faz um estudo sobre o comportamento dos corpos em cena, além de explorar as belas locações em prol de uma mise en scène efetiva. Guadagnino expõe todo o seu amor e respeito pelos personagens, cientes de que eles são de fácil acesso para todos os públicos. A história de Elio e Oliver será facilmente fixada na memória afetiva dos cinéfilos quando falarem sobre histórias de amor. Mérito disso também vai para a entrega de Chalamet e Hammer na construção de seus personagens. Chalamet é um achado para o cinema e

DIEGO BENEVIDES

Rotterdam

diego.benevides@diariodonordeste.com.br

Estreia em Sundance OLONGA brasileiro “Ferrugem”, dirigidoporAly Muritiba, farásua estreiamundial nestesábado (20) na mostracompetitiva do Festivalde Sundance.Ocineasta retornaao festivaldepois deseuprimeirolonga, o ótimo“ParaMinha Amada Morta” (2015),ser premiadocom oGlobal FilmmakingAward/Sundance Institut 2013.Atramade“Ferrugem” giraem tornodeTati, papeldeTiffanny Dopke, adolescentequetem avida transformadaquandoum vídeoseu privadoédivulgado emumgrupo de WhatsAppdocolégio. O filmetambém terásessõesnaprogramação do festivalnosdias 21,22, 25e 26de janeiro.Oelenco também contacom ClarissaKiste,DudahAzevedo, EnriqueDiaz, Giovanni deLorenzie PedroInoue. Muritiba,que jáfoi professordeensinomédio, escolheu o temadasredes sociais porser uma realidademuito presentenos diasde hoje.O longaérealizado pelaGrafo

“FERRUGEM”, deAly Muritiba,faz sua estreiamundial noprestigiadoFestival deSundanceneste sábado (20) Audiovisual,em coproduçãocom a GloboFilmes eCanal Brasil. Aprevisão deestreianocircuito comercial éno segundosemestre de2018.Sundance seguedando visibilidade àprodução brasileiraano apósano. Alémde “Ferrugem”,outras oitoproduções integramaprogramação,como “Benzinho”,deGustavo Pizzi.

segura o filme com a competência dos veteranos. Para quem já foi adolescente um dia e acreditou na romantização do amor, fica fácil se identificar com as lutas e questionamentos que Elio passa, independente de orientação sexual. É uma história de amor que, por acaso, aconteceu entre dois homens, mas ela é universal e a paixão não tem gênero. Hammer também tem o desafio de conferir várias nuances para Oliver. Ele transita entre o galanteador, o provocador, o sensível e o moço apaixonado com facilidade. Ele personifica a ideia clássica de príncipe encantado com seu charme irresistível. O encantamento por “Me Chame Pelo Seu Nome” é verdadeiro porque parte de uma abordagem sentimental e puramente pessoal. Mesmo que não corra riscos como obra, o resultado é sexy, divertido e pode partir o seu coração, como todas as grandes paixões da ficção ou da realidade.

Berlim O projeto “A Primeira Morte de Joana’, segundo longa-metragem de Cristiane Oliveira (foto à esquerda), foi selecionado para o Co-Production Market, do 68º Festival de Cinema de Berlim. A Okna Produções marca presença no evento desde 2011, quando Aletéia Selonk (foto à direita) foi selecionada para o Talent Project Market com “Mulher do Pai”, também dirigido por Cristiane, ainda em fase de desenvolvimento. Voltado para produtoras consolidadas no mercado e com experiência em coproduções, o Co-Production Market recebeu 326 projetos inscritos e 21 selecionados. É um encontro de mercado para apresentar projetos internacionais de alta qualidade, bons contatos de negócios e novas oportunidades de cooperação.

O Festival de Rotterdam, uma das vitrines mais relevantes para o cinema independente contemporâneo, selecionou duas obras distribuídas pela Boulevard Filmes: “Sol Alegria”, do paraibano Tavinho Teixeira, e “Açúcar”, dos pernambucanos Renata Pinheiro e Sergio Oliveira. O Ceará também vai marcar presença com a exibição de “Clube dos Canibais”, dirigido por Guto Parente, e “Inferninho”, codirigido por Pedro Diógenes e Guto Parente.

E

m seu primeiro longametragem, a cineasta Carolina Leone escolhe um tom mais cuidadoso para contar a história de Rosália, operária que dedicou sua vida inteira ao trabalho e é demitida aos 65 anos. O abalo emocional da protagonista é o ponto central de “Pela Janela”, drama nacional que recebeu o prêmio da crítica Fipresci no Festival de Rotterdam. Leone, que também assina o roteiro, pensa além da questão do desemprego na terceira idade. O filme se torna especial por fazer com que a depressão da protagonista se converta em outras questões, como laços familiares e reconstrução pessoal. A diretora respeita o tempo e o sentimento de cada sequência, preferindo a fluidez narrativa ao melodrama comum. Após a demissão, Rosália, interpretada por Magali Biff, parte em uma viagem para Buenos Aires com o irmão José, papel de Cacá Amaral. Ele precisa levar um carro de São Paulo até a capital argentina e, para não deixar a irmã sozinha em casa após a demissão, decide levá-la. É nesse deslocamento que começam as transformações da personagem. Aos poucos, ela passa a enxergar o mundo do lado de fora e, mesmo que de forma lenta, busca se reposicionar diante de sua nova realidade. Em uma das paradas mais significativas da viagem, os ir-

mãos contemplam a grandiosidade Cataratas do Iguaçu, que representa a força da natureza no mundo dos homens. É onde Rosália se reenergiza. A extraordinária entrega da atriz Magali Biff faz parte desse processo de decomposição e recomposição de Rosália. Sua voz serena não esconde o sofrimento, talvez por isso ela fale pouco. Por meio de olhares e gestos, a protagonista tenta lidar com a tristeza enquanto questiona não apenas o seu futuro, mas também o passar do tempo em sua vida. Cacá Amaral interpreta o irmão dedicado e compreensivo, sem cair em caricaturas. A viagem não programada ao lado de Rosália também funciona para que ele se conecte mais ainda a ela. Assim, independente da abordagem política que surge naturalmente no centro da história, “Pela Janela” também é um filme sobre família. Pelos olhos da diretora, a velhice e a solidão significam a renovação da força de uma mulher. “Pela Janela” também é um filme que luta pela sua protagonista e que não solta a sua mão um momento sequer, o que garante a atenção e a estima do público. É o protagonismo feminino dentro e fora do filme, que vem da diretora e de sua atriz, para revelar o olhar sensível e crítico sobre um mundo que está em processo de redução dos mais frágeis. (DB)

Em “Pela Janela”, a atriz Magali Biff traz a profundidade silenciosa de uma operária que é demitida aos 65 anos e precisa se reerguer

Peixonauta–OFilme

Produção Diretor do ótimo “Simone” (2013), o colombiano Juan Zapata, radicado em Porto Alegre (RS), prepara a série de ficção “The Last Defectors”. Sem leis de incentivo ou apoio governamental, Zapata apostou em equipamentos de última geração, entre eles um “antigravity cam” inédito em filmagens de longas nacionais, para garantir o melhor resultado da produção, que começa a ser rodada já no segundo semestre deste ano em Los Angeles.

ANIMAÇÃO Com previsão de estreia para 25 de janeiro nos cinemas nacionais, “Peixonauta – O Filme” expande o universo da série de animação lançada em 2009 e exibida em mais de 90 países. Dessa vez, o peixe-detetive e seus amigos precisam descobrir os motivos que levaram uma cidade inteira a diminuir de tamanho. Os diretores Célia Catunda, Kiko Mistrorigo e Rodrigo Eba! se preocupam em não fazer apenas um episódio longo da série, criando novos desdobramentos para a trama investigativa. Realizado em animação tradicional e repleto de cores, o longa traz uma história sem vilões, educativa e inocente, feita de forma mais clássica, mas que certamente vai garantir a diversão da criançada.


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