Coluna Contraplano | Caderno 3 | Jornal Diário do Nordeste | 18/11/17

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DIÁRIO DO NORDESTE FORTALEZA, CEARÁ - SÁBADO E DOMINGO,18 E 19 DE NOVEMBRO DE 2017

CONTRAPLANO ESTREIA

DRAMA

Uma amizade inesperada

Em processo de criação

O

Judi Dench volta a interpretar a Rainha Victoria em nova parceria com o cineasta Stephen Frears DIEGO BENEVIDES Crítico de cinema

É

uma honra ver Judi Dench no cinema, aos 82 anos. Já são quase 60 anos de carreira e mais de 100 produções no currículo. Em “Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha”, a atriz retoma a parceria com Stephen Frears após “Philomena” (2013) e volta a interpretar a Rainha Victoria após “Sua Majestade, Mrs. Brown” (1997). Talvez não seja o papel mais desafiador de sua vida, mas Dench atua com a responsabilidade e o brilho de uma veterana que é joia preciosa no cinema. Sua nova Rainha Victoria enfrenta a solidão da corte, rodeada de bajuladores que aguardam seus últimos dias. A sanidade da protagonista é qustionada após conhecer Abdul Karim, interpretado por Ali Fazal, um indiano muçulmano que conquista a simpatia dela após presenteá-la com uma medalha durante o Jubileu de Ouro. A partir de então, a Rainha Victoria passa a compartilhar seus dias com o jovem, começa a aprender um novo idioma e a entender um pouco mais sobre o povo ao seu redor.

Inspiração O roteiro, baseado no livro da jornalista Shrabani Basu a partir dos diários pessoais de Abdul Karim, começa quase como uma comédia pastelão que não nega a liberdade criativa em cima da história original. Vemos uma Rainha entediada, obrigada a cumprir de forma mecânica uma agenda diária e sem brilho existencial. O cineasta Stephen Frears faz uma boa transição do humor para o drama quando pas-

Os atores Judi Dench e Ali Fazal estrelam a dramédia “Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha”, de Stephen Frears, sobre um encontro fraterno entre a Rainha da Inglaterra e um servo indiano que abala a tradicional corte inglesa

samos a conhecer os outros lados da Rainha. O roteiro de Lee Hall, responsável por filmes como “Billy Elliot” (2000), brinca com a percepção do público. Hall chega a sugerir o tempo inteiro quais seriam os interesses de dada um nessa relação improvável entre Rainha e servo. Aos poucos, o roteiro se abre para falar sobre solidão, amizade, laços familiares e inevitabilidade da morte. Victoria e Abdul são perseguidos e humilhados, nada muito distante das relações opressoras que ainda existem hoje em qualquer contexto. Por meio de sutilezas, “Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha” discute as frontei-

ras entre estado político e liberdade religiosa, tendo a intolerância social como principal mote. Rainha da Inglaterra e Imperatriz da Índia, Victoria também representa o poder feminino em um contexto formado por homens. Ela não hesita em suas atitudes e o roteiro também não busca justificá-la o tempo inteiro. Victoria pode ser uma rainha mimada, mas sabe muito bem quais são suas obrigações como figura política. O ator Ali Fazal também traz a humanidade que o personagem precisa, além de criar imediata empatia com a composição de seu personagem. Na direção, Frears não vai muito além do que já mostrou

DIEGO BENEVIDES

Quixadá

diego.benevides@diariodonordeste.com.br

Encontro de titãs ELEÉ UM dos principais teóricos, pesquisadores,críticos erealizadores decinema.Elaé amusado cinema marginal,tendo atuadoem produções importantespara ahistória, como“O Padree aMoça” (1966),deJoaquim PedrodeAndrade, e“O Bandido daLuz Vermelha”(1968),deRogério Sganzerla,além deter se dedicado nos últimosadirigirseus próprios filmes. Aos81 e75 anos,respectivamente, Jean-ClaudeBernardet e HelenaIgnez seencontramno drama“Antesdo Fim”,sobdireçãodeCristiano Burlan, filmeaindainédito em circuico comercialqueterá exibiçãoúnicae gratuitana programaçãodo Cine Rebuceteio,noCinema do Dragão,na próximasegunda-feira(20), às19h. Natrama, Jeansente-sepreso na lógicadelongevidade queaindústria farmacêuticao impõeedecide planejarumsuicídioconsciente. Ele convidaHelena para queo suicídio sejaadois.Ela, porsua vez, hesita,

CRISTIANOBURLAN dirige Jean-ClaudeBernardet e HelenaIgnez nodrama“Antesdo Fim” sabequeviverá beminclusivese precisarviversó, mas oajudaem suas intenções.O silêncioentre eles não reveladistância, mas intimidade. Exibidoforadecompetiçãodo último FestivaldeBrasília doCinema Brasileiro,“Antesdo Fim” reflete sobre apassagemdo tempoea inevitabilidadeda morte.

até agora em filmes como “A Rainha” (2006), “Florence: Quem é Essa Mulher?” (2016) e até mesmo “Alta Fidelidade” (2000). O diretor dispõe de uma equipe competente para a reprodução da época por meio dos cenários exuberantes, figurinos, desenho de produção e fotografia. Tecnicamente é um filme requintado que faz bem para os olhos. Com sensibilidade e carisma, “Victoria e Abdul- O Confidente da Rainha” é mais uma obra que nos presenteia com o gigantismo de Judi Dench na frente das câmeras. Do humor ao drama, o longa diverte e emociona com naturalidade, sem pretensão de ir muito além do que precisa.

Premiação O For Rainbow - Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual encerrou, na última quarta-feira (15), sua 11ª edição, no Cinema do Dragão. Atuando como espaço de convergência de diversas linguagens artísticas que possibilitam debates sobre gênero e sexualidade, o festival se mantém como um dos mais relevantes do circuito cearense. O júri oficial da competitiva de filmes premiou “Guigo Offline” (foto), de René Guerra, entre os longas, e “O Chá do General”, de Bob Yang, entre os curtas. O prêmio da crítica, concedidomais uma vez pela Associação Cearense de Críticos de cinema (Aceccine), foi para o longa “Música Para Quando as Luzes se Apagam”, de Ismael Caneppele, e para o curta “O Quebra-cabeça de Sara”, do carioca Allan Ribeiro.

Falando em diversidade, hoje (18) chega ao fim o I Festival Sertão & Diversidade, em Quixadá. O evento cultural foi criado para discutir gênero e diversidade, ampliando discussões sobre a temática a partir da vivência de pessoas LGBTs, sobretudo aquelas atravessadas pelo sertão. Filmes, shows, debates e oficinas integraram parte da programação, que teve início na última quinta-feira (16), na Fundação Cultural Rachel de Queiroz, no Centro.

cineasta francês Laurent Cantet é um artesão. Os cenários de suas histórias extraem o naturalismo das atuações e conflitos estabelecidos por um roteiro profundamente político, como visto no seu filme mais famoso, o excelente “Entre os Muros da Escola” (2009), sobre o sistema educacional francês. Em “A Trama”, exibido na mostra Un Certain Regard, do Festival de Cannes desse ano, o cineasta segue pela metodologia que o evidenciou até agora. Temos uma escritora, interpretada por Marina Foïs, que inicia um trabalho com um grupo de jovens de raças, nacionalidades e posicionamentos políticos diferentes. A proposta da oficina é construir uma história sobre o cotidiano deles, sobre o que está ou esteve ao redor. Cantet tem uma habilidade extraordinária de contar histórias, que aqui se aproximam cada vez mais de um cenário que não apenas a França vive hoje, mas o mundo inteiro. As diferenças, o ódio, a intolerância, o que resta entre a direita e a esquerda política, tudo é jogado em um caldeirão imprevisível. Enquanto os jovens buscam construir uma história de suspense a partir de percepções pessoais, a professora estimula a pesquisa e o conhecimento histórico, social e político da sociedade. Dessa forma, Cantet usa a metalinguagem como elemento de fruição da própria narrativa do filme.

Enquanto os alunos são provocados a pensar, eles desenvolvem suas próprias perspectivas como personagens dentro de uma trama ficcional. Esse é o grande acerto de “A Trama”, a capacidade de se desdobrar em várias perspectivas de dramaturgia, que começa quase como um documentário e se torna algo além do que é óbvio. O cineasta faz um retrato de uma juventude inquieta e reacionária, que se tornam portavozes de ídolos cujas ideologias são questionáveis. O roteiro, feito em parceira com Robin Campillo, coloca em evidências as inquietudes, inclusive da própria história, que ainda abraça um arriscado tom de fábula dentro de uma história basicamente naturalista. O elenco é um destaque a parte, especialmente o jovem Matthieu Lucci, que interpreta o controverso e, não por isso, curioso Antoine, um jovem seduzido por ideias reacionárias. Aliás, é interessante como Cantet prefere muito mais falar como elas se formam do que justificá-las de forma plausível, dando essa oportunidade de reflexão ao próprio público. Ainda que o ritmo da história se arraste um pouco entre os dois últimos atos, “A Trama” é mais uma experiência de imersão política de Cantet, que se utiliza da arte para estimular as conversas sobre o ontem, o hoje e o amanhã, por meio do olhar daqueles que, teoricamente, são a esperança do mundo. (DB)

Novo filme do diretor de “Entre os Muros da Escola” fala sobre processo criativo a partir da memória histórica em perspectiva com o mundo de hoje

LigadaJustiça

Animação O Canal Brasil estreia hoje (18), às 21h30, a sétima temporada da faixa “Anima Mundi”, com os 36 melhores curtas-metragens do prestigidado festival, sob curadoria de Aida Queiroz, César Coelho, Marcos Magalhães e Léa Zagury. Entre as técnicas apresentadas estão o stop motion, a animação em 2D e 3D, animação de bonecos, rotoscopia e desenho direto na película, que contemplam as mais diversas estéticas e formatos de produção.

HERÓIS Consolidando o universo cinematográfico da DC, “Liga da Justiça” tenta a todo custo acertar, ainda que o longa não tenha ajustado todos os problemas das produções do estúdio, especialmente no que diz respeito ao uso indiscriminado de efeitos visuais pobres. O roteiro opta por uma estrutura mais tradicional, apresentando o contexto de cada herói para justificar a união da equipe. Não existem grandes surpresas em relação aos conflitos da história. As batalhas estão mais claras, graças à colaboração de Zack Snyder e Joss Whedon, ainda que o tom cômico que tem se tornado obrigatório para deixar os filmes de super-heróis mais “cool” force a barra. Ainda assim, é um prato cheio para entreter os fãs e o mercado.


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