8 | Caderno3
DIÁRIO DO NORDESTE FORTALEZA, CEARÁ - SÁBADO E DOMINGO, 21 E 22 DE JANEIRO DE 2017
CONTRAPLANO HISTÓRICO
COMÉDIA
Para olhar além do que é óbvio
O loser que deu certo na internet
“Estrelas Além do Tempo” mescla drama e bom humor para falar sobre opressão racial nos anos 60 DIEGO BENEVIDES Crítico de cinema
A
no passado, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, responsável pelo Oscar, foi criticada pela baixa representatividade de indicados negros. Neste ano, filmes que abordam questões raciais estão na reta, como “Fences” e “Estrelas Além do Tempo”, além do documentário “O.J. Made in America”. Inspirado na obra de Margot Lee Shetterly e dirigido por Theodore Melfi, “Estrelas Além do Tempo” volta no passado para mostrar a vida de três mulheres negras que trabalham para a Nasa, durante os anos 60. Formadas e inteligentes, elas eram usadas como “computadores humanos” pela companhia. Por mais inteligentes e capacitadas que fossem, a segregação racial as impedia de ter uma vida sem opressão. Afinal, além de afro-americanas, elas eram mulheres, um pacote completo para fazer dos homens brancos e ricos aparentemente superiores a elas ainda que menos inteligentes. O roteiro acompanha a ascensão dessas mulheres, especialistas em matemática e engenharia, na Nasa – que estava em competição com os russos pela dominação do espaço e que, posteriormente, levaria o homem até a Lua.
Sentimentos O principal mérito de “Estrelas Além do Tempo” está nas sutilezas. Naturalmente, a história levanta a bandeira da igualdade entre os povos com certo romantismo, o que poderia fazer deste uma experiência repetitiva. Entretanto, Katherine, Dorothy e Mary são verdadeiras heroínas que brincam
Com previsão de estreia para 2 de fevereiro nos cinemas brasileiros, longa-metragem traz Janelle Monáe, Taraji P. Henson e Octavia Spencer na pele de mulheres que desafiam a segregação racial nos Estados Unidos
com as sensações do público, graças ao roteiro que sabe dosar bom humor e drama. O filme também faz um ótimo trabalho com as repetições dramáticas, criando uma atmosfera de segregação a todo tempo, desde a presença das placas que indicam o que os negros devem fazer até as humilhações pelas quais as personagens passam. Esse cansaço natural que vem das repetições causa um incômodo e um sentimento de injustiça. Pior, mostra que, no decorrer do tempo, pouco se aprendeu com essa herança trágica que o racismo deixou na sociedade. Esse cansaço é balanceado com o leve toque cômico que o elenco traz para a trama. Elas são mulheres instruídas, bonitas, se vestem bem e têm suas rotinas familiares. Elas entendem o mundo onde vivem, mas o grito pela liberdade sempre vem na garganta. É quando o filme conquista de vez a plateia. Em determinado momento do filme, Taraji P. Henson,
que interpreta a protagonista Katherine, quebra o coração do público com um grito que estava engasgado desde o início do filme. A empatia da personagem é imediata, quase caracterizada como uma nerd aos 40 e poucos anos.
Interpretações Taraji é o principal destaque de “Estrelas Além do Tempo”, mas é auxiliada pelas ótimas interpretações de Octavia Spencer e Janelle Monáe. O trio sempre cresce quando está junto e a lealdade entre elas é bonita de se ver na tela. Ainda que o roteiro tropece ao conectar as histórias individuais das três, deixando algumas esquecidas na projeção durante certo tempo, o longametragem é beneficiado com uma áurea de filme de superação e conquista, temas tão simpáticos hoje em dia. Também se mostra atual e necessário não apenas pelo resgate histórico que faz, mas por criticar indiretamente a atual realidade política, social e econômica dos Estados Unidos.
DIEGO BENEVIDES
Documentários
diego.benevides@diariodonordeste.com.br
Festival online ASÉTIMAEDIÇÃO do MyFrenchFilmFestivaljá começou. Como objetivodeapresentar asnovas fronteirasdo cinemafrancês, ofestival onlinedisponibilizagratuitamente 10 longas-metragense10curtasnas mostrasdecaráter competitivo,além detrêslongase seiscurtasforade competição. Asproduçõesestão divididas em categorias:Comingof Age,sobre a transiçãoda infância àvida adulta;We areFamily, com histórias que reforçamoslaços familiares;Loveand Friendship,focadonaamizade,oamor ouambos; Psycho,quetraz personagensperturbadores; A Woman’sLife, sobre asvidas de mulheres,eMidnight Screenings,uma seleçãocontroversae violenta. Nosúltimosanos, o MyFrenchFilmFestivaltem aproximadoopúblicomundial do cinemafrancófono, disponibilizando obrasdeteor inéditoe que,às vezes,
OCURTA“VIOLENCEEN RÉUNION”, estreladoporVincent Cassel,integra o catálogodo MyFrenchFilmFestival nemchegam aestrear noscinemas locais.Além deassistir aosfilmes,o públicotambém poderávotar nosseus títulosfavoritos. O festivaltambém teráumjúrioficial, presidido pelo cineastaargentinoPablo Trapero. As obrasficamdisponíveis nosite (www.myfrenchfilmfestival.com)até o dia13defevereiro.
O diretor Theodore Melfi, cuja produção de maior destaque até então era “Um Santo Vizinho” (2014), faz um filme visualmente requintado, mas sem grandes estripulias narrativas, ciente da mensagem que a história carrega. Ancorado pelas atuações de Taraji e das ótimas Octavia Spencer e Janelle Monáe (a cantora está bastante à vontade como atriz), o cineasta realiza uma obra agradável de se assistir, mesmo dentro de um tema tão cruel. Independente da cobrança natural que se tem, a indústria cinematográfica precisa falar sobre esses e outros sistemas opressores que ainda não foram abolidos por completo, por isso “Estrelas Além do Tempo” é tão necessário para os dias de hoje. Não é apenas um filme sobre negros. É, sobretudo, uma obra sobre a força das mulheres através dos tempos e a luta diária que elas passam para serem reconhecidas não pela saia que vestem, mas pelos óculos que usam.
Mercado A Agência Nacional do Cinema (Ancine) publicou um estudo recente sobre circulação de obras brasileiras pelos segmentos do mercado audiovisual entre 2011 e 2015. A pesquisa mapeia 100 longas-metragens nacionais lançados em 2011 em diferentes plataformas de exibição, comercializadas nos segmentos de vídeo doméstico, TV paga e TV aberta. A TV paga se mostrou o segmento com maior aproveitamento. Dos 100 filmes, 86 foram veiculados na TV paga até 2015. A grande presença de obras brasileiras na TV paga pode ser parcialmente atribuída à Lei 12.485, que, a partir de 2011, estabeleceu obrigações de veiculação de conteúdo brasileiro. 21 filmes foram comercializados em todos os mercados monitorados pela pesquisa.
O Canal Futura está com uma chamada pública aberta até o dia 3 de fevereiro em busca de projetos de curtas-metragens documentais, com duração de até 13 minutos. O projeto deve selecionar 30 propostas audiovisuais de realizadores independentes que irão integrar a programação do Curtas 2017 e serão exibidos no Futura e em outras plataformas de exibição do canal. As propostas de documentários devem ser enviadas por e-mail (canal@futura.org.br).
A
no passado, a youtuber Kéfera Buchmann lançou a comédia “É Fada”, que arrecadou cerca de R$6 milhões e abriu portas para um segmento do mercado audiovisual: influenciadores digitais que tiram seus fãs da frente do computador e os levam para o cinema. Agora, o também youtuber Christian Figueiredo lança a cinebiografia “Eu Fico Loko”, que já ultrapassou 200 mil espectadores apenas na primeira semana em cartaz. Com foco no público infanto-juvenil, a comédia mostra a ascensão do garoto comum que enfrentava bullying na escola e descobriu que poderia dialogar sobre seus problemas na internet. Ao que parece, “Eu Fico Loko” seria uma comédia adolescente qualquer, a não ser pelo fato de que dialoga com bastante propriedade com seu público alvo. Não é uma obra prima, até porque não se propõe a ser nada extraordinário, mas entre tantos produtos enlatados que são lançados no Brasil, este se diferencia pela empatia natural do protagonista e das situações que ele vive. Na trama, Christian sofre com a falta de popularidade na escola, além da pressão de ainda ser virgem. Ao lado do amigo Yan, eles conhecem algumas garotas que mudam a forma com que eles olham para si e para o mundo.
A direção e o roteiro ficaram a cargo de Bruno Garotti, que não economiza nos clichês, mas tenta fazer com que eles não sejam tão cansativos. Os conflitos do protagonista são sempre possíveis de adivinhar, mas a naturalidade com que eles aparecem em cena fazem a diferença. Aliás, é corajoso ver um filme falando com concisão sobre temas que ainda são “tabus familiares”, como virgindade e preconceito. “Eu Fico Loko” consegue abordar esses assuntos sem superficialidade e ainda deixa uma boa mensagem para a garotada. Além da participação do próprio Christian Figueiredo, que conta sua história por meio de flashbacks, a trama funciona especialmente pelo ótimo desempenho do ator Filipe Bragança e do elenco secundário, que conseguem a simpatia do público com facilidade. Mesmo se você não conhecer nada da história do youtube, a leveza do filme faz com que seja completamente possível embarcar nas aventuras improváveis da turma. Apesar de assumir um aspecto que varia entre a linguagem novelesca e o cinematográfica, Garotti tem algumas sacadas criativas que são beneficiadas pela montagem rápida. Acaba que “Eu Fico Loko” diverte por não ser pretensioso como obra, enquanto escancara a intenção primária de ser um sucesso de bilheteria. (DB)
O youtuber Christian Figueiredo mostra como um garoto comum superou o bullying e se transformou em um sucesso da internet
AGrandeViagem
Estreia Após vencer o Festival de Brasília 2016, o drama “A Cidade Onde Envelheço” estreia no dia 9 de fevereiro nos cinemas. Dirigido por Marília Rocha, a história acompanha Francisca, uma jovem emigrante portuguesa morando no Brasil, que recebe em sua casa Teresa, uma antiga conhecida com quem já havia perdido contato. As duas passam a lidar com desejos simultâneos e opostos: a vontade de partir para outro país e a saudade de casa.
SÉRIE DE TV Estreou ontem na TV Brasil a série infanto-juvenil “A Grande Viagem”, criada e dirigida por Caroline Fioratti. Um dos últimos trabalhos do ator Umberto Magnani, a série de treze episódios será exibida todas sexta, sempre às 20h30. Na trama, Magnani interpreta o Vovô Mário, ex-vendedor porta-a-porta de guia de viagens, que começa a apresentar os primeiros sinais do Mal de Alzheimer. Seu neto, o menino de dez anos Lipe, papel de Léo Palhano, resolve ajudá-lo a encontrar sua “memória perdida”. Quando eles descobrem que o armário no quarto do avô é um portal mágico pelo qual podem viajar pelo mundo, até mesmo através do tempo, passando por diferentes países e épocas, tem início uma aventura. A história investe no teor lúdico e é baseada em um curta-metragem da diretora que foi lançado em 2011.