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DIÁRIO DO NORDESTE FORTALEZA, CEARÁ - SÁBADO E DOMINGO, 25 E 26 DE MARÇO DE 2017
CONTRAPLANO DRAMA
NACIONAL
De volta para acertar as contas
Entre o luto e a busca dos sonhos
De forma respeitosa, diretor e elenco original retornam em continuação de “Trainspotting – Sem Limites” e realizam um filme que vai além do saudosismo
Depois de vinte anos, Danny Boyle lança sequência do clássico cult “Trainspotting – Sem Limites” DIEGO BENEVIDES Crítico de cinema
A
ambição da indústria comercial tem respeitado cada vez menos as histórias clássicas, que renascem, na maioria das vezes, apenas com a intenção de bater recordes de bilheteria, sem nenhuma proposta estética ou narrativa nova para o cinema atual. O diretor Danny Boyle, no entanto, esperou 20 anos para retornar ao universo de “Trainspotting – Sem Limites” (1996), que se eternizou como filme cuja linguagem pop e frenética se dava muito bem com a abordagem da juventude transviada noventista, metida com drogas pesadas e imersa em um submundo onde tudo pode acontecer. Esperar tanto tempo tem
vantagens, pois permite que a obra realmente envelheça como clássico e que, se for para retornar a ela, ofereça algo diferente e coerente com os dias de hoje. Essa é a proposta de “T2 Trainspotting”, que mostra como a passagem de duas décadas alterou a vida dos personagens vistos no primeiro filme. Renton, Spud, Sick Boy e Begbie ainda tinha m muito a conversar, principalmente após o desfecho icônico do longa-metragem anterior. Hoje eles já não são mais tão jovens, ainda que preservem alguns hábitos do passado, como as drogas e a criminalidade. Dessa vez, Boyle abre mão dos vícios que marcaram o primeiro filme, como a montagem extremamente dinâmica e a narração incansável. Os personagens envelheceram e estão em outro contexto, então amadurecer também a forma de mostrá-los é um grande acerto. Claro, a trilha sonora continua ali, sendo parte fundamental da trama, e elementos visuais trazem um toque espe-
cial em momentos importantes no decorrer da projeção.
Enredo Ainda bebendo no texto do autor Irvine Welsh, o roteirista John Hodge nos mostra a realidade de cada personagem. As vidas começam a se entrelaçar novamente e os fantasmas do passado não foram embora. Ainda que no início a história demore um pouco para engatar, o passar do segundo para o terceiro ato é certeiro. Em certo momento, Renton escancara a passagem de tempo ao refletir sobre o que seria “escolher a vida” hoje. O mundo não é o mesmo e as pessoas parecem efêmeras demais. Bons tempos talvez foram aqueles de vinte anos atrás, quando eles conseguiam minimamente ter um acordo de lealdade entre si, até que aconteça uma traição. Os atores Ewan McGregor, Ewen Bremner, John Lee Miller e Robert Carlyle defendem muito bem os personagens que ficaram imortalizados no
DIEGO BENEVIDES
Biarritz
diego.benevides@diariodonordeste.com.br
Cheio de carisma ASIMPATIADO cineastaindiano M.NightShyamalanfoiumdos destaquesda coletiva deimprensa realizadapela UniversalPicturesem SãoPaulo, noiníciodessa semana.O diretorveio ao Brasilpara encontrar a imprensaeparticipar da noite de pré-estreiade“Fragmentado”, quejá estáemcartaz noscinemas. Mediadapelocrítico decinema RobertoSadovski,a coletivaestava lotadadejornalistas eblogueiros, que aproveitaramopoucotempo para falarsobre onovo longa-metragem de Shyamalan.Depois,ocineasta recebeu aimprensaem entrevistasreservadas. Mantendoobom humor ea confiança nosfilmes quejá realizouaté hoje, Shyamalanéumexemplo demente criativaquenão se deixa abalar pelas críticasnegativas. Ele defende que seusfilmes acontecem nomomento certoeainventividade com quenarra suastramasé uma fontequenão se esgota.“Fragmentado” fazreferência a
M.NIGHTSHYAMALAN lança “Fragmentado”e já prepara opróximo filme,que prometeser incomum umdeseusprincipais filmes eos dois universosdevemse unir embreve. Shyamalancontaquejá está desenvolvendoa premissadeumnovo filmee prometeque serábem incomumaformacom quevai criarum desfechopara asobras, ambientadas emfasesdiferentes da carreira. A expectativaéalta desdejá.
cinema. É bom vê-los de volta e tentando acertar o passado, além de criar novos conflitos. Boyle opta por repetir demais os flashbacks para criar nostalgia no público, o que poderia ser poupado um pouco. A memória de “Trainspotting – Sem Limites” é forte e influenciou tantos filmes sobre jovens nesse tempo todo. Agora, com os personagens mais cansados, eles abordam outras crises, não apenas a dependência das drogas, mas principalmente as consequências de tudo que foi feito no passado, das escolhas certas e erradas e como isso transformou ou não a personalidade de cada um. Boyle não faz exatamente um filme para as grandes bilheterias. Em troca, ele elabora uma obra que precisava existir nesse exato momento, refletindo as crises pessoais e as relações entre passado, presente e futuro. É um filme que resistiu ao tempo e à ambição dos grandes estúdios e respeita o legado que foi deixado e se reposiciona de forma madura.
Homenagem O cineasta cearense Karim Aïnouz é o grande homenageado da Mostra Audiovisual do IX Festival UFC de Cultura, que acontece de 28 a 31 de março no Campus do Pici. A Mostra começa no dia 29, com a exibição de “Madame Satã” (2001). No dia 30 é a vez de “O Céu de Suely” (2006) e, dia 31, será a exibição de “Praia do Futuro” (2014). Além do tributo a Aïnouz, a programação ainda exibirá curtas-metragens produzidos pelos alunos do curso de Cinema e Audiovisual da UFC, como “Fora da Onda”, de Pedro Henrique; “O Meu Lugar”, de Luana Sampaio, Vitor Oliveira e Tatiana Ferreira; “Ambulante”, de George Henrique Almeida; “Europa”, de Leonardo Mouramateus; entre outros. Todas as exibições são abertas ao público.
A 26ª edição do Festival Biarritz América Latina está com inscrições abertas até 31 de maio pelo site oficial do evento (festivalbiarritzameriquelatine. com). O festival acontece entre os dias 25 de setembro e 1º de outubro, em Biarritz, na França. Os longas-metragens devem ser inéditos em festivais, exceto Cannes, e no circuito comercial francês; enquanto os curtas devem ter duração máxima de 30 minutos; e documentários devem tratar de algum aspecto da América Latina.
O
cinema brasileiro independente gosta de explorar os desdobramentos das questões humanas, ambientadas em cenários muitas vezes opressores para trazer novas fronteiras para a existência. Em “Eu Te Levo”, o cineasta Marcelo Müller acompanha a história de Rogério, homem que acabou de perder o pai. Ao lado da mãe, ele tenta administrar a empresa da família e seus instintos interiores. Sempre calado e fã de rock, Rogério decide buscar formas de viver sua nova realidade. Ao lado de Cris, irmão de um grande amigo, eles constantemente viajam de carro para São Paulo. A diferença entre os dois vai diminuindo enquanto cada um descobre que o outro tem desejos de fuga. No meio, Ana aparece apenas para arquitetar o plano e, claro, servir de interesse amoroso do protagonista. O grande problema de “Eu Te Levo” está na frieza da história. É quase impossível se importar com os personagens, já que seus diálogos jamais convencem dos dramas que estão passando. A encenação também é fraca ao ponto de prejudicar o desenvolvimento das cenas. O ator Anderson Di Rizzi até tenta dar profundidade ao protagonista, mas a pouca consistência do roteiro não permite que ele cresça durante a projeção. As situações repetitivas não
constroem nada além do que se vê, ficando tudo caricatural. Müller também opta pelo recurso da imagem em preto e branco, talvez para reforçar a frieza dos personagens e dos cenários, mas a decisão parece aleatória demais por não funcionar como recurso de estilo. A imagem não exalta os objetos, sequer cria nostalgia nem transporta para outro lugar a trama central da história. O diretor tem boas ideias para colocar em cena, tornando o filme um pouco menos entediante, mas o argumento não vai para lugar nenhum. Não reflete o período do luto do protagonista e de sua mãe, interpretada por Rosi Campos; não reflete o desejo de exteriorização dos jovens, nem mesmo convence ao fazer com que Rogério vá em busca do sonho de criança de ser bombeiro. Sonhos e realidades se mantém na mesma esfera, não vazam para nenhum dos lados, não criam circunstâncias em que a transformação dos personagens justifiquem a existência do filme. A sobriedade excessiva de “Eu Te Levo” não traz densidade que, talvez, o projeto queria ter, enquanto escancara o esforço de elenco e equipe de querer fazer algo íntimo, mas que falha ao despertar certa indiferença e sensação de que ali não reside mais do que personagens circulando sem rumo. (DB)
Drama brasileiro “Eu Te Levo”, dirigido por Marcelo Müller, entra em cartaz a partir do dia 30 de março em Fortaleza
Netflixprocuraatores
Documentários A 13ª edição do Brésil en Mouvements recebe inscrições até 31 de março. A mostra francesa busca documentários sobre questões sociais e ambientas do Brasil. O evento acontece entre os dias 27 de setembro e 1º de outubro no Cinema La Clef, em Paris. São considerados elegíveis documentários de curta, média ou longa-metragem, inéditos ou não, que tenham como tema a sociedade brasileira. As inscrições acontecem no site (bresilenmouvements.org/).
CASTING Depois de anunciar que “3%”, primeira série original da Netflix brasileira, é o programa de língua não-inglesa mais visto nos Estados Unidos desde o seu lançamento, em 25 de novembro do ano passado, o serviço de streaming abriu o processo de seletivo para atores e atrizes que desejam participar da segunda temporada. De acordo com o chamado divulgado no site oficial (rkc.com.br/netflix), são muitos os personagens para diversos perfis de atores. Com direção de Cesar Charlone e roteiro de Pedro Aguilera, a nova temporada ainda não tem data para estrear. A trama se passa em um futuro distópico onde somente 3% tem privilégios são privilegiados. O elenco original é composto por nomes como Bianca Comparato, João Miguel, Michel Gomes, Vaneza Oliveira e Rodolfo Valente.