Revista Eletrônica Bragantina On Line - Janeiro/2016

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Revista Eletrônica Bragantina On Line

Discutindo ideias, construindo opiniões!

Número 51 – Janeiro/2016 Joanópolis/SP

Edição nº 51 – Janeiro/2016

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SUMÁRIO Nesta Edição: - EDITORIAL – Memórias ...................................................................................... Página 3; - A ARTE DO TURISMO E DA HOTELARIA – Afinal, para que estudar? Por Leonardo Giovane ............................................................................................. Página 4; - PSICOLOGUÊS – Comportamento X Férias Por Luciano Afaz de Oliveira .................................................................................. Página 7; - PALAVRAS E EXPERIÊNCIAS – Reflexões no início do ano Por Emily Caroline Kommers Pereira .................................................................... Página 9; - LINHA DO TEMPO – Os nossos dias precisam ter... Por Helen Kaline Pinheiro ..................................................................................... Página 11; - O ANDARILHO DA SERRA – O velho Por Diego de Toledo Lima da Silva ....................................................................... Página 13; - MEMÓRIAS – Do espírito da palavra Por Susumu Yamaguchi ......................................................................................... Página 15; - ROMANCE DAS LETRAS – Compreensão do fenômeno ansiedade Por Betta Fernandes ............................................................................................... Página 18; - BIOMEDICINA – Sangramentos disfuncionais Por Tereza Reche .................................................................................................... Página 21.

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REVISTA ELETRÔNICA BRAGANTINA ON LINE Uma publicação independente, com periodicidade mensal.

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EDITORIAL

MEMÓRIAS

Prezados leitores! Olhando a chuva pela fresta desta janela imagino muita coisa, fico a refletir sobre o tempo, com saudades dos dias de sol. Entre tantos pensamentos, memórias de dias passados, dos passos vividos e de tanta gente. No alto desta serra olho o horizonte encoberto de nuvens, numa feição artística dos céus. Velhas e boas memórias, meus amigos!

Diego de Toledo Lima da Silva – Editor (15/01/2016) E-mail: revistabragantinaon@gmail.com

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A ARTE DO TURISMO E DA HOTELARIA

Leonardo Giovane M. Gonçalves Técnico em Hospedagem e Graduando em Turismo E-mail: leonardo.giovane@hotmail.com AFINAL, PARA QUE ESTUDAR?

Andando pelas ruas, muitas vezes me pergunto o que motiva as pessoas? O que faz elas acordarem todas as manhãs e levantar da cama mais um dia? Por que trabalham? Por que escolheram esta profissão? Para entender o mundo em que vivemos precisamos nos questionar, isto é fato! Mas o que mais me deixa intrigado é o motivo pelo qual as pessoas escolhem seus empregos... Seria vocação? Pressão familiar? Sonhos? Destino? Acaso? Enfim, muitos fatores podem ser elencados neste questionamento. Já estou nos últimos passos do segundo ano de faculdade de Turismo, mas alguns pensamentos ainda rondam a minha cabeça. O fim de semestre nos deixa loucos, ficamos paranoicos, acreditamos que nada que fazemos está bom e que não será suficiente para alcançar a média para ser aprovado na disciplina. Mas ser aprovado por quê? Para quem? Para quando? Às vezes me pergunto qual o motivo de termos que estudar? Porque que quando estamos no ensino médio somos treinados feitos robôs para decorar fórmulas e conceitos que só vamos utilizar em poucos momentos da vida e o maior deles é o tão temido VESTIBULAR. Na realidade interpreto o momento pré-faculdade como uma máfia de ganhar dinheiro, pois tem cursinho específico de cada curso em um lugar, curso geral em outro, aulas extras na escola, livros e mais livros sobre como entrar na faculdade e sites inquietantes que roubam Edição nº 51 – Janeiro/2016

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inúmeras horas do seu dia com vídeos e textos sobre como mandar bem na “primeira fase da sua vida”. E quando menciono em aspas a “primeira fase da sua vida” é porque sempre cresci e ouvia que tinha que entrar na faculdade e que minha vida começaria por meio dela. Mas tudo isso por quê? Será que assim eu teria emprego? Não seria mais um desempregado que vive à custa do governo? Talvez esta seja a então lógica dominante que nossa sociedade vive, mas não para criar a Pátria Educadora, mas sim para criar a pátria alfabetizada, ou melhor, a pátria com possíveis probabilidades de emprego, e quando menciono a probabilidade de emprego é algo real, pois ter um diploma de nível superior não garante que no primeiro mês de formado você esteja lavando pratos em um restaurante (digo isso, pois nos discursos dos graduandos nunca vi um que dizia que o sonho é sair da faculdade e ir lavar pratos). Interessante também que a máfia da educação não está presente somente no período do Vestibular, mas após ele também. Vejamos quantas instituições privadas de nível superior temos, quantas de nível técnico, tudo isso para quê? Lançar mais e mais pessoas no mercado de trabalho, para que essas virem números, estatísticas de governo para explanar o quanto o Brasil é um pais alfabetizado. Mas e o emprego? Tem para todos? E a qualidade do ensino? Como está? Ou ainda veremos mais e mais “acidentes” dentro dos hospitais, rompimento de barragens, erros administrativos, e por aí vai... Durante a graduação perdemos horas de sono, nos matamos para ir bem nas provas, deixamos de comer, nos afastamos da família, dos amigos, da vida social, passamos feriados estudando ou sem poder voltar para casa, tudo isso para alcançar um sonho. Mas esse sonho é de quem? É meu? É seu? Ou é do sistema que diz que temos que escolher uma profissão quando temos apenas 16, 17 ou 18 anos de idade. As respostas para esses questionamentos eu não sei, apenas possuo suposições. Algum dia vi um post de uma amiga, a teoria dela é bem apocalíptica, mas deixo a reflexão. De que vale passar horas e horas estudando se ligamos a televisão e vemos a Terra morrendo, ou a nossa raça se matando em atentados e guerras?

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Sobre a ordem do mundo, não sabemos como chegamos aqui, muito menos os motivos que nos trouxeram aqui, mas só sabemos que temos que seguir nessa ideologia. Mas até quando?

Como citar: GONÇALVES, L.G.M. Afinal, para que estudar? Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 4-6, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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PSICOLOGUÊS

Luciano Afaz de Oliveira TRI-PSICO Psicólogo Clínico Particular (Piracaia) Psicólogo da Saúde Mental (Prefeitura Municipal de Piracaia) Psicólogo Clínico Particular (Joanópolis) E-mail: lucianoafaz@gmail.com COMPORTAMENTO X FÉRIAS

Nesta época do ano a rotina diária de muitos muda praticamente em tudo. Abandonase o relógio e o calendário. A prioridade é saber o que fazer com o tempo livre. Se viajar mudasse também o comportamento, pois muitos lugares têm o seu jeito específico de falar ou agir. Por exemplo, estava eu em Florianópolis, linda cidade (Ilha) e além do povo receptivo que tem, ao pedir o nosso pão francês de cada dia, “Tu tem que dizer se é o pão de trigo?”. Afinal se pedir o francês lá, com certeza terá uma surpresa ao receber um belo pão de cachorro quente nosso.

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São as diferenças das férias, e quem tem filhos então... Logo os pais; aqueles que realmente são presentes têm que se adaptar à realidade de trocar escritórios, empresas e entrar no mundo dos jogos, brincadeiras e curtir um simples desenho juntos. O organismo também muda, acorda-se mais tarde, dorme-se mais tarde também. Os pés ganham com maiores frequências os chinelos e como isto faz bem. Relaxa e nos deixa mais em contato com as energias do solo. Nesta época, também aproveitamos para repensar as atividades profissionais, fazer cursos extracurriculares e por que não mudar de emprego nesta época. Eu mesmo, particularmente, já mudei de empresa e até usei férias para estudar a uma prova de concurso público. Enfim vale tudo nesta fase linda da vida. Tempo de mudar-se... Mas dá para se desligar de tudo por completo? Hum! as contas continuam chegando, preços aumentando e se ficarmos totalmente inerte ao dia-a-dia, podemos nos enrolar. Este ano tive a oportunidade de emendar uma viagem a Floripa com Peruíbe e ficar 12 dias fora de casa, mas quantas surpresas ao voltar. Começando pelos problemas administrativos de minha cidade, onde o atraso do pagamento massacrou o orçamento ao voltar. Realmente fica difícil descansar amigos. Tem que ficar com um olho sempre aberto. Aproveitando que citei Peruíbe, cidade esta que acho maravilhosa de se morar também, porém estando de férias notei quanto o turista estraga mesmo a natureza, ao ver no fim de tarde as praias totalmente sujas. Coisa de turista né? Será? Ou seria um comportamento desviante dos que frequentam as praias paulistas? Pois mesmo com tantos turistas em Santa Catarina não deu para ver praias com tanto lixo como as daqui. Comportamento X Férias... Cuidem-se e bom descanso.

Como citar: DE OLIVEIRA, L.A. Comportamento X Férias. Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 7-8, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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PALAVRAS E EXPERIÊNCIAS

Emily Caroline Kommers Pereira Escritora e Jornalista E-mail: myzinhacarol@gmail.com REFLEXÕES NO INÍCIO DO ANO

Esses dias troquei mensagens por alguns minutos com uma amiga durante o expediente de trabalho, pelo chat do facebook, em um tempinho vago. Depois de alguma conversa fiada e risos, disse que precisava sair e voltar ao trabalho. Admirada, minha amiga digitou: “Nossa, não sabia que você já trabalhava!”, ao que respondi: “Pois é, trabalho há 10 anos, desde os 15”. “Queria trabalhar também e ganhar meu próprio dinheiro”, disse a garota de 17 anos. “É bom ter o próprio dinheiro, mas com o trabalho, vêm as responsabilidades”, respondi. “É... mas quero começar esse ano”, ela retrucou. “Comece sim! Bom... preciso mesmo ir, depois conversamos mais. Beijos.”, disse eu, e assim encerrei a conversa. Desconectei-me da rede social e voltei ao serviço. Durante o resto da tarde, enquanto trabalhava, refletia sobre o rápido bate-papo. Dez anos. Eu comecei a trabalhar em uma corretora de seguros aos 15 anos, como office girl, e fiquei lá por dois anos. Desde então, trabalhei como arquivista e secretária, além de ser monitora em uma escola infantil por dez meses em 2010, e hoje sou secretária, arquivista e office girl em uma igreja. Fiz faculdade de Jornalismo nos últimos quatro anos e, durante esse tempo, tive a experiência de estagiar em uma pequena agência de notícias de minha cidade. Escrevo para a presente revista, tenho um blog pessoal, colaboro com um blog de amigas, sou tradutora autônoma de inglês e a partir desse ano começarei a escrever artigos sobre música para um site de educação musical à distância. Nunca quis ser repórter, desses de ir à cata das notícias, “meter o pé na lama” e dar a cara à tapa. Meu negócio mesmo é escrever. Amo muito escrever e quero um dia escrever um romance. Meu primeiro livro foi meu Trabalho de Conclusão de Curso, um livro-reportagem Edição nº 51 – Janeiro/2016

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sobre jornalistas-escritores de ficção no Brasil atual. Mesmo amando escrever com todo o meu coração, meu trabalho é ser secretária, arquivista e office girl, uma auxiliar de escritório, como dizem. É o que me sustenta mês a mês, o que me manteve durante os anos de faculdade e o que sei fazer. Afinal, são dez anos de experiência, por assim dizer. Não posso simplesmente decidir viver do que amo. Com 25 anos, entendo isso muito bem. Por enquanto, faço o que amo por hobbie. Não é o que me sustenta, não por enquanto. Ninguém vive somente do que ama, porque ama, desde o começo. São 25 anos, eu ainda sou jovem, recém-formada, e quero escrever, e escrever cada vez mais, e continuar escrevendo. Todo mundo é assim. Tem aquilo que ama e aquilo que deve fazer. Isso não significa que não ame o que deve fazer. Guardadas as devidas proporções, amo ser secretária, arquivista e office girl. 2016 é o ano em que faço 26 anos. Sei que vivi um terço da minha vida, segundo o IBGE, mas vai que eu viva até os 100 anos, contra todas as possibilidades? Vai que eu morra amanhã? É o meu primeiro ano como jornalista, mas isso não significa que deixarei de ser secretária, arquivista e office girl. Trabalho há 10 anos e, como disse para minha amiga, ter o próprio dinheiro é bom, mas traz responsabilidades, e um diploma universitário por si só não resolve meus problemas. Tenho que fazer por merecer. Não sou rica, não nasci em berço de ouro, não herdei nenhuma fortuna e tenho que trabalhar de sol a sol para sobreviver. Ter meu próprio dinheiro é ter responsabilidades e eu entendo isso. Hoje, formada, escrevendo em três lugares diferentes e com meu primeiro livro escrito, trabalhando de segunda a sexta-feira, creio que conquistei algo, e posso conquistar ainda mais nos anos que se seguirão. Sinto e sei que 2016 será um ano realmente bom, não porque acontecerão coisas boas ou por isso ou por aquilo, mas porque eu decidi, na virada de 31 de dezembro de 2015 para 1° de janeiro de 2016 que eu terei um bom ano, mesmo que todos digam, que as circunstâncias digam, os acontecimentos digam, tudo diga que não está bom. Isso não é otimismo barato. Quem me conhece sabe que não sou otimista. Sou bem realista, e mesmo pessimista às vezes, mas creio que quando tomamos uma decisão, as coisas acontecem, ou ao menos começam a acontecer.

Como citar: PEREIRA, E.C.K. Reflexões no início do ano. Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 9-10, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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LINHA DO TEMPO

Helen Kaline Pinheiro Estudante de Psicologia e jovem talento de Joanópolis E-mail: helenkpinheiro@gmail.com

OS NOSSOS DIAS PRECISAM TER...

A esperança que nunca se esgota, é essa esperança que precisamos reviver.

O amor que nunca se cansa, é esse amor que precisamos dar e receber.

O sentido que nunca podemos perder, para que os desafios sejam superados na alegria de viver!

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Leia mais no Blog: http://helenkaline.blogspot.com.br/

Como citar: PINHEIRO, H.K. Os nossos dias precisam ter... Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 11-12, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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O ANDARILHO DA SERRA

Diego de Toledo Lima da Silva Técnico/Engenheiro Ambiental, Andarilho e Cronista E-mail: diegoaikidojoa@hotmail.com

O VELHO

A revolução é nossa, meu camarada! O homem olhava fixamente para o horizonte e repetia a mesma frase, tentando me convencer de suas convicções. Vai lá mochileiro, você verá que tenho razão! Entre um passo e outro fiquei sem palavras, o pensamento surtiu efeito, sumiu de repente... Restaram apenas os traços de uma vida cigana, além de uma saudade danada. A poeira da estrada trouxe de volta o carro de boi, o som do berrante e o mourão da porteira. O mundo gira, vai e volta, e sempre retorno para a mesma porteira, aos pés do mesmo gigante. Encostado no mourão, o velho me esperava todas as tardes, um sorriso e um abraço, onde observávamos juntos o por do sol de nossa terra. Hoje passo em frente à porteira e reverencio sua obra imaterial ao observar as palavras escritas no mourão de madeira. Saudade é dor que não consola, é sentimento que aflige e revigora ao mesmo tempo, pois os versos de suas canções e ensinamentos perpetuam o tempo dos vivos. Ao som de assobios lembrei-me de uma bela canção: “Lá no mourão esquerdo da porteira, onde encontrei ocê pra despedir...” É meu velho, não tem como esquecê-lo... Quando voltei em si, o homem continuava falando dessa tal revolução, dizendo que o mundo está mudando. Acho que antes de mudar o mundo temos que mudar nosso jeito de ser, de pensar, de agir... É a revolução da alma, do espírito. Contrariado, ele retrucou e foi embora. Novamente sozinho pelo caminho encostei perto do velho mourão, no silêncio de um final de tarde. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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O mesmo gigante, mais um fim de tarde e um mourão, meu velho!

Como citar: DA SILVA, D.T.L. O velho. Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 13-14, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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MEMÓRIAS

Susumu Yamaguchi Cronista e Andarilho E-mail: sussayam@gmail.com DO ESPÍRITO DA PALAVRA

Meu pai deixou Tóquio na adolescência e minha mãe saiu de Sapporo, ilha de Hokkaido, extremo norte do Japão, com meses de vida. Navegaram em épocas distintas até o outro lado do mundo, cruzaram seus caminhos em São Paulo e acabaram por encontrar-me, e a meu irmão e irmã, no Planalto Central do Brasil. Por herança de linhagem de nebulosa memória nasci Yamaguchi, mas nada sei de ancestrais que nos possam relacionar à província de mesmo nome, localizada no oeste do arquipélago japonês. Naquelas terras entre águas, Yama possui o significado de montanha e Guchi – guti, por ortoépia – quer dizer entrada, boca. Mas o meu planalto não tinha montanhas, e elas nem mesmo cabiam em minha imaginação. Víamos apenas perfis suaves de morros que aprendíamos a desenhar nas primeiras classes. E um dia, depois de viver por muitos anos em altitudes rentes de mil metros e largos horizontes, deixei o abrigo daquele céu rasante e desci. Em São Paulo, o céu pairava riscado por linhas verticais e o horizonte circulava além do cerco de ruas e esquinas, revelando o Pico do Jaraguá só ao final da Avenida Paulista. Da Cantareira varei a cidade, desci mais e cheguei ao mar que os planaltinos centrais, prudentemente, haviam colocado bem distante de suas terras. Em altitude zero senti a pressão do céu e das águas do mar, e ao olhar para trás vi a depressão em que caíra ao descer a Serra do Mar. E como meus pais tanto tempo antes, subi a Edição nº 51 – Janeiro/2016

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serra e falhei anos no Planalto de Piratininga, até que um dia meu olhar tornou-se encantado pelo maciço de Itatiaia, na Serra da Mantiqueira. Chegava enfim às montanhas e vales pressentidos, que tornavam o mundo mais amplo pela harmonia das dobraduras de sua superfície. Passei a olhar para o alto, para baixo e para os distantes horizontes anteriores, que agora circulavam um pouco mais perto do infinito. E olhava, naturalmente, para o céu abarcante. Do alto da Serra da Mantiqueira meu olhar vencia o Vale do Paraíba e esbarrava na Serra da Bocaina, de onde se podia avistar o mar. Mas nunca pousei lá. Eu deixava em definitivo os costas no litoral e acompanhava os silvas sertão adentro, virando-me para o mar de morros que ondulavam as terras mineiras. A Serra da Mantiqueira apartava Minas Gerais de São Paulo e do Rio de Janeiro, e suas montanhas tornaram-se caminhos que me levavam gradativamente para o alto e para o interior. Eu tornava a alcançar altitudes do Planalto Central e mais que dobrá-las, ao mesmo tempo em que me voltava para dentro, em silêncio. As serras tomavam rumo norte e eu as acompanhava de perto, cruzando seus caminhos de tempos em tempos. Mas aí elas já tinham mudado de nome e de feição, trajando outras vegetações, vales e vertentes. Tudo era novo – e cada parte daquele todo pedia uma nova forma de conhecimento. Mas também, de reconhecimento. Deparei com a Chapada Diamantina no meio da Bahia, longe, muito longe da Mantiqueira – e muito diversa. Suas serras não tinham picos como os que eu imaginara e conhecera. Eu subia pelas encostas e encontrava apenas largos planos altos que me remetiam aos extensos planaltos originais. Só que com bordas verticais. Entre a Mantiqueira e a Chapada Diamantina havia Diamantina, que ficava no meio da Serra do Espinhaço, que percorria o meio de Minas. Linhas pontilhadas de ouro e diamante formavam a Estrada Real, por onde caminhei em parte, desde a boca do Pico do Itambé até o final do Caminho dos Escravos. Brilho e dor, petrificados. “Daqui eu olho o mar”, disse seu Oscar quando amanhecia no Pico da Bandeira, no alto da Serra do Caparaó. Estávamos a quase três mil metros acima do nível do mar e do longínquo porto de Vitória, mas eu não os podia ver por causa das nuvens abaixo de nós. Desde lá, se imaginados, estaríamos no azul inatingível do céu. Inatingíveis também se revelaram para mim altitudes maiores que as de nossas serras, como as da Cordilheira Branca, no norte do Peru, e do Pico Aconcágua, na divisa da Argentina com o Chile. Montanhas convidam-nos para ascensões sempre para o mais alto, mas não pude ir além dos quatro mil metros acima do nível do mar. Mas nem por essa incapacidade afastei-me das montanhas, e elas tornaram-se permanentes em meus horizontes ao me mudar para os contrafortes de um dos extremos da Serra da Mantiqueira. Podia ir para planaltos, vales e planícies, mas voltava sempre para o Edição nº 51 – Janeiro/2016

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colo da serra, para casa, de onde imaginava as mais altas paragens. Pela palavra Taka trazer em si o significado de alto, elevado, Takayama atinge altivas regiões da massa bruta e, sobretudo, do espírito. Caminhos naturais para o céu, montanhas dão matizes de alento e luz a quem se dispõe. Fui ao outro lado do mundo, à terra dos ancestrais, mas não alcancei Takayama. Ao menos, não nesta vida. Vida, legada por ter meu pai sobrevivido ao terremoto que destruiu Tóquio em 1923, carregado por um irmão dez anos mais velho para lugar seguro. Anos após, já no Brasil, eles permaneceram sempre próximos e viveram cada um noventa e quatro anos, oito meses e alguns dias. Nove a mais foram concedidos ao irmão maior. Quase um século nesta vida, tempo que para nós é tudo – ou nada – na busca da palavra primordial que nos foi soprada e que, no entanto, não lembramos. “Deus nos dá pessoas e coisas, para aprendermos a alegria... Depois, retoma coisas e pessoas para ver se já somos capazes da alegria sozinha... Essa – a alegria que Ele quer...” (*) Depois de mudar muito pelo país, meu pai enfim aportou nas encostas do vale do rio Jacareí, na base da Serra da Mantiqueira, cujo portal abriga um gigante de pedra que se oculta como montanha. Ali, onde o brilho fugaz do ipê testemunha a impermanência de todas as formas, ele viveu plenas estações. E cumpriu o destino de seu nome.

___________ (*) – Buriti – João Guimarães Rosa

Margareth – margot.joaninha@hotmail.com

Como citar: YAMAGUCHI, S.

Do espírito da palavra. Revista Eletrônica Bragantina On Line.

Joanópolis, n.51, p. 15-17, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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ROMANCE DAS LETRAS

Betta Fernandes Escritora e Advogada E-mail: bettabianchi40@gmail.com COMPREENSÃO DO FENÔMENO ANSIEDADE

A palavra ansiedade é de origem ocidental e se refere a um estado somato-psíquico descrito pela Psicologia e pela Medicina ocidentais. Nesses termos, a terminologia ansiedade não é uma terminologia oriental, portanto, na literatura clássica da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) é impossível encontrar descrições de tratamentos para ansiedade. Aliado a isso, na MTC não existe separação entre mente, corpo e espírito, portanto não existem classificações de doenças ou distúrbios exclusivamente psicológicos ou psiquiátricos, como ocorre no ocidente, como, por exemplo, no caso de transtornos de ansiedade. Entretanto, de acordo com Ling-Shu (1995), na MTC existe uma classificação de doenças nas quais se enquadram as patologias que apresentam maior sintomatologia psíquico/emocional, as chamadas dian-kuang, que podem ser traduzidas por perturbações mentais. Nas dian-kuang, porém, estão enquadradas as patologias mais severas, o que, no ocidente, pode ser traduzido por psicoses. Assim sendo, distúrbios menos intensos, como, por exemplo, estados ou transtornos de ansiedade não poderiam ser classificados como patologias dian-kuang Nesta perspectiva, autores como Campiglia (2004) e Auteroche e Navailh (1992) entendem que fenômenos como a ansiedade são sintomas (assim como no ocidente) de distúrbios de outra ordem. Aliado a isso, como na MTC não existe separação entre corpo, mente e espírito, uma desarmonia em um dos cinco principais órgãos do corpo (na perspectiva chinesa: coração, baçopâncreas, pulmão, rins e fígado) ocasionará automaticamente um desequilíbrio nos aspectos mentais e espirituais desses órgãos, chamados respectivamente Edição nº 51 – Janeiro/2016

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de shen, hun, po, yi e zhi. Assim, como a ansiedade é sintoma de uma desarmonia, ela pode ser sintoma de desequilíbrio de qualquer um desses aspectos, sendo, porém, mais marcadamente considerada um distúrbio do shen, que significa espírito (Campiglia, 2004), ressaltando-se que, para os chineses, o espírito reside no coração. Esse espírito não fica preso no coração, mas circula por todo o corpo, garantindo a vitalidade e a consciência, regulando o humor e a sensação de bem-estar no mundo, como destaca Campiglia (2004): O Shen aloja-se no coração. O coração é o órgão que funciona como receptáculo das funções ativas da consciência, ele abriga ou expressa sentimentos, emoções, desejos mais profundos, imaginação, intelecto e memória dos eventos passados. Como um copo ou cálice, o coração contém o sangue e o Shen, que são seu conteúdo, seu vinho sagrado... Ou seja, ao se alojar no coração, o Shen não está em um lugar fixo, mas circula como o sangue nos vasos. Ele está em todo o corpo, pois o sangue dos vasos irriga tudo, da pele aos olhos. O Shen é, portanto, uma atividade dinâmica que está na essência do coração. Adquire-se e desenvolvese a consciência interagindo com o mundo e com os próprios órgãos e o Shen está presente em cada um deles (p. 92). Assim, para os chineses, um distúrbio no coração corresponde automaticamente a uma desarmonia no espírito. A ansiedade, então, pode ser entendida como o resultado de uma desarmonia do espírito, seja por uma situação de excesso, insuficiência ou estagnação de qi (energia) ou xue (sangue) no coração ou em outros órgãos que acabam afetando o coração. Essa situação de excesso, insuficiência ou estagnação pode ser causada pelos seis fatores patogênicos externos, vento, frio, calor, umidade, secura e fogo; pelos sete fatores internos, alegria, raiva, tristeza, pesar, preocupação, medo e pavor, ou pelos fatores nem internos nem externos, como a alimentação, os traumas, o excesso de trabalho, de exercícios físicos ou de relações sexuais (Campiglia, 2004; Chonghuo, 1993). Embora não existam na literatura clássica da MTC referências específicas ao fenômeno ansiedade, a não ser como um sintoma de distúrbios nos cinco órgãos, mais preponderantemente no coração, já existem autores modernos, como Ross, que traçam um paralelo mais direto entre as terminologias ocidental e oriental. Para Ross (2003, p. 461), a ansiedade “pode ser definida como um estado subjetivo desagradável e inquieto de tensão e apreensão, no qual é difícil relaxar ou encontrar calma e paz”. Tomando como base o princípio chinês da indissociabilidade entre corpo, mente e espírito e da relação entre os cinco órgãos, Ross (2003) também enfatiza que a ansiedade é causada por uma perturbação do sistema do coração. O autor acrescenta que o surgimento de distúrbios de ansiedade está relacionado constantemente a um desequilíbrio entre os sistemas do coração e do rim: “A ansiedade do coração está baseada no medo do rim, com sentimentos Edição nº 51 – Janeiro/2016

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característicos de apreensão, do medo de que algo terrível aconteça. A ansiedade pode então vir combinada de sobressaltos e receio, com sinais físicos como tremor, frequência urinária ou intestinos soltos” (Ross, 2003, p. 464). De acordo com o autor, a ansiedade é o resultado de um distúrbio do shen, é um sintoma que indica que o espírito não está conseguindo se mover de modo adequado pelo corpo. Nesse sentido, Ross (2003, p. 465) afirma que, na perspectiva chinesa, existem pelo menos três tipos diferentes de ansiedade, de acordo com a situação que a originou: - Ansiedade por excesso: “...O fogo fleuma do coração é uma forma de excesso que pode levar à ansiedade e à confusão de pensamento, linguagem e comportamento. consiste, essencialmente, em fleuma, decorrente da deficiência do baço, em combinação com o fogo do coração. Pode surgir de um estresse emocional ou do excesso de fumo, do álcool e de alimentos gordurosos, com falta de exercícios físicos”. - Ansiedade por estagnação: “A estagnação pode dar origem ao distúrbio do movimento. A estagnação do qi do coração e do qi do fígado, por exemplo, decorrentes da estagnação emocional, podem levar ao distúrbio do espírito do coração e à hiperatividade do yang do fígado, levando à ansiedade. A estagnação do qi pode resultar em acúmulo de fleuma, que pode perturbar a livre circulação do espírito, causando ansiedade”. - Ansiedade por deficiência: “a ansiedade aumenta quando a energia está reduzida, quando há deficiência por falta de sono e descanso, excesso de trabalho, estresse, doença e nutrição deficiente, além de outros fatores. A deficiência do qi do coração e do rim, do yin do coração e do rim, e do sangue do coração e do baço podem dar origem à ansiedade, já que o qi, o yin e o sangue são necessários para manter o espírito estável”.

Veja mais em:

Blog: bettafernandes.blogspot.com.br Twitter: @bettabianchi40 Facebook: Betta Fernandes

Como citar: FERNANDES, B. Compreensão do fenômeno ansiedade. Revista Eletrônica Bragantina On Line. Joanópolis, n.51, p. 18-20, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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BIOMEDICINA

Tereza Reche Biomédica/Escritora E-mail: terezarch@gmail.com SANGRAMENTOS DISFUNCIONAIS Sangramento Uterino Disfuncional

Lucas V. Machado Serviço de Ginecologia, Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. Baseado em longa experiência clínica, o autor faz uma análise crítica da terminologia e conceituação das perdas sanguíneas uterinas irregulares. Destaca a frequente confusão acadêmica entre os termos sangramento uterino disfuncional e sangramento uterino anormal, o que gera discussões acerca do diagnóstico e tratamento destas patologias. Procura racionalizar e simplificar a investigação clínica, enfatizando os recursos disponíveis em qualquer serviço ou consultório. Para tal, procura responder basicamente a duas questões: 1) O sangramento é de causa orgânica ou endócrina? 2) Se for de causa endócrina, é ovulatório ou anovulatório? Da mesma forma, limita o tratamento a dois ou três esquemas simples e eficazes, que funcionam também como diagnóstico diferencial ou tratamento de prova, pois, se um esquema racional, baseado no conhecimento da fisiopatologia do processo, não corrigir o sangramento, ele certamente não terá uma causa endócrina. Este fato nos obrigará a aprofundar a nossa propedêutica para identificar a causa orgânica. Unitermos: Sangramento

uterino

disfuncional;

Menorragia;

Polimenorréia;

Oligomenorréia Edição nº 51 – Janeiro/2016

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Sangramento Uterino Disfuncional

Ilustração: Janulla/iStock Refere-se a um sangramento uterino anormal, cuja origem se deve, exclusivamente, a um estímulo hormonal inadequado sobre o endométrio. Entretanto, o termo é frequentemente usado como sinônimo de sangramento uterino anormal e o que vemos na prática clínica é um grande número de sangramentos uterinos anormais provocados por lesões orgânicas, genitais ou extragenitais, sendo erroneamente rotulados e tratados como disfuncionais (obviamente sem sucesso). Até mesmo em eventos médicos esta confusão se perpetua, pois são inúmeras as mesas redondas e simpósios com o título especifico "Hemorragia ou sangramento uterino disfuncional" onde os tópicos e os expositores se perdem em métodos de diagnósticos por imagens e tratamentos modernos de miomas, pólipos, adenomiose, etc. Ora, sangramento uterino disfuncional já é um diagnóstico fechado e cabe apenas discutir o tipo da disfunção, as condutas e modalidades de tratamento. O termo sangramento uterino anormal é abrangente, multi-etiológico. Dentre as causas, inclui-se a disfunção hormonal. Quando falamos em sangramento disfuncional, pressupõe-se que todas as outras causas já foram excluídas. O grande desafio clínico é exatamente chegar ao diagnóstico preciso de sangramento uterino disfuncional, pois o tratamento será, em princípio, exclusivamente hormonal e sem possibilidade de fracasso. Se falhar, com certeza não será disfuncional. Neste caso, teremos que melhorar a nossa propedêutica, para identificar a real causa orgânica. Este é o primeiro e fundamental axioma: Edição nº 51 – Janeiro/2016

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"Sangramento disfuncional corrige-se com hormônios. Se não corrigir, não é disfuncional, é orgânico". Sangramento uterino disfuncional ou endócrino é um distúrbio frequente que pode ocorrer em qualquer época do período reprodutivo da mulher, mas concentra-se principalmente em seus extremos, ou seja, logo após a menarca e no período perimenopausa. É definido como um sangramento uterino irregular, sem nenhuma causa orgânica (genital ou extragenital) demonstrável. É, pois, um diagnóstico de exclusão, feito após cuidadosa eliminação das causas orgânicas de sangramento uterino representadas pela gravidez e suas complicações, patologias uterinas e pélvicas benignas e malignas, e problemas extragenitais, como distúrbios da coagulação, doenças sistêmicas, endocrinopatias extra-ovarianas, ou uso de medicamentos que interferem com a ação hormonal ou com os mecanismos de coagulação. O diagnóstico etiológico é, portanto, um desafio ao senso crítico do médico, à sua perspicácia na observação e interpretação dos sinais e sintomas, e à sua capacidade de saber utilizar os meios propedêuticos adequados para a comprovação ou exclusão das possíveis patologias. Quanto mais minuciosa e apurada for a propedêutica, mais causas orgânicas iremos encontrar, especialmente nas pacientes acima de 35 anos, fazendo com que um aparente sangramento disfuncional seja então identificado como orgânico. Aproximadamente 20% das pacientes com sangramento disfuncional são adolescentes e 50% concentram-se na faixa dos 40 a 50 anos. Para conceituar um sangramento uterino anormal é necessário primeiro estabelecer o que se considera um sangramento menstrual normal. O fluxo menstrual médio dura de 3 a 8 dias, com uma perda sanguínea de 30 a 80 ml. O ciclo médio varia entre 24 e 34 dias (não se preocupem se outros autores referirem um ou dois dias a mais ou a menos, é questão puramente semântica, sem nenhuma importância clínica). Portanto, sangramento uterino anormal é aquele que apresenta uma alteração em um ou mais destes três parâmetros, ou seja, um sangramento excessivo em duração, frequência ou quantidade. Com relação a este último parâmetro, não existe uma maneira prática e objetiva capaz de medir a quantidade de sangue eliminado, porém, se o sangue menstrual forma coágulos, provavelmente a perda é maior que o normal e quanto mais coágulos maior a perda. A dosagem da hemoglobina confirmará o excesso, se estiver baixa. Existe também uma terminologia universal, utilizada para descrever um sangramento uterino anormal, à qual devemos nos habituar e respeitar, afim de não cometermos impropriedades tais como a tão usada "hipermenorragia", pois menorragia já é o suficiente, hiper é pleonasmo: Hipermenorréia – Refere-se a sangramento prolongado, acima de 8 dias, ou quantidade excessiva, maior que 80ml, ou à associação de ambos. O volume excessivo é também denominado menorragia; Edição nº 51 – Janeiro/2016

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Hipomenorréia – Caracteriza um fluxo de duração menor que 3 dias, ou quantidade inferior a 30ml, ou à associação dos dois quadros; Polimenorréia – Caracteriza um ciclo cuja frequência é inferior a 24 dias; Oligomenorréia – Refere-se a ciclos que ocorrem a intervalos acima de 35 dias; Metrorragia – É o sangramento uterino que ocorre fora do período menstrual; Menometrorragia - É o sangramento que ocorre durante o período menstrual e fora dele. É típico dos miomas subserosos ou pólipos endometriais. Começa como uma hipermenorréia ou menorragia e com o evoluir, transforma-se em menometrorragia. Etiologia O sangramento uterino disfuncional é representado por duas situações distintas. Aquele que ocorre em pacientes que estão ovulando e o que ocorre em pacientes que não estão ovulando. Sangramento disfuncional ovulatório Cerca de 15% das pacientes com sangramento uterino disfuncional apresentam ciclos ovulatórios. São descritos os seguintes tipos de sangramento: Sangramento da ovulação. Ocorre com mais frequência no fim da vida reprodutiva. É geralmente escasso e coincide com o período ovulatório, que pode ser identificado pela secreção mucosa, clara, abundante e filante que se apresenta rajada de sangue e eventualmente associada à dor da ovulação (Mittelschmerz). O sangramento pode durar de um a três dias e é possivelmente secundário à formação de pequenos trombos nos vasos endometriais conseqüentes à elevação plasmática dos níveis de estrogênios, mas pode também ser devida ao sangramento da rotura folicular por ocasião da ovulação, que é captado pelo óstio tubário. Pacientes em uso de anticoagulantes estão mais sujeitas a este tipo de sangramento, podendo às vezes chegar até à formação de hemoperitôneo; Polimenorréia. Refere-se a ciclo ovulatório com menos de 24 dias de intervalo e é geralmente devida a um encurtamento da fase folicular, embora possa também ocorrer uma diminuição da fase lútea ou de ambas. A temperatura basal identificará com precisão estas alterações; Descamação irregular. É caracterizada por sangramento prolongado e abundante com intervalos regulares. A biópsia do endométrio praticada pelo menos 5 dias após o início do sangramento mostrará um aspecto de endométrio misto, onde identificam-se histologicamente áreas de secreção avançada, reepitelização endometrial incompleta e proliferação inicial. Este quadro sugere uma regressão retardada do corpo lúteo, fazendo com que ainda persistam áreas sob a ação da progesterona do ciclo anterior juntamente com áreas de proliferação estrogênica do ciclo atual; Sangramento pré-menstrual. Caracterizado por perda escassa de sangue, geralmente escuro, tipo borra de café, que antecede de alguns dias o sangramento menstrual. Também Edição nº 51 – Janeiro/2016

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mais freqüente no fim da vida reprodutiva (acima dos 35 anos) e associada a uma deficiente produção de progesterona. Deve nos alertar também para a possibilidade de uma endometriose; Hipermenorréia ou menorragia. Frequentemente devida a causas orgânicas como miomas, pólipos, adenomiose e distúrbios da coagulação que cursam paralelo com ciclos ovulatórios. Merece, portanto, atenção especial, pois é praticamente um diagnóstico por exclusão. A congestão uterina crônica provocada por uma retroversão uterina ou disfunção orgásmica (síndrome de Taylor) podem também provocar um sangramento escuro e prolongado; Persistência do corpo lúteo (Síndrome de Halban). Não recorre de maneira cíclica. É episódio esporádico e o diagnóstico geralmente não é feito, porque não se pensa nesta possibilidade. É confundida frequentemente com gravidez ectópica, o que já levou várias pacientes a cirurgia de urgência, pois ocorre um atraso menstrual, seguido de perdas irregulares, dor no baixo ventre e presença de massa anexial representada por um corpo lúteo hemorrágico. Com estes achados, há que se pensar naturalmente em ectópica. Se o diagnóstico correto for confirmado pela ultra-sonografia e bHCG (afastando a gravidez), a evolução espontânea seguirá sem maiores problemas. Sangramento disfuncional anovulatório É uma das manifestações clínicas da anovulação crônica, qualquer que seja a sua etiologia, e representa 80% dos casos de hemorragias disfuncionais. O sangramento pode ser leve ou intenso, constante ou intermitente, geralmente não associado a sintomas de tensão prémenstrual, retenção hídrica ou dismenorréia, embora algumas vezes a paciente relate cólicas devido à passagem de coágulos pelo canal cervical. Fisiopatologia Ciclos anovulatórios podem ocorrer em qualquer época do menácme, mas é particularmente frequente nos extremos da vida reprodutiva, seja logo após a menarca ou no período pré-menopausa. Na puberdade, a anovulação se deve a uma imaturidade do eixo Córtex-Hipotálamo-Hipófise-Ovário (C-H-H-O), ainda incapaz de levar um folículo ao estágio maduro e desencadear o pico ovulatório de LH. Nesta época é comum encontrarmos os ovários policísticos (óbvio, se existe uma população folicular adequada e a presença de FSH, os folículos crescerão até um diâmetro aproximado de 6 a 8 milímetros, acumulando abaixo da superfície, dando-lhe o aspecto policístico). No menácme, a anovulação crônica é consequência geralmente de um mecanismo de feedback inapropriado, cujo resultado levará invariavelmente aos ovários policísticos. No período climatérico, a anovulação se deve à falência funcional dos ovários, quando ainda produzem estrogênios, mas não mais ovulam e consequentemente não produzem progesterona. Também os ovários poderão estar policísticos, desde que exista ainda uma população folicular suficiente, porém, não é a regra. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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O sangramento ocorre superficialmente, na camada compacta, e representa uma perda por deprivação estrogênica (hemorragia de privação) ou por níveis estrogênicos incapazes de manter um estímulo endometrial constante e adequado (break through bleeding, ou hemorragia de escape),portanto, diferente da descamação ordenada da camada funcional do endométrio que ocorre na menstruação de ciclos ovulatórios (Figura 1).

A estimulação contínua dos estrogênios induzirá uma progressão da resposta endometrial que transitará de proliferado a uma hiperplasia em suas diversas formas (simples ou complexa, típica ou atípica), podendo chegar eventualmente ao adenocarcinoma. Na ausência das ações limitantes da progesterona sobre a proliferação induzida pelos estrogênios e da descamação ordenada da camada funcional, o endométrio continuará crescendo, sem o concomitante suporte estrutural. Há um aumento da vascularização e das glândulas que se apresentam coladas umas às outras, sem o devido arcabouço do estroma de sustentação e sua malha reticular. Este tecido torna-se frágil e sofre soluções de continuidade na superfície, por onde se exterioriza o sangramento. Os mecanismos vasculares de controle da menstruação normal acham-se ausentes e o sangramento não é um fenômeno universal, atingindo segmentos isolados da mucosa. Também não ocorrem os fenômenos de vasoconstrição ritmados, nem aumento da tortuosidade das artérias espiraladas pela redução do edema intersticial. O sangramento é interrompido somente pela ação proliferativa cicatricial dos estrogênios endógenos ou exógenos. Nestes casos não há descamação e subsequente

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renovação do endométrio. Haverá somente proliferação e aumento contínuo da espessura da mucosa intercaladas por perdas sanguíneas irregulares.

OBSERVAÇÃO: Se algum desses eventos estão ocorrendo, procure imediatamente um profissional ginecologista!

Referências Bibliográficas Machado LV. Hemorragia uterina disfuncional. In: Machado LV, ed. Endocrinologia Ginecológica. Rio de Janeiro: MEDSI, 2000. Weber AM, Belinson JL, Bradley LD, Piedmonte MR. Vaginal ultrasonography versus endometrial biopsy in women with postmenopausal bleeding. Am J Obstet Gynecol 1997; 177:924-9. Widrich T, Bradley LD, Mitchinson AR, Collins RL. Comparison of saline infusion sonography with office hysteroscopy for the evaluation of the endometrium. Am J Obstet Gynecol 1996;174:1327-34. Links http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-27302001000400010 abem-editoria@endocrino.org.br http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=0004-2730&lng=en&nrm=iso https://queminova.catracalivre.com.br/wp-content/uploads/sites/2/2015/10/%C3%BAterojanulla-iStock.jpg

Como citar: RECHE, T.

Sangramentos disfuncionais. Revista Eletrônica Bragantina On Line.

Joanópolis, n.51, p. 21-27, jan. 2016. Edição nº 51 – Janeiro/2016

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