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1.2.4 - Os resultados
from Trajetórias de uma lama litorânea: peças cerâmicas, arte educação ambiental e ações relacionais
by Duke Orleans
no evento UBUNTU, onde trabalhávamos com argila, conheceu nossa Oficina de Tridimensionalidade e se interessou por aprender a roda de oleiro. Mas, na verdade, começamos um curto envolvimento, respeitoso e no tempo de cada tempo. Acontece que estando eles na aldeia nova, e buscando respostas nos recursos locais, saíram para pitar petynguá e observar. O Pajé pitou no dele e não mostrou. Mas olhou para Evoi e perguntou do seu Petynguá: é de argila daqui? É possível que tenha sido feita com argila da lama. Mas, enfim, Evoi respondeu que sim, que ele o havia feito. Você é daqui? Sim, desde muito pequeno. Posso pitar o seu? CLARO! Então o Pajé pitou com Petynguá dali e com o sopro da vontade ele voou até o monte. Um paredão com uns 2m de altura que declina para o ponto 0, a uns 300m, uma fonte branca, uma base caulinita. A argila da aldeia foi para o projeto Sal Cerâmica, outro encontro de respostas. Esta fonte nos possibilitou conceber uma argila de excelente qualidade junto à lama da praia do Cassino. A argila lamaldeia é a do meu PETYNGUÁ, e quem fez ele foi a companheira do Cacique, dias depois de ter lhes entregado alguns quilos da argila. Ainda recolhi outras bases para efeito comparativo. Porém, vou aprofundar na relação possível de continuidade: LAMALDEIA!
1.2.4 - Os resultados
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A análise das amostras de argilas coletadas pelo projeto Sal Cerâmica permitiu a elaboração da arte gráfica que apresenta as etapas do processo, fotografadas no momento de cada experimento, e organizadas como escala de paleta de cores, onde estão descritas as análises de cada teste (Figura 1). Esta outra descoberta que se deu dentro das experiências, foi a amplitude de cores que é possível obter com um material, apenas submetendo ele a níveis variados de temperatura, submergindo em substâncias que provocam a reação química necessária, evidenciam-se novas e distintas cores. Algo me remete à oficina de fluidos, uma prática pedagógica na arte educação, que vivenciei com a professora Rita Patta Rache, onde o azul de metileno dançava enquanto gotejado no tubo de ensaio com água. Aqui agora, revelando informações da sua potência de envolvimento com a lama ou a argila. A cada etapa uma expansão da ação e sigo usando estas paletas de cores em trabalhos gráficos relacionados ao projeto e desdobramentos do
mesmo.
FIGURA 1: RESULTADO DE ANÁLISE DAS BASES: LAMA DA PRAIA DO CASSINO E ARGILA DA ALDEIA GUARANI EM DOMINGOS PETROLINE.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
A avaliação que se chegou neste ponto da pesquisa é que a lama da praia do Cassino é basicamente um composto orgânico com a presença de partes argilominerais mínimas no perfil montmorillonita e silte (limo). Ainda na composição da lama, encontramos a presença de óxidos de sódio, potássio, cálcio, ferro, silício e alumínio, porém a presença destes elementos só foi detectada através da análise microscópica que apresentou uma análise da composição química parcial. O MEV - Microscópio Eletrônico por Varredura - faz parte dos equipamentos do CEME-SUL, Centro de Microscopia Eletrônica do Sul, da FURG. Acompanhado pela Professora responsável, Dra. Henara Lillian Costa Murray, pude observar as partes geométricas da composição da lama e das demais amostras, mas seguiremos com destaque também para a argila da aldeia guarani de Domingos Petroline (Figuras 2 e 3)
FIGURA 2: AMPLIAÇÃO DA LAMA DA PRAIA DO CASSINO EM 3000X, ATRAVÉS DE MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
Nesta etapa, os olhos passaram a ganhar novas perspectivas de interesse. Além de podermos ter maior precisão quanto ao baixo nível de elementos contaminantes, houve o encontro com formas geométricas que se sobrepõem, e criam desenhos, encontro nova relação com o traço geométrico de acabamentos cerâmicos ancestrais. A beleza destas imagens ultrapassou a expectativa de apenas conformar uma argila de utilidades manuais, mas trouxe a revelação de que suas partes são agrupadas química e geometricamente de acordo com suas camadas valentes e que em uma parte que apontamos analisar, podemos ter variações do percentual de presença de um elemento ou outro. A análise parcial química confirmou mais uma vez a caracterização de uma argila montimorillonita para a lama da praia do Cassino e a argila da aldeia guarani de Domingos Petroline (FIGURAS 4 e 5), para uma argila caulinita, porém com alternância da cor em função das impurezas de Ti (Titânio) e Fe (Ferro) que acaba dando alguns manchões rosados na base branca desta argila e em alguns casos deixando-a rosada.
FIGURA 3: AMPLIAÇÃO DA ARGILA DA ALDEIA GUARANI DE DOMINGOS PETROLINE EM 3000X, ATRAVÉS DE MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
A argila da aldeia, diferente da lama da praia, já apresenta condições para estruturar um material cerâmico com melhores propriedades, já que se trata de uma caulinita com maior presença de alumina. Isso quer dizer que apresenta melhores condições argilominerais. Então, as duas bases que passamos a considerar: a lama, uma base gorda, pois apresenta uma carga elevada de matérias orgânicas, e a aldeia, uma base magra, pois apresenta maior carga de sílica, em relação às suas condições plásticas.
FIGURA 4: RESULTADO DA ANÁLISE PARCIAL QUÍMICA DA LAMA DA PRAIA DO CASSINO.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
FIGURA 5:RESULTADO DA ANÁLISE PARCIAL QUÍMICA DA ARGILA DA ALDEIA GUARANI DE DOMINGOS PETROLINE.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
Diante dos resultados e compreendendo as fragilidades do uso puro da lama e do uso puro da argila da aldeia, experimentamos diversas proporções e também outros
materiais, como o caso do papel jornal, para então conformar as seguintes massas, como resultados da pesquisa desenvolvida no projeto Sal cerâmica:
• “ArgiLama” - Para o preparo desta base, considero que podemos usar dois métodos: úmido e seco. No método úmido, as partes colhidas são lavadas em ciclos de 3 semanas; durante este período se mexe a massa, até que encontre homogeneidade, usa-se defloculante para desmanchar os nódulos presentes; após este período, a massa descansa e perde água, tornando-se mais pastosa e, neste ponto, verte-se em placas de gesso, para que se elimine mais um volume de água e permita que ganhe a consistência de moldagem. Na condição de preparar a seco, deixa-se empedrar o material coletado, depois estes blocos são triturados e peneirados; a vantagem deste método é que permite ter a base para preparo e composição de engobes e esmaltes, além de poder levar parte desta argila em pó para uma calcinação e utilizá-la como chamote (estruturante antiplástico); outra vantagem é o armazenamento, e havendo a necessidade de material, basta hidratar em 30% e logo se obtém a massa para trabalhar. Esta base deve ser considerada de baixa temperatura, podendo chegar a 980°C e pode resultar em peças com alto grau de absorção (Figura 6).
FIGURA 6: POTE TORNEADO EM RODA DE OLEIRO COM A ARGILAMA, QUEIMA À LENHA DE 980ºC.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
• News Cassino - Para o preparo dessa massa, usamos o método úmido e, além da lama, outro material é o papel (jornal). A lama será colocada na forma natural em um recipiente e esta será submersa em água; o papel (jornal) será picado e colocado em outro recipiente e também submerso em água; nas duas bases se acrescenta um pouco de defloculante para dissolver melhor os nódulos da lama e a trama da celulose. No decorrer de 3 meses, são mexidas e lavadas. Após este período, misturam-se as duas partes, tornando-se uma única mistura, que será revolta durante 3 semanas até que se obtenha uma massa homogênea. Depois, basta colocar nas placas de gesso e retirar a massa para trabalho. A queima pode exceder um pouco mais, chegando aos 1100°C, perfeita para usos artísticos, possibilitando peças finas e leves, justamente por que toda matéria orgânica existente, incluindo as fibras da celulose, volatizam aos 500ºC, mantendo poros em todo o corpo cerâmico (Figura 7).
FIGURA 7: CACOS DA PLACA COM A RECEITA DA ARGILA NEWS CASSINO, QUEIMA À LENHA DE 980ºC.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
• “LamAldeia” - No preparo dessa massa, podemos considerar os dois métodos: úmido e seco. Porém, a mistura dos pós nos traz maior precisão no percentual da fórmula. Basicamente, compõem-se a mistura em percentual de 40% da lama e 60% da argila da aldeia, pode-se variar os percentuais de mistura, de acordo com a intenção do objeto a ser confeccionado, porém, esta receita demonstrou resultados de excelente resistência mecânica, refratariedade e baixa retração e um índice de permeabilidade baixo. Para confecção de utilitário, é a argila mais adequada, com baixa absorção e boa refratariedade. Queima até 1150ºC com segurança, podendo exceder ainda mais a temperatura, porém pode apresentar leve deformidade na peça final (Figura 8).
FIGURA 8: CONJUNTO DE CHÁ FEITO COM A ARGILA LAMALDEIA, QUEIMA À LENHA DE 980ºC.
Fonte: Acervo do Projeto de pesquisa Sal Cerâmica. 2018.
Durante os anos de pesquisa do projeto Sal cerâmica, outras composições foram elaboradas, porém estas 3 massas foram as que seguiram e seguem ativas nos trabalhos
que foram desenvolvidos e continuam nas mãos daqueles que foram de alguma forma “contaminados” pela ideia de transformar a lama em matéria prima potencial para a produção de peças cerâmicas. Os resultados destas peças foram expostos em diversas ocasiões, provocando ainda mais discussões a respeito da potência social, cultural e econômica oculta neste insumo, considerado ainda por muitos como dejeto. Assim como a Eng. Laurita dos Santos Teixeira apresenta em seu estudo das propriedades químicas dos rejeitos da dragagem do porto novo para utilização como solo fabricado para fins agrícolas:
Os usos benéficos de material dragado incluem uma grande variedade de opções as quais podem utilizar este material para alguma finalidade produtiva. O material dragado é fonte valiosa de solo com grande poder de manejo e gerenciamento, com capacidade de fornecer melhorias e benefícios ambientais e socioeconômicos. As principais categorias na qual o sedimento dragado pode ser utilizado para uso benéfico, são: restauração e melhoramentos de habitats aquáticos (mangues, marismas, ilhas artificiais); uso em aquicultura; uso em parques e recreação (comercial e não-comercial); agricultura e silvicultura; uso em aterro e cobertura para lixões; estabilização e proteção da costa e controle de erosão (através de arrecifes artificiais, quebra-mares e bancos de areia); uso industrial e na construção civil (incluindo desenvolvimento portuário, de aeroportos, urbano e residencial); produção cerâmicas (pouco explorado por ser um processo muito caro). (TEIXEIRA, 2009, p.40-41, grifo nosso)
Observa-se que há muitos apontamentos na intenção de uso da lama. Agora, e a arte? Não é um caminho com circunstâncias experimentais reveladoras? Pois, ao nos depararmos com a expressão entre parênteses no que se refere à possibilidade do uso da lama para cerâmica, entenda-se neste lugar, por que não, a produção artística? Fora o fator custo para seu aproveitamento, esta matéria é válida para experimentos. Então, o que torna esta possibilidade realmente custosa? Em primeiro lugar, o conhecimento. Ter acesso à informação é fácil e já é um começo, porém o conhecimento já antecipa boa parte do custo, pois com ele vamos poder nos estruturar sabendo o que necessita o ceramista, ou qualquer pessoa interessada neste material, diante da vontade de confeccionar um objeto usando este recurso abundante. A informação vai aclarar que não basta a argila apenas para se fazer um objeto cerâmico, e que para além da sua estruturação necessária para completar esta intenção, é preciso a queima. Só completando esta etapa é que a argila ganhará novo título e passará a ser considerada cerâmica. E este pode ser um dos fatores de maior relevância no custo. Porém, é possível acessar a outras pesquisas, onde vamos observar que existem diversos
tipos de queimas, das mais rudimentares até as que possibilitam a construção de fornos para diferentes tipos de combustíveis (lenha, gás e elétrico) e que basta adequar a realidade econômica de cada ceramista, artista ou curioso. Vamos ver à frente algumas possibilidades.