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ENTREVISTA

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E-COMMERCE SEM PRESCRIÇÃO

A compra de medicamentos e itens de farmácia via canais digitais foi desmistificada na pandemia. A manutenção desse processo é o grande desafio da classe farmacêutica

Por Lucas Kina, da Redação do E-Commerce Brasil

Apesar de não ter o mesmo destaque no nosso cotidiano, a Covid-19 deixa algumas marcas no e-commerce. O termo "legado da pandemia", tantas vezes invocado por nós, jornalistas, ao tratarmos do futuro sem a doença, ganha sentido ao pensarmos, principalmente, no hábito das pessoas. Ao nos aprofundarmos nisso, portanto, nos deparamos com outro aspecto da população que também passa por mutações ainda mais rápidas: o consumo. São muitas ramificações nas quais o comércio eletrônico evoluiu, mas um segmento em específico tem seu local de destaque: saúde.

Dos avanços relacionados à telemedicina, com atendimento por meio de aplicativos e sites, temos também a comercialização online de produtos farmacêuticos. A categoria, que cresceu e tornou-se importante para redes de farmácias brasileiras, sobe diariamente degraus importantes dentro do setor. De acordo com a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), o faturamento da classe em questão foi de R$67,5 bilhões, crescendo 16,04% ante 2020.

Os números em si, apesar de altos, não são os únicos a se destacarem aqui. O que chama atenção, na realidade, é a relação dos resultados com o então recém-surgido e-commerce farmacêutico. Dados da entidade mostram que este e outros índices positivos conversam diretamente com o bom desenvolvimento das operações de delivery de produtos e do próprio comércio eletrônico. Segundo levantamento da Intelipost, inclusive, no retrospecto de março de 2020 em relação ao mesmo mês em 2021, a comercialização de produtos farmacêuticos por meio de canais digitais aumentou em 66%.

É possível dizer que o cenário é totalmente positivo? Ainda existem obstáculos e desafios no aumento da capilaridade logística e comercial do e-commerce farmacêutico? A certeza, atualmente, é que o processo ainda é de consolidação e tem espaço para erros, acertos e testes. Para entender o que permeia a expansão e o futuro da atividade

farmacêutica no e-commerce brasileiro, Sérgio Mena Barreto, CEO da Abrafarma, falou de desafios, dados, multicanalidade e outros pontos envolvendo o assunto.

E-Commerce Brasil: Com o arrefecimento da Covid-19, como o e-commerce farmacêutico deve manter o desenvolvimento positivo? E dado que a pandemia não tem a mesma força e, por consequência, a demanda do período não existe mais, qual a estratégia para que o índice de vendas continue alto?

Barreto: Mesmo com o arrefecimento, a operação de e-commerce continua em viés de crescimento nas farmácias brasileiras, na contramão das vendas online do varejo em geral. Considerando os três primeiros trimestres de 2022, esse segmento registrou receita de R$2,71 bilhões nas 26 redes associadas à Abrafarma, o que representou um avanço de 36,3% sobre o mesmo período do ano passado. O setor vem trabalhando com sucesso a combinação entre a agilidade digital e a experiência na loja física, por meio de modalidades como o “clique e retire”. O consumidor tem acesso a uma jornada de compra e a uma saúde muito mais fluida.

Porém, ainda temos empresas em diferentes pontos da jornada. Como fazemos parte de uma cadeia logística ineficiente, investimos muito tempo construindo um sistema próprio de distribuição que pudesse preencher as lacunas necessárias nesse setor. Esse foi o foco do trabalho da área de tecnologia das nossas empresas por ao menos dez ou 15 anos. E fomos bem-sucedidos: nas grandes redes, a ruptura de estoques foi reduzida para um índice em torno de 7%-15%, ante 50% do segmento das farmácias independentes.

Depois disso, veio a transformação com foco na centralidade do cliente. Mas ainda nessa nova etapa, para algumas empresas, a transformação digital é sinônimo de ter um site responsivo ou um app na mão do usuário, enquanto que na outra ponta já se trabalha na redução do atrito, na melhoria de processos e no mapeamento da jornada do cliente para oferecer soluções cada vez melhores e mais rápidas. No mundo em que vivemos hoje, mobile e instantâneo, não cabem respostas lentas, dados duplicados e decisões tomadas sem as evidências necessárias.

ECBR: Existe uma ideia dos principais produtos comercializados especificamente no e-commerce? Quais? O mercado faz algum rastreamento para compreender o hábito dos consumidores?

Barreto: Não temos dados específicos sobre vendas por categoria ou item, mas o foco da operação de e-commerce são os produtos

de higiene pessoal, perfumaria e os chamados medicamentos isentos de prescrição (MIPs), justamente pela restrição à venda de medicamentos de prescrição por meio dessa plataforma.

ECBR: No primeiro trimestre de 2022, o e-commerce farmacêutico cresceu 40%, segundo dados da própria Abrafarma. Qual a percepção da entidade sobre a manutenção desse modo de compra? As empresas já entenderam a força do comércio eletrônico?

Barreto: Analisando as grandes redes que integram a Abrafarma, o setor acredita firmemente que o uso intensivo de tecnologia é a melhor resposta para o abandono do tratamento crônico, que ainda é absurdo no Brasil. Com o uso de dados, podemos estar um passo à frente do paciente, percebendo a mudança do uso e estimulando a adesão ao tratamento, seja por meio de gamificação, abordagem direta do sistema ou pelo profissional de saúde envolvido. Podemos pensar em sistemas de assinaturas, em mais prevenção e menos agravos, e, como consequência, menos custos para o sistema como um todo.

ECBR: Hoje, o que ainda falta para que o e-commerce tenha mais espaço no segmento? Como ampliar essa sinergia?

Barreto: Apesar de termos apenas 10% do total das farmácias brasileiras, as redes associadas à Abrafarma realizam 960 milhões de atendimentos/ano e dispensam 52% de todos os medicamentos consumidos no país. O volume de vendas está em R$ 72 bilhões nos últimos 12 meses e as transações digitais representam menos de 10% dos negócios. Há, portanto, um longo caminho a ser percorrido.

ECBR: A multicanalidade envolvendo o e-commerce farmacêutico é positiva? A distribuição dos produtos por terceiros é um modelo que agrada o varejista ou existe um esforço para que o canal direto seja fortalecido?

Barreto: Sem dúvida, esse é um modelo interessante, e a tendência é de que as farmácias evoluam com foco na adoção de plataformas omnichannel.

ECBR: Existe possibilidade de farmácias e drogarias atuarem como centros de distribuição, caso essa “terceirização” do canal de vendas seja o melhor caminho? Como a Abrafarma enxerga essa possibilidade?

Barreto: Estamos evoluindo rumo à multicanalidade, mas isso não significa que a farmácia se limitará a ser um centro de distribuição, justamente em função do papel desse estabelecimento como um centro de atendimento primário à saúde da população e o primeiro canal que o brasileiro aciona para solucionar problemas relacionados ao seu bem-estar.

ECBR: Além dos dados gerais das vendas no e-commerce, é possível estimar a quantidade de vendas que vem de outros canais digitais, como aplicativos, WhatsApp e sites de terceiros?

Barreto: Não temos esses indicadores, mas o setor vivencia um ciclo em que os e-commerces próprios ainda despontam como principais canais de vendas.

ECBR: Quais as novidades para o e-commerce farmacêutico em 2023?

Barreto: Acreditamos em uma consolidação do e-commerce, com mais tecnologia, mais diversidade de mix e multicanalidade.

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