BEATLEMANIA

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BEATLEMANIA



Glauco Mattoso

BEATLEMANIA

São Paulo Casa de Ferreiro


Beatlemania © Glauco Mattoso, 2023 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros _____________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA _____________________________________________ Mattoso, Glauco BEATLEMANIA/Glauco Mattoso São Paulo: Casa de Ferreiro, 2023 74p., 14 x 21cm CDD: B896.1 - Poesia 1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.


NOTA INTRODUCTORIA Dos Beatles fui fan, claro: ouvinte dos mais bobos e fanaticos. Foi proprio da minha geração. Hoje, mais critico, resalvo muita coisa, mas ainda percebo que elles foram, mesmo, os taes, deixando uma aggradavel influencia, motivo de diversos dos meus versos. Por isso os collecciono neste livro, visando uma possivel edição impressa. Amigos pedem-me esse typo de lyrico tributo, com justiça.



DISSONNETTO CHAPMANIACO [0163] Curiosa coincidencia me accontesce: Um mez antes do facto (Que idiota!), parei defronte à porta do Dakota, mas não peguei autographo. Annoitesce. E logo Nova York estava em prece. O Central Park, em lucto, o povo lota. Em choro, cantam juncto a mesma nota. John Lennon lembra sonho, e não se exquesce. Turista entristescido, fui ao predio em que o gorilla enorme trepa e morre. A torre gemea, o Empire State, o tedio. Só tem arranhacéu aqui! Que porre! Sem Lennon nem gorilla (Que remedio?), que um poster dos dois, pois, meu quarto forre. Ao novo rock eu mostro o dedo medio, meu sacco ja torcendo que não torre.

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DISSONNETTO TRIBUTARIO [0312] Em Roma se pagava p’ra cagar, mas hoje a taxação tem melhor nivel. O imposto sobre a merda é deductivel do grosso que teremos de pagar. Não ande em contramão, va devagar. As mulctas são pesadas, coisa horrivel! Ja não se tracta mais de “causa civel”: “tributaristas” temos que tragar! O Harrison ja disse que a receita lhe deixa um só, retendo dezenove. Sacou ou não sacou? Gostou, my love? Achou sua parcella muito estreita? Da sua grana a fonte então comprove, sinão a mão em tudo ella lhe deita! Não é, gajo, uma machina perfeita? Só falta tributarem quando chove!

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DISSONNETTO BEATLEMANIACO [0353] John Lento é devagar, mas vae ao longe. No galho, Paul Macaco vira fera. No coppo, Ringo Estrago é bom battera. No mantra, George Arraso é quasi um monge. Os Kinkos, mais chronistas? Não sei onde! Os Byrdos, mais barrocos? Quem lhes dera! Estones, mais pauleira? Ora, pudera! Ficaram nos cincoenta, attraz do bonde! “Não fosse a Yoko Ono (diz um fan), tocavam até hoje, todos vivos!” “A culpa foi do Brian, bicha van!”, opina um outro. Em summa, pelos crivos do tempo, até que o Ringo foi galan. Mais idolo é um dos Beatles nos archivos do cego que, envolvido num affan poetico, tem lubricos motivos...

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CONTO RECIPROCADO [0499] Inedito dos Beatles foi achado mixado e quasi prompto para o disco. A musica fallava em São Francisco e “dar e receber” era o recado. O Martin nem lembrava: fora o lado “B” para “Savoy truffle”. Bom petisco, que ao paladar do ouvinte mais arisco será puddim de leite condensado! Ao remasterizar aquella joia as mãos gananciosas a lapidam demais e a producção nova destroe-a. No desespero, os cerebros convidam Tom Zé, que em Babo, Ernesto e Heitor se appoia e salva o som, que as lojas ja liquidam. Pensei aqui commigo: tal tramoia foi boa. Que outros posteros transgridam!

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DISSONNETTO MORTAL [0959] Rockeiros morrem cedo! Alguem explica? Nem sempre é pela droga: um accidente, doenças, suicidios... De repente, “milhões de fans são orphans”, se publica. Jim Morrison, a Janis... Lista rica! Tem Elvis... Tambem Hendrix se accrescente, alem de Buddy e Valens... Quanta gente que victima virou da mesma zica! Si Marley, Russo ou Mercury se vão, Cazuza, George e John são companhia citada na fatal chronologia, até que chegue a vez do Tremendão. Talvez o Raulzito até se ria la em cyma, ou si for outra a posição, em baixo, ao ver que agora nem rockão nem mesmo um rockzinho é som do dia.

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DISSONNETTO FUNDAMENTAL [0966] “Revólver”, “revolver”... Quem vê sentido ambiguo é o Walter Franco, que, de branco, imita o John e canta, em solavanco, a syllaba truncada e seu ruido. O branco, um tom de cappa, a mim tem sido synonymo de tranco e de barranco na musica, um advanço sobre o flanco mais classico das artes, revolvido. No duplo disco, os Beatles tambem teem no branco seu signal de experimento que passa a limpo a historia e o “Quem é Quem”. Beethoven fica. Beatles, cem por cento, não digo, mas bem perto estão dos cem, embora eu ouça o Creedence no momento. Ainda psychodelico, porem, me sinto quando cores lembrar tento.

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DISSONNETTO CONTRACULTURAL [0967] Na cappa estão de farda colorida e as lettras veem impressas, novidade [vêm] até então não vista. Minha edade ainda juvenil vê verde a vida. As musicas nos fallam de partida, chegada, cucas livres, amizade. O espaço um som de citharas invade e o tempo, rallentado, se encomprida. Tocou aquelle disco um anno inteiro, mas nunca nas festinhas, pois dansante não era: só de fundo, alvissareiro. Não veiu a nova era, e hoje na estante conserva-se o vinyl, pois, no chuveiro, só canto um “Long Tall Sally” que se cante, ou outra dos Ramones, um certeiro rockão, que ja gastou nosso pisante.

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DISSONNETTO MARCIAL [0970] “Peor do que ja está não vae ficar!” A Coppa até ganhamos, mas o ganho pertence ao invasor, tyranno, extranho, que pisa em nossa cara: o militar! Alguem relembra os Beatles: “Deixa estar!” O quadro é promissor, e até me assanho com sonhos de mudar, mas o tamanho das nossas utopias dá logar aos annos de suffoco, que sem fim parescem, sob a bota da Direita! Mas digo ainda: “Ah, não! Não fica assim!” Um dia, expezinhado, a gente deita e accorda libertado! Só o PASQUIM adjuda a accreditar nessa receita, alem da poesia, a saber vim, depois que de Satan cahi na seita.

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DISSONNETTO DO ROCK PAMPHLETARIO [1380] O Lennon parodia muito bem a cappa dum jornal, e mette o pau naquelles taes que, então, poder deteem num mundo dividido em bom e mau. Montagem photographica faz quem colloca os dois dansando nus: o Mao e o Nixon! Nos desenhos ha tambem mulher exfaqueada... E o som, uau! Achei melhor aquella em que elle advoga a causa dum detento que, por droga, sentença recebeu muito severa, alem do que, no caso, um réu espera. O nome é John Sinclair: foi como o Fio, que Jorge Ben transforma em rei do Rio. Sahir do anonymato? Quem nos dera! Sinclair? Pois é, se soube, então, quem era…

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DISSONNETTO DO CONTRA [1505] Parodia, glosa, satyra, epigramma nem sempre presuppõem uma homenagem. Às vezes o humorista attenção chama ao dubio modo como os homens agem. Um Rutle goza um Beatle porque o ama. Gregorio de Camões faz boa imagem. Ja Chaplin vive Hitler e conclama que os bardos contra os barbaros se engajem. Si fallo de carrascos e oppressores, é claro que os condemno! As duras dores das victimas são minhas, egualmente. No sonho, sou egual a toda gente. Estupidos dirão que “de direita” serei, porque meu verso se deleita zombando da afflicção que um cego sente, ainda que por todos me lamente.

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DISSONNETTO PARA A UTOPIA PACIFISTA [1940] Sobrevoando Londres, aviões despejam suas bombas. Lennon nasce com nome de John Winston por razões bem obvias: reflectir da guerra a face. Talvez isso é que accaba às taes questões utopicas fazendo que se abbrace. A chance à paz, amor nos corações, o fim da guerra, tudo que elevasse. Porem a baixaria outra vez vence e faz com que vacille, amargue e pense que ja não accredita nem nos Beatles. Ranzinza, agora attura seus attritos. Bobagem! Tudo passa, diz o George. Por mais que a má fornalha azar nos forje, ainda accreditamos nós nos mythos, ainda somos, para as fans, bonitos.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO CREEDENCE CLEARWATER REVIVAL [2381] John “Fóguerti” (ou “Foguérti”, como aqui ficou sendo John Fogerty) é mentor e lider duma banda de valor egual ao som dos Beatles, das que ouvi. Na minha geração, alguem sorri de tal comparação, pois superior a todas acha o Creedence: “Só si for melhor o proprio John, solo por si!” Tambem sou eu fanatico por tudo que o “Crídens” (não “Cridênci”) representa em termos de rockão do mais grahudo. Adoro aquelle country dos sessenta, mas, quando, friamente, faz-se o estudo, os Beatles mais nenhuma banda enfrenta. Meu gosto, seja como for, não mudo: ouvir ambas as bandas me contenta.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE BYRDS [2383] O Roger poz electrica guitarra no Dylan e no Seeger, duplicada: nascia assim a marca registrada do arranjo psychodelico, se narra. Aos Beatles, o barroco fez, na marra, que abrissem mão da rustica ballada e fossem, na harmonia trabalhada, buscar a reacção, com maior garra. Ao “Homem do pandeiro”, ou tamborim, respondem, pois, com “Alma de borracha” e com “Revolver”: auge, para mim. Mas firmam nome os “Byrdos”, e a bollacha do magico tapete, que ruim não é, jamais de “basicos” os tacha. Não tem a discussão jamais um fim... Melhor, uma das duas, alguem acha.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE MONKEES [2385] Fizeram elles tudo, exactamente tudinho quanto os Beatles tenham feito. Mas, só porque o fizeram sem o jeito britannico, seu caso é indifferente. Appenas um detalhe: ha quem invente e quem só tire copia. Eu proprio acceito, porem, que até do country o trilho estreito allargue esse “gruppinho adolescente”. Neil Diamond não teria, de encommenda, composto para os caras, si talento nenhum houvesse alli, só lucro e renda. Si todos copiaram e no vento seguiram, por que, então, tanta contenda p’ra olhar os “micos” com olhar attento? Não creio que successo só dependa de genio: ser babaca, às vezes, tento.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO JEFFERSON AIRPLANE [2427] Mulher cantando rock é coisa rara, mas, quando em certa banda uma desponcta, são duas, trez, e a gente perde a compta de quantas ja passaram pela vara. É sempre a mesma voz, a mesma cara, e o som dopante deixa a gente tonta. Si o bom vocal da Grace alguem confronta com outras vocalistas, ja compara. Um hymno, “Get together”, marca a phase lysergica, canção ja bem coberta por todos os Youngbloods, naquella base. Melodicos, harmonicos, na certa estão no mesmo patamar, ou quasi, dos Beatles ou dos Byrds, si o ouvido é allerta. Com Grace eu não desejo que se case nenhum careta, si ella for experta.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE ROLLING STONES [2430] Seus fans dos fans dos Beatles são rivaes, egual a uma torcida. Esse quartetto, que às vezes foi quinctetto, eu não me metto a achar que seja menos bom, nem mais. A dupla Jagger-Richards é das taes que formam boa liga: vão ao ghetto dos negros e nos trazem som que preto não é, tampouco branco ou “clean”, jamais. Seu merito, passados os sessenta, foi ser fiel ao impeto dansante do velho rock’n’roll, que não rallenta. Emquanto o progressivo era maçante e o tedio diffundia, a somnolenta cidade não ha quem melhor levante. Compondo “Revolution”, Lennon tenta sacar, mas só por si se fez pensante.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE RASPBERRIES [2431] O nome de Eric Carmen, normalmente ao brega associado, foi mais rude no tempo em que assumiu uma attitude parodica da musica “p’ra frente”. De Beatles, de Beach Boys, principalmente, a banda approveitou a juventude brincando de fingir algo que mude a historia, mas que, emfim, nada accrescente. Gostoso, todavia, é ouvir aquella perfeita imitação: até o vocal do Paul é parescido e não appella. Foi phase adolescente, é natural, mas nada mais fez Eric, e revela ter sido bom emquanto jovial. Nem cabe levantar qualquer querella: Qual delles não imita alguem? Hem? Qual?

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE HOLLIES [2442] Em Londres sempre chove. A moça espera seu omnibus, no poncto. Nada como, bancando o cavalheiro, ou o mordomo, levar-lhe um guardachuva: eis a paquera! Os Hollies, como os Beatles, na sincera visão de quem mordeu do Mal o pomo, são agua-com-assucar. Mas eu sommo ponctinhos, não subtraio: a banda é fera! Em “On a carousel”, estava em poncto de balla. Nos septenta, ja addocica demais, mas mesmo assim eu dou descompto. O bom da scena ingleza é que ella é rica em bandas (quasi) eguaes: quando as confronto, dizer qual a melhor é o que complica. Eu, quando ao sessentismo me remonto, só lembro que era dura a minha picca.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE MOVE [2462] Roy Wood, alma da banda, quer, egual aos Beatles, inscrever no pantheão seu nome. E então, canção appós canção, copia a trajectoria do rival. Até que tem seu gruppo original pendor para os arranjos, porem não emplaca, como os Kinks, a tal opção aos boys de Liverpool, e fica mal. Se sente um dinosauro sem ter sido, ao menos, tão famoso. Corrigindo, se sente um brontosauro, envelhescido. Exquesce elle que, em meio ao que vem vindo na decada seguinte, seu bramido echoa pela selva e soa lindo. Eu, quando o som escuto, me convido a, como um fan dos Beatles, ir curtindo.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE GANTS [2476] Plagia mesmo o Lennon? Noutra ou numa canção, talvez, mas segue elle tambem algumas outras fontes, e faz bem, ainda que tal plagio não assuma. Do Diddley é que o Sid Herring costuma tirar estylo e “côver”, e que nem “Road runner” sae a “Snake”. Que é que tem? Mas com beatlemania a cobra fuma! “My baby don’t care” cara tem daquillo que os Beatles ja gravavam. Mesmo assim, tem toque original e faz estylo. Não foram psychodelicos, mas vim sem pejo a amar o gruppo e a preferil-o a muita banda mega, mas chinfrim. Eu, quando um som escuto, não vacillo: supponho ouvir os Beatles, por tintim.

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DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE KINKS [2481] Chronistas mais britannicos não ha. Até um beatlemaníaco o chapéu lhes tira, pois Ray Davies deixa ao léu quem queira ser da Corte a fada má. Criticam o burguez que às compras va, o nobre decadente, e fazem réu do cidadão moderno. Um escarcéu maior deu-se ao levarem Lola la. Fallar de travestismo, nos sessenta, ainda era tabu: nem os Estones ousaram isso a serio. A coisa é lenta. Ferinos, debochados, foram clones do rico ao pobretão. Na pachorrenta terrinha, os sanctarrões estão insomnes. De Kinkos vou, até quando rallenta, até quando está baixo o som dos phones.

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DISSONNETTO PARA JOHN LENNON [2521] Foi genio, não ha duvida, mas digo sem odio nem paixão: seu calcanhar de Achilles, por ser muito popular, é um ego a contemplar o proprio umbigo. Capaz de abbandonar o amigo antigo por causa duma japa e de accusar o Macca de mediocre, seu ar de lider e guru foi seu castigo. Morreu assassinado por um fan que, dizem, tem remorsos do seu acto. Destino bem ironico, eu constato, a quem fallou que achava a fama van. Mas teve outra virtude: seu pé, chato, dedão tinha mais curto e, si galan não chega a ser, confesso eu, no divan da analyse: sonhei ser seu sapato.

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DISSONNETTO PARA PAUL McCARTNEY [2522] Melhor compositor que seu parceiro, mas não tão bom lettrista, fez, no entanto, canções, da mais pauleira ao accalanto mais leve, que à lembrança veem primeiro. [vêm] Da fama de melloso teve inteiro motivo para culpa, mas expanto não causa haver composto, tambem, tanto rockão, como o mais typico rockeiro. “I’m down”, “Can’t buy me love”, a volta à Russia, “Get back”, “Oh, darling”, “Birthday”, “Helter skelter” são sons que, em collecção quasi completa, assustam meu ursinho de pellucia. Seu pé não tem a sola plana e recta, egual ao pé do Lennon, com argucia podolatra constato, si exmiuce-a meu crivo, mas em nada o saldo o affecta.

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DISSONNETTO PARA GEORGE HARRISON [2523] Não era, nem queria ser guru, mas como guitarrista fez papel de monstro mais sagrado. Era um rebel pacifico e, dos quattro, o mais hindu. Jamais perdeu aquelle jururu semblante, mesmo quando seu corcel de solo carreirista o coquetel de estréa festejou, e entrou tutu. Compoz vinte e trez musicas no gruppo, appenas, mas sozinho até exaggera tirando do bahu tudo que o zera naquella caixa tripla. Eu não o apupo. Disseram que em chulé seu tennis era provavel campeão, mas me preoccupo, emquanto em sonho o beijo, lambo e chupo, que tenham desdenhado o pé da fera.

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DISSONNETTO PARA RINGO STARR [2524] Ser feio e narigudo é um infeliz destino? Ora, nem sempre, si os fieis devotos duma banda suas fés professam na battera do pettiz. Biccão, um jornalista saber quiz: “Por que gostas de usar tantos anneis nos dedos?” A resposta é nota dez: “Porque não posso usal-os no nariz!” Gravou dez, onze faixas nessa vasta e astral discographia, sem veloz ser como batterista, e sua voz, fanhosa e não melodica, se arrasta. Aos outros fans não sei, mas, para nós, podolatras, seu pé sabermos basta, sem ser nenhum de nós iconoclasta, que é chato e fede, mesmo o banho appós.

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DONA DE OCA CONNA [4835] Si você for japoneza feia, chata, rabugenta, e quizer ter cama e mesa com aquelle que a sustenta, si sahir deseja, illesa, dessa scena violenta sem sujar-se, isto é certeza: case-se, antes dos cincoenta. Um rockeiro é o que se indica si a carreira delle é rica, si talento tem de sobra e ao Systema não se dobra. Si elle, acaso, morto cae, perder nada você vae... O marido deixou obra e direitos você cobra.

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REVOLVENDO O TERRENO [5606] Tem gente que divide a Beatle era em duas phases, muito differente a “boa” (aquella cujo som a gente curtiu e mais dansante considera). Até sessenta e cinco o padrão era, nas lettras, só paquera adolescente em rhythmo ora mais lento, ora mais quente, e nisso o nosso gruppo foi, sim, fera. Depois de RUBBER SOUL, é controverso aquillo que fizeram de vanguarda. Uns acham que a notar a banda tarda de Dylan o discurso, o tom do verso. Alguns em SGT. PEPPER’S ja disperso acharam todo o clima, feia a farda. Depois, acham que Lennon se accovarda compondo “Revolution”... Foi o inverso?

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EVE OF CONSTRUCTION [5607] Depois de meia cinco, os Beatles não notaram que, nas lettras, o que vinga é Dylan, Pete Seeger ou folksinger do genero, o “protesto” de plantão. Ficaram no “Te adoro, coração!”, “Te amei mas ja não amo!”, “Nessa ginga a gente vae dansar!”, mas ninguem xinga os donos do poder. Perdem a mão. Talvez por isso os Byrds são, a partir de então, mais antennados. Vermos basta as lettras de teor iconoclasta que gravam, antevendo o bom devir. Si veiu ou si não veiu, decidir só cabe a quem viveu aquella gasta cultura que, “do contra”, fama vasta rendeu, da juventude um elixir.

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DE PYJAMA NA CAMA [5645] Photographos dos Beatles, eu ja pude ver isso, registraram uma lucta dos quattro, sem judô nem força bruta, mas sim de travesseiros. Nada rude. Aquillo me ouriçou, na juventude, pois vi seus pés descalços, quando um chuta, empurra, pisa, puxa, na disputa de espaço, numa comica attitude. Simulam ser creanças. Eu simulo commigo quem teria seu pé posto na cara do collega que, disposto a ser pisado, finge errar o pullo. Poder de reacção seu sendo nullo, do Lennon leva a sola bem no rosto, tal como ja levei. Beijei com gosto, mas fiz que não queria ser tão chulo.

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BOB FIRMINO [5680] Espaço dá, dedica muito dengo a midia àquelle clube, exaggerado conceito de que, pelo nosso lado de fracco futebol, só dá Flamengo. Ja como torcedor, sempre capengo e caio, suffocando cada brado de gol que foi perdido, mas vingado estou quando o Mengão se torna quengo. Perdeu do Liverpool o Mundial de Clubes! Isso basta para meu tesão estimular! Qual europeu meresce mais tamanha bacchanal? Dos Beatles elle é symbolo! Que tal? Que mais posso querer, nesse meu breu de luzes e de titulos? Perdeu o Mengo! Que delicia! Que final!

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MACHINA DO TEMPO [5940] No tempo em que eu ainda via, vi Ginsberg elogiando, em oitentista registro, o SGT. PEPPER’S. Não despista o bardo sobre aquillo que ergo aqui. “Jamais reviveremos phrenesi egual ao da cultura sessentista!”, assim diz um nostalgico, que lista as magicas conquistas. Respondi: {Exsiste retrocesso, ou é só phase? O mundo não caminha para traz. Appenas num sentido gyra. Mas ha sempre quem fascismos extravase. Por mais que recuemos, será quasi sem gaz a pregação das fadas más. A menos que espelhemos Satanaz na farsa antichristan dum guru nazi.}

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MISCELLANEA ROCKEIRA [6038] Pensemos num historico momento. Foi anno musical, digo e não brinco: mil novecentos e sessenta e cinco. Eis como de alguns ponctos lembrar tento. Concordo com aquella theoria segundo a qual as decadas que vão marcando a musical historia, via um poncto inaugural, comptadas são ao meio, no anno quincto. A maioria dos factos nos sessenta cae. Ou não? Pautaram a maior revolução, dos Beatles, “Rubber soul”; de Dylan, “Like a rolling stone” e “Minha geração” do Who. Com “Satisfaction” outra cae, que importa, “California dreamin’”. Dão respaldo os Drifters, Pickett, Otis, Ike...

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YOU LOOK LIKE A GIRL [6168] Menino que tem cara de menina por causa do cabello bem comprido é caso que, em Barbarians, bem ouvido eu tinha, Glauco! O que você imagina? Em epocha de Beatles, a ferina linguinha do povão acha a libido suspeita si com gay é parescido qualquer moleque à toa alli na exquina. Agora ninguem liga si tem cara de fada -- até de puta -- algum pivete, pois quasi todo mundo faz boquette por gosto, ou quando a vida fica cara. Até você, Glaucão, que se compara ao torpe em cuja bocca alguem só mette caralho com sebinho, se remette a musicas mais sadicas na tara!

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FUNEBRES BREUS [6790] Proverbio ouvi dizendo que quem cria um corvo se subjeita a ter furado seu olho, Glauco! Causa desaggrado saber disso? Você não se arrepia? Quem perde a vista assim não vae, um dia, querer o suicidio? Ouço, ouriçado, aquella do John Lennon que, em estado de graça, fez um blues, rara agonia! Os Beatles não faziam blues, mas quando fizeram, bem pisaram na ferida! Glaucão, você pensou na suicida sahida, não pensou? Segue pensando? Seus olhos aguia alguma bicca, a mando de Exu, quiçá de Juppiter? Convida Satan que, no sabbath, uma lambida você lhe dê no cu? Quer breu mais brando?

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COME TOGETHER [6793] Quiz Lennon fallar disso? Bem, seu jeito confuso de fazer nonsense não adjuda muito, Glauco! Mas é tão explicito o podolatra conceito! Pés chatos? Wilson Pickett não viu peito do pé na Mustang Sally, mas pezão paresce ter o gajo da canção accerca dum detalhe que eu suspeito! Sim, Glauco! “Come together”, acho, tracta dum typo grosseirão e varzeano, que não engraxa a bota, siquer panno no couro passa! A gente bem constata! Porem, é no chulé da sola chata, alem do vão dos dedos, que o magano junctou uma geléa, Glauco! Uffano você por elle fica? Ah, foi batata!

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WHY CAN’T WE LIVE TOGETHER [6834] Si Timmy Thomas falla, tem logar! Cantava: “Não importa a sua cor, nós somos irmãos, brancos, negros! Por que guerras accontescem sem parar?” Tambem o Paul McCartney quiz fallar e, juncto com o Stevie, foi auctor do thema antiracista que, em favor da paz, fez da canção these exemplar! Não cabe qualquer critica a nenhum dos dois, naturalmente, Glauco, mas cricris não vão faltar com suas más linguinhas restringindo o “bem commum”! Razão teem Paul e Timmy, qualquer um que queira appellar para haver mais paz, em vez de erguer altar a Satanaz, que adspira, dos defunctos, o fartum!

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FILA QUE AFFUNILA [6876] Na morte de John Lennon... Nesta data, um oito de dezembro, uma vaccina começa a ser usada... Mas termina, hem, quando, Glauco? Data apponcte, exacta! Não basta annunciar uma bravata! Nós temos que saber o que imagina fazer esse governo! Uma cortina se fecha, de fumaça, se relata! Talvez o que ja rolla la na terra do Lennon signalize grande feito historico, Glaucão... Mas qual proveito teremos nós, aqui? Tudo se emperra! Aqui só somos gente que se ferra, na fila dos paizes! Eu suspeito que iremos é morrer antes que jeito se encontre para allivio de quem berra!

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THERE’S NO TIME [7142] Fazer as pazes podem! Lennon canta as musicas do Macca! Canta Macca as musicas do Lennon! Não attacca ninguem jamais ninguem pela garganta! A gente, nós sabemos, não é sancta, mas, antes de ir ao brejo cada vacca, podemos desistir daquella faca nas costas de quem males seus expanta! Que merda a tal mania de brigar! É curta a vida, amigo! Por que não dormir bem uma noite, meu irmão? Está com medo? Um odio só dá azar! Aquelle que parou para pensar na certa arrependeu-se, mas então foi tarde, pois faltou occasião ao disco mais reciproco dum par!

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MANIFESTO SAUDOSISTA (1/3) [7916] (1) “Não, Glauco! Quer saber? P’ra mim o rock morreu com Lennon! Elle hoje seria melhor que Macca, Jagger, Dylan, porra! Hem, Glauco? Ja pensou? Aquelle disco junctando tantas causas, hoje em dia? Teria que ser triplo! Tanta gente clamando por direitos! Alem disso, ninguem foi tão rockeiro de raiz, tractando-se de covers dos cincoenta! Em summa, Glauco, falta faz, à bessa!” (2) -- Faz falta, sim, mas esse seu enfoque restringe muito. O rock ‘inda teria um tempo com os Wilburys. Que morra depois, mas Macca até correu o risco de, em plenos nove nove, nostalgia propor do cincoentismo. Mais urgente, a causa social, a seu serviço, só tem um Bono, um Waters, infeliz excolha. Mas você, que se lamenta, repare que NEW YORK ainda expressa... (3) O caso irlandez, caso alguem o troque por Russia, por Hespanha ou por Turquia, está sempre na pauta. Na masmorra os presos continuam. Ha confisco e saque em toda parte. A droga cria polemica. A mulher ainda sente o peso do machismo. Compromisso faltou elle assumir com os civis direitos dos gays, isso sim. Sustenta alguem tal causa? Alguem ja se interessa?

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MANIFESTO FEMINISTA (1/2) [7917] (1) “Tem horas que eu me sinto uma coitada, me culpo, me pergunto o que é que faço, entende, Glauco? Sabe? Eu bem que quiz ser uma feminista! Mas reparo naquellas que idolatro, que eram tão autonomas, as duas! Sim, a Janis, alem da Mama Cass! Uma dizendo, chorosa, que voltava para casa sozinha, sempre, Glauco! Outra que ria, mas era appaixonada pelo Lennon, sabendo que, tão gorda, chance zero teria com qualquer outro rockeiro! Estou desconsolada, Glauco! Addeanta luctar para ser livre, si nos resta appenas solidão, Glauco? Me diga!” (2) -- Entendo, sim, amiga. Porem nada se pode fazer. Pense no palhaço que Lennon foi de Yoko! Ser feliz assim não dá! Ser bruxa sae mais caro! Não acha mais amor haver num cão? Adopte seu bassê! Si ao povo “panis” ja basta, ao bassê basta, como addendo, um osso, um biscoitinho! Mal se attraza você, chora, saudoso! Não seria melhor ganhar lambeijos? No veneno não fique, minha amiga! Feliz quero que seja! Assim, dispense o perdigueiro, o beagle, mesmo o cocker! Veja quanta ternura num bassê, quando faz festa! Melhore seu astral! Que diz, amiga?

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MANIFESTO DIVISIONISTA (1/2) [7957] (1) “Não curto o Lennon, não. Sou mesmo louca é pelo Macca! Sabe, Glauco? Os dois brigaram! A favor eu sou da Linda, jamais da Yoko! Nisso por fallar, tractando-se de Beatles, lhe pergunto: Das duas, qual é, Glauco, a melhor banda discipula? Responda neutramente: Badfinger ou Raspberries? Fallar ouço que Lennon foi Raspberries, mas o Macca curtia mais Badfinger! E você?” (2) -- Magina! Curto as duas! Acho pouca, na musica, a importancia de nos bois dar nomes como “oppostos”. Mais ainda: Teem ambas repertorio singular, melodico, opulento. Nesse assumpto vantagem só dou mesmo a quem mais manda na voz, pois Eric Carmen evidente seu tymbre tem do Macca. Calabouço mental é desprezar quem se destacca mais nisso ou mais naquillo. Cê não vê?

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HISTORIA DO ROCK (1/5) [8014] (1) Dos hippies a polemica verdade applica-se à rockeira trajectoria. Com annos mais de trinta ninguem é por elles respeitado, siquer digno dalguma confiança. Assim eu vejo o proprio rock’n’roll, si for historia aquillo que queiramos estudar. Olhando friamente, temos trez, de facto, ferteis decadas: cincoenta e cinco até sessenta e cinco, a base. Até septenta e cinco, a plenitude. Mais dez, e oitenta e cinco marca a data final, depois da qual nada se cria. (2) Na phase inicial, pois, ninguem ha de negar que foi dansante essa memoria. Dansante e adolescente, pois no pé marcava-se o compasso que eu defino “emballo de bailinho”, no desejo de quem perde cabaço. A quem adore a sonora trilha disso, “car”, “guitar” e “hold your hand” bastavam, nesse inglez “teenager”, para alguem que adulto tenta ser, mas não quer crescer. Foi nessa phase que, de Elvis até Beatles, juventude vendeu-se. De politica não tracta a lettra, nessa analyse mais fria.

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(3) De Dylan, “Like a rolling stone” edade maior ao rock empresta. Si illusoria, utopica a mensagem, pode até alguem pôr em questão, mas ja menino não era aquelle joven, pois ensejo havia para a droga que melhore a astral visão de mundo, que estellar não é só por de “star” ser o burguez projecto dalgum idolo da attenta platéa psychodelica. Que em paz e amor accreditasse, eu ca não pude dum joven duvidar. Àquella natta pertencem Janis, Byrds e companhia. (4) Nos annos “progressivos”, que me aggrade ha muito no rockão. Maior a gloria foi delles, do Led Zeppelin, que fé merescem. Queen e Stones vaticino que fiquem, com Deep Purple e Yes, varejo deixando para um Creedence e, na escoria, a turma dos Ramones, no logar depois mais occupado por quem fez podreira tribalista nos oitenta. Não ha canção mais typica que case com esse aureo periodo, nem que grude mais nessa geração que “Changes”, chata a alguns, mas verdadeira allegoria.

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(5) Deixou-nos David Bowie tal saudade, pois phases encarnou. Quem rememore a questão, depois de Smiths outro filé não acha no chardapio. Ja termino aqui, pois com os Wilburys bocejo de tedio. Os revivaes são transitoria versão do que virá reaffirmar o grunge: recyclagem ja vocês percebem que se expalha pela lenta virada do millennio. Agora quasi mais nada resta, alem dessa attitude rebelde e saudosista, que bravata fez duma breve e fragil utopia.

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THE SINGER NOT THE SONG (1/2) [8046] (1) Às vesperas da morte, Lennon ja vivia amargurado. Morreria bem menos conformado caso não à balla assassinado fosse. E qual seria a causa disso? Não, nenhum biographo me disse, mas em sonho fiquei sabendo. Tinha ardente inveja do Macca, pela musica que tanto famoso cantor negro gravou deste. Ray Charles, “Yesterday”, “Eleanor Rigby”, e Stevie Wonder, “We can work it out”. “Hey Jude”, Wilson Pickett excolheu. Gravou “Lady Madonna” Domino. Daquelle nenhum idolo quiz nada, siquer quiz o Sinatra, que gravou do George qualquer outra canção bella. (2) Lhe disse eu em espirito: {Não ha motivo para tanta guerra fria, pois tu não precisavas ficar tão mordido. Que tu foste genial concorda toda a critica. Commum é vermos tuas lettras, eu deponho, nas aulas estudadas. Va que seja pretexto o teu nonsense um tanto infanto ou quanto juvenil, mas recebeste de todos a attenção. Ninguem se inhibe, por tua causa (caso alguem nos paute um thema abstracto, onirico), de em teu nonsense te seguir. Precisas só notar que Mama Cass, illuminada que foi, “I call your name” ja cantou, e nunca alguem cantou-te que nem ella.}

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LOVE YOU LIVE (1/2) [8086] (1) {Achaste, Glauco, graça na sessão de photos que, descalços, flagra os Beatles? Pois digo-te que os proprios Rolling Stones flagrados foram numa bem mais quente sessão, por Andy Warhol, que não quiz appenas pés descalços, mas que fossem mordidos! Sim, mordidos! Ja pensaste, Glaucão? O pé do Jagger ou do Keith, em close, na dentada do Ron Wood? Irias delirar, si tu pudesses ver isso! Mas só podes suspirar de tedio ou frustração… Como te sentes?} (2) -- Frustrado não me sinto tanto, não. E sabes por que? Nunca de taes mythos estive perto. Caso me abbandones, ahi, sim, ficarei mui descontente. Espero, pois, meu caro, que feliz me faças. Nem pedir vou que te rocem meus dentes o dedão. Basta que eu gaste saliva nessa sola. Que deleite! Assim descomptarei o que não pude fazer nalgum rockeiro… Minhas preces tu podes attender! Teu calcanhar, teu dorso, teu mindinho… nos meus dentes!

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INFINITILHO MOLHADO (1/2) [8127] (1) {Odeio os novos jovens, Glauco, odeio! Dos jovens mais antigos, que nos são tambem contemporaneos, raiva tenho por causa do rockinho vagabundo que escutam, differente do da gente, que sabe distinguir o que de bom o rock offeresceu… Glauco, você tambem odeia aquelle novo joven? Nem rock escuta, raios! E nem dá direito p’ra saber que porra aquillo seria! Acho que nome isso nem tem!} (2) -- Talvez se chame funk, axé, mas creio que este comprimidinho sensação mais calma lhe trará. Sei que ferrenho fanzão você dos Beatles foi. Segundo meu senso, ouvir podemos longamente o RUBBER SOUL, que tal? Assim do som dos jovens actuaes nem tem porque você ter odio. Os nossos sons ja chovem, por si, nesse molhado blablablá. Sossegue, meu amigo. Bem tranquillo estou, que peor coisa ainda vem.

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RHAPSODIA LENNONIANA (1/2) [8397] (1) {Direito de fumar, Glauco, o comparo à propria liberdade de ir e vir! À livre excolha, até, de respirar! Assim fallou John Lennon quando quiz luctar por John Sinclair, que tinha sido culpado de fumar, ou de portar, ja nem me lembro, um par de baseados… Aquillo que de facto tem razão o Lennon de dizer é que ninguem ser preso pode pela sua plena e livre preferencia por um typo de gaz ou ar que queira pela venta sugar ou, como dizem, inspirar! Tem duvida você nessa questão?} (2) -- Nenhuma. Mais exotico ou mais raro que seja qualquer habito (ou convir que seja vicio posso), nenhum ar, nem vento, nem vapor, esse infeliz poder da caretice conseguido terá nos prohibir de desfructar. O mesmo vale para alguns calçados fedidos, para as meias, o pezão que calça taes fetiches, si quem tem tesão por isso os quer na sua scena. Portanto, dizer devo: participo da causa, mas quem tanto se contenta com hervas tem tambem que tolerar a minha chulepenta devoção…

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BEWARE OF DARKNESS [8510] Não é mesmo uma pena, meu irmão? Por causa da cegueira, aquella scena affavel, familiar, vae de roldão embora pelo rallo! Alguem condemna alguem por pouca coisa! A discussão politica, domestica, pequena, apparta pae de filho, um amigão dos outros amigões! A fina penna se torna venenosa, fica tão sem verve, illitterata! Antes serena, a rouca voz não canta ao coração! Por Juppiter! Necrosa de gangrena um vinculo! Se perde uma nação! Antidoto faltou? Quem se envenena não teme a má memoria, a escuridão? Meu olho até, por ella, mais se drena! Diria George Harrison: Mas não é mesmo uma vergonha? Ah, Zeus, que pena!

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KHORO NO CHORO [8578] Ninguem cantar consegue, assim, chorando: Ray Charles, quando canta “Eleanor Rigby”, Stevie Wonder, “We can work it out”, José Feliciano, em “In my life”, canções que são dos Beatles, mas ninguem cantar assim consegue, como um cego. Consegue Stevie Wonder que até Jagger tambem cante chorando um “I don’t know…”, canção que por mim falla, sem que saibam. Agora vão vocês me dar licença, pois cego sou tambem, mas não consigo cantar, siquer compor, mas chorar vou, ouvindo o que elles cantam para mim.

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MUITO POUCO [8618] “Me exquesço de lembrar de te exquescer…”, cantava George Harrison nos Beatles. Eu acho que me perco si procuro pensar em dispensar a rhyma rica mantendo o decasyllabo, outrosim. Será contradicção? Não vou dizer que seja, mas pensei nisso, não nego. Accabo convencido de que estou à toa questionando o que fazer daquillo que ja faço sem siquer errar, eis que conhesço tudo… ou quasi.

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TRUFFAS DO SAVOY [8700] {Nem ebony, nem ivory!}: é o que diz a dona Deborinha, a tal vizinha que em casa me recebe toda tarde. {O Macca se equivoca, Glauco! Um bello exemplo da harmonia racial do branco com o negro não está tão nitido nas teclas do piano, mas sim no manjar branco, com tamanhas ameixas pretas nessa linda calda! Não acha, meu querido?} Um pedação me serve do manjar, que eu saboreio sem ter o que dizer, de tão gostoso. Mas digo, para appenas não deixar a boa senhorinha sem resposta: -- Sem duvida! Aliaz, o proprio Harrison, si seus puddins provasse, não faria questão tanta das truffas do Savoy…

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REDES SOCIAES [8708] Fofoca agora “fake news” se chama, segundo dona Deborah, que lembra: {O Carlos Imperial, um cascateiro manjado, publicou na VEJA, logo que George, ‘inda nos Beatles, “Inner light” gravou: elles iriam gravar, em seguida, algo do nosso Gonzagão, talvez essa “Asa branca”, que paresce, no rhythmo, com aquelle lado B. Você percebeu isso, né, querido?} De facto, percebi. Mas “cascateiro” tambem equivaleu a “fofoqueiro”, aquillo que Imperial, hoje, seria, na certa, pelas redes sociaes.

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MISS SÃO PAULO TRAVESTIDA [8713] {Não são minhas vizinhas, só, quem tem a lingua venenosa, Glauco! O proprio John Lennon, appós RAM do Paul McCartney, mordeu-se de maneira tal de inveja que fez “How do you sleep”, uma canção eivada do maior rancor, à qual o Macca respondeu com “Dear friend”, que indaga do que Lennon tem tal medo. Não pense, Glauco, que eu não idolatro o Lennon… Mas que culpa tem o Macca si John não foi capaz, na phase solo, de ter sonoridade egual àquella dos Beatles, que no RAM Macca alcançou?} Ouvindo dona Deborah fallar, mais nada accrescentei. Endosso tudo. Despeito, gente, é foda, ja diria o Mario quando Oswald o rotulou de nossa Miss São Paulo travestida.

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KOSMICAS DIVAGAÇÕES [8925] “Mamãe, não va! Papae, venha p’ra casa!”, cantava Lennon, sempre em seu umbigo focado. Mas a minha mãe não quiz sahir de casa, nunca, nem meu pae. Appenas eu sahi. Sinto-me fora de tudo. Nunca achei que pertencesse a algum logar, a alguem. Siquer a mim de corpo pertenci, nem mesmo d’alma. Me sinto universal, mas sem planeta natal, sem nem satellite em que possa morar eternamente neste kosmo. Pergunto-me: Fui cego, fiquei cego em outras vidas? Cego nascerei nas proximas? Visão tem importancia na vida de qualquer extraterrestre? De toda forma, as cores eu guardei, bem nitidas, na mente e, emquanto penso que posso voltar verde, em breve, em Marte, evito pensar muito num vermelho demonio me espetando o cu, debaixo da Terra, azul que consta ser, segundo um russo kosmonauta cancellado.

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BEATLEMANIACO? [9353] Você, na adolescencia, Glauco, usou aquellas taes botinhas que dos Beatles o typico desenho copiavam? Lambeu a propria bota, até, suppondo que fosse, não dum Beatle, mas dum fan ainda mais fanatico, com pincta, cabello, rosto joven e risonho? De facto, somos ambos, menestrel, da mesma geração de botinudos…

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SECUNDARIO? [9356] Você que, no gymnasio, reparava nos pés da molecada, não notou que estava aquella moda começando? A moda das botinhas typo Beatle! Nem todo mundo usava, pois a grana faltava, mas usei uma daquellas, Glaucão! Ah, que tesão eu tinha quando alguem os olhos nunca conseguia tirar da minha bota! Si você cruzasse, então, commigo, certamente teria me lambido os pés, Glaucão!

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ULTRAPASSADO? [9544] Ja disse George Harrison um dia: Hontem, hoje, Glaucão, era ammanhan! Da mesma forma, disse ‘inda: ammanhan, ja hoje será hontem, menestrel! Portanto, meu amigo, um blimblom para você! Pare de estar nesse passado!

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TERRENO REVOLVIDO? [9606] Não, nada disso, Glauco! Os Beatles foram perfeitos! Não admitto que ninguem questione si tal phase foi melhor, si falta alguma coisa no legado deixado pela banda, tal e coisa! Quem falla ssim meresce levar… Sabe o que, Glaucão? Um chute na cannella! Va a cova revirar dos Rolling Stones!

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EVE OF CONSTRUCTION? [9607] Não, nada disso, Glauco! Os Rolling Stones não foram mais briguentos, nem siquer mais conscios duma causa social! Mentira deslavada! Cada Beatle deixou a sua marca nessa lucta dos jovens contra toda a caretice! Quem falla mal dos Beatles, para mim, não passa dum… dum… chupa-rolla desse boccudo, desse Jagger, um… veado!

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FUNDAMENTAL? [9966] De rock entender, Glauco, não será jamais fundamental! Mas entender de musica symphonica, ah, Mattoso, é coisa de importancia bem maior! Verdade? No REVOLVER elles usam orchestra? Ah, vou ouvir! Si for verdade, nos Beatles passarei a crer, Glaucão!

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CONTRACULTURAL? [9967] Sargento? Que sargento? Não ouvi fallar desse sargento, o tal Pigmenta! Dos Beatles foi um album? Mas quem são os Beatles, menestrel? Novos funkeiros? Rapeiros? Sertanejos? Forrozeiros? Ouvir, eu não ouvi, mas ja gostei si drogas forem thema desse disco! São? Porra, agora mesmo ouvir irei!

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SUMMARIO DISSONNETTO CHAPMANIACO [0163]................. 9 DISSONNETTO TRIBUTARIO [0312]................. 10 DISSONNETTO BEATLEMANIACO [0353].............. 11 CONTO RECIPROCADO [0499]...................... 12 DISSONNETTO MORTAL [0959]..................... 13 DISSONNETTO FUNDAMENTAL [0966]................ 14 DISSONNETTO CONTRACULTURAL [0967]............. 15 DISSONNETTO MARCIAL [0970].................... 16 DISSONNETTO DO ROCK PAMPHLETARIO [1380]....... 17 DISSONNETTO DO CONTRA [1505].................. 18 DISSONNETTO PARA A UTOPIA PACIFISTA [1940].... 19 DISSONNETTO PARA O GRUPPO CREEDENCE CLEARWATER REVIVAL [2381]................................ 20 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE BYRDS [2383].... 21 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE MONKEES [2385].. 22 DISSONNETTO PARA O GRUPPO JEFFERSON AIRPLANE [2427].. 23 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE ROLLING STONES [2430].. 24 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE RASPBERRIES [2431].. 25 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE HOLLIES [2442].. 26 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE MOVE [2462]..... 27 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE GANTS [2476].... 28 DISSONNETTO PARA O GRUPPO THE KINKS [2481].... 29 DISSONNETTO PARA JOHN LENNON [2521]........... 30 DISSONNETTO PARA PAUL McCARTNEY [2522]........ 31 DISSONNETTO PARA GEORGE HARRISON [2523]....... 32 DISSONNETTO PARA RINGO STARR [2524]........... 33 DONA DE OCA CONNA [4835]...................... 34 REVOLVENDO O TERRENO [5606]................... 35 EVE OF CONSTRUCTION [5607].................... 36 DE PYJAMA NA CAMA [5645]...................... 37 BOB FIRMINO [5680]............................ 38 MACHINA DO TEMPO [5940]....................... 39 MISCELLANEA ROCKEIRA [6038]................... 40 YOU LOOK LIKE A GIRL [6168]................... 41


FUNEBRES BREUS [6790]......................... 42 COME TOGETHER [6793].......................... 43 WHY CAN’T WE LIVE TOGETHER [6834]............. 44 FILA QUE AFFUNILA [6876]...................... 45 THERE’S NO TIME [7142]........................ 46 MANIFESTO SAUDOSISTA (1/3) [7916]............. 47 MANIFESTO FEMINISTA (1/2) [7917].............. 48 MANIFESTO DIVISIONISTA (1/2) [7957]........... 49 HISTORIA DO ROCK (1/5) [8014]................. 50 THE SINGER NOT THE SONG (1/2) [8046].......... 53 LOVE YOU LIVE (1/2) [8086].................... 54 INFINITILHO MOLHADO (1/2) [8127].............. 55 RHAPSODIA LENNONIANA (1/2) [8397]............. 56 BEWARE OF DARKNESS [8510]..................... 57 KHORO NO CHORO [8578]......................... 58 MUITO POUCO [8618]............................ 59 TRUFFAS DO SAVOY [8700]....................... 60 REDES SOCIAES [8708].......................... 61 MISS SÃO PAULO TRAVESTIDA [8713].............. 62 KOSMICAS DIVAGAÇÕES [8925].................... 63 BEATLEMANIACO? [9353]......................... 64 SECUNDARIO? [9356]............................ 65 ULTRAPASSADO? [9544].......................... 66 TERRENO REVOLVIDO? [9606]..................... 67 EVE OF CONSTRUCTION? [9607]................... 68 FUNDAMENTAL? [9966]........................... 69 CONTRACULTURAL? [9967]........................ 70



São Paulo Casa de Ferreiro 2023




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