DIA DO MUSICO

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DIA DO MUSICO



Glauco Mattoso

DIA DO MUSICO

E OUTROS SONNETTOS

São Paulo Casa de Ferreiro


Dia do musico © Glauco Mattoso, 2024 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros ______________________________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA ______________________________________________________________ Mattoso, Glauco DIA DO MUSICO E OUTROS SONNETTOS/Glauco Mattoso São Paulo: Casa de Ferreiro, 2024 112p., 14 x 21cm CDD: B896.1 - Poesia 1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.


NOTA INTRODUCTORIA A cada novo livro, me questiono accerca do que posso compor como prefacio si, na practica, só sommo sonnettos e sonnettos collecciono. Digamos que eu não diga que num throno sentei do sonnettismo, mas que eu domo o verso decasyllabo, pois tomo logar de quem se torna meu patrono. O posto que, na nossa Academia, exalta Antonio Lobo de Carvalho exige que eu me exmere em ironia. Nem só de prazer vive meu trabalho, emfim, eis que quem antes tudo via ja nada vê. Tambem à dor eu calho.



DIA DA “EIAI” NUM “AUAU” Ouviu fallar, Glaucão? Que intelligente maneira de estudar o que é que falla o nosso cachorrinho! Não se estalla o dedo, mais! Fallemos como gente! Os bichos nos entendem! Sim, não tente ninguem assobiar, alli na salla, nem dar tolos commandos que algum “mala”, mettido a addextrador, em vão invente! Teremos que entendel-os e fallar com elles claramente, coisa que essa veraz programmação torna vulgar! Expertos são os bichos, cara, à bessa! Tomara que não queiram disfarsar aquillo que entender vamos depressa!

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DIA DO REPUDIO AO TERRORISMO Eu fico dividido na questão! Dum lado, torço para que o judeu se ferre em Israel! Mas tambem eu desejo ver judeus sem compaixão! Sim, quero os terroristas ver, na mão dos homens de Israel, sentirem seu cuzinho se rasgar, alem do breu nos olhos, que cegados ja serão! Por isso me divido: quanto mais chacina terrorista se fizer, mais vingam-se elles desses animaes! Hem, Glauco? Sanguinario sou? Mulher, creança, adulto, joven, filhos, paes… Da vida, assim, me vingo, si puder!

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DIA DO ESPECTACULO DE BALLÉ Está vazio o palco. Uma só luz focada fica sobre quem accaba de entrar: o cego, deante duma braba platéa. A luz, aos poucos, se reduz. O cego, bengalando, não faz jus à fama de quem dansa. Alguem lhe gaba os dotes e, no palco, uma diaba vae delle tomar posse, dando um plus. Não pode ser diabo, pois tamanha é sua agilidade, que nenhum chifrudo tão veloz impulsão ganha. Ballé findo, uns applausos dão commum retorno, mas ninguem alli se accanha de achar melhor ouvir um preto assum.

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DIA DO NECROLOGIO Fallesce este illustrissimo portento, que sempre compaixão teve com quem pedisse, da mamãe com seu nenen aos mais desabrigados, ao relento. Sim, essa morte eu claro que lamento, pois sua fama à mente logo vem. Do honesto cidadão se lembra alguem com nitida tristeza, no momento. Sapatos engraxou, ‘inda menino. Os paes ja sustentava, adolescente. Adulto, ouro comprava, do mais fino. Não pôde ser eleito presidente, mas, como um direitista genuino, junctava, no Congresso, muita gente.

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DIA DO OBITUARIO Fallesce este bandido violento, que nunca teve pena de ninguem. Foi elle cavallar desde nenen, ferindo os paes em cada movimento. Não, essa morte eu nunca que lamento, pois sua ficha à mente logo vem. De cada afflicta victima ou refem os traumas nem lhes narro no momento. Mactou para roubar ‘inda menino. Mulheres estuprou, adolescente. Adulto, ouro ganhou como assassino. Não pôde ser eleito presidente, mas, como um direitista genuino, comprava, no Congresso, muita gente.

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DIA DO ADDEXTRADOR CONSCIENTE Achar que intelligentes nós sejamos, accyma dos bichinhos, está dando mais panno para mangas! O commando que damos não os “treina”, convenhamos! Ao cão que só obedesce, somos amos. Mas, quando um basset teima, nós, teimando, dizemos que elle é “burro”. Porem, quando faz isso, o cão se impõe por seus reclamos. Basset que desaccapta não é bobo! Está manifestando opinião! Portanto, tão experto é quanto um lobo! Aquelle cão robot, tão manso, tão “treinado”, esse que é burro! Sendo um probo subjeito, reconhesço tal questão!

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DIA DO XADREZ Um genio do xadrez sou, trovador! Na cella, apprendi rapido! Domino os lances duma torre e ja combino com bispos e cavallos, sem pudor! Um bispo me visita, ha de suppor você! Lhe dou razão! Sim, fui menino do padre, menestrel! É meu destino pagar pena maior, só pela cor! Não gosto do xadrez, porem! Prefiro jogar, si estiver solto, um dominó, um lance com as damas, num retiro! Mas quando, em liberdade, estiver só, na falta dum bom alvo para tiro, me sirvo dum ceguinho! Sim, sem dó!

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DIA DAS VICTIMAS DO TRANSITO Não tive culpa, Glauco! Si charteira nem tenho, como posso saber disso? O carro desviou no allagadiço asphalto! Não direi que fiz besteira! Mas, Glauco, quem mandou, alli na beira da praça, aquelle povo do cortiço ficar parado? Um tempo desperdiço freando? Nem pensar! Jeito maneira! Passei por cyma, Glauco, dessa gente todinha! Mas problema não terei, pois fica a auctoridade indifferente! Si eu fosse de maior, ahi nem sei que pena pegaria! Quem se sente de lucto que se vire com a lei!

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DIA DO TENNIS DE MESA Jogando pinguepongue estava aquella putinha que é podolatra, Glaucão! Conhesce? Sim, a propria! Pois então! Cheguei e me sentei, não longe della! Você sabe, essa puta não é bella, mas chupa que só vendo! Ja a attenção tractei de lhe chamar, pondo o pezão na mesa, bem à moda da favella! Assim que viu meu tennis encardido de sola a ella, appenas, dirigida, ficou perturbadissima, querido! Parou de jogar, louca, ja, da vida e veiu se chegando! Só convido que lamba, a puta acceita! Alguem duvida?

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DIA DO HOMEM Não quero nem saber, Glaucão, si estão da prostata fallando! Minha data eu quero que respeitem! Não se tracta de esmolla, nem siquer consolação! Mulheres se empoderam! Por que não os homens? Hem, Glaucão? Acho que empatta! Nem venha me citar aquella chata actriz, a feminista de plantão! Diz ella que machões logar de falla não podem ter, por causa duma antiga historia de oppressão! Mas vou pegal-a! Que venha a mulherada minha amiga aqui me defender, porra! Quem galla me engole, em militancias não se liga!

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DIA DA MULHER EMPREHENDEDORISTA Aquillo que qualquer doceira sonha farei eu, Glauco! Claro, sou experta! A sua amiga aqui na mosca accerta: Vender vou meus docinhos de maconha! Ninguem pensara nisso! Que vergonha! Precisa alguem ter mente mais aberta! Bastou eu collocar isso em offerta e espero mais vender do que pamonha! Você consumiria a minha linha de ludicos confeitos, né, querido? Inveja até ja causo na vizinha! Teem ellas olho gordo! Não duvido que queiram me imitar! Uma ja tinha fallado num biscoito colorido!

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DIA DO CHORDELISTA Talvez “litteratura de bordel” devesse se chamar a tua lyra, Glaucão! Até que encontro quem prefira chamar de “bordelismo”, menestrel! Emquanto tu fazias, em papel barato, taes folhetos, não admira que disso se fallasse! Mas mentira será dizerem, hoje, que és fiel! Teus versos ja sahiram como zine, jornal, revista, até como brochura bonita, das que esnobam na vitrine! Sonhavas tu, Glaucão, com cappa dura, papel biblia, talvez? Nem se imagine tal coisa! Algum ebook é ja fartura!

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DIA MUNDIAL DO BANHEIRO Cagar, todos cagamos, menestrel! Appenas, pelo mundo, o que varia é o typo de privada, de bacia, de vaso, dum modello mais fiel! Alguns usam jornal, outros papel sedoso, bem mais caro! Mas seria possivel distinguir, em theoria, que typo de cocô tem um miguel? Os ricos, por acaso, cagam molle? Os pobres cagam duro? Não sou crente! Não creio, com certeza, que isso rolle! Por vezes, minha merda differente paresce, dependendo do que engole, na marra, a minha bocca, ainda quente!

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DIA DA BANDEIRA Usar verdes roupagens, hoje em dia, mais nada representa. Amarellinha, a nossa camiseta não allinha ninguem, nem mais irmana, nem allia. Azul ainda a bolsa alguem confia que esteja, mas a margem é mesquinha de lucro. Um tom mais branco nem na minha cueca acho que exsista. Deveria? Camisa do Palmeiras? Va que seja bem verde! Si perder, evito usar. Mas mancha amarellada… Ah, si sobeja! No dia da parada militar as cores andam junctas. Quem corteja golpistas tem a chance de sonhar.

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DIA DA AUTO ESCHOLA Glaucão, me dá até medo quando vejo um carro que é de eschola! A qualquer hora um desses, sem os freios, collabora com mais um accidente no varejo! Um dia vi, no meio dum cortejo de enterro, um desses carros! Sem demora, sahi dalli! Não é que, rua affora, o carro põe à prova seu mollejo? Um engavetamento provocou, ainda attropelando, de lambuja, a turma do passeio! Horrivel show! Coitado, meu, daquelle que não fuja a tempo dum vehiculo que, estou sabendo, nem um tanque sobrepuja!

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DIA DE COMBATTE AO ABUSO INFANTIL Abusam das creanças? Certamente! Estupram, prostituem! Videos grava quem vende pelas redes! Mas estava na hora de tocar num poncto quente! Abusam as creanças, sim, da gente, tambem! A creançada, antes escrava dos paes, agora lucta brava trava com todos os adultos pela frente! Você, Glaucão, é boa testemunha, pois sabe como os cegos são currados por essa molecada! Quem suppunha? Sozinho bengalando, ouvindo os brados selvagens dos meninos, uma alcunha você ganhou, Chupão, desses tarados!

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DIA DA CONSCIENCIA NEGRA Quem tenha amigos negros pode, sim, brincando, de macacos os chamar, de escravos, urubus… Nenhum logar de falla cobrarão elles de mim! Então, por que me cobra você? Vim ouvindo a vida toda, alli no bar, as mesmas piadinhas! Linguajar é, Glauco, bem normal! Não é ruim! “Racismo cordial”? Não, “cordial”, appenas, Glauco! Ou diga que é “zoeira amiga”, à “zoação total” egual! Não, Glauco! Censurar você não queira meu jeito de tractar amigos! Mal tambem me tractam! Mera brincadeira!

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DIA DO REENCONTRO DE RAÇAS Faz tempo que informado não sou, cara, daquelle cachorrodromo onde tanto bassê ja se encontrou! E, por emquanto, noticia ninguem teve! Quem repara? Você não sente falta? Attente para as photos! Tem saudades, eu garanto! Hem? Vamos reviver aquelle encanto? Aos outros o bassê nem se compara! Nem beagle, nem siquer um bulldoguinho francez, siquer um cocker, tem a graça daquelle salsichão pelo caminho! Mas podem conviver, aqui na praça, si formos recordando, com carinho, das nossas emoções! O tempo passa!

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DIA DA CULTURA HIP HOP Passou, Glaucão, o tempo dos negões dansando os passos typicos da sua cultura, alli da praça, alli da rua! Agora formam elles multidões! Exigem seus direitos e, mandões, no sadomasochismo teem a crua noção de serem mestres! Quem actua no meio ja lambeu esses pezões! Você não teve, Glauco, sua chance? Mas é “socialmente consciente” e pode reparar isso! Descanse! Conhesço um rapper, Glauco, um typo “fancy”, que irá se “desforrar” de você! Tente fazer o que elle manda! Aguente! Danse!

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DIA MUNDIAL DA CREANÇA Será doze de outubro? Sim, aqui! No resto deste nosso mundo, não! Foi isso o que disseram (Tá, Glaucão?) em todas as noticias que eu ouvi! Sim, fallam dos pedophilos! Mas, si mais factos pesquisarem, notarão que muitos “de menor” fazem questão de serem, dos adultos, quem mais ri! Você bem sabe como uma creança tortura, si puder, alguem que seja mais velho ou indefeso, sem tardança! Celebrem! Mas se lembrem da cereja no bollo! Quando um fracco ou frouxo dansa a seus pés, elles chutam quem rasteja!

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DIA DO BIOMEDICO Piccada de tarantula? Ah, menino! Nem queira saber como nos tortura! Alem, porem, daquella creatura feroz, outras aranhas imagino! Maior caranguejeira ainda vi no fundão la da Amazonia! Quem procura achar vae a Golias! Mas é pura bobagem pensar nellas, eu previno! Aranhas bem menores teem veneno capaz de mactar rapido! Mas nessa peçonha vi, de curas, um acceno! Ja, Glauco, pesquisei peçonha à bessa! À parte essa phobia, sou quem crê no poder de tal veneno, uma promessa!

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DIA DO AUDITOR Fiz uma auditoria, Glauco, nessa empresa que falliu. Você precisa ver quanta falcatrua que essa lisa cambada commetteu! Cagada à bessa! Ballanço nem fizeram, não, que meça um rombo desses! Nada suaviza a raiva dos credores, que de brisa não vivem! Mas quem é que se interessa? A midia faz escandalo, mas basta passar um certo tempo! Uma borracha será passada nessa acção nefasta! Hem, Glauco? O que você das comptas acha dos cynicos gestores? Quem affasta hypotheses de termos nova taxa?

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DIA DA SABBATINA ARGENTINA Alguem conclama “Viva a liberdade, caralho!” na campanha da Argentina e todos acham lindo. Uma ladina senhora diz que nada a persuade: {Glaucón, soy peronista!} Tem edade, ja, para conhescer, nesta Latina America, a persona à qual se inclina qualquer caudilho, pela auctoridade. Peron contemporaneo foi daquillo que muitos abominam: a direita fascista, que chegou a seduzil-o. Agora, na Argentina, a turma acceita que seja “peronista” algum estylo de esquerda, de direita, qualquer seita.

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DIA DA DESCONFIANÇA Glaucão, ja declararam que perigo não ha, que isso não pode succeder! Alguma garantia, p’ra valer, ninguem pode esperar, é o que lhe digo! Disseram que eu não tema! Ah, não! Commigo não, Glauco! Ninguem tem esse poder! Apposto que elles trollam, por prazer, comnosco, como forma de castigo! Alguma auctoridade sempre sae com essa, de que nunca vae rollar! Mas, quando falla assim, é porque vae! Conhesço por demais o linguajar dos gajos, pois alguem sempre se trae, achando que no cu não va tomar!

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DIA DA MATURIDADE Quem é que te será mais immaturo? Quem é que mais está despreparado? Quem tenha mais futuro que passado? Quem tenha mais passado que futuro? Eu posso dizer: sinto-me inseguro, embora bens ja tenha, antes, herdado e esteja com sahude. Meu estado geral é bem normal, fora algum furo. Meu netto, todavia, ja se queixa de morbida anxiedade e insegurança! Mas elle, em seus cuidados, não desleixa… Quem é mais problematica? A creança que fui ou a pessoa que sou? Deixa p’ra la, pois quero, mestre, encher a pança!

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DIA DA PERDA DE COMPOSTURA Bem feito! Se fodeu! Quebrou a cara! Perdeu o rebollado! Do cavallo cahiu! Sahiu seu ouro pelo rallo! Seu lado deshonesto se excancara! Bem feito! Foi mandado o cara para a puta que pariu! Tambem mandal-o à merda ja quizeram! Eu egualo a sua cara a alguem que vira arara! Que xingue! Que experneie! Que reclame! Tambem eu mandarei tomar no cu um cara assim canalha, assim infame! Jamais um palavrão será tabu si serve p’ra augmentar o seu vexame! Quem manda ser politico? Sifu!

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DIA DA FALTA DE DECORO Bem feito! Se fodeu! Tomou no rabo! Quebrou a cara! Agora à merda vae! Quem manda ser politico, ser pae da patria? Ja seu nome está no cabo! Bem feito! Que se foda! Abra ao Diabo seu rego! Que ninguem ouça seu ai! Ladrão! Bundão! Cusão! Por que não cae um raio nesse encosto, um raio brabo? Quer esse fidaputa revidar aquillo que xingaram? Que revide! Que perca a discussão parlamentar! Bem sei que raramente se decide cassar algum mandato, mas vou dar ainda mais risada, não duvide!

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DIA DE USAR CHINELLO Discute-se si pode ser usado, alem do mais domestico borralho, tambem num ambiente de trabalho formal, onde o gerente é engravatado. Tem gente que detesta, por um lado, alguem que, desleixado, seu caralho por baixo da bermuda, bem bandalho, exhibe sem cueca, si excitado. Por outro lado, o pé desse subjeito folgado, num chinello vagabundo, sem meia, mostra as veias do seu peito. Attrae, sim, a attenção de todo mundo, mas ‘inda tem, erotico, um effeito occulto no patrão, bem la no fundo.

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DIA DE USAR GRAVATA Gravata, quando usada num local formal, tem cabimento, ninguem nega. Quem veja aquella chique num collega inveja terá. Tudo bem normal. Mas, quando, neste clima tropical, usar gravata fica muito brega, a gente vê que mal demais ja pega na rua, sob um sol que nos faz mal. O gajo, num calor que de quarenta ja passa, ainda a accerta, appertadinha, no duro collarinho! Quem aguenta? Em casa, suadaço, se encaminha ao banho. Uma cueca fedorenta de mijo, no chão, nunca foi branquinha.

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DIA DE USAR TENNIS O tennis, si é de griffe e custou caro, a gente, em sociedade, ja tolera, fingindo que o mau gosto se supera por causa do dinheiro, fica claro. Mas, si elle estiver sujo, eu ja reparo na hora! Finjo nojo mas, à vera, por dentro o meu thermometro se altera e ponho-me em allerta com meu faro! Ahi, Glaucão, presinto que esse tennis chulé terá por dentro, forte, intenso, tornando os meus instinctos mais infrenes! Por pouco, desse cara, aquelle immenso pezão alli não lambo! Não condemnes, Glaucão, si eu, enrustido, nisso penso!

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DIA DE USAR OCULOS Um fundo de garrafa, Glauco, usei mas hoje nem preciso. Operação exsiste de myopia. Você não sabia? Bem, com parte ‘inda fiquei. As lentes de contacto, hoje ja sei, resolvem com vantagem a questão. No caso do glaucoma, não estão os caras nem ahi. Quem tem é rei. Mas oculos escuros, ao ceguinho, alguma serventia teem. Quem vê ja sabe quem se exgueira no caminho. Melhor é de zoar, como você fallou. O cego chupa direitinho a gangue e perde as lentes no rollê…

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DIA DE USAR BOTA Eu sempre estou de tennis, Glauco, mas às vezes uso bota. Algum cliente me pede, implora, para que eu lhe tempte um vicio de podolatra, fugaz. O gosto delle é ver-se, dum rapaz, debaixo dum solado que se sente bem aspero na lingua. Assim, a gente de tudo, para aggrado delle, faz. Lhe piso, melhor digo, pisoteio o corpo todo, o rosto, sem ter pena. Até que um joven sadico me creio! Você diz que tem, Glauco, delle plena inveja? Ah, meu querido! O preço cheio nem cobro, si você somente enscena!

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DIA DO ESCRIPTOR BOYCOTTADO Fiquei sabendo, Glauco, que você está sendo, de facto, ostracizado! Deu ordens para tanto, de seu lado, alguem da Companhia, ja se vê! Tambem na Academia, na TV, no radio, nos jornaes, alguem tem dado a dica: “Aquelle cego, não! Tarado, pornô, gay! Foge muito do clichê!” “Não seja convidado para nada! Não seja premiado, nem menção receba! Seu condão nos desaggrada!” “Tem obra muito vasta! Pantheão nenhum comporta tanto! Vae que invada as redes, viralize! Eis a questão!”

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DIA DA HOMEOPATHIA “Similia” que “similibus curantur” é coisa para alguem accreditar de livre excolha, Glauco! Um popular remedio que se vende em todo cantho! Tem para caganeira, que eu garanto, tem para algum problema vascular, tem para quem não pode mais trepar, tem para, até, cegueira! Ja vi tanto! Vi cegos que enxergavam de repente, tomando uma só pillula, Glaucão! Você duvida? Ah, peço-lhe que tente! É mesmo? Ja tentou? Ficou cagão alem da compta, mestre? Mas vidente ainda não? Você que disse, irmão!

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DIA DA TELEVISÃO Sonhei, Glaucão, com ella! Sim, com ella! Com Hebe! Hebe Camargo! Ocê queria tambem sonhar com ella? Ah, foi? Um dia sonhou? Foi pesadello? Que esparrella! Não gosto nem de filme, de novella, nem nada! Mas, no tempo della, havia um charme na TV! Que sympathia! Que encanto! Hoje ninguem mais se revela! Você boa lembrança não tem? Só porque do seu romance ella fallou mal, Glauco? Ora, querido, tenha dó! Ganhou repercussão boa no show daquella grande dama, aquella avó de todas, e chiou? Tolo não sou!

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DIA DA PESCA Os cheiros, no mercado, são mixtura do fresco com o podre. Não se queixe você dalgum peixeiro que desleixe si baixo preço for o que procura! Sim, quanto mais podrão, melhor textura a carne tem, Glaucão, daquelle peixe vencido ja faz tempo! Não se deixe levar por hygienica frescura! Depois de fricto, o forte cheiro some! Quem paga tão barato nem se toca com essas coisas putridas que come! Relaxe, Glauco! Venha, na malloca, comer comnosco um peixe que nem nome terá, mas que por outro ninguem troca!

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DIA DO MUNICIPIO “My little town” é minha pequenina cidade, quando canto um rock experto. Em outra, que é “small town” e fica perto da minha, alguem, cantando, desaffina. Mas, seja bom cantor ou não, termina fallando dum oasis no deserto. Ninguem accreditar irá, por certo, naquillo que enaltesce quem opina. O gajo sae dum pobre villarejo que nunca deixará a menor saudade, tentando ver concreto o seu desejo. Successo, caso tenha, ninguem ha de notar que, na canção, sem nenhum pejo, é “linda” a villa? A mim, não persuade!

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DIA DAS MONJAS DE CLAUSURA Fallou, da Madragoa, aquelle Lobo famoso das putissimas freirinhas. Eu duvida não tenho disso. Minhas questões aqui são outras. Não sou bobo. Conhesço um cidadão que se diz probo mas, como cafetão, as ladainhas do ramo manja. Sabe das mesquinhas manias dessas monjas, pelo globo. As lusas cobram caro uma chupeta. Estão as hespanholas callejadas de tanta lambidella na boceta. Ja todas, pelo mundo, são taradas por uma colleguinha que commetta as mesmas putarias, mas privadas.

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DIA DO MUSICO Glaucão, o meu bassê sabe tocar piano! Não, piano percussivo, não! Elle nunca toca rock ao vivo! Piano de verdade, sem falhar! Da frente suas pattas, devagar, appoia no teclado! Um selectivo criterio tem, à clara! Ahi, revivo Ravel e Debussy no meu radar! Emquanto, uivando, canta affinadinho, as pattas, ao acaso, cada nota desenham! Só na mente, eu as sublinho! É, Glauco, de vanguarda aquillo! Bota vanguarda nisso! O bicho, direitinho, bem toca, como quem, na rua, trota!

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DIA DE ACÇÃO DE GRAÇAS Não, Glauco, ca não temos o peru, lembraste bem. A data aqui não tem a mesma proporção. Aqui ninguem celebra nada, como observas tu. Alguma gratidão? Nem ao Exu teria nosso povo, ja que, sem dó, serve elle de escravo, de refem… Quem lembra, mandará tomar no cu! Tu dizes que respeito ja não tenho com coisas tão sagradas? Mas tiveste, na verve de teus versos, firme empenho! Xingaste! Praguejaste! Feito peste, desceste nas christans acções o lenho! Sou grato! Não serei quem as moleste!

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DIA DE COMBATTE À IMPUNIDADE Sou mesmo um macho, um alpha! Como posso suppor que minha amada namorada me troque por alguem que não tem nada de macho, cujo penis não endosso? Por causa desse fresco, foi o nosso namoro deschartado na privada! Por isso me vinguei! Me persuada você de não ter feito um justo troço! Alem de ter trepado com a mina, o gajo me comeu, com esse pau minusculo, que folga na vagina! Mactei os dois! Não acho que fiz mau negocio! Ora, quem é que me imagina em canna? Tenho grana! Ahi, babau!

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DIA DO VOVÔ Glaucão, o meu avô tambem ficara ceguinho, mas com elle sempre tive carinho. Bem cuidei, pois quem convive com cegos aos coitados se compara. Sim, sempre tive boa visão, cara! Por isso dou valor. Quem ao declive da vida ja chegou tem, inclusive, maior carencia. A coisa, a mim, é clara. Mas, Glauco, com você foi differente. Você não me suscita pena, só tesão, pois nem siquer é meu parente… Saudade ja senti da minha avó. Saudade, de você, tenho da quente boccarra chupadora. Sem xodó.

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DIA DE COMBATTE AO BULLYING Num filme sobre cegos, bem se nota a alegre distracção da molecada emquanto cerca a victima, que nada fazer pode e soffrer vae sua quota. A victima, no caso, da chacota dos jovens, é mais velha: foi currada e entende que, de novo, vae de cada moleque lamber uma suja bota. O cego, um estudante de internato, bem sabe que esses jovens nem collegas seus são, mas dum collegio não barato. Na rua, se mixturam todos. Bregas canções ouvindo, alem do riso, o chato é que esses querem ver que elle erra, às cegas.

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DIA DA CONSCIENCIA FLUVIAL Os rios da Amazonia, agora, são immensas areas seccas, sem nenhuma navegabilidade, Glauco! Rhuma a coisa para a quasi que exstincção! Emquanto, ca no Sul, as aguas vão subindo sem parar e se costuma dizer que, vez mais cada, a cobra fuma, no Norte passa appuros o povão! Prevejo, Glauco, que essa secca vem alli para ficar e vem, aqui, a chuva! Não excappa mais ninguem! Em breve, beberemos é chichi com gaz numa garrafa, porque, sem gaz, é mesmo um horror! Eu ja bebi!

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DIA DO FIO DENTAL Depois da gengivite, fica a gente allerta. Apprenderemos logo, sim, a passar fio dental. Apprendi minha licção de se limpar, de facto, o dente. De inicio, uma limpeza mais frequente cheguei a practicar com essa linha difficil de enrollar nos dedos. Tinha que estar muito disposto, realmente. Batata! Com o tempo, vou ficando cansado, preguiçoso. Em breve, quando accabo de comer, nem agua bebo. Aquella podriqueira, fermentando, tem cheiro parescido com o sebo da picca, Glauco, facil eu percebo.

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DIA DO ANEURYSMA Depois duma tontura, a gente scisma que possa ser infarcto, ser derrame, emfim, um mal cardiaco, que inflamme as veias, typo um sopro, ou aneurysma! De nada disso entendo! Por um prisma mais leigo, como queira que eu bem chame um caso vascular desses, exame requer, sinão a gente paroxysma! Não goze de mim, Glauco, si confuso estou! Hypochondriaco que sou, num panico tal, entro em parafuso! Descompto, ja mais calmo, eu sempre dou, mas tantos são os pharmacos que eu uso, que ignoro si meu cerebro pifou!

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DIA DE COMBATTE À VIOLENCIA CONTRA A MULHER Na rua a caminhar, a joven sente que está por traz alguem, que chega perto, portando um estylete e, bem experto de pappo, ja ammeaça alegremente. Coitada! Bem conhesce, está sciente das manhas do maluco que, ja certo de impune ficar, joga seu aberto estylo de estuprar, inconsequente. Mas ella, crendo que isso o dissuade, simula agir de cumplice intenção com elle. Eis que esse insano não se evade. Levada ao mattagal, verá que são inuteis os seus berros. Chupará, de joelhos, um cacete ensebadão.

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DIA MUNDIAL SEM CARNE Mas como? Os restaurantes não estão servindo o meu bifinho mal passado? Que data commemoram? E eu, coitado de mim, como farei a refeição? Maldictos! Os veganos confusão arranjam com quem nunca foi do lado das fructas e verduras! Quero o gado bovino ver na mesa do povão! Piccanha, si em cubinhos for cortada, tão boa fica quanto uma macia fatia de filé! Vou num de cada! Provei eu, vegetal, o que seria de soja alguma carne… Que mancada! É trouxa quem comeu tal porcaria!

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DIA MUNDIAL SEM COMPRAS Mas como? Não estão comprando nada? Que data commemoram? Como pode alguem não consumir? E quem se fode? A casa de commercio que é fechada! Eu, como cidadão, me sinto cada vez menos respeitado! Num forró de protestos, fazem tudo que incommode, aquelles militantes na calçada! Accusam nossa febre consumista de estar, do capital, ao bel serviço! Censuram cada bem que a gente lista! Assim não é possivel! Ja sumiço levou aquelle dildo que conquista meus maximos desejos e eu cobiço!

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DIA DO ROMEIRO O padre exige, duma multidão, que, pela via “sacra”, se destine à proxima parochia. Quem define os grandes sacrificios que farão? Sim, elle mesmo, Glauco! O padre é tão cruel, tão deshumano, que previne: “Quem não fizer aquillo que combine commigo, não será, jamais, christão!” Succede que esse povo, pela via de grande movimento, morrerá na certa, attropelado, nesse dia! Os carros, caminhões, mactaram ja dezenas! Mas o padre ‘inda queria mais! “Pena que impediram!” Mais, não dá!

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DIA DA MADRINHA Não tive, como magica madrinha, quem fosse, nesta vida, aquella fada. Appenas uma thia que, coitada, nem grana para algum presente tinha. Amigos bruxos contam, nessa linha de historias, que fadinha teve cada um delles. Perguntei si tudo ou nada fizeram as babás da carochinha. “A minha me deu aulas de magia!” “A minha me ensignou a ser vidente!” “A minha me ensignou philosophia!” Pensei aqui commigo: quem se sente por baixo, sendo cego, mais queria aquella que puddim faz, e cha quente…

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DIA DO DOADOR DE SANGUE Mas como poderei ser doador, si tenho um sangue extranho, por assim dizer, sangue “malefico” ou “ruim”? Alguem me explique, peço, por favor! Um cara do meu typo, um que é “de cor”, aqui no bairro, quasi que Itahim, levou ballaço, ja a saber eu vim, de grave hemorrhagia causador! Quizeram transfusão fazer e eu quiz doar, mas recusaram! A razão? Meu sangue não é “dadiva”, alguem diz! Tambem eu sou escuro, sou negão, mas, só por causa desses imbecis, não pude soccorrer o meu irmão!

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DIA DO CORNO Você, Glaucão, que excolhe e collecciona relatos conjugaes de trahição, na certa gostará dum caso tão grottesco, que paresce vir da zona! Esposa tive, Glauco, que mandona foi muito! O seu folgado Ricardão commigo se exbaldou, pois ella não queria dar, appenas, sua conna! Queria curtir algo mais pornô, por isso obrigou, Glauco, que eu comesse, na frente delle, todo o seu cocô! Sim, tive que comer, pois ambos desse scenario muito riram! Juro, pô! Faltou somente que elle me fodesse!

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DIA DA BAHIANA DO ACARAGÉ Comeu acaragé do bom quem ja esteve em Salvador, como você, Glaucão! Caso vontade ca me dê, não creio que comer um bom eu va! Ja tive experiencia que fará você zoar commigo, bem se vê! Achei bollinho secco, sem dendê no gosto, sem siquer o vatapá! Difficil encontrar é, por aqui, daquelle genuino! O meu avô achava que a bahiana diz por si! Aquella que é devota de Xangô, de Exu, dos orixás todos, sorri com jeito, offerescendo um ao “Sinhô”!

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DIA DO DEFICIENTE AUDIOVISUAL Hem, Glauco? Ja pensou? Cego você ficou, ja. Mas escuta muito bem! Pensou naquelle cego que não tem tão boa audição? Porra, que deprê! Si mal escuta aquelle que não vê, mais facil ficará, como refem, aos pés da molecada, pois ninguem excappa àquella turma do rollê! Fiquei vendo, Glaucão, um surdomudo ser feito de cachorro numa roda daquelles pivetões, e vi de tudo! Vi darem soco, chute… Meu, foi foda! Puzeram de joelho! O mais marrudo mandou chupar! Quem é que se incommoda?

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DIA DA JUVENTUDE CATHOLICA Do padre eu fui menino, Glauco! Sim, fui mesmo um dedicado coroinha! Aquelle padre, cara, amava a minha piroca! Ah, que prazer causava a mim! Chupou a minha rolla, até que vim a ser seu favorito! O padre tinha tambem outros meninos… Sim, damninha foi sua acção, tornou-me, emfim, ruim! Peguei, Glaucão, o gosto de metter, na marra, numa bocca a minha rolla, por grana, até só mesmo por prazer! Agora sou, dum cego, quem vae pol-a garganta addentro! Glauco, o meu poder provem de Deus, noção que não é tola!

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DIA DA DANSA CLASSICA Eschola de ballé cursei, Glaucão! Estylo choreographico ganhei a poncto de, na dansa, virar rei perante todo um misero povão! Depois eu descobri, Glaucão, que não dansava mesmo nada, que não sei siquer me equilibrar, que nem um gay daqui, dos pés na poncta! Ah, meu irmão! Emfim, a tal eschola foi fechada depois de engannar, Glauco, muita gente! Agora, só frequento uma ballada! Dansar ja sei forró, que é bem mais quente que toda aquella classica salada de estylos! Neste passo sigo em frente!

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DIA DO CHRISTÃO LEIGO Pae Nosso me quizeram ensignar a mim, que, no sonnetto, sou vigario. Não sendo um vigarista, nem primario meu nivel, respondi sem vacillar. Citei, a meu favor, um exemplar sonnetto de Bilac, em que foi vario o emprego de vulgar vocabulario, ainda que erudito o linguajar. Nos versos enjambados, elle faz verbaes malabarismos, a tal poncto que expõe algum climão com Satanaz. Tambem eu, como bruxo, não sou tonto si exponho o meu segredo. Por detraz da lyra, do vigario passo o conto.

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DIA DO BOLLO Um bollo de fubá vovó fazia que todos ja guardaram na lembrança. Ainda desses tempos de creança me lembro, neste escuro dia a dia. Um bollo recheado minha thia fazia. De fallar nelle não cansa a gente. Quem tem medo da ballança evita até pensar, mas se sacia. Glacê, mais chantilly, mais o recheio de nozes e castanhas, mais um toque secreto de licor… Não me refreio! Mas, cada vez que o como, levo um choque. É todo bollo falso! Não falseio meu gosto! Que a saudade me convoque!

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DIA DE COMBATTE À OBESIDADE Com medo da ballança, fica a gente tentando não pensar nesse quindim que está na padaria, no puddim de leite, temptador, à nossa frente. Desculpa a gente inventa. Tem o dente mais carie, tem o sangue essa ruim porção de glycemia, augmenta assim, assado, o peso… Gordo, quem se sente? Não quero nem saber, emfim eu penso. Ao demo o diabetico perigo! Comer irei aquelle doce immenso! Aquelle doce enorme, em que me instigo! Aquelle doce falso que eu, ja tenso, me privo de provar, como castigo!

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DIA DE LUCTA CONTRA O CANCER Na phase terminal, lhe deram droga fortissima. Que nada! As dores não passavam. O coitado, no colchão mijado, rogou como ninguem roga. Pediu, implorou… Só quem dialoga com Christo, Satanaz e Buddha tão tenaz lucta travou. Eis a questão: Jogar ou não jogar? Quem soffre, joga. As chartas foram postas. Figurado sentido, pois rollava no mijado colchão quem supplicava pela vida. Emfim, foi attendido. Não doia mais nada. Mas assim que essa agonia passou, eis que elle, então, se suicida.

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DIA DE PROTESTO CONTRA OS BRINQUEDOS DE GUERRA Fazendo o seu sermão, que desaggrada alguma auctoridade mais fascista, o padre não descansa até que insista que “patria amada não é patria armada”. Pistola, trezoitão, fuzil, granada, é tudo brinquedinho que conquista o sonho consumista que mais dista das theses pacifistas de quem brada: “Abbaixo os armamentos! Guerra, não!” “Queremos mais amor, não odio, gente!” “Mais rango no prattinho do povão!” Na rua, a passeata, ao solão quente, accaba dispersando, pois estão as cucas a fundir. Ha quem aguente?

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DIA DO ORIENTADOR PROFISSIONAL A sua vocação, Glaucão, está ha muito comprovada. Você tem dever de massagista ser de quem enxerga bem. Ainda questões ha? Glaucão, o seu curriculo me dá certeza duma coisa: chupa bem aquelle que ficou cego. Porem melhor pode fazer o que faz ja. Sim, posso preparal-o, Glaucão, para lamber profundamente todo um anus siquer sem de cocô sujar a cara. Você qualificado foi por manos aqui das redondezas, mas prepara melhor o seu futuro quem faz planos.

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DIA DA MEDALHA MILAGROSA Alguem me segredou: “Nossa Senhora das Graças proteger-te poderá! Até pode curar-te, porque ja curou cegos, que enxergam bem, agora!” Fiei-me nos conselhos de quem ora à sua padroeira. Achei que má idéa não seria ver si dá bons fructos o que escuto porta affora. Comprei uma medalha milagrosa que muito me custou. Rezei, e nada! De fama, appenas, tal medalha goza! Visão não me voltou. Que fiz cagada notei rapidamente. Quem se entrosa com falsos milagreiros em vão brada.

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DIA DA LEGALIZAÇÃO DA MACONHA Ja querem liberar, Glaucão, o porte da herva! Até que emfim! Passou da hora! A lei careta, aquella que vigora, me pune e vae mudar, Glaucão, por sorte! Ja tenho uma esperança que comforte! Você, não, porque nada commemora! Fetiches não são crimes, mas, embora não sejam, ninguem dá nenhum supporte! Seu vicio por chulé não se tolera, pois todos lhe recusam um direito normal de cafungar! Ninguem libera! Nenhuma lei regula, mas um jeito não ha! Nenhum amigo, só por mera peninha, acceitará! Nem eu acceito!

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DIA DA EDUCAÇÃO À DISTANCIA Prestar vestibular? Mas para que? Se inscreva ja na nossa faculdade! Pagar mensalidade? Mas quem ha de gastar tanto, si vive em miserê? Na nossa faculdade, você lê na tela tudo! Cursa o que lhe aggrade, estuda si quizer! Ninguem lhe invade o quarto p’ra dar toques a você! Só paga as appostillas e diploma terá, reconhescido pelo MEC! Verá que nosso curso não embroma! Accesse ja, se inscreva ja, moleque! Quem quer presencial e enorme somma investe, não terá, de opções, tal leque!

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DIA DO DESPACHANTE ADUANEIRO Comprei, Glauco, um “podildo” p’ra você! Um masculo pezão, de silicone, exactamente egual ao que, num clone daquelle filme duca, a gente vê! Você nem pagaria mais michê só para ter a sola que ambicione na sua cara, Glauco! Ja seu phone mais mudo ficaria, e quieto o apê! Azar, porem, eu tive! No momento exacto de na alfandega passar, abriram a bagagem! Eu lamento! Aquelle pezão chato, cavallar, você não acha aqui! Quem sabe eu tento, na proxima, as revistas evitar…

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DIA DAS ARTES MARCIAES Você dos luctadores de judô na cara ja levou algum pezão? Siquer de karatê levou, Glaucão? Nem mesmo taekwondô, siquer sumô? Appresentar-lhe irei o gigolô que em minha casa, agora, é Ricardão e come minha mina! Vocês vão ter muita diversão, na certa, pô! O gajo, nessas artes, faixa preta allega ser e enorme pé tem, meu! Não quer, Glaucão? Prefere só punheta? Alguem na sua cara ja metteu o pé, sem ser aquelle que prometta luctar bem? Era appenas philisteu?

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DIA DA ANXIEDADE DA ESPERA Glaucão, o meu bassê, si está sozinho em casa, não me espera sem uivar! Paresce que lhe espetam, sem parar, agulhas e alfinetes, coitadinho! Pois é, quem me contou foi um vizinho que escuta a choradeira… Tem um par, tambem, de bassezinhos. Por azar, se junctam a lattir! Eu me apporrinho! Hem, Glauco? O que você faria, amigo? Eu, quando ouço fallarem, quasi morro! Sahir de casa, agora, nem consigo! {É simples! Leve juncto o seu cachorro em todas as sahidas. Tal castigo nenhum bassê meresce, eis meu exporro.}

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DIA DA AFFIRMAÇÃO DEMOCRATICA Não, Glauco! Não podemos tolerar que queira defender a dictadura algum fascista! A gente não attura que possa alguem dum golpe cogitar! Teremos que prendel-o! O seu logar é mesmo uma masmorra! Até tortura teremos que empregar, quando elle jura que cumplices não tenha, alli no bar! Fallarem dum “Mein Kampf” ou dum “Orvil” num pappo de boteco? Mas de jeito nenhum! Temos governo que é civil! Que fallem bem de Hitler não acceito, Glaucão! Elles que fallem no Brazil, aqui não! Si estão presos, é bem feito!

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OUTRO DIA DO SOLDADO DESCONHESCIDO Jamais reencontrei, Glauco, o rapaz que estava, aquella noite, de serviço na porta do quartel. Por causa disso sonnetto outro compuz, tambem veraz. Ninguem delle sabia, pois ja faz um tempo que pergunto. Um compromisso com elle nunca tive, mas cobiço, em vão, outro que tenha tanto gaz! Aquelle sentinella me fodeu a bocca ferozmente, como um jegue, depois que me pisou, qual num lebreu! Narrei, ja, que lambi (nem que elle negue) a sua bota, alem de chupar seu cacete… Mas achal-o, quem consegue?

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DIA DO MARCIANO Não, Glauco! Os scientistas tentam, sem successo, convencer-nos de que não são verdes! Mas é claro que elles são! Quem é que ja não sabe, Glaucão? Hem? Eu delles ja fui feito de refem e pude ver, de perto, um verde tão berrante, tão intenso, que a visão offusca até daquelle que vê bem! Mas quero lhe fallar doutro detalhe, Glaucão, que deixará você feliz… Não ha pezão mais chato que lhe calhe! São pranchas gigantescas! Até quiz trazer um tennis desses (Hem? Não ralhe!), mas elles não me foram tão gentis!

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DIA DA FANFARRA Sahir battendo bumbo virou moda? Então quero tambem allardear que macho sou! Sou alpha! No meu lar as coisas gyram sempre à minha roda! Alli sempre commando cada foda, decido, sim, quem come e quem vae dar! Até, talvez, eu troque de logar com ella, si ser macho me incommoda! Sou sempre quem excolhe e quem dará as ultimas palavras! Si eu quizer, convido um Ricardão, que é meu xará! Quer elle, si foder minha mulher, que eu beba seu chichi, qual guaraná! Farei eu, quando quero, o que elle quer!

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DIA DO POVO PALESTINO Você ja fez poema para aquella soffrida gente, Glauco, mas agora a coisa, que ruim era, peora! Inutil ter um lado na querella! Artistas são irmãos, o Papa appella, mas tudo só de longe, la de fora, pois, dentro desse ghetto, o que vigora é scena apocalyptica na tela! Creanças orphans vagam, sem destino, em busca de comida, quando cae o missil. Sobrevive um só menino. Mas elle, ja sem pernas, que se exvae em sangue, morrerá. Nem imagino que typo de poema disso sae!

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DIA DA PREVENÇÃO DE DESASTRES Tem gente, menestrel, que questão faz de, quando não houver nenhum problema, achar qualquer desculpa mais extrema que possa algumas coisas tornar más. O gajo vê que fica para traz, na rua, aquella casca, num eschema bem typico daquillo que se tema rollar: a da banana, que é zastraz! O gajo meia volta dá, vae, pisa, sabendo que excorrega, mas duvida que seja perigosa a casca lisa! Depois que se quebrou e ja de vida correu risco, percebe que precisa, na proxima, ter mente prevenida…

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DIA DA LEMBRANÇA DO HOLOCAUSTO No tempo ja longinqua, a scena dista, mas temos que lembrar. No patamar de cyma, a divertir-se e gracejar, estava a Juventude Hitlerista. No pateo, os judeus presos, sob a vista dos jovens, se moviam devagar, às cegas, rastejando, para dar prazer àquelle publico nazista. Sem roupas, mãos e pés aptados, iam e vinham, se rallando pelo piso, emquanto os crueis jovens delles riam. Agora, quando ouvindo estão um riso angelico (ou mengelico), os que viam aquillo um dejavu teem, impreciso.

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DIA DO CAFÉ Não, Glauco, o melhor mesmo nem “espresso” da machina mais cara será, nem aquelle que, coado, todos teem em casa, a fazer sempre esse successo! Melhor, mesmo, foi um que, de regresso das terras africanas, tomei, sem saber, no aeroporto: o seu pó vem das fezes dum macaco, lhe confesso! Exacto, Glauco: o mico come, caga e, desse cocozinho, um raro pó se extrae! Sim, todo mundo caro paga! Mas pode ser de pombo, sim! Não só! Tambem de porco! Creio que tem vaga até para cocôs humanos, ó!

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DIA DO ACUPUNCTURISTA Eu, antes de cegar, tentei de tudo, naquelle desespero. Fui até buscar na acupunctura alguma fé capaz de comprovar qualquer estudo. Depois que fiquei cego, não me illudo mais. Foda-se esse pappo da ralé! Nenhuma “alternativa” capaz é da cura dum ceguinho ou surdomudo! Aquellas agulhinhas me varavam, entravam por aqui, sahiam la, sem que eu sangrasse… Scenas que se gravam… Valeu o sacrificio? Ja nem dá, de facto, p’ra dizer. Meus dentes travam si disso me recordo… Oh, phase má!

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DIA DO THEOLOGO Pastor eu sou, Glaucão! Mas, outro dia, prenderam-me! Que escandalo! Foi chato! Queriam me accusar de estellionato, magina! Na prisão eu ficaria? Jamais! Porem, emquanto não sahia, lembrei-me de ter sido bem sensato, pois fiz theologia, vate! Exacto, cursei eu à distancia! Não, não ria! Ainda que remoto, o meu diploma valeu-me estar em cella especial! O curso nem custou tão alta somma! Até lhe recommendo! Si seu mal não cura a fé, você, quem sabe, embroma alguem no seu perfil official!

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DIA DO SYNDICO Glaucão, o meu apê tem, bem ao lado, um louco, um psychopatha! Abbaixo, fica, do syndico, uma salla! Meu, que zica! Até que sinto pena do coitado! Barulho me incommoda, não me evado de estar irritadiço. Fica a dica, comtudo: quem com doidos não se bicca, não pense em se queixar dum som damnado! A musica que escuta aquelle insano é coisa do outro mundo, menestrel! Ao syndico, maior é, claro, o damno! Embora as mulctas valham no papel, na practica não entra pelo cano quem tenha familiares no quartel…

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DIA DO OMNIBUS Os trolleybus dos tempos de creança, antigos, importados, tinham cara dum omnibus londrino. Faltou, para ser um, ter dois andares, na lembrança. Um omnibus electrico não cansa o ouvido com barulho, não dispara tal qual la, pelo Atterro, se repara que seja carioca algum que advança. Mas chifres tem, precisa ter um trilho aereo, onde se prenda. Superado conceito, dizem. Acham empecilho. Sim, delle bem me lembro, pois, dum lado mais lyrico, meus olhos maravilho emquanto não estou, ‘inda, cegado.

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DIA DO TAXISTA Um taxi me enviaram. O taxista, curioso, perguntou como me sinto. Assim lhe respondi: {Sabe? Não minto si digo que é um horror perder a vista!} {Quem perde sua vista que desista dalgum tesão! Quem pode ver, instincto terá de estar gozando, de seu pincto ter duro, dum prazer que não despista!} O gajo concordou: “Cê tem razão! Tesão devo sentir! Porra, nem sei aquillo que faria sem visão!” Calamo-nos. Certeza ja terei de que elle imaginou gozar, mas não na mão e sim na bocca deste gay…

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DIA DA SEGURANÇA EM COMPUTADORES Sabia que sou hacker, Glauco? Posso entrar no cellular de quem eu queira! Exacto! Sempre exsiste uma maneira de dados roubar, neste ramo nosso! Por isso me chamou quem quer um troço fazer, neste paiz, que brincadeira não seja, porque senta na cadeira maior la na Alvorada! Alli ja almosso! Quiz elle encommendar que eu invadisse os phones e sigillos de quem tenha poder para barral-o! O que é que eu disse? Fallei que dar um golpe nem de senha precisa! Basta alguem, da dama ao vice, achar que só depende de resenha!

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DIA DA REFORMA AGRARIA Glaucão, nós invadimos a fazenda daquelle coronel que acha que é vivo! Chamamos “latifundio improductivo” as terras que quizermos, tá? Me entenda! Entramos, occupamos! Eu à venda ja puz a propriedade! Não me privo de nada, pois sou muito creativo! Ja posso, sim, Glaucão, viver de renda! Camponio, camponez, campezinato… Palavras são palavras, meu querido! Importa aquelle poncto que eu constato: Que somos nós de esquerda, nem duvido, mas, quando um de direita tem mandato maior, ficar na moita, ahi, decido!

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DIA DO RHYTHMISTA Você não sei, Glaucão, mas eu detesto battuque, só battuque, sem mais nada! Sim, para mim, Glaucão, a battucada precisa de mais coisas, ou do resto! Me calam si, na quadra, manifesto tal poncto, pois de mim a molecada tem raiva! Ahi, me cobrem de porrada! Mas, quanto mais appanho, mais contesto! Mactou você, Glaucão, essa charada! Sou mesmo um masochista! Vae dahi que curto quando levo um pau de cada! Me battem de verdade, como si eu fosse tamborim, e mais me aggrada que batta mais quem manda mais alli!

93


DIA DO EVANGELICO Irmão, si eu lhe disser que sou pastor você me leva a serio? Mas preciso da sua confiança! Si indeciso está, que é que os irmãos irão suppor? Irão pensar que eu, como um impostor, me faço de quem tenha bom juizo, de sabio conselheiro! Si improviso, dirão que meu sermão deve favor! Preciso que você me recommende a todo o pessoal alli da rua! Assim esse negocio mais me rende! Dizer que eu seja ungido tem a sua forcinha! Beijarão meus pés, entende? Você tambem que beije! Contribua!

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DIA DO AMIGO ARGENTINO Você, no futebol, zoa commigo, por ter a selecção mais vencedora, e muito mais zoava, si não fora o facto de chamar-me “muy amigo”. Zombar do seu dinheiro não consigo, embora jamais possa recompor a altissima inflação. Eu, com temor, à sahude sua brindo, “muy amigo”. Nós ambos, na politica, teremos, tivemos e ‘inda temos esse ranço fascista, auctoritario, nos extremos. Mas, sendo “muy amigo”, não descanso emquanto não insisto que, sim, vemos bons ponctos em commum, feito o ballanço.

95


DIA DA CHARADA Hem, Glauco? O que é que o homem tem na frente, a mulher tem no meio e o gay não tem? A lettra “H”! Gostou? Você tambem se liga num enigma que eu invente? Onde é que a mulher tem, naturalmente, cabello mais crespinho? Ora, ninguem duvida que é na Africa! Porem, pergunta ainda tenho que é mais quente! O que é que, em poesia, tem cabeça, alem de ter pé? Dessa você vae gostar! E, caso goste, me aggradesça! Resposta: as suas obras, ja que é pae você daquella lyra mais travessa, que implica algum tesão, no qual recae!

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DIA DA SALADA “Eu quero de tomate com palmito!” “Eu quero de escarola com alface!” “Aquella de cenoura alguem me passe!” “Sem alho nem cebolla não admitto!” Na minha, as azeitonas teem bonito papel, quando o repolho mostra a face. Comtudo, o memoravel desenlace está num ritual que eu não evito: No fundo da tigella fica aquella mixtura dum vinagre com um sal, um oleo, que rebrilha! Ah, scena bella! Alli mergulho o pão que, é natural, origem italiana tem! Quem zela por essas tradições é meu egual!

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DIA DO CACHORRO QUENTE No pão, appenas ella, a salsichona, ao lado da mostarda, nada mais. Agora, algumas modas que eu jamais adopto são normaes por esta zona. Normaes? Bem, não as acho tão normaes. Quem tem opinião se posiciona contrario. Eis que o dogueiro ja estaciona a van perto de escholas e hospitaes. Põe tanta coisa nesse sandubão (purês e mayonnaises, milho, ervilha) que ja nem de dogão eu chamo, não! O olhinho dos bassês até rebrilha, comtudo. O que interessa a todo cão é tudo devorar. Que maravilha!

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DIA DO MACACO Você pode chamar-me de macaco, por ser um argentino, e eu brazileiro. Mas isso não impede que eu, primeiro, lhe diga que não temo tal barraco. Macacos todos somos, eu destacco, depois do que ja Darwin, pioneiro, fallou. Eu, inclusive, ja me inteiro da sua “cabecita negra”, Paco! Paresce que indio foi, caro Paquito, aquelle seu avô, que tem a cara, notei, do Maradona. Achei bonito! Si caras, aliaz, alguem compara, verá que, mesmo cego, não imito um mono, mas você virou arara!

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DIA DE COMBATTE À MICROPHALLOPHOBIA Eu tenho um minipenis e não vejo quem possa soccorrer-me com supporte moral ou social, Glauco! Quem forte se sente si não pode ter desejo? Verdade, Glauco? Perco o meu ensejo de boccas penetrar? Sim, tenho um porte bem masculo! Talvez eu me comforte fodendo uma boquinha, até, sem pejo! Você me convenceu! Meu pau pequeno melhor se encaixa numa bocca grande! Agora não me privo nem condemno! É pena que você não vê si expande meu penis seu tamanho! O seu acceno foi optimo! Chupar não quer que eu mande?

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DIA DE COMBATTE À ARACHNOPHOBIA Segure esta, rapaz! Ei, abra as mãos! Assim… As duas palmas … Isso… Veja que a aranha ainda sobra! Não deseja mexer nos seus pellinhos? Quantos nãos! Medrosos, ja vi varios cidadãos que soffrem da phobia! Quem esteja querendo se livrar, tem, de bandeja, a chance de exhibir seus nervos sãos! Soppese, si puder, esta Golias! Pesada, né? Mas fique sossegado! Só picca si estressada! Tem manias! Não tema, que estarei eu do seu lado! Bem, acho que a bichana sympathias não teve por você… Piccou? Coitado!

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DIA DA PEGADINHA Glaucão, aos meus amigos vou propor a nova pegadinha num ceguinho: pregar-lhe pelas costas, no caminho, o adviso de “Sou cego chupador!”… Assim, a molecada mais rigor terá para pegal-o! De excarninho proposito, farão que, direitinho, o cego os satisfaça, no que for! Mas como? Diz você que pegadinha do typo nem precisa que se faça? O cego ja tal phrase, por si, tinha? Estava, mesmo, implicito? Quem passa na rua ja adivinha? Então a minha proposta perderia toda a graça!

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DIA DA GREVE NOS CORREIOS Na vespera das festas, o correio entrava numa greve prolongada. Se lembra disso, Glauco? Ja mais nada chegava! Muito livro que eu não leio… Ficavam, do caminho pelo meio, as chartas, os chartões, alem de cada presente que esperava a molecada ganhar pelo Natal e que não veiu! Mas hoje não recebo nem remetto mais chartas, e encommendas ja não faço, porque ninguem tem grana, aqui no ghetto! Não ha, pois, para greves esse espaço! Os tempos ja mudaram! Nem me metto, comtudo, num assumpto de palhaço!

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DIA DA BLACK FRIDAY Magina! Nem precisa sexta-feira ser para haver “total liquidação”, “estoques em offerta”, “promoção”, emfim, qualquer pretexto que se queira! De “black” eu nada vejo, de maneira nenhuma, só de “fraude”, como vão chamando, no commercio, tal noção erronea de mais grana na charteira! Conforme a piadinha, vendem “tudo” na loja que estiver “pela metade do dobro”, ou seja, nunca que eu me illudo! Appenas uma coisa, na cidade, suppuz achar: aquelle pé thalludo, de plastico! Não acho um que me aggrade!

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DIA DO SHOW INFANTOJUVENIL Semanas antes, fica a creançada na porta dum estadio, com barraca armada. Logo, logo, vae a vacca pro brejo, e se arrepende o pae de cada. Calor insupportavel, não ha nada que faça refrescar. Só se destacca a morte duma fan. Algum babaca explica: “Sim, morreu deshydratada…” Aquella popular cantorazinha, que estava se lixando para a morte da sua fan, repete a ladainha: {Cantar vou a canção que mais comforte os jovens corações!} Eis que, excarninha, cantou: {Quem for mais forte que supporte!}

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DIA DA DIPLOMACIA ASSERTIVA Não quero nem conversa com o seu paiz! Seu presidente é um idiota, macaco, communista! Ninguem nota a sua voz! Não passa dum plebeu! O que é que irá propor ao europeu mercado? Nada! Minima tem quota! Governo respeitavel, só com bota na cara dos civis, si me entendeu! Na minha patria, muita auctoridade um lider tem! Não damos a molleza que dão no seu paiz! Sim, temos grade! Prendemos, condemnamos! Pau na mesa battemos! Democrata, aqui, não ha de vingar! Que foi? Ficou com a voz presa?

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DIA DO BICHINHO DE ESTIMAÇÃO Cachorros, gattos, todos elles são carentes dum amor e dum carinho. Alguem, porem, prefere ter bichinho feroz, um leopardo ou um leão. Um porco, um elephante, sei que estão os jovens adoptando. Ja adivinho que esteja alguem querendo ter um ninho de cobras bem debaixo do colchão. Alem de escorpião, exsiste quem adopte essa aranhona monstruosa, chamada de Golias. “Que é que tem?” “É linda, cabelluda!”, alguem me goza. Depois que foi piccado, não me vem ninguem gozar da cara desdenhosa.

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DIA DO ESCRIPTOR HOMENAGEADO Na feira litteraria, quem da vez é bolla recebido bem será. Mal chega, as entrevistas que elle dá são muito concorridas. Ha freguez. Mas, logo, uma total insensatez se segue. Empurrões, tapas… Bafafá geral. Alguem ja manda que elle va tomar no cu. Mais coisa alguem lhe fez. Os outros escriptores, com ciume da fama do coitado, quebram tudo, estragam a palestra. Quem assume? Emfim, os pannos quentes um marrudo impõe. Prohibem mesmo que se fume. Accaba, ja sem graça, aquelle entrudo.

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SUMMARIO NOTA INTRODUCTORIA........................... 7 DIA DA “EIAI” NUM “AUAU”..................... 9 DIA DO REPUDIO AO TERRORISMO................ 10 DIA DO ESPECTACULO DE BALLÉ................. 11 DIA DO NECROLOGIO........................... 12 DIA DO OBITUARIO............................ 13 DIA DO ADDEXTRADOR CONSCIENTE............... 14 DIA DO XADREZ............................... 15 DIA DAS VICTIMAS DO TRANSITO................ 16 DIA DO TENNIS DE MESA....................... 17 DIA DO HOMEM................................ 18 DIA DA MULHER EMPREHENDEDORISTA............. 19 DIA DO CHORDELISTA.......................... 20 DIA MUNDIAL DO BANHEIRO..................... 21 DIA DA BANDEIRA............................. 22 DIA DA AUTO ESCHOLA......................... 23 DIA DE COMBATTE AO ABUSO INFANTIL........... 24 DIA DA CONSCIENCIA NEGRA.................... 25 DIA DO REENCONTRO DE RAÇAS.................. 26 DIA DA CULTURA HIP HOP...................... 27 DIA MUNDIAL DA CREANÇA...................... 28 DIA DO BIOMEDICO............................ 29 DIA DO AUDITOR.............................. 30 DIA DA DESCONFIANÇA......................... 32 DIA DA MATURIDADE........................... 33 DIA DA PERDA DE COMPOSTURA.................. 34 DIA DA FALTA DE DECORO...................... 35 DIA DE USAR CHINELLO........................ 36 DIA DE USAR GRAVATA......................... 37 DIA DE USAR TENNIS.......................... 38 DIA DE USAR OCULOS.......................... 39 DIA DE USAR BOTA............................ 40 DIA DO ESCRIPTOR BOYCOTTADO................. 41


DIA DA HOMEOPATHIA.......................... 42 DIA DA TELEVISÃO............................ 43 DIA DA PESCA................................ 44 DIA DO MUNICIPIO............................ 45 DIA DAS MONJAS DE CLAUSURA.................. 46 DIA DO MUSICO............................... 47 DIA DE ACÇÃO DE GRAÇAS...................... 48 DIA DE COMBATTE À IMPUNIDADE................ 49 DIA DO VOVÔ................................. 50 DIA DE COMBATTE AO BULLYING................. 51 DIA DA CONSCIENCIA FLUVIAL.................. 52 DIA DO FIO DENTAL........................... 53 DIA DO ANEURYSMA............................ 54 DIA DE COMBATTE À VIOLENCIA CONTRA A MULHER.. 55 DIA MUNDIAL SEM CARNE....................... 56 DIA MUNDIAL SEM COMPRAS..................... 57 DIA DO ROMEIRO.............................. 58 DIA DA MADRINHA............................. 59 DIA DO DOADOR DE SANGUE..................... 60 DIA DO CORNO................................ 61 DIA DA BAHIANA DO ACARAGÉ................... 62 DIA DO DEFICIENTE AUDIOVISUAL............... 63 DIA DA JUVENTUDE CATHOLICA.................. 64 DIA DA DANSA CLASSICA....................... 65 DIA DO CHRISTÃO LEIGO....................... 66 DIA DO BOLLO................................ 67 DIA DE COMBATTE À OBESIDADE................. 68 DIA DE LUCTA CONTRA O CANCER................ 69 DIA DE PROTESTO CONTRA OS BRINQUEDOS DE GUERRA ............................................ 70 DIA DO ORIENTADOR PROFISSIONAL.............. 71 DIA DA MEDALHA MILAGROSA.................... 72 DIA DA LEGALIZAÇÃO DA MACONHA............... 73 DIA DA EDUCAÇÃO À DISTANCIA................. 74 DIA DO DESPACHANTE ADUANEIRO................ 75 DIA DAS ARTES MARCIAES...................... 76 DIA DA ANXIEDADE DA ESPERA.................. 77 DIA DA AFFIRMAÇÃO DEMOCRATICA............... 78


OUTRO DIA DO SOLDADO DESCONHESCIDO.......... 79 DIA DO MARCIANO............................. 80 DIA DA FANFARRA............................. 81 DIA DO POVO PALESTINO....................... 82 DIA DA PREVENÇÃO DE DESASTRES............... 83 DIA DA LEMBRANÇA DO HOLOCAUSTO.............. 84 DIA DO CAFÉ................................. 85 DIA DO ACUPUNCTURISTA....................... 86 DIA DO THEOLOGO............................. 87 DIA DO SYNDICO.............................. 88 DIA DO OMNIBUS.............................. 89 DIA DO TAXISTA.............................. 90 DIA DA SEGURANÇA EM COMPUTADORES............ 91 DIA DA REFORMA AGRARIA...................... 92 DIA DO RHYTHMISTA........................... 93 DIA DO EVANGELICO........................... 94 DIA DO AMIGO ARGENTINO...................... 95 DIA DA CHARADA.............................. 96 DIA DA SALADA............................... 97 DIA DO CACHORRO QUENTE...................... 98 DIA DO MACACO............................... 99 DIA DE COMBATTE À MICROPHALLOPHOBIA........ 100 DIA DE COMBATTE À ARACHNOPHOBIA............ 101 DIA DA PEGADINHA........................... 102 DIA DA GREVE NOS CORREIOS.................. 103 DIA DA BLACK FRIDAY........................ 104 DIA DO SHOW INFANTOJUVENIL................. 105 DIA DA DIPLOMACIA ASSERTIVA................ 106 DIA DO BICHINHO DE ESTIMAÇÃO............... 107 DIA DO ESCRIPTOR HOMENAGEADO............... 108


São Paulo Casa de Ferreiro




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