GABINETE DO AMOR

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GABINETE DO AMOR



Glauco Mattoso

GABINETE DO AMOR

São Paulo Casa de Ferreiro


Gabinete do amor © Glauco Mattoso, 2023 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros ______________________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA ______________________________________________________ Mattoso, Glauco GABINETE DO AMOR/Glauco Mattoso São Paulo: Casa de Ferreiro, 2023 84p., 14 x 21cm CDD: B896.1 - Poesia 1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.


NOTA INTRODUCTORIA Amor não se define. Nem siquer se pode contrapor ao odio, nem fazer com a amizade parallelos. Mas gostam os poetas de tractar de themas tão complexos, a partir de casos pessoaes. Eu, nesta breve selecta, reuni scenas diversas, visando um voluminho que, si for impresso, prejuizo não dê para valentes editores, nem talvez no caso dest’auctor, si editor for. Leitores meus que digam si fui bem.



PRIMEIRA PARTE GABINETE DO AMOR Fallou-se muito, nestes tempos, dum secreto gabinete no governo só para, pelas redes, diffundir fofocas as mais falsas e maldosas accerca de “inimigos communistas”, na practica, adversarios quaesquer, desde que fossem antipathicos a quem controla aquellas redes sociaes. Ahi, pensei commigo: um amoroso conceito os bardos todos ja tiveram ao longo desse historico passado das lyras pelo mundo. Ja notei que, embora as differenças sejam muitas, poetas varios tentam definir “amor”, barrocamente, tantas vezes, usando os evidentes paradoxos com “odio”, seu opposto, o que tambem eu tenho feito, devo confessar. Aqui, portanto, quero uns tantos casos alheios commentar, para alguns meus sommar aos dos confrades alludidos. Camões nem revisito, que, por obvio, taes themas inaugura, mas, affora a linha chronologica, forçoso será que de Vinicius nós partamos. Eterno só durante certo tempo? Não, esse, dum amor sempre ideal, citar não vou. Prefiro citar outro, aquelle mais cruel, assim relido:

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SONNETTO DO MAIOR AMOR (Vinicius de Moraes) Maior amor nem mais extranho exsiste Que o meu, que não sossega a coisa amada E quando a sente alegre, fica triste E si a vê descontente, dá risada. E que só fica em paz si lhe resiste O amado coração, e que se aggrada Mais da eterna adventura em que persiste Que de uma vida maladventurada. Louco amor meu, que quando toca, fere E quando fere vibra, mas prefere Ferir a fenescer -- e vive a esmo Fiel à sua lei de cada instante Desassombrado, doido, delirante Numa paixão de tudo e de si mesmo.

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A minha releitura assim ficou: RELENDO VINICIUS (1) [5141] Não fallo de Vinicius quando falla de amor no tal sonnetto que “infinito emquanto dure” cita, nem recito chavões de “chamma” ao publico na salla. Prefiro recital-o nessa escala maior, do amor que fica triste e afflicto si a amada se contenta, e solta um grito de alegre vibração ao magoal-a. Paixão que “de si mesma” vive e vibra, o amor assim descripto mais me toca, pois flagra do poeta a funda fibra. Amor com dor se compra: não se troca por ouro, ou euro, ou dollar ou por libra. Vinicius se revela e sae da toca em versos taes, pois nelles se equilibra a synthese mais sadica e masoca.

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Ou seja, amor é, para tal poeta, um tanto do seu odio, desforrado na mesma amada, que elle, então, castiga. Leoni, sonnettista de relevo, tambem argumentou que com um odio egual convive nosso demonstrado amor em relação ao inimigo mais intimo, talvez nosso carrasco mais sadico, comquanto mais leal. Vejamos seu sonnetto, como observa os nossos sentimentos, e meu modo de lel-o nos meus proprios argumentos: DESCONFIANDO (Raul de Leoni) Tu pensas como eu penso, vês si eu vejo, Attento tu me escutas quando fallo; Bem antes que te exponha o meu desejo Ja prompto estás correndo a executal-o. Achas em tudo um venturoso ensejo De servir-me de servo e de vassallo; Perdoa-me a verdade num gracejo. Serias, si eu quizesse, o meu cavallo… Mas não penses que estolido eu te creia, Ou como um Patroclo abnegado, não: De todos os excessos se receia… O certo é que, em rancor, por dentro estallas; Odeias-me, que eu sei, mas, histrião, Beijas-me as mãos por não poder cortal-as…

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Agora a minha crua releitura: DISSONNETTO MANCOMMUNADO [0534] Te beijo as mãos por não poder cortal-as e os pés por não poder pisar-te a face. Odeio-te, mas brinco que te amasse a poncto de inhalar o odor que exhalas. Bem sei que habitarei tuas senzalas porque não tens quem mais se dedicasse a teu prazer: ninguem que assim abbrace, de bruços, tuas botas que mais rallas! Por dentro, me revolto quando as lambo. por fora me sorris, me crês submisso. Mantemos este extranho, torpe excambo: me exponho e tu te impões. Amamos isso. te fazes de mandão; eu, de molambo. Si queres, serei teu cavallariço, cavallo, até! Serás meu Thor, meu Rambo, meu Attila! Porem sem compromisso!

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Tambem em Amadeu Amaral vejo um caso de inimigo que preenche o nosso coração como um amante, até, mais que qualquer “melhor amigo”, tal como no sonnetto que excolhi: BOM INIMIGO, BOA VINGANÇA (Amadeu Amaral) Nada é inutil, no entanto: um inimigo não é o opposto do amigo que convem; é, voltado do advesso, um bom amigo, e podemos até querer-lhe bem… A amizade, alimento que bemdigo, frequentemente a maus excessos vem, e põe, não raro, a gente como um figo, a arrebentar do miolo que contem. O inimigo, ao contrario, roe e suga; de humores doentes minha carne enxuga; e, nessa eucharistia singular, emquanto do meu ser elle se nutre, vingo-me, em paz, do inoffensivo abutre, indo la no seu sangue circular.

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Assim reli seus versos em sonnetto: DISSONNETTO COMMISERADO [0595] Fallando de inimigos, Amadeu achava que não são do amigo o opposto, mas nutrem-se de nós e nos dão gosto de delles nos vingarmos. Pensei eu: Foi só minha visão tornar-se um breu e amigos desertaram, mas seu posto às vezes é occupado por um rosto que ri de mim e faz que se doeu. Dizendo me entender e sentir dó, consente que eu me humilhe e que, de quattro, lhe lamba das botinas todo o pó. Emquanto, na cegueira, me embarathro, desapto dos cadarços cada nó. No fundo, seu appoio era theatro: appoia, sim, em mim seus pés e só desfructa quando o escuro me é mais atro!

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EX-AMIGOS [10.006] Sonhei que enxergar posso novamente. Sahi, feliz, à rua. Advistei quem feliz ficou depois que fiquei sem visão. Quiz lhe fallar, mas fui em frente. Depois, advistei outro que contente ficara quando cego me viu. Nem pensei eu duas vezes e fui, bem depressa, lhe fallar, qual fina gente. Mas elle ja contente não estava. Sozinho resmungava. Parescia estar no meio duma zica brava. E, como nem notou que eu lhe sorria, passei por elle. Então mandei à fava amigos taes. Sonhei que era meu dia.

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Fallei, num dos sonnettos mais famosos, daquella convivencia não pacifica que exsiste entre esse nosso sentimento mesquinho, ou odioso, ou odiento, e seu caso contrario, mais sublime, aquelle que suppomos amoroso, cabendo notar como os nossos odios costumam ser, da bocca para fora, expressos. Mas nem sempre conseguimos fallar abertamente dos amores àquelles com quem temos convivido. Tambem cabe notar que esse sonnetto, gravado por Arnaldo Antunes num CD que MELOPÉA se chamou, depois foi transformado, com dois versos a mais, em dissonnetto, que ficou assim devidamente registrado: DISSONNETTO CONFESSIONAL [0234] Amar, amei. Não sei si fui amado, si amor jurei a alguem que eu odiara e a quem amei jamais mostrei a cara, de medo de me ver posto de lado. Odeio si tambem sou odiado. Devolvo o que se jura e se declara, mas quem amei não volta, e a dor não sara. Não sobra nem a crença no passado. Palavra voa, escripto permanesce, ou “Verba volant…”: era certo, emfim, aquelle adagio vindo do latim. Escripto é que nem odio, só envelhesce. Si serve de consolo, seja assim: ainda que odiar eu mais quizesse, amor nunca se exquesce, é que nem prece. Tomara, pois, que alguem reze por mim…

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Depois, elle ensejou novo sonnetto, que cabe registrar, tambem, aqui: AMBIGUA ANGUSTIA [10.004] Mais amo quando odeio o meu amado objecto dum amor que tanto odeio. Na duvida até fico si é mais feio amar ou odiar, mudando o lado. Odeio o meu amor, mas não me evado de estar ao lado delle. Sacco cheio demonstro na presença delle e, meio zangado, com prazer faço um aggrado. Mais odio delle sinto, mais amor procuro demonstrar e, com affecto, me chego, mesmo ommisso si elle for. Jamais posso passar sem tal objecto tão physico dum odio, um oppressor amor, e tão opposto, que eu me inquieto.

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Em termos mais de satyra, abbordei a nossa relação conflictuosa com esses mais queridos companheiros, parceiros, ou amantes, si quizermos chamal-os dessa forma affectuosa. Um breve infinitilho bem retracta, ainda que em mordaz caricatura, conflictos que excapparam ao controle e expostos foram para a sociedade: CULTO ECUMENICO (1/2) [8088] (1) Os dois espadachins olham-se com um odio mudo, usando a saudação de praxe, porem avidos de sangue. Começa a lucta. Advança aquelle, seu rival encurralando, que desvia dum golpe certeirissimo, o qual corta a vella pelo meio. Sobre a mesa enorme sobem ambos. Continua a lucta, alli por cyma mesmo. Pulla um delles para o solo novamente. Tambem desce o rival. Eis sinão quando aquelle perde sua leve espada. Ja prestes a morrer, elle se exquiva e pega pelo braço um opponente surpreso. Tambem deste voa longe a branca arminha. Prompto. Vão na mão.

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(2) Agora muda a scena. De bom tom não ha mais nenhum golpe, só chutão, pernada, parescendo bangue-bangue sem tiro. Um dos parceiros ja perdeu dois dentes. Outro berra, na agonia dum olho ja vazado. Pela porta affora, rollam elles. Indefesa, a moça sae correndo pela rua. Mas pede por soccorro. Quem ulula de gosto é a garotada. Juncta gente, torcendo para alguem ir se ferrando. Exhaustos, mutilados, ja sem nada podendo fazer, elles dão um viva à rude multidão. Sob o sol quente, abbraçam-se, se beijam. Um é monge buddhista. Seu amante é bom christão.

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Emfim, definir “odio” significa, ao mesmo tempo, olhar em direcção daquella mais folklorica noção que temos para “amor”, e vice versa, tal como no poema abbaixo, sobre um velho bordão, muito popular em brindes e chartões que conservamos: PARES [6242] “Amar é…” Ja pensaste, Glauco, nessa questão? Ja completaste a reticencia? Qualquer menestrel classico que vence a pieguice encontrará resposta à bessa! Só vale responder o que interessa a amantes, namorados: “paciencia”, “saber ouvir”, “lembrar não só na ausencia”, “fallar logo; pensar, porem, sem pressa”… Tu, Glauco, que és poeta, certamente virás com um conceito breve e bello. Que tarde ‘inda, a ti nesta lyra appello: Não deixes de brindar, com graça, a gente! Somente isso, Glaucão? Ficas contente com outra phrase nesse teu martello: “chulés compartilhar num só chinello”? Mas como? Quantos pares tens em mente?

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Deixemos, pois, um odio figadal àquelles que, envolvidos numa guerra total, mortal, que espero não occorra jamais, ou ‘inda ao mero, transitorio embatte ideologico. Deixemos, possivel si isso seja, a convivencia mais sadomasochista para as horas dos gozos em privado, não na sede dalgum mais democratico governo.

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SEGUNDA PARTE AMISTOSAS COLORAÇÕES AMOROSAS DISSONNETTO DOMESTICO [0436] Estava o cachorrão sozinho e triste, trancado na casinha, come-e-dorme. Seu unico brinquedo, aquelle enorme, surrado pé de tennis, que resiste. Ja victima das linguas e do chiste, a edade faz que quasi se conforme. Seus donos usam botas e uniforme. De fuga não ha ropta que os despiste. Até que um lindo e timido gattinho, em busca de refugio, certa feita, se acchega ao cachorrão e alli se deita. Naquelle apperto, pisa-lhe o focinho. O cão accorda, extranha, mas acceita. Resiste à temptação de ser mesquinho e, em vez de defender, divide o ninho. Agora a dupla vive satisfeita.

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DISSONNETTO DO AMOR REVISTO [0743] “Que seja eterno emquanto dure”, disse com taes ou quaes palavras o poeta, fallando-nos de amor, que elle interpreta como algo que surgisse e então sumisse. Uns acham-no sublime; outros, pieguice. Quem anda appaixonado vê completa a vida só com elle; em nada affecta, porem, a quem se isola na velhice. Do velho para a velha, mais allumbra. Do coxo para a coxa, allarga o passo. A dois adolescentes, os deslumbra. Ao misero casal segura o laço. Ao cego é luz; ao sceptico, penumbra. Ao orpham é o sorriso do palhaço. Na guerra é appello à paz, que a bomba obumbra. No verso é de Vinicius seu espaço.

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DISSONNETTO DAS AMIZADES DESCOLORIDAS [0775] Amigos gays, os tenho certamente, embora alguns até sejam peores que aquelle frei que, quando diz “Não chores!” por dentro “Chora!” diz, como a serpente. Dos heteros conhesço bem mais gente e tenho, entre amizades, as melhores, à parte os que “Meu pé quero que adores!” me ordenam si adjoelho-lhes na frente. Negocios separando, o amigo certo, presente em hora incerta e mais soffrida, é raro e poucos teem algum por perto. Conservo uns dois ou trez por toda a vida. O resto me fugiu quando os allerto que cego estou: teem luz, e é colorida. Um normovisual, si for experto, dum cego quer distancia que encomprida.

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DISSONNETTO DOS ODIOS DISCRETOS [0776] Si odeio alguem do fundo do meu peito, disfarso e mostro appenas que não quero maior intimidade: sou sincero, porem seu mal não berro que é “Bem feito!” Mas quem dum inimigo meu tem jeito e passa por soffrer meu mais severo attaque ou glosa, em prosa ou verso, é mero collega de battalha ou de defeito. Os odios se cultivam como um pratto servido ammanhescido, vingativo, que accaba envenenando quem diz “Macto!” Por isso odios extremos não cultivo: appenas aos que odeio sou ingrato e finjo que de amar seus pés me privo. Mas elles sabem como sou cordato amante e das porradas nem me exquivo.

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DISSONNETTO DO CONTINHO CONTINUADO [1436] Gattinho e cachorrão formaram par unido e inseparavel: outro cão na certa brigaria e, no logar do gatto, outro ja armava discussão. Em vez de arranca-rabo, ambos vão dar exemplo de convivio. A explicação? Talvez, alem do facto de um só lar ter duas camas, com que edade estão. Maduro está o cachorro, emquanto o gatto, menor e com feição de garotinho, podia ser seu filho. Mais pacato, o cão modera o rhythmo do gattinho. Mas, em compensação, mais agitado, tal como um affilhado a seu padrinho, o gatto excita o cão que, lado a lado, encontra adjuda e amor, força e carinho.

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DISSONNETTO DO GENTIL SERESTEIRO [1463] Amada Clara, minha amada Clara, em versos cantarei a tua cara! Amada Beatriz, tu, Beatriz, verás que cantarei o teu nariz! Querida Conceição, canto-te a mão! Querida Nazareth, canto-te o pé! De ti canto, Raymunda, como não podia me ommittir, a bunda, né? Cantei, da Julieta, a bocetinha, alem de, em Portugal, cantar a conna. O cu cantei, tambem, da Luluzinha. Nem fallo das mammonas da Ramona! Cantei, por ser pequena, a Magdalena e, fina, a Josephina. Quem, grossona, cantei foi a Godiva. Mas a pena nem vale Amor cantar à minha dona.

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DISSONNETTO DO MAU HUMOR [1642] Um beijo, appenas. Tudo que queria o velho era um beijinho. Porem, dado que a velha não o dava, elle, de dia, passava o tempo fora, magoado. Os outros ja suppunham que a harmonia daquelle casal coisa do passado seria, pois o humor que elle exhibia affugentava até bandido armado. À noite, finalmente, elle voltava, depois de andar por tantos outros lados, e a velha, que ja estava menos brava, servia-lhe a sopinha. Os dois calados. Na hora de dormir, como ninguem ainda disse nada, ambos culpados se sentem, mas emfim a velha vem beijal-o… e dormem calmos, abbraçados.

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DISSONNETTO PARA UM PÉ CHOLERICO [1773] Em “Um coppo de cholera”, o pé dicta: nessa novella, Raduan Nassar desfructa quando a femea fica afflicta ao ver-lhe o peito, a sola, o calcanhar. Descalço, esse seu pé faz que repita “amor amor amor”, a delirar, aquella cuja logica é restricta appenas ao dialogo, ao fallar. Que seja amor, appenas, eu não acho. Na practica, ella dobra-se ao pé macho e cede a seus desejos de capacho lhe ser, de rastejar, de usar a bocca. Daquella paixão torna-se captiva. Nassar prolonga sua exspectativa propositadamente, na lasciva e quente discussão, em termos, oca.

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DISSONNETTO PARA UM NAMORO SEM PALAVRAS [1799] Ganhar um cafuné tão bem nos faz! Deitar-se no seu collo a namorada fez, com simples acceno, seu rapaz: não quiz que elle pensasse mais em nada. Pegando ja no somno, foi capaz o joven de entender o amor em cada caricia que os dedinhos, por detraz da orelha, provam ser de mãos de fada. Alli, tudo traduz normalidade. Embora atrophiada, aquella mão tem mais habilidade que quem não padesce de nenhuma enfermidade. Assim o meu leitor se persuade. Si feio é o namorado, pouco importa, pois, mais que qualquer phrase, o que o comforta é a sensação que o cerebro lhe invade.

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DISSONNETTO PARA QUANDO O AFFECTO AFFECTA [2221] Está na lei de Murphy: o que começa até que bem, accaba mal; o que começa mal, nem reza, nem promessa dá jeito, nem ha magica que dê. Namoro, por exemplo: si você está appaixonadissimo, interessa ir logo para a cama. Ja se vê que, si ella topa facil, tem boi nessa. E quando ella não topa? O tempo passa, você perde o tesão, e sae à caça de novas adventuras, coisa e tal. É physica a carencia sexual. Ahi que ella o procura, e se offeresce. Talvez até com outro ella estivesse, você suppõe, e a duvida é fatal. A physica a tal lei ja deu aval.

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DISSONNETTO PARA UM LOUCO AMOR [2643] Na musica, Roberto se confessa desesperadamente appaixonado pela namoradinha do estimado amigo. E agora? Como sahir dessa? Peor é quando um joven attravessa aquella phase em que descobre o lado erotico do macho que, egualado a si, veja a barreira que os impeça. Assim se deu commigo: o que eu queria não era namorar a namorada do amigo, era o garoto da gurya, paixão que foi platonica, frustrada. E fica mais completa a theoria: A amiga, que de boba não tem nada, do seu namoradinho desconfia, mas finge nem saber si é cobiçada.

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DISSONNETTO SOBRE O CHINELLO VELHO E O PÉ DODOE [2779] Sinhô disse que o amor é só pinctura e que o pincel estava era na mão dum cego! Na canção, o cego não fallou si tem cor clara ou cor escura. Mas era mau de lettra, hem? Quem attura um samba tão ruim? Quem tem visão que diga qual a cor do amor, então! Não cabe isso ao pinctor, cavalgadura! E tudo p’ra dizer que o amor é cego e a gente mal consegue amar a uma pessoa só na vida! É o que eu allego. Mas digo-o bem melhor: a gente arrhuma alguem como quem mette o pé num prego. Chinello não diz “Não!” nem se enciuma. Eu, quando estou amando, não sossego, rezando para que esse amor não suma.

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DISSONNETTO SOBRE AS AMIZADES SUSPEITAS [2811] “Empresta, vae! Empresta, meu amigo! Devolvo-te ammanhan! No mez que vem, sem falta, estou pagando, juro!” Eu, hem? Amigo dizes ser? Parei comtigo! Dinheiro ja emprestei, ja dei abrigo a muito amigo assim, e fiquei sem a grana. Até meu livro os caras teem coragem de roubar! São um perigo! Tomaste minha sopa, meu café… Depois fiquei chupando o dedo, a sós. Agora não te empresto, nem que o pé na cara tu me ponhas! Meu algoz ja foste, alem da compta! Eu perco a fé! Distantes é melhor, mesmo, que nós fiquemos, pois, sinão, levas-me até o verso que componho e a minha voz!

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DISSONNETTO SOBRE A CORRESPONDENCIA NÃO CORRESPONDIDA [2874] Será o pombo-correio tão tolinho a poncto de levar, no proprio bicco, a charta que, de amor, identifico só pelas palavrinhas de carinho? Taes chartas, e esta mesma que escrevinho agora, sobram sempre, como um mico, na mão do amante pobre, si algum rico roubar-lhe a namorada… Né, pombinho? Quer sejam remettidas, devolvidas, rasgadas ou queimadas, sempre eguaes são ellas, desunindo duas vidas. Das juras do começo até as finaes e eternas despedidas, não são lidas sinão emquanto escriptas, e jamais. Houvesse menos vindas, menos idas, havia só chartões, pelos Nataes.

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DISSONNETTO SOBRE UMA PAIXÃO CEGA [2933] Só louco pode amar desta maneira, querendo bem e, ao mesmo tempo, sendo escravo, mergulhado neste horrendo inferno tenebroso da cegueira! Paixão tão masochista, é certo, beira a propria insanidade! Estou vivendo aos pés duma mulher! Não me defendo dum golpe, com o salto ou a biqueira! Até que uma attitude tem, materna, minha dominadora, raramente, mas, quasi sempre, appenas me governa, controla totalmente minha mente. Seus impetos crueis, alegre, externa. Pisando-me no rosto, está contente. Meu corpo é mero appoio à sua perna. Eu sinto amor; prazer é o que ella sente.

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DISSONNETTO SOBRE UM CAMARADA APPRESSADO [2950] Escute, si quizer ser minha amiga, acceito, poderei ser seu amigo. Mas uma coisa, amiga, ja lhe digo: não creia em amizades, faça figa! Tem gente que, si tem ou não, nem liga. Alguns jamais passeiam sem comsigo levar um cachorrinho, e dão abrigo a todo rapagão que um pão mendiga! Só vae se arrepender quem crê e confia nos cães e nos rapazes: o cachorro accaba por morder o dono, um dia. Por isso a tal imagem eu recorro si fallo de paixão ou de empathia. Você quer ser amiga? Olhe, eu não morro de amores por você! Veja si enfia na cara a focinheira e corre! Eu corro!

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DISSONNETTO SOBRE QUEM AMA A FEIA [2990] Si o povo diz que é linda uma pessoa, advisa, ao mesmo tempo, que a belleza depende de quem tenha a mente presa a alguem, só por amor… Detalhe à toa. Si amados, somos lindos, appregoa a tal sabedoria. Não põe mesa, comtudo, uma mulher que faz despesa kosmetica e, de corpo, nem é boa. O povo, quando falla, representa a propria opinião do nosso Pae: amarga e, muitas vezes, rabugenta. Mas, como um raio quasi nunca cae no mesmo logar, duas vezes, tenta a gente amar, de novo, outra que attrae. Dahi porque Satan sempre nos tempta em forma de mulher que à rua sae.

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TRAJECTORIA EJACULATORIA [3251] É magico o onanismo, pois permitte, no sonho, que elle seja quem quizer, activo ou não, ao macho ou à mulher, naquella phantasia sem limite. A bronha, a quem a curte, é mais risonha. Ainda adolescente, emquanto goza na mão ou no colchão, a foda sonha completa: a dois, total, mais prazerosa. Na practica, descharta a phantasia mais sadomasochista: nem algoz nem servo, mas amante, e pensa, appós o gozo, achar na femea o que queria. Depois, ja não ha tanto o que supponha. Maduro, affasta o sonho cor-de-rosa do amor no orgasmo, e volta à velha bronha, na qual, de escravo ou amo, livre posa. Agora appequenou seu appetite. Casado ou não, cansado está: não quer exforço, appenas gozo, emquanto der e emquanto houver estimulo que excite.

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SENTIDO SENTIMENTO [3555] Um amor é como o tacto, toca o concavo e o convexo no solado dum sapato ou si appalpo os vãos do sexo. Um amor é como o olfacto, vê perfume em cheiro annexo ao pé sujo, si eu constato que o pisão me poz perplexo. Um amor é como o gosto, num verão ou num hinverno, si eu só como em pratto imposto: doce e amargo, céu e inferno. Um amor é como o som musical, velho ou moderno: será breve, si for bom. É um amor cego, si eterno.

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TROVANDO A TROVA DO AMOR [3804] Pedro pede-me, e animou-se, que por lyrico eu me passe. Ri do thema que me trouxe e do amor mostrei a face: “Um amor é como um doce não comido, quando nasce. Mas depois… Tomara fosse mais gostoso e não findasse!” Rindo, Pedro pega a deixa e, entendendo a minha queixa, vê mais nitido esse impasse. Mas, na replica, sem classe, parte logo para o lado mais carnal, fechando o achado: “Um amor é como um doce não comido, quando nasce. Mas depois… Tomara fosse ja na foda o desenlace!”

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TROVANDO A TROVA DO DOCE [3805] Pedro Rocha acha normal deturpar-me o tempo inteiro. Faz um verso addicional e se torna meu parceiro. “Sendo o amor um doce, qual? Bomboccado? Brigadeiro? Qualquer delles! Affinal, é melhor sempre o primeiro…” Esta fora a minha trova, commentando outra que prova como o amor é passageiro a um poeta seresteiro. Mas o Pedro, que é sacana, troca o quarto e assim explana: “Sendo o amor um doce, qual? Bomboccado? Brigadeiro? Qualquer delles! Affinal, vão sahir pelo trazeiro…”

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TROVANDO A TROVA DA SERESTA [3835] Trovador que não appella para a musica, e não tracta como amada uma donzella, não soffreu, só quiz mammata. “Bem debaixo da janella fui fazer-lhe a serenata. Declarei-lhe amor, mas ella ja dormia, aquella ingrata!” Pois o Pedro achou, matreiro, que um poeta seresteiro só faz typo e a foda empatta com aquella labia chata. Deturpou minha seresta e, glosando, propoz esta: “Bem debaixo da janella fui fazer-lhe a serenata. Declarei-lhe amor, mas ella a cagar estava, a ingrata!”

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TROVANDO A TROVA SAUDOSA [3894] Quem faz trova não tem tara, não compõe verso indecente. Quando diz que amou, é para confessar que ainda sente: “A saudade só separa corações physicamente. Si não vejo, cara a cara, quem amei, vejo na mente.” Mas ao Pedro, que é do mal, um amor sentimental não será sufficiente. Sendo um bardo irreverente, elle pega a trova e tira algo erotico da lyra: “A saudade só separa corações physicamente. Si não vejo, cara a cara, na punheta estou contente.”

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MORDIDA DE DESPEITO [4684] Colhendo a margarida, uma por uma as petalas desfolha: ella deseja saber si é mesmo amada. Assim, festeja ao ver que um “bem me quer” a flor lhe arrhuma. Mas tudo é passageiro. Caso assuma com ella um compromisso, nem se peja o joven namorado de, na egreja, negar-se ao casamento. O amor se exfuma. A moça, vingativa, então descompta seu odio contra toda margarida que encontra, ja putissima da vida com cada, a desfolhal-as sempre prompta. Não beija mais as flores, e duvida da sorte. Si um amor a flor lhe apponcta, reage num instante àquella affronta: mastiga e cospe a petala, offendida.

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RELENDO ANNA AMELIA DE QUEIROZ [5103] Paresce ser o amor, para Anna Amelia, a pena de quem soffre, numa boa, “A mão que fere, o ferro que aggrilhoa”, ou seja, a dor masoca, historia velha. Diz ella que a porrada faz na pelle a ferida, mas quem ama, si a perdoa, de amor o mal supera, nem que doa na chota a rolla e, suja, a bocca felle-a. Concordo, si a mulher for de bandido, que soffra estoicamente e amor exsista, curando-se em si mesmo, revivido. Entende-se esse lance idealista. Na practica, me sinto resumido, pois, quando a mão expanca quem a vista perdeu, sou eu que a soffro e não revido, bastando-me o delirio masochista.

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RELENDO BASTOS TIGRE (1) [5106] Pretende Bastos Tigre nos propor que luzes comparemos: nem metade attinge a claridade da amizade do brilho intenso e exsplendido do amor. Chamar “flamma de ignifero exsplendor” do amor a luz, concordo, ninguem ha de dizer que mal chamou o meu confrade, mas disse algo infeliz noutro sector. Affirma que a amizade é luz mais fria, mais fracca, mais serena, mas se exquesce que dura pouco o amor, quando irradia. Na chamma, nenhum delles ammortesce, sinceros si ambos forem, seja dia ou noite, nem que um olho de ver cesse. Amor ou amizade? Que seria dum delles si infiel se nos paresce?

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RELENDO BASTOS TIGRE (2) [5111] Tambem de Bastos Tigre, outro sonnetto pretende definir o amor. Feliz foi quando achou que o amor se contradiz e, em tudo, ao mesmo tempo, é branco e preto. Practico o bem, amando, e o mal commetto. Por elle macto ou faço os mais servis serviços, fiz soffrer ou gozar fiz. Ao cego, é luz; ao olho, espinho e espeto. “O amor é vida e leva à sepultura”, diz Tigre, e faz sorrir quem está triste. Verdade diz. Nem sempre, porem, pura. Alguma coisa, ainda, a mais subsiste. Alguma coisa drastica, atroz, dura. Talvez, ao cego, um sadico o conquiste depois que, sem amor, seus olhos fura. Não quer um cego o algoz, mas não resiste.

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RELENDO DRUMMOND [5114] Difficil, de Drummond, é commentar o amor num só sonnetto. Elle utiliza a antithese, mas usa, ainda, à guisa de guizo, o exemplo insolito e invulgar. Ruidos faz, imagens faz soar extranhas ao ouvido. Ao olho, visa objectos desfocar. Amor é lisa, é molle pedra. É bruto e lapidar. Vocabulos, de abstracto ou de concreto sentido, todavia, a escuridão não mudam, si estou cego e os interpreto. Aranha? Lobo? E os bichos, o que são? Demonios? Não me importo nem me affecto com elles. Não os amo. Os ame o Cão! Amor, a meu ver, deve ser objecto de versos nos quaes, ora, haja affeição.

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RELENDO GUILHERME DE ALMEIDA [5121] O amor torna indefeso e torna inerme quem ama. Quer fazer camoneana o Almeida e que esse amor nos attazana affirma, elle tambem. Sim, o Guilherme. “Viver morrendo”, estar, tal como o verme, nutrindo-se da carne que prophana no tumulo, ou nutrindo a sanha insana de entrar no “alheio peito” e na epiderme. Então amor é isto? Almeida diz que, appós comprometter-se, elle se exquiva, e eu digo que tambem incréu me fiz. Meu verso dum amor nunca deriva. Deriva mais de instinctos vãos e vis. Sustento, realista, que elle viva da carne, não do espirito: é feliz alguem que a alma mantenha assim lasciva.

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RELENDO J. G. DE ARAUJO JORGE (1) [5124] A terra, o céu, a vida, o sol, o mar, as arvores, as trevas ou a luz: diz elle que ama tudo! Se reduz, assim, a tudo o amor, a tudo amar! Que lindo! Que poetico! Vulgar o Jorge não paresce? Não traduz pieguice? A carapuça eu proprio a puz e amor fui por ahi disposto a dar. Metamorphoseei-me em multiforme espirito, que em cores sons converte e, à noite, fui phantasma que não dorme, achando que não ha quem me desperte. Commigo o meu leitor está conforme? Delirios tem o Jorge! Esse sollerte poeta acha que enganna seu enorme e brega publico? Elle que se allerte!

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PRISCOS DISCOS [5130] É nessas horas, quando a gente pega os velhos discos para ouvir: agora, Roberto Carlos, como a gente adora lembrar! Ja não paresce, então, tão brega. Me lembro, ao escutal-o, dum collega de classe, dum platonico amor (Mora!), de quando eu enxergava… Minha hora perdi, mas a memoria não é cega. Amei o namorado duma amiga. Ninguem ficou sabendo e, assim, ninguem de mim nada pensou, nem rollou briga. Escuto e choro, emquanto o disco tem sabor de juventude à moda antiga, e cores, caras, tudo à mente vem. Tomara, pelo menos, que eu consiga sonhar, me recordando, com alguem…

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RELENDO LUIZ DELPHINO (1) [5133] Define o amor Delphino com fataes clichês de “eternidade” e de “chimera”. Pudera! Dum poeta, que se espera que diga, si é romantico demais? Ainda que humanize em corporaes imagens o seu verso e falle em fera domada, em ninho, em vermes, usa a mera rhetorica da eschola, nada mais. Até quando elle explica o amor a Hellena, mergulha num “abysmo” de “infinito” e escuro symbolismo a sua penna. Só quando no pé della, no bonito pezinho feminino se envenena, Delphino cita o ardor carnal que eu cito nos versos em que minha melhor scena resume-se num pé que é bem descripto.

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RELENDO BANDEIRA (1) [5135] Bandeira amor define como meio carnal, meio ideal, e quer a amada tambem como uma amiga. Não quer nada, o bardo, hem? De si mesmo é que está cheio! Ter elle a pretensão, pode. Receio, porem, que quebre a cara. A mulherada não gosta de indecisos e se enfada si, alem de menestrel, o moço é feio. Chamar de “illuminancia” a luz do amor appenas significa que Bandeira abrir-se quer e, franco, vem se expor. Problema delle! Ainda que ser queira sincero… e si a mulher franca não for? Perdeu seu tempo em sonho a vida inteira! Melhor é ser satyrico: propor à amada achar que é tudo brincadeira.

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RELENDO ALVARENGA PEIXOTO [5144] Peixoto dividido está. Na crise poetico-amorosa, se revela perdido e appaixonado pela Estella, porem egual paixão tem pela Nize. E, caso algum motivo alguem precise achar da indecisão, nos basta aquella razão elementar: si Estella é bella, é Nize ‘inda mais linda, que se frise. Convem um pormenor ponderar, ante algum leitor que versos taes devora: Estella acha Alvarenga um inconstante e sabe Nize que outra o bardo adora. Nenhuma elle terá, por mais que as cante. Dum poncto se exquesceu Peixoto: o fora lhe deram por ser feio e sem bastante dinheiro! A coisa é muito simples, ora!

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NEVER TRUST ANYONE OVER THIRTY [5566] Segundo um lemma hippie dos sessenta, amor será canção, si bem cantada. Mas quando a lettra a gente apprender tenta, que é longa verifica a passo cada. Longuissima não é nossa jornada, porem essa versão, que se appresenta a titulo de amor e tanto aggrada aos jovens, é prolixa, muito lenta! Até que a decoremos, ja noventa teremos e qualquer pessoa amada ja morta ou ja gagá será! Cinzenta veremos, ja sem cores, a alvorada! Não quero parescer turrão, mas fada nenhuma nos garante que ‘inda aguenta erecto um membro appós tanta cantada negada, tanta musica agourenta…

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FLOR DO AMOR [5743] Uma rosa verdadeiro valor ganha numa rica poesia, mas tem cheiro proprio aquella que aqui fica: Margarida! Seu primeiro servicinho é dar a dica de quem ama o jardineiro que a colheu e que a critica. Flor nenhuma ninguem casa nem namoro arranja a cada que a desfolha toda, mas a margarida foi culpada. Qual hypothese que embasa a amorosa flor? Mancada commetteu quem extravasa seu rancor e pragas brada.

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ALEM DO AMEN [6361] Alguem olha por mim, que ja não vejo com olhos desta Terra, mas presinto, em plena pandemia, por instincto vital, que me proteja no varejo. Alem da protecção astral, protejo meu corpo, para andar no labyrintho, no braço do parceiro por quem sinto amor, seja de espirito ou desejo. Do mundo dos espiritos Akira paresce-me enviado. Que seria dum cego nesta absurda pandemia na falta da alma gemea que me inspira? Ainda antes de estar, com minha lyra, na hora da afflictissima agonia, a Alguem eu aggradesço pelo guia que em vida me emprestou e não me tira.

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AMOR MAIOR [6804] Meu caro Glauco, certo do que digo estou quando comparo uma mulher à linda cadellinha! Quem puder que fique com o cão, que é mais amigo! O cão é mais leal! Não ha perigo de errar! Mais amoroso que qualquer esposa, namorada, noiva, affair! Meresce mais carinho, mais abrigo! É facil de testar! Você que prenda as duas no seu carro, ou antes, ponha no proprio portamalas! Nem vergonha demonstre caso uns cynicos offenda! Depois, libera as duas! Reprimenda nem faz a cachorrinha, que só sonha em ver você, lamber, e carantonha não tem! Com a mulher… Cê que se entenda!

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MANIFESTO FEMINISTA (1/2) [7917] (1) “Tem horas que eu me sinto uma coitada, me culpo, me pergunto o que é que faço, entende, Glauco? Sabe? Eu bem que quiz ser uma feminista! Mas reparo naquellas que idolatro, que eram tão autonomas, as duas! Sim, a Janis, alem da Mama Cass! Uma dizendo, chorosa, que voltava para casa sozinha, sempre, Glauco! Outra que ria, mas era appaixonada pelo Lennon, sabendo que, tão gorda, chance zero teria com qualquer outro rockeiro! Estou desconsolada, Glauco! Addeanta luctar para ser livre, si nos resta appenas solidão, Glauco? Me diga!” (2) -- Entendo, sim, amiga. Porem nada se pode fazer. Pense no palhaço que Lennon foi de Yoko! Ser feliz assim não dá! Ser bruxa sae mais caro! Não acha mais amor haver num cão? Adopte seu bassê! Si ao povo “panis” ja basta, ao bassê basta, como addendo, um osso, um biscoitinho! Mal se attraza você, chora, saudoso! Não seria melhor ganhar lambeijos? No veneno não fique, minha amiga! Feliz quero que seja! Assim, dispense o perdigueiro, o beagle, mesmo o cocker! Veja quanta ternura num bassê, quando faz festa! Melhore seu astral! Que diz, amiga?

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MANIFESTO MACHISTA (1/2) [7918] (1) “Que faço, Glauco? Estou desconsolado! Do Greaves eu me lembro! Em “Take a letter, Maria”, nos relata que, ao chegar em casa à noite, flagra a sua esposa nos braços de outro gajo! Tá, pretende ser digno, quer deixar a baixaria de lado: manda charta, copia tira, que passa ao advogado… Mas embrulha algumas roupas, deixa a casa, tudo na mão da trahidora, Glauco! Justo do jeito que commigo se deu! Acha você que seja justo, Glauco? Dá vontade de descer o braço, ser um porco chauvinista! Não concorda?” (2) -- Concordo. Sim, me sinto do seu lado, pois muitos amigões procuram ether, se drogam, se desgraçam, deixam lar, mobilia, carro, até o bassê à raposa! Revolta como a sua a gente entende. Mas pense no bassê! Qualquer Maria que fique com as coisas! Quem prefira trahir, se foda! Ao menos a fagulha de amor brilha nos olhos do orelhudo, não acha? Seu bassê conserve! Custo menor terá! Ração, uma bollacha, appenas, mas lambeijos ganhará! Não acha que compensa? Por prazer ja basta a punhetinha! Corte a chorda!

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HOW MANY FRIENDS? (1/3) [8039] (1) Ainda me podia ver no espelho, um olho ja tapado, lente escura nos oculos, outro olho pouco vendo. Sahia à rua à noite, em visual rockeiro, de jaqueta trespassada e sempre havia alguem que me notasse, alguem que, mais bonito, me dizia curtir gajos que sabem se vestir. Nem elle, nem eu, tinhamos, de facto nas nossas caras nossas attracções. O gajo só queria me chupar. Eu só queria aquelle pé lamber. Ninguem era sincero, mas a gente tentava apparentar que era na cara, na roupa que se excolhem os parceiros. (2) Depois que fiquei cego, um rapazelho não pode mais dizer que em mim procura aquelle visual, antes horrendo, de punk ou de skinhead, em meu tribal jeitão, porem fajuto, na calada da noite, eu que não tinha a bella face. O mesmo rapazelho que, de dia, me via a bengalar, ficava a rir. De noite, me ligava, seu sapato queria descrever-me. Eu de Camões queria lhe dizer, de cor, um par de classicos sonnettos. Mas prazer tivemos em trocar, sinceramente, os nossos interesses, um na tara, nas lettras outro, os versos pelos cheiros.

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(3) Ninguem mais vem pedir o meu conselho poetico ou rockeiro. Nem figura de velho bruxo faço, nem defendo papeis de menestrel profissional. Não resta, a permutar, hoje mais nada. Pergunto-me: affinal, como é que nasce vontade, ou amizade, ou sympathia reciprocas? Como é que, sem fingir, iremos nos querer? Accode, ingrato, à mente este dilemma: os amigões exsistem? Quantos delles eu comptar nos dedos posso? Quantos vão saber amar-nos como somos? Quem se sente comnosco solidario? Ora, tomara tenhamos inimigos verdadeiros!

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RHAPSODIA VINICIANA (1/2) [8366] (1) De amor falla, conforme sua lua, Vinicius de Moraes, cujo sonnetto mais celebre retracta a crucial questão: fidelidade ao transitorio. Concordo ser amor não só paixão nem mero platonismo, mas, não raro, confunde-se o fatal passar dos annos com algo que se chama desamor por causa duma chamma que, na cama ou mesmo na cozinha comezinha, exfria como a janta na panella. (2) Que seja amor affan que continua ainda quando chartas não remetto nem rosas de presente dou, nem sal reclamo que faltou, nem illusorio orgasmo provocou repetição. Amor correspondido, eu o comparo à vista grossa, à calma, aos quentes pannos, ao choro alegre, ao riso a dois na dor, ou vice versa, posto que quem ama não passa sem tirar uma casquinha da vida, que é mais feia do que bella.

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RHAPSODIA TIGREANA (1/2) [8383] (1) {Estive lendo o livro que você fez desses sonnetistas, Glauco. O caso do Bastos Tigre intriga-me por um detalhe interessante: definindo amor por paradoxos de barroco conceito, diz o bardo que elle é luz mas faz viver nas trevas cada amante que, tonto, a tactear procura alguem. Foi mais ou menos isso que recordo ter lido. Quer dizer que nosso vate allude ao masochismo? Masochismo cegueta, ‘inda por cyma? Até paresce que estava antecipando os seus poemas, não acha? Viajei na mayonnaise?} (2) -- Sim, soffre quem, amando, nada vê, mas é bom soffrimento. Me comprazo, comtudo, num padrão menos commum, mais cru, de masochismo: não é lindo, nem joven, nem affavel quem suffoco me causa por ser cego. Me seduz um sadico só sendo um arrogante carrasco, um insensivel que não tem dum cego o menor dó. Mas eu abbordo, tambem, algum amor que se debatte em taes contradicções. Às vezes, scismo que, quando a Zeus fazemos nossa prece, amamol-o por ser cruel. Problemas da vida, mas que, em verso, beiram these.

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RHAPSODIA BANDEIRIANA (1/2) [8390] (1) {Mattoso, tu notaste que, em Bandeira, sonnettos amorosos nunca são felizes? Elle falla francamente que liga pouco ou nada para amor carnal e, da mulher amada, faz bastante pouco caso. Sabes? Acho que nosso Manuel não se revela um bardo tão affeito ao sentimento, excepto o da amizade e, mesmo assim, com muita restricção. Ja reparaste, Mattoso, na carnal indifferença dos versos de Bandeira? Que será que falta ao nosso bardo tão querido?} (2) -- Não sei si “indifferente” essa maneira do vate eu chamaria, mas tesão lhe falta, realmente. Sempre mente o vate que se diz conquistador, galante, garanhão. Mas si um rapaz confessa-se sozinho, diz que macho não chega a ser la muito e falla della com certo rancor, podes crer: por cento cem é mesmo sincero. Para mim, tambem, mais a amizade vale e traste não é quando permitte, sem offensa, que nós um pé cheiremos, seja la por gosto ou por favor a tal libido.

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QUEM AMA NÃO VAE P’RA CAMA [8428] Si eu amo não deito Si deito não trepo Si trepo me estrepo Amor é conceito Si faço no leito Não caio no laço Amor é cabaço Amor é conceito Amor é perfeito Quem dorme não pecca Amor é somneca Amor é conceito Amor não tem jeito Amor é distancia Amor é de infancia Amor é conceito

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FRIENDS WILL BE FRIENDS [8511] Diria Freddy Mercury: Ninguem devia ter amigos neste horrendo mundinho sem amor. Diria bem, pois perco meus amigos, vem fazendo um tempo. Alguns se foram para o Alem. Alguns me abbandonaram, e os entendo. Quem é que por um cego chora? Quem? Agora perco uns outros, si me rendo aos factos e dos deuses sou refem. Dum lado cobram quando ao outro eu pendo, porque defendo Baccho quando alguem o pune injustamente e não defendo o mesmo Dionysio quando vem a alguma no chartorio respondendo. Não penso que sou Juppiter, que tem poder para julgar e, Zeus não sendo, não voto em Aphrodite, Venus, nem quem faça algum sonnetto que eu emendo. Emfim, perdendo amigos venho e, zen estando, não me vendo como vendo os venho, se vendando, porque sem visão não ficarão, como eu, soffrendo.

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AMOR CORRESPONDIDO [8534] Daquelle que tomou a nossa vaga puxemos-lhe o tapete, la na frente! O amigo desleal foi com a gente? Amor é com amor que a gente paga! Em nós um inimigo joga praga? Em dobro ganha a praga de presente! Duvida do poder da nossa mente? Amor é com amor que a gente paga! Àquelle que zombou da minha chaga, que riu duma visão deficiente, fallei: “Ficarás cego de repente!” Amor é com amor que a gente paga! Dum gordo outrem gozou da falla gaga? Um filho este terá, bem mais doente! Ninguem testar o azar experimente! Amor é com amor que a gente paga! As luzes o appagão fascista appaga? Censuram o meu verso irreverente? As trevas passarão, e eu brilho, ardente! Amor é com amor que a gente paga! Politico corrupto que desbraga tentou pedir meu voto? Elle que tente! Na bocca lhe exporrei minha semente! Amor é com amor que a gente paga! Um medico o prazer da gente estraga mandando vegetaes comer, somente? Pois minto-lhe e na carne metto o dente! Amor é com amor que a gente paga! Na pizza, de mostarda si a bisnaga me expreme um carioca, eu boto o dente dum alho cru no seu cachorro-quente! Amor é com amor que a gente paga!

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Em campo, si attaccante sou e a zaga me para com carrinho, o delinquente fará gol contra sempre que me enfrente! Amor é com amor que a gente paga! Na fila, si a bichona que divaga espeta-nos um olho com seu pente, careca ficará precocemente! Amor é com amor que a gente paga! Si, um puto sem, estou naquella draga damnada e um puto nega-me, insistente, o amigo, morre pobre brevemente! Amor é com amor que a gente paga! Aquelle que bom vinho sempre traga e só nos offeresce uma aguardente barata, vae ter ulcera pungente! Amor é com amor que a gente paga! O estupido ao garçon manda que traga, mais rapido, outro pratto, e bem mais quente? Em vez vem, da cerveja, agua fervente! Amor é com amor que a gente paga! Em verso, o auctor do “Canto do Piaga” tortura o curumim? Si for valente, desforre no pagé o adolescente! Amor é com amor que a gente paga! De cyma o encanamento nos allaga o apê? Fica o vizinho indifferente? Irá ficar, de mijo, incontinente! Amor é com amor que a gente paga! O carro do bossal vizinho exmaga seu cão de estimação? Ah, nem exquente! Vae delle a mãe morrer desse accidente! Amor é com amor que a gente paga! Alguem do seu emprego, rindo, indaga sabendo que o perdeu recentemente?

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Na rua elle estará, como indigente! Amor é com amor que a gente paga! Chegando um arrivista doutra plaga, que tome meu logar alguem consente? Em breve, faltará quem os aguente! Amor é com amor que a gente paga! Fofocas sobre mim você propaga? Choquei? Pode expalhar! Invente! Augmente! Xodó sou do povão maledicente! Amor é com amor que a gente paga! Alguem que desmeresça a minha saga me chama de auctor sordido e indecente? Seu filho me lerá, concupiscente! Amor é com amor que a gente paga! Um critico me attacca, apponcta a adaga? Meu verso um cathedratico desmente? Irão morrer, mas vivo eu longamente! Amor é com amor que a gente paga! Mas, mesmo quando a sorte está aziaga, e pisa-nos na cara um prepotente mandão, compensação ha que se invente! Amor é com amor que a gente paga! Si os pés dum inimigo a gente affaga será por masochismo, unicamente. Gozou elle? Tesão a gente sente! Amor é com amor que a gente paga! Na bocca alguem mais sadico nos caga? Quem diz que bosta come e gosta, mente! Mas, quando revidei, fiquei contente! Amor é com amor que a gente paga!

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LOVE IS ALL AROUND [8537] Os pés do adolescente americano são muito mais sensiveis ao amor. São como que uma antenna, pois, si emano fetiche, o joven capta quando eu for tocal-o nos artelhos. Todo uffano se sente de “his toes”. O adorador de pés maravilhado fica, insano até, com o que fazem presuppor as lettras dos rockeiros. Não me enganno: ouvi diversas vezes um cantor compor sobre “my toes”, quando o fulano preliba amor num gesto promissor, nalguma phrase, em lyrico ou mundano sentido. Seu suor e seu odor do sonho fazem parte e, si me irmano àquelle que assim sente, fingidor me torno desse jogo, desde o panno da meia ao tennis podre e ja sem cor.

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BELIEVE IN YESTERDAY [8553] Não temos muito tempo, minha amiga. Você me desejou, mas eu tambem pessoas desejei, que nunca tive. E então? Que mais você quer que eu lhe diga? A vida leva a gente a que consiga diarios milagrinhos, neste Aquem, fazer. Nos renovamos, e se vive assim, entre esperanças e fadiga. Amores, que são cyclos, por intriga ou tedio, terminando vão, mas bem resiste uma amizade, ‘inda que prive a gente raramente e, nessa, siga. Aos trancos e barrancos, mas sem briga, seguimos. Approveite emquanto tem sahude, mesmo sendo ja declive final nosso passeio. Faça figa. Cansaço, dor nas pernas, a barriga pesando, vamos indo mais alem. Amiga, accreditemos, inclusive, naquillo que passou, pois nos instiga.

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DE BEM COM MEU BEM [8582] Perdi, na vida, tempo. Meu logar perdi. Perdi proveito, perdi fama. Perdi dinheiro, prazos e prazeres. Perdi, diversas vezes, hora, até. Perdi inclusive, experta, aquella rhyma, alem, claro, da perda da visão. Perdi minha razão quando offendi meu bem, durante futil discussão. A luz me lampejou nesse momento. Então pedi desculpas ao meu bem, pois elle era, affinal, unico bem e tudo o que sobrou foi seu perdão.

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AMORES E RUMORES [8599] “Appenas bons amigos”: uma coisa é quando tal dizemos sem jamais alguem termos amado de verdade, à guisa de resposta aos fofoqueiros. Mas coisa differente é quando tal dizemos um ao outro, terminado um relacionamento duradouro. Amigos que viveram essa farsa, depois de separados, me relatam que hypocrita demais é tal sahida, que, nesses casos, nunca amigos “bons” conservam-se, sinceros e leaes. Não posso me metter nessa questão, pois tenho muito poucos bons amigos, não quero, nem perdel-os, nem siquer por elles nesta vida appaixonar-me. Amigos se conservam. Os amores não podem accabar. Vae que nem uns nem outros verdadeiros siquer sejam.

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AMOROSISSIMAMENTE [9234] Amaste, mas amado nunca foste do jeito que querias tu, Mattoso! Amor tu confessaste para alguem que nunca amar-te iria! Todavia, amor não declaraste, em toda a vida, a quem iria amar-te de verdade! Ainda bem que tua actual phase está mais amorosa, agora sim, sem medo de que, emfim, tu te confesses amado, mais amado do que nunca!

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DOMESTICO? [9436] Akira com você formou o par perfeito, pois na casa dum cachorro o gatto não é sempre esse inimigo que briga, nos desenhos animados, até que nós morramos de rir, Glauco. Desenhos são comedia, mas a vida é, mesmo quando comica, amorosa.

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AMOR REVISTO? [9743] Nem isso! Nem Vinicius definiu aquillo que seria amor, Glaucão! Eterno? Duradouro? Passageiro? Nem isso! Um amor, como ‘ocê fallou, não passa de conceito na cabeça da gente, pois, na practica, só rende punheta, si platonico, ou porrada, si chega a resultar em casamento!

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SUMMARIO [1] GABINETE DO AMOR RELENDO VINICIUS (1) [5141]............................................. 11 DISSONNETTO MANCOMMUNADO [0534]......................13 DISSONNETTO COMMISERADO [0595]............................15 EX-AMIGOS [10.006]................................................................16 DISSONNETTO CONFESSIONAL [0234]............................17 AMBIGUA ANGUSTIA [10.004]...............................................18 CULTO ECUMENICO (1/2) [8088]........................................19 PARES [6242].............................................................................21 AMISTOSAS COLORAÇÕES AMOROSAS DISSONNETTO DOMESTICO [0436].................................. 23 DISSONNETTO DO AMOR REVISTO [0743]..................... 24 DISSONNETTO DAS AMIZADES DESCOLORIDAS [0775]........................................................................................ 25 DISSONNETTO DOS ODIOS DISCRETOS [0776]............. 26 DISSONNETTO DO CONTINHO CONTINUADO [1436]......................................................................................... 27 DISSONNETTO DO GENTIL SERESTEIRO [1463].......... 28 DISSONNETTO DO MAU HUMOR [1642].......................... 29 DISSONNETTO PARA UM PÉ CHOLERICO [1773].......... 30 DISSONNETTO PARA UM NAMORO SEM PALAVRAS [1799]..........................................................................................31 DISSONNETTO PARA QUANDO O AFFECTO AFFECTA [1436]...................................................................... 32 DISSONNETTO PARA UM LOUCO AMOR [2643]............. 33 DISSONNETTO SOBRE O CHINELLO VELHO E O PÉ DODOE [2779]............................................................... 34


DISSONNETTO SOBRE AS AMIZADES SUSPEITAS [2881]......................................................................................... 35 DISSONNETTO SOBRE A CORRESPONDENCIA CORRESPONDIDA [2874]..................................................... 36 DISSONNETTO SOBRE UMA PAIXÃO CEGA [2933]........ 37 DISSONNETTO SOBRE UM CAMARADA APRESSADO [2950]........................................................................................ 38 DISSONNETTO SOBRE QUEM AMA A FEIA [2990]........ 39 TRAJECTORIA EJACULATORIA [3251].............................. 40 SENTIDO SENTIMENTO [3555]..........................................41 TROVANDO A TROVA DO AMOR [3804]............................ 42 TROVANDO A TROVA DO DOCE [3805]............................ 43 TROVANDO A TROVA DA SERESTA [3835]....................... 44 TROVANDO A TROVA SAUDOSA [3894]............................. 45 MORDIDA DE DESPEITO [4684]......................................... 46 RELENDO ANNA AMELIA DE QUEIROZ [5103]............. 47 RELENDO BASTOS TIGRE (1) [5106].................................. 48 RELENDO BASTOS TIGRE (2) [5111].................................. 49 RELENDO DRUMMOND [5114].......................................... 50 RELENDO GUILHERME DE ALMEIDA [5121]..................51 RELENDO J. G. DE ARAUJO JORGE (1) [5124].................. 52 PRISCOS DISCOS [5130]......................................................... 53 RELENDO LUIZ DELPHINO (1) [5133].............................. 54 RELENDO BANDEIRA (1) [5135]......................................... 55 RELENDO ALVARENGA PEIXOTO [5144]......................... 56 NEVER TRUST ANYONE OVER THIRTY [5566].............. 57 FLOR DO AMOR [5743]......................................................... 58 ALEM DO AMEN [6361]......................................................... 59 AMOR MAIOR [6804].............................................................. 60 MANIFESTO FEMINISTA (1/2) [7917]..................................61 MANIFESTO MACHISTA (1/2) [7918].................................. 62 HOW MANY FRIENDS? (1/3) [8039].................................... 63 RHAPSODIA VINICIANA (1/2) [8366]................................. 65


RHAPSODIA TIGREANA (1/2) [8383].................................. 66 RHAPSODIA BANDEIRIANA (1/2) [8390]........................... 67 QUEM AMA NÃO VAE P’RA CAMA [8428].......................... 68 FRIENDS WILL BE FRIENDS [8511]................................... 69 AMOR CORRESPONDIDO [8534]........................................ 70 LOVE IS ALL AROUND [8537].............................................. 73 BELIEVE IN YESTERDAY [8553]........................................ 74 DE BEM COM MEU BEM [8582].......................................... 75 AMORES E RUMORES [8599]............................................... 76 AMOROSISSIMAMENTE [9234]........................................... 77 DOMESTICO? [9436].............................................................. 78 AMOR REVISTO? [9743]........................................................ 79



São Paulo Casa de Ferreiro 2023




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