HORRENDA AGENDA
Glauco Mattoso
HORRENDA AGENDA
E OUTROS SONNETTOS
São Paulo Casa de Ferreiro
Horrenda agenda © Glauco Mattoso, 2024 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros ______________________________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA ______________________________________________________________ Mattoso, Glauco HORRENDA AGENDA E OUTROS SONNETTOS/Glauco Mattoso São Paulo: Casa de Ferreiro, 2024 112p., 14 x 21cm CDD: B896.1 - Poesia 1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.
NOTA INTRODUCTORIA A cada novo livro, me questiono accerca do que posso compor como prefacio si, na practica, só sommo sonnettos e sonnettos collecciono. Digamos que eu não diga que num throno sentei do sonnettismo, mas que eu domo o verso decasyllabo, pois tomo logar de quem se torna meu patrono. O posto que, na nossa Academia, exalta Antonio Lobo de Carvalho exige que eu me exmere em ironia. Nem só de prazer vive meu trabalho, emfim, eis que quem antes tudo via ja nada vê. Tambem à dor eu calho.
BIOGRAPHIA AUCTORITARIA Biographos dividem-se em questão bastante controversa: a minha morte. Uns dizem que morri sem que se importe ninguem, obscuramente. Eu digo não. Mas outros sabem onde meu caixão está. Dizem que rhuma toda sorte de gente para a tumba. Que eu comforte as mentes pedem muito os que la vão. Mandaram que eu morresse em soffrimento os sadicos biographos. Morri appenas em seus livros. Nem commento. Nos livros que escrevi, me encontra aqui quem queira procurar-me. Estou attento àquelles que não mactam nem sacy.
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JORNADA PROPHANADA No dia de Finados, verifica aquelle que visita algum jazigo que está tudo virado. Nem castigo dos Céus quem depredou teme, nem zica. Levaram todo o bronze e feia fica a tumba sem as placas. Quem comsigo parentes trouxe sente esse perigo nos ares. A familia a mula picca. Caveiras para fora, de mixtura com lapides pichadas, formam uma orgia que, maccabra, a praga augura. Com medo, o visitante em fuga rhuma à rua, mas tropeça, batte e fura um olho. O cemeterio cae na bruma.
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OTARIO SOLIDARIO Uns trouxas accreditam em você? Você tem o dever de ser alguem capaz de governal-os, Glauco! Tem sim! Elles o merescem, meu! Não vê? Sim, cada trouxa desses que lhe dê seu voto dá tambem o cu, tambem a bocca a penetrar, Glaucão, si bem que em senso figurado… Como? O que? Tambem acha que em senso bem concreto precisam os otarios levar ferro? Então ja foi alem do que interpreto! Emfim, você confirma que eu não erro? Entendo… Como cego, ‘ocê directo se ferra sem nem mesmo dar um berro…
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CONFUSO ABUSO Peguei um paralytico, Glaucão! Joguei no chão, sentei na cara, fiz lamber meu cu, meu sacco! Orra, feliz fiquei à bessa, Glauco! Que tesão! Não, claro! Não ficou só nisso, não! Mandei chupar! De sebo o seu nariz enchi! Soltei o leite e exigi bis, mettendo bem no fundo! Fui mandão! Depois fiz mais ainda! Fiz chichi na bocca do coitado! Foi um sarro total! Eu a valer me diverti! Achou que errei? Achou muito bizarro? Achou cruel demais? Um cego alli devia ser o objecto do que narro?
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PENSANDO E DISPENSANDO Às vezes me pergunto si eu devia pensar em coisas boas, em amor, somente, e si devia, aqui, propor só themas de bondade e de empathia. Accabo concordando que, por via de tanta atrocidade, fui auctor de versos indigestos, fiz suppor que é fera todo humano ser, um dia. Então sonnettizar o bem decido. Consigo, nos quartettos, só fallar dum anjo, não dum monstro ou dum bandido. Mas logo reconhesço o meu logar de cego, nos tercettos. À libido me entrego dos leitores, sem pensar.
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DOMINGÃO DO MENGÃO Foi, mesmo sem jogar uma rodada, a sorte do Flamengo muito boa. Ainda que qualquer rival se doa, deu tudo certo, um ferro para cada. Um perde, empatta aquelle. A coisa aggrada ao povo flamenguista. Não à toa a midia accusa a fraude e, na pessoa dum arbitro, um placar vira piada. Roubaram? Não roubaram? De concreto, ficou o resultado bem de jeito às comptas do Flamengo. Nem me inquieto. Fé tenho que, a despeito do suspeito jeitinho, o Fla na proxima, completo, dá sopa ao chocolate, e eu me deleito.
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DIA DO BARBEIRO Emquanto do barbeiro na cadeira estou sentado, o gajo põe o dedo na minha bocca. Ahi, meus labios cedo ao toque e quasi chupo o que elle exgueira. Malicia tem o gajo. Costumeira acção é excanhoar, mas esse enredo deturpa-se si lambo, ja sem medo, o dedo que, da bocca, roda à beira. Escuto o que o barbeiro me cochicha ao pé do ouvido: {O cara, alem de cego, alem dum infeliz, é tambem bicha?} De lingua, affirmo. O gajo diz: {Eu pego você, entendeu? O dedo não exguicha, mas sim a rolla! Disso me encarrego!}
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CHORÕES E FOLLIÕES Ainda que estejamos ja doentes e edosos, sem familia, sem amigo, nós temos um amor, que mal consigo conter, por sermos ‘inda aqui viventes. Ainda amor à vida, pelos dentes risonhos, a caveira traz comsigo. Ainda amor à vida algum mendigo demonstra, si se lembra dos parentes. Tristeza sem remedio nós sentimos por terem ja morrido nossos paes ou mesmo nossos thios e nossos primos. A festa alheia cala nossos ais e irão, dos carnavaes, mais e mais rhythmos calar nossos suspiros terminaes.
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DESATTRAVESSANDO BILAC {Flor ultima do Lacio, inculta e bella, a um tempo és exsplendor e sepultura, nativo ouro que, em sua ganga impura, a mina entre os cascalhos, bruta, vella!} {Assim, desconhescida, te amo, obscura, clangor de tuba, lyra a mais singella, que tens o trom e o silvo da procella e o arrollo da saudade e da ternura!} Bilac errou no rhythmo, pois accyma deviam os quartettos ter ficado. Errou, mas de proposito, se estima. Si eu fosse rigoroso, para aggrado de mestres mais cricris, até na rhyma mudava alguma coisa. Mas me enfado.
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POUCA PORCARIA É BOBAGEM Um filho quem não queira adopta algum bichinho, um cão, um gatto, uma gallinha, até. Mas eu sciencia ‘inda não tinha de coisa assim, aqui tão incommum! Sim, porco! Uma mulher adoptar um quiz, Glauco! Ja pensou? Não é gracinha um bicho desses solto na cozinha, na salla, até no quarto! Que fartum! Não, nisso não pensei… Então o cheiro do porco tem erotico condão? Será por dar idéa de chiqueiro? E si ella se deitar com o leitão? Aquelle parafuso cabe inteiro na chota? Virgem sancta! Pode, então?
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DIA DO INVENTOR Me inveje, que inventei uma maneira de grana fabricar em casa, mano! Contar vou em segredo, mas uffano me sinto! Ninguem tanto se endinheira! Usei “intelligencia”! Foi certeira! Sim, “artificial”! Eu os enganno a todos direitinho com meu plano! Contar vou, mano, caso saber queira! Produzo desses dollares um monte e expalho na favella! Genial idéa, né? Quer, mano, que eu lhe conte? Não, dollar é melhor do que real! Menor suspeita attrae! Mas, no desmonte, eu troco por moeda nacional!
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DIA DA FAVELLA Tão grande, esta favella, que dá até um jeito de dinheiro proprio termos! Sim, “dollar nacional”! É nesses termos que chamo o trocadinho da ralé! Nós mesmos fabricamos, Glauco, ué! Assim temos um jeito de comermos! Assim a gente tracta dos enfermos e compra arroz, pheijão, até filé! É facil! Imprimimos o papel moeda alli na casa desse mano que emprega IA na veia, menestrel! Ficou dollarizado tudo! Um panno nos passa a auctoridade! Coronel nenhum deixa que entremos pelo cano!
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NOW AND THEN Não, Glauco, não gostei. O mesmo tom fatal de marcha funebre, egualzinho àquelle que, na ANTHOLOGY, vizinho achei dum decadente e esteril som. Aquillo que sobrou dos Beatles, com total boa vontade escutei, vinho bebendo, mastigando um biscoitinho, mas, finda a audição, nunca achei tão bom. Jamais, nem Paul, nem Ringo, poderá a audaz beatlemania que, dansante, curti, recuperar, meu camará! A vida que me resta aqui, durante, ouvindo ficarei discos que ja mal soam, no vinyl, mesmo que eu cante…
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BURACO NEGRO É claro que é racismo, Glauco, usar o negro para tudo que é expressão! Ora, acham tudo negro! O cambio não é branco, nem aquella area estellar! Por que “buraco negro”? Um similar systema poderá ser dicto, então, “buraco branco”? Como ficarão mil outras expressões do linguajar? Eu acho um preconceito que “buraco” ja seja termo usado para tudo, pois rhyma, caro Glauco, com “macaco”! Poetas nem deviam (e não mudo meu modo de pensar) rhymar, destacco, “tesudo” com “bundudo” ou com “beiçudo”!
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CREME ANTIEDADE Abrir irei a griffe mais careira daqui deste paiz, Glaucão! Duvida? Um creme venderei que dará vida eterna à velharada ja na beira! Sim, mesmo que na cova alguem ja queira pensar que tem um pé, minha alludida pommada tornará mais parescida com pelle de bebê sua caveira! Farei de margarida negra aquella especie de kosmetico, Glaucão! Que é facto uma pesquisa ja revela! Ouviu da flor fallar? Ainda não? Não torna alguma feia cara bella, mas joven tal caveira achar irão!
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NAMORADA AMMEAÇADA Namoro um delegado, Glauco, mas tentei me separar. Elle não quiz. Ligou, ammeaçou. Com medo, fiz aquillo que exigia, ja sem paz. Mulher bem masochista sou, por traz da face empoderada. Assim, seus vis propositos temptei com meus gentis accenos. Dei-lhe, emfim, o maior gaz: -- Tá certo. Ja mudei de idéa. Agora perdão vou lhe pedir, adjoelhada, ja prompta a chupar, quieta, a sua tora… Ah, Glauco, o cara agora me dá cada tapão nas fuças, pondo para fora a rolla! Ah, nem contar irei mais nada!
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APPAGÃO NO QUARTEIRÃO Ficou o quarteirão sem energia appós o temporal. Commerciante zeloso, o gajo chia: “Quem garante que tudo se congela por um dia?” Nos outros quarteirões, uma follia damnada repercute com bastante barulho. Uma gallera faz, durante a festa, gozação ao tal que chia: {Ahê, ficou na treva? Até paresce aquelle escriptor cego que só chora, emquanto nós gozamos seu estresse!} O tempo passa. Aquelle auê peora o drama do subjeito. Nem a prece resolve. Então, dá berros porta affora.
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DIA DO CINEMA BRAZILEIRO Ainda a achar estou que é magistral “O caso dos irmãos Naves”, Glaucão! Em termos de tortura real, não ha nada que filmado foi egual! Fiel que foi ao livro, mas com tal sadismo ao descrever cada sessão de innumeros supplicios, um tesão não causa, a não ser como onus do mal! Comtudo, não podemos ignorar caseiros casos, como o lynchamento em Matto Grosso, um celebre exemplar! Queimados vivos, scena que nem tento narrar, em Matupá teve logar um curta do mais longo soffrimento!
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DIA DA LINGUA PORTUGUEZA Mais datas tem a lingua para alguem poder commemorar, mas quando penso nos erros do povão, sinto um immenso desgosto, Glauco! Sentes tu tambem? Ja tantos mencionei, mas um, que vem bastante me irritando, o proprio senso commum aggride: é “sobre”, ja que extenso emprego como “sob” obtido tem! Não quero que tu “sobre” meu poder estejas, nem que “sobre” tal adspecto tu sejas meu escravo, por prazer! Te quero “sob” as solas, qual insecto que piso, comprehendes? Escrever uns versos “sobre” irás! Bem te interpreto?
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DIA DO PROTHETICO Você se lembra, Glauco, duma scena de filme em que, no coppo mergulhada, estava a dentadura? Alguem, do nada, bebeu, sem reparar, dalli! Deu pena! Deu nojo, tambem, claro! Mas amena a scena me paresce, pois vi cada absurdo que, aos luxentos, não aggrada nadinha, mas aqui ninguem condemna… Aqui na minha casa, todo mundo ja protheses tem! Ficam na gaveta, às vezes se confundem… Bem immundo! Não ria de mim, Glauco, me prometta! Contou-me meu avô, com ar jocundo, que tinha a do thio gosto de boceta!
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SABOTAGEM Depois dum temporal, não se religa nem agua, nem luz, Glauco? Uma demora tamanha não se explica! Vou, agora, dizer: é sa-bo-ta-gem duma figa! Não, Glauco! Sempre que essa mão amiga de esquerda age em protesto ao que vigora nas coisas do governo, vae-se embora o justo lado, vale que se diga! Irá privatizar? Não privatiza? Emquanto se debatte, ja approveita alguem um temporal, de causa à guisa! Ahi falta a agua, a luz… Uma suspeita recae nos syndicatos, mas precisa provar (Né, Glauco?), ou nada a midia acceita…
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DIA DO RISO Si estou num ambiente mais fechado, com menos gente extranha ao meu redor, provoco só sorrisos. Na peor hypothese, gargalha alguem mais sado. Mas, quando pela rua ando, coitado do cego que vos falla! Do menor tampinha ao marmanjão, provoco mor risada, da gallera para aggrado! Si cara de palhaço tenho, ou si appenas a cegueira dá motivo ao sarro, nada ainda concluí. Mas, quando dos moleques não me exquivo e levo uma rasteira, até chichi me fazem!Tenho sorte de estar vivo!
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SERMÃO CHRISTÃO Palavras, Glauco, ouvi taes dum pastor: “Irmãos, nós a Jesus vamos orar bastante, todo dia! Ha que evitar que esteja, a nos temptar, um peccador!” “Sim, temos que exsecrar o gay! Quem, por ser gay, peccou, que soffra! Deve estar ainda vivo quando, para azar seu, numa cova a morte encontrar for!” Se escuta apparte, Glauco, dum fiel: {Sim, isso mesmo! Vivo deve ser um desses enterrado! Horror cruel!} Então, outro fiel diz: {Sim, poder tal temos! Que elle chupe, para bel prazer nosso, bem antes de morrer!}
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DIA DO OUVINTE Eu acho que meresço uma attenção maior daquellas radios! Ninguem toca mais Beatles, Glauco! Tocam, sim, em troca, só brega sertanejo! Oh, não, Glaucão! Eu dessas preferencias do povão não gosto! Ouça a gallera da malloca aquella porcaria! Sou fanzoca, ainda, da pauleira, do rockão! Si desse, eu toparia ser putinha dum desses dinosauros dos septenta! Victrola? Não! Está quebrada, a minha! Dependo só do radio! Mas quem tenta ouvir um desses classicos na linha dos Rolling Stones, chia! Ah, quem aguenta?
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DIA DA PREGUIÇA Na cama quando fico para alem da hora, Glauco, sinto uma vontade damnada de exporrar e, que me aggrade, não ha nada melhor que pensar em… Mammado ser, tal como si um nenen sorvesse meu leitinho! Uau! Me invade aquella sensação! Ah, meu! Quem ha de negar que, appós gozar, estarei zen? Bem, como me exporrei, a toalhinha procuro, mas não acho… Onde estará? Prefiro nem pensar… Preguiça minha! A porra logo secca… Ahi, virá de novo o somno… Durmo depressinha e, logo, o pau durinho ja me está!
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DIA DO URBANISTA Nas urbes, toda praça deveria dispor de cachorrodromo! Não acha, Glaucão? Nada de imposto nem de taxa! Terá que ser gratuito, noite e dia! Nos bairros mais selectos, a alegria seria do bassê, que só relaxa depois de ter ganhado uma bollacha, a aguinha, alem do beijo da tithia! Sim, mesmo o viralatta caramello teria seu espaço! Não, racista não sou e pelos pobres tambem zelo! Não, cegos não, Glaucão! Quem sua vista perdeu que fique em casa, de chinello, roupão e tudo! Seja realista!
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INTERSEX DAY Não, Glauco, não sou nada! Não sou homem, tambem não sou mulher, siquer sou bi! Nem sei por onde faço o meu chichi! Às vezes minhas partes até somem! Tampouco sou transgenero! Me tomem, talvez, por um rebelde ex-travesti, por uma transformista, pois sahi à rua, ja, affectando um lobishomem! Vampira ja tentei ser, sem successo! Meus dentes assustavam o freguez! Ao meu perfil viril, então, regresso! Não quero ter o corpo que vocês, cisgeneros, teem, Glauco, pois confesso que ET me sentirei, mais cada vez!
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VIRALIZANDO EM BANDO Meninas estão sendo, nuas, vistas em photos que, montadas, alguem posta nas redes. Claro, disso ninguem gosta, excepto o bando desses voyeuristas. Mas fico ca pensando, Glauco… Listas immensas de politicos na bosta irão parar si, como uma proposta fizeram, forem para as mãos sarristas. Estão querendo, Glauco, photos pôr até de senador e deputado chupando mirins rollas! Um horror! Qual outra auctoridade ja chupado terá, por mais illustre e superior, até que o povo esteja accostumado?
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INSOMNE SONNETTISMO Glaucão, por que você se segurava por dias, por semanas, até mezes, tentando seus sonnettos descortezes e impuros não compor? Por que parava? Emfim se convenceu? Mandou à fava inuteis abstinencias? Quantas vezes fallei que nesse vicio os portuguezes quizeram, sem successo, pôr a trava? Bobagem! Nem Bocage, nem Quental renega a sua fertil producção! Aqui, tambem, ninguem excappa ao mal! Do vicio nenhum foge, estando são ou não, Glaucão! O poncto principal está, dos seus leitores, no tesão!
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DIA DO TURISMO RESPONSAVEL Devia haver um dia, Glauco, para aquillo que podiamos chamar “turismo responsavel”. Um logar será Praia do Coco”? Joia rara! Mas Praia do Cocô (ficou na cara que disso se tractava) a registrar eu tenho, pois accento regular faltou naquella placa que eu notara… Coitado do turista que se banha naquelle exgotto! Um bello troço boia por todo lado, Glauco! Não é manha! Não, nada vi que fosse “rara joia”! Coberto de excremento, nem me extranha que em branco passe toda a tal tramoia!
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DIA DA HOSPITALIDADE É facil perceber si sou bemvindo, poeta, a algum amigo, no seu lar! Sim, basta seus cachorros observar! Assim sei si ja fico ou vou sahindo… Bassês tem um amigo: qual mais lindo nem posso distinguir! Sou, ao chegar, por todos festejado! Teem olhar tão meigo, tão gentil! Me esperam rindo… Será por que lhes levo um biscoitinho no bolso? Ou será mesmo hospitaleiro um fofo desses? Finjo ou adivinho? Um dia, não levei e, pelo cheiro, notaram que exquesci… Glauco, o focinho torceram-me! Senti-me interesseiro…
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DIA DA MORTE DO MACCA Devia haver, hem, Glauco (mas não ha), um dia para a morte do Paul nós lembrarmos? Não queremos que essa voz se cale, claro. Rolla a lenda, ja. De facto, rolla a lenda, desde la dos idos dos sessenta. Foi atroz aquelle rumor, Glauco, mas appós um tempo, mais ninguem credito dá. Disseram ser um sosia quem, agora, faz celebre carreira solo por ahi. Fans tem ainda, mundo affora. Morreu ou não morreu? Quero suppor que não, pois a gallera commemora que possa pelos Beatles ter amor…
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DIA DO ANTINAZISMO Devia haver, Glaucão, um dia para fallarmos do nazismo, da lembrança da Noite dos Crystaes… Quem é creança não sabe, mas apprende, está na cara. Sim, disso sei. Tal data nos azara si, em troca de repudios, ella alcança os jovens neonazis, ja que mansa conducta nenhum delles denotara… Em vez de condemnarem dos Crystaes a Noite, esses fanaticos festejam a data, Glauco! O que se espera mais? Chacinas? Terrorismo? O que é que estejam os nazis planejando, os velhos ais mais alto soam, novos ais ensejam…
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DIA DA BEBIDA FALSIFICADA Tal data não ha, Glauco, mas devia haver: a da bebida adulterada! Ainda assim, ninguem faria nada a fim de prohibir a porcaria! Agora acharam alcohol, que seria “appenas” ethanol no whisky, cada garrafa com seu rotulo! Me enfada dizer que ganharão boa quantia! Puzeram caramello mixturado ao alcohol, para aquella cor bonita no whisky dar! Sacou, Glauco, o recado? É facil engannar quem não vomita bebendo qualquer coisa! Algum culpado dirá: “Quem olha as marcas… accredita!”
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DIA DA HUMILDADE Alguem pode entender muito humilhante lamber a bota suja, chupar picca sebenta, ter linguona que se enchica dum sangue que a garganta acha abundante. Grudados numa sola de pisante, cocôs são removidos. Quem estica a lingua sabe disso. Mas a zica maior não ha poeta que bem cante. Consiste essa maior humilhação em tudo limpar quando na privada alguem deixou seu grosso cagalhão. Mas isso com a lingua. Não ha nada peor que engolir merda. Você não concorda, Glauco? O que é que mais degrada?
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DIA DO TRANSPLANTE DE OLHO Mattoso, ja sabias tu que exsiste transplante de olho inteiro? Sim, foi feito agora mesmo! O globo do subjeito até perdeu aquelle jeitão triste! Arterias, veias (tudo em que consiste um orgam) ja funccionam! Approveito e indago: Tu não queres ter proveito egual? Hem? Tal desejo não sentiste? Um olho novo, Glauco! Tu não queres voltar a ver? Verás tudo que vias em tempos idos, preces si fizeres! Não crês? O optico nervo ja, por vias fataes do teu glaucoma, vale neres? És sceptico demais, Glaucão, sabias?
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DIA DO TRIGO Está faltando trigo? Se colloca a basica questão: O que faremos? Propostas ja chegaram aos extremos: Um pão querem fazer de mandioca! Magina! A tal farinha vão, em troca daquella que na pizza nós queremos, usar nas padarias? Com os demos! A gente, de escutar, até se choca! Peor, muito peor (diz um doutor) seria haver farinha de cocô de pombo, como ousou alguem propor! “Collegas deputados! O robô informa que esse estrume, si bem for tractado, nutre! É nectar em pó, pô!”
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DIA DA SAHUDE AUDITIVA Ainda que eu não beba, que eu não fume, que vicios, outros, poucos delles tenha, sou desse extranho typo que se empenha num intimo, phrenetico costume… Sim, Glauco! Ouso comer o meu cerume! Você tambem? Então nossa resenha mais facil fica! A nossa aberta senha a um medico preceito se resume… Limpar o ouvido! Prompto! Uma resposta melhor não ha! Tiramos nossa rolha e… cada qual degusta como gosta! Àquelles que criticam tal excolha, direi que, embora cheire que nem bosta, bem sabe! Ninguem deixo que me tolha!
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DIA DA INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA Verdade, Glauco! Tive um “romisetta”! Carrinho de trez rodas! Se recorda? Agora mais ninguem tal thema abborda, mas quero fallar! Ouça, me prometta! Um plano tenho, Glauco, não é peta: Pretendo fabricar um, bem na borda daquelle modellito! Ocê discorda de tudo que me venha na veneta! Se lembra do Gurgel? Pois eu tambem, por compta propria, ainda monto o meu! Sim, falta grana… Sempre estive sem! Eu, hem? Um “karman”, “fusca”, “alpha romeu” são coisas do passado! O meu ja vem com asas! Ou meu sonho se perdeu?
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DIA DO ESCRIPTOR RESPONSAVEL Durante uma entrevista, a jornalista pergunta ao escriptor: “Qual o papel, na sua concepção, de quem fiel se julga ao seu officio, o dum artista?” Mostrando mau humor, o auctor, que dista de toda a gentileza, diz: {Meu fel não nego. O meu papel é ser revel e pouco conversar, sem dar na vista!} {Emfim, fallar o minimo!}, fulmina. “Não fallam do senhor como pessoa alegre?”, indaga, timida, a menina. {Sim, fallam. Commummente, estou de boa. Só não estou alegre quando opina alguem que fallar devo coisa à toa!}
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DIA DO POVO DA RUA Amigo sou do padre, mano! Faço trabalhos com o fluxo que se expalha alli na Crackolandia, com a tralha que leva quem occupa aquelle espaço! Preciso lhe contar! Ganhei abbraço dum desses usuarios! Quem trabalha com elles sempre ganha! Ahi, sem falha, notei que elle calçava um pisantaço! Embora baixotinho, tinha pé quarenta e seis ou septe, mano! Juro! Direi que cincoentão calçava, até! Na proxima, prometto! Sim, no duro! Eu pego o tennis delle, que seu é, garanto! Um chulezão, de facto, puro!
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DIA DA CENSURA DE LIVROS Em Sancta Catharina foi LARANJA MECHANICA banido nas escholas? Mas tem que prohibir mesmo, ora bollas! Aquelle livro horror e crime exbanja! Magina, meu! Cautela, como canja, nenhum mal faz! Aquelles rapazolas do livro são uns sadicos! Nas solas lambidas querem, dentes que alguem ranja! Um livro desses deve censurado ser, Glauco! Quem prohibe é que está certo! Hem? Pense das creanças pelo lado! Magina! Si entender alguem que experto será quem põe nos rostos seu solado, estou de ser pisado muito perto!
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DIA DO ZUMBIDO NO OUVIDO Paresce ser problema bem frequente, Glaucão, esse zumbido ter no ouvido alguem que do rockão tem consumido o maximo possivel, como a gente… Mas acho que “zumbido”… Não, somente zumbido não será! Faz mais sentido fallarmos de “chiado”! Nem duvido que encontre alguem um nome differente… Ouvi fallar que heavy metal traz mais graves consequencias, mas não creio que seja algum estylo… Tanto faz! Ah, Glauco, si no rock eu me recreio, jamais essas sequelas serão más! Não acha? Nem Ramones é som feio!
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DIA DO HEAVY METAL Mudou esse conceito, né, Glaucão? No nosso tempo, heavy metal era tal como o Steppenwolf um som fizera, melodico, comquanto pesadão! Rockeiros que mais jovens são irão citar extranhas bandas, ja se espera, mas mesmo quando, nesta actual era, curtimos rock, está posta a questão: Deep Purple, Judas Priest e Nazareth, alem de Slade, AC/DC e quetaes, serão eternos nesta nossa fé! Sim, claro, Glauco, que esses taes jamais superam Beatles, porra! Só quem é eclectico sons curte, deseguaes…
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DIA DO SOLDADO DESCONHESCIDO Lambi, Glaucão, a bota dum soldado que estava no quartel, de sentinella! Verdade, meu! Passei a lingua nella emquanto o rapagão estava armado! À noite, ninguem nota si elle errado estava procedendo… Sim, dei trella tambem à chupetinha! A gente fella com gosto, mas olhando cada lado! Assim que elle gozou, seu nome disse ser Angelo Miguel, mas eu duvido, pois nunca mais o vi! Que vigarice! Por elle perguntei quando o lambido foi outro, mas ninguem que conseguisse fallar achei! Sumiu? Não faz sentido!
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DIA DO PALESTRANTE MOTIVACIONAL Meus collaboradores! Meus collegas de empresa! Meus amigos! Meus amados! Vocês ja me conhescem! Nestes lados ninguem é maior lider, nem mais Degas! Mas sou comprehensivo! Nunca às cegas demitto nem contracto! Os empregados da casa teem seus justos ordenados em dia pagos! Acham meus plas bregas? Pois bem! Tenho operario, funccionario, não “collaborador”! Sou é patrão, não “lider”! Ordenado, não “salario”! Aqui sou eu quem manda, sim! Quem não concorda peça a compta! Que empresario irá me desmentir nesta nação?
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DIA DA RUA SEM NOME Jamais se saberá, Glauco! Uma rua se chama Aspilcueta, aqui na Villa? Talvez Aspicuelta, mais tranquilla graphia, aquella accyma substitua! Magina! Alguem pensou ser essa a sua escripta? Azpilcueta alguem ventila e escreve Azpicuelta, mas vacilla! Ninguem ha que, em soccorro, contribua! Na Villa Magdalena achei Mourato, que jura ser Morato um cidadão que mora noutra parte! É muito chato! Quem mora na Morgado, Glauco, não está livre! Matheus? Mattheus? De facto, as ruas de São Paulo um sacco são!
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DIA DO ARMISTICIO “Tá louco? Um cessar fogo? Não, jamais!” “Jamais uma amnistia! Sem perdão!” Assim, Glaucão, as coisas sempre são! Hem? Tregua querem esses animaes? Causaram tantos damnos, tantos ais! Agora acham que balla de canhão é desproporcional? À merda vão! São praças, ja, de guerra as capitaes? Assim si for, Glaucão, em breve iremos ver tudo pelos ares, egualzinho àquelles velhos biblicos extremos! Porvir prevejo, muito mais damninho, si formos appellar aos mesmos demos que, em cada Apocalypse, abrem caminho!
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DIA DA COLLECTA DE ALIMENTOS A coisa ja tão grave está, poeta, que fica mais difficil para a gente, que é pobre, conseguir algo decente que seja comestivel, na collecta! Na falta dum ranguinho que sustente a nossa mais levissima dieta, achamos no lixão uma completa feirinha a céu aberto! Quem desmente? No meio do chorume encontra quem procura até torresmo, rapadura, mehudos, hortaliças! Tudo tem! Comida, vate, encontra quem procura! Somente não terá tal armazem puddim, porque é de leite e pouco dura!
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DIA DO SUPERMERCADO No meio das garrafas de licor achei na pratteleira, certa vez, aquella que talvez nenhum freguez achar esperaria a seu dispor. Absintho, sim senhor! Só pela cor notei que se tractava dum francez legitimo. Ou duvidam ja vocês daquillo que lhes narro? Oh, por favor! Concordo que em nenhum supermercado commum alguem encontra tal bebida que, em brindes, de “Evohé!” faz jus ao brado. Deliro? Não deliro? Quem duvida da minha palavrinha algum achado melhor indique em loja mais sortida!
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DIA DA MÃO AMIGA Fizeram-me rollar na areia, sem as roupas, Glauco! Foram maus commigo por causa da cegueira que, lhe digo, me torna, dos moleques, um refem! Eu ia attravessar a rua. Alguem auxilio offeresceu, mas um castigo estava ja tramando. Juncta amigo daqui, dalli… Soccorre-me, então, quem? Estavamos, em breve, em plena praia deserta. Alli, brincaram a valer! Chupei uns quattro ou cinco dessa laia! Por isso digo, Glauco: se foder vae todo cego otario, caso caia no pappo de quem age por prazer!
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DIA DO LIDER COMMUNITARIO Sim, fomos nós, poeta, que zoamos com esse cego! Lider fui, aqui no bairro, dos pivetes! Quem não ri dum cara que perdeu a vista? Ah, vamos! Na praia, nos tornamos crueis amos e escravo virou elle! Fiz chichi, depois de ser chupado! Um outro vi pisando-lhe na cara! Ah, nós brincamos! Ah, Glauco! Quem mandou, sozinho, o cego sahir à rua? Foda-se! Que saia, então, accompanhado, ou firme eu pego! A turma adora, alli naquella praia, zoar deficientes! Até prego fincamos bem na bunda da cobaya!
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DIA DO DIRECTOR DE ESCHOLA Aqui no bairro, Glauco, dirigi, sem muita auctoridade, essa precaria eschola. Nem siquer de “secundaria” a chamo. Não ha nivel, por aqui. Mas esses maus alumnos são, por si, peores que bandidos! Temeraria conducta, a do ceguinho que, em hilaria sessão, foi estuprado, como ouvi! Segundo me informaram, o cegueta passou por maus boccados! Oralmente, serviu, poeta, à guisa de punheta! Desculpe si empreguei um indecente vocabulo, mas, caso me prometta sigillo, outras eu conto, mais à frente…
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DIA DA TESTEMUNHA OCULAR Vi quando o otario cego, a duras penas, levando umas porradas, era posto, na praia, de joelhos. O seu rosto sangrava, mas quem via, ria, appenas. Os sadicos garotos, que nem hyenas, soltavam gargalhada. A contragosto, o cego os chuparia. Foi-lhe imposto um baita affan! Gravaram essas scenas. Sim, tenho vista boa. Bem distante estive, mas vi tudo. Conferi, depois, as scenas. Nada que me expante. A bocca lhe foderam, de chichi encheram-na. Sim, soube que estudante foi, cada, dum collegio por aqui.
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DIA DA GENTILEZA Senhor, por gentileza… Aqui, senhor, permitta-me que indique este logar, o qual lhe recommendo, onde encontrar prazer irá, si incommodo não for… Desculpe-me, senhor! Não va suppor que estou eu sendo quasi tão vulgar no tracto quanto um frade em lupanar! Tão mal não me interprete, por favor! Appenas eu lhe peço, sem rancor nenhum, que no seu rabo va tomar… e espero que não soffra a menor dor! Tambem à merda quero, sem faltar ao minimo respeito, lhe propor que logo va, tal como o meu azar!
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DIA DO GOLPE MILITAR Os nossos tanques, Glauco, ficarão postados bem na frente do Congresso! Licença, si preciso for, nem peço e invado, commandando o battalhão! Mas isso, vate, em ultima questão, pois toda consequencia, antes, eu meço! Em paz, primeiramente, eu attravesso a praça. Ahi, commigo os outros vão! Em caso de qualquer parlamentar oppor-se e resistir, irei prendel-o, é claro. Mas convem dialogar. Tão logo o presidente nosso appello ouvir e em ser deposto concordar, será festa! Sinão, é pesadello!
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DIA DO GOLPE CIVIL Não, Glauco, nós de tanques e blindados nem vamos precisar! É coisa antiga! Jamais um general ha que consiga dar golpe, com fuzis e com soldados! Nós temos nossos homens que, isolados ou dentro da policia, força amiga conseguem, indo ou vindo, sem intriga, com liquidos e pós bem emballados! Em nossos territorios, o que basta é termos o controle sobre tudo que envolva a herva, a bolla, a balla, a pasta! Assim, ja governamos o polpudo thesouro da nação, sem sermos casta de farda, de gravata nem de escudo!
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DIA DO REFEM RESGATADO Não creiam nesse pappo official! Aquelles innocentes civis só puderam excappar porque com dó fiquei e, entre os bandidos, fui legal! Da gangue sou amigo, sim, e tal é minha connexão, que foi a avó ja solta, com seus nettos e o totó! De volta ao lar estão, pois dei aval! Não fosse por mim, podem ter certeza que estavam ‘inda nesse captiveiro! Dalli não sae, garanto, gente illesa! Mas fica se gabando, o tempo inteiro, o chefe de policia, alli na mesa, na frente dos reporteres, fuleiro!
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DIA DO SEQUESTRADO Emfim chegou meu dia de deixar aquelle captiveiro! Vocês não calculam como soffre um cidadão que caia, dos bandidos, no radar! Appenas por calçar um caro par de tennis, dos de griffe, elegantão, raptaram-me e fiquei ao rés do chão, aos pés de quem quizesse me zoar! Pisaram-me na cara, com Rainha, com Conga, até com Nike, por vingança! Adidas nos pezões, tambem, um tinha! Depois me libertaram, mas quem dansa, no caso, sae descalço! Fica a minha versão: não lambi tennis de creança!
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DIA DO EUNUCHO Castraram-me, poeta! Foi por puro capricho do mandão que, no logar, controla a bandidagem! Sem meu par de bollas, sem pau, passo por appuro! Tornei-me chupador, ja que pau duro tem sempre esse mandante! Me treinar quiz elle, especialmente, para dar prazer, com minha bocca, neste escuro! Exacto, menestrel! Me cegou, esse chefão do territorio! Quer motivo plausivel p’ra que eu tanto me fodesse? A mina delle eu tive… Si me privo dos organs, foi por isso! Si quem lesse seus versos dó tivesse… É lenitivo?
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DIA DA MOCIDADE ESPIRITA Aquelles jovens todos que ja curra te deram, a cumprir uma missão estavam, Glauco! Todos elles vão, depressa, ao paraiso! Quem se emburra? Quem fica apprehensivo, na casmurra moral christan, com isso, uma questão exquesce: nesta vida, a gente não faz nada sem motivo! Ô moral burra! Bandidos, assassinos, dictadores papel teem, decisivo, nesta nossa fatal encarnação, nas nossas dores! Sim, nesta a gente soffre, p’ra que possa, na proxima, ascender! Quando tu fores morrer, te lembrarás delles, da troça!
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DIA DO RECORDE DE CALOR Aquelles idiotas, Glauco, vão à praia, com sessenta graus ao sol, achando que terão, no mar, um rol de commodas vantagens! Que illusão! Na areia, deshydratam-se! Terão, no caso de jogarem frescobol, maior insolação! Eu num anzol do typo não me enrosco, Glauco, não! Prefiro uma duchinha, aqui, tomar de vezes uma meia duzia, a por tamanho sacrificio la passar! Mas elles que se fodam! Tal calor a gente suaviza alli no bar, bebendo umas geladas, sem se expor!
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DIA DO VULNERAVEL ESTUPRADO Poeta, as estatisticas dão prova daquillo que ja sabe todo mundo! Meninas ou edosas, por segundo, são victimas de estupro ou vão à cova! São quantas? Nem me lembro! Quem mais sova novinhas são adultos, é o commum do que está noticiado… Mas redundo naquella affirmação que não é nova: Um cego, vulneravel tambem, pode ser victima de curra! A molecada adora fazer delle seu pagode! Levando chute, soco, bofetada, o cego chupeteiro mais se fode sabendo que ninguem vae fazer nada!
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DIA DO DIABETICO Você, Glaucão, estava numa phase de rigida dieta, não estava? Agora vem dizer que manda à fava os medicos, num gesto kamikaze? Entendo que você, vate, extravase a sua frustração quando se aggrava seu quadro diabetico… Mas dava (Não dava?) para ser sensato, ou quasi! Você, que não comia mais puddim, nem bollo, nem de leite condensado a torta, agora falla coisa assim? Si volta a comer doces, para aggrado da sua gula, diga, porra, a mim si devo desistir do meu cuidado!
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DIA DA ALPHABETIZAÇÃO Escrevem ja, no gruppo dos bassês, que curtem um “luau”. Não, não é mau, está correcto. Porra, mas “corau”, ou mesmo “karaukê”, não? Tu não vês? Questão, naquella turma, alguem ja fez de termos como “aumigo”, tudo em “au”, usar. Tambem “encãotro”, num tal grau de excesso, que paresce insensatez! Não achas “cãominhada” assaz horrivel, poeta? Consideras “Au Que Mia” bom nome num petshop de alto nivel? Então nada direi mais, pois a thia que ensigna portuguez faz o possivel, mas essa cachorrada a silencia!
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DIA DA PHOTOGRAPHIA DE ALIMENTOS Não quero parescer muito mesquinho nem quero que você, Glaucão, se zangue mas, quando se exhibiu, num mukbang, só para apparescer, achei fraquinho! As photos de comida, ja com vinho ou seja com refresco typo Tang são pouco convincentes! Nem com Sangue de Boi bem lhe calhou o salgadinho! Eu quero ver você de maccarrão se enchendo de verdade, egual àquella gordona numa scena do filmão! Do “Magical” dos Beatles! Você della não lembra, Glauco? Muitos querer vão ver quando sua cara toda mella!
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DIA DO SUPERVISOR DE ENSIGNO Notei que, entre os alumnos, a mais brava das gangues se formou. O meu trabalho não era leccionar, mas um attalho mostrar aos professores, eu achava. Ao nivel dos pivetes, nem oitava nem quincta attenderia, pois caralho faziam chupar outros que eu nem calho de estar adjectivando… Um nó me trava! Das victimas, quem pena me infundia mais era aquelle cego, coitadinho, que quasi que curravam todo dia… Bastava que estivesse no caminho dos jovens, e porradas levaria até que boquettasse direitinho…
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DIA DO URSINHO DE PELLUCIA Me deram um ursinho, mas eu não gostei, pois tenho mente ecologista! Nem mesmo uma boneca me conquista! Menina consciente sou, Glaucão! Ursinho? Qual ursinho! No povão eu penso, numa gente que resista à grana, ao capital! Dei entrevista a todos os canaes desta nação! Sim, nas Nações Unidas vou berrar, gemer, até chorar, si for preciso, na lucta pelo verde e por bom ar! Por isso, ja que tenho mais juizo que muito adulto, ursinhos vou jogar no lixo! O recyclavel, eu ja friso!
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DIA DO VENDEDOR AMBULANTE Eu era, desses oculos da China, quem muito revendia, alli na rua. Ao cego um reservei que esconda a sua careta, que não é de gente fina. O cego ficará, ja se imagina, mais feio que mendigo que jejua. Até creio que o treco contribua demais para attrahir gente maligna. Na certa, a molecada, ao ver a lente escura desses oculos, irá zoar esse infeliz deficiente… Não venham me culpar pelo que ja supponho: um chupador que gosto sente de mijo, que dirão ser guaraná!
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DIA DO CÃO DE RUA Fugindo do calor, um viralatta entrou na padaria, que tem ar melhor, refrigerado. Quiz ficar alli, mas a fregueza disse, chata: “Não pode! É contra as normas!” Não se tracta de regras, mas de empathico pensar, commigo penso. O dono do logar a tempo demonstrou mente sensata. Aguinha trouxe, deu até biscoito àquelle cachorrinho. Não demora, com elle virão outros, seis ou oito. Parados na fresquinha, alli não chora nenhum. O bassezinho, mais affoito, roubou (Bem feito!) os pães duma senhora.
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DIA DO LADRÃO PERDOADO Ha video, garantiu o meu leitor. Entrou, sem dono, o cão na padaria, fugindo do calor. Ninguem diria que fosse elle roubar. Mas foi auctor. Roubou uns pães no plastico. Suppor iriam que os comesse. Pela via, comtudo, o cão seguiu. Quem o seguia notou que era, de facto, um bemfeitor. Por elle, num terreno, mais uns trez cachorros esperavam. Divisão foi feita. Accreditar podem vocês? “Me esperem aqui! Irei roubar o pão e volto! Si der certo, sou freguez! Sinão, vocês com fome ficarão!”
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DIA DA PROMESSA Você não prometteu que pararia, Glaucão? Mas continua a sonnettar! Assim, não poderei accreditar nas coisas que verseja! Quem iria? É vicio? Comprehendo… Mas um dia tambem o viciado um exemplar arbitrio poderá ter! Eu no bar não entro mais! Parei mesmo, sabia? Deixei de lado o vinho, o whisky, e “mé” tambem não beberico mais! Você não passa sem medir, dum verso, o pé? Então é isso? Um gajo que bem vê consegue distrahir-se… Mas não é o caso dum ceguinho na deprê!
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DIA DA ANTHROPOPHAGIA O Oswald -- Hem? -- tem um que de fanfarrão e um que de charlatão. Hem? Quem não acha? Não digo que não tenha aquella macha postura que se espera dum causão. Deixou, de pertinaz provocação, as provas mais cabaes. Mas é bollacha a sua poesia. Quem a tacha tambem como biscoito o faz em vão. Concordo, um anthropophago foi, claro, pois teve lucidez para affirmar que nada precisamos pagar caro. Nos basta lançar rede nesse mar e tudo que vier eu ja comparo à musica que, em disco, foi ao ar.
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DIA DO BOM CHARACTER O Mario, que era pardo e que foi bicha, não era, pelo Oswald, embellezado, pois este pouco caso fez do lado gay nessa van novella que se espicha. Agora ninguem liga nem se lixa, mas sempre foi tabu que era veado o Mario. Dum conceito não me evado, porem: as suas obras ninguem picha. Nos contos, foi supremo. Tambem rhyma capaz foi de fazer, e seu heroe character, sim, terá: Macunahyma. Azul foi o sonnetto que ao seu boy compoz. Mas do perfeito se approxima mais quando Oswald, de inveja, se remoe.
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DIA DA ARTE MODERNA Tarsila retractou Oswald e Mario em grande estylo. Os tenho na moldura. Mas, quando uma obra prima se procura na nossa arte moderna, sou summario. Excolho o “Abaporu”. Tem quem encare o pezão anthropophagico, na pura e enorme proporção? Só quem ternura tem pelo pé dum macho ja viu pareo. Me lembro dum pezão desses num cara baixinho, o que tornava a proporção ainda mais esthetica, mais rara. Tarsila pinctaria tal pezão na minha face, em close exacto, para tornar-me immortal como um olho são.
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DIA DO PHILOSOPHO Não, Glauco! Um bom philosopho não pode appenas ser quem nisso tem diploma! Precisa ser alguem que estudos somma, embora autodidacta, assim me accode! Sinão, o musicista que pagode estuda por um curso ja se toma por grande pagodeiro! Nos embroma quem acha que, no ramo, não se fode! Irá, sim, se foder! Acaso um Kant, um Socrates, um Sartre, está na malta que, só por palestrar, julga que encante? São meros impostores (e lhes falta vergonha) taes sophistas que, durante um pappo, “Ói nóis, meu!” fallam em voz alta!
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DIA DO UMBANDISTA Sim, toda sexta-feira, Glaucão, tem battuque no terreiro, bem do lado do predio onde resido! Mas gozado achei este detalhe, sem desdem: Aqui não ha terreno vago! Quem quizer fazer um afro culto, usado terá, claro, um apê desoccupado! Mas, Glauco, um templo desses pega bem? Não pega! Quem battuca fica tenso, a cada nova queixa dos vizinhos, com medo da policia! Assim eu penso! Periga até que espiritos damninhos, querendo se vingar, causem immenso terror, com seus nocturnos barulhinhos!
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DIA DO ESCRIPTOR PRESO São tantos os collegas nossos, vate, que estão attraz das grades, em paizes longinquos! Condemnados, infelizes, estão aos pés daquelle que os maltracte! Appenas por idéas, quem debatte e explana, penas soffre! Tu, que dizes as coisas mais crueis, por mais que vises só versos, não terás quem te resgate! Melhor será não ires a logares distantes, pois os cegos teem peor destino por alli! Convem cuidares! Hem? Achas que tambem aqui ja mor perigo corres, mesmo tendo uns pares de botas pela cara, ao teu redor?
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DIA DA PROCLAMAÇÃO DA DICTADURA Relata Rocha Pombo o que tambem collegas seus disseram. Quem adepto seria da republica, sem veto, punia monarchistas, pena sem: “Furando os olhos delles”, como bem descreve quem não pôde ficar quieto perante taes abusos. “Um completo scenario de sadismo”, observa alguem. Os pobres monarchistas, sem visão, vagavam ao acaso, recebendo do povo todo typo de aggressão. Alguns, que rastejavam nesse horrendo festim, bem se lembraram do pisão, mas hoje pouca gente está sabendo.
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DIA DA MACONHA MEDICINAL Glaucão, o Peter Tosh explicou, ja, que cura até glaucoma a tal plantinha! Você, que não escuta nunca a minha voz, acha, emfim, que duvida não ha? Então se convenceu? Agora dá até para maconha haver na linha das ballas e bombons ou da lattinha de cerva, de suquinho ou guaraná! Você nunca fumou? Mas, si fumasse, talvez ‘inda pudesse ver! Agora é tarde, pois ja teve desenlace! A algum glaucomatoso, o que vigora na nova medicina talvez passe noção de que mammar pode quem chora!
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DIA DO JOALHEIRO Mandei fazer, Glaucão, um diamante lavrado no formato dum peru! É claro que não posso pôr no cu tão cara joia! Ah, grana foi bastante! Excentrico sou mesmo! Não se expante! Só para me enrabar emquanto, nu, gymnastica practico, fiz um cru pedido a um joalheiro dilettante: Um dildo cravejado de esmeralda barata, acho que chamam turmalina! Até fica sangrada a minha fralda! Você, que maluquette me imagina, não pode fallar nada, pois se exbalda chupando uns caralhões fedendo urina!
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DIA DO ESPORTE AMADOR Eu, juncto com a turma, me dedico a todos os esportes, mano! Mas nós temos um que exige muito gaz: dar trote em alleijados! Meu, que rico! Que chique! Que elegante! Quem tal mico meresce nesta vida a Satanaz que implore! E si eu tiver intenções más? O trouxa que se foda! Alegre eu fico! Tiramos a muleta, rasteiramos, chutamos, ja no piso, o corpo inerme! Tambem dos cadeirantes somos amos! Queremos que elles chupem, pois dum verme do typo nem se escutam os reclamos! Dum cego tambem, si na telha der-me!
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DIA DOS MATERIAES RECYCLAVEIS Sim, tudo se approveita, até papel hygienico, poeta! Até bacia quebrada de privada! Não sabia? Precisa que eu lhe mostre, menestrel? Em novo transformamos, bem fiel, o usado! Uma bacia até seria bem util como parte duma pia do typo das que vemos num hotel! Artistas ja mostraram que independe de esthetica si temos um penico ou temos uma chicara! Me entende? Mais uma vez, poeta, aqui lhe explico: Valor tem, alto, tudo que se vende! Um dia, nesse ramo, fico rico!
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DIA DA MULHER DO PRESIDIARIO Sim, dama sou do crime, Glauco! Mas por intima visita ja luctei bastante! Finalmente alguma lei protege-me! Tardou paca, aliaz! Agora, alli na cella, a gente faz loucuras, Glauco! Tanto ja trepei a trez, a seis, com trava, até com gay! Suruba alli não falta, nem o gaz! Até no Ministerio da Justiça fui, para conversar, batter um pla! Alli ninguem o tempo desperdiça! Meu lobby fiz! Achei, Glaucão, que dá até, para arejar na zona a piça, os presos conseguirem alvará!
92
DIA DO DIALOGO “Sonnetto dialogico” tu chamas aquillo, nestes versos, que te digo? Então que me respondas, meu amigo, te peço: da velhice não reclamas? Si fosse eu, do tesão ja sem as chammas, talvez nem supportasse esse castigo! Mas, posto que estás velho, mal consigo suppor como sacias tuas damas! É mesmo? Tu com damas não tens caso? Preferes num pisante cafungar e gozas só na bronha, a curto prazo? Te digo que estás louco! Teu logar é, Glauco, o manicomio! Si extravaso tal chiste, é para, aqui, dialogar!
93
DIA DO SUPPLENTE PARLAMENTAR Não, vate! Comecei como engraxate na porta do Congresso. Devagar, com jeito, fui subindo, até chegar aqui. Me degradei à bessa, vate! Supplente sou agora. Dum debatte não fujo, si me derem o logar. Lambi, porem, dum cara caro par de botas, qual cachorro que não latte… Quem quer que engraxe bem, de lingua, vae chegar aonde estou, seja assessor, supplente, secretario, o raio, uai! Irá se rebaixar, porem. Si for capaz, engraxa algum da patria pae e, em breve, eis que se elege senador!
94
DIA DO JORNALEIRO Agora mais ninguem quer ler jornaes, mas, quando molequinho, os entreguei na casa dos leitores e bem sei o risco que corri! Não corro mais! Fugindo das hyenas, dos chacaes e lobos, dos que estão fora da lei, emfim, muitos appuros eu passei na rua! Mais respostas querer vaes? Me indaga, si quizeres! Só respondo que varias vezes, Glauco, fui currado! Magina! Meu passado não escondo! Tu podes entender este meu lado masoca, pois bem sabes que hediondo nenhum crime será, p’ra quem é sado!
95
DIA DA VISITA INTIMA Trigesima terceira namorada inscripta como minha visitante? Perdi, Glaucão, a compta. Mas bastante mulher ja conhesci, não é por nada! Não, puta, não! Talvez seja chamada melhor si for “modello”! Mas, durante o tempo em que ella fica, me garante aquella gostosissima trepada! Confesso uma coisinha só, Glaucão: nenhuma chupa como um cego chupa! Faltava appenas isso ao meu tesão! Ha cegos no presidio: um hoje occupa a cella do chefão local, que não o empresta e mactar manda quem o “estrupa”!
96
DIA DA ROUPA SUJA -- Você não precisava (Né, querida?) fallar alto, na frente das visitas, de coisas que não são nada bonitas accerca desta nossa azeda vida! {Bobagem, porra! Ja ninguem duvida daquillo que tu fazes! Si te irritas com isso, tenta as linguas mais maldictas ouvir! Será, sim, coisa que te aggrida!} -- Ah, tenha paciencia! Vou agora ficar me preoccupando com aquillo que falla, no portão, cada senhora? {Melhor te preoccupares, si tranquillo estás, pois ja fallaram duma tora que chupas! Nem commento o teu vacillo!}
97
DIA DA TOLERANCIA Estou cansada, Glauco, desse lero que expalham a respeito da palmada! Não! Para a creançada, não ha nada melhor! Não acha? Seja bem sincero! Eu, como mãe zelosa, não tolero creança que, rebelde e malcreada, me enfrente, Glauco! Saio dando cada tapão! Querem molleza? Chance zero! Meu filho, um cavallão do meu tamanho, brigou commigo, um primo defendendo! Magina! De moleque eu não appanho! Sentei nos dois o braço! Não entendo quem falle em atturar parente extranho! Conversa! Aos tolerantes não me rendo!
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DIA DA TRADIÇÃO ORAL Na India, a tradição da fellação está consolidada, ha que suppor. Sim, basta algum leitor os olhos pôr nos KAMA SUTRA, que elles bem verão! Costuma-se dizer que, no verão, os organs se dilatam. No calor mais dura fica a rolla… Só si for! Quem pode saciar tanto tesão? As putas, as mulheres em geral, se prestam ao serviço de chupar, mas, como os indianos dizem, mal. Os cegos, esses sabem seu logar qual seja: caprichar nessa animal funcção humana, para abboccanhar.
99
DIA DO RECORDISTA NO GUINNESS Mas, Glauco, os teus sonnettos ja não são motivo dum registro la no Guinness? Por que tu, desde então, não te defines? Precisas te mexer, vate, sinão… Capaz é de surgir um teu irmão em Christo, digo, Baccho, nas vitrines do business litterario, e mesmo os zines mais proximos razão não te darão! Os numeros do Guinness passam por constante revisão, Glauco! Por isso, convem que tu não pares de compor! Si estás, porem, cansado do serviço, não falta quem te faça fellador! Mais themas terás, sendo tão submisso!
100
DIA DO POLICIAL FEDERAL Sim, vate, meu primão é quem se passa, no bairro, por agente federal! Bastou botar uns oculos que mal escondem sua cara de reaça! Não digo que elles todos dessa raça damnada sejam, Glauco, mas o tal primão impõe temor ao pessoal da zona, até na puta mais devassa! Mas logo se ferrar irá, pois quer, alem das drogas, tudo controlar, até, nesses bordeis, cada mulher! Jurou o cafetão dum lupanar mactal-o! Um trafficante, quando der na telha, ainda o pega p’ra cappar!
101
DIA DE NÃO FUMAR Parar, por um só dia, de fumar? Não, Glauco! Não me peças isso, mano! É muito sacrificio! Um ser humano tal sorte não meresce, nem azar! Os medicos nos pedem que, no bar, um gole não bebamos! Dão insano combatte aos doces todos! Acham damno em tudo que dê graça ao paladar! Ahi tu me suggeres que não fume? Estás de brincadeira? Qual resposta darás si eu censurar o teu costume? Sim, deixa de cheirar chulé! Quem gosta dum fetido pezão, e que isso assume, não pode criticar quem cheira bosta!
102
DIA DO OCEANO Convite eu acceitei à pescaria em alto mar. Fallou o meu collega da firma: “A gente, mano, só se entrega à calma, põe de lado o dia a dia!” Pensei: desestressar bem que eu queria… O barco desmentiu, logo, quem nega que enjoos tenha. Mesmo quem navega faz tempo não excappa duma azia. Aquelles funccionarios de escriptorio botaram os seus bofes para fora! Pensei eu ter tomado um vomitorio! Si falla alguem dos mares, eu agora commento com desdem esse illusorio desejo portuguez, praias affora.
103
DIA DO AR PURO Em busca dum ar puro, comprei uma legal casa de campo! Natureza visivel, respiravel, com certeza! Mas logo um problemão quem não arrhuma? Phobias quem tiver e não assuma irá se lamentar, pois vi na mesa aquella baita aranha! À luz accesa, maior me paresceu! Quer que eu resuma? Piccado nem fui! Ella, a cabelluda tarantula, fugiu para a varanda! De noite, qual sanctinho nos adjuda? Agora, quando vejo propaganda de casas desse typo, penso: Muda quem queira! Mas dalli, depois, debanda!
104
DIA DA CREATIVIDADE E DA INNOVAÇÃO Sonnetto não é coisa assim tão dura nem grave, Glauco! Um bardo creativo consegue innovar, mesmo tendo um crivo mais rigido na hora da factura! Podemos incluir girias! Na pura linguagem mixturar um adjectivo mais chulo! Defendendo eu sempre vivo os truques da vulgar litteratura! De novo, não ha nada! A rigor, nada no genero, Glaucão! O que podemos fazer é dar mais trella à molecada! Leitores jovens curtem os extremos! Por isso de ler gostam, Glauco, cada sonnetto teu! Purismo? Manda aos demos!
105
DIA DE COMBATTE AO RACISMO “Racistas cordiaes”: ouviu fallar? Não, Glauco? Negro sendo, ouço: no cu que eu va tomar! Me chamam de urubu, macaco… Mas é pappo, só, de bar! Ja muitos negros dizem que escutar taes coisas não preciso, pois tabu se torna a brincadeira… Por Exu, poeta! Desnorteiam meu radar! Disseram que “racistas cordiaes” preciso repellir com energia! Perder vou meus amigos? Não, jamais! Os brancos, esses, fallam que eu devia parar de xingar todos de animaes albinos… Mas é mera zombaria!
106
DIA DO ESTRESSADO Estive eu, menestrel, tão estressado que, quando tu meus pés massageaste, tamanho foi o magico contraste que logo addormesci, de tão dopado! Sim, era bem notorio o meu estado de typica fadiga! Tal desgaste soffri naquelle cargo de guindaste politico, que quasi em lodo nado! Por pouco, de corrupto não me accusa a midia! Assim subir na vida não mais quero! Que ninguem a tal me induza! Agora, approveitar irei a mão dum cego como tu, que, alem da musa mais lyrica, tens magico condão!
107
HORRENDA AGENDA Que coisa, Glauco! Cada dia a gente com novas más noticias se depara! Mal temos um tempinho calmo para curtir alguma data pertinente! Espaço de ephemeride? Nem tente bons factos celebrar! Em plena cara, catastrophe qualquer nos excancara o nosso despreparo permanente! Si chove, inunda tudo! Si não chove, a secca tudo queima! Si não venta, ninguem ar bom respira! Ha quem comprove! Si venta, nada em pé, Glaucão, se aguenta! Hem? Prova quer fazer, você, dos nove? Pretende completar os seus noventa?
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SUMMARIO NOTA INTRODUCTORIA........................... 7 BIOGRAPHIA AUCTORITARIA...................... 9 JORNADA PROPHANADA.......................... 10 OTARIO SOLIDARIO............................ 11 CONFUSO ABUSO............................... 12 PENSANDO E DISPENSANDO...................... 13 DOMINGÃO DO MENGÃO.......................... 14 DIA DO BARBEIRO............................. 15 CHORÕES E FOLLIÕES.......................... 16 DESATTRAVESSANDO BILAC...................... 17 POUCA PORCARIA É BOBAGEM.................... 18 DIA DO INVENTOR............................. 19 DIA DA FAVELLA.............................. 20 NOW AND THEN................................ 21 BURACO NEGRO................................ 22 CREME ANTIEDADE............................. 23 NAMORADA AMMEAÇADA.......................... 24 APPAGÃO NO QUARTEIRÃO....................... 25 DIA DO CINEMA BRAZILEIRO.................... 26 DIA DA LINGUA PORTUGUEZA.................... 27 DIA DO PROTHETICO........................... 28 SABOTAGEM................................... 29 DIA DO RISO................................. 30 SERMÃO CHRISTÃO............................. 31 DIA DO OUVINTE.............................. 32 DIA DA PREGUIÇA............................. 33 DIA DO URBANISTA............................ 34 INTERSEX DAY................................ 35 VIRALIZANDO EM BANDO........................ 36 INSOMNE SONNETTISMO......................... 37 DIA DO TURISMO RESPONSAVEL.................. 38 DIA DA HOSPITALIDADE........................ 39
DIA DA MORTE DO MACCA....................... 40 DIA DO ANTINAZISMO.......................... 41 DIA DA BEBIDA FALSIFICADA................... 42 DIA DA HUMILDADE............................ 43 DIA DO TRANSPLANTE DE OLHO.................. 44 DIA DO TRIGO................................ 45 DIA DA SAHUDE AUDITIVA...................... 46 DIA DA INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA............ 47 DIA DO ESCRIPTOR RESPONSAVEL................ 48 DIA DO POVO DA RUA.......................... 49 DIA DA CENSURA DE LIVROS.................... 50 DIA DO ZUMBIDO NO OUVIDO.................... 51 DIA DO HEAVY METAL.......................... 52 DIA DO SOLDADO DESCONHESCIDO................ 53 DIA DO PALESTRANTE MOTIVACIONAL............. 54 DIA DA RUA SEM NOME......................... 55 DIA DO ARMISTICIO........................... 56 DIA DA COLLECTA DE ALIMENTOS................ 57 DIA DO SUPERMERCADO......................... 58 DIA DA MÃO AMIGA............................ 59 DIA DO LIDER COMMUNITARIO................... 60 DIA DO DIRECTOR DE ESCHOLA.................. 61 DIA DA TESTEMUNHA OCULAR.................... 62 DIA DA GENTILEZA............................ 63 DIA DO GOLPE MILITAR........................ 64 DIA DO GOLPE CIVIL.......................... 65 DIA DO REFEM RESGATADO...................... 66 DIA DO SEQUESTRADO.......................... 67 DIA DO EUNUCHO.............................. 68 DIA DA MOCIDADE ESPIRITA.................... 69 DIA DO RECORDE DE CALOR..................... 70 DIA DO VULNERAVEL ESTUPRADO................. 71 DIA DO DIABETICO............................ 72 DIA DA ALPHABETIZAÇÃO....................... 73 DIA DA PHOTOGRAPHIA DE ALIMENTOS............ 74 DIA DO SUPERVISOR DE ENSIGNO................ 75 DIA DO URSINHO DE PELLUCIA.................. 76 DIA DO VENDEDOR AMBULANTE................... 77
DIA DO CÃO DE RUA........................... 78 DIA DO LADRÃO PERDOADO...................... 79 DIA DA PROMESSA............................. 80 DIA DA ANTHROPOPHAGIA....................... 81 DIA DO BOM CHARACTER........................ 82 DIA DA ARTE MODERNA......................... 83 DIA DO PHILOSOPHO........................... 84 DIA DO UMBANDISTA........................... 85 DIA DO ESCRIPTOR PRESO...................... 86 DIA DA PROCLAMAÇÃO DA DICTADURA............. 87 DIA DA MACONHA MEDICINAL.................... 88 DIA DO JOALHEIRO............................ 89 DIA DO ESPORTE AMADOR....................... 90 DIA DOS MATERIAES RECYCLAVEIS............... 91 DIA DA MULHER DO PRESIDIARIO................ 92 DIA DO DIALOGO.............................. 93 DIA DO SUPPLENTE PARLAMENTAR................ 94 DIA DO JORNALEIRO........................... 95 DIA DA VISITA INTIMA........................ 96 DIA DA ROUPA SUJA........................... 97 DIA DA TOLERANCIA........................... 98 DIA DA TRADIÇÃO ORAL........................ 99 DIA DO RECORDISTA NO GUINNESS.............. 100 DIA DO POLICIAL FEDERAL.................... 101 DIA DE NÃO FUMAR........................... 102 DIA DO OCEANO.............................. 103 DIA DO AR PURO............................. 104 DIA DA CREATIVIDADE E DA INNOVAÇÃO......... 105 DIA DE COMBATTE AO RACISMO................. 106 DIA DO ESTRESSADO.......................... 107 HORRENDA AGENDA............................ 108
São Paulo Casa de Ferreiro 2024