INFINITILHOS EXCOLHIDOS

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INFINITILHOS EXCOLHIDOS



GLAUCO MATTOSO

INFINITILHOS EXCOLHIDOS

São Paulo Casa de Ferreiro 2020


Infinitilhos Excolhidos Glauco Mattoso © Glauco Mattoso, 2020 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros _______________________________________________________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA _______________________________________________________________________________________

Mattoso, Glauco

INFINITILHOS EXCOLHIDOS/Glauco Mattoso

São Paulo: Casa de Ferreiro, 2020 236p., 21 x 21cm ISBN: 978-85-98271-28-4

1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.

B869.1


NOTA INTRODUCTORIA Desde que fiquei cego, os annos 9 teem sido marcantes na minha producção. Em 1999 comecei a sonnettizar a carreira poetica, num phrenesi que só parou em 2012 porque, antes de completar o sexto milhar, decidi interromper o vicio. Em 2009 comecei a reorthographar toda a obra para voltar à escripta classica que practiquei nos annos septenta, e agora meu diccionario orthographico é trabalho consolidado. Em 2019 comecei a versejar em diversos formatos estrophicos e rhymaticos, sem abrir mão do decasyllabo e da redondilha maior, e dei inicio a nova sequencia catalographica a partir do poema 0001, quando, em meio a madrigaes, odes, rhapsodias, oitavas, sextilhas e terças rhymas, incorporei entre os experimentos um typo de poema isostrophico em que o parallelismo rhymatico se reordena de estancia em estancia, no eschema ABCD/ABCD, sem limite de versos, donde a designação de “infinitilho” com que baptizei tal formatação. Eventualmente dialogico, o infinitilho funcciona como replica do eu lyrico a uma segunda pessoa poetica, que o provoca e inquire. À primeira vista, portanto, o poema tem versos brancos, mas um attento olhar promptamente identifica as rhymas dialogicas na sequencia. À parte os que foram incluidos no livro MANIFESTOS E PROTESTOS, no presente volume 140 novos exemplos foram seleccionados, cuja thematica, previsivelmente, será polemica e controversa, satyrica e fescennina, corroborando a vocação questionadora deste auctor.



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PEDRA SOBRE PEDRA [0301]

Si rhymas podem extraordenadas ser, posso utilizal-as sem temor de estar em decasyllabo medido. Não vejo mais nenhuma posição rhymatica tão rigida que imponha limites ao meu verso ou minha estrophe. Fará a philosophal pedra nenhuma ou pouca differença no poema. Tambem de parastrophicas as fadas me pedem que as baptize. Vou suppor que faça algo de novo ou com sentido mais experimental. Porem ja não me deixa preoccupado que essa bronha poetica renove ou, velha, mofe. Importa a liberdade que eu assuma perante qualquer forma, foco ou thema. Durante muito tempo fiz rhymadas estrophes preoccupado com rigor formal, com algum genero battido. Agora não me importo si mais são os versos, ou si menos, que eu disponha em quadra, oitava, decima... Galhofe a lyra, e sei que a um rhumo certo rhuma meu verso, sem que fama alguma eu tema.

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10 GLAUCO MATTOSO CHARTILHA DO INFINITILHO [0528]

Si duas parallelas no infinito se encontram, trez ou quattro terão sua estrophe equivalente, que lhes rhyme no mesmo ordenamento. Sendo assim, os versos serão brancos entre si por dentro duma estrophe, mas terão egual a sua rhyma na seguinte. O numero de versos que repito em cada estrophe pode ser, de lua, bastante variavel. Que me anime, o thema será vario. Para mim, melhor é quando alguem provoca, ri, perguntas faz. Respondo com tesão a um interlocutor qualquer que pincte. Ou seja: variavel e restricto, ao mesmo tempo, quero que elle inclua a metrica. Perdel-a será crime. Comtudo, o meu poema não tem fim preciso, obrigatorio. Vou aqui chamar de “infinitilho” o que lerão meus sadicos leitores, com requincte.


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DARK DINNER [0018]

Por causa dum “jantar às cegas”, quem se fode é a mais burgueza mulherada, que affecta ser sensivel ao problema dos “pobres invidentes” e procura manter “civilidade” à mesa, emquanto garçons deficientes vão servindo os prattos mais exoticos, sabor que as pega de surpresa, sem fallar de incertas consistencias sob a faca, o garfo ou a colher em desastrado manejo, o que transforma quem bem vê em cego e só os garçons em “bons” no escuro. Coitada da madame! Que é que vem agora? Camarão? Paresce, a cada dentada, ter crocancia... Que dilemma! Depois de mordiscar a casca dura, mastiga a carne interna com encanto fingido: “Que delicia! Mas que lindo chardapio!” Indaga alguem: {Gente, e si for lacraia, escorpião?} O paladar de todas se estragou! Quem é que attacca, agora tacteando, outro boccado? Mais uma commensal acha o patê “extranho”... O astral ficou mais inseguro.

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12 GLAUCO MATTOSO BIRD BOX [0019]

Por causa de outro “jogo”, ou “desaffio”, os jovens se mutilam, correm risco de vida, acceitam testes de bravura! Não é que um desses jogos faz o otario vendar os olhos, como si os tivesse cegado de repente? Assim vendado, terá de andar em casa, até na rua, trombando, tropeçando ou despencando... Achei bem feito! Delles até rio, pois, quando sou menino, um simples cisco ou grão me faz temer algo que fura um olho accommettido e ja precario! Com risco de perdel-o, minha prece ainda em Deus confia, mas errado deu tudo e meu glaucoma alcançou sua victoria, seu final fatal, nefando... Agora, taes babacas sangue frio ter querem para achar que algum petisco não seja venenoso? Da tortura dos cegos sentirão o secundario effeito que senti: nos outros, cresce a sadica tendencia a achar gozado o nosso desespero! Substitua quem possa a moda a tempo, ou até quando...


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“LOSER” DAS LUZES [0022]

Ter dado a cara a tapa sempre foi meu vicio na cegueira. Desta vez tentei à Academia Brazileira de Lettras pertencer, ser immortal. Um “loser” assumido não iria perder sinão por trinta e nove a zero. Assim suppuz, e voto nenhum tive, de facto, o que renova a velha teima. Não sinto, pois, nenhum constrangimento de expor-me a tal ridiculo e fazel-o de novo certamente vou, emquanto viver e, alguem morrendo, abrir-se vaga. Não tenho muito tempo, pois sou boi ja rhumo ao mactadouro e sou freguez dos males da velhice, de maneira que posso me arriscar sem pejo a tal vexame de perder. Na Academia Paulista meu assento tambem quero, pois, quanto mais um cego bruxo vive, mais “ultimos cartuchos” elle queima. Tão logo aberto o posto, outra vez tento entrar, quebrar daquelle espaço o gelo. Ao menos dizer posso que em meu cantho não fico, só no assento de quem caga.

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14 GLAUCO MATTOSO FLATULENTO FLA-FLU [0038]

Sahiu silencioso o peido. O staff começa a perceber. Todos de terno, sentados ao redor. O proprio chefe sentiu, forte, o fedor e ja se abbanna. Augmenta a fedentina. Alguem offega. “Caralho!” - um assessor deixa excappar. De facto, o odor offende. Não se evitam olhares ao gordinho que, coitado, tambem se abbanna, sua, constrangido. O chefe se levanta da cadeira, respira fundo, tosse, pigarreia e todos logo imitam o seu gesto, incluso o gordo. Expreitam-se de esguelha o gringo, o contador de causos, um sobrinho do patrão. Que malestar!


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Peor que commetter alguma gaffe no pappo é peidorrar nesse moderno e aseptico escriptorio. O mequetrefe capaz de fazer isso, rindo, enganna a todos. É o coppeiro que, ao collega, la fora, gaba-se. Indo ao paladar do chefe, seu café faz que repitam a dose e approvem, como que do aggrado geral. Ah, si soubessem quão fedido é o peido do rapaz, que bem se exgueira servindo à mesa! Solta, volta e meia, seus gazes e dalli se evade, presto! Nem sempre os solta. Só si der na telha. “Meu time perdeu? Sintam o meu pum!” -com seus botões diz, antes de ir cagar.

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16 GLAUCO MATTOSO ENTENDA A LEGENDA! [0044]

Remedio contra a queda de cabello ou para emmagrescer faz propaganda que entendo por piada prompta, visto tractar-se de producto ja suspeito de cara! Deante deste annuncio, alguem tem duvida? “Não creiam em qualquer offerta falsa dessas por ahi!” Só falta accrescentar: “Confiem só na nossa falsa offerta!” Até sincera me soa, pois você perfeitamente, por autosuggestão, pode ter cura usando algum placebo, não é mesmo? Pensando bem, a phrase dicta pelo politico flagrado tambem anda por esse bom caminho: “Não sei disto nadinha! Fui trahido! Si um malfeito fizeram, quem fez pague!” Entendam bem o espirito da coisa: “Quem fizer malfeitos, de esconder tracte! Escondi mal? Esse foi meu erro!” Sente dó de gente desse typo só quem era louquinho para estar entre essa gente capaz de desfructar da sinecura tirando o cu da recta sem tenesmo...


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AUREA PHASE CRITICA [0122]

Preciso lhes fazer um desabbafo, amigos internautas. É o seguinte: Estou ja detectando um preconceito assaz sophisticado contra a minha cegueira, alem de tudo o que ja venho soffrendo ou passa alguem deficiente. Não vem de quem ja desce em mim sarrafo, mas sim de quem prefere que se pincte minh’obra antes de cego como um feito melhor que esta actual. Vão, depressinha, dizendo que o DOBRABIL teve engenho maior que o dos sonnettos, minha gente! Alguns até sustentam que me sapho melhor no MANUAL que nestes vinte anninhos de cegueira quanto ao jeito de entrar na narrativa que, excarninha, explana o masochista desempenho da victima ante o sadico inclemente! Jamais renego aquillo que autographo faz tempo, mas convenham que é um accincte milhares desdenhar do mais perfeito formato de poema! Si eu ja vinha maduro me tornando, ora detenho total controle sobre minha mente!

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Agora que, em heroico ou no de Sappho, cultivo o decasyllabo no ouvinte compasso da memoria, não acceito que façam pouco caso dessa linha esthetica que sigo! Franzo o cenho e torço o meu nariz! Ha quem aguente? Aos posteros mensagens engarrafo que, justo, me darão valor! Pedinte não sou quando os malevolos rejeito! Exijo que percebam: quem caminha ha tanto tempo, como eu, que me embrenho no breu, quer mais respeito! Francamente!


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HOSPICIO NO EDIFICIO [0123]

Que ingenuo que eu era! Accreditava que a gente, quando fica accommettida de algum mental problema, si não for neurose, é paranoia! Agora tem transtorno depressivo bipolar, maniaco obsessivo compulsivo, estresseschizophrenico, o cacete a quattro, tanta coisa mixturada! Será para lucrar mais que conchava um medico com outro sobre a vida da sua clientela? Algum doutor do ramo capaz era de refem fazer seu paciente? Que pagar mais caro o cara sempre tem, captivo! Terei que imaginar que ser joguete eu posso dum psychologo por nada? Psychologo, analysta... Só faltava mais essa! Psychiatra, sei la... Lida qualquer um desses medicos com dor no cerebro, não lida, gente? Eu, hem! O facto é que, não só no meu andar, porem no predio todo, ja motivo eu vejo de loucuras! De lembrete me servem estes casos p’ra pedrada:

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Aqui do lado, um delles sempre trava a porta com a cama, que é comprida! Um outro tem cachorro labrador que, até para trepar, na cama vem! Accyma, tem quem gosta de cantar às trez da madrugada! Assim me privo do somno! Um outro, abbaixo, na retrete cagando, dorme! Eu soube pela fada! Ou elles são normaes e eu, só, que escrava a mente tenho duma pervertida cegueira masochista, portador sou dessa anomalia, que ninguem consegue definir? Um exemplar maluco não serei? Mas lenitivo não quero, droga alguma! Meu macete está na therapia versejada!


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PÉ NO SACCO E PONCTO FRACCO [0175]

Diego, um amigão que dicas dá de filmes onde um cego é confrontado com sua actual crise de autoestima, me conta que, em “Perfume de mulher”, um typo gozador joga na cara do cara a situação com bom humor: “Talvez Deus ache mesmo que tem gente aqui que não meresce enxergar, hem?” No filme, quem ficou cego reage na base da porrada, mas eu não. Reajo, dependendo do que está em jogo, de dois jeitos. Si o folgado que disse aquillo falla mal da rhyma que emprego ou duma metrica qualquer que excolho, si vulgar ou si mais rara, a minha reacção é de rancor profundo: sobre o typo certamente tal praga jogarei que, la do Alem, tambem uma desgraça, algum ultraje egual, vae soffrer esse folgazão.

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Comtudo, si o folgado toca la no poncto meu mais fracco, me degrado inevitavelmente. Caso accyma dum cego se colloque, si quizer fallar de raras cores, só me azara os brios. Nesse caso, dou louvor ao typo. Me rebaixo, à sua frente me prostro, o pé lhe lambo, chupo sem pudor a sua rolla. Serei lage de appoio à sua sola, serei chão.


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HISTORIA DO ROCK [0316]

Dos hippies a polemica verdade applica-se à rockeira trajectoria. Com annos mais de trinta ninguem é por elles respeitado, siquer digno dalguma confiança. Assim eu vejo o proprio rock’n’roll, si for historia aquillo que queiramos estudar. Olhando friamente, temos trez, de facto, ferteis decadas: cincoenta e cinco até sessenta e cinco, a base. Até septenta e cinco, a plenitude. Mais dez, e oitenta e cinco marca a data final, depois da qual nada se cria. Na phase inicial, pois, ninguem ha de negar que foi dansante essa memoria. Dansante e adolescente, pois no pé marcava-se o compasso que eu defino “emballo de bailinho”, no desejo de quem perde cabaço. A quem adore a sonora trilha disso, “car”, “guitar” e “hold your hand” bastavam, nesse inglez “teenager”, para alguem que adulto tenta ser, mas não quer crescer. Foi nessa phase que, de Elvis até Beatles, juventude vendeu-se. De politica não tracta a lettra, nessa analyse mais fria.

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De Dylan, “Like a rolling stone” edade maior ao rock empresta. Si illusoria, utopica a mensagem, pode até alguem pôr em questão, mas ja menino não era aquelle joven, pois ensejo havia para a droga que melhore a astral visão de mundo, que estellar não é só por de “star” ser o burguez projecto dalgum idolo da attenta platéa psychodelica. Que em paz e amor accreditasse, eu ca não pude dum joven duvidar. Àquella natta pertencem Janis, Byrds e companhia. Nos annos “progressivos”, que me aggrade ha muito no rockão. Maior a gloria foi delles, do Led Zeppelin, que fé merescem. Queen e Stones vaticino que fiquem, com Deep Purple e Yes, varejo deixando para um Creedence e, na escoria, a turma dos Ramones, no logar depois mais occupado por quem fez podreira tribalista nos oitenta. Não ha canção mais typica que case com esse aureo periodo, nem que grude mais nessa geração que “Changes”, chata a alguns, mas verdadeira allegoria.


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Deixou-nos David Bowie tal saudade, pois phases encarnou. Quem rememore a questão, depois de Smiths outro filé não acha no chardapio. Ja termino aqui, pois com os Wilburys bocejo de tedio. Os revivaes são transitoria versão do que virá reaffirmar o grunge: recyclagem ja vocês percebem que se expalha pela lenta virada do millennio. Agora quasi mais nada resta, alem dessa attitude rebelde e saudosista, que bravata fez duma breve e fragil utopia.

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26 GLAUCO MATTOSO ANECDOTA CARIBENHA [0353]

Escandalo causou à dictadura daqui que uma piada do Caribe virasse ska dansante e fosse tão famosa a poncto de isso ser problema aos nossos jumentissimos censores. Renato e Seus Blue Caps amenizaram o thema, que extourou pelas paradas à guisa de canção da Joven Guarda, daquellas innocentes e cafonas. Um joven quer casar. Seu pae procura e pede permissão. O pae prohibe: “É tua irman, porem tua mãe não está sabendo.” O filho extranha o eschema. Namora outras meninas, de outras cores, e quer casar com uma. Mal lhe param os planos, pois os paes das namoradas tambem respondem isso. O que é que o agguarda, alem de procurar putas nas zonas?


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À mãe o meninão então dá a dura noticia. A mãe, comtudo, um riso exhibe e diz: “Não te preoccupes, pois estão por fora! Quem quizer casar, não tema! Não quero que tu tenhas novas dores, mas devo te contar que me comparam a alguma puritana por uns nadas! Teu pae não é teu pae! Só tem cor parda, tambem, mas nada sabe! Te emocionas?”

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28 GLAUCO MATTOSO TERREMOTO PERPETUO [0359]

Fiquei alliviado quando li que estamos numa “crise”. Mas não numa qualquer. Estamos numa “crise chronica”. Ainda bem! Si a crise é permanente, si sempre foi assim, estamos como si nada accontescesse de mais grave que aquillo a que eu estou accostumado. Peor seria a crise mais aguda, que abballa, que nos tira da roptina. Seria a verdadeira, a grave crise. Eu acho engraçadissimo o que, aqui, se entende por “problema”. Se accostuma a gente a reclamar da mais euphonica das gregas palavrinhas. Chega a gente a gozo ter, tal como si num pomo dentada a gente desse que lhe excave enorme e fundo naco. Consolado, a “crise” saboreio. Quem estuda as coisas do Brazil não se admofina. Portanto, que a questão se tranquillize.


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OPPOSTOS POSTOS [0363]

{Do lado que, do Atlantico, te fallo, paresce-me, carissimo poeta, que estás a delirar. Como pretendes viver num paiz grande, si jamais estás, ou estiveste, ou estarás dum vasto territorio em quaesquer partes? Hem, Glauco? Como queres, te questiono, viver num paiz rico, si riqueza alguma não terá jamais o povo do qual te julgas parte, caro vate? Questiono-te, meu bardo: como pensas viver num paiz bello, si o desmattam, polluem e lhe extraem das entranhas minerios que nem ouro siquer são? Que raio de paiz é este teu, meu caro menestrel, em que se joga supposto futebol e que se brinca um falso, um falto, um futil carnaval? Responde-me então, cego trovador!}

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30 GLAUCO MATTOSO

-- Confesso que pisaste no meu callo, carissimo confrade, e que me affecta aquillo que me indagas. Por que entendes que estou hallucinado, si normaes viagens são as nossas, ó rapaz, a bordo dum poema? Por que partes do falso presupposto de que dono eu seja da comida que na mesa não viste de ninguem, si me commovo com todos os que comem chocolate emquanto diabetico sou? Densas florestas nunca as gabam os que tractam, ahi, de versejar. Hem? Por que extranhas as mattas que perdemos, si ja não tem quasi teu paiz, tão europeu, aquellas que ja teve? E então? Que droga de seres são humanos, si se finca num touro, por esporte, esse mortal espeto que, em meus olhos, causou dor?


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CIRANDA QUE DESANDA [0365]

{Estou aqui pensando, Glauco, aonde chegamos, chegaremos, em materia de infancia corrompida... Glauco, veja! O funk excappa a todo padrão ethico, esthetico, ou appenas musical! As lettras erotizam a menina do modo mais abjecto, Glauco! Pode? Um desses “emecês” obriga a sua “novinha” a adjoelhar para fazer boquette, Glauco, frente ao “bonde” todo! Ainda a menininha vae chupar o resto da patota, Glauco! Onde é que vamos parar, Glauco? Os taes valores moraes, civilizados, nada valem?}

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32 GLAUCO MATTOSO

-- Ouvi fallar. Pedrinho fui, de escondeesconde ja brinquei, mas esse fere a candura dos Pedrinhos. Quem rasteja, agora, não sou eu, que ja prophetico me torno, mas a “mina”, que tem tal dom para a fellação mais libertina, gruppal e cultural de quem se fode em publico. Quem quer que prostitua menores é covarde e meu dever de vate é criticar. Mas eu me fodo assim desde menino, si é vulgar, nas areas suburbanas, lamber pé na marra, chupar rolla, sem pudores. Censores jamais deixo que me calem.


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LERDA EPHEMERDA [0373]

Juninas festas sempre evocam minha cegueira, pois sou Pedro e sou nascido no dia desse sancto festejado. Mas meu anniversario me trazia maior preoccupação: quanto faltava p’ra que eu ficasse cego? Quantos annos ainda, até que eu macte em mim o drama? É muito melancholica a lembrança. Costumo conversar com quem me assiste, o espirito que, anonymo, é chamado de Pedro por mim mesmo. Quem será? Não disse, mas suspeito que elle seja tambem um menestrel. Fallo commigo tal como si com elle conversasse. Si alguem mais alto ouvindo nos está, por elle fallará, que escutarei, ficando o suicidio ‘inda addiado.

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34 GLAUCO MATTOSO

Serão juninas festas o meu lado sombrio mais sombrio, pois eu sei que estão a festejar como si ja pudessem advistar de Deus a face. Não sabem que vem delle só o castigo, que nada commemora quem festeja. Um cego certamente invejará aquelle que, feliz, não foi cegado. Um cego certamente está mais triste no dia de São Pedro, pois creança não é para sorrir. Hoje na cama eu temo o pesadello, temo os damnos que n’alma me provoca a treva brava. Espero o inferno astral, esta agonia passar, mas jamais passa algum passado emquanto não, emfim, me suicido. Por ora, aqui cheguei ao fim da linha.


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PIPOCANTES MICROONDAS [0384] (para Lucio Medeiros, amigo e leitor attento) Macacos, ou Vigario Geral, ou Pedreira, ou Juramento, ou do Urubu... Tambem Villa Vintem, tambem Koréa... Visiveis, mas difficil seu accesso. O traffico usa alli seu tribunal e quem o desaffia alli será queimado vivo: o riso da gallera que assiste é garantido. O trafficante trazer uns pneus mandou. Seu desaffecto (alguem que está devendo, um seu rival, reporter, informante, ex-namorada) entrar vae pelo tubo de borracha. Os numeros, ninguem os informou. Não é que seja aquillo algum tabu. Appenas se varia. Quem idéa tiver, para augmentar o seu successo perante a molecada, tem aval do chefe. Morra a victima, que está bem viva, appenas cega talvez! Mera questão de expancamento que, durante o previo julgamento, foi correcto demais ou foi de menos: ritual de farra e diversão geral, mais nada. Que seja crime barbaro quem acha?

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36 GLAUCO MATTOSO

Demora a agonizar. Melhor o show será si o condemnado, ao olho nu, caretas mais fizer para a platéa. “Por isso o corpo delle eu attravesso no meio duns seis pneus, de modo tal que braços, pernas, prendam-se e não va fugir dalli.” Deleite é o que se espera que renda aquella scena, jus a Dante fazendo, rosto exposto ao predilecto dos methodos mortaes. O carnaval desfila na avenida, mas ja cada vez mais é superado: outro se excracha. Detalhe interessante: elle fallou (à midia um dos bandidos, em tom cru, nos conta) que da victima não é a erecta a posição melhor. “Eu peço que o ponham é deitado. Assim eu mal estico o pé, pois sua cara ja alcanço facilmente...” Que severa, extrema, dolorosa, degradante maneira de mactar, hem? Eis, no tecto de pedra dos Brazis, o cultural exemplo duma technica advançada que royalties não cobra, siquer taxa.


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FINAS AFFINIDADES [0389]

Mostrava-me elle, quando o visitei, a sua collecção de tennis, botas, sapatos e chinellos. Sim, mas eram da rua recolhidos! Tennis sujo e todo detonado, sem lingueta... Botina de pedreiro, deschartada, furada, fedidissima... Que mais? Sapato de mulher, não vi nenhum, ainda bem! Só coisa que interessa a gente de selecto, fino gosto. Faz tempo. Ja assumido como gay eu era, ja sem medo de chacotas daquellas que os podolatras esperam ouvir. O tal amigo, porem, cujo armario transbordava, até sargeta fuçava, procurando os tennis! Nada temia que pensassem, mas os taes sarristas o chamavam de bebum, de doido, de drogado. “sim, (confessa o cara actualmente) eu sou de agosto!”.

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38 GLAUCO MATTOSO

“Nasci com esse fado vil, bem sei, mas hoje me curei, Glauco! Não notas?” Sim, noto, mas lamento, pois lhe zeram de lixo seus armarios. Delle fujo, agora que é “curado”. Não se metta, tambem, a me “curar”! Podia cada pé desses ter me dado! Quantos ais chorei! Jogou-os fora! Si em commum mais nada temos, fico triste à bessa e estou com elle, em gostos, indisposto.


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SCINTILLANTE TRANSEUNTE [0394]

Enganna-se quem acha que o basset ja morto vire estrella e fique la parado no universo, eternidade affora. Que elle vire estrella, sim, eu creio, pois ao anjo se assemelha. Jamais, porem, durante dia claro. Passeia pela rua, mas você não pode vel-o. Saiba que elle está nos mesmos locaes onde -- Quem não ha de lembrar? -- esteve sempre, por assim dizer, nos encantando, longa orelha e curta patta, em tudo usando o faro. Você não o verá, mas elle vê você. Tambem é visto por quem dá na rua seu passeio, si amizade fizeram: beagle, cocker ou mastim. Cachorros, mesmo os vivos, a scentelha de vida acham nos mortos, eu reparo.

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40 GLAUCO MATTOSO CAGANDO E MANDANDO [0395]

É bello, é lindo, é sadico, é cruel requincte escatologico! Um amigo me conta que escraviza duas bichas masocas e as obriga a comer tudo que caga, cagalhão por cagalhão, mordendo, mastigando, degustando a merda advolumada no penico. “Glaucão, tu precisavas ver! O mel que excorre do tolete, eu as obrigo, as duas, a lamber! Como salsichas teem ellas que chupar cada thalludo tolete, até que, aos poucos, elles vão sumindo, derretidos! Eu, gozando da cara dellas, vendo tudo fico!” Pergunto-lhe si nojo do farnel as duas não demonstram. “Sim, mas sigo mandando até que accabem! Tu não pichas os mestres que alliviam? Não adjudo ninguem! Eu só complico! Né, Glaucão?” Percebo que elle sabe no commando ficar e ja nem abro mais o bicco...


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CHEIRO PASSAGEIRO [0396]

Estou tão louca para que o verão de volta venha! Ai, quasi nem me aguento! Me sinto tão incommoda, tão cheia de roupa, de assadura, de coceira! Ai, Glauco, só você me entende, né? Preciso tomar banho, Glauco! Não aguento tantos mezes! Fedorento meu corpo tá todinho! Minha meia você nem quereria! Quem a cheira jamais se exquescerá do meu chulé! Não quero ficar suja, não, Glaucão! Usando um bom perfume eu até tento meu cheiro disfarsar, mas está feia a coisa! Nem masoca acho que queira lamber da bocetinha meu filé! Com esse frio todo, o banho é tão difficil de tomar! Não, Glauco, um vento gelado ja me grippa! Não receia você pela rhinite costumeira? Então! Quem prevenido ca não é?

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42 GLAUCO MATTOSO

Mas tudo se resolve! Esta estação está quasi passando! Mesmo lento, o tempo vae mudar, Glauco! Sim, creia! Chulé quem ja cheirou a vida inteira nas idas e nas voltas bota fé!


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SUPPOSTO CONTRAGOSTO [0400]

De “scat” uns videos mostram que comida a merda ja vem sendo normalmente nas scenas de sadismo ou submissão. Até que, nesse poncto, eu commemoro. Aquillo que incommoda meu instincto, direi, “deshumanista” é que o submisso demonstre estar feliz e dê risada emquanto foi cagado ou come a bosta! Assim, não! Perde a graça! Até brochante se torna toda a scena! Como pode alguem que soffre abusos externar prazer ou alegria? Pode até curtir intimamente, mas precisa fazer suppor que cede coagido!

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44 GLAUCO MATTOSO

O mesmo vale para a preferida sessão do meu orgasmo: o adolescente pisando no mais velho, o madurão lambendo o pé do moço. O que eu deploro é nojo não haver, é o que não minto naquillo que narrei. Fetiche nisso achei porque ennojava! Porque cada pé sujo ou chulepento ninguem gosta, na marra, de lamber! Quando um pisante sujissimo lambi, suppuz: se fode quem fica por debaixo! Tem azar quem perde e fica cego! Lambe pé quem feito de capacho foi, à guisa! Mas tudo por consenso eu não valido!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

DESDOBRABILIDADE [0401]

Eu, quando comecei, o que queria não era questionar a auctoridade durante a dictadura, appenas. Quiz eu, mesmo, questionar uma auctoria, a propria propriedade, ou auctoral, ou intellectual. Do plagiario fiz, sim, apologia. Allardeei o texto espurio, apocrypho, udigrudi. Pudera! Fui poeta marginal naquelles septentistas petreos annos! Sim, petreos annos patrios! Hoje em dia, a sanha auctoritaria nos invade o caldo cultural, quando fuzis e botas novamente pela via circulam, patrulhando. Mais aval agora dou aos classicos. Mas Mario, Oswald e os Campos ‘inda são a grei que minha fé norteia. Não, não pude do canone abrir mão, mas actual o faço si não passo quentes pannos.

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46 GLAUCO MATTOSO

Parodias sejam feitas, todavia! Paraphrases se façam à vontade! E satyras, tambem! Peçamos bis! De vida signal seja uma anarchia possivel, postmoderna! Carnaval brinquemos! Algo achemos mais hilario! Ainda transgredir alguma lei podemos! É questão duma attitude! Logar ainda resta à “coisa e tal”! Sejamos hedonistas... e espartanos!


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CATARRHO NO SARRO [0402]

Agora a cusparada virou moda nos videos pornographicos do typo curtido por podolatras: um cara mais velho dos mais jovens é cobaya, dos tennis lambe sola, de descalços pés lambe e cheira a typica sujeira. Na cara tapas leva, até biccuda. Mas uma coisa chama a attenção nossa: saliva abunda nessa bella scena. Não usam nu frontal, nenhuma foda explicita alli rolla. Participo da scena mentalmente, pois compara a mim o personagem que então caia aos pés da molecada, sem os falsos pudores dos adultos que a cegueira só fingem proteger com sua “adjuda”. Careca, gordo ou oculos quem possa usar será pisado, pois, sem pena.

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48 GLAUCO MATTOSO

Alem de ser pisado, o que incommoda a victima é o catarrho. Si me grippo, excarro com frequencia. Minha tara si fosse egual à delles, ah, que saia da frente quem não queira, alem dos calços, levar a catarrhada! Mas quem queira gozar sendo cuspido, vê que gruda à bessa a baba nelle, espessa, grossa e erotica, si estamos nessa arena.


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SCENA SUBURBANA [0417]

As casas que, naquelle quarteirão, se junctam, geminadas, quintal teem murado, umas com outras. Um ladrão, entrando numa dellas, rendeu com total facilidade o morador edoso, que admarrou numa cadeira. Queimou-o com cigarro, lhe batteu na cara, lhe cuspiu, e foi embora. Mas visto foi por uma das vizinhas. Allarme dado, o joven ladrão não consegue ir longe. Foge, então, mas vem correndo nos telhados. Um pisão em falso, rolla abbaixo. Nada bom será disso o desfecho, é de suppor. Tentando equilibrar-se, ‘inda na beira do tecto, cae num muro onde alguem deu um tracto, fincou cacos. Eis que, agora, taes ponctas foram uteis, as ponctinhas.

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50 GLAUCO MATTOSO

Se corta todo, corre. A multidão formada logo o pega, de refem o faz num lynchamento, uma licção bem dada, de risada boa ao som. De eschola, um ex-collega até mais dor lhe causa, ao vel-o alli. Caso alguem queira saber por que, sem pena, dá no seu collega tanto chute, elle nem cora: -- Porque nota tirou, melhor que as minhas!


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QUEIJO DE GUEIXA [0421]

Em outros desses videos é feliz o rosto da mulher que aquillo faz, ou seja, lamber tudo do caralho sebento cuja pelle ella arregaça. Mas neste é repugnancia que ella exprime emquanto passa a lingua na camada de esmegma apparentando forte cheiro. Ao menos na attitude é convincente. Detesto quando victimas servis, nas scenas humilhantes, dessas más e sadicas torturas, o trabalho performam com prazer! Quero que faça ter nojo quem a serva assim victime! Não pode parescer que a foda aggrada a alguem que faz papel de verdadeiro escravo, como faço realmente! Papeis do typo, sempre que eu os fiz, me foram repugnantes! “Mas estás, nos versos, a gozar!” -- diz quem o malho me desce. Sim, eu gozo! Quando passa o sordido momento que me opprime, ahi sim! Mas, na hora da chupada, estou sempre ennojado! Faz inteiro sentido um cego sendo obediente!

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52 GLAUCO MATTOSO FESTA DE SÃO BARTHOLOMEU [0422]

Naquella millennar mythologia hellenica, a caixinha de Pandora continha tudo quanto ruim era. A caixa não podia ser aberta, sinão os varios males fatalmente iriam se expalhar por todo o mundo. Mas foi, pois sempre pincta algum curioso. Ficou na caixa appenas a esperança, dos males o menor, que sempre resta. Pois é: segundo alguns, a cada dia que passa, a coisa mais e mais peora e o tal Apocalypse, que chimera temida foi, agora como certa e celere esperança quer a gente que seja a salvação. Tambem segundo alguns, aquillo que era pavoroso se torna preferivel. Não se cansa a mente da crendice mais funesta.


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Tambem o meu palpite eu lhes daria, pois acho que o peor não é de agora e sempre esteve a pique, em quem espera, de, emfim, fazer sentir-se. Bem allerta, portanto, sempre estive e, experiente que sou, do meu abysmo mais profundo lhes fallo. Não, não é Glauco Mattoso quem falla, mas Satan que, feliz, dansa no rhythmo saltitante desta festa.

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54 GLAUCO MATTOSO CERTIFICADO DE CONCLUSÃO [0424]

Entrar na Academia não consigo, por causas mais politicas que, em summa, theoricas ou criticas, mas quero logar proprio no canone, isso sim. Cadeira, simplesmente, não confere tal posto. Nem desejo uma cadeira si for municipal, estadual ou mesmo uma secreta associação. Sou supranacional e só postulo aquillo que meresço por justiça poetica, lusophona, terrena. Pergunto ao meu collega, ao meu amigo, então: Como é que eu faço? Quem me arrhuma um premio, um attestado? Não um mero registro midiatico (que, emfim, não vale como numero na serie historica), mas uma verdadeira sentença em pedra inscripta, esculptural, cabal, definitiva, como são as obras de Rabello ou de Catullo. Linguagem mais vulgar ou mais castiça nem compta assim. A penna vale a pena.


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Pergunto: quantas theses, das que instigo aos mestres e doutores, valem uma vaguinha nesse crivo tão severo? Milhares de sonnettos, como os vim compondo, quantos querem que eu espere compor? Quantos mais annos de cegueira febril e productiva, antes de tal espaço conquistar? Hem? Por que não me entregam tal em vida? Fico fulo sabendo que, de septimo, uma missa preparem quando eu saia, ja, de scena.

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56 GLAUCO MATTOSO AFFLICTO MOSQUITO [0426]

De dores oculares eu padesço. Perdi meu olho esquerdo, o que restava. Pendi para analgesicos, em vão. Pedi para meu medico o opioide. Pedi dum outro medico o opiaceo. Pedi de mais um medico morphina. Pedi dum outro ao menos codeina. Disseram-me: {Magina! Você quer mactar o que não passa dum pequeno mosquito com um tiro de canhão!} Difficil conseguir uma receita foi sempre, pois os medicos não dão à gente o que elles tomam quando a dor não querem supportar na propria pelle.


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Paguei ja, por remedios, alto preço. Mandei ja, muitas vezes, tudo à fava. Pensei: “Por que é que os medicos não são eguaes aos que, nas epochas do Freud, remedios davam para que passasse o effeito doutra droga que elimina symptomas que não passam duma fina cortina de fumaça?” Quem disser {Magina! Quer você com um veneno curar quaesquer incommodos?} eu não acceito mais! Aguente quem acceita! Agora, compto os dias que virão até que isso termine. Não, doutor, mactar-me irei, não tendo a quem appelle!

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58 GLAUCO MATTOSO AUTOCOMPLACENTE PLACEBO [0427]

As drogas injectaveis são as mais potentes contra a chronica dor, essa que sinto no olho onde era ainda viva a restia de luzinha que perdi. Não gosto de injecção, mas raciocino na logica proposta por Diego Tardivo, opportunissima, no caso. Usar continuamente essas lethaes dosagens macta cedo. Mas, à bessa soffrendo, o cara appella à lenitiva acção duma substancia. Até se ri de allivio. Vae morrer, mas é destino morrer, mais cedo ou tarde, e quer sossego alguem como eu, que os males extravaso. Ao medico, convem que use jamais taes drogas o doente e lhe interessa vender novos placebos, pois me criva de innumeras receitas. Eu, aqui commigo, decidi: logo termino com isso me mactando, sem emprego de methodo sangrento, sem um prazo.


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SEPTEMBRO AMARELLO [0433]

A cada quarentinha segundinhos alguem se suicida. Assim allega a agencia mundial. Mas estatistica jamais afferirá cada motivo, cegueira, solidão, dor, depressão, que induz uma pessoa a se mactar. Sapato que percorre maus caminhos, apperta cada pé cada collega meu, cego ou outra victima da mystica malefica. Daquillo que me privo alguem tambem se priva, sem ser tão maldicto nem estar no meu logar. Em summa: tem tambem os seus espinhos nos pés ou no trazeiro. O que me cega espinho tambem é, characteristica commum aos suicidas. Não, o crivo não pode ser appenas os que estão soffrendo de deprê sem se tractar. Tampouco os molequinhos, coitadinhos, são unicos exemplos desse mega problema de sahude. Masochistica hypothese, com ella até me exquivo de excusas, mas terei sempre razão si invoco, por pretexto, o meu azar.

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60 GLAUCO MATTOSO GASTRICA GASTURA [0434]

O velho tirar sangue vae, roptina à qual se accostumou, com tanto exame que os medicos lhe pedem. Nem está nervoso no momento da collecta. Mas, desta vez, inepto é o funccionario que fura a sua veia. Sem achal-a, o gajo faz da agulha sacarolha e, fura que refura que perfura, emfim faz a sangria. Alli, coitado, contorce-se o velhinho no repuxo dos nervos, vendo estrellas, tenso, afflicto. De subito, começa a passar mal, accaba desmaiando, dá trabalho até que se refaça, para casa consiga retornar, de braço tincto.


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Agora, a qualquer hora se imagina naquella situação. A quem reclame não tendo, ganha azia, fica ja tremendo, sapateia, arfa, se inquieta, revê seu hemorrhagico scenario. “Ja soffro, Glauco, tanto! (elle me falla) Me tracto das doenças, sem excolha, e ganho, de lambuja, a tal gastura de estomago! Ora, estou ou não ferrado?” Eu, só de imaginar, quasi extrebucho com elle na afflicção. Depois, medito accerca da sahida natural pro nosso descomforto. Não me valho, porem, da suicida voz que embasa as minhas theses. Fico mudo, ou minto.

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62 GLAUCO MATTOSO PAZ DE ESPIRITO [0435]

{Tem hora, Glauco, que esse estresse excede qualquer resiliencia, mas eu ja achei a solução! Automassagem! Exacto! Tem um methodo que ensigna a gente a conhescer a propria sola, fazer uma “reflexo” bem gostosa, tocar nos ponctos certos e explorar as zonas problematicas, Glaucão! Você, que é tão podolatra, na certa ja sabe practicar essa autoadjuda plantar, não é? Me diga, Glau: dá paz de espirito, não dá? Super relaxa, nos deixa a levitar, quasi, não deixa? Me diga, Glauco: gosta desse troço, não gosta? Não é boa therapia?}


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-- Practico, sim, mas caso a vida azede demais, nenhum dos methodos nos dá maior tranquillidade. Não reagem os ponctos energeticos -- Previna a sua mente! -- si ella não controla a nossa dor mais chronica, a penosa angustia de exsistir. No meu azar si penso, só garanto da afflicção a tregua si em mactar-me vejo aberta e clara solução. Basta que accuda a these suicida: nem se faz preciso consummar algo que a taxa augmente de taes obitos. Mais queixa não faço. Só saber que tirar posso a vida, as dores della, ja allivia.

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64 GLAUCO MATTOSO COMING TO THE CANYON [0436]

Possivel si me fosse conversar appenas com cachorros, um amigo humano que não tenho certamente canino a mais teria. Como os Mamas and Papas ja cantavam, é preciso “to say good morning really meaning it” e, quando um cão diz “Au!”, quer nos dizer “Bom dia!” “Alô!” “Cadê minha linguiça?” Ou seja, diz aquillo que lhe vem à mente, sem fingir, sem falsidade. Cachorro, quando morre, vira “star”, no céu uma estrellinha, mas te digo que é falso tal conceito, pois a gente não vê quando não quer. Nos nossos dramas estamos tão absorptos, que juizo nem temos para ouvir um cão que grite com outro (ambos ja mortos), para ver os dois a passear na fronteiriça calçada, no trajecto que ao Alem nos leva, pela vida, na cidade.


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Não morrem, os cachorros. Nosso lar ainda, sim, frequentam. Meu castigo é vel-os, pois sou cego. Sei, descrente o povo é do que digo. Tu não amas teu cão? Não vês phantasmas? Pois te adviso: Phantasmas elle vê. Quem accredite naquillo que eu affirmo, tem poder tambem para notar quem é que attiça aquelle bassezinho que ninguem notou, excepto um cego ja de edade.

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66 GLAUCO MATTOSO HOW MANY FRIENDS? [0438]

Ainda me podia ver no espelho, um olho ja tapado, lente escura nos oculos, outro olho pouco vendo. Sahia à rua à noite, em visual rockeiro, de jaqueta trespassada e sempre havia alguem que me notasse, alguem que, mais bonito, me dizia curtir gajos que sabem se vestir. Nem elle, nem eu, tinhamos, de facto nas nossas caras nossas attracções. O gajo só queria me chupar. Eu só queria aquelle pé lamber. Ninguem era sincero, mas a gente tentava apparentar que era na cara, na roupa que se excolhem os parceiros.


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Depois que fiquei cego, um rapazelho não pode mais dizer que em mim procura aquelle visual, antes horrendo, de punk ou de skinhead, em meu tribal jeitão, porem fajuto, na calada da noite, eu que não tinha a bella face. O mesmo rapazelho que, de dia, me via a bengalar, ficava a rir. De noite, me ligava, seu sapato queria descrever-me. Eu de Camões queria lhe dizer, de cor, um par de classicos sonnettos. Mas prazer tivemos em trocar, sinceramente, os nossos interesses, um na tara, nas lettras outro, os versos pelos cheiros.

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68 GLAUCO MATTOSO

Ninguem mais vem pedir o meu conselho poetico ou rockeiro. Nem figura de velho bruxo faço, nem defendo papeis de menestrel profissional. Não resta, a permutar, hoje mais nada. Pergunto-me: affinal, como é que nasce vontade, ou amizade, ou sympathia reciprocas? Como é que, sem fingir, iremos nos querer? Accode, ingrato, à mente este dilemma: os amigões exsistem? Quantos delles eu comptar nos dedos posso? Quantos vão saber amar-nos como somos? Quem se sente comnosco solidario? Ora, tomara tenhamos inimigos verdadeiros!


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RANHETA GRETA [0439]

Estou magoadissima, ah, si estou! Irei ja convocar greve geral! Não! Quero uma global, pensando bem! Meu lindo planetinha todos nós, teenagers do mundinho todo, vamos parar, vocês verão! Eu vim aqui, tão crente e esperançosa, convidada que fora, mas, ouvindo esse discurso vazio, magoada fiquei! Como commigo fazem isso? Destruindo estão a minha linda, crente infancia! A minha linda casa de bonecas (o nosso planetinha) vae ficar sequinho, devastado! Magoada estou! Vou procurar outro caminho!

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70 GLAUCO MATTOSO

E então? Do meu futuro, o que restou? E tantas creancinhas, que são mal amadas? Nisso pensa alguem? Hem? Hem? Não fica assim a coisa! Minha voz farei ouvir! Irão nossos reclamos nas redes propagar o que senti! Advante! Todos junctos, molecada! Não quero conversar só com meu urso, tão fofo, de pellucia! Agora sommo a minha birra às outras! Nosso lindo mundinho devastar vae a ganancia dos homens? Não podemos deixar! Necas! Parar irei a Terra, nosso Lar! Mas sabem por que estou tão chateada? O Glauco me mandou catar coquinho!


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THAT’S THE QUESTION [0440]

{Você não percebeu, Glauco? Não tem “prisão de ventre”, nada! Appenas é questão de conhescermos nosso tão sympathico cocô! Quem vae ao throno sem falta, todo dia, acha que faz cocô regularmente! Não faz tudo, porem: levanta logo da privada! Por isso repetir vae admanhan! Quem vae de vez em quando mais demora, mas caga até sahir a bosta toda, caralho! Porra, Glauco! Saca agora? Entende, então? Que merda, a nossa vida!} -- Sossegue! Não se enfeze! Tudo bem, sei disso. Ja fiquei, antes, até cabreiro, mas agora a situação paresce-me normal. Nunca funcciono certinho, ja notei faz tempo, mas nem ligo mais, a coisa nem estudo de forma scientifica. Qual nada! Si Shakespeare fallou que a nossa van cabeça não conhesce nada, affora aquillo que cagamos, que se foda a van philosophia! Amigo, bora la, vamos é pensar mais na comida!

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72 GLAUCO MATTOSO CONVERSA EM CONSERVA [0441]

{Não sei como dizer, Glauco, mas para mim rolla algo comnosco... Você sae commigo, não sae? Sabe? Eu tenho um pé bem chato, do seu gosto! Diz você que curte pé tamanho maior, bem maior! Ja reparou no meu solado do tennis? Não sentiu nenhum tesão?} -- Tá doido? Olhe só para a minha cara! Sou feio que nem sapo! Cê não vae dizer que quer ficar commigo, né? Você, que é tão bonito, não se vê no espelho? Pois procure alguem tambem bonito, ué! Não venha pro meu lado com essa de “belleza d’alma”, não! {Mas, Glauco, só pensei na sua tara podolatra! Affinal, você não cae de bocca facilmente? Fiz até poemas p’ra você! Por que não lê aquillo que eu escrevo? Vou alem do physico, fiquei appaixonado por sua voz poetica, Glaucão!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Amor, meu amigão, você declara agora! Mas, mais tarde, é só o papae aqui que vae ficar na mão! Chulé teem muitos gajos feios! Cê não crê que exsista alguem melhor? Claro que tem! Me troque por alguem do seu aggrado emquanto nem tivemos relação!

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74 GLAUCO MATTOSO DESCRIPTA SCENA SAUDITA [0442]

Relatam-me: na Arabia, actualmente, a practica sunnita recrudesce. Quem pensa que internet é livre para protestos, condemnado será como qualquer outro sacrilego. Será, em publico filmado, flagellado. Até turistas filmam. Quanta gente diverte-se com isso! Si estivesse alli, tambem eu, logico, filmara: a todos os demais nisso me sommo. Me dizem que, entre aquelles que vêem, ha quem queira, até, nas botas ser babado! Explica-se: o punido tem, na frente de todos, que lamber, antes da prece e dumas chibatadas, com a cara nas botas do carrasco ou, num assommo da parte deste, lambe quem está appenas assistindo como sado. Não posso me fazer de indifferente perante tal castigo. Me enduresce a picca quando um cego se compara à victima. Meu gozo não embromo e digo que desejo lamber ja o tennis dum turista mais folgado.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

Um arabe que livre pense e tente ser, logo saberá, caso não cesse seus memes de postar, que quem se azara é elle. Provará do amargo pomo na sola da botina. Provará aquillo que provei ao ser cegado.

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76 GLAUCO MATTOSO DOPANTE INHALANTE [0445]

{Você precisa, Glauco, usar morphina! “Tylex” não dá mais compta? Tome então “Dimorph” e vae allivio ter total! Um texto do doutor Drauzio Varella demonstra que, nas dores fortes, nada resolve, só morphina! A droga não provoca dependencia, mas barata demais si comparada a drogas mais complexas, boycottada sempre está por parte do commercio da sahude! Ainda que receitas amarellas assaz burocratizem, você tem, Glaucão, que insistir nisso! Cobre, exija! Seu olho melhorar vae, Glauco, creia!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Morphina a gente exige, sim, magina! Ja colica renal eu tive e tão aguda, que parar fui no hospital! Nem fundo dóe meu olho. O que flagella, na sensação de areia, na ponctada, no vidro que, em farello, sensação me causa, sempre e sempre, é que, sem data, agguardo os vazamentos naturaes nos casos de cegueira, como ja nest’outro olho occorreu. Quem não se illude sou eu, com tantas drogas. Antes dellas, emquanto me tornei da dor refem, refem sou eu tambem da rolla rija, cheirando um podre tennis, uma meia...

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78 GLAUCO MATTOSO THE SINGER NOT THE SONG [0450]

Às vesperas da morte, Lennon ja vivia amargurado. Morreria bem menos conformado caso não à balla assassinado fosse. E qual seria a causa disso? Não, nenhum biographo me disse, mas em sonho fiquei sabendo. Tinha ardente inveja do Macca, pela musica que tanto famoso cantor negro gravou deste. Ray Charles, “Yesterday”, “Eleanor Rigby”, e Stevie Wonder, “We can work it out”. “Hey Jude”, Wilson Pickett excolheu. Gravou “Lady Madonna” Domino. Daquelle nenhum idolo quiz nada, siquer quiz o Sinatra, que gravou do George qualquer outra canção bella.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

Lhe disse eu em espirito: {Não ha motivo para tanta guerra fria, pois tu não precisavas ficar tão mordido. Que tu foste genial concorda toda a critica. Commum é vermos tuas lettras, eu deponho, nas aulas estudadas. Va que seja pretexto o teu nonsense um tanto infanto ou quanto juvenil, mas recebeste de todos a attenção. Ninguem se inhibe, por tua causa (caso alguem nos paute um thema abstracto, onirico), de em teu nonsense te seguir. Precisas só notar que Mama Cass, illuminada que foi, “I call your name” ja cantou, e nunca alguem cantou-te que nem ella.}

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80 GLAUCO MATTOSO NOBODY ELECTED YOUR FAMILY [0452]

{Ahi, Glauco, você que curte rock não acha que faz falta alguem que fique com raiva mas que faça algo que nua exponha dos poderes a mazella? Hem, Glauco? Meu, agora attenção presto a tanta jumentice e puto fico, mas lettras typo Dylan ja não temos! Beber da juventude esse elixir rockeiro nem podemos! Lhe escrevinho, Glaucão, para pedir que dê na veia um toque musical, para meu sonho saudoso reviver! Quero sonhar!} -- Bons tempos em que Guthrie dava toque do typo quanto a Nixon, “tricky Dicky”, cantando que “Ninguem elegeu sua familia, seus amigos!” Sim, aquella foi epocha de facto do protesto bem feito, como o nosso pelo Chico. Agora, tristes tempos nós vivemos aqui, quando até temos de engolir alguem sendo chamado de “mythinho”. Jamais pude sentir vergonha alheia maior, mesmo porque não me envergonho por gente que não vale um “Appesar...”


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THESE CORROBORADA [0454]

{Tu leste, Glauco, o texto? Os homens agem assim na Antiguidade! Sim, refere o estudo que a menina cega à zona estava destinada! Sim, fatal funcção, a da ceguinha que, bollachas levando, chuparia rolla à bessa! Menino cego tinha seu medonho destino, tambem, pelo que ja leio: viver escravizado! Tens notado, Glaucão, como tractados feito gado humano os cegos foram? Eu attesto: não vejo differença num plebeu moleque desse tempo, si estivesse vivendo no presente! Sim, até que podia ser peor hoje! Que pensas?}

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82 GLAUCO MATTOSO

-- Ja muito li, reli, sim, tal passagem do texto scientifico, bem serio e grave, por signal. Mais me impressiona o caso do menino, com o qual melhor me identifico. Ora, não achas que “escravo” significa, tambem, essa funcção de prostituto? Ja supponho, por minha propria compta, sem receio de errar, que esse menino está fadado a ser bom fellador, pois que treinado será para chupar, por todo o resto da vida, maior prazo do que meu destino permittiu. Não te paresce que devo ter inveja do moleque? Convem analysar as differenças...


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HYPOTHESE SUGGESTIVA [0455]

{Então, Glaucão, na certa te provoca angustia a proporção em que a cegueira usada fora para a punição ou para a represalia, quando o globo podia ser queimado pelo ferro em braza, ser furado ou simplesmente tirado com os dedos, imagino que sem anesthesia... Ja pensaste, Glaucão, si tu vivesses nesse escuro regime? Bastariam teus poemas mais leves para à pena costumeira tu seres condemnado! Ouso dizer que, quando teus dois olhos prestes ja a serem arrancados estivessem, verias do carrasco o olhar risonho e, logo appós a barbara extracção, risadas ouvirias, nada mais podendo divisar na cara assaz cruel e zombeteira do rapaz, suppondo-se mais joven o carrasco...}

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84 GLAUCO MATTOSO

-- Mais longe vou, si scena tal te choca: Alem duma agonia, da caveira me sendo retirados como são os olhos, e de estar eu, feito bobo, causando o riso delle, mal meu berro cessasse de echoar, esse inclemente carrasco quereria meu destino mais cedo completar. Esse contraste do cego, para aquelle que fez furo nos olhos seus, daria bellos themas poeticos. Supponho que elle queira usar-me como objecto de prazer, fazendo-me chupar, o que lhe dá tesão mais requinctado. Não se exquescem os sadicos de serem, no meu sonho, rapazes caprichosos. O tesão, tu sabes, mais augmenta si normaes os olhos do oppressor forem e más as chances do opprimido. Não estás a achar graça do lance em que eu me lasco?


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PROTHESE POSSIVEL [0456]

{Por que, Glauco, uma prothese não mettes na tua cavidade do olho mais inchado de glaucoma, que te causa tamanhas dores, essa sensação de teres muita areia alli por dentro? Tu tiras esse globo, outro collocas, de vidro verde, e prompto! Tuas dores terão final feliz, Glauco! Não temas!} -- Tu pensas que isso é como cottonettes metter dentro do ouvido? Não, as taes de gude bollas cobram uma pausa na vida, a cirurgia não é tão banal assim! Não, quando me concentro no thema, sinto medo de taes trocas! Pergunta a algum pirata, quando fores com elle navegar, sobre esses themas!

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86 GLAUCO MATTOSO SYNTHESE POETICA [0457]

{Não, Glauco! Pensa assim: si Baudelaire julgou os cegos como seres tão humildes e inferiores, foi devido ao vago olhar dos olhos azulados que ficam parescendo olhar só para os céus, pedindo um pouco de divina justiça, de exemplar misericordia! Melhor não te seria a cara dum subjeito mais altivo, o olhar de cor bem verde e transparente, sem aquella pathetica apparencia de quem não consegue bem dormir? Vae, me responde! Talvez o olho de vidro te melhore ao menos essa cara de defuncto!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Quem disse que ser bello um cego quer? Crendice tua! A nossa maldicção é termos mesmo cara de bandido, de monstro, de zumbi, desses coitados que vagam, mortos-vivos, essa cara de gente que delira, que imagina as scenas mais satanicas, que morde a maldicta, a propria lingua, que fartum fareja, que acha magico o sabor do vicio, da miseria, da mazella! Percebes por que os cegos todos são perdidos, ou parescem, sem ter onde dormir, sonhar, ouvir alguem que chore por elles, que com elles chore juncto?

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88 GLAUCO MATTOSO EMPESSEGANDO [0458]

Está propicio o tempo para achar-se motivo, que não falta, ao ja tardio, urgente impedimento do occupante do cargo de quem pega na canneta. La fora, a mesma coisa: cidadãos cansados dum estupido dão curso, com base em muitas provas, ao processo. Nas cappas das revistas, apparesce um pessego cahindo na cabeça do gajo, ou seja, taquem “peach” em cyma! Tambem quero propor, nessa catharse que, espero, contamine nosso brio, o verbo “empessegar”, ja que bastante a lingua ingleza affecta a nossa peta politica, a tal lenda que, entre irmãos, causando vem rancor pelo discurso. Sim, gente! Empesseguemos, é o que peço, em nome de quem reza a mesma prece, pedindo um milagrinho que accontesça. Ao menos ja desfructa quem se anima...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

USO ADULTO [0459]

{Caralho, Glauco! Onde é que tu ja viste industria pharmaceutica tão filha da puta? Meu, tu pedes a receita ao medico, daquellas amarellas, e pagas caro o raio do remedio! Mal tomas umas pillulas e guardas a caixa, mal transcorrem alguns mezes, e prompto! Vaes olhar da droga a data... Vencida ja se encontra a porcaria! Assim não é possivel, Glauco! Tens que fora jogar tudo o que compraste! Que fazes nesses casos, Glauco? Tomas a pillula assim mesmo? Ou jogas fora?} -- Ah, bem intencionada não exsiste industria alguma, amigo! Qual não pilha o nosso bolso? Tudo a gente adjeita, porem. E quanto às pillulas... Com ellas eu faço o que fiz sempre. Nada impede o effeito que fariam quando agguardas um pouco alem do prazo. Muitas vezes, suppondo que estão fraccas, a sensata medida adopto: dupla dose. Iria alguem dizer que perco os meus vintens? Triplico, si preciso. Mas que eu gaste de novo um dinheirão, tamanhas sommas, ninguem fará! Mal nunca fez, por ora...

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90 GLAUCO MATTOSO ABUSO INFANTIL [0460]

{Você experimentou, Glauco, brincar de “tudo que seu mestre mandar” quando creança? Si brincou, se lembra bem das ordens humilhantes e nojentas! E então? Pois eu me lembro bem! Gostava de, sendo o mestre, impor ao escravinho que todos os meus peidos adspirasse, alem de me cheirar o pincto, o pé! Hem, Glauco? Si brincassemos, você iria adorar essa pose minha de sadico mirim, ou apprendiz! Foi pena não crescermos junctos, cara!} -- Foi mesmo. Nesse caso dei azar, tal como em muitos outros. Seu commando seria apprendizado para alguem ja meio cego, meio nas cinzentas visões apprisionado. Foi escrava a minha lingua doutros, no caminho da eschola, algo mais tarde, mas na classe eu era respeitado. Fui até melhor alumno. Pena que não dê p’ra gente reviver a creancinha sacana que ja fomos. Foi feliz a gente e sou quem, hoje, mais se azara...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

EXEMPTÃO DE CORAÇÃO [0461]

{Não, Glauco! Ouço fallar, mas não! Commigo jamais! Nem por um pratto de comida eu vendo o meu bom senso! Não! Do joio o trigo que eu separo como boa idéa jamais custa a minha perna, meu braço, nem por ella meu cu fodo! Não sou voto comprado, minha fé nalguma boa causa, no poder vigente, na campanha dum rival, não tem tabellamento de milhões nem mesmo de migalhas! Meu modello tem sido você, Glauco, que, maldicto, por nada se vendeu! Quero seguil-o!} -- Tambem estou tranquillo, meu amigo. Eu nunca, veja, nunca nesta vida ganhei um só centavo para appoio dar, seja a algum politico em pessoa, a algum partido, ou mesmo a quem governa. Não, nunca recebi nada. Mas todo subjeito tem seu preço. O meu não é barato. Caso queira alguem saber, eu quero uma cadeira de immortal e, vindo de lambugem, um Camões. Mas, como ninguem paga tanto pelo appoio dum ceguinho, lhe repito que estou, mais do que nunca, bem tranquillo.

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92 GLAUCO MATTOSO INCORRECTA EDADE PROVECTA [0464]

Eu vivo me queixando, reconhesço. Mas velho soffre mesmo dum montão de dores, de symptomas aggravantes, de males que, ja chronicos, são como um fardo que, coitados, carregamos. Mas claro que a você nem me comparo, ceguinho, pois está bem mais fodido quem perde seu sentido mais vital. Por isso vou tirar o meu proveito da sua condição que, sim, compensa um pouco dos problemas que eu enfrento. Você, que se subjeita a tal abuso, se empenhe e faça tudo o que me aggrada, sem nada discutir. Appenas faça.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

Agora vae você pagar o preço da porra da cegueira. Meu tesão demora, aguente firme. Vae ter, antes da galla na garganta, que dum pomo maduro o mel sugar. Com calma, vamos! Appalpe com o labio. Ja seu faro notou que na cueca arde incontido fedor de mijo, certo? Menos mal que pouco xixizinho tenho feito nas calças. Va lambendo minha pensa piroca até que esteja no momento de, fora, algo pingar, pois ja confuso estou si mijo, semen, ou de cada um pouco. Que sabor o pau lhe passa?

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94 GLAUCO MATTOSO CHILENA CANTILENA [0466]

{Paresce-me, Glaucão, ser opportuno fallarmos do que rolla alli no Chile. Não achas que isso lembra aquelles dias saudosos, anteriores ao estado milico, de excepção, la nos septenta? Refiro-me aos protestos, mesmo appós ter dado o Pinochet aquelle insano, sangrento golpe. E então? Te lembras quando o Victor Jara, preso num estadio no meio de centenas, protestou cantando? Que fizeram os milicos? Lesaram suas mãos, as mesmas mãos que tanto na guitarra dedilhavam! Mactaram-n’o, depois! Te lembras? Tudo por causa das canções que, por Allende, fez elle, incentivando um operario, um medico, um mineiro, um professor a serem mais participes do seu paiz, Glauco! Te lembras? Por signal, não era só no Chile: ca tambem soffremos repressão e sempre fora algum compositor mais censurado, embora sem perder as mãos, a vida...}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Sim, claro que me lembro. Fui alumno, então, da USP e as lettras nem vacille você em pensar que nunca foram frias alli naquelle campus tão visado por nossa dictadura violenta. Mas quero recordar, ja que entre nós rockeiros são heroes, que esse paizano, o Jara, virou thema do nefando regime, na canção que, não no radio, mas sim num elepê, como num show, ouvi bastante, então. Nem nossos Chicos cantaram o que Guthrie a seus irmãos latinos bem cantou. Claro, cantavam tambem outros Caetanos, nenhum mudo ficou, nem Gil, nem Milton. Reaccende agora a atroz questão esse scenario chileno, ou argentino, ou de suppor que seja, brazileiro, ou europeu, até, si ja global se torna a tal questão dessa direita, alhures, em crescente expansão, sempre repressora. Esteve esse Arlo Guthrie mais do lado de baixo que de cyma. Alguem duvida?

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96 GLAUCO MATTOSO DISCURSO SEM CONCURSO [0467]

Surpresa nunca, para ser sincero, causei quando deixei de mencionar o meu antecessor na cobiçada cadeira, até porque não discursei, ou seja, nem tomei posse no dicto assento. Por signal, siquer eu fora eleito, ou antes, nunca concorri. Jamais seria, assim, uma surpresa aquella assignalavel ommissão. Por outro lado, disto tambem quero fallar: Não lhes paresce singular que eu seja boycottado sempre em cada discurso ou premio, como cego ou gay? Motivo não lhes falta, si maldicto sou, seja para a critica censora ou para alguma justa gloria, aqui em vida, antes que façam a defesa da minha fama à beira do caixão.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

SOLITARIO IMAGINARIO [0469]

{Não tem coisa melhor, Glauco! Punheta! Punheta acceita tudo que você quizer, qualquer desejo ou phantasia! Eu posso torturar, violentar sem medo, sem escrupulo, usar posso a victima de tudo quanto é jeito! Até posso trocar o meu logar de sadico com ella, Glauco, observe que eu posso fazer tudo o que na telha me venha! Que parceiro ou que parceira, Glaucão, acceitaria a condição de mero objecto? Diga ahi, Glaucão!} -- Concordo que você não comprometta seu tempo, o commodismo, no clichê completo do prazer, à revelia da alheia posição, da acção dum par. Mas note que o maior tesão do nosso contracto predilecto surte effeito havendo reacção de quem tem ar folgado mas irá perder a verve na nossa mão. A bronha se assemelha mas nunca substitue esta cegueira que faz de mim a victima na mão daquelle que, enxergando, tem tesão.

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98 GLAUCO MATTOSO AUDIO PARA GAUDIO [0470]

{Passou por um, passou por dois! Será possivel? Chapellou mais um zagueiro! Só falta agora... Ah, va tomar no cu! Marcou por cobertura! Assim eu não transmitto mais a porra desse jogo! Vão todos para a puta que pariu! Ao patrocinador peço perdão, tambem ao nosso ouvinte, mas não dá! Assim não dá mais para narrar nada da merda desse jogo! Vão à puta, repito, vão à puta, à merda, todo o time se foder! Desculpe, gente!} “Ahi, Glaucão! Escuta só! Vem ca! Escuta a narração desse fuleiro reporter esportivo! Si tabu achavas palavrões na transmissão dum jogo, que dirás do desaffogo das magoas deste gajo? Só serviu de meme pelas redes! Palavrão tem volta? Tem perdão? Achas que ja chegamos a tal poncto de excrachada chulice, que qualquer gajo que escuta aquillo não faz caso desse engodo? Então, Glaucão? Estás indifferente?”


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Estou me divertindo. Não está você? Provavelmente só o goleiro vazado não rirá. Termo mais cru ouvi de torcedores, mas um tão explicito me vem quando, no fogo dum classico, o outro time reagiu melhor e o meu perdeu. Nos versos são até bem collocados os de má sonancia, mas são termos que quem brada no radio manchará sua conducta. Xingar, eu xingo, sempre que me fodo, mas, sendo num poema, alguem aguente!

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100 GLAUCO MATTOSO PARTES PARCIAES [0472]

{Estão muito folgados, Glauco, os taes ceguinhos modernosos! Querem dar nas artes marciaes um ar da graça! Não, Glauco, ja pensou? Cegos luctando judô, no karatê dando porrada! Quem pensam que são? Lembra até piada antiga, dos dois cegos frente a frente e alguem gritando “Faca não, ceguinho! Não vale faca, cego!”, só p’ra rir dos dois, no desespero, ja da lucta fugindo! Mas, na boa, Glauco, pode? Os cegos estão muito folgadões! Usando cellular fallante, tendo direitos de egualdade, emprego, como qualquer gajo normal! Onde é que vamos parar, Glauco? Você tem parte nisso?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Não tenho parte nisso, não, jamais! Conhesço bem (Magina!) meu logar! Ja muito descrevi como desgraça tremenda a minha perda, qual nefando destino o meu! Não mudo, jamais, nada daquillo que fallei! Me vejo cada vez menos competente e independente! Não só não lucto, como dum pezinho appanho de qualquer moleque! Vir qualquer um pode, pela força bruta ou pela auctoridade, e ser quem fode a minha bocca, aquella que Camões prophana, de Bocage faz horrendo papel e de Delphino o melhor pomo defeca no poema! Si fallamos de cegos, na real, eu sou submisso!

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102 GLAUCO MATTOSO JUDÔ PORNÔ [0473]

{Bollei este espectaculo, você dirá si gosta. Assistem na platéa mais homens que mulheres. Num tablado, dois cegos se engalfinham no judô. Quem perde vae chupar o vencedor. Quem vence chupará qualquer subjeito do publico que queira tirar sarro na frente de pessoas tão sacanas. Hem, Glauco? Ja pensou? Até mulheres berrando “Chupa ahi, ceguinho, chupa!” Você, que nada lucta, perderia, teria que chupar seu opponente, depois de levar surra bem levada. E então? Topava, Glauco? Que me diz?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Caralho, meu! Que scena! Que me dê maior tesão não penso noutra idéa. É claro que dois cegos, de bom grado, excepto si masocas, num pornô show desses não entravam sem suppor a gente que na marra, sob effeito de muita coacção. Mas mais me admarro em tal ou qual hypothese. Bananas ja dei aos correctinhos, mas suggeres tu coisa differente dessa lupa politica. Suppuz com alegria que estive nessa arena condizente com muita diversão da molecada que curte enxergar longe e ser feliz.

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104 GLAUCO MATTOSO NADA DE PEGADA [0474]

{Dei buscas, attendendo ao seu pedido, mas nada achei, Glaucão, nem na Calçada da Fama, aquella que era conhescida emquanto um pantheão “Maracanan” ainda definia, antes da coppa perdida, da reforma destructiva. Não, Glauco, pé nenhum de jogador, moldado no cemento, corresponde ao typico formato que você cultua. Dedão todos teem egual ou mesmo mais comprido que o segundo artelho. São “romanos” e não “gregos”, segundo o seu criterio. Mas achei appenas um: talvez o do Renato Gaucho tenha curto o seu dedão, não sei si tanto quanto você queira, mas vou salvar a photo, a qual annexo.}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Renato? Qual? Aquelle que tem sido um idolo no Gremio? Não, mais nada me diga! A sua busca me convida a duma coisa appenas ter a van noção de que me lembro! Nada ensopa mais minha sunga que essa scena viva na mente, do Leandro, com amor, fallando que seguia o craque aonde preciso fosse, dando roupa, apê, presentes... Quanta inveja tive, mal eu soube, do Leandro, si no fundo dum tennis, duma chanca, deu empregos diversos à narina, à lingua gay! Que inveja, si na sola do sapato, do pé descalço, um labio ficou tão pertinho do Renato! Prazenteira imagem vou guardar, que praza ao sexo!

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106 GLAUCO MATTOSO PHANTASIA QUE ECSTASIA [0475]

{Assumo que sou, Glauco, um punheteiro! E sabe qual estimulo me basta? Um filme pornographico, Glaucão! É simples: eu assisto, tiro o pau p’ra fora, a bronha batto, gozo, e prompto! Estou bem saciado de erotismo! Você tambem se basta só com scenas mentaes, pelo que disse... Estou errado? As minhas são mulheres obrigadas a abrir a bocca para a maior picca possivel de engolir garganta addentro! As suas eu supponho serem pés bem chatos e fedidos... Accertei?} -- Em parte esse seu calculo certeiro está, mas não appenas pederasta, podolatra, bem sadico ou podrão é o filme que eu curtia quando o grau da minha lente ainda, meio tonto, visão me permittia. Ainda scismo com essas scenas fortes, nada amenas. Mas outra phantasia meu tarado prazer masturbatorio ouriça: as dadas noticias dum politico que fica bom tempo na prisão, naquelle centro fatal de detenção que das ralés são fonte do temor à dura lei.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

CALÇADA DESCALÇA [0477]

{Você sempre fallou, Glauco, que não costuma achar pés gregos no Brazil. Pois bem! Vou lhe propor uma pesquisa: Dos cinco mil amigos que você mantem no facebook, exsiste alguem que tenha dedão curto? Caso o cara dê photo do pezão para a postagem, ganhar pode seu livro mais recente! Que tal, Glaucão? Possivel não seria que, dentre esses milhares, mais de dez tivessem “pollegar” menos comprido que o dedo “indicador” num pé tão chato! Faria assim você seu monumento mais vivo que a calçada tão famosa que, no Maracanan, deu gloria aos craques!}

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108 GLAUCO MATTOSO

-- Até que interessante suggestão você me deu, amigo! Cinco mil eu tenho nessa rede e nem precisa dizer que, desse publico que lê a minha poesia, nem dez, nem uns quattro gattos tenham essa rara especie de dedão. Delles mensagem estou, sim, agguardando urgentemente. Até ja reservei, na livraria, uns tantos exemplares a taes pés famosos, pois atypicos. Decido, portanto, premial-os e constato que devem ser eguaes aos que commento faz tempo, num sonnetto ou numa glosa, lhes dando os mais estheticos destaques.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

GENTE DO CÉU [0481]

{Estou é chocadissima, amigão! Não posso crer naquillo que estou vendo nas telas, nos jornaes! Gente do céu! A praia toda preta! A gente nota a pelle do menino ja todinha pichada, Glauco! Gente do céu, isso é um ecoterrorismo sem limite! Não, gente do céu, como se permitte que toquem nesse toxico? Ninguem devia alli ficar, gente do céu! Você não falla nada, Glauco? Falle!} -- Até ja fiz poema, minha mão sujei para limpar aquelle horrendo petroleo que grudava p’ra dedéu na sola do moleque que, sem bota nem mesmo uma hawaiiana, alli ja tinha entrado p’ra adjudar nesse serviço inglorio de limpar tanto graffitti de estado, ou do terror! Nem dou palpite si queima de “peneus” pode tambem ser ecoterrorismo. Mas ao léu estamos, si Satan diz: “Tudo vale!”

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110 GLAUCO MATTOSO PARNASO DE ALEM TUMULO [0483]

{Estou arrepiada, Glauco! Juro, eu nunca tinha lido um livro tão phantastico! Você crê nisso, Glau? Alli cada poema tem a cara perfeita do poeta quando vivo! O Chico não seria assim tão culto a poncto de imitar tantos auctores de estylos differentes! Addemais, tão joven era, Glauco! Supponhamos que fosse assessorado por alguem lettrado... Um dia aquillo vazaria! Não, Glauco, o medium era foda! Foda! Faltou, na certa, alguma putaria, mas pode-se entender essa moral da purificação, não é, querido? Mas digo-lhe: fiquei arrepiada!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Querida amiga, agora sou seguro daquillo que está alli. Não sou christão devoto, ou kardecista, mas num grau qualquer eu nisso creio, pois a tara tambem explicação tem, pelo crivo espirita. A cegueira, nesse culto, faz parte da missão, tal qual as dores que sinto na velhice, si meus ais causarem gozo sadico aos meus amos, ou seja, a meus leitores. Ao Alem eu devo o que escrevi, da poesia à prosa, por aquillo que incommoda pudores puritanos. Não seria, porem, psychographia a bacchanal que muitos me imputaram, no sentido de culpa, de peccado. Não, qual nada!

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112 GLAUCO MATTOSO CUIDADOS INSPIRADOS [0491]

{Tarantulas soltou, o damnadinho, em pleno corredor dum hospital! Calculas, Glauco, o panico que cria um unico exemplar da cabelluda especie? Pois calcula varias dellas à solta, transitando pelas camas de cada enfermaria, cada quarto! Não achas que o menino se excedeu nas suas travessuras, Glauco? Diz!} -- Sim, posso calcular. Eu ja adivinho o susto de quem soffra dalgum mal mais grave, preso ao leito, quando espia em torno. Ficará sua voz muda de expanto. Mal refeito das sequelas, da aranha não excappa. Me conclamas a dar algum palpite? Dum infarcto na certa morrerá quem ja soffreu daquillo. E quanto ao sadico pettiz?


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

{Ahi que está! Pegaram o damninho subjeito bem no flagra! Mas o tal moleque protecção tinha da thia ricaça! Ficou tudo em linguaruda fofoca, alguma morte em tagarellas intrigas! Abbafaram essas tramas e nada accontesceu! Eu não descharto que culpem um moleque mais plebeu por essa traquinagem infeliz...}

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114 GLAUCO MATTOSO OBSCURAS CREATURAS [0492]

{Disseste que phobia, Glauco, tens de aranha, que é perigo bem concreto. Mas quanto àquellas mythicas figuras, maccabras e terriveis, que na mente de muitos são reaes, que pensas tu? Dirias que tambem são um perigo, ou achas que crendice, só, seria aquella fauna toda? Diz, Glaucão!} -- Não temo, porem creio. Outros porens se impõem. Nos lobishomens interpreto a crença como graves conjecturas ao povo do interior. Ninguem nos mente por visto ter um bicho que tabu é só para a sciencia. Algum amigo eu tenho que passou pela agonia de estar a ver até bicho pappão...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

FLATULENTO MOMENTO [0493]

{Preciso lhe contar, Glauco! Você, somente, poderá crer no que digo! Promette não rir disso? Foi assim: Voltando duma festa na fazenda, meu carro pela estrada vicinal errada dirigi. Quando parei a fim de orientar-me, escutei um grunhido! Sim, do banco de traz! Voz de boi, de lobishomem, de monstrengo difficil de suppor que exsista, mas que estava alli no carro, Glauco! Fiz aquillo que faria quem presença de espirito tem: fora cahi! Com ligeiro gesto, a porta abri e pullei! Corri, corri... Mas, quando olhei p’ra traz, ninguem me perseguia! Só depois dum tempo retornei ao carro. Nem signal daquelle monstro, Glauco! Juro que pude presentir na nucha até seu bafo fedorento, Glauco! O olfacto, o ouvido, não se engannam, cê não acha?}

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116 GLAUCO MATTOSO

-- Não ha causo que medo não me dê, mas vamos ponderar. Sim, meu amigo, prometto não rir. Isso, para mim, não passa de impressão, às vezes: vem da fatal insegurança, natural na gente em noite escura. Mas tal lei nem sempre se confirma. Bem commum, tambem, é succeder algo que nós do sobrenatural, no maior dengo, cobramos. No seu caso, o que me traz à mente tal grunhido um infeliz factor é: foi seu peido. Dá licença, amigo? Ouviu você seu proprio som. Sentiu seu proprio cheiro. Sinto, sei que offendo seus temores. Satanaz à parte, si nós dermos nome aos bois, não sobra, de malefico, ninguem mais, quasi. Quando estamos nesse escuro momento, temos medo. Quem não é cagão? Sem pretender passar por chato, direi que disso o bicco tem quem racha...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

DESFRUCTE NÃO SE DISCUTE [0495]

{Explica-me este poncto, si és capaz, meu caro Glauco, sobre coito anal. Quem come, de cocô suja seu pincto, concordas? Fica todo malcheiroso, borrado, quando o pau dalli retira, concordas? E quem dá, dores supporta, às vezes nem supporta, tão agudas que são! Tu não concordas? Poderá, talvez, até sangrar! E se mixtura o sangue ao excremento sobre a pelle do penis, Glauco! Puta que pariu! Por que diabos, Glauco, tem quem goste de tal penetração? Ninguem desfructa total, desse prazer de gosto tão, digamos, duvidoso! Que me explicas?}

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118 GLAUCO MATTOSO

-- Nem sempre o sexo anal, de Satanaz o coito predilecto, faz de tal maneira a porcaria. Não te minto si digo que evitado tenho o gozo anal, talvez por causa duma lyra oral que poetizo. Mas a torta visão que tens do rabo, não te illudas, em nada altera a graça p’ra quem dá, tampouco p’ra quem come, si tortura faz parte do tesão, caso alguem felle a rolla suja, appós o que sentiu no proprio cu, fodido por um poste. É sadomasochismo! Não discuta ninguem a dor alheia, a compulsão alheia, por trazeiros ou por piccas!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

BAR DA SOFFRENCIA [0504]

Não, nunca estive nelle, nesse bar, mas dizem-me que exsiste, sim, e fica aqui mesmo, no bairro onde resido. Ja sei do Bar dos Cornos, por signal são varios que a tal nome fazem jus. Mas este, ao que me dizem, frequentado seria por quem leva pé na bunda. Levei, ja, muitos. Nunca dum pé grego, comtudo, um bello chute ganhei para, ouvindo uma canção daquellas bregas, lembrar-me com saudade. Fui chutado por pés communs, romanos, de dedão mais longo, o brazileiro mais vulgar. Amigos meus levaram muito chute das suas namoradas de pé bem fininho, delicado, feminino. Alguns querem voltar. Emquanto não conseguem reaptar, no bar bebida consomem, compartilham a soffrencia.

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120 GLAUCO MATTOSO

Quem nunca visitou algum logar por cornos frequentado? Muita dica me deram. Suggeriram que eu, munido dos oculos escuros, da cabal bengala, ja não branca, que seduz os sadicos que curtem um babado vendado, fosse la numa segunda à noite, quando querem mais sossego alguns frequentadores que da cara dum cego gozariam. Meus collegas estão de brincadeira. Tal recado só pode pegadinha ser. Estão querendo que eu la chegue, mas o bar esteja, na segunda, a tal desfructe fechado. Tambem pode ser que nem siquer exsista aquillo que imagino e fake news me passem esses tão gaiatos amiguinhos. Mas é vida que segue. Sonharei com mais frequencia.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

BAR DOS CORNOS [0506]

{Fui, Glauco, corneado! Você nem calcula a minha raiva, as minhas magoas! O gajo que ficou com minha mina às vezes me encontrava. Appenas ria da minha cara, como si dissesse: “Vem ca lamber meu tennis! Hem, que tal? Emquanto tua mina aqui me chupa, tu lambes o meu tennis!” Glauco, não supporto ser assim tão humilhado! Passei a frequentar aquelle bar aonde vão só cornos. Que tristeza no rosto dos rapazes que em bebida affogam-se, Glaucão! É deprimente! Até que, certa noite... Quem eu vejo entrando no local? O mesmo typo marrento, tambem elle corneado! Você não é capaz de calcular o riso radiante de euphoria na minha bocca, Glauco! Destoei alli de todo mundo, mas na certa alguem comprehendeu minha alegria, não acha? A vida voltas dá, Glaucão!}

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122 GLAUCO MATTOSO

-- Sem duvida. Tambem ja fui refem da fossa. Superei passadas aguas depois de muito choro. Contamina a nossa dor algum local, de dia, banal, porem à noite só de estresse lotado, só p’ra cornos um local propicio. Todo mundo se preoccupa, alli, com algum caso de paixão frustrada. Mas tambem rolla algum lado hilario. Houve commigo um similar. Um gajo muito myope, numa mesa, queixava-se com outros dessa vida malvada. Mas eu entro de repente e, vendo-me infeliz, teve desejo de rir da minha cara. Participo, portanto, dessa scena, não me evado da mesma situação. Todo logar assim nos une a todos, empathia provoca, seja macho, seja gay quem soffra a rejeição que nos apperta de dor o coração. Que bom seria ter bares taes em cada quarteirão...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

SINGULARES PLURALISMOS [0507]

{Não leve a mal, mas muito ja sambada estou, Glauco. Ja nada mais me choca. Você que escandaliza diz, mas eu estou accostumada a ver e ouvir dum “pig” ou doutro “scat”, alem dum “fist”, dos “water sports”, ou seja, “golden shower”. Ficou tudo banal, Glauco! Mas uma coisinha só me expanta: você escreve naquella antiga forma, ja bastante retrô, fake, em desuso, ultrapassada! Mas para que, querido? Para nada?} -- Banal, sim, a nojeira, mas lettrada, poetica, ninguem a faz nem toca no thema algum auctor, siquer plebeu. Em termos orthographicos, servir irá meu verso para quem persiste na lucta contra aquillo que mais dava horror a um Alencar, Assis, em summa: Si delles se indagasse como deve alguem graphar “philosopho”, que expante não ha nada com “F”. Entende? Cada auctor é singular si desaggrada...

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124 GLAUCO MATTOSO “O CRAVO BEM TEMPERADO” [0508]

{Eu quero te contar, Glauco, uma cousa. Até podes achar que vergonhosa me seja. Sei que gostas tu de cravo, por isso te confesso, constrangido, que pego, sim, no somno quando escuto do Bach aquelle disco que ganhei. É sempre a mesma cousa! Ja do meio pro fim, pego no somno, não consigo ouvir jamais inteiro o tal do “Sem tempero” ou “Temperado”, Glauco! Tu não dormes, não, durante uma audição do cravo de Scarlatti? Eu gostaria immenso de poder ouvir tudinho!} -- Tem gente que relaxa, que repousa, sei disso, ouvindo cravo. Só quem posa de eximio pianista, que diz “Bravo!” comsigo mesmo, nunca tem dormido com esses exercicios. Jogo bruto tentar tocar aquillo! Mas bem sei, appenas por ouvir, que, sem receio, tambem eu addormesço, meu amigo. Nenhum problema. Duro mesmo é nem podermos dormir quando o nosso cu apperta de furor, dum pancadão debaixo, bem na nossa portaria, não é? Com cravo, nunca me apporrinho...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

PADRES PRECIPITADOS [0509]

{Agora virou moda, Glauco! Todo bemdicto padre scisma de sahir voando num ballão! Não é possivel! Em vez de rezar missa, baptizar, fazer um casamento, o padre não consegue sossegar o rabo? Ja me irrita suspeitar que seja falta de foda, de enrabado ser por um robusto coroinha, com certeza! Você sonnettizou, Glauco, que eu sei, um caso brazileiro. O caso russo precisa dum poema, cê não acha?} -- Commigo, não. Não sou eu que me fodo voando nisso. Todos podem ir à puta que os pariu! Querem do nivel do solo estar accyma? No logar não podem ficar quietos? Dou razão àquillo que se disse: que será bem feito si morrerem. Essa malta não tem o que fazer? Nada commum seu rabo satisfaz? Depois illesa desejam ter a pelle? Padre gay exsiste de montão. Mas si de bruço não basta ficar, elle se exborracha...

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126 GLAUCO MATTOSO PRESUMPÇÃO DE INNOCENCIA [0510]

{Roubei, sim! E dahi? Qual o problema? Somente porque pego fui no flagra irei para a cadeia? Nem pensar! Sim, tive que mactar o fidaputa que em scena me flagrou! Ora, quem manda ficar flagrando os outros? Se fodeu! Tambem havia cameras, eu sei, que tudo registraram! Minha cara foi vista bem de frente? Que se foda! Julgado fui, aquelle juiz bicha sentença cannetou, mas a segunda instancia, não bastasse, ‘inda augmentou a pena, veja só, Glaucão, si pode! Mas para que foi tanta palhaçada si posso responder em liberdade? Podiam me livrar duma vez! Era mais simples e economico, ora! À vera, Glaucão! Vou ficar livre mesmo, porra!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- É isso ahi, malandro! Nada tema! Si eu fosse você, mano, com a magra peninha que pegou, ia zoar à bessa! Approveitava! Nem discuta com tiras, promotores! São da banda mais podre do Systema! Você, meu, tá certo! Nem precisa dessa lei vingar-se dando tiro! Quem dispara na cara dum juiz attraza toda a vida! Faz melhor você si espicha o pé na cara delle, chuta a bunda, mandando que elle lamba! Appostar vou que lambe e ‘inda aggradesce! Mais se fode chupando, mais feliz fica! Chupada assim eu tambem peço, na verdade, si chance cê me desse! Mas pudera! Quem é que uma figura tão sincera não curte? Deite e rolle, meu! Recorra!

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128 GLAUCO MATTOSO AMENO VENENO [0512]

{Agora que estou velha posso, sem reservas, fallar tudo que quizer, não é, querido Glauco? Fui bonita, mais moça, namorei homem maduro. Lhe digo com franqueza, Glauco: os taes politicos se casam com garota mais joven, bem mais joven, e vaidade teem disso. Acham que inveja vão sentir os outros homens. Nada, Glauco! Vão é rir da cara delles! Tá na cara que cornos, só, serão esses babacas! Alguem imaginou menina linda paixão tendo por velho? Só se casa por grana, por comforto, posição nas rodas sociaes! Mesmo que fique bem claro entre elles dois, ainda assim motivo são de riso! Quem, de facto, inveja tem dum corno? Glauco, diga!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Querida, não expalhe p’ra ninguem, sinão esses politicos mulher nenhuma mais arranjam! Você cita diversos babacões, mas nem deduro seus nomes. Todos sabem ja demais dos cargos que occuparam, gotta a gotta das tetas em que mammam. Na verdade, bem sabem que não tomam elixir nenhum da juventude, que tesão com pillulas não vale e se compara a baba de cadaver, que essas jacas maduras cahirão. Mas são, ainda, vaidosos. Que fazer? Que se compraza a gente, que gargalhe! Gozação façamos, nós que somos do debique artifices, querida! Para mim dão optimos assumptos ao que tracto de expor na alegre lyra, minha amiga...

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130 GLAUCO MATTOSO PHAROLEIRO MOTOQUEIRO [0513]

{Você, que é meu vizinho, não escuta aquella moto chata que circula sem rhumo pelo bairro, Glauco? Não escuta a barulheira? Pois sabia que disso o proprietario não é boy filhinho de papae nenhum, mas sim um velho, gordo, comico baixote? Pilota a Harley Davidson, Glaucão, só para se exhibir! Só dando volta se expõe no quarteirão! Tenho certeza que seja complexado, corno, brocha e tenha pau pequeno! Não, só pode! Glaucão, calcula a raiva que me dá?} -- Escuto, sim, até mandei à puta o dono da tranqueira. A gente fula da vida fica. Aquelle barulhão irrita mesmo. Logico seria que fosse dum playboy. Mas quem remoe rancor do cara appenas por ruim de cama ser, faltar-lhe melhor dote erotico, não creio que razão meresça. Revelar sua revolta podia parescer, tambem, burgueza inveja, não podia? De galocha é chato o gajo. Poncto. Mas se fode quem pensa só na grana. Xa p’ra la!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

FABULA CABULOSA [0516]

{Conhesces tu, dos indios, a famosa versão da Creação, não é? Pois vou lembrar-te: trez bonecos Deus na argilla moldou. Levou ao forno todos trez. Anxioso, retirou cedo o primeiro. Ainda estava cru seu homem branco. Um pouco mais tardando, Deus retira do forno o seu segundo, moreninho, no poncto: só podia ser um indio! Ficou tão encantado com a sua perfeita creatura, que exquesceu la dentro o seu terceiro, que queimado demais ficou: seria, claro, o negro. Percebes, caro Glauco, como cada cultura se elitiza, superior se julga, valoriza a sua lenda? Glaucão, somos racistas todos! Nada de errado vejo nisso! O que tu vês?}

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132 GLAUCO MATTOSO

-- Pretextos nunca faltam para a prosa racista, mas você não se informou de qual tribu sahiu essa tranquilla, pacifica versão. Tupan, talvez, foi esse deus nativo? Não me inteiro do thema, queridão. Para ser franco, dizer não vou que seja só mentira, mas nada justifica algum vizinho mais loiro pretender que um Hitler guinde-o ao topo racial. Que cê se inclua na natta nem extranho, si europeu tem sangue, mas tomar deve cuidado com essas conclusões. Eu não me alegro por causa duma pelle, si ja nada ver posso. Para mim, nenhuma cor de pelle differença faz, entenda, querido. Sua these está furada, em summa. Cê jamais foi finlandez.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

PODRE DE RICO [0517]

{Ai, Glauco! Os ricos, muito ricos, são malucos! O dinheiro os enlouquesce! Sabia que Bill Gates inventou... Sim, isso! Uma ecologica privada, capaz de transformar as nossas fezes em agua! Sim, em agua, em agua limpa! Fefito perguntou: “Você bebia tal agua, recyclada do cocô?” Pois é, nosso querido cocozinho virando uma purissima bebida, fresquinha, transparente... Ou não. Talvez um pouco marromzinha, parescendo café com leite... Hem, Glauco? O que você me diz? Hem? Tomaria aquella aguinha?}

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134 GLAUCO MATTOSO

-- Ué, mas ja bebemos, amigão, tal agua! Nada vejo, mas paresce que sae ja da torneira como entrou, barrenta, cor de terra, amarellada. Por isso vou ficar fazendo theses assim conspiratorias? Minha grimpa nem coço. Sem comptar que bem podia a nossa ser cocô, porem... Hem, pô? Nem mesmo recyclada! Ja adivinho aquillo que você, que se intimida com isso, me dirá, por sua vez. Não sente o coração o que não vendo estão os nossos olhos. Quem não vê perguntas não fará. Quem adivinha?


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VINHO NA BOTA [0518]

{Agora a gente encontra, Glauco, à venda um’agua assim, direi, “saborizada”, purinha, sem assucar! Não é lindo? A gente abre a garrafa, saboreia, degusta, até commenta sobre nota, resaibo, transparencia, marca, tudo! Não é lindo, Glaucão? E faz tão bem ao corpo! Da sahude cuida quem consome essa bebida assim moderna!} -- Lindissimo, sem duvida. Ninguem da selecta sociedade exalta nada inutil nem superfluo. Sorrindo estou, veja você. Garrafa cheia nem quero ver sobrar. Quando na bota beberem, a brindar algum sortudo evento, fingirei ter nojo, nem pedir vou um golinho. Ora, quem tem visão va pedir agua na taverna!

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136 GLAUCO MATTOSO LOVE YOU LIVE [0519]

{Achaste, Glauco, graça na sessão de photos que, descalços, flagra os Beatles? Pois digo-te que os proprios Rolling Stones flagrados foram numa bem mais quente sessão, por Andy Warhol, que não quiz appenas pés descalços, mas que fossem mordidos! Sim, mordidos! Ja pensaste, Glaucão? O pé do Jagger ou do Keith, em close, na dentada do Ron Wood? Irias delirar, si tu pudesses ver isso! Mas só podes suspirar de tedio ou frustração... Como te sentes?} -- Frustrado não me sinto tanto, não. E sabes por que? Nunca de taes mythos estive perto. Caso me abbandones, ahi, sim, ficarei mui descontente. Espero, pois, meu caro, que feliz me faças. Nem pedir vou que te rocem meus dentes o dedão. Basta que eu gaste saliva nessa sola. Que deleite! Assim descomptarei o que não pude fazer nalgum rockeiro... Minhas preces tu podes attender! Teu calcanhar, teu dorso, teu mindinho... nos meus dentes!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

DESUSO CONTINUO [0521]

{Saber quer duma coisa, Glauco? Ligo bulhufas para a data na caixinha! Remedio tem que ter é validade total, illimitada! Aqui na minha gaveta guardo muitos! Tempo faz que não estou tomando um comprimido vencido, mas si tenho, de repente, algum symptoma, ah, tomo novamente! Alguns são tão antigos, que ja nem veem sendo fabricados! Eu suspeito que datam essas drogas para a gente comprar sempre, de novo, ora! Ninguem é trouxa! Não, commigo não tem disso!} -- Concordo com você, mas mal consigo tomar remedio velho. Nem mesquinha achei sua attitude. Mas quem ha de saber si faz effeito uma antiguinha chartella dessas pillulas que, nas horinhas mais difficeis, revalido? Confesso que, num caso mais urgente, tomei um analgesico que frente não fez às minhas dores... Ah, tambem pudera! Como pode ter effeito aquillo, si dez annos, frio ou quente o clima, alli ficou? Melhor é, sem sentir nada, passarmos, né? Que enguiço!

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138 GLAUCO MATTOSO CULTO ECUMENICO [0522]

Os dois espadachins olham-se com um odio mudo, usando a saudação de praxe, porem avidos de sangue. Começa a lucta. Advança aquelle, seu rival encurralando, que desvia dum golpe certeirissimo, o qual corta a vela pelo meio. Sobre a mesa enorme sobem ambos. Continua a lucta, alli por cyma mesmo. Pulla um delles para o solo novamente. Tambem desce o rival. Eis sinão quando aquelle perde sua leve espada. Ja prestes a morrer, elle se exquiva e pega pelo braço um opponente surpreso. Tambem deste voa longe a branca arminha. Prompto. Vão na mão.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

Agora muda a scena. De bom tom não ha mais nenhum golpe, só chutão, pernada, parescendo bangue-bangue sem tiro. Um dos parceiros ja perdeu dois dentes. Outro berra, na agonia dum olho ja vazado. Pela porta affora, rollam elles. Indefesa, a moça sae correndo pela rua. Mas pede por soccorro. Quem ulula de gosto é a garotada. Juncta gente, torcendo para alguem ir se ferrando. Exhaustos, mutilados, ja sem nada podendo fazer, elles dão um viva à rude multidão. Sob o sol quente, abbraçam-se, se beijam. Um é monge buddhista. Seu amante é bom christão.

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140 GLAUCO MATTOSO HELPING HAND [0525]

{Eu tenho uma pergunta, Glauco, tão difficil de propor! Será que tu podias teus espiritos fazer, tambem, que me assistissem? Tu podias pedir a teus demonios o favor de, em sonhos, inspirar-me, Glauco, porra! Preciso duma adjuda, pois está tão fracco o meu poema, amigo! Vae, não sejas egoista, Glauco! Quero que tires essa duvida, affinal! Que tu me exclarescesses eu queria!} -- Disseste bem: querias. Mas eu não te posso responder. Tomar no cu jamais irei mandar-te. Meu dever foi sempre pelas boas companhias zelar, com os meus prestimos de auctor maldicto. Mas nem sempre de Gomorrha, Sodoma, alem de Roma, vem a má ou boa bruxaria, nem meu pae permitte, elle que espirito severo tem sido, que favor eu faça tal, nem vive de favor a poesia.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

DESIMMUNIDADE PARLAMENTAR [0526]

{Você ficou sabendo, Glauco? Foi achado um monte enorme de... de... Minha Mãe Sancta! Escorpiões! La no Congresso! Accabo de saber, o radio deu! Não, Glauco! Ja pensou? No corredor, nos proprios gabinetes, no Senado, na Camara! Si eu fosse deputado, pedia p’ra sahir! Uma licença, qualquer motivo valido, mas ia ficar é fora, Glauco, desse tão horrivel antro! Bichos peçonhentos? Tá louco! Claro fique, eu sahiria de ferias, mas sem perda dos proventos! Parou p’ra pensar nisso, Glauco? Diga!}

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142 GLAUCO MATTOSO

-- Nem mesmo do tamanho ser dum boi precisa para algum dessa damninha especie ter veneno. Nem lhe peço maior detalhe. Puta susto, meu! Por outro lado, posso bem suppor que piquem senadores, um damnado estrago causem, piquem o saphado ladrão, aquelle sordido, que pensa que pode se valer da mordomia, livrar-se de qualquer accusação. Sim, optimo seria seus lamentos ouvir de dor, ouvir dessa agonia soffrida pelo gajo. Taes momentos são lindos. Foi verdade? Faço figa.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

TALK SHOW [0527]

O Jotabê Medeiros à procura está dum editor que banque sua idéa de estudar a vida, a obra do Piva. Do Roberto Piva, sim! Biographo do mytho Raul Seixas, comptou, naturalmente, com appoio moral e... financeiro. Mas cadê quem queira dum maldicto ja lendario, porem na poesia, pagar bem a saga duma vida attribulada? Sahiu, sobre Raul, farta factura de livros, claro. Quem não continua gostando do rockeiro? Ninguem cobra, comtudo, que se faça jus, emfim, aos bardos mais bastardos, cujas deixas ainda trigo são, em meio ao joio das redes internauticas, tevê inclusa. Mas serei tão visionario si sonho com o dia em que tambem os cegos obra tenham estudada?

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144 GLAUCO MATTOSO MONIKA NIPPONICA [0531]

{Coitada da japinha, Glauco! Alem de ser treinada para chupar, ella precisa se deixar filmar chupando caralhos ensebados! Você falla, naquelles seus poemas, do sebinho, mas tinha que ver como foi sebão aquillo que lambeu a tal japinha! Às vezes foi vendada, como cega chupou. Em outros videos, vendo tudo estava. Mas, Glaucão, eu nem lhe conto o quanto que ficou accumulado o sebo, typo coco ralladinho cobrindo toda a glande! A japa cheira, recua, mas accaba se exforçando e limpa aquillo tudo com a sua linguinha japoneza, Glauco! São diversos videos, pena que você não pode conferir... Que lhe paresce?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Paresce-me que fazem muito bem focando tantos filmes na amarella camada que esse esmegma vae formando. Mas, quanto à japoneza, de senzala jamais vae precisar, pois com carinho practica tudo quanto, no Japão, se exige da mulher. Segue essa linha sem ter, socialmente, tal entrega exposta. Bem discreta, sempre mudo é seu comportamento. Dou descompto aos videos, que exaggeram, por seu lado, na linha pornographica. Sublinho, porem, que eu, como cego, da cegueira fiz uso, ou me fizeram. Ao commando cruel obedesci. Quem prostitua a bocca me entender consegue, tão commum é ver, chupando, quem não vê. Estar no logar della... Ah, si eu pudesse!

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146 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA PILHERIA [0532]

{Glau, veja que engraçado! Você diz que ja não participa mais de eventos por causa desses chronicos symptomas de estresse, da cegueira, coisa e tal. Mas deu no facebook onde você iria debatter ou palestrar, leria seus poemas, cantaria, guitarra tocaria, dansaria, até sapateado bem capaz seria de exhibir! Donde lhes vem, a todos esses gajos delirantes, tal verve imaginaria? Você não se sente incommodado com as petas?} -- Achei foi bem gozado. Mais feliz fiquei quando fallaram dos talentos que tenho para varios idiomas fallar, para fazer um recital bilingue, meus poemas ler. Cadê que leio coisa alguma? Superstar do rock até que eu bem que gostaria de ser, até com maxima alegria seria dansarino. Mas, rapaz, mal posso caminhar! Calcula alguem que faço tudo quanto ja fiz antes de cego? Bem, restou algum tesão, é claro, mesmo graças às punhetas...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO IMPATRULHAVEL [0534]

{Glau, sabe o que rollou em Curityba? Pegaram os collegas um ceguinho, alumno que ja bullying atturava, levaram ao banheiro do collegio, fizeram que chupasse e em plena cara mijaram! Do occorrido foi lavrada a queixa na policia, mas... Seria capaz aquella victima de ter alguem reconhescido? Ficou tudo pendente, Glauco, nada se appurou! Depois, aquelles mesmos que na curra gozaram, gozariam mais ainda, zombando delle, em khoro gargalhada lhe dando pela frente! Só por voz ninguem indiciado poderia ser como auctor do trote no ceguinho, siquer das piadinhas, Glauco! Pode?}

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148 GLAUCO MATTOSO

-- Não ha patrulhamento que prohiba tal trote, nem a curra. Ja adivinho o gosto que sentiu, de quem não lava a pelle, esse ceguinho. Privilegio assim eu tive. Nada se compara a tal humilhação. Somente cada um pode saber como uma agonia transforma-se em prazer, mas num prazer masoca. Não, nem todos desse mudo boquette fallarão tal como vou fallando. Uma fofoca appenas burra noção expalhará. Jamais bemvinda, a triste experiencia desaggrada a muitos moralistas, mas a nós, os cegos, restaria a poesia, retracto do oppressor mais excarninho, que nossa voz não prende emquanto fode.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA PASTILHA [0537]

Levado ao popular prompto soccorro, nem tive que esperar para attendido ser pelo plantonista, rapazelho ainda, que de duvidas me criva: “Tem febre? Sente enjoo? Vomitando está? Faz cocô molle? Tem sahido bem liquido? Faz tempo que você ficou assim? Que drogas tem tomado?” Em vez de soro dar-me, elle me passa appenas uma pillula, que engulo depressa, com receio de cuspil-a, mas surte tal effeito, que dalli eu saio saltitante de alegria, sem minimos symptomas do que tive.

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150 GLAUCO MATTOSO

Mal posso accreditar! Eu quasi morro mas basta aquelle simples comprimido e ter daquelle medico o conselho, que espero uns annos mais para que viva sem medo doutro virus tão nefando! Mas não me receitou, esse sabido doutor, o tal remedio, qual o que! Segredo quer o gajo, por seu lado, manter? Ora, mas isso não tem graça! Preciso descobrir si effeito nullo teria tal placebo, ou si tranquilla será sua funcção. Ja percorri pharmacias, drogarias, mas um dia descubro por que disso o doutor vive.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA EXCOLHAMBAÇÃO [0539]

{Aquelle negro, sim, é corajoso! Com elle é que eu concordo inteiramente, Glaucão! O movimento negro nem devia, no Brazil, ter exsistido! Um negro foi quem disse, Glauco, pense bem nisso, meu! Racismo? Não! Aqui não houve nada assim tão violento, tal como la na America! Abolimos, sem guerra, a escravidão! Até benigna direi que foi a nossa! Cê não acha? Eu soube até de negros que, libertos, quizeram seguir sendo, para seus senhores, ‘inda aquelles escravinhos que sempre foram, mais bem comportados e menos açoitados! É questão de vermos com bom senso, Glauco! Deixe que grite, que experneie essa chorona esquerda tropical! Concorda ou não?}

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152 GLAUCO MATTOSO

-- Discordo. Não serei Glauco Mattoso si disso for attraz. Você que tente sahir dizendo um troço que não tem nenhum embasamento! Mas duvido que disso quem fallou seja forense e douto portavoz. Mais vejo alli um certo masochismo, que não tento culpar, mas que em privado, só, curtimos. Um negro quer lamber uma botina de branco? Pois que lamba! Se esculacha um branco aos pés dum negro? Que elles certos estejam não duvido. Tambem meus são esses bons fetiches. Mas, maninhos, separem bem as coisas! Varios lados exsistem na questão. Os negros não teem nada a ver com esse podre peixe vendido pelos brancos, sempre à tonna, fedendo pelas aguas da nação.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

CUESTA ABAJO [0541]

{Que estás a pensar, Glauco, de mim? Pensas que devo ser modesta por que? Estás em duvida si tenho os predicados que tenho? Olha bem para a minha cara! Ah, deixa p’ra la! Cego estás, me exquesço. Mas sabes por demais como fui linda, charmosa, actriz famosa, até cantora! De sobra meu talento foi notado! Modestia? Qual modestia! Glauco, o meu exemplo mais marcante é o da Sarita, que sempre repetiu ser forte em tudo! Tambem sou diva, musa, bruxa, fada! Não passas tu por mago? Pois eu sou é quasi semideusa! Vae, pergunta ahi na rua, pelas praças, pelas barracas dos feirantes, pelos bancos todinhos de jardim! Sim, te dirão quem fui, quem sou, quem sempre serei: uma estrella, não cadente, mas brilhante!}

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154 GLAUCO MATTOSO

-- Eu nunca duvidei dessas immensas e bellas qualidades tuas, mas a zona que frequentas, pelos lados do corrego, mal hoje se compara aos tempos do coretto, do começo do seculo passado. Sim, ainda tens fama, si me informo com quem fora gary, choffer de taxi, delegado... Comtudo, o tempo passa. Ja cedeu logar o cinemão à tal mesquita, que, quando demolida, ao mais classudo puteiro passou poncto. Uma moçada mais nova fatalmente do teu show ja não se lembrará. Que tu defuncta estejas, muitos acham. Das estrellas bem poucos são fans, hoje. Teus tamancos, porem, fazem successo, pois te são roubados com frequencia. Lhes perfuma teu cheiro o material. Não é bastante?


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO ESPELHO [0543]

{Entendo você, Glauco, pois tambem sou bruxa, feiticeira, maga, barda. Não era, ‘inda menina, todavia, tão má, nem vingativa. De repente fiquei, depois que vi meu namorado de infancia me trocar pela garota mais linda do collegio. Foi então que, vendo-me no espelho, descobri quão feia poderá ser a creança depois da rejeição. Naquelle dia não houve sol. Appenas a neblina tomou compta do bairro, da cidade. Não sou do typo Carrie, você sabe. Meu methodo tem sido como o seu, mental, mais litterario. Mas consigo, de facto, compensar o que soffri. Discipulas ja tenho, tambem boas nas artes da maldade, Glauco. Nós sabemos nos virar na nossa praia, não é? Você se sente compensado?}

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156 GLAUCO MATTOSO

-- Eu? Nunca! Compensado não sou, nem ninguem, duma cegueira. Mas me guarda Zeus dessas taes “discipulas”. Quem cria mais fake news que toda a sua gente? Daquellas fofoqueiras eu me evado! Mas pense bem, querida: cada gotta de lagryma chorada por nós não tem nada que compense. Quem se ri da gente chorará, mas a vingança é Zeus quem determina. Cê se via no espelho. Mas nem disso um cego opina. Parou para pensar? Não, ninguem ha de saber como me sinto. Não me cabe saber como você se sente. Deu, a cada, Zeus um fardo. Meu castigo eu cumpro versejando. De persi, é cada qual um bruxo. Minhas loas vão para quem me goza, cuja voz me serve de incentivo. Quem me caia na teia que experneie, esse coitado!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA TRILHA [0545]

Saber que, no conceito de imbecis, boçaes bolsolavistas, o culpado dos analphabetismos será quem compõe musica, lettra, que o rockeiro induz ao satanismo ou ao aborto, que, para abundar droga em Woodstock, preciso foi que agentes russos, claro, la fossem offertal-a... -- Tanta grossa besteira até me deixa mais tranquillo. Peor ‘inda seria si esses crassos discipulos dum tosco charlatão curtissem nossa musica, curtissem a trilha que trilhei na juventude. Tomara que não curtam! Mais me rende!

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158 GLAUCO MATTOSO

Ouvi que esse guru, nas redes, diz que, caso o capitão seja flagrado corrupto ou corrompendo, o gajo, sem siquer titubear, chupa o trazeiro, sim, chupa, do Caetano! Descomforto não sinto, nem vergonha alheia. Choque não causa a autodeshonra dum ignaro. Tambem posso appostar: caso se possa pegar o capitão roubando um kilo de nhanha, ah, lambo o pé desses palhaços todinhos, chupo o pau dum battalhão inteiro! Mas duvido que me atticem assim, dando lambugem. Quem se illude? Tambem terraplanista alguem se vende?


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO INCOMPARTILHAVEL [0547]

{Tu passas o Natal sozinho, meu amigo? Ja paes vivos tu não tens? Não seja, pois, por isso! Te convido à minha ceia, Glauco! Para teres idéa, tentarei temptar-te: vou assar o tal pernil de que tu gostas, cercado com rodellas de batata, sem passas na farofa, só pedaços de bacon. Alem disso, panettone commum, sem chocolate, mais as nozes, castanhas, um bom vinho, um bom champagne. Terei queijo do reino, com aquella sopinha abrir vou nossa alegre ceia. E então? Tu não te sentes, ja, temptado? Não fosse pela boa companhia, ao menos a comida valeria a pena, não é mesmo? Que me dizes?}

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160 GLAUCO MATTOSO

-- Temptado fico, claro, pelo teu convite. Ja te dando os parabens estou pelo bom gosto. Si decido passar aqui, só, desses taes prazeres terei que me privar. Sabes que sou maluco por pernil, com cujas postas eu sonho. Não, peru não ha que o batta! Contento-me com estes meus excassos chardapios requentados. Só por phone faremos um contacto. Não, não poses de victima. Não poso, nem que ganhe carinho dos amigos. Data bella jamais representou para mim, creia quem queira, a natalina, neste estado. Prefiro meditar como seria a vida si enxergasse, ‘inda de dia, as cores mais alegres e felizes.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

SCENAS DE PUGILLATO [0549]

{Você, Glauco, teria gosto nisso! Contar-lhe vou aquillo que vi, nesta dignissima Assembléa: na tribuna discursa aquelle velho fanfarrão, chamando todo mundo para o pau, xingando, proferindo offensas varias, até que um trouxa veste a carapuça e parte para cyma do orador. Do deixa disso a turma logo cerca a dupla, mas é tarde. Sae porrada geral, distribuida, com direito a golpes de judô, de karatê, pernada, ponctapé, tudo que alguem assim como você ver quereria, Glaucão! Ficou você mais satisfeito?}

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162 GLAUCO MATTOSO

-- Não. Quero mais ainda. Grande enguiço desejo no Congresso. Minha festa seria que, na base da borduna, appenas, não ficasse. Que na mão alguem saia, acho pouco. Maior grau espero de calor. Sim, latrinarias offensas que provoquem a dentuça partida por um coice, senador sacando seu revolver, quem alterca tombando balleado, da bancada o lider morto a faca, num perfeito desfecho cidadão, como você suggere. Mas tivemos, ja, tal, sem que nada resultasse. Quero, um dia, que morram de montão. Vae ser bem feito.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

TRABALHADORES DO SEXO [0553]

{Agora, Glauco, um soropositivo não mais transmitte a peste! Cê sabia? Fiquei sabendo: os medicos agora suggerem uma pillula que evita do virus transmissão pralgum parceiro. Disseram que é melhor a camisinha, mas sabe-se que poucos utilizam. Por isso, você, Glauco, que é sozinho, ja pode contractar o seu michê, que, como toda puta, todo trans, trabalha mais seguro. Ja pensou? Você não se enthusiasma, não celebra?} -- Nem tanto. Tão sozinho ja não vivo nem tenho, sem visão, tanta phobia. Entendo por que tanto commemora a classe prostituta que cê cita. Mas nunca recorri, não, por dinheiro, a algum garoto, desses que, na linha villan, fazem programma. Não me pisam do jeito que eu queria. Nem me allinho à pillula, pois, como bem você conhesce, pés eu lambo. São, pois, vans p’ra mim taes discussões. Não, não estou ligando. O galho a gente sempre quebra.

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164 GLAUCO MATTOSO PORN FOR THE BLIND [0554]

{Sabias tu que exsiste ja na rede noticia sobre cegos que pornô procuram material? Não só papaemamãe, não só normaes penetrações, mas todo typo, claro, de fetiche, de sadomasochismo ou perversão. Notei que, em testemunhos, os ceguinhos allegam que, entre eguaes, codigos ha que tudo facilitam, mas no caso dum normovisual que abborda um cego, ainda faltam codigos capazes de dar plena noção do que se quer fazer para que tenham um prazer total, justo, reciproco. Que pensas?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Ao pote não irei com essa sede dalguns principiantes. Ja cocô comendo sei de cegos, mas não sae nadinha disso nessas descripções que muitos consideram mau pastiche daquillo que se verte em bom calão. Só posso confirmar que, com carinhos e gestos mais gentis jamais se dá qualquer encontro fertil. Só num raso e grosso pappo à foda não me nego. É simples: com as phrases mais mordazes, o gajo de mim faz o que quizer, humilha-me, demonstra seu poder de quem pode gozar com taes offensas.

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166 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO EXPALHADO [0557]

{Quem olha para o gajo não se enganna! Ja viste, Glauco, um typo mais escroto? Seus oculos escuros não são como os teus, que tens de cego face clara! São como os dum gambé, dum araponga! O gajo o dia passa a teclar fake news sobre todo mundo que critica aquella familicia ainda impune! Não, nada faz de bello ou productivo! Só quer saber de “guerra cultural”, de “mytho”, “lacração”, tudo que ennoja! Não achas que esse typo nausea causa?} -- Foi visto usando, dizem, hawaiiana barata. Tambem dizem que o garoto tem pés largos, chatissimos, e sommo a tal characteristica a mais rara de todas: dedão curto, menos longa medida que a do dedo ao lado. Sei que tem gregos pés, emfim. Imagem rica, embora sendo um verme. Eis que reune, portanto, qualidades que, no crivo dum cego masochista, dão aval ao lodo onde esse cara ahi se expoja. O odeio, mas meu odio ora faz pausa.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO LHANO [0559]

{Fiquei impressionado, Glauco, quando, na festa de Natal, varios casaes ha tempos separados, outros bem recentes nessa drastica questão, conversam normalmente, são gentis, tractando-se com toda a cortezia, sorrindo, demonstrando não haver qualquer rancor guardado, sympathia total apparentando. Glauco, como conseguem disfarsar? Como conseguem fingir que nenhum odio ninguem guarda? Me explique isso, Glaucão! Fico perplexo!} -- Nem sempre estão, de facto, disfarsando, mas outros me contaram que normaes não são as relações. Vontade teem de murros applicar, de confusão armar, sahir no braço. Ninguem quiz tal coisa assumir, quando me dizia “appenas bons amigos” ja poder fallar de quem foi ex. Melhor seria perder a polidez, comer o pomo maduro da discordia. Que se peguem a tapa, não é mesmo? Mas não tarda que percam o tesão de ‘inda haver sexo.

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168 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA INVEROSIMILHANÇA [0561]

{Em nome do Partido, eu ca proponho tomar por homenagem a medida de gloria ao Dirigente Koreano do Norte, pelo exforço do seu povo, alem da liderança, tão suprema, tão maxima, tão bella, tão sublime, do Grande Timoneiro, digo, Grande Amigo, Companheiro, Camarada! Proponho que se inscreva nesta Casa o nome desse Lider como exemplo da nossa linda lucta popular! Estou representando o meu Partido!} -- Assim não dá. Por isso é que, tristonho, eu perco o meu respeito. Quem decida dizer-se libertario desenganno do typo não tolera. Me commovo por causas sociaes, pelo problema do nosso retrocesso. Mas fodi-me tentando crer na esquerda. Quem commande partidos esquerdistas não tem nada mais util a fazer? Quem extravasa tal pleito não meresce como templo um foro democratico. No bar, tampouco, valerá menor ouvido.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO RELHO [0564]

Alguem que do governo toma as dores me disse que deviamos tomar medidas as mais drasticas, taes como na constituição fazer a limpa, voltar ao AI-5, fechar tudo, Congresso, tribunaes, imprensa, até controle de internet annunciar. Seria, como falla a “auctoridade”, a “maxima delicia” a degustar, um “céu de brigadeiro”, uma total aurora governista, ao seu estylo. Entendo tal tesão dos dictadores na pelle do cagueta mais vulgar. Quer elle descomptar, em cada assommo raivoso, de quem baixa a sua grimpa, lhe barra as pretensões. Seu odio mudo seria desforrado, de má fé, num intellectual, num superstar, na mais celebre estrella da cidade. Chicote quererá, sim, manejar. Seus pés quem lamberia, quando o mal que prega triumphasse? Eu nem vacillo...

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170 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA TELHA [0567]

{Assim do nada, Glauco, me vem essa idéa bemfazeja de ser uma pastora! Não! Melhor dizendo, bispa! Maior sacerdotiza que eu não ha! Não acha, Glauco? Olhasse você bem, veria como tenho o pé bonito, pequeno, delicado, de dedão mais curto, bem greguinho, um tesão só! Calcule quantos dizimos me vão pagar para beijal-o! Só não sei como é que tal idéa não me veiu mais cedo! Vou chamar aquelle mano que faz a segurança alli da loja e, junctos, nosso templo montaremos! Que idéa genial! Não é, meu nego?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Aquelle molecão? Caso me peça, eu entro para a seita! Cê me arrhuma alguma funcção, desde que eu não dispa a minha roupa. Alguma coisa dá que eu faça, né? Será que elle não tem vontade de ser bispo? Si eu lhe cito uns biblicos versiculos, christão se torna aquelle mano. Que xodó seria seu pezão! Será que não tem elle tambem curto dedão? Dei a minha suggestão. Acho que cheio da nota ficará, si não me enganno. Vocês dois, junctos... Orra! Quem se ennoja beijando pés assim? Consideremos fundada a Grande Egreja do Pé Grego!

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172 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DE ORELHADA [0569]

{Ouvi fallar, Glaucão, que tudo tem perigo de explodir! Ouviste tu? Por isso não terei um cellular, um carro, um electronico cigarro! Não quero, de repente, ir pelos ares! Pensaste nisso, Glauco? Uma faisca nem mesmo necessaria se faria! Explode de espontanea decisão aquella tralha toda! Que perigo! Tens medo, tambem, Glauco? Ou não te importas?} -- Não penso nisso, nunca, amigo, nem preciso dessas coisas. Ja tabu demais nós arranjamos. Vae cuidar da vida, meu amigo. Sei que exbarro com riscos sempre, em todos os logares. Não é por isso, claro, que se arrisca a gente a arrebentar assim na via. Si fosse facil uma combustão do typo, que seria, meu amigo, de tudo que funcciona? Moscas mortas?


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO PECCADILHO [0581]

{Jesus fallou, Glaucão: nós não devemos uns ciscos apponctar em olho alheio si temos, bem no nosso, um pedregulho. Não disse exactamente nesses termos, mas quiz dizer: macaco que não olha o proprio rabo nunca poderá fallar dos outros. Nisso por fallar, meu rabo eu ando dando, Glauco! Sabe? Eu nunca tinha dado, só chupava! Agora descobri que dar o cu é muito dolorido! Si você se julga masochista, saber vae daquillo que lhe digo com franqueza! Então pergunto: como um peccador serei, si ja pagando pela dor estou? Quer me dizer, Glauco? Me diga!}

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174 GLAUCO MATTOSO

-- Ouvidos ando dando mais aos demos que aos anjos, mas em Christo tambem creio, pois disse muita coisa que barulho fará quanto mais della nos valermos. Que cada qual seu ganso, livre, molha é poncto claro. O mesmo, pois, se dá com nosso lindo rabo. Quem quer dar que dê. Você bem sabe quanto cabe de rolla dentro delle. Quem, escrava, a cara abra ao caralho, tal tabu nem teme, pois pinctinho de nenê não é bem o que leva quando cae de bocca num thalludo pé de mesa. Por isso não censuro quem quer pôr no rabo o piccolé dum fodedor. Sossegue, que com Christo não ha briga.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO VERMELHO [0583]

Signal verde, vermelho, verde... Mas nem quando fica verde livre fica o transito. Uma longa fila vae, de poncta a poncta, pela rua toda. Os carros buzinando vão, mas nada resolve tal barulho. O motorista que, preso no vehiculo, se estressa é visto por pedestres e por gente que mora alli na rua como um pato. Nem sempre taes pessoas são tão más, mas, quando se engarrafa a coisa, a zica de quem está nos carros nellas trae a sadica tendencia. Que se foda desejam ao choffer. Ficam, de cada sacada, janellinha, porta, à vista de todos, caçoando, rindo dessa ralé motorizada. Mui contente percebo o transeunte mais pacato.

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176 GLAUCO MATTOSO

Qualquer velhinha mostra-se mordaz, qualquer moleque exfrega a sua picca, qualquer porteiro ja no riso cae, qualquer vovó sorri, qualquer vovô da desgraça alheia goza na calçada. Eu mesmo, que me julgo masochista, divirto-me com isso, sim, à bessa. Até battendo palmas ha quem tente fazer festa. Aliaz, eu tambem batto.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO ENVELHESCIDO [0585]

{Estou aqui pensando, Glauco... Como nós eramos abertos, nos septenta! Caetano, Raul, Chico, Milton, Gil, em tudo que faziam, perfeição esthetica passavam, lucidez politica! Que inveja nos causavam! Agora que, das decadas, decurso nós vamos perfazendo, Glauco, não parescem mais assim tão geniaes... Reouço os velhos albuns, me detenho na parte instrumental, ainda bella, mas perco o meu tesão nas lettras, antes magnificas, orgasticas, sublimes! Será que rigoroso sou demais, ja velho, Glauco, ou tu tambem estás mais critico? Tambem não minimizas aquella scena toda? Que me dizes?}

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178 GLAUCO MATTOSO

-- Aos mais amargurados eu me sommo, mas lembra-te de como se sustenta a nossa lucta, ainda hoje, em mil motivos que resurgem, amigão. Inveja ja não temos, uma vez que nossos proprios versos luctas travam. Mas delles nós herdamos o discurso, ainda nossos idolos serão. Nós somos como foram nossos paes, cantava Belchior, porem ferrenho será nosso desejo de quem zela por uma sociedade sem farsantes, nas artes, na politica. Regimes retrogrados, de novo? Não, jamais! Porem, revisitemos os que, das passadas datas, tu tambem reprisas. Por causa delles, fomos mais felizes.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA PALHAÇADA [0587]

{Cholerica fiquei, Glauco! Ja cada ministro um estandape está fazendo! Gracinha p’ra platéa, Glauco! Observas? Um planta bananeira para dar noção de que a politica, si innova, põe tudo de cabeça para baixo! Um outro joga ao povo chocolates e imita Sylvio Sanctos! Reparaste? Mais outro dos desenhos animados debocha, personagens gays apponcta! Um circo me paresce esse maldicto governo, gente! Estou inconformada!} -- Querida, não te irrites. Estressada si ficas, tempo perdes. Eu defendo que calmos nós fiquemos, que com hervas façamos um chazinho. O paladar melhora ao addoçarmos. Anda, prova! Mais tarde, nós riremos, e me encaixo na claque que rirá. Somos, nós, vates, prophetas, bem tu sabes. Que nos baste, prevemos ao governo tristes fados. Ministros dão risada, mas a compta chorando pagará quem eu nem cito. Que delle archiva a chronica? Bah! Nada!

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180 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO BISBILHOTEIRO [0589]

{Mas, Glauco, como quebram o sigillo dum gajo que é politico, que tem totaes immunidades? O paiz virou casa da sogra, virou cu de Mãe Joana, Glauco! Um juizinho qualquer, de qualquer vara de interior, decide que se pode examinar as comptas dum honrado cidadão! Ninguem ser poderá tão abelhudo! Si duma auctoridade bisbilhotam bancarios movimentos, que dirá dalgum gajo commum? Não! Não consinto! Glaucão, isso precisa ter um fim!} -- De facto, tem um fim, si definil-o eu posso como tactica de quem tem tal finalidade. Esse juiz talvez tenha pensado: “Ora, tabu não vejo no sigillo do vizinho! Por que não dum cacique?” Do doutor juiz não está livre nem quem ar obstenta de major ou capitão! Pequenos magistrados podem tudo? Talvez. Alguns juizes calma adoptam, pois sabem que jeitinho sempre dá um caro defensor. Mas não me sinto em risco. Duro vivo, ora! Ai de mim!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA VELHICE [0592]

{Que coisa, Glauco! O mundo, para nós, que estamos na velhice enveredando, se torna mais difficil cada vez! As pernas de equilibrio sentem falta! O braço mal se firma na bengala! As costas, ja curvadas, sentem dor! As dores pelo corpo não dão tregua! O somno se interrompe com frequencia! Xixi, cocô, ja tudo desregula! Somente, no meu caso, o pincto dá no couro, uma vez tendo o seu devido buraco disponivel, ‘inda bem! Você, Glauco, percebe-se cansado? Ainda tem tesão? Como se sente?}

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182 GLAUCO MATTOSO

-- Se exquesce de fallar você que a voz tambem vamos perdendo, que commando não temos sobre nossa sensatez na hora duma dose que, mais alta, nos deixa problematicos na salla, bom alvo prum dedinho accusador. Ainda tem bem recta a sua regua? Sortudo, você! Teime! Não dispense-a! A minha anda ja molle e só me pulla si penso num pé sujo, o que não ha por perto sempre. Quando me decido a gozo dar-lhe, passo mesmo sem nenhum buraco. Sorte do meu lado! E disso alem, bem passo sem o pente...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

SOLTURA SEM TORTURA [0594]

{Eu juro que vi, Glauco! Uma terrivel sessão de masochismo! O gajo fica deitado, com a cara para cyma, debaixo dum assento, typo um vaso, daquelles de privada, só que sem o vaso! Tem a tabua, appenas! Deu, Glaucão, p’ra me entender? Pois muito bem! O gajo que sentou faz o cocô na cara de quem fica alli deitado! Peor, muito peor, Glauco! O dejecto é molle, quasi liquido! O subjeito coberto fica pela lama, aquella nojeira, Glauco! Nojo dá! Não dá?} -- Descrevem muitos videos desse nivel na rede meus amigos. Minha picca às vezes enduresce. Mas o clima nem sempre me convence. Cito o caso dum gajo que se mostra rindo, bem contente por estar alli, por seu rostinho ser cagado, o que ninguem normal toleraria. Meu pornô prazer vem justamente de ennojado estar quem é borrado, ora! Não veto nenhuma preferencia, mas deleito a minha tara appenas si elle mella a cara, alli, na marra! Pensou ja?

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184 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO ABBRUTALHADO [0596]

{Cabral ja disse, Glauco: Tudo é duro. É dura a vida, a pedra, a terra, a morte, fallou. Si não fallou, vou fallar eu. Dureza representa, às vezes, mais que titulo ou character... Entendeu? Trabalho, quando duro, nos eleva. Um bife nos requer dente... Entendeu? A cama, quando dura, nos exige um somno mais pesado, para as dores podermos supportar a noite toda. Cocô nos suja menos... Entendeu? É mais difficil tudo, quando duro, mas dá valor aos homens... Entendeu?} -- A alguem que si entendi pergunta, juro, eu mando perguntar (Que não aborte mais filhos!) à mãezinha que à luz deu. Não quero nem saber si duros paes você teve na vida. Quem me leu bem sabe como um duro pau se leva no cu, na bocca, quando se vê breu. Tesão de mijo, para que se mije, precisa admollescer. Oraes favores um cego os presta, sempre que se foda na mão dum felizardo philisteu que enxerga, que me zoa, neste escuro. Calar-me irá você, si me fodeu.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO GUILHERMINO [0598]

{Fiquei sabendo, Glauco, que será fechada a cultural Casa das Rosas! Não achas uma pena? Tantas vezes la foste palestrar, tantos eventos alli presenciaste! Elles allegam que pende de reformas a mansão, que, em dois annos, “appenas”, está prompta! Dois annos? Eu duvido! Ouço dizer que, como do Ypiranga no museu, as obras pararão e nada mais alli funccionará! Que pensas tu?} -- Ninguem um prazo longo desses dá si falla serio sobre essas famosas reformas “de fachada”. Nós, freguezes que somos desses velhos monumentos, chorar vamos. Mas elles não sossegam. Ainda vão fechar o casarão do Mario, ou do Guilherme... Pões na compta tambem nosso Theatro? Que fazer do predio Martinelli? Que sei eu? Tomara que boatos essas taes noticias sejam: praga de urubu...

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186 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA EMPULHAÇÃO [0702]

Dum lado, desconfiam da facada. Uns acham que foi scena bem armada, mas torna-se impossivel suspeitar de tantos hospitaes, de renomados doutores que terão reputação e nunca acceitariam uma farsa. Paresce que, si insistem nisso, vão cobrir-se de ridiculo os que tal versão ainda querem sustentar. Dum outro, mais vexame dá quem brada que plana sempre fora a Terra, nada havendo que se imponha, nem lunar visão, nem solar polo dos dois lados do movel horizonte, num clarão. Um trouxa, que duvida até da Barsa, fé bota num guru, num charlatão que passa por philosopho. Total burrice, dos dois lados, bipolar.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO EMPORCALHADO [0703]

{Sabias tu, Glaucão, que exsiste um typo mais caro de café, mas tão selecto que custa dois mil dollares o kilo? Verdade! Elle é tão raro porque vem o grão do cocozinho dum gambá, alguns dizem dum porco, mas é facto! O bicho o grão engole e não digere, porem aquelle typo de grão é comido pelo bicho por excolha do proprio, sendo, pois, especial! Não achas isso o maximo, Glaucão? Será que tomarias tu daquillo, ainda que pagar não precisasses?} -- Estás é louco! Nunca participo de farsas taes! Sim, tenho um predilecto café: se diz “espresso” por estylo, com “S”, em italiano. Quer alguem provar-me que melhor café não ha que fezes de gambá? Sou eu o pato, talvez? Ha rico trouxa que prefere cocô torrado? Botas nisso fé? Melhor é duma droga ter a folha no cha! Dá mais barato, por signal... Em porco por fallar, por que não vão comer o seu cocô, pago por kilo? Dará menor preju nas altas classes...

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188 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA MULHERADA MARAVILHADA [0707]

{Glaucão, eu fico puto! Cê sabia que “jovens infractores” tambem teem direito de ter “intima visita”? Puteiro de bandido ja virara a penitenciaria para adultos! Peor, muito peor, é sustentar com grana dos impostos um puteiro mirim, Glauco! Pois é! Com camisinha, até lubrificante, pagos com o nosso dinheirinho, Glauco! Fico putissimo! Tambem eu quereria putinha nova assim, ‘inda de graça! Glaucão, que tem você para dizer?} -- Suspeito sou, por causa da mania que tenho por chulé dos que a FEBEM ja tenham frequentado. Você cita prostibulos de estado. Tá na cara que taes “namoradinhas” jamais cultos de egreja acceitarão, alem dum lar. Tambem eu quereria meu dinheiro usar para pagar, dum trombadinha, o cheiro chulepento, o sabor bom daquelle seu pezão. Si fosse rico, eu varios contractava. A poesia me serve de consolo. O que se passa la dentro ja supera meu prazer...


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO CARALHO QUE NOS CALHA [0715] (ao Sylvio, bordeleiro que eu respeito) {Você sonnettizou, Glauco, que quem é muito feio puta nem consegue capaz de bem chupal-o. Namorada, então, mas nem pensar! Ahi você affirma que ceguinho não excolhe ninguem, nem pela cara, nem caralho. Pequeno, grande, sujo, torto, ja chupou sem reclamar. Pois muito bem! Eu ca lhe digo, Glauco: sim, sou feio, mas putas eu excolho porque pago e exijo que me chupem. Dou gorgeta àquella que chupar com mais capricho. Appenas um detalhe, Glauco, para você se estimular: para gozar melhor, eu fecho os olhos. Tanto faz, portanto, si quem chupa seja a puta ou seja algum ceguinho. Só me importa que saiba dar o maximo de si!}

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190 GLAUCO MATTOSO

-- Detalhe addicional: no caso, eu nem cobrar suppuz. Eu sonho que me cegue um typo philisteu e bem treinada se faça a minha bocca. Que lhe dê vontade, espero. Pena que quem olhe as coisas do seu jeito nem meu galho quebrar possa, pois mora para la das bandas do sertão... Fiquemos, sem problema, a fazer disso um devaneio, talvez masturbatorio. Não estrago a sua phantasia, pois boceta você ja dispensou. Pense num bicho, talvez um macaquinho: se compara o cego com o bicho. Meu logar eu sei e você sabe. Sou capaz de ver-me lhe chupando. Si fajuta não for a scena, creio que comforta alguem como você, que de mim ri.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

FAKE NUS [0717]

{Não achas, Glauco, que esse facebook ganhou, de facto, um optimo baptismo? Pois é: “Livro da Cara”! Meu perfil alli tem duas faces, uma bem real, outra fajuta. Quando quero, eu poso de villão nesse fajuto perfil, mas, si preciso, livro minha carinha bonitinha no meu bom perfil. Não achas, Glauco, que é perfeito? Assim, “caralivrando” no livrinho, eu faço o bommocismo do mocinho e posso, livremente, ser villão!} -- Perfeito? Claro! Mostras o teu muque mais bruto no perfil falso. Só scismo commigo uma coisinha. Achas que vil és tu só na palavra? Não te vem vontade de despir-te? Si sincero tu fores, quererás mostrar, bem puto, em vez do dedo medio, uma birrinha real, um pau bem duro, desses com cabeça de az de espadas. De que jeito, porem, si o facebook, esse mesquinho livrão, prohibe nus? O que escrevinho é texto, mais se livra da aggressão.

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192 GLAUCO MATTOSO PSYCHOTICO DIAGNOSTICO [0718]

{Cantora gospel? Hymno protestante? Um canto gregoriano? Um candomblé? De jeito nenhum! Chega desse pappo! Não posso permittir! Eu, que sou membro da Camara de Agnosticos e Atheus, entrei ja na Justiça para ver si barro um espectaculo onde esteja qualquer canção do typo programmada! Emquanto não puzerem uma banda que toque rockão sceptico, ninguem escuta mais tal musica de egreja! Estou certo, Glaucão, ou não estou?} -- Mas sceptico rockão ja tem bastante tocado por ahi! Creio, não é, não, por ahi, pagão! Va caçar sapo, diriam os Mutantes... Em dezembro você não vae querer que alguns dos meus amigos de Natal não possam ter ouvido umas canções! Beber cerveja deixar não quer quem bebe limonada ou vinho? Ninguem nessas coisas manda! Satanico si sou, ou monge zen, eu ouço o que quizer, seja ou não seja em publico! Procure por seu show!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO MOLHADO [0721]

{Odeio os novos jovens, Glauco, odeio! Dos jovens mais antigos, que nos são tambem contemporaneos, raiva tenho por causa do rockinho vagabundo que escutam, differente do da gente, que sabe distinguir o que de bom o rock offeresceu... Glauco, você tambem odeia aquelle novo joven? Nem rock escuta, raios! E nem dá direito p’ra saber que porra aquillo seria! Acho que nome isso nem tem!} -- Talvez se chame funk, axé, mas creio que este comprimidinho sensação mais calma lhe trará. Sei que ferrenho fanzão você dos Beatles foi. Segundo meu senso, ouvir podemos longamente o RUBBER SOUL, que tal? Assim do som dos jovens actuaes nem tem porque você ter odio. Os nossos sons ja chovem, por si, nesse molhado blablablá. Sossegue, meu amigo. Bem tranquillo estou, que peor coisa ainda vem.

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194 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DO ADMARRILHO [0722]

Eu tenho um cothurninho, miniatura daquelle de soldado, mas marron é sua cor, não preta, a mais commum. Um ex-paraquedista foi quem fez a mim tal presentão, cujo cadarço tem nós, um por ilhoz, um admarrilho de estylo ornamental, bem caprichado. Me disse o “pequedê” que quem procura servir alli de elite quer ser, com orgulho superior a qualquer um. O proprio capitão, por sua vez, passou pelo uniforme, que de março um trinta e um nos lembra, mas me pilho pensando noutra coisa, aqui excitado. Sim, tracta-se do trote, que tortura commum foi nos quarteis. Novato bom lustrou com sua lingua, sim, algum cothurno marronzão. Fiquei freguez daquella phantasia. Mais esparso agora, tal tesão como gattilho não serve si lembrou chefes de estado.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DOS OLHARES [0723]

Contaram-me este caso. Uma gattinha vivia no brechó, toda feliz, gordissima, dormindo no sofá. Fazia da mobilia até que parte. Mas eis que uma fregueza, cobiçosa, raptal-a conseguiu, levou-a para seu chique appartamento, de carinho cercou-a. Achou que nova vida a gatta teria, mais comforto, mais amor. A gatta accostumou-se, ella pensou, pois quieta, deitadinha, alli ficava. Um dia, da janella a gatta vinha sahindo. Pullar fora, claro, quiz. Cahiu do sexto andar. Dizer nem dá que inteira ficou, ja que um bicho parte seus ossos, organs, numa desastrosa quedinha dessas. Nunca que ella sara de todo, mas viveu, voltou ao ninho antigo, no brechó. Tem quem lhe tracta, aos poucos, das sequelas, sem suppor que coisa succedera. Aqui nem dou palpite nessa lucta que se trava.

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196 GLAUCO MATTOSO

Aquella que a roubou até ja tinha achado que morreu, que por um triz não ia resistir. Não é que está de novo no brechó? Vae que um descharte lhe pode interessar... Quem é que posa de fofa, no sofá? Mal se depara com sua vil raptora, de fininho, a gatta se retira. Alli desapta a ladra a chorar. Logico, uma dor tamanha attrae olhares. Esse show quem viu diz que a mulher em choque estava.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO COMPARTILHADO [0724]

{Ahi, Mattoso, quero que me digas si estou equivocado ou si nós dois entramos num accordo. Pois occorre que dó, mesmo, não tenho de ninguem, nem velho, miseravel, cego, mudo, currado, prisioneiro, cadeirante, emfim, ninguem da raça que se diz humana. Mas não é que sinto dó dos bichos? Sim, dó tenho de cachorro, ainda que feroz, si maltractado, faminto, abbandonado, coitadinho! Paresce-te talvez, Mattoso, que eu me mostro um insensivel? Mas tu tens, tambem, com cachorrinhos o maior carinho! Pelos homens tu tambem terás o meu desprezo? Me responde!}

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198 GLAUCO MATTOSO

-- Prezado cidadão, entre as amigas pessoas que me pedem nome aos bois, cachorros, gattos, patos, quem me torre o sacco nunca falta. Mas me vem alguem como o senhor, que falla tudo aquillo que sustento. Semelhante a todos os humanos sou, mas quiz deixar claro nos versos que xodó não tenho por ninguem, por ninguem morro de amores, nem por mim. Por outro lado, adoro cachorrinhos, com carinho refiro-me ao basset. Quem entendeu meu poncto me meresce parabens. Portanto, meu senhor, nada melhor que nós compartilharmos o que tem a gente em commum, sabe só Zeus onde.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA PENTELHAÇÃO [0725]

{Senhor Mattoso, venho-lhe, por meio da nossa virtual rede, pedir que deixe de servir-se de expressões tão chulas, indecentes, de teor improprio para todas as edades. Talento o senhor, duvida sem, tem. Então para que tanta aberração? Façamos o seguinte: doradvante, poemas o senhor fará só com palavras elevadas, instructivas, que exaltem devoção aos mais sublimes valores da christan communidade. Agindo dessa forma, não será por mim mais accusado de deboche, excracho, perversão ou sacrilegio. Não acha razoavel, meu senhor?}

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200 GLAUCO MATTOSO

-- Não só por esta rede, estou ja cheio de toques desse typo. Si mentir quizesse, eu lhe diria que Camões foi chulo tambem, como o professor que tive de Moral nas faculdades nas quaes maiores notas que eu ninguem obteve. Inda diria que mais não farei pornographia, que bastante estou arrependido, do bom tom, appenas, usarei e darei vivas à patria, a mais dureza nos regimes, à ordem, ao progresso. Mas verdade não quero que me falte. Então, que va catar coquinho peço, que lhe attoche la dentro uma cenoura, que lhe inveje o pauzão que encaro, como chupador.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

REMOTO DEVOTO [0728]

Extranho joven, esse. Casto, crente, mas tem idéas proprias do que seja jejum ou castidade. Nem punheta batter quer todo dia. Se isolou no sitio que deixou seu pae. Só mora com elle um primo cego, orpham, de quem cuidado, christanmente, tem, mas não tão charidosamente quanto crê a rasa vizinhança. Tem sisudo adspecto o joven, pouco dado às fallas. Bollou elle conceito differente daquillo que se julga, alli na egreja, “divina providencia”. Que commetta maldades com um orpham dar não vou certeza. Mas me dizem que elle ignora o choro dum cegueta que só tem um dom: “obediencia cega”. São deveres deste, excolha sem, que dê de lingua banho nesse pé cascudo do primo, fora arcar com suas gallas.

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202 GLAUCO MATTOSO

Lamber, chupar, sem asco ou repellente noção, nem dignidade. Quem não veja tem essa vil missão, reza a canneta divina, diz o primo. Si ficou sem gozo uma semana, acção agora, no sabbado, quer elle. Eis que lhe vem um cego bem na hora do tesão. Agora não importa qual buquê terá seu pé, seu pau, seu anus, tudo que nunca suspeitou quem chupa ballas. Perguntam-me si exsiste quem aguente viver em tal estado. Quem esteja, ha pouco, sem visão e se submetta às ordens dum parente, me contou mais gente, não é raro. Só peora no caso desse primo, pois ninguem suppõe um cara assim, que bom christão se julga, que jejua. Acha você que desse caso valha algum estudo fazer? Ou nem tal thema chega às sallas?


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO BRILHO [0732]

{Eu tenho competencia no mercado, Mattoso! O meu dindim tá garantido! Por isso não dependo de estataes, que são uns cabidões de emprego e vão, de mim si depender, privatizadas todinhas ser, Mattoso! Para a rua ir devem todos esses parasitas chamados “funccionarios”! Desemprego? Mendiguem, ora! Peçam que eu lhes deixe no meu sapato um brilho dar, que eu pago, talvez, um trocadinho! Sou bem franco, Mattoso! Só meresce emprego quem tem tino, tem cabeça! A maioria que fique na sargeta, que mendigue, que engraxe meu sapato! Não concorda?}

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204 GLAUCO MATTOSO

-- Tractando de sapatos, não me evado e digo que lhe engraxo, no devido capricho, o borzeguim. Em tudo o mais, discordo de você. Nem todas são cabides e nem todas ser fechadas deviam. O governo continua gastando muito nellas, mas maldictas não podem ser chamadas. O sossego de muitos servidores que eu me queixe faz, claro. Mas não vejo tal estrago nas comptas, affinal. Aqui não banco o typico “perito”, mas alguem que entende de engraxada. Ah, si eu queria um brilho dar, de lingua, nesse big tamanho de sapato, seu calhorda!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DE AFFOGADILHO [0740]

{Você viu, Glauco, o texto que o juiz mandou um advogado retirar dos autos do processo? O gajo tinha junctado, por enganno, o seu contracto de mestre duma escrava sexual no meio da forense papellada! Hem, Glauco, ja pensou? Expancamento, açoite, lambeção de pés, oral serviço no caralho, tudo lido por entre documentos de jargão formal, juridiquez com putaria! Não é maravilhoso, Glauco? Diga!} -- É claro que me deixa assaz feliz a comica noticia. No logar dalgum appenso serio, foi na linha pornô, talvez às pressas, o tal pacto mettido nessa pasta, mas o tal causidico de bobo não tem nada. Fez baita propaganda do que tento eu mesmo divulgar no virtual espaço ou nos meus livros. Ja fodido me vejo, no logar daquella tão servil compromettida. Ah, que faria um cego ao advogado que o castiga?

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206 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO ANDARILHO [0764]

{Te lembras, Glauco, desse video? O gajo inglez, depois de estar horas na rua, commenta que seu tennis bem curtido ficou do bom chulé, segundo o teu criterio, obviamente! Então, que faz o perfido rapaz? Chega na salla na qual seu pae assiste a algum programma e, vindo-lhe por traz, colloca aquelle calçado chulepento no nariz do velho! Sacanagem, hem, Glaucão? Pensaste nisso? Sendo tu papae dum punk, office-boy, charteiro, moto taxista, si o moleque te faz isso? Passivo ficarias? Um exporro darias? Ou em ecstase tal acto iria te deixar? Que me commentas?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Jamais andei assim, roupas não trajo de trampos taes, mas penso bem na tua idéa. Nesse caso... Bem, decido levar na brincadeira, pois, plebeu que fosse tal contexto, no rapaz o riso brotaria. Não se cala um pae deante daquillo, mas reclama sem muita convicção. No tennis delle daria a cafungada, como fiz em tantos outros casos de tesão podolatra. Ah, meu caro, si me cae nas fuças um daquelles! Eu o boto de encontro ao narigão e, num ouriço tão breve, me faria de cachorro sabujo que fareja algum sapato usado de seu dono... Oh, bentas ventas!

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208 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO LHEGUELHÉ [0777]

{Eu tenho, Glauco, um velho camarada do qual ias gostar! Elle não diz “Segura, peão!”, “Força ahi!” nem “Venha depressa!”, mas diz tudo com um “lhé”: “Segura, lhé!”, “Depressa, lhé!” Marrento, não achas? Gostarias de serviço prestar-lhe? Elle diria, ao te ver bem na frente, de joelhos, ao invés de “Chupa, cego!”, “Chupa, lhé!” Paresce mais vil, mais arrogante, não estás commigo nessa crua advaliação?} -- Estou. Do que me excita, não ha nada mais sadico que, vendo-me infeliz, alguem egual costume bruto tenha. Talvez isso ja fora “lheguelhé” e, emfim, se abbreviou. Aqui nem tento linguagens estudar. Mas, sim, submisso eu ia ser ao gajo, que não tem escrupulo nenhum, e nos seus pés lambidas eu daria. Que não cesse você de analysar intenções más nas fallas, que circulam, do povão!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA CAINÇALHA [0778]

{Você, Glauco, de sadomasochismo entende, né verdade? Então lhe peço: confirme esta noticia, si possivel ser pode tal accordo. Uma senhora de escravas sexuaes (foi em Brazilia) exige que as novatas se escravizem às servas veteranas! É verdade, Glaucão? Não lhe paresce degradante demais? Então você, si fosse escravo dum outro dominado, serviria de bode expiatorio, de desforra, e tudo quanto o gajo supportasse seria descomptado no ceguinho? Daria pr’aguentar? Bem, affinal, qualquer escravo pode retirar a venda, mas você não poderá, dahi que fica abbaixo do mais baixo, concorda? Acceitaria, Glauco, ou não?}

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210 GLAUCO MATTOSO

-- É logico! No fundo dum abysmo estou faz tempo, trevas attravesso sabendo o meu logar, o baixo nivel dum cego. Você extranha? Pois agora comparo o bode àquelle que se humilha aos pés do Bolsonaro: quer que pisem na sua cara, as botas lambe e Sade vê nesse capitão. Mas, nesse instante, o proprio Bolsonaro, não tão bravo, aos pés do Trump está, na lage fria, humilde, rastejante. Bem que torra o sacco um puxasacco, mas a face do Trump esboça riso. Eu, excarninho, qualquer bolsonarista acho que tal papel exerce: escravo dum vulgar escravo dum mandão que instrucções dá accerca do serviço. Ora, me encaixo no jogo, mas não sirvo um capitão.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

BOBBY VEE ADÃO [0781]

{Responda-me, Glaucão, si esse subjeito, o Bobby Vee, seria algum veado tentando se passar por namorado frustrado de mulheres! Sempre escuto o gajo se queixando nas canções, pedindo que rivaes mais garanhões não roubem sua gatta, que, no caso de estarem saciados, tenham dó e queiram devolvel-a! Ah, Glauco, não consigo tolerar um typo tão capacho, tão... bobão dum Ricardão! Sim, Bobby de bobão tem o perfil, não acha, Glauco? Diga algo do cara!} -- Não tenho o que dizer. Mas não rejeito hypotheses do typo. O que me enfado de ver é sempre egual ao mesmo dado: rockeiros cornos mansos. Fico puto com isso! Mais eu quero! Trahições explicitas! Chifrados mais cagões, chupando um Ricardão, sendo-lhe vaso, mictorio, ou engraxate, ‘inda que só de bocca, de intenção! Tenho tesão demais nesses triangulos! De cão ser feito ver eu quero o bobalhão! Comtudo, nem siquer ha no Brazil rockeiro algum que ao Bobby se compara...

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212 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO ADVACCALHADO [0788]

{Eu acho engraçadissimo, Glaucão! A cada nova lei que se annuncia tentando cohibir velhas manias, a midia diz que aquelle que incidir na practica da coisa “poderá” ser preso, ser mulctado, ou ser fechado seu poncto de commercio. “Poderá”? Mas como “poderá”? Si é p’ra valer alguma lei, no minimo dirá que o gajo “será” preso, porra! Alguem respeita lei que nasce tão incerta? Ja basta que ser preso, no Brazil, não dá certeza alguma de que fica trancado! Si disserem que elle “pode” pagar pelo seu crime, então fodeu! “Aquelle que assassina alguem...”, calcule você, Glauco, “talvez possa pagar alguns anninhos preso...” Brincadeira!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- Por isso ja disseram que este não é, nunca será, mesmo, uma sadia nação, um “paiz serio”. O Zacharias morreu, mas carequinhas vão surgir usando uma peruca, que será ridicula, a qualquer momento. O dado mais comico o percebo no gagá politico que excappa do dever de comptas nos prestar, mas para ja propõe que todo mundo o dever tem de arcar com mais impostos. Gente experta ha tanta por aqui, que quem é vil paresce maioria, que quem mica só pode raro otario ser. Se fode aquelle que quizer ser europeu em terras brazileiras. Si seu bule tiver café sem palha, seu azar será menor e extranho odor me cheira.

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214 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA SCENTELHA [0800]

Meus livros teem tiragem tão pequena que estão practicamente na gaveta, ineditos, excepto os que na mão restaram dos amigos ou leitores mais velhos do ceguinho visionario. Poemas colligindo vou e vão sahindo, publicados em formato impresso, mas são poucos exemplares que, em breve, raridades ja serão. Será que se eternizam, ou no pó de tudo vão junctar-se, espaciaes? Disseram-me que capta alguma antenna as luzes scintillantes do planeta em toda parte, em toda direcção. Assim, mesmo impedido de ver cores, terei em polychromico summario meus livros digitaes numa amplidão celeste, nas mensagens ja constato. Signaes varios me chegam, estellares, de irmãos meus, marcianos, ou então de Juppiter, Saturno, Urano, ou só daqui mesmo, porem bem mais astraes.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA PALHA [0802]

{Os homens que, de lettras, para ti importam, Glauco, como os classificas? Dum lado, os vejo como o typo ommisso: não move siquer uma palha para mostrar que descontente está, na vida politica da patria brazileira. E, doutro, os vejo como o futil typo: irá, por dá ca aquella palha, ter motivos de discordia para tudo. Nenhum delles, Mattoso, compromisso terá com importantes coisas, nem com nobres interesses. Achas tu que tenho opinião disparatada?} -- Magina! Achaste certo, pois aqui só cuidam do debatte de titicas, ou dizem que não teem nada com isso. De minha parte, nada mais me enfara que tempo jogar fora na perdida disputa de polemicas na feira vaidosa, a virtual. Sim, participo da scena, mas compondo. Meu dever é dar opinião, mas meu escudo e minha firme espada são -- e nisso insisto -- o proprio verso. Com ninguem debatto, que não seja pelo nu e cru verso rhymado,ou fallo nada.

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216 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DO BARULHO [0810]

{Commigo, não, Glaucão! As dores tomo daquelle que estiver sendo offendido! Mexeu com meu amigo, ja mexeu commigo! Ja tambem parto p’ra briga! Repare, Glauco, como o pessoal está sempre de nervos tão à flor da pelle, como parte p’ra aggressão qualquer um por qualquer futil motivo! Então, Glaucão! Você pensa que vou perder alguma chance de brigar por causa dum amigo? Vou à lucta! Às vias vou! O braço desço, ué!} -- Espero que me tome sempre como amigo... Mas lhe digo: si decido brigar por qualquer coisa dessas, eu nem tinha tempo para da barriga cuidar, da cabecinha, do podal prazer, mesmo do oral, do fellador serviço... Sem fallar que tempo não teria para a lyra. Não, não vivo brigando. Mas de fora não estou das drasticas questões, pois dá logar a lyra ao bom combatte. Quem disputa por causas, por amigos briga, até!


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

SOME NIGGERS NEVER DIE... [0832]

{Estou é revoltado, Glauco! Ouvi canções do Johnny Rebel! São datadas, é claro, são do seculo passado, ainda quando os negros sem direitos civis estavam, sendo segregados, mas são canções chocantes pelo tom racista ao nivel maximo, Glaucão! “Alguns negros não morrem nunca, mas do mesmo jeito fedem...” -- diz, directa, a lettra duma dellas! Johnny lucta de forma pamphletaria, como si soldado fosse, em guerra civil, la nos idos da sulista seccessão! Os negros são fedidos, ignorantes, bandidos, incapazes, só servindo de escravos, engraxates, faxineiros, segundo o Johnny Rebel! As canções parescem bello country, bello rock estylo cincoentista, mas a lyra transborda abuso odioso, Glauco, tão frequente nessas epochas! Não fica tambem você chocado? Não se ennoja?}

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218 GLAUCO MATTOSO

-- Sim, claro. Mas exsiste por aqui quem pense dessa forma. Revoltadas as nossas consciencias ficam, dado que temos no Brazil eguaes defeitos e manchas sociaes. Mas os Estados Unidos condemnando vivem, com firmeza assaz hypocrita, a nação, em Africa, logar de tantas más noções dum apartheid, esse que affecta, no fundo, um Occidente inteiro. Chuta o pau dessa barraca alguem que ri dos negros, como o Johnny, mas está o povo americano sem razão si falla do nazismo os raios, antes de ver o proprio rabo. O negro lindo se sente, ja se gaba dos rockeiros que delle derivaram. As nações que escravos mantiveram dão o toque e tentam retractar-se. Quem adhira ao segregacionismo nem irmão meresce ser chamado. Dessa zica não vendo o verso torpe em minha loja.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA BRAGUILHA [0841]

-- Preciso lhe dizer, si você quer saber: minha cegueira não é só problema de visão, mas accarreta innumeros incommodos, tambem. Nem sei si com os outros cegos ha taes dramas. Equilibrio, por exemplo. Depois de tantos annos sem ver nada, paresce que perdendo vou o senso de estar em pé, de estar em terra firme. Me sinto sem appoio, como si suspenso num espaço sem limite em todos os sentidos. É terrivel, sabia? Dá tontura! Nem bengala dá compta da vertigem, porra, meu!

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220 GLAUCO MATTOSO

{Problema seu, Glaucão! Eu, si quizer, saltito qual sacy, nas pernas nó consigo dar! Eu planto (sou athleta) perfeita bananeira! Cê não tem nenhuma segurança quando está andando ou paradão? Chegue num templo subindo de joelhos pela escada! De quattro fique! Pense no que eu penso! Rasteje nos meus pés até subir-me de bocca pela perna p’ra xixi sentir nesta braguilha, a meu convite! Sim, fique engattinhando, no seu nivel rasteiro! Sem siquer sahir da salla, você que em si se perca! Se fodeu!}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO AGGRILHOADO [0921]

{Te sentes victimado, Glauco? Pois então pensa naquelles que, em qualquer nação, regime ou epocha, serão cegados na prisão, suppostamente a fim de doar corneas, mas tambem por uma disciplina commodista por parte do regime: quem não tem visão difficilmente foge, não reage nem recusa quando o novo e rude carcereiro nelle busca alguma diversão impiedosa. Que pensas disso, Glauco? Não te sentes, às vezes, invejoso desses presos? Não queres masochista ser, Mattoso?}

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222 GLAUCO MATTOSO

-- Amigo, nem calculas! Os meus dois globões glaucomatosos nem siquer dariam boas corneas, porem não me falta phantasia nesta mente devassa. Me imagino, sim, refem dum joven carcereiro, que da vista perfeita bem desfructa. A rir, me vem o agente exigir prompta fellação, applica bofetões. Si me commovo por outros, por mim nunca. Me chammusca o joven, me machuca. Por fim goza gostoso, bocca addentro. Dos agentes, aquelle não deixou jamais illesos os cegos. A sonhar, vejo o seu gozo.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DO GATTILHO [0930]

{A coisa muito simples se affigura, Glaucão! Epidemia? Virus novo? Perigo social? É simples, mano! Que imponham um gattilho radical no plano collectivo: quem vier tossindo, perdigotos expirrando, nariz entupidão, mesmo um pigarro, seria promptamente eliminado! Recolhe-se esse gajo, uma lethal substancia se lhe injecta, alguem o crema... E então? Foi um a menos! Não concorda, poeta? Ah, ja sei! Isso lhe paresce cruel e deshumano! Não é mesmo?} -- Paresce, sim. Um caso de tortura será considerado. Nenhum povo subjeita-se com esse deshumano recurso. Só seria natural tal coisa si quem soffra de qualquer doença assim for cego. Figurando estou um sanatorio bem bizarro no qual são confinados como gado os cegos com suspeita da grippal doença. Si excapparem do problema, serão approveitados pela horda nazista como servos. Quem fizesse boquette bem, vivia, mesmo a esmo...

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224 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DOS FILHOS [0931]

{Agora virou moda, Glauco! Um filho não topa a sua mãe, nem com a cara do pae vae! Então pega num porrete e batte na cabeça delles, batte até sahir o cerebro p’ra fora! Depois acha que basta pôr no carro os corpos, queimar tudo... Falta só seguros receber, herança boa no bolso collocar! Si fosse tão tranquillo, tão impune, que seria dos paes da molecada, Glauco? Ouvi fallar que subiu muito o preço desses bastões de beisebol... Será verdade? Não fica mais barato um simples pau sem griffe, popular, de maccarrão?}


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

-- É mesmo. No radinho, sempre pilho um caso desses. Drogas, quem repara verá, por traz estão desse macete usado pelas proles. Ha quem macte papae, mamãe, com faca, muito embora um tiro de revolver (como narro em outros versos plenos de xodó dos paes com o filhinho) não se enjoa ninguem de empregar, nessa situação. É como sempre digo: mais valia a pena ter bassês, não um gury rebelde. Confiança tenho nesses cachorros, mais que em gente. Quem não ha de amar esses anjinhos? Nenhum mau será, só teimosinho. Todos são.

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226 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO DA ENCRUZILHADA [0940]

{Permitta-me indagar, Glauco: será difficil excolher o que compor, ao mesmo tempo que esse dado thema suggere certo molde? Exemplifico: Você ja decidiu qual molde tem melhor effeito quando seu assumpto surgiu, ou vem-lhe tudo duma vez? Paresce-me, Glaucão, ser um dilemma qual genero usarei, quando sou eu o auctor, e não você, poeta amado!} -- Amor é tudo quanto ninguem dá de graça, mas respondo com amor. A gente faz das rhymas, quando rema em aguas agitadas, o mais rico recurso, mas tambem algo que vem depressa, de improviso. Me pergunto, eu mesmo, como posso ser freguez do metro, duma rhyma, sem do thema fugir, nem me perder. Só mesmo o meu demonio sabe: está aqui, do meu lado.


INFINITILHOS EXCOLHIDOS

INFINITILHO DA ARMADILHA [0941]

{Estava combinado, Glauco! Minha esposa me trahiu com um subjeito mais feio que eu! Só tenho uma certeza: foi para que eu divorcio peça! Assim, quem fica com as coisas todas é a puta! Glauco, o gajo ja tramava com ella! Prepararam toda a scena! Mal chego, pego os dois sem roupa, sem vergonha alguma, alli na nossa cama! Não tinha alternativa, Glauco! Como sahir dessa armadilha? Não tem jeito!} -- Sim, claro! Uma mulher bem expertinha. Mas sabe o que eu alli teria feito? O gajo sendo feio, rolla tesa ainda mais terá. Que elle de mim fizesse o que quizesse! Seu chulé faria que eu cheirasse! Bocca escrava seria a minha delle! Minha pena seria rebaixar-me... Bem, ninguem casado topa a coisa. Quem reclama razão tem, claro. O cego é que esse pomo teria de engolir, a sós no leito...

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228 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO TRABALHADO [0944]

{Pergunto-lhe: será que dá trabalho as rhymas espelhar nesse parelho eschema, Glauco? O seu infinitilho paresce-me composto, não a olho, mas muito calculado, sem barulho nem falsas theorias. Si não falho na minha appreciação, nem o bedelho eu metto no seu verso sem ter brilho de critico, percebo que ferrolho não é, para você, nem pedregulho.} -- Notou bem. Na verdade, me attrapalho até mais com estrophes sem espelho que com infinitilhos. Desvencilho meu verso do problema, não me tolho nem perco muito tempo si vasculho as rhymas mais frequentes. Meu caralho consigo punhetar e meu pentelho dá tempo de coçar: eis que me pilho fechando outro poema, que trambolho na certa não será, siquer entulho.


SUMMARIO PEDRA SOBRE PEDRA [0301]..............................9 CHARTILHA DO INFINITILHO [0528]......................10 DARK DINNER [0018]...................................11 BIRD BOX [0019]......................................12 “LOSER” DAS LUZES [0022].............................13 FLATULENTO FLA-FLU [0038]............................14 ENTENDA A LEGENDA! [0044]............................16 AUREA PHASE CRITICA [0122]...........................17 HOSPICIO NO EDIFICIO [0123]..........................19 PÉ NO SACCO E PONCTO FRACCO [0175]...................21 HISTORIA DO ROCK [0316]..............................23 ANECDOTA CARIBENHA [0353]............................26 TERREMOTO PERPETUO [0359]............................28 OPPOSTOS POSTOS [0363]...............................29 CIRANDA QUE DESANDA [0365]...........................31 LERDA EPHEMERDA [0373]...............................33 PIPOCANTES MICROONDAS [0384].........................35 FINAS AFFINIDADES [0389].............................37 SCINTILLANTE TRANSEUNTE [0394].......................39 CAGANDO E MANDANDO [0395]............................40 CHEIRO PASSAGEIRO [0396].............................41 SUPPOSTO CONTRAGOSTO [0400]..........................43 DESDOBRABILIDADE [0401]..............................45 CATARRHO NO SARRO [0402].............................47 SCENA SUBURBANA [0417]...............................49 QUEIJO DE GUEIXA [0421]..............................51 FESTA DE SÃO BARTHOLOMEU [0422]......................52 CERTIFICADO DE CONCLUSÃO [0424]......................54


AFFLICTO MOSQUITO [0426].............................56 AUTOCOMPLACENTE PLACEBO [0427].......................58 SEPTEMBRO AMARELLO [0433]............................59 GASTRICA GASTURA [0434]..............................60 PAZ DE ESPIRITO [0435]...............................62 COMING TO THE CANYON [0436]..........................64 HOW MANY FRIENDS? [0438].............................66 RANHETA GRETA [0439].................................69 THAT’S THE QUESTION [0440]...........................71 CONVERSA EM CONSERVA [0441]..........................72 DESCRIPTA SCENA SAUDITA [0442].......................74 DOPANTE INHALANTE [0445].............................76 THE SINGER NOT THE SONG [0450].......................78 NOBODY ELECTED YOUR FAMILY [0452]....................80 THESE CORROBORADA [0454].............................81 HYPOTHESE SUGGESTIVA [0455] ..........................83 PROTHESE POSSIVEL [0456].............................85 SYNTHESE POETICA [0457]..............................86 EMPESSEGANDO [0458]..................................88 USO ADULTO [0459]....................................89 ABUSO INFANTIL [0460]................................90 EXEMPTÃO DE CORAÇÃO [0461]...........................91 INCORRECTA EDADE PROVECTA [0464].....................92 CHILENA CANTILENA [0466].............................94 DISCURSO SEM CONCURSO [0467].........................96 SOLITARIO IMAGINARIO [0469]..........................97 AUDIO PARA GAUDIO [0470].............................98 PARTES PARCIAES [0472]..............................100 JUDÔ PORNÔ [0473]...................................102 NADA DE PEGADA [0474]...............................104 PHANTASIA QUE ECSTASIA [0475].......................106


CALÇADA DESCALÇA [0477].............................107 GENTE DO CÉU [0481].................................109 PARNASO DE ALEM TUMULO [0483].......................110 CUIDADOS INSPIRADOS [0491]..........................112 OBSCURAS CREATURAS [0492]...........................114 FLATULENTO MOMENTO [0493]...........................115 DESFRUCTE NÃO SE DISCUTE [0495].....................117 BAR DA SOFFRENCIA [0504]............................119 BAR DOS CORNOS [0506]...............................121 SINGULARES PLURALISMOS [0507].......................123 “O CRAVO BEM TEMPERADO” [0508]......................124 PADRES PRECIPITADOS [0509]..........................125 PRESUMPÇÃO DE INNOCENCIA [0510].....................126 AMENO VENENO [0512].................................128 PHAROLEIRO MOTOQUEIRO [0513]........................130 FABULA CABULOSA [0516]..............................131 PODRE DE RICO [0517]................................133 VINHO NA BOTA [0518]................................135 LOVE YOU LIVE [0519]................................136 DESUSO CONTINUO [0521]..............................137 CULTO ECUMENICO [0522]..............................138 HELPING HAND [0525].................................140 DESIMMUNIDADE PARLAMENTAR [0526]....................141 TALK SHOW [0527]....................................143 MONIKA NIPPONICA [0531].............................144 INFINITILHO DA PILHERIA [0532]......................146 INFINITILHO IMPATRULHAVEL [0534]....................147 INFINITILHO DA PASTILHA [0537]......................149 INFINITILHO DA EXCOLHAMBAÇÃO [0539].................151 CUESTA ABAJO [0541].................................153 INFINITILHO DO ESPELHO [0543].......................155


INFINITILHO DA TRILHA [0545]........................157 INFINITILHO INCOMPARTILHAVEL [0547].................159 SCENAS DE PUGILLATO [0549]..........................161 TRABALHADORES DO SEXO [0553]........................163 PORN FOR THE BLIND [0554]...........................164 INFINITILHO EXPALHADO [0557]........................166 INFINITILHO LHANO [0559]............................167 INFINITILHO DA INVEROSIMILHANÇA [0561]..............168 INFINITILHO DO RELHO [0564].........................169 INFINITILHO DA TELHA [0567].........................170 INFINITILHO DE ORELHADA [0569]......................172 INFINITILHO DO PECCADILHO [0581]....................173 INFINITILHO VERMELHO [0583].........................175 INFINITILHO ENVELHESCIDO [0585].....................177 INFINITILHO DA PALHAÇADA [0587].....................179 INFINITILHO BISBILHOTEIRO [0589]....................180 INFINITILHO DA VELHICE [0592].......................181 SOLTURA SEM TORTURA [0594]..........................183 INFINITILHO ABBRUTALHADO [0596].....................184 INFINITILHO GUILHERMINO [0598]......................185 INFINITILHO DA EMPULHAÇÃO [0702]....................186 INFINITILHO EMPORCALHADO [0703].....................187 INFINITILHO DA MULHERADA MARAVILHADA [0707].........188 INFINITILHO DO CARALHO QUE NOS CALHA [0715].........189 FAKE NUS [0717].....................................191 PSYCHOTICO DIAGNOSTICO [0718].......................192 INFINITILHO MOLHADO [0721]..........................193 INFINITILHO DO ADMARRILHO [0722]....................194 INFINITILHO DOS OLHARES [0723]......................195 INFINITILHO COMPARTILHADO [0724]....................197 INFINITILHO DA PENTELHAÇÃO [0725]...................199


REMOTO DEVOTO [0728]................................201 INFINITILHO DO BRILHO [0732]........................203 INFINITILHO DE AFFOGADILHO [0740]...................205 INFINITILHO ANDARILHO [0764]........................206 INFINITILHO LHEGUELHÉ [0777]........................208 INFINITILHO DA CAINÇALHA [0778].....................209 BOBBY VEE ADÃO [0781]...............................211 INFINITILHO ADVACCALHADO [0788].....................212 INFINITILHO DA SCENTELHA [0800].....................214 INFINITILHO DA PALHA [0802].........................215 INFINITILHO DO BARULHO [0810].......................216 SOME NIGGERS NEVER DIE... [0832]....................217 INFINITILHO DA BRAGUILHA [0841].....................219 INFINITILHO AGGRILHOADO [0921]......................221 INFINITILHO DO GATTILHO [0930]......................223 INFINITILHO DOS FILHOS [0931].......................224 INFINITILHO DA ENCRUZILHADA [0940]..................226 INFINITILHO DA ARMADILHA [0941].....................227 INFINITILHO TRABALHADO [0944].......................228


São Paulo Casa de Ferreiro 2020




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