MANIFESTOS E PROTESTOS
Glauco Mattoso
MANIFESTOS E PROTESTOS
São Paulo Casa de Ferreiro 2021
Manifestos e protestos Glauco Mattoso
© Glauco Mattoso, 2021
Revisão Lucio Medeiros
Projeto gráfico Lucio Medeiros
Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros ______________________________________________________________________________
FICHA CATALOGRÁFICA
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Mattoso, Glauco
MANIFESTOS E PROTESTOS/Glauco Mattoso
São Paulo: Casa de Ferreiro, 2021 158p., 21 x 21cm ISBN: 978-85-98271-28-4
1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título. B869.1
NOTA INTRODUCTORIA Desde que fiquei cego, os annos 9 teem sido marcantes na minha producção. Em 1999 comecei a sonnettizar a carreira poetica, num phrenesi que só parou em 2012 porque, antes de completar o sexto milhar, decidi interromper o vicio. Em 2009 comecei a reorthographar toda a obra para voltar à escripta classica que practiquei nos annos septenta, e agora meu diccionario orthographico é trabalho consolidado. Em 2019 comecei a versejar em diversos formatos estrophicos e rhymaticos, sem abrir mão do decasyllabo e da redondilha maior, e dei inicio a nova sequencia catalographica a partir do poema 0001, quando, em meio a madrigaes, odes, rhapsodias, oitavas, sextilhas e terças rhymas, incorporei entre os experimentalismos um typo de poema dialogico em que o eu lyrico replica a uma segunda pessoa poetica. Eventualmente chamado de “infinitilho” e formatado quasi sempre em duas estrophes eguaes, cujos versos, apparentemente brancos, teem rhyma parallelamente reordenada, o “manifesto” foge, por vezes, a tal eschema quando revisita o quartettismo dos sonnettos ou o cruzadismo rhymatico das oitavas. Não é fixo, portanto, o molde do “manifesto”, que pode variar na quantidade de versos ou de estrophes. Uma collecção dos poemas dessa proposta esthetica deu contehudo ao presente volume, cuja thematica, previsivelmente, será polemica e controversa, corroborando a vocação questionadora deste auctor. Em outro volume do mesmo sello, INFINITILHOS EXCOLHIDOS, ja foram compilados os poemas analogos, mas que não levam no titulo a designação de “manifesto”.
MANIFESTOS E PROTESTOS POEMANIFESTO DA ANTIGYMNASTICA PREGUICISTA [2.13] Não basta um “viva e deixe viver”! Tem que haver detalhamento do bordão! Tambem um “coma e deixe comer” vem ao caso, quando o medico diz não! Talvez um “beba e deixe beber” bem se applique, quando alguem é beberrão! Mais vale um “durma e deixe dormir”, sem barulho, quando o insomne tenta em vão! Mas durma quem quizer e beba alguem aquillo que quizer! O comilão que coma, a gosto, quanto lhe convem! Si alguem quizer viver, mesmo que pão lhe falte, seu direito tem! Porem, mactar-se poderá ser sua opção! Emfim, ninguem por outrem vive, nem por outrem come ou obra o cagalhão! Aquillo que é saudavel ao recem formado doutorzinho, ao ancião talvez mais sacrificio imponha! Zen nem todo mundo almeja ser! O Cão nem sempre é o mais malvado alli no Alem! Em vez dum Zeus tyrannico e mandão, Prefere o satanista ser refem de alguem que sim lhe diga e mais razão encontra no peccado, ou mais obtem no vicio, que no medo ou no perdão! Um outro diz a Juppiter amen! Saudavel seja a mente em corpo são, mas quando alguem faz disso um nhenhenhen achando que sahude é malhação,
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10 um trouxa perde nisso algum vintem e ganha algum experto outro tostão! Portanto, um movimento, ou dez, ou cem, ja faço tendo um garfo em minha mão ou mesmo sem talheres, pois susteem dois dedos da comida uma porção! Ao coppo que levanto é que se attem a quota de exercicio à refeição! Não busco num bordel ou num harem o orgasmo que procura meu irmão! Jamais minha semente faz nenem, mas basta algum pezão ao meu tesão! Appenas esta insomnia me mantem poeta e preguicista, sem visão...
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ESQUEERDISTA [2.23] Confesso-me e professo a fé num “esqueerdismo” eschizo, no qual scismo que faço meu progresso: no verso, ja nem peço licença de ser dextro nem “gauche” e tenho um sestro politico a favor do lado “fingidor” que aos cegos eu sequestro. Por mais conservador que possa parescer, masoca é meu prazer de escravo aos pés da dor, mas, como bom actor, sou sadico: gracejo e zombo do desejo. Portanto, liberal me vejo e, como tal, engajo-me sem pejo.
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MANIFESTO PACIFISTA [0068] “Marxismo? Communismo? Eu estou fora!” -fallou-me um anarchista, certa vez. “Governos? Sou é contra!” -- foi, na hora, aquillo que esperei ouvir, talvez. Mas disse que era contra o que vigora nos meios esquerdistas: o burguez deposto pelas armas, a “penhora” dos bens particulares e quem fez a tal “revolução” impondo, agora, poderes “proletarios”, sem porquês. Então eu perguntei: -- Quem corrobora as theses anarchistas de vocês? “Um Gandhi, um cara assim, ninguem mais, ora!” Pensando bem, achei que elle é freguez, tal como eu, dum guru que a gente adora, melhor que um lider russo ou um chinez.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ANTIFASCISTA [0069] “De agora em deante, emposso-me e sustento total intolerancia aos maus, que estão do lado communista! Sou sargento e exijo bons costumes, corpo são e mente equilibrada! Muito attento estou e prompto, contra a subversão!” -- Escuto e me pergunto quando o vento irá mudar de novo neste chão. Ja faz um certo tempo que eu lamento a falta de visão, a escuridão. “Eu sou conservador! Meu lar é bento! Futuro bom terão, nesta nação, meus filhos do terceiro casamento!” -- Terceiro casamento? Mas então, que raio de familia cem por cento christan você defende, babacão?
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MANIFESTO VANGUARDISTA [0073] Queremos inventar! Ja não nos basta appenas debatter essa questão esthetica do verso de Camões, segundo d’OS LUSIADAS! “Que tal? Tu mudas essa tonica na sexta e passas para a quincta!” -- me propunha o luso colleguinha de vanguardas. Tomado de enthusiasmo, diz: “Te affasta, querido Glauco, disso que te estão as bestas a propor! Innovações não bastam! Inventar original mais é que discutires com a besta dum lado ou doutro! Testa a tua alcunha! Não possa alguem pensar que te accovardas!” Mas, quando lhe propuz que iconoclasta nos seja a poesia no tesão thematico, offendeu-se: “Tu propões tractarmos nós do obsceno? Ousas tu, mal inventas, prophanar? Nada me resta sinão repudiar-te! Então com unha e dente te defendo, e te abbastardas?”
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO MASOCHISTA [0074] “Eu quero que me battam, mas não quero sentir dor! Quero o latego na pelle lanhando-me! Porem, sendo sincero, poupando o corpo, sempre que eu appelle, de todo o descomforto! Bem severo desejo o meu senhor! Mandar que eu felle e engula, anxeio que elle mande e mero brinquedo, que eu lhe seja! Que elle zele por minha integridade é o que eu espero, sem penas duras, caso eu me rebelle!” -- Folgado, né? Você se considera escravo, mas vontades tem e falla que “quer” isto ou aquillo! Quem lhe dera que alguem com paciencia, na senzala, comforto tal lhe desse! Eu viro fera si pego um typo desses! Você cala a bocca na porrada! Appanha à vera! Lhe mijo antes que engula a minha galla! Você me teme, claro, mas venera, na bronha, a minha rolla e quer chupal-a!
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16 MANIFESTO REVANCHISTA [0078] Não saio mais de casa, quasi, e não me exponho às intemperies. Mas ruim é minha sorte, às vezes. Hoje, então, foi dose! Ja lhes conto, por tintim. A cantharos chovia, mas razão eu tinha de sahir. Na volta, vim de taxi. Que excappei pensei, pimpão, da chuva. Que illusão! Pobre de mim! Do carro aberta a porta, pé no chão mal ponho e, numa poça, sinto o fim do sonho dum pé secco, tennis são e salvo... Me ensopei até o mindim! Xinguei! Ah, soltei tanto palavrão! Mas deixe estar, pensei. Não fica assim! Me vingo e, da total prohibição do medico a zombar, pappo um quindim!
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO BOLSISTA [0079] “Não só Bolsa Familia, nesta terra, exijo que tenhamos! À direita, tambem por Bolsa Lar a gente berra! A Bolsa de Valores Moraes feita foi para nos valer na sancta guerra! Por Bolsa Educação a gente acceita somente aquella civica, que encerra principios e deveres! Foi eleita a gente pela causa! Ninguem erra e segue impune aqui na nossa seita!” Ouvindo o pappo, penso que me ferra o “novo tempo” e sinto à minha expreita estar alguem que a practicas se afferra mais antidemocraticas. Estreita ficando vae a estrada e o carro emperra. De bolsa em bolsa, um bolso se approveita...
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18 MANIFESTO FETICHISTA [0091] “Me irrita, Glauco, quando alguem só fica fallando em usar droga como opção e esse uso alguem chamar RE-CRE-A-TI-VO! Me irrita, Glauco! Fico EM-PU-TES-CI-DO!” Por que? “Tal termo nada justifica! Eu tenho VI-CIOS, Glauco! Você não tem outros? Todos temos! Eu não vivo cobrando de ninguem, nem me intimido!” Então por que com droga tanto implica? “Implico nada! Alguma todos vão usar! Mas sempre é VI-CIO, porra! Crivo exsiste nas palavras! Ha ruido!” Entendo. Ha “Exacto! Só tem para! A playground!
synonymia bem mais rica. RE-CRE-IA quem razão creançada num festivo A plebe em circo divertido!”
“Mas vicio não é circo! Chupar picca não é forró nem festa do peão! Você não lambe bota? Acha motivo pralguem chamar fetiche de appellido?”
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ALLARMISTA [0092] “Adviso, esse é o primeiro: a coceirinha! Segundo adviso é o proprio pente seu! Cabello que começa a cahir...” Eu gostava desse annuncio em cada linha. Creanças, o imitavamos e minha voz era até maccabra: “Percebeu? Cabello, quando cae, amigo meu, inutil é testar qualquer mezinha!” Qual tonico, qual da droga capillar alguem? Quer elle careca ficará, bem Um leigo Calvicie dirá que é sorte,
nada! A ladainha ja convenceu rico, quer plebeu, depressinha!
intelligente ja adivinha: é biologica! Um atheu ter cabello é qual meu breu, mas o azar com Zeus se allinha.
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20 MANIFESTO QUOTISTA [0093] Tem quota para tudo no momento. Os negros conseguiram achar uma nas universidades. A contento conseguem outra quando vaga arrhuma alguem num gabinete. Dez por cento de gays, na sociedade, teem alguma funcção remunerada. Mais augmento consegue de salario quem não fuma, ainda mais mulher si for. Detento que varias engravida, caso assuma um cargo na prisão, engulo e aguento mais essa. Cadeirante, até, vae numa qualquer repartição ter seu sustento. O cego, não! Nem quando elle perfuma seu cu, na Academia tem assento! Calcule então aquelle que se estruma!
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CATASTROPHISTA [0094] “Magina, Glauco! Nunca a gente illesa está! Calcule só si, de repente, se rompe essa velhissima represa que todos attestavam resistente manter-se, e somos pegos de surpresa! Caralho! Ja pensou? Vae morrer gente!” -- Talvez. Mas cê concorda que quem fez a barragem não foi muito intelligente? Bastava poupar menos a despesa e nada construir alli tão rente! Sahia mais barato pruma empresa tão grande enxergar lucro mais à frente! “Bobagem! Como podem ter certeza? É foda! Qualquer coisa que se tente errado dá! Você põe sobre a mesa um monte de papeis, inutilmente! Si não for a represa, vae talvez a mor chuva provocar alguma enchente!”
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22 MANIFESTO HYGIENISTA [0097] “Boneca cadeirante? Que mau gosto! Não falta, ja, mais nada fabricar! Tambem fazem boneca com o rosto marcado? Deformado? Com esgar? Ainda mais fabricam? Eu disposto não posso me sentir a perguntar que typo de alleijado, de supposto monstrengo, ou de xiphopago, logar terá nesse indecente e descomposto elencho de brinquedo hospitalar!” Ouvindo quem diz isso, meu desgosto augmenta. Sou levado a constatar que é facil simular um mau encosto cegando uma normal: é só furar seu olho, ou arrancar e, nem reposto, voltava a bonequinha a me enxergar...
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ARMAMENTISTA ou ODE AO KAKI [0103] Dois caras que eu não deixo entrar em casa de jeito nenhum: Bispo e Capitão! Visita assim não vejo que me appraza! Tambem Rainha, Boulos, esses não pisavam nunca aqui! Sou eu quem vaza, si entrassem! Aliaz, tal invasão é o jeito que costumam usar! Asa nenhuma arrasto a “lider” desses! Vão à merda, vocês todos! Sou da paz, a pistola, de accepção, tem outra opção, mas caso alguem entrasse, que não casa commigo, até dou tiro de canhão, si posso um armamento ter que arrasa intrusos oppressores no meu chão! Aqui só vem quem amo, até si attraza, só pisa quem me pisa -- permissão que extendo a Sansão, quando vem de Gaza, Tiresias, ou Homero: o meu povão!
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24 MANIFESTO EXPANSIONISTA [0108] Costuma ser assim. Consensual nem sempre é todo murro ou todo tapa no jogo sadomaso. Mas é tal o clima, que o masoca não excappa de achar menos assucar ou mais sal num doce ou num salgado. Si não pappa por bem, pappa forçado. Será qual a graça, si um escravo a bocca tapa àquillo que não curte? Serviçal treinado é o que expandiu limites, rapa o pratto e não discute. Desegual é toda relação, em qualquer mappa, de duas das pessoas que, moral nenhuma tendo como casta cappa, assumem que normal é ser “do mal” e trocam seus desejos. Tem etapa seguinte este episodio. Natural que, appós ser abusado, quem garapa tomou na marra a acceite, no final, ja grato a alguem que os brios lhe solapa.
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO LAVAJACTISTA [0112] Vi tanta gente em briga por motivo louvavel quanto frivolo. Porem não brigo contra alguem com quem eu privo. De gente sei que briga porque tem um time, egreja, sigla, qualquer crivo de cores differentes, mas, si vem Natal, niver ou Paschoa, ja festivo se torna o familiar encontro, ou zen. Então aqui pergunto: Si me exquivo de briga por esporte ou por amen a um deus, por que caralho serei vivo e ferreo defensor, peor, refem dum “lider”, dum politico? Ora, activo nem cego militante não sou, nem de Baccho, nem de Venus! Afflictivo alguem acha que fico, acha que sem cabellos ficarei por um nocivo caudilho? Ora, tomar vão no cu, bem no meio! Que se foda quem passivo for duma suspeição que se sustem!
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26 MANIFESTO COMMODISTA [0114] “Mas, Glauco, tomar banho dá trabalho demais! A mesma coisa todo dia! Você passa sabão, lava caralho, virilha, sacco, umbigo, rabo, enfia o dedo no cuzinho, um acto falho commette, exfrega a rolla, a phantasia da bronha aguenta firme, e tanto malho p’ra nada! Ao fim do dia, a porcaria do cheiro de sovaco que eu expalho voltou com tudo! Glauco, que agonia!” Reflicto que elle pode estar, no galho, macaco sendo, ao passo que em porfia ainda mais inutil me embaralho: fazer a barba! Ahi, sim, me allivia deixal-a crescer! Antes, um attalho tentei: barbeador. Porem, a via mais practica será, como expantalho, ficar mesmo barbudo! Essa mania diaria de exfollar-me, eu advaccalho sem culpa! Mas sem banho... não daria!
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO OPPORTUNISTA [0115] Fiquei sabendo disso por um crente... Pastores evangelicos, agora, adoptam estrategia convincente, alem da fé que, em dizimos, se explora: “Exsiste video, Glauco! Aquella gente que passa pelo palco onde a pastora está, lhe beija o pé! Passam em frente daquelle pé, da sua superiora, ao nivel duma bocca reverente!” Ouvindo, reflecti que, si a senhora pastora não se encontra alli presente, algum pastor está. Naquella hora, eu chego e pago o dizimo! O que em mente terei vocês ja sabem! Elle adora ver homem ou mulher, obediente, curvando-se e beijando o que, de fora dum simples chinellinho, fica rente aos labios: seus artelhos! Gente chora, commove-se, exsultante! Eu, promptamente, em vez da reverencia de quem ora, lambendo vou e o cara, claro, sente a minha devoção! Crente sou, ora!
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MANIFESTO POLYTHEISTA [0116] “Vaccina contra a grippe? Eu, hem? Qual nada! Addeanta vaccinar? Virus ha tanto, mudando de anno em anno! A gente, a cada hinverno, pega um novo! Em cada cantho ha virus differente! Vaccinada, a gente nem siquer, eu lhe garanto, está contra o mais novo immunizada! Só contra o virus velho! Mas, emquanto a gente se vaccina, ja grippada está, com mais viroses! Eu me expanto com tanta incompetencia! A renomada sciencia menos pode do que o sancto do qual eu sou devoto! Bem rezada, eu rezo a minha prece e ja levanto o astral! Hem, Glauco? Fallo coisa errada?” Respondo que tambem eu não me encanto com essa cantoria mais furada que um olho de Camões, mas digo, quanto ao sancto, que prefiro ser, na estrada da vida, protegido pelo manto de Baccho, de Cupido, ou duma fada...
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO TRABALHISTA [0118] Ja quasi, de entrevista, não acceito convites, mas, abrindo uma excepção, gravei para a TV. Sempre foi feito assim: elles preenchem, mesmo à mão, um termo que assignamos. Eu suspeito que seja a necessaria permissão de usar a nossa imagem. O mau jeito se deu quando exquesceram a questão e, estando eu ja de volta, eis que a respeito contactam-me. Depois do trabalhão num leva-e-traz, está meu imperfeito e rustico rabisco, um jamegão, apposto ao documento. Me subjeito ao tosco protocollo, mas, turrão, indago: Que proposito ou proveito tem isso para alguem ja sem visão? Podiam dispensar-me, si direito de imagem eu não tenho! Claro ou não?
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30 MANIFESTO RELATIVISTA [0126] Na hora de dormir, a minha thia fervia alguma coisa a mais no cha. Si quero despertar, a luz do dia não pode me livrar da noite má. Não ha, como mamãe sempre dizia, bebê que nunca cague na babá. Quem come, nos botecos, porcaria cocô muito mais molle cagará. Vovó dizia: “A gente deveria comer muita castanha do Pará!” Mas come boia fria quem não pia tudinho em delação no Paraná. Alguem que na politica confia somente em trahidores votará. Ninguem que com hypocritas se allia dirá que um senador está gagá. Censura, por aqui, não prohibia, em vez de “camarada”, “camará”. Mas como prohibir pornographia, si fosse “p’ra caralho”... “pacará”? Quem pecha de incorrecto repudia não falla dum “mulato sarará”. Refere-se, porem, a quem sacia seu vicio como alguem que ao Cão irá.
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MANIFESTOS E PROTESTOS Sahuda cortezmente e diz “Bom dia!” quem pode se expressar com um “Olá!” Mas, entre certos cultos, ficaria melhor para saudar um “Saravá!” Não peçam que a qualquer enfermaria, nem para visitar alguem, eu va! Enganna-se quem, duma Academia fallando, diz que, emfim, me viu por la! Tem gente que, sem sorte, da magia desfaz, dum talisman, dum patuá. Eu tenho um amuleto: putaria. Não salva, mas mais damno não fará. Ja li muito gibi quando ‘inda lia. Akira lê mais livro que mangá. Aquelle que de mim biographia fizer, como pornô me pinctará. Guerreiros, nos momentos de euphoria, divertem-se jogando caxangá. Escravos ja perderam a mania e nunca mais um delles jogará. Um dia, quem na moda se vestia usou seu chapeuzinho Panamá. Mas hoje nem bonné tem serventia. Topete toda gente exhibirá. Melhor é ter choffer que ter um guia. Peor é ter patrão que ter crachat. Mais vale ser “modello” que “vadia”. Quem hoje me derruba, cahirá.
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32 Quem soffre duma arachnophobia não pode viajar a BH. Quem teme escorpiões depararia com tantos como nunca se verá! Carnivoro jamais se delicia com nabo, rhabanete, nem cará. Vegano vi, comtudo, uma fatia comer de mortadella, às vezes, tá? O velho pescador, na pescaria, se serve de canniço e samburá. Quem pega peixe em rio podre enfia no sacco o que, ja morto, pegará. Faminto, uma panella achei vazia. Pipoca não achei, só piruá. De gente sei que, farta, se enfastia de tanto comer verme, içá, gambá... Cocô por chocolate passaria. Urina ser bem pode guaraná. No sadomasochismo, de bacia si feita for a bocca, se encherá. Café, para excitar-me, é o que eu bebia e, para me accalmar, maracujá. De rubro uma bandeira coloria, mas hoje nem siquer sei si é grenat. Achei, ja, em vez, no Recheio de no frango,
vinagrette na Bahia, acaragé, do vatapá! maçan não caberia ou alho em bollo de fubá!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS Na secca do sertão, não haveria cadaver que não coma um carcará. Si gosta de buchada, todavia, o povo, ora, não façam bafafá! Quem pensa numa facil utopia creou seu paraiso ou Shangri-La. Ninguem de seu paiz se ausentaria sobrasse pheijãozinho com jabá. Diria quem conhesce economia que nada muito caro nem está. Porem, quem caviar hontem comia agora nem mais come mungunzá. Ganhar salario minimo queria quem ganha commissão de marajah? Querer vae quem só teve mordomia perder essa mammata? Kakaká! Um sitio, a mim, nenhuma companhia jamais, em Atibaya, doará. Si, um dia, commandar esta anarchia, apê nunca terei no Guarujá. Ankara capital é da Turquia, emquanto é, da Colombia, Bogotá. Mas para que saber geographia si um cego no seu mundo morrerá? Alguns encontrarão philosophia nas phrases do marquez de Maricá. Maior curiosidade poderia causar o magistral FEBEAPÁ.
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34 Judeus, para affectar sabedoria, estudam o Talmud ou a Torah. Catholicos teem muita liturgia, que pouco, la no inferno, adjudará. O povo mussulmano, na folia, tolera as brincadeiras com Allah. Mas pede ao Padre Ciço quem expia peccados, p’ra chover no Ceará. Segundo diz Jesus, theologia é para a grana a Cesar darmos ja. De accordo com Bilac, a poesia jamais para as paixões molde achará. Não creio que, na midia, a maioria se importe com tamanho blablablá. Certeza tenho: falta não fazia a logica na lyrica dadá. Que possa algum poeta allegoria fazer! Um grande cedro ou baobab plantei, pois o poder da prophecia meu verso obra menor não creará. No Velho Testamento, antipathia dá para ter até por Jehovah. Ouvindo Rolling Stones, sympathia até por Satanaz para ter dá. Satan, de quem practica bruxaria, exige sacrificio no Sabbath. Mas beija cus sem nojo quem phobia não tem do satanismo, p’ra nós ca!
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MANIFESTOS E PROTESTOS Na mente dum atheu, questão não ia fazer ninguem de Exu nem de Oxalá. Quem fé põe no zumbi, da cova fria nem perto chega! À noite, que dirá! De lobo quem, cagão, se refugia affirma ser crendice o boytatá. Quem teme lobishomens diz que mia la fora mero gatto, um angorá. Na compta do Sacy, mythologia razão não dá si perna a menos ha. Nos versos do Mattoso, phantasia só vale si de sobra pés terá. Preferem uns caminha bem macia. Uns dormem na poltrona, no sofá. O cego vive insomne, em agonia que o tumulo, somente, encerrará. Dispenso o funeral. Mais me cabia alguem que celebrasse um “Ulalá!” Não quero, juncto à tumba, a prece pia alli no cemeterio do Arassá.
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36 MANIFESTO PESSIMISTA [0127] “Si, como está, a bagaça continua, só tende a peorar, Glauco! Magina! Trez mezes se passaram e, na rua, ninguem mais vi sahindo, nem na exquina as rodas se formando! Quem actua agora? Quem reclama? Quem opina? Não vejo quem tarefas attribua, quem nossos passos proximos defina!” Opino que elle proprio tem a sua melhor chance de estar com a buzina na bocca, de dizer, bem nua e crua, aos outros a verdade! Catilina se torne! Solte a lingua! Restitua o rhumo das idéas! Cumpra a signa! “Não, Glauco! Nem pensar! Eu sou de lua! Não tenho a coherencia, a disciplina que a coisa necessita! Quem possua talento, vocação, lingua ferina, é disso que caresce a gente! A pua quem senta é você, Glauco! Gazolina você pode jogar! Hem? Contribua!” Tá louco? Nunca! Assim é que termina o pappo, pois faltou quem substitua o lider dessa merda! Que latrina!
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO OPTIMISTA [0128] “Podia peorar, mas não peora, não acha, Glauco? Tudo nos indica que a coisa está melhor, um pouco, agora! Lhe juro, eu appostava que essa zica iria perdurar! Quem assessora o cara a situação sempre emburrica! Mas, mesmo assim, a gente, que está fora daquella merda toda, nem futrica fomenta mais, tal como foi outrora! Você não acha, Glauco? Onde está a dica?” Replico que não acho, não senhora, que a coisa melhorou! Esta titica (dizer que é merda, não, pois ella cora) ficou é mais fedida! Que é mais picca no nosso cu, nem digo, pois, embora esteja puto, quero que essa rica conversa tenha nivel! Ella chora, comtudo, se lamenta. A coisa fica gozada quando a propria desaffora: “Caralho, Glauco! Porra! Você mica o pappo! Pessimismo quem adora não sou eu! Si esse pappo a gente estica, fodeu, meu! Com licença, ou perco a hora!”
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MANIFESTO GOLPISTA [0131] “Você não accredita, Glauco, nessa hypothese? Eu, sim, nella apposto e creio, pois da conspiração a theoria funcciona neste caso! O que interessa a muitos generaes é ver, no meio do prazo de mandato, o que viria...” Indago o que viria. Alguma peça egual à que enscenaram quando o freio puxaram do progresso que occorria? Fariam tudo como na pregressa comedia, quando, ao franco tiroteio, um pacto preferiram, na coxia? “Não, Glauco! O que rollou foi lento à bessa! Agora accostumaram-se! Interveiu o vice, e as calças logo o cara arria! Vae tudo transcorrer bem mais depressa! Ao proximo o Congresso, que está cheio de cabos, corpo duro nem faria!” Preoccupo-me. Esta terra ja attravessa tamanha crise, e cada vez mais feio o quadro ser promette todo dia! Será que esse golpismo nunca cessa? Será que nosso velho devaneio utopico resiste? Quem confia?
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CARREIRISTA [0133] Podologo queria tambem eu ser, desses que trabalham para algum dos nossos grandes clubes! De europeu nenhum faço questão, mas talvez um paulista ou carioca... Me escreveu alguem que o Botafogo um incommum boato diffundiu! Elle cedeu o Bruno, seu podologo (Que bum de memes provocou!), ao colyseu da patria: a selecção! Mas esse seu prestigio nem almejo! Quero é num lotado vestiario um apogeu curtir: pezões que exhalam o fartum do officio, vocação que Zeus me deu! Que gloria! Aos pés dum craque ser, no zum, flagrado pelas cameras! Hem, meu?
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40 MANIFESTO CONTINUISTA [0135] Parar accreditei eu que podia, diversas vezes. Nunca, porem, pude. Sonnettos, foram muitos, mas, um dia, cansei de sonnettar. Alguem se illude achando que eu, com isso, pararia tal como si dum vicio que a sahude destrua, a gente excappe, em alforria? Só fica nesse molde quem não mude! Alem do mais, a midia nos premia com tanto besteirol de magnitude local e nacional, até diria eu internacional, que juventude poetica recobro para, via de regra em decasyllabo, ser rude e rispido, ou, por meio de ironia, costumes castigar, caso me adjude a mystica presença de quem ia morrendo, mas não morre, pois tem grude na terra a lyra chula de quem chia.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO TERRORISTA [0136] Você vae mal nas aulas? Ja não tem mãe viva? Pae por perto? Avós que deem mezada, nem que seja algum vintem? Quem mais? A namorada ja tambem perdeu? Aquelle emprego que mais vem tentando conseguir arrhuma alguem na sua frente? Entende mais ninguem a crise em que você vive, porem? É facil resolver! Attente bem! Nas redes, você encontra um armazem de canos e metrancas! Entre, sem receio, no collegio! Macte uns cem, duzentos, quantos possa! De refem ja faça a directora! Muito zen mantenha-se, sorrindo! Si intervem um tira, attire nelle, e nhenhenhem... Sacou? Talvez você consiga, assim, um pouco de attenção, por mais chinfrim que seja a pa de corpos no jardim, no pateo, pelas sallas, onde, emfim, tiver você curtido o seu festim! Não use de festim ballas e sim dumdum, calibre grosso! Por tintim vasculhe cada salla! Va por mim!
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42 Depois que fez serviço bem ruim, você, cuja cabeça de puddim pensou em tudo, seja de outro teen exemplo! Como o caso que ja vim mostrando, bem no craneo, não no rim, attire! Caso seja espadachim, practique harakiri! Que bello fim, seu Zé Ninguem, Migué, Mané, Joaquim!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PHRASISTA [0138] Fallar que “En politique, plus ça change, plus c’est la même chose” significa, na practica, admittir que, si em francez, as phrases bem se applicam ao Brazil. De Gaulle, por signal, teria dicto que este “n’est pas un pays sérieux”. Disseram que não disse. Pouco importa, pois quanto mais polemica a auctoria, maior a propriedade de expressão. Suppor que, quanto menos alguem manje francez, mais accredita numa picca que mude, emquanto os cus, por sua vez, os mesmos permanesçam, é servil conceito que se faça do cabrito que, bom si for, não berra. Acha você que a phrase que alguem cite em lingua morta será mais verdadeira? Qual seria aquella mais plausivel à nação? Digamos, “Nihil novi...”, mas arranje quem queira, para ver como é que fica, deixal-a como está, bom portuguez que faça da politica subtil noção de como pode ser bonito dos povos um proposito, que dê um fio de esperança! Não comforta ninguem saber que, em summa, a poesia capaz é de brincar com a questão.
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44 MANIFESTO POLEMISTA [0139] “Eu quero provocar! Quero causar! Você vae ver só, Glauco! Vou fazer furor! Entre evangelicos, direi que adoro o satanismo! Num debatte petista, affirmarei que sou do Moro discipulo, tambem do general Mourão, do Bolsonaro, até! Mas, quando houver bozonazistas no recincto, declaro-me esquerdista irreductivel! E ahi, Glauco? Não acha que é brilhante a tactica que adopto connectado?” -- Brilhante? Si você não der azar, no minimo ridiculo vou ter que achar esse seu methodo! Ser gay você pode affirmar caso se tracte de evento neonazi! Caso o foro de negros seja, affirme que é total adepto do racismo! Onde algum bando chegar do PCC, você diz: “Sinto fallar, mas o Marcolla não tem nivel de lider!” Olavistas ja perante, lacrando “Lula livre!”, assuma um lado!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS “Mas, Glauco, quer dizer que um militar talvez possa sentir um desprazer com isso ou invocar alguma lei mais rigida, que doutros tempos date? Petistas, que acham falta de decoro dirão, si senador eu for? Que mal eu faço por escripto quando mando mensagens pela rede? Eu então minto?” -- Só resta lamentar. Fiz o possivel, mas elle se compara, petulante, ao Francis, ao Ivan Lessa, coitado...
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46 MANIFESTO REFORMISTA [0142] “Está tudo fodido, Glauco! Ousar a gente necessita para pôr no azul as nossas comptas novamente! Reformas radicaes a gente vae fazer na vida publica, ah, si vamos! Fiscal, eleitoral, da previdencia, bancaria, trabalhista, patronal... A deixa approveitando, Glauco, nós queremos nos costumes ver limite! Na China ter irmão é prohibido! Aqui prohibiremos o cachorro, assim a “bassear” ninguem mais leva basset nenhum! Livramos a calçada de tanto cocô! Chega, nos apês, daquella barulheira! Não concorda? Tal como foi alli, cães nunca mais!” -- Espere ahi! Votar quem vae? No lar dos proprios congressistas labrador ou cocker ha, não acha? Alem de quente, o thema não tem nada a ver e sae da pauta nacional e dos reclamos antigos do povão, que tem urgencia de eschola, de trabalho, coisa e tal... Pensou nisso? Na certa, logo appós cachorros prohibir, alguem palpite dará na nossa cama! Decidido será que ninguem pode, nem de Zorro, pôr mascara! De Adão, então, qual Eva irá phantasiar-se! Que mais cada um deixa de fazer? Que é que vocês esperam que resulte si essa chorda esticam? Diga! Alvissaras geraes?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO OPPOSICIONISTA [0143] “Reformas? Que reformas? Appoiar não vamos essa porra, não, senhor! Quem disse que reformas são urgente medida a ser tomada? A gente cae é numa bella merda, convenhamos! Aqui p’ra nós, Glaucão, a paciencia perdi com communistas! Elles mal se elegem, e ja querem grossa voz ter para assediar a nossa elite, impor hegemonia do partido de esquerda! Você sabe que eu não morro de amores por tal causa! Quem eleva, no pappo, o tom de egual pataccoada, eu corto logo, Glauco! Sou cortez, mas, quando tal assumpto alguem abborda, me irrito! Que se fodam taes bossaes!” -- Refere-se você, talvez, ao mar de lama na politica, ao suppor que é só qualquer “communa” delinquente? Que tudo continue quer? Se trae você quando pretende ser dos amos amigo, si de escravos tem sciencia, ainda, no paiz! Ao capital accesso mal você tem! Seus avós são pobres immigrantes! Não se irrite, meu caro, mas fazer qualquer sentido não pode seu discurso! Vem do morro a sua parentela! Não! Qual é? Va! Que tal nos entendermos? Desfructada melhor seria a noite si eu, em vez de estar argumentando, meu melhor, da oral funcção, lhe faço, em horas taes!
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48 MANIFESTO COITADISTA [0146] {Não, Glauco! Você nunca ouviu fallar na “logica do assalto”? Quem assalta é “victima”, no caso! Um assaltado “auctor” é desse crime! Culpa tem o proprio capital! Sim! Quem mandou alguem ter algo de util que o “ladrão”, dizer quero, o “coitado” necessita? Não fosse o consumismo, talvez nem daquillo o coitadinho precisasse! Mas ja que precisou, tem o direito de, claro, appropriar-se, Glauco! Vê você como é bem logico? O subjeito só rouba si não tinha aquillo, saca? Quem tinha não devia ter, é claro! Entende como é logico o clichê?} -- Entendo. Quem não tenha, ainda, um lar a casa alheia invade! Só lhe falta a cama? Numa loja, o resultado do assalto foi a cama! Ja ninguem tem duvida: boceta, si faltou, compensa-se estuprando! Pode, então, quem “logica” adventou dizer que a dicta funcciona caso sua casa alguem occupe e seu cuzinho coma! A classe se inverte facilmente! Admanhan, feito bem faz quem foi roubado em seu apê e rouba do vizinho! O mais perfeito joguinho de “justiça”! Algum babaca crê nisso? Caso creia, me declaro “carente” e requisito o seu bassê...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CONSUMISTA [0147] Num desses “dissonetos” que Camões jamais assignaria, pesquisando estive, nas devidas proporções, as compras, do importado ao contrabando. -- Mas como? Um cellular, você não tem? Não tem chartão de credito, tambem? Nem camera, nem banda larga, nem um plano de sahude? É um Zé Ninguem! -- Não vê que a informação se padroniza? Ainda nem comprou computador? Não posso accreditar! Você precisa plugar, se connectar, a par se pôr! -- Pamonhas são “caseiras”, ouça: “Venha provar, minha senhora, é uma delicia!” É a chance à sua porta! Desperdice-a e alguem, no seu logar, lhe ganha a senha! -- Se priva quem tostões economiza! Jamais se exquesça, quando você for à feira, da banana! Uma pesquisa revela que ella cura e tira a dor! Fallando em cura, nova versão vem da pillula do cancer, do recem lançado xaropinho do nenen, do “cha da meia-noite” ao “pó do Alem”!
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50 Está na lei de Murphy: a gente faz mais compras do que pode consumir. Banana, por exemplo: o preço assaz barato não nos deixa resistir. Si vemos “em offerta” um elixir do somno, ou capillar, caro, aliaz, achamos que é vantagem. Si subir o preço, ninguem dorme mais em paz. Então sobra a banana, que appodresce ao lado de laranjas ou mammões. Cabello não terá queda que cesse por causa de elixires ou poções. O somno, como a merda, só vem quando quizer, não quando eu quero. Taes licções jamais apprenderei e, agora, mando à puta que pariu as promoções!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PARLAMENTARISTA [0150] “Entenda, Glauco: nossa solução será parlamentar! O presidente governa, só que não! Um chanceller modera monocraticos anxeios de cada mandatario! Assim, ninguem se torna dictador e, si preciso, depõe-se o chanceller! Não é perfeito?” -- Perfeito? Bem, depende. Algum mandão querer vae implantar a condizente versão à brazileira, si quizer: a tal “democradura”! Estamos cheios de formulas do typo! Só me vem à mente, decidido ou indeciso, algum “mytho” ou tucano... Não tem jeito!
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52 MANIFESTO AMBIENTALISTA [0151] “Glaucão, meu caro, sabe aquella aranha gigante? Sim, aquella que se chama Golias, ella mesma! Sim, bem sei do medo que lhe inspira a tal bichana! Pudera! Até maior do que um prattão daquelles rasos! Glauco, a cabelluda ninguem pode mactar! Sabe por que?” -- Caralho! Você sabe que tamanha bichana me intimida! Até na cama eu temo que se esconda! Ja fallei, não toque nesse thema! Não me enganna você, que é natureba! A gente não a macta porque exsiste lei que escuda os bichos de exterminio, ja se vê! “Que nada, Glauco! Occorre que façanha tal nunca alguem tentou! Nenhum IBAMA prohibe, mas ninguem, com ou sem lei, nem chega perto della! Só se damna quem della se approxima! Eis a razão de estar proliferando! Quem estuda diz: -- Picca mesmo, adviso eu a você!” -- Ja chega! Quer você ver si me appanha tremendo de pavor? Você reclama si eu xingo, mas me chama até de gay por causa da phobia! Mais bacchana seria si, por causa do tesão por pés, gay me chamasse! Não sou Buddha, não fico zen, sozinho aqui no apê!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO IMMEDIATISTA [0159] “Caracas! Não pensei que era p’ra ja! O proprio presidente precipita as coisas! O thermometro, que está mais quente, deixa a scena bem bonita praquelles que preveem o que virá!” -- E então, o que virá? Por que será que comptam com a crise? Ninguem cita, mas acho que celebram, no sabbath, um rapido desfecho. Quem evita o “impeachment”? Moro? Maya? Mourão? Qua! “Quem sabe, Glauco, o proprio gajo tá pedindo p’ra sahir? Assim, incita os animos, depois desculpa dá de terem sabotado essa bemdicta politica à direita... Ah! Que ella va...” -- Exacto. O que eu apposto é que estará na moita alguem que “mytha” e que “tweeta” discreto: o general. Que Jehovah, Allah, Zeus, nos protejam! Accredita em bruxas quem assiste do sofá?
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MANIFESTO SIMPLISTA [0160] “Estão fazendo, Glauco, um bicho disso! De septe cabecinhas, isso sim! As coisas são mais faceis! É postiço todo esse fallatorio, para mim!” -- Onde é que elles complicam? Acho ommisso quem pensa que perderam o latim por causa duma palha. Desserviço fará quem diz que nada é tão ruim... “Magina, Glauco! O frege eu não attiço! Appenas reconhesço que o plimplim das redes faz sentido! Compromisso só temos com Platão! Simples assim!” -- Platão? Que tal com Socrates? Chinfrim demais seria aquelle encontradiço tom cynico dum Orwell? Para a ABIN seria coppo d’agua chover nisso? “É simples, Glauco! A gente põe um fim ja nessa confusão si no feitiço não cae desses politicos! Affim não sou de trez poderes, nem submisso!” -- Porem você bem sabe que não vim ao mundo para achar que este enfermiço paiz quartel se torne! Que capim comeu o seu guru? Só vejo enguiço!
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO LEGALISTA [0165] “Senhoras e senhores! Desaccapto não faço às leis da patria! Respeitado por todos, o Congresso fará pacto geral! Legalidade é nosso brado! Com golpe nenhum posso ser cordato! Os meus concidadãos eu persuado a, livres, me appoiar! Sei que sou chato si insisto, mas... Ei, calma! Mais cuidado! Mal posso me mexer! Quasi me macto! Esperem! Não empurrem! Do meu lado eu quero segurança! Não! Que ingrato, você, né? Não! Soccorro! Um advogado eu peço, por favor! Sahir barato não vae! Vou me vingar! Sou deputado!” -- Recolham-no ao xadrez! Com esse ratto perdemos mesmo a calma! Não me evado nem medo tenho delle! Em lavajacto, appenas, eu confio! Dou recado bem rapido a vocês: não tenho tacto com este regimento! Mais aggrado faz outro regimento ao meu sensato juizo: o militar! Sou commandado por gente de valor! Não por um acto qualquer, legislativo! O resultado das urnas pouco importa! Facto é facto! Mandou o General, está mandado! Ninguem que foi votado tem mandato mais neste meu paiz! Caso encerrado!
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MANIFESTO CAPITALISTA [0166] Oi, gente! Estou aqui, toda lindinha, feliz e loira, para lhes contar que, graças a Jesus, ja fiz a minha fortuna! Sim, milhões! Qualquer milhar eu, linda, multiplico! Nessa linha, embolso eu um milhão! Tal patamar attinjo rapidinho! Ahá! Adivinha! Pyramides? Acções? Jogos de azar? Youtube? Nada disso! Eu, expertinha que sou, virei pastora! Vem um mar de gente no meu templo! Cincoentinha eu cobro de quem chega p’ra beijar meu pé! Sim, fazem fila! Quem caminha na trilha do Senhor, pode esperar! Terá seu pé beijado! Uma sobrinha que tenho, a bispa Zilda, a caminhar assim eu ensignei! Mas, coitadinha, junctou-se, na milicia, com Oscar, aquelle cafetão, um cappetinha que, orando quando rouba um cellular, dá graças pela sorte que expezinha! Euzinha aqui, não quero me levar por essa temptação, pois quem se appinha aqui na minha porta quer pagar, de boa, pela simples bitoquinha! Prefiro que me beijem, em logar de darem queixa! Assim, sem ser mesquinha, eu prego! E o Glauco, uns versos vae me dar?
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO REVISIONISTA [0172] {Não fica bem chamar de “golpe” aquillo! Que pensa você disso, Glauco? Aquella mudança de governo poderia chamar-se “movimento”? “Inconfidencia”? “Motim”? “Revolução”? “Scisão”? “Levante”? Talvez uma “campanha”, Glauco! Nunca um “golpe”, não concorda? Que me diz?} -- Não acho que pacifico ou tranquillo esteja o quiproquó. Nessa querella não quero me metter. Na poesia tentaram tambem isso. Paciencia não tenho com “vanguardas”. Quem garante que rhyma se “revoga”? Alguem que trunca o metro querer pode ser juiz? Na prosa, a mesma coisa. Algum estylo a gente “moderniza”. Mas revela burrice quem, sem meio ou termo, cria enredos “surreaes”. Algum nonsense a ficção tem, caso a caso. Mas constante tornou-se o que, sem nexo, uma espelunca fará da academia nos Brazis. Agora, na politica, vacillo qualquer nos termos cala a voz da cella, da valla, do terror? A tyrannia mudar pode de nome, porem vence a noção de dictadura, doradvante. Chamar de “aguia” ou “condor” não faz, da adunca megera, fada aos olhos infantis.
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58 MANIFESTO ARRIVISTA [0173] “Sim, fui torturador! Ja no DOI-CODI, admitto, trabalhei! Que mal ha nisso? Cumpri com meu dever! Ordens cumpri! Fiquei na moita appenas para não poderem patrulhar, os revanchistas! Agora fallar posso, Glauco! Ou é bonito ser sincero só si for de esquerda quem assume que é da lucta armada defensor, Glauco? Responda!” -- Eu, hem? Si não respondo, você pode até me torturar! No seu serviço eu não trabalharia. Si escrevi O QUE É TORTURA, admitto que, ao tesão do algoz, fujam os proprios masochistas, pois acho que você pode seu pé mandar que beijem, lambam, sem auctor ser desse crime, ou cumplice. Quem chuta ou pisa não precisa da atroz onda! Um sadomasochista não quer só de mentira dominar ou ser submisso, mas isso não exige que quem ri da agrura dum captivo seja tão adepto dum regime de fascistas que appenas utilizam sua fé no gozo para a toda parte impor os proprios interesses. Eu à puta que va quero quem minhas crenças sonda!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PRESIDENCIALISTA [0176] “De um lado, temos cada presidente que cruza a rua appenas para achar ensejo de pisar no cocozinho deixado por algum vadio cão! E, doutro lado, temos uma imprensa que, caso o presidente nos declare à dengue ser contrario, editorial fará a favor do pobre mosquitinho!” “Faz parte do seu jogo que elle enfrente problemas, mas precisa provocar alguns que nem teria no caminho? Dispensa, assim, qualquer opposição! Até podem dizer que elle dispensa de caso pensadissimo! Repare você, meu caro Glauco, que jornal nenhum descharta assumpto tão mesquinho!” -- Sei disso, mas, fallando francamente, estou é me lixando. Seu logar está quasi vacante, ja adivinho. Propheta nem preciso ser, então, si, como todo mundo, nutro crença nas moscas que se fazem revezar e na merda que não muda seu normal estado de jazente e sujo ninho.
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MANIFESTO PURISTA [0180] {Não, Glauco! Não acceito! Isso jamais foi funk aqui, nem nunca foi na China! Eu sei bem o que é funk! Até lhe cito uns classicos: do Pickett, “Funky Broadway”; do Carter, “Funky fever”; “Funky street”, do Conley, tudo vindo do soul, mano! Até Nassau fez funk, e direitinho! Um baixo poderoso, uma guitarra que é quasi battucada, a batteria vibrante, alem de, claro, alguns metaes! Aquillo que no Rio o povo escuta paresce cirandinha analphabeta!} -- Você terá razão quanto às bossaes e chucras lettras, quasi de menina brincando de ciranda. Até reflicto que a parte instrumental não se promove aos niveis da Motown. Mas quem admitte que somos viralattas nosso damno descompta. Que fazer? Eu não me allinho com esse pobre genero. Na garra do rock é que me admarro. Mas diria que, para nosso nivel, fazer taes resalvas é prudente, pois a lucta dos fraccos não se esnoba nem se veta.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ONANISTA [0182] “Glaucão, eu batto muita bronha, todo o tempo! Um punheteiro se tacteia com jeito, sabe? Nunca a gente malha o sacco quando cobre com a mão o thallo. Phantasio, nos momentos finaes, alguma puta, num puteiro de guerra, alguma presa. Ah, si funcciona! Mas, quando demorado, o gozo bom não vindo, o jeito é, claro, ver o damno que attinge algum politico na fria masmorra, si for preso. A gente vê o cara appavorado, ja que agguarda chegar um habeas corpus. O logar lhe sendo bem incommodo, duvido que falhe esse meu ecstase tão lindo! E ahi, Glaucão? Egual tesão lhe accirro?” -- Não, bronha nunca batto. Appenas fodo, de bruços, o colchão, com uma meia suada no nariz. Uma toalha colloco por debaixo, para não sujar o meu lençol. Os movimentos de foda accelerando vou si cheiro o poncto mais molhado da meiona, até que, loucamente, exporro com gemidos abbafados pelo panno da meia. Quanto à minha phantasia, varia, mas concordo com você bem nesse poncto: quando o orgasmo tarda, é só nalgum politico pensar, que esteja preso ou venha a ser detido, chorando, pelo amor de Deus pedindo. O gozo vem mais rapido que expirro!
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62 MANIFESTO SIONISTA [0184] “Judeu, presta attenção nas prophecias dos sabios de Sião! Dos não judeus, os proprios reis serão escravos teus! Está na prophecia de Isaias!” “Prostrar-se-ão por terra, pelas vias e estradas que cruzares, porque Deus assim garante e, como vis plebeus, farão o que mais gostas e apprecias!” “Aquillo que tu nunca aqui farias farão elles! Lamber, como os atheus lamber devem, o pó que philisteus lamberam de Sansão nos idos dias!” “O pó que, em nossas solas, arredias mantem todas as linguas, de europeus a povos amerindios, ante meus judaicos pés, eguaes aos teus! Sabias?” Judeu não sou, amigo, nem judia é minha mãe. Mas outro amigo meu, tambem judeu, que o Livro tambem leu, achou que tal conceito não cabia. Não quero ser propheta, pois seria, na these, intromissão. Mas si meu breu confere de Tiresias algo, seu pé nobre lamberei. Isso o sacia?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SAUDOSISTA [0186] “Não, Glauco! Quer saber? P’ra mim o rock morreu com Lennon! Elle hoje seria melhor que Macca, Jagger, Dylan, porra! Hem, Glauco? Ja pensou? Aquelle disco junctando tantas causas, hoje em dia? Teria que ser triplo! Tanta gente clamando por direitos! Alem disso, ninguem foi tão rockeiro de raiz, tractando-se de covers dos cincoenta! Em summa, Glauco, falta faz, à bessa!” -- Faz falta, sim, mas esse seu enfoque restringe muito. O rock ‘inda teria um tempo com os Wilburys. Que morra depois, mas Macca até correu o risco de, em plenos nove nove, nostalgia propor do cincoentismo. Mais urgente, a causa social, a seu serviço, só tem um Bono, um Waters, infeliz excolha. Mas você, que se lamenta, repare que NEW YORK ainda expressa... O caso irlandez, caso alguem o troque por Russia, por Hespanha ou por Turquia, está sempre na pauta. Na masmorra os presos continuam. Ha confisco e saque em toda parte. A droga cria polemica. A mulher ainda sente o peso do machismo. Compromisso faltou elle assumir com os civis direitos dos gays, isso sim. Sustenta alguem tal causa? Alguem ja se interessa?
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64 MANIFESTO FEMINISTA [0187] “Tem horas que eu me sinto uma coitada, me culpo, me pergunto o que é que faço, entende, Glauco? Sabe? Eu bem que quiz ser uma feminista! Mas reparo naquellas que idolatro, que eram tão autonomas, as duas! Sim, a Janis, alem da Mama Cass! Uma dizendo, chorosa, que voltava para casa sozinha, sempre, Glauco! Outra que ria, mas era appaixonada pelo Lennon, sabendo que, tão gorda, chance zero teria com qualquer outro rockeiro! Estou desconsolada, Glauco! Addeanta luctar para ser livre, si nos resta appenas solidão, Glauco? Me diga!” -- Entendo, sim, amiga. Porem nada se pode fazer. Pense no palhaço que Lennon foi de Yoko! Ser feliz assim não dá! Ser bruxa sae mais caro! Não acha mais amor haver num cão? Adopte seu bassê! Si ao povo “panis” ja basta, ao bassê basta, como addendo, um osso, um biscoitinho! Mal se attraza você, chora, saudoso! Não seria melhor ganhar lambeijos? No veneno não fique, minha amiga! Feliz quero que seja! Assim, dispense o perdigueiro, o beagle, mesmo o cocker! Veja quanta ternura num bassê, quando faz festa! Melhore seu astral! Que diz, amiga?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO MACHISTA [0188] “Que faço, Glauco? Estou desconsolado! Do Greaves eu me lembro! Em “Take a letter, Maria”, nos relata que, ao chegar em casa à noite, flagra a sua esposa nos braços de outro cara! Tá, pretende ser digno, quer deixar a baixaria de lado: manda charta, copia tira, que passa ao advogado... Mas embrulha algumas roupas, deixa a casa, tudo na mão da trahidora, Glauco! Justo do jeito que commigo se deu! Acha você que seja justo, Glauco? Dá vontade de descer o braço, ser um porco chauvinista! Não concorda?” -- Concordo. Sim, me sinto do seu lado, pois muitos amigões procuram ether, se drogam, se desgraçam, deixam lar, mobilia, carro, até o bassê à raposa! Revolta como a sua a gente entende. Mas pense no bassê! Qualquer Maria que fique com as coisas! Quem prefira trahir, se foda! Ao menos a fagulha de amor brilha nos olhos do orelhudo, não acha? Seu bassê conserve! Custo menor terá! Ração, uma bollacha, appenas, mas lambeijos ganhará! Não acha que compensa? Por prazer ja basta a punhetinha! Corte a chorda!
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66 MANIFESTO SATANISTA [0190] “Entendo disso, Glauco! Quando alguem fez pacto com Satan, eu reconhesço! Bastante é nos seus olhos olhar bem e vejo si mui alto foi o preço!” “Não basta que invoquemos, em Salem, Turim, Apparescida ou no endereço dum templo ou dum terreiro, o que nos vem em forma dum Exu, torpe e travesso!” “Mas urge incorporal-o, Glauco! O Alem excolhe seus discipulos! Advesso não sendo a Satanaz, você tambem cedeu, não é? Me conte do começo!” -- Você desconfiou? Que viu em mim? Ah, claro! Viu meu olho, que postiço não é, mas azulado pelo fim das luzes na cegueira, foi por isso! Então sabe que Lucifer ruim jamais tem sido! Tenho um compromisso com elle, como o “bluesman”! Quando vim a versos compor, houve esse feitiço! Agora virou vicio! Posso, emfim, dizer a quem, de facto, sou submisso! Só faço sacrificio no festim, beijando um cu que nunca foi castiço!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO IMPRESSIONISTA [0193] “Que pena, Glauco, que esse seu defeito nos olhos bloqueou-lhe a percepção das coisas ao ar livre, dos diversos matizes da luz, angulos do olhar! Você se desgraçou mesmo! Como é que, agora, vae saber si está mais alto ou baixo o sol à tarde? Como vae saber si ja reflecte o pôr do sol nas arvores do parque? Que desgraça a sua, Glauco! Porra, sinto pena!” -- Caralho! Sente mesmo? Não suspeito das suas intenções, mas seu tesão por essas impressões pode mais versos sarcasticos propor-me! Meu azar reforça a sua sorte? No seu pé estou pensando agora... Si estou falto do sol, que differença faz si cae a tarde? Me imagino usando, em prol da sua visão, minha tão devassa linguona nelle! E então? Acha pequena?
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68 MANIFESTO EXPRESSIONISTA [0194] “Será que ‘inda se lembra, Glauco, dessa particularidade da pinctura moderna? Formas sempre distorcidas, as cores alteradas, confusão causando na visão de quem observa! Perdendo sae você, Glauco! A cegueira, eu acho, prejudica a percepção de tudo na memoria! Como vae lembrar-se dos detalhes, si o pinctor moderno os distorceu? Cê tá fodido, amigo! Realmente, é de dar dó!” -- Verdade? Dó cê sente? Mas que impeça não ha nada que eu pense na fofura do pé no “Abaporu”, nas tão battidas botinas do Van Gogh ou no dedão mais curto, em Portinari, que preserva os pés dum camponez quando peneira, descalço, o seu café! Si tantos são, na mente, taes detalhes, mais me attrae seu pé, querido amigo! Por favor, me deixe comparar o seu fedido pezão com elles, deixe! Um delles só!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SYMBOLISTA [0196] “Estou pensando, Glauco... A academia faz muita distincção. P’ra mim é tudo a mesma coisa. Só necrophilia! O Cooper, em “I love the death” ja fez resumo da questão. Mas fazem tanto barulho com um Alvares contista de “Noite na taverna”, com Augusto dos Anjos, Cruz e Souza, com os ultra, com gothicos... Caralho, Glauco! Vão tomar no cu! Necrophilos, somente!” -- Não vamos mixturar, né? Numa fria e escura sepultura jaz, desnudo, qualquer cadaver, para quem iria fazer o que quizesse. Mas freguez exsiste para tudo. Só levanto alguma differença: symbolista, romantico, underground... E não é justo junctar tudo no sacco. Que cê nutra seu nojo, comprehendo. Mas tesão aqui nem se discute, frio ou quente.
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70 MANIFESTO COMMUNISTA [0197] “Não quero que me chamem bolchevique, mas acho o socialismo muito vago. Prefiro communista, Glauco! E cago praquelles que duvidam do meu pique!” -- Magina! Não duvido. Mas não fica melhor ser progressista? Quanta chaga restou no communismo! Nada appaga aquillo que virou a nossa zica... “Que nada! Assumo mesmo! Claro fique: Eu quero dictadura! Quero estrago fazer na burguezia! Raiva trago commigo! Odeio o rico, odeio o chique!” -- Tambem nos pise, do sadico boquette?
odeio que essa classe rica nos humilhe... Mas a vaga quem pega? Quem lhe paga Quem na cara leva a bicca?
“Não seja, não, por isso, Glauco! Estique a lingua no meu bute, no meu bago! Sou sadico, tambem! Você, que é mago, bem sabe que é só troca de cacique!”
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO IRRACIONALISTA [0203] “Quem disse que preciso deduzir que exsiste um Deus appenas porque eu penso? Nem sei si exsisto, Glauco! Ja pensou? A gente perde tempo defendendo conceitos e direitos dum humano ser vivo que siquer nem vivo seja! Talvez sejamos sonho dum insecto, pensou nisso, Glaucão? Talvez vapor sejamos dum cometa? Que tal isto? Agora tem você que responder!” -- Alem de cego, mago, ou de fakir, virei tambem philosopho? Um immenso problema cê me arrhuma! Mas eu sou capaz de responder. Pelo que entendo, não somos só delirio dum insano propheta, dalgum lider duma egreja. Prefiro crer que, quando me interpreto, poeta sonhador finjo ser, por algum tempo, não só crendo que exsisto, mas crendo que terei certo poder. Não posso fabricar um elixir bebivel, nem pro pranto tenho um lenço. Mas posso lhe dizer que cego estou appenas aos que enxergam. Estou vendo aquillo que ninguem vê. Si me enganno de porta, não me enganno caso veja as cores quando sonho. Não me inquieto tentando ser aquelle pensador que irá regras cagar. Appenas visto a minha phantasia por prazer.
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72 MANIFESTO PLURALISTA [0205] “Eu acho que nós temos que comptar com todas as hypotheses, não é? Atheus, crentes, machistas, feministas, gays, lesbicas, rockeiros e chorões! Concorda, Glauco? Vejo um só problema com essa convivencia... Caso a gente inclua democratas e fascistas, como é que fica? Assim que um fascistão assuma, acceitará seus opponentes? Mas, caso os excluamos, não seremos, de facto, pluralistas! Que dilemma!” -- Dilemmas fazem parte. Tolerar oppostos é premissa. Pode até alguem não concordar, desde que mixtas as coisas se mantenham. Só taccões de botas militares, não! Quem tema perder a liberdade que não tente dar margem ao azar. Tirar das listas quem nunca nos tolera não é tão absurdo, si os demais abertas mentes tiverem e evitarem os extremos. Exsiste incoherencia nesse thema? Appenas um protesto registrar eu quero neste caso. Por chulé meu vicio se conhesce, dei as pistas. De minha parte, entendo os mais doidões drogados, jogadores, todo eschema e toda preferencia. Mas sou ente extranho nesse ninho. Até callistas me acharam pervertido! Todos dão seu tapa, curtem tudo, mas dementes nos acham, nós, podolatras! Não temos direito de remar contra quem rema?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ALTRUISTA [0206] “Não basta liberar, Glauco! Me enfado de tanto fallar nisso! Quero, sem limites, consumir! Que não confisque ninguem o meu direito! Bello achado, dizer “recreativo”! Me deleita aquillo que prefiro! Jamais asco eu tenho de ninguem que dá confesso recado do seu vicio! Na cadeia não quero o dependente! Todos são bem livres para achar o que lhes dê prazer, Glauco! Tesão cada pessoa tem como bem prefere e bem deseja! Assim penso, Glaucão, assim eu vivo!” -- Pois é, si eu lhe offeresço um baseado, você, por certo, acceita, né? Tambem si um coppo de cachaça, vinho ou whisky lhe sirvo, você bebe de bom grado, não bebe? E chocolate? Não acceita? E bollos? E sorvetes? E churrasco? Café, si for espresso? Mas si peço que deixe eu cafungar na sua meia, cheirar por dentro o tennis ou no vão dos dedos lambidellas dar, você recusa, não recusa? Muito boa, a sua noção simples do que seja usar o que será “recreativo”!
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GLAUCO MATTOSO
MANIFESTO EGOISTA [0207] “Explico-me: quem gosta de mim sou eu, Glauco! Mais ninguem! De accordo, ou não? Você tambem crê nisso, Glauco! Certo? Então! Si dependesse só de mim, justiça me fariam! Eu teria ganhado tantos premios, Glauco, puxa! Meu livro quem lê fica a perguntar por que razão não ganho um Jaboty, Nobel, ou Oceanos! E você? Tambem ja se sentiu injustiçado? Mas vamos e venhamos! Muito mais injusto foi aquillo que commigo fizeram! Com você nem fazem tanto, pois sentem até pena dum ceguinho!” -- Não, pena acho que sempre me faltou. Mas premios não dependem dos que são bomzinhos ou amigos. Sou aberto a criticas, mas nunca foi assim a coisa. Não criticam poesia, criticam a cegueira, fria ducha me jogam. Não toleram que este azar eu possa superar. Mas, quanto a ti, escreves bem, teu livro ninguem lê sem bellos commentarios. Desaggrado tu causas mais por tuas pessoaes acções e reacções. Não te maldigo, appenas te suggiro que em teu cantho mais quieto fiques. Menos borborinho.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PROGRESSISTA [0208] “Appenas ser de esquerda, Glauco, não me basta! Agora quero mais e penso que estamos mais à frente! Esquerda velha, aquella que punia a minoria, que nunca mencionou “diversidade”, não, essa não a quero mais! Espero que nossos novos lideres attraz não voltem, que evoluam! E você, Glaucão, tambem se sente progressista? Tambem acha que está no tempo certo de novos ideaes encampar essa tendencia? Ja me sinto, por signal, alem de libertario, libertino!” -- Melhor não confundir essa questão, amigo. Não exsiste esse consenso pacifico no meio da groselha. Tem gente só pensando numa fria manobra: cooptar-nos, liberdade propor e prometter, para severo regime, depois, sobre essa fugaz idéa, nos impor. Depois, cadê que vamos ter direito algum na pista de dansa, no sambodromo ou aberto desfile em nosso bloco? Só promessa não colla. Quero nosso carnaval brincar mais livre, em solo planaltino.
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76 MANIFESTO SOLIPSISTA [0209] “Me sinto um misanthropo, Glauco! Faz alguma falta alguem na nossa vida? Que nada! Amigos sempre decepção nos causam! Mulher, filhos, paes, avós só sabem nos pedir algum favor! Que fiquem de mim longe! Ja me basta cuidar do meu bassê que, coitadinho, precisa de mim tanto! Seu bassê não é, tambem, carente, Glauco? Não lhe cobra a companhia permanente?” -- Sim, elles cobram mesmo. Teem um gaz damnado! Mas a gente até convida alguem que tem bassê num domingão, faz festa p’ra cachorro! Quem a sós se tranca si um bassê vier propor passeio? Quem resiste? Quem se affasta dum desses orelhudos? Seu vizinho tem um, não tem? Então! Como você se sente solitario? Ao quarteirão dê voltas, socialize-se! Então? Tente!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO INCONFORMISTA [0211] “Sim, Glauco! Sou pacifico! Me adapto a tudo que é normal, que é justo ou certo! Appenas me rebello contra toda politica abusiva, auctoritaria! Agora, por exemplo, vejo bota por tudo quanto é lado, para la e para ca, querendo nos impor regrinhas de conducta! Mas nem quero saber! Gente de bota, para mim, é tudo a mesma coisa: militar! Governo militar é dictadura! Você gosta de bota, que eu sei, mas bem sabe que é synonymo de força, poder, auctoridade, Glauco! Onde é que fica a nossa livre excolha? Tudo virou quartel, agora, Glauco? Porra!” -- De bota gosto. Nunca fui cordato com golpes e jamais estive perto de despotas, comtudo. Que se foda eu quero um dictador! Mas arbitraria é sua parca analyse. Quem vota aguente! Eu não votei, nem em Allah, nem Christo, nem Javeh! Nosso Senhor não acho ninguem! Logo, não venero quem cego me tornou! Bom ou ruim, divino ou não, recuso-me a pagar pedagio a tal fiscal da moral pura! As botas, em si mesmas, não são más. Calçadas são por gente má. Quem torça por uma livre excolha, algum chulé concorda que excolhi. Nunca me illudo com mythos, mas meu gozo que não morra!
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78 MANIFESTO ELITISTA [0214] “Te cuida, Glauco! Deixa-te de tantas baixezas! Usas muitos palavrões e escreves sobre coisas asquerosas! Podias usar tua boa verve em optimos poemas de elevado teor, epicos, lyricos, mas não satyricos! Talvez tua cegueira não passe de castigo por usares a penna, como a lingua, de tão sujo e grosso modo, Glauco! Queima aquillo!” -- Conhesces-me faz tempo. Si te expantas com esse linguajar, por que então pões os olhos no que escrevo? Por que gozas? Suggiro que teu fino senso observe que os themas de que tracto resultado são dessa sociedade que tu tão vanmente valorizas. De maneira nenhuma abdicarei dos meus logares de falla. De inimigos nunca fujo. Em tempo: teu pé, posso em mim sentil-o?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO HEDONISTA [0215] “Não vale punhetar-se, Glauco! Agora adulto, sou correcto e não faria de novo tudo aquillo que fiz quando de cegos monitor fui no instituto. Contar lhe posso, Glauco, mas não vale tocar punheta, vamos combinar!” -- Me conte, então. Não vamos fazer hora. Apposto que dos cegos você ria com gosto, pois conhesço o seu desmando no tracto com os outros, sempre bruto. Ao menos eu lhe peço que me falle sem pappas como agiu em tal logar. “O cego tinha a minha edade, embora menor e mais franzino. Delle, um dia, ouvi resposta torta. Ja fui dando porrada, até fazer aquelle puto pedir perdão! Agora, que se ralle! Primeiro, elle terá que adjoelhar!” “Mandei-o pôr a lingua para fora. Tirei o pau, a pelle puxei. Via seu nojo do sebinho. Ao meu commando, lambeu toda a cabeça: -- Chupe, ou chuto a sua bocca! Quero que se eguale ao cão, ao veadinho mais vulgar!”
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80 -- Então elle sentiu, antes da tora na bocca, algo na lingua? Que seria? Ja sei. Você exfregou, foi deslisando o pau na baba delle. Até lhe escuto as ordens de lamber aquelle braille de ponctos amarellos, sem parar... “Foi mesmo assim! Emquanto um cego chora e chupa, a gente goza de alegria por ter boa visão! Mas va tirando da chuva o cavallinho! Nem discuto! Sem chance! Com você, mesmo que estalle a lingua, nada faço similar!”
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO URBANISTA [0216] A linha do metrô leste extendida estava ja, faz tempo, sem que eu nem me desse compta! Appós mais uma ida à casa de mamãe, voltei de trem. Tomei na plataforma errada e vi, da janella do wagão, campos ja sem urbanas areas. Mesmo assim, comprida alléa, aqui e alli, cortava um bem frondoso bosque, em multicolorida verdura, varios verdes tons. Alguem commenta que o metrô para, em seguida, em São José dos Campos. Mais alem, me deixa em Taubaté. Ja na sahida daquelle terminal, meus olhos teem defronte mais frondosas coppas. Vida não quero outra! Que sonho! Muito zen, vou indo por alli, mas dolorida cegueira appaga tudo, pois me vem, agora que accordei, a mais soffrida noção do que é real, que me detem a mente de poeta e me convida, ao menos, a admirar os que em Deus creem.
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82 MANIFESTO DECADENTISTA [0217] “Dá tedio, não dá, Glauco? Nesse estado de coisas eu não ponho mais fé, não! Da crise de valores ja me enfado faz tempo! Cê tambem descrê, Glaucão?” -- Descreio, sim. Mas tão desanimado não fico que não dê minha versão dos factos, em sentido figurado, que seja, sem abrir mão do calão... “Ahi que está a questão! Cê tem usado no verso um porrilhão de palavrão, mas, como não sou bardo, desregrado me sinto é si extravaso o meu tesão!” -- Faz muito bem! Desfructe do legado maior que tem, alem dessa visão! Quizera desfructar tambem! Meu fado de cego não permitte tal opção... “Ah, Glauco, não se faça de coitado! Aquillo que não falta é som no chão, é bota militar p’ra todo lado! Mais facil não lhe fica achar pezão?” -- Difficil nem tem sido. Si o soldado for sadico de facto, rollarão as coisas. Mas me sinto mais brochado por serem tão masocas como são...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO NATURISTA [0218] “Na frente de qualquer outra visita, eu logo vou dizendo: Não repare! Mas sendo você cego, Glauco, vou tentar ser bem didactico. Virei nudista, Glauco! Agora ando pellado em casa! Convenci minha vizinha aqui do lado... Logo ella adheriu! Um dia quero andar assim na rua! Então, Glaucão, você quer conferir? Appalpe, va passando a mão... Assim... Ei, calma! Não precisa abbaixar tanto! Cuidado! O penis deve estar bem molle, sinão parescer pode sacanagem! Por isso, não exbarre muito ahi! Ja chega! Precisava adjoelhar? Agora accreditou? Tirou a prova?” -- Tirei. Só me desculpe si lhe excita que mexam no seu pincto. Mas encare os factos. Você fica dando show no espelho? P’ra vizinha? Quer que um gay assista da janella? Resultado bem piffio, o seu, não acha? Mas a minha mão boba percebeu que preferiu você ficar calçado. Continua usando o seu sapato por que? Rir não quero, mas terá medo de mim? Aqui de nós nenhum nunca foi sancto. Qualquer um que quizer, o cego engole um pincto sem problema. Muitos agem assim commigo. Claro, me trahi, mas vamos combinar: P’ra que calçar sapato, si na lingua a gente escova?
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84 MANIFESTO MONETARISTA [0220] “Paresce incrivel, Glauco, mas tem gente otaria nesta terra, a poncto tal num golpe de cahir: cryptomoeda! Commigo pense, Glauco: Quem emitte moeda? Quem fabrica cada nota do meio circulante? Só paizes, governos ou thesouros estataes, correcto? Si qualquer um for fazer dinheiro em casa, sabe o que elle é, né? Falsario, claro! Então como é que alguem “minera” quanto queira, pelo seu caseiro micro, um dollar virtual? Onde é que fica a mina? La na China? Ah, vão tomar no cu! Quem caia nessa meresce se foder, Glauco! Não acha?” -- Sim, acho. Mas tambem exsiste crente capaz de pagar dizimo. Natal não é tempo que as trevas arremeda, tal como as “blequefraudes”? Quem admitte que voto ser trocado pela bota é jogo democratico e felizes nós somos si elegemos generaes, só pode estar brincando de “poder directo” ou la que porra for, ué! Ha tanto vigarista que ninguem extranha mais o pappo phariseu dum desses guardiões duma moral fallida. Ninguem liga mais, magina! Politicos não fazem só promessa? Não cobram mais imposto, juro ou taxa?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO MONARCHISTA [0221] “Não dizem, Glauco, que houve um golpe aqui, alli por meia quattro ou meia oito? Não dizem que, antes disso, o que exsistia vigente era a republica, a tal, essa que em quinze de novembro se celebra? Então! Pois tambem essa golpe foi! Tambem regime authentico não é! Foi golpe, sim, e golpe militar, com uma dictadura subsequente, aquillo que depoz a monarchia! Sim, esta democratica, pois era ja parlamentarista, com partidos e tudo! Glauco, estou inconformado com isso! Superamos o regime de meia quattro e nunca superamos a velha dictadura oitocentista? Eu quero a monarchia restaurada!” -- Tambem quero. O direito eu exerci, votei num plebiscito, mas affoito demais foi tal evento. Bom seria fazer um novo, agora sem tal pressa e tendo uma campanha que, de quebra, informe e conscientize, nome ao boi dê mesmo. Ainda nisso boto fé. Mas outra coisa vale resaltar: Aquella orthographia então vigente, a mesma que practico, deveria vigir de novo. Sinto-me em tal era. Não sei si sou vanguarda ou tempos idos appenas revisito. Mas legado algum eu deixarei que alguem estime, ou Glauco não me chamo, ja que estamos fallando dum auctor que, sem a vista, se disse visionario. Valho nada?
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86 MANIFESTO GARANTISTA [0223] “Eu acho -- Sabe, Glauco? -- que ninguem ser preso poderá sem que se exgotte, no prazo derradeiro, seu recurso. Instancias trez são poucas. Eu proponho a quarta, a quincta, a sexta... Só depois de estar bem transitado, o condemnado será preso. Nem pode, por signal, alli ficar, ja velho como está. Prisão domiciliar, hospitalar, ou coisa assim irá cumprir, de facto...” -- Sim, posso concordar, caso tambem eu tenha tal direito. Quero um trote passar nalgum politico, ser urso amigo delle e, quando ja me bronho ao vel-o, preso, dando nome aos bois, immune quero estar ao advogado do cara, ao promotor, ao tribunal. Só quero fofocar, usar a má linguagem dos poetas, sem passar por risco de prisão pelo meu acto.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PUNITIVISTA [0224] “Prisão, Glauco, devia ser cumprida por simples, monocratica sentença dalgum juiz, instancia de primeira! Você batte punheta quando algum politico vae preso, não é mesmo? Pois muitas outras bronhas batterá si minha suggestão for accolhida! Calcule só, Glaucão! Basta a canneta dum duro magistrado, e mette em canna qualquer governador ou senador! Que gozo! Que erecção! Que ejaculada!” -- Talvez devesse, mesmo. Mas quem lida com versos fescenninos logo pensa no risco que se corre, pois quem queira prendel-o por louvar algum bodum pedal ou caralhal nenhum tenesmo terá de condemnar quem livre está. Prefiro recorrer a quem decida collegiadamente, antes que metta em canna este ceguinho algum bacchana mettido a auctoridade superior. De molho as barbas, antes de mais nada...
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MANIFESTO GOVERNISTA [0225] “Bem sei, Glauco, tu tocas uma bronha vez toda que um politico se ferra! Mas lembra-te daquillo que eu te disse: Nem todos os politicos são isso que pensas! Temos homens de valor, decentes, empenhados, que farão um rollo compressor nos opponentes! Sim, Glauco! Passaremos qual tractor por cyma desses merdas! Tu verás! Nem pedra sobre pedra sobrará!” -- Que medo! Nem duvido... Que eu supponha, até teremos homens, nesta terra, capazes de ser firmes, como o vice, mas numa coisa appenas eu me ouriço: saber quaes delles forte seu fedor terão nos pés. Em summa, chulezão! Quem tenha tal chulé tem condizentes quesitos preenchidos, sim senhor! Que importa quem seria mais veraz? Importa quem mais forte federá!
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO DIVERSIONISTA [0226] “Tens duvidas si irei mactar no peito, meu caro Glauco? Pensas que roubei alguma vez na vida? Te respondo: Roubei, sim! E dahi? Quem não roubou? Te peço, pois, que vejas bem o lado daquelles que roubaram! Phariseu será quem os condemna, quem accusa sem provas! Quanta gente, Glauco, ja foi pega? Ninguem, quasi! Precisamos parar com essa caça às bruxas, ora! Tu deves concordar commigo! Ou não?” -- Sahiu pela tangente, com effeito, você, né? Fui, então, quem fez a lei? Não sou quem rouba, aqui. Jamais escondo aquillo que commetto: bardo sou e mostro o que componho. Não sou dado a culpas e desculpas. Não fui eu quem disse que roubou. Ja que confusa ficou esta conversa, me dirá você si tem chulé? Si nós estamos fallando francamente, em boa hora de duvida ja livro o seu pezão...
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90 MANIFESTO VOYEURISTA [0227] “Mas Glauco, por acaso torturei, mactei ou estuprei alguem? Me diga! Magina! Você sabe muito bem que eu, pobre de mim, macto só mosquito! Adoro tão somente ver quem faz taes coisas em detalhe, como batte, flagella, queima, fura, fode, enraba, admarra, arranha, affoga, pisa, chuta... Você tambem não curte scenas taes? Mas ficam me imputando maus valores, segundas intenções ou fins excusos, somente porque vejo, porque gozo aqui, remotamente, no comforto da minha poltroninha, Glauco! Pode?” -- Não podem accusal-o, não, que eu sei. Só podem allegar que quem se liga em scenas violentas pensa, sem escrupulos, na alheia dor, do grito das victimas chacota faz, mordaz. Peor é minha tactica de vate privado da visão, que é quem accaba chupando, otario, o dedo, pois escuta, com audiodescripção, appenas ais... Me cabe imaginar aquellas dores, os actos practicados, os abusos. Podemos divergir, ja que não doso meu gozo como algoz, por esse torto enfoque, mas soffrendo como o bode...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO EXCAPPISTA [0229] “Sahida sempre exsiste, Glauco, ainda que seja para achar derivativos na vida! Não é mesmo? Onde é que fica Pasargada? Será no Beleléu? Finlandia? Nos Confins do Judas? Não, Glaucão, ninguem precisa se esconder, fugir, nem se exsilar! A gente está tranquilla por aqui! Para que tanta neurose, paranoia, depressão? O jeito é punhetarmo-nos, e prompto! Gozamos, relaxamos... e exquescemos aquella porra toda, aquella bosta de patria, de nação, de estado ou terra! Meu plano sendo astral, estou na boa!” -- Perfeita solução, amigo, linda maneira de lidar com oppressivos problemas como o nosso. Caso a picca recuse erecção, basta, alli no céu, pensarmos num anjinho saphadão, sacana, que nos pise e, de prazer, na bronha gozaremos. No céu ha anjinhos para todo gosto. Sancta candura, a sua! Até no céu o Cão será capaz de estar... E então, seu tonto? Achando que excappou? Estão os demos por toda parte! Exsiste até quem gosta de beijos dar num rego, quem se ferra mas acha não ser coisa que lhe doa...
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92 MANIFESTO EXHIBICIONISTA [0230] “Odeio os naturistas, Glauco! Só se despem! Nunca ficam de pau duro! Não sabem se mostrar como eu, que sou damnado para achar quem veja meu lindissimo caralho enrijescido! Eu tenho, Glauco, um lindo cappotão, egual àquelles que usa um detective! Naquellas lindas tardes de verão, eu saio encappotado, vou ao parque e, frente à mãe, à filha, à sogra, à thia, eu abro a cappa! Claro que, por baixo, estou é lindamente pelladão! E então, Glaucão? Não acha que sou foda?” -- Sim, foda acho que é, só! Mas a vovó talvez não ache. Eu, nunca que no muro fiquei, lhe digo: occorre esse seu show faz tempo. Todo mundo ja perdeu qualquer curiosidade. Nem libido eu tinha, pois você nesse pezão calçou seu lindo tennis. Cê só vive calçado! Nunca mostra seu dedão mais curto, seu solão que jamais arque nem caia, de tão chato! O que eu queria ver, mesmo, não veria! Nem me encaixo na sua linda scena, mas eu não perdia tempo olhando nessa roda...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO ANILINGUISTA [0236] “Qualquer um que ja tenha sido alli lambido sabe, Glauco! Quando a merda sae molle, ao passar lambe o cu, gostoso, tal como dum escravo a lingua suja! Você ja reparou nisso, Glaucão? Por isso é que cagar tanto prazer nos dá, não é? Difficil é que eu tenha a lingua dum escravo, como o rollo que fica, de papel, alli do lado do vaso! Mas a gente, emfim, se vira...” -- Às vezes eu descharto o que ja li limpando o cu, mas uma lingua lerda, lambendo devagar, causa mais gozo, sem duvida. Quem tenha, de lambuja, um habil fellador, prazer tem tão completo que difficil é mais ter. Viajo nisso. Lingua que se embrenha nas pregas, indo e vindo, por consolo eu tenho, mas appenas sou levado por Sade e, no delirio, pela lyra...
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94 MANIFESTO MINIMALISTA [0237] “Sou curto e grosso mesmo, Glauco! Não me attenho às encheções dessa linguiça chamada poesia! Quando quero dizer anus, eu digo cu! Si digo que é pau, é porque penis ja seria demais! Si prostituta não fallei, se explica pela puta que pariu! Emfim, não vou ficar justificando aqui meu linguajar, sinão eu caio naquillo que pretendo contestar! Concorda, Glauco? Tenho sido claro?” -- Concordo. Tambem uso o palavrão no verso, sem problema. Mas enguiça o pappo si pretendo ser severo com tudo que é prolixo, meu amigo. Em vez de pau, melhor não ficaria caralho ou caralhão? Talvez um gay prefira dizer mala... Você viu que tudo só depende de onde, quando e como usar um termo. O papagayo repete sem pensar o linguajar que ouviu. Eu ja separo e ja comparo...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO REDUCCIONISTA [0238] “Em these, é tudo a mesma coisa, sabe? Não passa de cocô toda essa bosta! Me deixa emputescido quem consente que estado bem differe de governo e patria de nação ou de paiz! Não somos brazileiros todos? Não fazemos o papel do viralatta? Bobagem, caro Glauco, pretendermos achar que merda pode ter perfume! Cocô fede a cocô! Paiz maior resume-se, é fatal, a um cocozão!” -- Até lhe dou razão. A mim me cabe, comtudo, ser poeta. Alguma apposta eu faço num Brazil independente. Talvez um presidente mais moderno nos seja dictador e quem se diz mau lider de estadista tenha mão. Mas algo nos restou, alem da matta ja quasi devastada. Meros termos não medem nosso lyrico costume de sermos utopistas. Nem major perdura num quartel, nem capitão...
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96 MANIFESTO EXSISTENCIALISTA [0250] “Babacas! Elles dizem que ladrão eu sou por ter roubado! Tambem dizem que sou estuprador e violento bandido, Glauco! Veja que injustiça! Não sou porra nenhuma! Sartre disse que não exsiste essencia! Ninguem é nadissima de nada nesta vida! A gente tão somente exsiste, e prompto! Eu faço o que quizer! Si fizer bem aquillo que costumo fazer, sou é digno de elogios! Mau ladrão é só quem se arrepende de roubar! Estou certo, Glaucão? Você me endossa?” -- Endosso. Nada assigno, porem, não. Bandidos bons serão caso nos pisem na cara, alem do roubo. O que sustento é tal explicação. Assim a missa entende você? Fallo uma tolice? Philosophos explicam, mas si fé puzermos muito nelles, accolhida não sobra a Allan Kardec. Eu dou descompto em tudo. Nesta vida sou refem dos deuses e dos demos. Do meu show faz parte a luz e a perda da visão. Portanto, tenho sorte e tenho azar ao mesmo tempo. O opposto tudo roça...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO IMPERIALISTA [0251] “Hem, Glauco? Ja pensaste? Poderias ser como, os portuguezes, nós, ja fomos! Tiveste ja a Provincia Cisplatina! Na guerra ja venceste o Paraguay! Compraste da Bolivia mais que um acre! Podias ter Guyanas, a Amazonia todinha, a peruana inclusa, tudo! Não achas que Dom Pedro bobeou? Mais mattas, mais accesso à pratta, ao ouro! Serias mais riquinho! Tu não achas?” -- Não acho, não. Melhores tive dias emquanto não pensei nos aureos pomos. Alem do mais, ser dono duma mina dizer não quer que rico fico, uai! Vocês ja nos pilharam, com massacre ou sem, tudo o que havia na colonia. Mais ‘inda pilhariam! Seu entrudo foi tudo o que ficou e vicejou aqui, fora algum trote de calouro herdado de Coimbra. Thema aos rachas.
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98 MANIFESTO COLONIALISTA [0252] “Caralho, Glauco! Puta que pariu! Que chance nós perdemos! Foi azar ficar dos portuguezes o paiz na mão! Não acha, Glauco? Si Nassau ficasse em Pernambuco, si os inglezes, alem duma Guyana, conquistassem o Rio de Janeiro... Ah! Pense só! Recife ja seria Nova York! Aqui ja Saint Paul City ficaria! Fallavamos inglez! P’ra que Camões, si temos Shelley, Byron, Keats, alguem assim? Hem, Glauco? Milton cê seria! Que perda! Agora é tarde! Quanto attrazo!” -- Não sei, não, pois em Africa se viu aquillo que fizeram. Calabar exsiste em qualquer parte, si infeliz ou não. Mas nosso coco, ou o cacau, alem dumas pedrinhas, quantas vezes daqui nos levariam? Annos passem, seriamos Uganda, seu bocó! Não dorme quem a grana nos extorque, bobão! Por padroeira, nem Maria teriamos siquer... Nossos porões de presos se encheriam, com ou sem inglezes no commando. Poesia eu tenho, sem ser Milton e sem prazo.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO FUTURISTA [0253] {Não falle assim commigo, Glauco! Não me chame de bocó! Você bem sabe que a Australia está, no mappa, bem melhor que nós e falla inglez! Alem do mais, ainda que possivel não nos fosse ser como outra britannica colonia, prefiro ver inglezes no commando, pois sabem governar! Eu lhes seria bem util, trabalhando de feitor, de algoz, de capataz! Você queria lamber minha botina? Pois então! Tal coisa fatalmente ia se dar! “Si queres uma photo do futuro, é a bota sobre um rosto humano, e só! Um mundo de pisar ou ser pisado!” -de accordo com George Orwell, que você citando vive e tanto que cultua! Ahi, Glaucão! Confesse! Torce, né?}
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100 -- Lamber sua botina? Ah, meu patrão! Mas claro que torcendo estou que accabe a gente dos inglezes na mão! Mor barato, reconhesço! Si fataes nos fossem previsões taes, algo doce achava a minha lingua que lhe abbone a surrada sola grossa, justo quando pisasse num chiclette pela via... Mas pense bem, rapaz, em -- quando for chamado para trampos de vigia nos campos de trabalho -- qual funcção mais alta alcançará. Do calcanhar jamais desses inglezes, lhe asseguro, você proprio passava! Acha que dó teriam de você? Pobre coitado! Fallando serio, cara: cê não crê que tenha privilegios nessa sua utopica noção, né? Perca a fé!
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO MANICHEISTA [0254] “Não, Glauco! Não sou bruxa! Você, sim, é bruxo! Sou é fada! Sou do bem! Você ficou refem da perversão, querido! Não lhe quero mal, mas vamos convir que excolhi certo! Escrevo e leio somente coisas boas! Nunca fallo de nojo, de sujeira, mijo e merda! Sou limpa! Positivas vibrações transmitto, Glauco! Pense no que digo! Em tempo ainda está de bandear-se ao lado bom da vida, meu querido!” -- Que bom que tem você pena de mim, amiga! Quem teria? Mais ninguem! Mas vamos e venhamos... Quantos são os lados da questão? Quantos os ramos por arvore? Pensou nisso? Recreio bem pode ser aquillo que, no callo de alguns, é descomforto. Quem bem herda a fama dos maldictos, com Camões não briga, minha amiga. Si commigo você combina, vamos sem disfarse vivendo. A tal convivio é que a convido!
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MANIFESTO MATERIALISTA [0255] “Eu, como uma analysta financeira quotada que sou, digo-lhe, Glauquinho: Da vida não se leva nada! Nada! Entende, queridinho? É justamente por isso que eu a todos recommendo gastar, sem culpa, a grana, viajar, comer bem, badalar, curtir o luxo possivel e pagavel! Mas p’ra tanto, fofinho meu, nós temos que saber bem como o nosso rico dinheirinho se investe e multiplica, certo? O meio mais rapido e rentavel não é nem poupar na caderneta, que dá pouco, nem bolsa de valores, cujo risco é grande, e sim na rede virtual! Exacto! No cryptouro! Ouviu fallar, Glauquinho? Quer que explique isso melhor?” -- Magina! Não precisa! Da maneira emphatica que falla, com carinho, prometto, pensarei nessa jogada! Qual mesmo? Cyberouro? Que se invente não falta, ja, mais nada, ‘tou sabendo, p’ra gente especular... ou applicar, tal como diz você. Ja que sou bruxo, não saco desses saques, mas garanto que sei como ganhar, no bolso ter o tal philosophal poder. Bom vinho e boa pastasciutta ja bem cheio me deixam, minha amiga. Aqui, porem, confesso que me deixa mesmo louco um vicio que não custa, nem petisco algum vale em sabor: o sensual prazer da poesia. Paladar nenhum deu-me o que a lyra dá de cor.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PROSELYTISTA [0256] “Sou bruxa, sim, Glaucão! Sem culpa, assumo! Até vou convidar você, meu caro, a minha activa seita conhescer! Você, que eu sei, é bruxo. Quanto a mim, fundei um movimento satanista ao qual ja muitos magos adheriram. Faremos, Glauco, junctos um tremendo furor! Agitaremos o pedaço! Nem pedra sobre pedra deixaremos! Estude do bruxismo com carinho o methodo proposto e dê retorno, Glaucão! Aos inimigos nós iremos causar choro e ranger de dentes, hem?” -- Lamento não seguir o mesmo rhumo que segue você, linda! Não declaro que estou em desaccordo. Com prazer festejo o movimento. Mas festim egual faço sozinho. Sem a vista, prefiro na clausura, aos que me admiram, mensagens enviar. Só recommendo cuidado com os dentes e lhe faço, tambem, a confissão: de tanto os demos ouvir, mordi da lingua um pedacinho... Agora mais insomne, tal suborno evito. Equidistante dos extremos, versejo sem razão dar a ninguem.
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104 MANIFESTO GREVISTA [0257] “Não sou, Glauco, espartana, atheniense nem arabe, mas digo com franqueza: deviamos nós todas fazer greve de sexo contra nossos maridinhos, amantes, namorados, noivos, casos estaveis, passageiros ou fortuitos! Iriam apprender, esses machistas, a nossos lindos corpos respeitar! Queria ver só, Glauco! Uns quattro dias sem foda, sem boceta, sem boquette, sem cu siquer, e todos elles iam deixar de ser tão brutos e mandões, não acha, amigo? Conte-me o que pensa!” -- Importa pouco, amiga, caso eu pense assim, assado, sendo uma burgueza ou simples operaria quem, por breve periodo, negasse seus carinhos ao macho. Mas eu acho que os attrazos tiravam alguns, digo mesmo muitos, entre elles mesmos. Sendo masochistas ou sadicos, curtir vão o seu par e facil ficarão fans das orgias, gostando tanto, tanto, que, appós septe manhans, da mulherada prescindiam... Não acha perigoso? Ou sapatões serão ellas? Você rollas dispensa?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SOCIALISTA [0258] {Eu acho um desrespeito que se chame menor de “trombadinha”, de “pivete” ou mesmo de “infractor”! Só de “carente” acceito que se chame, Glauco! Ouviu você, na sua vida, alguem chamar maior de “trombadão”? Eu puta fico, pois, sendo uma assistente social, quero uma sociedade mais humana, mais justa, que não puna adolescentes com pena de prisão! Glauco, lhe digo com toda a minha practica no tracto com elles: muito triste é ver meninos reclusos, masturbando-se escondidos, com medo de exporrar do monitor na frente! Não lhe causam dó, tambem?} -- Si causam! Sem alguem que o pau lhes mamme, que faça a quelle lubrico boquette, é mesmo um desperdicio de semente, né? Vamos combinar! Si quem pariu foi puta, não importa. Si tem lar christão ou não, tambem. Menino rico não vae para a prisão. Quanto a mim, mal num delles penso, sinto o que lhe emana dos tennis encardidos... Repellentes não acho uns pés daquelles, pois consigo cheirar tal chulezinho num pé chato, ainda que em imagem. Fescenninos poemas tenho feito, de bandidos tractando, mas você tem mais amor a dar-lhes, certamente. E fará bem.
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106 MANIFESTO DIVISIONISTA [0259] “Não curto o Lennon, não. Sou mesmo louca é pelo Macca! Sabe, Glauco? Os dois brigaram! A favor eu sou da Linda, jamais da Yoko! Nisso por fallar, tractando-se de Beatles, lhe pergunto: Das duas, qual é, Glauco, a melhor banda discipula? Responda neutramente: Badfinger ou Raspberries? Fallar ouço que Lennon foi Raspberries, mas o Macca curtia mais Badfinger! E você?” -- Magina! Curto as duas! Acho pouca, na musica, a importancia de nos bois dar nomes como “oppostos”. Mais ainda: Teem ambas repertorio singular, melodico, opulento. Nesse assumpto vantagem só dou mesmo a quem mais manda na voz, pois Eric Carmen evidente seu tymbre tem do Macca. Calabouço mental é desprezar quem se destacca mais nisso ou mais naquillo. Cê não vê?
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SEPARATISTA [0260] {Alem de ouvir do golpe do bahu fallar, ouço do golpe da barriga! Assim não é possivel! Mãe eu sou, casada, monogamica! Não posso com isso concordar, Glauco! Porem, não é que minha prima, alem de dar taes golpes, defensora até se faz daquella “alienação” que “parental” se chama por ahi? Sim, ella diz que os filhos teem pae bicha, pae veado! Na cara delles falla, Glauco! Pode?} -- Magina! Que barraco! Ja no cu tomar ouvi que mandam uma amiga que tenho, mãe tambem. Não, nunca dou razão a quem nos filhos esse troço inculca, por vingança contra alguem que conjuge ja fora. Não que um lar eterno que ser deva, mas as más e sujas linguas fazem dum casal motivo de desdem. Mais infeliz se mostra quem xingou. Ninguem do lado lhe fica. Quem maldiz é quem se fode.
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108 MANIFESTO MODERNISTA [0261] “Mas, Glauco, o decasyllabo ficou de todo ultrapassado! Não seria equivoco occupar-se delle tanto? O verso libertar-se necessita!” -- Não acho que estou preso nem que estou parado no passado. Poesia depende do poeta, cujo canto tem regra, caso a queira mais restricta. “E quanto a alguma eschola, Glauco? Vou batter nesta questão. Qual theoria seguir? Qualquer corrente, em cada cantho do mundo, um jeito novo sempre dicta!” -- Sem duvida que as modas dão seu show no plano collectivo, mas confia o bardo no seu tacco. Eu me garanto no metro e na memoria, que é maldicta. “Insisto nisto, Glauco! Valor dou à quebra de tabus! Em qual orgia, vigente, exsiste norma? Alguem, emquanto fornica por tesão, peccar evita?” -- Quem disse que não pecco, que não sou perverso ou pervertido? Si na via vão todos do “moderno”, o menos sancto aqui sou eu, que todo mundo cita...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO DESHUMANISTA [0263] “Não creio que tu devas te envolver só com perversidade e perversão, meu caro Glauco! Vejo tua lyra tractando unicamente desses themas nojentos, violentos, chulepentos... Paresces obcecado com tal lado da vida, como si outro não houvesse! Precisas pensar, Glauco, na faceta humana das pessoas, na bondade que exsiste ‘inda nos homens, por Jesus! Ou achas que sensato não me faço?” -- Te fazes, com certeza. Mas dever eu tenho, como bardo, de ver não appenas as bondades de mentira. Tambem dos mais veridicos problemas eu tracto. Não descharto os bons momentos, mas, como vês, sou cego, revoltado, maldicto. Ja perdi tempo com prece inutil, com protesto. Na trombetta a bocca ja puz muito. De maldade, porem, quando te fallo, lingua puz na chaga. A mais denuncia dei espaço...
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110 MANIFESTO SCIENTIFICISTA [0267] “Odeio gente supersticiosa, odeio, Glauco! Odeio essa mania de tudo pelo sobrenatural querer justificar! Está na cara: vampiro, lobishomen ou phantasma, é tudo só crendice! Não exsiste! Qualquer parapsychologo exclaresce phenomenos do typo! Um lycanthropo, um simples hematophago, qualquer de nós identifica de maneira methodica, com technicas de poncta! Odeio gente estupida, Glaucão! Odeio, odeio, odeio! Ou ‘tou por fora?” -- Melhor reputação um sabio goza si for um scientista. Quem se fia no Alem, porem, achar sempre normal irá toda figura que compara a alguma apparição que os olhos pasma. Por mais que um padre ou medico despiste taes crenças, uma lenda sempre cresce. Mas noto que você, no seu escopo moral, perdeu a calma, né? Não quer um chymico composto? Ou talvez queira algum tranquillizante mais em compta... Relaxe! Está tão tenso! Um odio não resolve o que a razão não corrobora...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO POPULISTA [0271] “Fundei um syndicato, Glauco! Agora, sim, posso ser aquella activa voz da minha tão soffrida, dessa tão fiel categoria dos que vivem sem trampo ou profissão! Ja lhes prometto a todos, todos, todos, Glauco, todos, que, em breve, terão todos um battente! Cobrar vou trez reaes, trezinhos só, por isso, mas garanto -- Ouviu? -- garanto que, ao menos, vou tentar! Que sou sincero tem duvida você, Glauco? Quem tem?” -- Eu, duvida? Magina! Fico fora da sua alçada, amigo. Como nós sabemos, sou invalido, funcção nenhuma tem um cego. Mas activem vocês a sua lucta, sim! Sonnetto nem faço mais, mas, livre dos engodos da classe, recommendo que ‘inda tente fazel-os um novato. Caso o nó não aptem nem desaptem, nem ao sancto pedindo, lhes direi: Ganhei foi zero mas nunca peço um obolo a ninguem...
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MANIFESTO SURREALISTA [0274] “Quem disse, Glauco, que isto aqui tem nexo? Estamos numa nuvem, Glauco! Entende? A nuvem modifica a sua forma o tempo todo, muda, vae mudando... Agora, seu leitor sou. Admanhan você se converteu num chimpanzé, num mico ou num chupim de penna preta! Penico, de repente, você vira, de bocca para cyma, para baixo, ou vira aquella timida ovelhinha, chorando p’ra mammar no branco bode, que fica colorido num instante e, feito borboleta, voltas dá por cyma dum estadio lotadinho de gordos lenhadores! Glauco, o cravo não briga com a rosa, não brigou jamais! Foi a roseira que de espinho se encheu e fez a cama na varanda! Sacou, Glaucão? Cabeças, temos dez!”
MANIFESTOS E PROTESTOS -- Uau! Você me deixa, assim, perplexo! Caralho! Desse jeito, cê me rende, me envolve e me convence! Cê me informa que viro um urinol? A seu commando, então, bebo xixi? Fiquei seu fan! Será que cheirarei o seu chulé? Será que, no assum preto, caso metta a rolla, aquelle passaro não tira aquillo mais da bocca? Si me encaixo na sua descripção, terei a minha boquinha penetrada? A rolla fode até me suffocar? Fode bastante? Estou maravilhado! Venha ca: você ja poz em practica, amiguinho, as coisas que imagina? Fez de escravo alguem ja nesta vida? Do seu show fez parte, vez alguma, algum ceguinho que disso fez tremenda propaganda? Ainda não? Pois tente! Espiche os pés!
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MANIFESTO BAIRRISTA [0275] “Sabia, Glauco? Aqui no Rio exsiste tambem a Penha, a Lapa, a Freguezia, a Praça da Republica, a avenida chamada Rio Branco, o SESC, a PUC... Si tudo é tão egual, por que será que aqui temos feitiço sem farofa, sem vela e sem vintem, que nos convem? Será porque São Paulo dá café, dá leite Minas, Glauco, mas a Villa dá samba? Noel Rosa ainda a gente podia argumentar que tem razão? Nós temos mesmo um traço differente?” -- Teem, claro. Nunca falta o que conquiste o nosso amor ao Rio. O que premia a fama da cidade não valida, porem, nada que a gente fez no muque, no cerebro ou na grana, boa ou má. Aquillo que o poeta mais estropha é a matta, o mar, o morro, o que nos vem da propria natureza. Jamais é dos homens que provem essa tranquilla noção que maravilha a nossa mente. Noel, vale lembrar, foi excepção. Mas, cego, sou à these indifferente.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO OBSCURANTISTA [0278] “Pensando bem, Glaucão, não é preciso na rede virtual navegar tanto! Nas redes sociaes, menos ainda! Só servem de fofoca, fake news! Os proprios cellulares, si você for ver, desnecessarios são, tambem! Até computadores eu dispenso! São machinas inuteis, que attrapalham mais mesmo do que adjudam! Cê não acha? Não, Glauco, pense aqui commigo: tudo aquillo que se escreve e se publica accaba deschartado! Não seria melhor nem publicar? Pensando bem, durou todo um millennio a Edade Media por causa da leitura que não tinha aquella gente toda! Que belleza! Que calma! Que sossego! Que delicia!” -- Não era bem assim. Esse juizo seu falha quanto à calma. Seu encanto talvez se deva à practica bemvinda que, dentro dos mosteiros, os menus mantinham da cultura que se lê até no nosso tempo. Mas ninguem tem duvidas accerca desse extenso periodo de trevas. Só trabalham os servos e os senhores cobram taxa daquelles que ja nada ganham. Mudo, o povo obedescia à dura picca dos poucos poderosos. Não queria você ser do povão, não é? Porem si fosse algum feudal senhor, comedia na certa achava aquella van vidinha. Estou com você nessa. Con certeza seria seu escravo. Sem malicia...
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MANIFESTO OLAVISTA [0279] “Não, Glauco, o Olavo sempre faz attaque com base e com vigor! Dou-lhe razão em tudo quanto cause discussão e mexa com os criticos de araque!” Olavo, p’ra guru, quero o Bilac e mesmo a elle opponho restricção em certos ponctos. Quanto ao charlatão citado por você, não dou destaque. Que compte elle, na rede, com a claque mediocre que intriga faz, eu tão tocado nem fiquei. Faço questão, appenas, de deixar que o leitor saque. Está para philosopho o tal “craque” assim como o Capone está, menção se faça, a Gandhi ou Sartre. Sabichão do typo vende prosa de almanach. Concordo que elle deva soltar traque fedido. Usando tanto palavrão, na certa tem chulé que nem o Cão supporta, discutir isso não ha que. Portanto, quem quizer que se embasbaque com elle. Eu ja prefiro o meu Platão, meu Socrates, meu Sade e -- Por que não? -um “mestre” inculto, o ouriço que me applaque.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO BELLETTRISTA [0281] “Estão os escriptores a perder -- Que pena! -- pondo o merito da penna, carissimo, amicissimo Mattoso! Não pensas como penso, meu confrade? Agora não mais petalas desfolham, às flores alludindo, nem milagre vislumbram no crepusculo que empresta às tardes tal anxeio de saudade! Os passaros gorgeiam, cada dia, um tanto menos nessas ocas lyras! Não achas, caro Glauco? Que farão os novos ficcionistas, os poetas, si ja tão insensiveis ao encanto do lexico vernaculo comprovam ser todos? Não estás, tambem, descrente?” -- Descrente não estou, si por prazer alguem ainda escreve. Quem condemna as lettras actuaes quer -- é forçoso dizer -- menos auê, menos vaidade, e menos internet. Elles nem olham, os novos, para alguem que se consagre depois de morto. Querem fazer festa agora, aqui, na rede, eis a verdade. Mas nada ficará dessa alegria precoce e juvenil. Fora as mentiras que são taes litteratos, não sou tão descrente, pois vão sempre alguns esthetas manter os bons valores, entretanto. Correntes e tendencias se renovam, mas creio em quem os classicos sustente.
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118 MANIFESTO DETALHISTA [0282] {Você disse que curte muito um video pornô que exhibe um gordo copulando na bocca dum ceguinho, o qual engulha. Notei que, quando param de chupar, as lubricas actrizes que lhes foda a bocca ao macho pedem: “Fuck my face!” Não dizem “Fuck my mouth!” e sim o rosto. O macho então começa a, para dentro da bocca das garotas, socar sua caceta até gozar. É sempre assim. Pergunto-lhe, Glaucão: Do que mais gosta, ainda, chupar pau ou chupar pé? Acaso ja deixou alguem foder a sua bocca, typo lhe bombar o pau sem que você mexa a cabeça? Consegue aguentar firme, sem engulho?} -- Qualquer um quer foder, caso convide-o, a bocca delle, della, a seu commando. Se chama “irrumação” quando algum pulha se deixa pelo macho penetrar. Ja fui, sim, penetrado. Quasi toda a rolla affundou, quinze, dezeseis centimetros. O cara foi com gosto! Sim, quasi vomitei. Mas me concentro bem nessas horas. Quasi que recua a gente, mas aguenta. Para mim, difficil foi, pois, cego, dar resposta não posso, negativa. Melhor é lamber, num pé, chulé sem responder negando, mesmo quando o calcanhar tem grossa casca preta, a sola espessa camada de sujeira. Até me orgulho...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO TRADICIONALISTA [0283] “Assim não dá, não, Glauco! O café ja não é -- Que pena! -- aquelle que eu gostava bastante de tomar! Alguem está limão, alho, maçan, maracujá com elle mixturando! Virou brava bagunça! Delle, indago, o que será?” “Espresso, o que eu cansei de tomar, -- Ah! -ja quasi nem exsiste e se conchava que deva accabar, Glauco! Não que eu va parar de tomar! Isso não é la motivo tão terrivel nem me trava de todo o paladar, mas é fé má!” -- Entendo o seu pesar. Vontade dá de versos lhe compor. Não precisava crearem disso tanto bafafá. Bastava addicionarem uma pa de novos typos, sem mandar à fava o velho café. Vamos tomar cha?
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MANIFESTO UTILITARISTA [0295] {Fallar vou o que eu acho, Glauco, e prompto! Por serem portadores dessa... dessa... fatal “necessidade especial”, os cegos ter ja pensam um direito maior do que os normaes, que estão accyma de taes defeituosos! Veja só! Ninguem de “especial” não tem é nada appenas porque nasce com defeito ou, muito menos, sendo perdedor dalgum sentido, um membro, uma funcção! O cego necessita ser mais util àquelle que visão tem, isso sim! Precisa compensar a charidade que ganha, apposentado ou mendigando! Precisa trabalhar dalguma forma! Fallei besteira, Glauco? Por acaso você vae se sentir mais offendido por causa da franqueza dum leitor? Offenda-se com Elle, então, que fez tal coisa com você! Commigo, não!}
MANIFESTOS E PROTESTOS -- Podia me offender, mas dou descompto, tractando-se daquillo que interessa a mim como poeta que abnormal se julga. Masochista, me subjeito a alguem que pensa assim, só pela estima que nutro por um sadico sem dó, sincero, ou espontaneo. Estou é cada vez mais accreditando num subjeito assim como você, caso suppor eu possa que lhe causo algum tesão, ainda que capricho mero, futil, preencham-lhe meus actos, no que vim faz tempo practicando. Que lhe aggrade ha coisa que eu capaz seja, a seu mando, de bem executar? Que bem performa tarefa alguma a bocca deste raso ceguinho -- ficaria convencido você disso, talvez? Si Zeus me for punir, mais do que ja puniu, talvez melhor me fosse dar-Lhe mais razão...
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MANIFESTO DESILLUMINISTA [0299] {Caralho, Glauco, porra! Tu não pensas que um despota não deve nem precisa ser culto ou, propriamente, “exclarescido”? Um lider, si for firme e auctoritario, precisa ter colhão! Ou tu discordas? Tambem, si discordares, vae à merda! Mas dize-me, Glaucão, para que serve a porra da cultura? Tu, que cego ficaste, falta sentes da leitura? Não basta a ti meus pés massagear? Então, Glaucão! Um coppo mais de vinho e posso concluir o raciocinio... Que merda! Me exquesci donde eu estava! Te lembras, Glauco, disso que fallei? Ah, foda-se! Que importa? Agora quero tirar uma pestana, addormescer, sonhar que, como sempre, sou tyranno, sou grande dictador! Tu, que me dizes?}
MANIFESTOS E PROTESTOS -- Massagem nos pés pode essas doenças mentaes alliviar, digo-lhe à guisa de thema ao responder. Mas não duvido da sua tyrannia, não. Otario seria si perdesse eu o melhor das banaes occasiões em que, na lerda passagem duma tarde, quando ferve o clima de mormaço, no seu ego applico uma massagem. Sim, sem cura é minha condição, mas meu azar compenso nestas horas. Um pouquinho de vinho tambem quero. Posso? Opine o que venha à sua mente. Não nos trava a lingua mais um gole. Bem, um rei você disse querer ser, um severo monarcha, alguma coisa que o poder envolva, né? Fallou, si não me enganno, você disso. Mas somos, ja, felizes...
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124 MANIFESTO SARRISTA [0300] “Permitta-me dizer: você provoca na gente, caro Glauco, uma tremenda vontade de gozar, de tirar sarro! Um cego tão escroto nunca vi! Cegueira, por si mesma, bom motivo de riso causa àquelle que vê bem, mas quando um cego o comico papel faz, como no seu caso, gargalhadas de gozo nem consigo reprimir! Pudera! Reprimir p’ra que? Bem faço!” -- Sim, claro. Mas melhor faz si a piroca tirar você p’ra fora, não se offenda, e boa punhetinha batter. Narro ja muita scena assim, sobre quem ri da minha condição. Ja que me privo de tudo que você desfructa, sem problema aguento quando sou, ao bel prazer do seu humor, thema às piadas. Não perca, pois, a chance, que engolir consigo um pau, emquanto sou palhaço...
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MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SEXORALISTA [0303] {Sei por experiencia propria, cego: um pau os travestis chupam melhor que muita mulher! Numa festa ja flertei com um bonito -- ou mais bonita que muitas putas, Glauco! Sussurrei em seu ouvido: “E então? Quer me chupar com essa bocca linda que me excita?” Nós fomos ao banheiro. Ahi tirei p’ra fora a rolla. Aquella gatta fez na vida a chupetinha mais gostosa que tive! Percebi, cego: uma puta não chupa assim tão bem, tão delicada nos labios e na lingua! Se empenhava bastante na cabeça, até que, emfim, na hora de gozar, me punhetou de leve com a bocca. Ah! Que deleite! A porra foi todinha para dentro daquella gargantinha! Arrancou minhas golfadas sem perder nenhuma gotta! Assim é que se faz! Não como as putas, que não se especializam em tirar a porra dum caralho numa bronha buccal tão bem battida, cego! Ou não? Você não sente inveja dum traveco? Queria no logar della ficar? Que gloria para um cego chupador, não acha? Performar com sua bocca aquillo que faria com a mão alguem que se punheta, não é facto?}
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126 -- Razão, caro Diego, não lhe nego, pois desses argumentos sei de cor. Esposas, namoradas, não está ninguem de fora nessa. A favorita chupeta, quem faz mesmo, alem do gay, é a mais transexual, essa exemplar mulher que ja foi homem. Quem imita, usando a propria bocca, como usei, aquillo que sentiu alguma vez no pau, quando chupado, melhor dosa os toques labiaes, linguaes -- labuta que puta alguma nunca fará, nada egual, jamais, ainda que de escrava se faça. Nada novo, para mim. Ao cego, ja faz parte de seu show mostrar-se efficiente. Que approveite quem delle se servir! Eu me concentro e faço meu melhor, não nestas linhas, appenas, mas tambem na mais escrota das practicas buccaes, sob ordens brutas, bebendo mijo, ouvindo o mais vulgar e chulo commentario, sem vergonha nenhuma, adjoelhado pelo chão. Inveja sinto, claro, mas eu secco, tal como o travesti, meu paladar curtindo, o doce semen de sabor salgado, amargo, ou acre. Jamais oca a bocca dum ceguinho fica, tão fatal a vocação que tem ao acto.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PRAGMATISTA [0318] {Não dava. Não dará. Não deu. Não dá. Não vae dar nunca para a corrupção p’ra sempre combatter, nem totalmente, Glaucão! Sabias disso? Quem se elege com essa bandeirinha de campanha só pode, ja no cargo, de cinctura ter jogo, do contrario, ou renuncia, ou morre, ou é deposto! Si “impedido” ou “victima dum golpe”, differença nenhuma faz, meu! Essa a realidade que lados extremistas nunca vão com ella conviver, meu cego bardo! Ou pensas differente, meu ceguinho?} -- Bem... Janio, Jango, Collor, Dilma... Ca p’ra nós, motivo deram para não chegarem ao final dum coherente mandato. Sim, a formula que rege as quedas é bandeira, mais façanha frustrada, combinadas com a pura e simples percepção, no dia-a-dia, de impopularidade, eis o sentido de tudo. Sei bem disso. Mas, na crença do povo, sempre espera a gente ca, de alguem mais messianico, missão de patrias vir salvar. Eu desse fardo fugi. Mais vale o rhumo que o caminho.
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MANIFESTO METEORISTA [0319] “Você concorda, Glau, que ninguem vê a merda como coisa comestivel? Então! Si ninguem topa aquillo entrando na bocca, como acceitam sentir cheiro daquillo no nariz entrando, Glau? Ninguem acceita, não, Glau! Cê percebe por que que peido offende tanto, Glau? Ahi que eu entro! Gosto de peidar nas horas, nos logares mais lotados de gente, Glau! Adoro ver que vão meus gazes engolir, sentir o gosto do cheiro! Sim, no fundo, o peido offende por causa disso, Glau! No fundo, comem cocô virtualmente, Glau! Entende o gozo que me dá peidar assim, anonymo, civil, socialmente?” -- Concordo plenamente com você. A coisa justamente nesse nivel eu vejo. Um thema desses, nada brando, meresce ser tractado com inteiro enfoque intelligente, em alto grau de senso philosophico. P’ra plebe, assumpto desse typo nem é mau, pois acham engraçado que, no bar de exquina, na calçada, alguem, aos brados, reclame do fedor da digestão mal feita, da batata doce, rosto franzido, do pheijão que sempre rende mais gazes, do repolho, quando um homem assume que comeu... Claro, ninguem, de bom grado, cheirará coisa ruim. Por isso dão risada de quem sente...
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CRIMINALISTA [0322] {Lhe conto, Glauco, tudo bem do jeito que estava accontescendo. O criminoso da epocha não era, como agora, “soldado” da facção, embora agisse em bando. Então, o “modus operandi” do assalto a residencias incluia um typico sadismo no que implica “zoar”, “barbarizar”, “esculachar”: as victimas, em casa sequestradas por certo tempo, viam-se forçadas a torpes e humilhantes situações.} {Ninguem hoje se lembra, mas affeito ficou o bando armado a algum famoso e sabio pae-de-sancto que, na hora dos passes no terreiro, por crendice geral impõe que o “mano” sempre mande a victima sujar-se em porcaria fecal, beber xixi, chupar a picca mijada, comer merda, no logar se pôr da prostituta, gargalhadas ouvindo, vendo filhas estupradas por brutos e malvados bandidões.}
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130 {Você percebe, Glauco, que o subjeito se sente “protegido” quando o gozo sacia, tendo o corpo, sem demora, “fechado” quando goza, como disse à midia a magistrada, que de grande saber se jacta. Claro que, hoje em dia, nenhum desses chavões se justifica. Mas isso não impede que algum lar ainda alguem invada com saphadas e porcas intenções, euphemizadas na midia com identicos chavões.} -- Percebo, sim, sem duvida. Approveito taes casos em meus versos, pois Mattoso é marca registrada que não cora no tracto do problema. Nem tolice eu acho os ritos afros, nem quem ande fechando o corpo otario, que dum guia joguete seja. A fonte é muito rica. Si for superstição, si for vulgar ou não, materia prima às desvairadas rhapsodias me tem dado, que inspiradas são tanto por Satan quanto Camões.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO SEXISTA [0323] “Ahi, gostosa! Quero lhe comer a chota! Arrombar tudo o que você não abre, sua vacca! Cê não nota, peituda, bocetuda, nadeguda, que eu morro de tesão? Você devia suppor, adivinhar! Devia até pedir para chupar o meu caralho, cadella, vagabunda! Ah! Volte aqui! Não fuja, pistoleira do cacete! Ahi, Glauco! Não fallo que essa nova facção da mulherada nem escuta mais quando grito ou chamo de gostosa alguma pela rua? Ah, Glauco! Falla bem franco: cê não acha a maior pena?” -- Achar, eu acharia, a bem dizer, si fosse do Roy Orbison o que você põe para fora, mas remota seria qualquer chance de, desnuda, a moça a você vir, nessa macia linguagem, chupar rolla, lamber pé, em summa, tudo aquillo a que eu bem calho, modestia à parte, claro. Você ri, mas sabe que um ceguinho do macete entende, pois ja teve disso prova. Emfim, quando mais nada com a puta do bairro cê consegue, bem que goza de forma alternativa, bem que a galla exguicha, à bocca grande, e não pequena...
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MANIFESTO DESASSISTENCIALISTA [0324] “Não acho justo, Glauco, que alguem ganhe sem nada dar em troca! Quem chancella tal coisa é trouxa! Cego não tem nada que estar nos exigindo um tractamento melhor, mais attenção, nem mais direito que aquelle que trabalha normalmente, que rende e que produz, Glauco! Ora, bollas! Agora, porque é cego, o gajo vae querendo se exemptar de tudo quanto é duro ou é difficil? Que se foda! Se vire com o braille! Estude! Exforço demonstre, porra! Apprenda a ler na marra naquella porcaria de systema primario, ponctilhado, ou que se ralle!” -- Magina, amigo! Quando a sua mãe ficar cega, você diz isso a ella, seu filho duma pura desgraçada! Que muitos assim pensem, nem lamento, pois vivo ouvindo alguem dizer: “Bem feito!” “Castigo meresceu!” “Você que aguente!” Ja vi, ja trabalhei, e das esmollas, por sorte, não dependo, mas quem sae na rua a mendigar, ou que do manto depende do governo, terá toda a minha solidaria these! Eu torço por elle, mesmo quando alguem me excarra na cara porque eu quero, alguem é thema da minha chupetinha... Tudo vale!
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CONSTITUCIONALISTA [0327] {Que coisa, Glauco! Onde é que a gente vae parar com essa clausula que dizem ser “petrea”? Não se pode mexer nisso? Magina! Como assim? Então si alguem puzer na Charta Magna que “veado” só pode ser chamado de “pessoa de livre orientação que optou por ter tendencia homoerotica”, ninguem mais pode designal-o como “bicha”? Si assim for, eu prefiro que essa tal de “clausula” consagre que tem pena de morte no Brazil! E ja que querem chamar de “petrea”, que essa morte seja por appedrejamento, Glauco, porra!} -- Espere ahi, que assim você se trae! Va la que sempre eu peço que me pisem, mas nunca vou prestar um desserviço dizendo que ninguem agora tem direito de exigir-se respeitado! Ainda que um careta a mais se doa, nós temos que incluir nosso prazer em termos de direito, mesmo sem babacas euphemismos. Nessa ficha cahida não está qualquer penal nem maxima sentença, nem condemna ninguem nenhum “peccado”. Si puzerem aquillo que deseja alguma egreja, logar nenhum se chama mais Gomorrha...
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134 MANIFESTO TROCISTA [0328] “Eu quero mais é que esse povo todo se foda! Quem mandou fazerem meu poetico cursinho, Glauco? Os caras achavam que eu seria algum poeta? Foderam-se! Tomaram no cu, Glauco! Bem feito! Sabes, Glauco? O que eu estou é mesmo só cagando e andando para o mundo litterario! Quero o bicco rachar de rir daquelles idiotas que pensam que ser bardo o cara apprende! Entendes, Glauco? O Olavo ja me disse que estava a fim appenas de trollar! Por isso resolvi que divertido será si eu imital-o nessa troça! Conhesces, Glauco, o caso do subjeito que disse que fallava javanez? Então! Annunciei minha officina e um monte de imbecis accreditou que sou um professor, Glauco! Não é gozado? Que se fodam, Glauco, porra!”
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS -- Sim, li Lima Barreto. Não me fodo com elles, pois ninguem curso me deu de bardo ou trovador. Si minhas taras alguem quer ler em verso, nada affecta a vida no planeta. Não desfalco nenhum banco, não fraudo. Quem fallou que faço merda accerta mesmo, cara! Estou aqui p’ra isso. Justifico, portanto, o meu curriculo. Sabotas a scena litteraria, sim, mas quem de golpista te chamou disse tolice. Tu fazes dadaismo, cara! Achar quem seja nosso otario não duvido que fique muito facil. O que endossa teu curso é isso. Dizes que é bem feito. De facto. Bem fizeste, como o fez quem, dando uma officina fescennina, comeu o cu de todos que no show do cara confiaram. Si ballé tu queres leccionar, danse quem morra...
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GLAUCO MATTOSO
MANIFESTO ACHISTA [0329] “Tu queres saber, Glauco, o que é que eu acho? Eu acho que essa gente palpiteira passando vae da compta! Ja não falta mais nada! A coitadinha da cantora não pode dar siquer opinião accerca do poeta predilecto? Magina, Glauco! Onde é que a gente vae parar? Eu, por exemplo, ja não posso achar que o Mario tinha pé mais chato que o pé do Oswald? Então preciso ser um medico legista? Ah, faz favor! Ninguem quer exhumar ninguem, Glaucão! Appenas um conceito levantando estou! Que pensas disso tu, poeta?” -- Estás certo. Não vejo como excracho fallarmos desses themas. Só me cheira a pura caretice que essa malta nos fique patrulhando, qual si fora absurdo que especulem si pezão um tinha, ou outro. O Mario eu interpreto mais como um pé pequeno. Um grande cae melhor no Oswald, e explico o que do troço eu penso: ja que Mario era mulato, teria pé menor, nesse entender da turma anthropologica. Suppor o opposto tambem vale, caso não concordem que taes theses eu abbrando. Não erra quem appenas interpreta.
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO NACIONALISTA [0330] {Paiz do faz-de-compta somos nós, segundo diz você, Glauco. Ou será paiz inexsistente, que esperando está pelo futuro, sempre e nunca? Ah, Glauco, quer saber? O brazileiro nem liga para aquillo que se chama orgulho patriotico! O problema está no nosso lemma: jamais pode ser “ordem e progresso” sendo o nosso povão tão desordeiro, ou sendo tão retrogrado o governo! Nosso attrazo e nosso carnaval, bagunça, digo, são marca registrada, que conflicta com essas palavrinhas sem sentido! Notou incoherencia, né, Glaucão?} -- Notei, naturalmente. Mas a voz poetica trabalha, como eu ja affirmo faz um tempo, pendulando por entre extremos. Somos espelunca do mundo; de repente, um artilheiro qualquer do futebol alcança a fama e então o mundo todo que nos tema! A gente só se queixa que se fode, mas gaba-se daquillo que não posso chamar de “ser alegre”, pois sinão terei que “masochista” achar que é caso de rotulo servir, eis o perigo, a todo brazileiro. Si maldicta é minha voz masoca, até duvido si é sadico o restante da nação...
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138 MANIFESTO COLLECTIVISTA [0340] {Nós somos altos, baixos, Glauco, mas si somos magros, gordos, mesmo si nós formos pobres, ricos, Glauco, faz alguma differença? Não! Aqui na Terra, até pessoas boas, más si formos, temos algo em commum! Li ja muito, Glauco, e ainda que me vás a these contestar, ja conclui que appenas em conjuncto pela paz podemos combatter, nunca por si luctando cada qual, como quem traz a braza ao proprio peixe! E quanto a ti?} -- Não quero parescer-te descortez nem quero da questão ser urubu, mas acho que em commum nunca se fez justiça nem governo bom. Bem nu e nu te digo: pode ser burguez o gruppo, ou operario, que tabu será sempre esse thema. Toda vez que varios eus convivem, um rebu se installa. Até si todos em inglez se entendem, não serei eu como tu naquillo que queremos. Como vês, sem paz todos irão tomar no cu.
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO INDIVIDUALISTA [0341] “Bobagens, Glauco! Pouco vale sermos humanos todos! Vale tão somente aqui sermos quem somos, ou melhor, ao menos que sejamos quem pensamos que somos! Glauco, uma autocognição é coisa para poucos! Que se foda quem pensa pertencer a qualquer gruppo, nação, religião, facção, povão! Mal sei como meu proprio cu funcciona! Ainda perder tempo vou com gente maria-vae-co’as-outras, Glauco? Vão tomar todos no rabo! Penso só por minha cabecinha, melhor digo, por minhas cabecinhas! As vaquinhas que fiquem no presepio collectivo!” -- Em parte até concordo com seus termos, mas mesmo tendo mente independente de livre-pensador, ao meu redor percebo dos demais os seus reclamos, com elles me comparo, dou razão a muitos excluidos, pois ha toda especie de injustiça. Me preoccupo com isso, o que me torna quasi irmão daquelles que me entendem nesta zona. Si dizem que o poeta finge e mente, talvez seja por isso que noção melhor tenha daquillo que dá dó nos outros. Não concorda, meu amigo? Ainda que discorde destas minhas bobagens, com você sempre convivo...
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MANIFESTO ILLUSIONISTA [0350] “É tudo synesthesico, Glaucão! Confundem-se os sentidos, e eu te faço, bem facil, que os confundas, meu querido! Duvidas? Te approximo do nariz a minha meia e digo que se tracta de queijo gorgonzola! Adorarás o cheiro, pois não viste donde parte! Acchego-te ao nariz a minha picca, da qual arregaçada a pelle esteja, e um outro queijo o olfacto te dirá que seja aquelle sebo fedorento! Assim, nojo nenhum tu sentir vaes, appenas porque estás cego, meu caro! Não achas que engannar alguem é bem possivel, Glauco? O nosso proprio olhar tambem eu confundir posso, mas tu, que és cego, mais passivel és do truque...” -- Enganna-se você, somente, eu não. Não só não sinto nojo dum pedaço de queijo, como ouriça-me a libido o cheiro duma meia e bem feliz eu fico com a sua podre natta si cheiro tiver disso que um rapaz debaixo tem da pelle e, que me farte, permitte que eu confira a dada dica. Não quero questionar que você veja nos outros uns otarios, mas não dá tambem para fazer que tão nojento eu ache seu chulé, nem vou jamais achar que me trahiu meu fino faro. Fallar nisso, será que você tem de facto o odor no corpo que expalhar pretende? Qual o cheiro do seu cu? Me deixe provar, antes que eu encuque...
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO PERFECCIONISTA [0351] “Não, nada disso! Odeio coisa assim mambembe, improvisada, sem nenhum cuidado nem qualquer planejamento! Entenda, Glauco, o foco do problema: os novos poetinhas vão fazendo seus versos, sem limite nem tamanho, só param quando accaba de papel a folha ou quando a tela toda cheia ficou desse prolixo palavrorio! Pro lixo, sim, devia destinada ser toda a producção dessa gentalha que nunca se preoccupa com a forma final, com os retoques, a costura!” -- Até que entendo o foco. Bem ruim tem sido a poesia mais commum, mas ha que descomptar algo. Não tento junctar tudo num sacco. Quem exprema aquillo tudo, tira o que eu defendo, a titulo de succo, como um ganho, não como um prejuizo. Do pastel se salva algum recheio, mesmo feia que seja a prompta massa. Meio inglorio tem sido o resultado, mas de cada poeta achei um caso que trabalha a forma até que bem, que alguma norma ainda segue... O genero perdura!
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142 MANIFESTO PRECIOSISTA [0352] “Mas Glauco, não me basta que o poeta se exforce, em isolados casos, para seguir alguma norma, achar a rhyma, a metrica, no rhythmo ter cuidado! Exijo mais que mera perfeição final: quero que exsista uma chimera no seio da palavra! Quero o termo a dedo procurado entre centenas, até que esteja a obra realmente promptinha para della desfructarmos! Entende, Glauco, aonde estou querendo chegar? Esses poetas não teem gaz!” -- Não dá para cobrar tamanha meta dos novos menestreis! Magina, cara! Ja basta haver quem rhyme! Inda por cyma você quer do vernaculo um soldado que evite empregar mesmo o palavrão mais raro ou dephasado? Ora, tal era, aquella do Parnaso, “fudeu mermo”, diria algum dos rappers. Eu appenas registro ou selecciono. Tenho em mente o crivo natural. Quando chegarmos ao termino da decada, o que entendo por novo é velho. O tempo está fugaz...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO CLASSISTA [0354] “Mas sabe duma coisa? Desconfio que nossos ficcionistas nem noção siquer teem do que seja poesia! Não, Glauco, nem noção! Mario de Andrade foi, claro, uma excepção! Tambem, pudera! Fez conto, fez romance, mas tambem fez muita poesia! Quando vejo contistas referirem-se a poetas, o fazem com desdem, magina, Glauco! Nem sabem, com começo, meio e fim, contar uma historinha, e querem pôr no officio do poeta seu nariz adunco ou, raramente, arrebitado! Nós temos, nós, poetas, o direito de sermos desconnexos, elles não! Hem, Glauco, que você tem a fallar?” -- Jamais generalizo, pois do fio da trama narrativa muitos são senhores, sim senhor. Com alegria lhe digo que li muitos. Que me enfade ou mesmo desaggrade, delles era o minimo que achei. Sim, sempre alguem exsiste, badalado, que mottejo meresce e protecção tem, indirectas recebe com razão. Esse é, no palco, quem curte um holophote. Mas a mim paresce que quem seja bom auctor de conto saberá ler o que diz na lyra seu collega de riscado. Sem pé ser, nem cabeça, foi defeito de muitos, qualidade doutros, tão frequente quanto o vinho mau num bar...
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144 MANIFESTO CLASSICISTA [0355] “Não faço concessões, Glauco, jamais! Valor não dou nenhum a quem não leu os classicos, não tem cultura alguma artistica! Mas querem ser poetas, contistas, romancistas, o caralho! Me encara assim por que, Glaucão, por que? Por causa do caralho que fallei? Tambem caralho é classico, bem sabe você, que é fan de Sade e de Bocage! Ou nega as referencias que cê tem? Concorda ou não commigo quando digo que falta à geração maior leitura?” -- Concordo, claro. Sei que nem jornaes direito os caras leem, porem eu descompto dou no caso de quem duma peripha brava chega sem directas e cultas referencias, mas trabalho e estylo me revela. Só quem lê Genet saber irá, como ja sei, que pode erudição, por mais que gabe alguem, ser prescindivel. Quem reage com esse seu pernostico desdem paresce do calão ser inimigo, e não quem “pau” nos classicos procura...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO BELLICISTA [0356] “Putissima fiquei, Glauco, mas puta demais, Glauco! Não posso tolerar que estados tão potentes, como são nações americanas e européas, não partam para a guerra contra quem assim as desaffia! Glauco, chega de tanto terrorismo viralatta! Alguem tem que fazer alguma coisa, jogar a bomba atomica, attaccar com força mesmo maxima, Glaucão! Magina! Aquella gente que nem tem logar para cahir, morta da sylva, querendo provocar uma potencia tão grande, nuclear e de mercado! Não, Glauco, fico puta, não consigo com isso conformar-me, não, jamais!” -- Amiga, fique calma. Não discuta commigo, por emquanto. Vou jogar no coppo um pó tranquillo. Você tão calminha vae ficar, que taes idéas até vae exquescer. Sei que cê tem momentos mais instaveis, minha nega. Sim, vamos, beba tudo. Quem se tracta não fica assim, querida. Mas a dois a conversa se resolve e tem logar. Depois a gente pensa na nação dos outros. Nós tambem estamos sem logar para morrer. Não que o Brazil va entrar nalguma guerra, mas carencia não falta. A pessoal nosso cuidado requer e vou lhe dar meu hombro amigo. Dormiu? Que effeito fazem estes saes!
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146 MANIFESTO TRIBALISTA [0357] {Não, Glauco, não concordo que ja tudo teria que ser sempre “global”! Ora, dou muito mais valor à minha tribu, à minha subcultura! Não me venha dizer que somos todos irmãos, não! As tretas entre tribus são a prova cabal disso dahi! Sou punk e, como bom punk, odeio clubbers, que os skins tambem odeiam, Glauco! Mas odeio, por outro lado, um typico skinhead, excepto si for desses que de ska são fans, como qualquer dos rude boys! Emfim, Glaucão, não acho que sentido algum faz junctar tribus numa só cultura alternativa, ampla, geral, chamada de “irrestricta”! Cê concorda?} -- Concordo mas discordo. Meu estudo das tribus me levou a ver de fora questões tão especificas. Recibo não passo de racista nem resenha tolero com os nazis, mas irmão me faço do alleijado, o que comprova que estamos num só barco. Não me domo por essa tal cultura dos Jardins, de elite, que, excludente, do meu meio desdenha. Que os Jardins não são a sede dos ricos, ja faz tempo. Não será momento de junctarmos forças? “Nóis é nóis!” “Ói nóis aqui travêis!” Ruido nós temos que fazer, sinão sem dó seremos o quartel dum general qualquer, a poncta fracca dessa chorda...
GLAUCO MATTOSO
MANIFESTOS E PROTESTOS MANIFESTO NIHILISTA [0358] “Sobrar não vae é nada! Nada, meu amigo! Você pensa que será lembrado? Mas ninguem se lembrará de nada, aqui na Terra, Glauco! Sabe por que? Da nossa raça, dos humanos, ficar não vae vestigio, nem siquer um livro, um disco, um quadro, um casarão! Glaucão, vou lhe dizer, meu: va por mim! Desista! Rasgue tudo! Sim, delete ja todos os archivos! Pense só no doce, no torresmo, na pipoca, que em breve virarão mero cocô!” -- Talvez. É bem possivel que esse seu tristonho raciocinio, desde ja, se imponha. Mas a gente sempre está tentando se entreter. Até que accabe a vida no planeta, faço planos, projecto o meu futuro, por qualquer coisinha me emociono... Por que não? Adjuda a passar tempo... Tão ruim não é versos compor. Não nos promette bellezas o porvir? Da nossa avó pensemos no docinho! Quem evoca um disco não se exquesce do vovô...
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SUMMARIO POEMANIFESTO DA ANTIGYMNASTICA PREGUICISTA [2.13]..............9 MANIFESTO ESQUEERDISTA [2.23].................................11 MANIFESTO PACIFISTA [0068]....................................12 MANIFESTO ANTIFASCISTA [0069].................................13 MANIFESTO VANGUARDISTA [0073].................................14 MANIFESTO MASOCHISTA [0074]...................................15 MANIFESTO REVANCHISTA [0078]..................................16 MANIFESTO BOLSISTA [0079].....................................17 MANIFESTO FETICHISTA [0091]...................................18 MANIFESTO ALLARMISTA [0092]...................................19 MANIFESTO QUOTISTA [0093].....................................20 MANIFESTO CATASTROPHISTA [0094]...............................21 MANIFESTO HYGIENISTA [0097]...................................22 MANIFESTO ARMAMENTISTA ou ODE AO KAKI [0103]..................23 MANIFESTO EXPANSIONISTA [0108]................................24 MANIFESTO LAVAJACTISTA [0112].................................25 MANIFESTO COMMODISTA [0114]...................................26 MANIFESTO OPPORTUNISTA [0115].................................27 MANIFESTO POLYTHEISTA [0116]..................................28 MANIFESTO TRABALHISTA [0118]..................................29 MANIFESTO RELATIVISTA [0126]..................................30 MANIFESTO PESSIMISTA [0127]...................................36 MANIFESTO OPTIMISTA [0128]....................................37 MANIFESTO GOLPISTA [0131].....................................38 MANIFESTO CARREIRISTA [0133]..................................39 MANIFESTO CONTINUISTA [0135]..................................40 MANIFESTO TERRORISTA [0136]...................................41 MANIFESTO PHRASISTA [0138]....................................43 MANIFESTO POLEMISTA [0139]....................................44 MANIFESTO REFORMISTA [0142]...................................46
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OPPOSICIONISTA [0143]...............................47 COITADISTA [0146]...................................48 CONSUMISTA [0147]...................................49 PARLAMENTARISTA [0150]..............................51 AMBIENTALISTA [0151]................................52 IMMEDIATISTA [0159].................................53 SIMPLISTA [0160]....................................54 LEGALISTA [0165]....................................55 CAPITALISTA [0166]..................................56 REVISIONISTA [0172].................................57 ARRIVISTA [0173]....................................58 PRESIDENCIALISTA [0176].............................59 PURISTA [0180]......................................60 ONANISTA [0182].....................................61 SIONISTA [0184].....................................62 SAUDOSISTA [0186]...................................63 FEMINISTA [0187]....................................64 MACHISTA [0188].....................................65 SATANISTA [0190]....................................66 IMPRESSIONISTA [0193]...............................67 EXPRESSIONISTA [0194]...............................68 SYMBOLISTA [0196]...................................69 COMMUNISTA [0197]...................................70 IRRACIONALISTA [0203]...............................71 PLURALISTA [0205]...................................72 ALTRUISTA [0206]....................................73 EGOISTA [0207]......................................74 PROGRESSISTA [0208].................................75 SOLIPSISTA [0209]...................................76 INCONFORMISTA [0211]................................77 ELITISTA [0214].....................................78 HEDONISTA [0215]....................................79 URBANISTA [0216]....................................81 DECADENTISTA [0217].................................82 NATURISTA [0218]....................................83
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MONETARISTA [0220]..................................84 MONARCHISTA [0221]..................................85 GARANTISTA [0223]...................................86 PUNITIVISTA [0224]..................................87 GOVERNISTA [0225]...................................88 DIVERSIONISTA [0226]................................89 VOYEURISTA [0227]...................................90 EXCAPPISTA [0229]...................................91 EXHIBICIONISTA [0230]...............................92 ANILINGUISTA [0236].................................93 MINIMALISTA [0237]..................................94 REDUCCIONISTA [0238]................................95 EXSISTENCIALISTA [0250].............................96 IMPERIALISTA [0251].................................97 COLONIALISTA [0252].................................98 FUTURISTA [0253]....................................99 MANICHEISTA [0254].................................101 MATERIALISTA [0255]................................102 PROSELYTISTA [0256]................................103 GREVISTA [0257]....................................104 SOCIALISTA [0258]..................................105 DIVISIONISTA [0259]................................106 SEPARATISTA [0260].................................107 MODERNISTA [0261]..................................108 DESHUMANISTA [0263]................................109 SCIENTIFICISTA [0267]..............................110 POPULISTA [0271]...................................111 SURREALISTA [0274].................................112 BAIRRISTA [0275]...................................114 OBSCURANTISTA [0278]...............................115 OLAVISTA [0279]....................................116 BELLETTRISTA [0281]................................117 DETALHISTA [0282]..................................118 TRADICIONALISTA [0283].............................119 UTILITARISTA [0295]................................120
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DESILLUMINISTA [0299]..............................122 SARRISTA [0300]....................................124 SEXORALISTA [0303].................................125 PRAGMATISTA [0318].................................127 METEORISTA [0319]..................................128 CRIMINALISTA [0322]................................129 SEXISTA [0323].....................................131 DESASSISTENCIALISTA [0324].........................132 CONSTITUCIONALISTA [0327]..........................133 TROCISTA [0328]....................................134 ACHISTA [0329].....................................136 NACIONALISTA [0330]................................137 COLLECTIVISTA [0340]...............................138 INDIVIDUALISTA [0341]..............................139 ILLUSIONISTA [0350]................................140 PERFECCIONISTA [0351]..............................141 PRECIOSISTA [0352].................................142 CLASSISTA [0354]...................................143 CLASSICISTA [0355].................................144 BELLICISTA [0356]..................................145 TRIBALISTA [0357]..................................146 NIHILISTA [0358]...................................147
Titulos publicados: A PLANTA DA DONZELLA ODE AO AEDO E OUTRAS BALLADAS INFINITILHOS EXCOLHIDOS MOLYSMOPHOBIA: POESIA NA PANDEMIA RHAPSODIAS HUMANAS INDISSONNETTIZAVEIS LIVRO DE RECLAMAÇÕES VICIO DE OFFICIO E OUTROS DISSONNETTOS MEMORIAS SENTIMENTAES, SENSUAES, SENSORIAES E SENSACIONAES GRAPHIA ENGARRAFADA HISTORIA DA CEGUEIRA INSPIRITISMO MUSAS ABUSADAS SADOMASOCHISMO: MODO DE USAR E ABUSAR DESCOMPROMETTIMENTO EM DISSONNETTO DESINFANTILISMO EM DISSONNETTO SEMANTICA QUANTICA INCONFESSIONARIO DISSONNETTOS DESABRIDOS SONNETTARIO SANITARIO DISSONNETTOS DESBOCCADOS RHYMAS DE HORROR DISSONNETTOS DESCABELLADOS NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES A LEI DE MURPHY SEGUNDO GLAUCO MATTOSO
São Paulo Casa de Ferreiro 2021