MOLYSMOPHOBIA: POESIA NA PANDEMIA

Page 1



MOLYSMOPHOBIA: POESIA NA PANDEMIA



glgGLAUCO MAT TOSO

MOLYSMOPHOBIA

POESIA

:

NA PANDEMIA

São Paulo Casa de Ferreiro 2020


Molysmophobia: Poesia na Pandemia Glauco Mattoso © Glauco Mattoso, 2020 Revisão Lucio Medeiros Projeto gráfico Lucio Medeiros Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros

___________________________________________________________________________________ FICHA CATALOGRÁFICA ___________________________________________________________________________________

Mattoso, Glauco

MOLYSMOPHOBIA: POESIA NA PANDEMIA/Glauco Mattoso

São Paulo: Casa de Ferreiro, 2020 113p., 21 x 21cm ISBN: 978-85-98271-28-4

1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título.

CDD B869.1


NOTA INTRODUCTORIA

Mais que mero diario de quarentena, este volume constitue uma critica trajectoria em direcção da consciencia libertaria... e libertina, claro. Os cem dissonnettos que o integram foram compostos em 2020, o mais antigo, “Farra na marra”, em 15 de fevereiro. A partir de “Meme da mascara”, composto em 12 de março, os effeitos psychologicos da pandemia se traduzem em symptomas poeticos, bem ao estylo mattosiano. Sequencia natural dos volumes CEM NOVIDADES e VICIO DE OFFICIO, a presente collectanea reaffirma a obsessão do auctor pelo decasyllabo e pelo themario satyrico/fescennino.



MOLYSMOPHOBIA [6077]

Não é “misogynia”. Nada a ver terá com mulher. Pode ser tambem qualquer “rhypophobia”, que ja tem noção de sujidade e desprazer. Direi “mysophobia” por dever do officio, mas à mente tambem vem a “molysmophobia”, que refem me faz desse pavor de immundo ser. Estamos, na verdade, sempre em busca dum termo scientifico que embase a nossa paranoia nesta phase difficil, no temor que nos offusca. Prefiro crer na vida breve, brusca, que, na fragilidade, passa quasi sem tempo de que nosso tesão case com nossa luz fugaz, que mal corusca.

9


FARRA NA MARRA [5919]

Um typo cafageste eis que eu estudo faz tempo. Descrevel-o ora, aqui, tento. É cynico, orgulhoso. Tem nojento sorriso de desdem. Sorri de tudo. Briguento, mas covarde, elle é mehudo e finge luctador ser, violento. Alguns o rotularam de “marrento”, mas outros o chamaram de “marrudo”. Cruel e fanfarrão, abusa à bessa do fracco ou indefeso, que não pode, no braço, reagir. Quem mais se fode na mão delle é o ceguinho, que se estressa. O cego, que excorrega, até tropeça depois de rasteirado, emfim, p’ra mode poupado ser, por mais que se incommode, terá que lhe chupar o pau, sem pressa.

10


MEME CHAMMUSCADO [5920]

Um meme incendiario ouvi, mas peço licença de esconder quem me revela a fonte, embora todos saibam della. Não ponho a mão no fogo e riscos meço. “O flavio queima archivo, sem successo. Papae queima a Amazonia por tabella. Carlucho queima a rosca com a vela. Dudu ficou queimado no Congresso.” Assim as queimaduras e queimadas, alem das queimações, foram no meme citadas. Quem citou, acho, nem teme alguma represalia das más fadas. Eu, ca commigo, penso: taes piadas quem faz contra a maré quer que se reme? Seu corpo vão deixar que, emfim, se creme depois de ser achado nas quebradas?

11


ACCERTO DE TRACTAMENTO [5921]

Hem? Como cê se sente, infeliz? Hem? Responde, infeliz! Cego cê se diz? Então vae se foder só porque eu quiz! Ahi, cara! Adjoelha! Muito bem! Assim que eu gosto! Sabe chupar sem ter nojo? Vae saber! Lambe, infeliz! Vae, passa a lingua porca no que eu fiz! Xixi tem gosto bom? Que gosto tem? Engole, infeliz! Abre bem a sua boccona de ceguinho! Quem mandou perder sua visão? Agora sou quem manda! Chupa, cego! Soffre! Sua! Assim, vae! Vou gozar! Ah! Continua! Ah! Tem que engolir tudo, ou eu lhe dou porrada! Ah! Gostou, cego? Não gostou? Azar! Bebe meu mijo! Não recua!

12


MOLECA SAPECA [5922]

Talvez porque tivesse ella a figura dum Dennis, o Travesso, ou Pigmentinha, eu, quando adolescente, nella tinha a minha namorada... Farsa pura! Seria formidavel (assim jura meu ego) si Pavone fosse minha amante masculina! A garotinha commigo fez bastante travessura! Na poncta dos pés entra no meu sonho. Fazemos um xixi la na montanha. Jogando futebol, ella só ganha. Em verso martellarmos lhe proponho. Tentando ser amante, fui bisonho, mas suas canções ‘inda teem tamanha presença na lembrança, que me banha o cego olho uma lagryma, tristonho.

13


MEME DA CERCA PULLADA [5923]

{Mulheres de politicos, Glaucão, não são umas coitadas? O subjeito mantem muitas amantes e “Bem feito!” diz disso, sem reservas, o povão! Algumas humilhadas muito são! Um certo presidente tinha feito segredo de “impedido” ser. Sem jeito ficou a dama, alem do Ricardão! “Meu bem, eu estou gravida! Brindemos!” “Mas fiz vasectomia! Quem é o pae?” “Não brinque, meu querido! Com os demos!” Glaucão, ja pensou nisso, hem? Ai, ai, ai!} -- Pensei. Ella que pense, quando sae com esses Ricardões que nem sabemos quem são! Mas o marido, quando trae e esconde a trahição... P’ra la deixemos!

14


MEME DA BABA [5924]

Descrevo-lhes extranho pedicure. A lingua serviçal, que se encarrega da sordida tarefa, lingua cega será, por mais que “exotica” ser jure. Frieiras, callos, tudo que ella atture lamber, que inspirem nojo ninguem nega. Cliente não será nenhuma brega madame, mas chuteiras quem pendure. Exacto. O jogador que foi de bolla (de varzea, certamente) é quem cliente se torna dessa lingua, que agua quente dispensa ao descascar a grossa sola. Bem, tudo descrevi. Será que colla? Em todo caso, digo que se sente servido o jogador e que não mente o cego que serviu tal rapazola.

15


MEME DO DISCURSO [5925]

Mas quanta baixaria ja se falla accerca dum fulano tão vulgar num cargo que precisa de exemplar conducta mas cahiu na commum valla! O gajo quer familia, alli na salla, ouvindo o seu sermão, mas, em logar daquellas platitudes, vem fallar da foda alheia, alem da alheia “mala”! Assim não é possivel que pretenda exemplo dar de civica virtude! Ninguem com tal conversa mais se illude! Que tal chamar, então, o Homem Legenda? O gajo diz: “Ja tenho uma tremenda tarefa! Por vocês topal-a pude!” Mas leia-se: “Preciso que me escude quem faça, no Congresso, compra e venda!”

16


EM TORNO DUMA PHRASE [5927]

{Bandido bom não é bandido morto, appenas! É preciso tortural-o bem, antes de mactal-o, Glauco! Fallo sem força de expressão nem descomforto! Meu poncto é bem directo, não é torto, mas sei que vou pisar, Glauco, no callo daquelles humanistas! Que regalo, na bronha, proporciona tal desporto! Deleite é torturar bandidos, ja que falta não farão! Mas o melhor é quando lhes arranco os olhos! Mor barato o desespero delles! Ah!} -- Você nunca pensou como será que podem se vingar? Olhe em redor! Estão bem do seu lado! Não, major! Melhor outra punheta ver si dá!

17


VALE QUANTO FELLA [5928]

Ninguem confessa aquillo, mas que ja fizeram, ja fizeram. Não me accanho, porem, de confessar que dou, no banho, lambidas no que duro sempre está. Chupadas, tambem. Logico, o que dá aquellas lambidellas e o tamanho da rolla augmenta, até sahir o ranho do gozo, minha bocca não será! O proprio sabonete se encarrega de dar da chupetinha a sensação. Molhado, liso, unctada deixa a mão e eguala-se à linguinha leve e cega. A gente, appós passal-o, logo offega, tal como si sentisse a fellação. Comtudo, sei que todos dizer vão que passa sem sabão quem putas pega.

18


PHALLICO ACTO FALHO [5929]

Ouvi ja dum racista a allegação absurda de que o negro tem beiçuda boccarra com razão, pois isso adjuda na hora de cumprir a fellação. “Perfeita a natureza nisso, não concorda? A bocca feita foi carnuda por causa disso, Glauco! Não se illuda! Ninguem sabe chupar como o negão!” Nem quero commentar bobagem tão sem nexo, do contrario o que me escuda é a longa rolla, quando deixa muda a funda bocca desse babacão. Nem fallo do botão desse cuzão, que, estreito, suas pregas só desgruda si for bem enrabado, o que desnuda a mente de quem tem o cu na mão.

19


NOITE SOB AÇOITE [5930]

{Pensei commigo, Glauco: um bom tesão seria açoitar, como foi Jesus surrado, mas tambem, como suppuz, cegal-o ja durante essa sessão. No filme do Mel Gibson, elles vão battendo até que um olho perde a luz, vazado pelo relho. Sua cruz podia ser assim, não é, Glaucão? Que tal, hem? Ser cegado como Christo! Si elle sobrevivesse, poderia tornar-se escravo desses que, no dia da surra, deleitavam-se com isto!} -- De facto. Ja seus pés eu tendo visto emquanto da chibata padescia, depois de cego os paus eu chuparia. Em sonho, só, taes rollas eu enristo...

20


INIMIGAVEL VESTUARIO [5931]

A roupa se rebella contra a gente! Quem curte leis da physica, confere-a: é “Lei da Teimosia da Materia”! Na duvida, vestir-se experimente! Jamais a camiseta quer de frente ficar para você! Faz tambem seria, tenaz opposição, ou faz pilheria a meia, a sunga, a blusa renitente! As mangas ao contrario querem, por pirraça, se enfiar pelo meu braço e, sempre que meu pé no furo passo, a perna se inverteu, quer se indispor! Ja sei que pelo advesso, quando for calçar a meia, a appanho, mas eu faço questão de me vingar si, suadaço depois de usal-a, adspiro-lhe o fedor!

21


WEIRD DISSONNET [5932]

Segundo Norman Greenbaum, ser um hippie implica barbudinho ser, sujinho, supponho, no cabello ter um ninho de bichos que grillaram em equipe. Implica que o barbudo participe dum livre movimento que caminho procura, differente do mesquinho systema financeiro do boss VIP. Alem de detestar eschola, banho e roupa social, esse barbudo está sempre descalço, ou seja, tudo que pode interessar a um vate extranho. No fundo, exquisitão sou eu, que ganho a fama actualmente, ja que grudo nariz e bocca nesse pé desnudo que, para novos hipsters, é d’antanho.

22


QUADRO DESEMMOLDURADO [5933]

Repenso, ao ver-me em lapides vazias, o pulpito que os passaros comforta. Na cama quente, a vibora ja morta dos tympanos rodeia as flores frias. Tricyclos e charrettes fugidias percorrem a afflicção da rua torta. Talvez a confusão seja o que importa nos casos de fraternas cantorias. Na salla, sobre as cinzas da terrina, scintilla a verde perola madura. Jamais transparesceu tanta amargura dos rollos de papel sem margarina. Mas eis que, devolvendo o que rumina, o velho camponez ja se segura no throno dos afflictos e, com pura tinctura de morango, o show termina.

23


VINHO NACIONAL [5934]

Pensemos no velhissimo bordão: “Restaure-se a total moralidade ou nos locupletemos todos!” Não podemos abrir mão dessa verdade! Ja que ethica nenhuma nos farão seguir, façamos só o que nos aggrade! Accusam-nos? Fallemos palavrão! Será parlamentar immunidade! Aquillo que melhor nos locupleta se chama, nas más linguas, “mordomia”, “mammata”, “começão” ou, hoje em dia, ainda a “rachadinha”, mais discreta. Ninguem irá tirar o cu da recta. Nós vamos só pedir que, em poesia, um cego não nos jogue, d’agua fria, o jacto da descarga na retreta.

24


MISCELLANEA SUPPEDANEA [5935]

Com minha propria lingua (assim eu brado) suppuz ser puxasacco, dando um tracto debaixo duma sola de sapato usado por politico saphado. Tambem com minha lingua (Não me evado da culpa: sou masoca, assim constato!) dei tracto, qual cachorro num pé chato, debaixo duma bota de soldado. Com minha lingua, ainda, fiz eu cada sessão de lambeção (Não é bravata!) na sola dum artista da mammata adepto! Mas ninguem por mim dá nada! De lingua até farei a deslavada cunnette num pastor que desaccapta Jesus e de Satan é diplomata, mas sei que elle prefere bruxa... ou fada.

25


MEME DO MARÇO AZUL MARINHO [5936]

Em março, o mau politico, ou melhor, o pessimo politico se borra de medo! Sim, aquelle que nos torra dindim e paciencia, em grau maior! O mez falla dum cancer, o peor possivel aos caciques, pois desforra o povo com a praga que lhes jorra em cyma e torna frio o seu suor! Se tracta do rectal cancer! Pois é! Nós todos, todo dia, aqui torcemos! Univocos, chamamos nossos demos e em todas as macumbas pomos fé! Torçamos ja! Peçamos, da ralé si somos portavozes e fazemos legitima leitura! Sim, rezemos! Do cu teem que soffrer, morrer até!

26


MEME DA MENINA MALHADA [5937]

Sentou-se. Todo mundo olhou. A bella menina, da gymnastica voltando, descansa, suadaça, quando um bando de manos chega, vindo da favella. A linda mina cruza a perna. Appella às jovens phantasias. Vae passando a mão no branco tennis. Gesto brando, que instiga quem massagem quer dar nella. Emfim, o tennis tira. Tira a meia, mostrando seu pé liso, suadaço. Os manos fazem lingua de palhaço, os labios lambem, fingem bocca cheia. A mina a propria sola massageia. Alguem que não se aguenta faz, devasso, o mesmo. Nisso, chego no pedaço e sinto o forte cheiro, que tonteia.

27


MEME DA MENINA ENSABOADA [5938]

Coitada da nympheta! Tão até quando, no banho, se Não é que nesse instante o caro cellular? Ella se

bonita, ensaboa! é que lhe soa irrita.

“De quem será a mensagem?”, pensa, afflicta, debaixo do chuveiro. Uma pessoa, appenas, lhe interessa, que tão boa lembrança lhe traz... Buça que se excita... Pullando fora, aggarra a tal caixinha fallante, mas, na pressa, lhe excorrega da mão e cae no vaso onde fez mega tolete ‘inda ha pouquinho, coitadinha! Chorou com uma amiga, a qual é minha alumna. Aqui, pensei: {Gente que é cega não deve ter aquillo! Ninguem pega no troço com mão boba! Hem? Adivinha!}

28


MEME DA VERRUGA [5939]

Si for um condyloma, bem no cu se forma, mas na cara a coisa faz estrago mui maior, seja rapaz ou moça: a gente fica jururu. Ninguem acha bonito um rubro, cru caroço pela testa, nem appraz no queixo ou no nariz um que, aliaz, paresce uma castanha de caju. Imagem foi da bruxa mais fiel aquella nariguda, com verruga immensa, batatuda, alem de ruga no rosto todo, um typico pastel. Agora a mulherada faz papel de fada maquillada, mas sem fuga possivel da velhice, essa que estuga o passo com o tempo, que é cruel.

29


MACHINA DO TEMPO [5940]

No tempo em que eu ainda via, vi Ginsberg elogiando, em oitentista registro, o SGT. PEPPER’S. Não despista o bardo sobre aquillo que ergo aqui. “Jamais reviveremos phrenesi egual ao da cultura sessentista!”, assim diz um nostalgico, que lista as magicas conquistas. Respondi: {Exsiste retrocesso, ou é só phase? O mundo não caminha para traz. Appenas num sentido gyra. Mas ha sempre quem fascismos extravase. Por mais que recuemos, será quasi sem gaz a pregação das fadas más. A menos que espelhemos Satanaz na farsa antichristan dum guru nazi.}

30


MEME DA MASCARA [5941]

Da grippe prevenir-se ella apparenta usando certa mascara que tapa a cara, protegendo a bocca, a nappa dos bafos dessa peste virulenta. Em these, tudo bem, mas isso exquenta, suor provoca. A dona não excappa da tosse, da saliva que lhe empappa o panno, qual calcinha fedorenta. Fiquei sabendo, pela bocca amiga dalguma fofoqueira, que essa dona nem troca a velha mascara: a abbandona num cantho, quando em casa ja se abriga. Sahindo à rua, a mesma põe. Nem liga si está suja, fedendo mais que conna de chico, o que comprova que funcciona do advesso, pois passar algo periga.

31


VINHO DE SAFRA [5942]

Me lembro. O Marcellinho Carioca, depois dum gol, performa verdadeiro “estripetise” erotico. Primeiro, se livra da camisa. Auês provoca. Aquella, com ninguem o craque troca, jogada ao torcedor que ja seu cheiro cafunga ao aggarral-a. Ahi, ligeiro, o septe seu calção lança ao fanzoca. Depois do short, attira Marcellinho à turma de marmanjos a chuteira, a meia, que um feliz fan beija, cheira, apperta contra a cara, com carinho. Do campo volta alegre, pelladinho. Faltou somente a sunga, com certeira e extrema ponctaria, nessa feira erotica, valor ter mais que vinho.

32


OPHIDIO SEM OFFICIO (II) [5943]

É gente que não tem o que entregar. Só ficam diffundindo uma fofoca. Na rede um imbecil sempre colloca boatos velhos sobre novo azar. Maconha ja será vendida em bar. A falsa, pois da boa nem ha coca. Poderes brigam? Falta quem convoca? Preparam outro golpe militar. O virus cem milhões ja contamina. Pessoas pelas ruas vão cahindo, cadaveres ao sol dum dia lindo. Ninguem logrou achar uma vaccina. Qualquer resto de viveres termina. Quem não morrer de fome em sua toca na certa morrerá, sem ser masoca, da grippe, menos elle, esse que opina.

33


HESITANTE INSTANTE [5944]

Será que, emfim, eu desta feita morro? A grippe é minha deixa! Só não quero correr attraz da peste! Chance zero! Desejo que ella chegue em meu soccorro! Nem vejo a hora, gente! De cachorro tem sido minha vida! Mas espero depressa compensar este severo caminho de cegueira que percorro! A gente quer morrer, mas, no momento exacto de exspirar, aquelle instincto impõe a sobrevida! Agora sinto que, desta vez, encerro o meu tormento! Irei em paz! Appenas eu lamento ficar sem degustar meu vinho tincto, sem dar mais um prazer ao velho pincto, cansado das torturas que eu enfrento!

34


TOO GOOD TO BE TRUE [5945]

Sessenta annos você tem? Ai, meu Pae! Morrer vae do Corona Virus, cara! Sessenta annos você tem, cara? Ah, vae morrer! Não tem soccorro que isso para! Ainda diabetes tem? Ai, ai! Você vae é morrer, pois não ha, para o caso, cura alguma! Quem contrae o virus, baixa! A praga ja dispara! Você seria, acaso, um hypertenso? Ja pode encommendar o seu caixão! Você problema tem no coração? Chorar ja pode! Empunhe ja seu lenço! Eu, como uma neurose não dispenso, no radio ouço os reporteres, que vão mais panico causando nos que são edosos. Mas morrer... Não me convenço.

35


CHINEZA SEM DEFESA [5946]

A grippe foi chamada de hespanhola, depois de koreana. Agora a gente devia de “chineza”, simplesmente, chamal-a, si enxergarmos o que rolla. Não sou quem a bobagens vae dar bolla, taes como que na China ha quem invente um virus que causar ao concorrente irá grande preju. Tal lei não colla. Mas, quando uma fechada dictadura esconde informação e prende quem expõe o serio risco que isso tem, a gente é trouxa quando não dedura. Portanto, não tractemos com ternura os pobres chinezinhos, pois alguem de la tem toda a culpa nesse trem que irá mactar milhões e não tem cura.

36


RESPOSTA IMMUNOLOGICA [5947]

A mascara ganhou do seu patrão. Sahiu a cidadan toda pimpona, gabando-se de estar fora da zona de contaminação. Mas foi em vão. Chegou em casa, nem lavou a mão. Salada mixturou com azeitona nos dedos, como mexe em sua conna. Mal limpa a bunda appós o cagalhão. É claro que ella tinha que pegar o virus! Disso os medicos não teem nem duvida. Porem, só pegou quem cagou onde ella accaba de cagar. Foi ella restou a Em casa, mas ella

asymptomatica. Que azar seu patrão, rhumo ao Alem! não se salva mais ninguem, não é como os demais são.

37


VIGARIO SOLITARIO [5948]

Peccado Aquelle ou quem nenhuma

por peccado, quem mais pecca? que peccou battendo bronha trepou com outro, sem vergonha si na rolla alguem defeca?

Sozinho quem peccou mella a cueca, no maximo. Assim, culpa quem lhe ponha esteve exaggerando no que sonha de casto ou de manchado quando secca. Alem do mais, quem pecca a dois se presta a alheio julgamento do que seja peccado, numa egreja ou noutra egreja. Quem pecca a s처s se basta em sua festa. Se pune elle, si culpa achar que resta punir, mas n찾o entrega de bandeja a sua confiss찾o a quem esteja babando de tes찾o, suando a testa.

38


LINGUA PENDENTE [5949]

Às vezes não se explica bem o caso. Quem lambe botas pode ser que lamba com nojo, mas nem sempre se descamba de todo na sujeira, no mais raso. Daquelle que lambeu eu me comprazo não só quando por cyma, appenas, bamba se mostra, mas tambem quando (Caramba!) achou o que se deva achar no vaso. Lamber um couro liso, bem lustrado, é muito differente da lambida na bosta, ainda fresca ou resequida, grudada no relevo dum solado. É tudo relativo. Me degrado mais caso um borzeguim limpo decida lamber, ou quando lambo uma encardida botina de quem viva sem peccado?

39


PULLO DE SUSTO [5950]

Cagava molle quando notou ella, subindo pelo vaso, uma aranhinha de porte inoffensivo, que ja vinha tocando, quasi, sua bunda bella. Dansado uma animada tarantella a dama certamente que ja tinha. Porem o que succede (impressão minha) é que ella não sabia da sequela. Quem conta augmenta a compta. Brincadeira não era a proporção daquella aranha, que, em vez de pequenina, foi tamanha a poncto de egualar caranguejeira. A merda molle excorre, molha, cheira mal mesmo. Não, a dama nem extranha aquillo que limpar, quando se banha, irá. Mas sentir dores... Ninguem queira!

40


HILARIO PLENARIO [5953]

Tem methodo o jargão parlamentar. Debatte de alto nivel bem transcorre na Camara, mas, caso alguem desforre, bem pouca coisa pode se salvar. Alguem pede palavra para dar palpite sobre thema que ja morre por falta de quem grana nisso torre, mas, mesmo assim, papel faz exemplar. -- O nobre deputado se equivoca! {Jamais! Vossa Excellencia não sabia?} -- Sei muito bem! Não vivo de fofoca! {Mas vive de mammata e mordomia!} -- Não falle assim commigo, seu boboca! {Ah, foda-se, Excellencia! Chupa! Enfia!} -- Commigo ninguem nesse assumpto toca! {Si toco! Não tolero baixaria!}

41


MISCELLANEA MONARCHISTA [5958]

Pensaram? Bem melhor tudo seria suppondo que Dom Pedro nos eduque na base, não do murro, não do muque, mas duma nobiliarchica mania. Sim, meritos tivera a monarchia. Barão, visconde, conde, marquez, duque... Um titulo não quero que me encuque. Talvez um delles ganhe eu, certo dia. Barão paresce grande, mas é baixo. Visconde não é vice que me aggrade e conde condecora, mas me encaixo melhor no de marquez, que lembra Sade. De duque ou de archiduque não me enfaixo si a faixa não me espelha a crueldade. Appenas à pobreza me rebaixo si um sadico plebeu me persuade.

42


MISCELLANEA TROPICAL [5966]

As cores nacionaes dão trella à bessa. Banana e papagayo da bandeira teem cor verde-amarella, à brazileira. Como é que um vate experto se sae dessa? Talvez thematizando uma promessa que faça algum cacique quando queira fazer-nos de freguez da bananeira, alem dum fallatorio que não cessa. Banana symboliza a impunidade dos nossos criminosos, pela falta de empenho para os pôr attraz de grade. E quanto ao papagayo, esse peralta? Biccudo e linguarudo, persuade a gente a sustentar, eleita, a malta. Da nossa tropical diversidade são ambos a metaphora mais alta.

43


MEME DO PAU DOADO [5975]

Transplantes ja communs são, hoje em dia. Um penis de cadaver se transplanta num homem vivo, graças à mão sancta dum bom cirurgião da anatomia. Noticia foi na midia: quem precisa de rolla nova agora excolhe cor, grossura, comprimento, pelle lisa ou aspera, conforme o doador! Caralhos mortos podem ter, à guisa de vivos, erecção, fazer amor! Fallou desse milagre seu auctor, um medico cubano, ou haitiano. Diz elle, franco: “Sente alguma dor, depois, o paciente, eu não enganno ninguem, mas lhes garanto, seu sabor ainda, a quem chupal-o, é phallo humano!”

44


DOSE EXACTA (I) [5977]

Eu sempre tive nojo de cocô e, desde adolescente, esse fedor deixava-me impedido de suppor que exsista, com cocô, filme pornô. Ouvindo o que papae ou que vovô fallavam, sem comptar o que o doutor contava sobre nunca a bocca pôr siquer perto das fezes, pensei: “Pô!” Em summa, de hygiene é que se tracta. A minha propria merda me repugna. Si exsiste alguma coisa que nos una é o asco, reacção a mais sensata. Por isso mesmo, imagem do rival com merda a ser não sermos nós,

gozo com a grata que a gente puna comida. Que fortuna mas elle! Dose exacta!

45


MISCELLANEA VERBIVOCOVISUAL [5983]

Dispostas no papel as lettras são. Um “O” debaixo de outro, de outro abbaixo e accyma, em vertical eixo os encaixo. Nem sempre no papel, porem, estão. Primeiro, na cabeça algumas vão surgindo. Quando proprias eu as acho, decido que terão, no meu despacho de cego, utilidade na canção. Quem as dactylographa, ou as digita, é um cego concretista, que na mente ainda guarda as fontes e cogita si em caixa baixa estão, visualmente. Dispostas, allinhadas na restricta medida do papel, sem luz nem lente, nem é, pois, necessario que repita mais vezes a leitura diligente.

46


MISCELLANEA COPROPHILICA [5985]

Pensei em verosimil narrativa. Que fezes ja comeu ninguem confessa, mas quem faz anilingua sabe dessa. Masoca de verdade não se priva. Nem colhe da privada. Ja a saliva excorre quando caga nova peça aquelle comilão que nunca cessa na mesa, mas postura tem lasciva. Não ha como negar: quem lambe um anus dejectos põe na bocca e seu sabor conhesce, alem do odor e de outros damnos. Quem sente esse fedor pode suppor. Suppõe-se um paladar, mas, entre humanos, são poucos os que provam, como o auctor de livros debochados e mundanos, veridicos, garante. Só si for!

47


MISCELLANEA BUCCAL [5986]

A bocca necessita de limpeza? Palito, escovação, fio dental... Pergunto: qual o methodo ideal? Quem é que sua lingua tem illesa? Seria, ao levantarmos nós da mesa, preciso que escovemos, com total cuidado, os nossos dentes? Ou normal será certa migalha num vão presa? Tractando-se de alguem que bem conhesço, o menos hygienico nem mica os dentes, mais fraquinhos do que gesso, porem a lingua grossa, que se estica. Dobrada, quasi vira pelo advesso durante uma chupada em suja picca. Conhesço um chupador assim travesso, mas elle sem bochechos nunca fica.

48


MISCELLANEA CATARRHAL [5987]

É farta a verve em provas desse evento. Catarrho o mais espesso da caveira nos enche as cavidades e mal cheira. Em verso descrever um caso tento. É foda a sinusite, meu amigo! Entope tudo um muco que amarella por dentro das narinas, e não digo que seja perfumado! Tem sequela: Dorzinha de cabeça! Traz comsigo a tosse! E quem livrar-se pode della? Occorre que o catarrho na goela penetra quando excorre internamente... E causa a coceirinha... Quem se pella de medo é o narigudo, o que mais sente, conforme a poesia, toda aquella interna fedentina putrescente!

49


DOSE EXACTA (II) [5988]

Eu sempre tive medo da cegueira e, desde adolescente, esse temor deixava-me impedido de suppor que um cego pornofilmes fazer queira. Ouvindo o cantador que vae à feira contar historias sobre sua dor, allivio senti sempre, portador que sou de vista nitida, certeira. Em summa, de visão é que se tracta. A minha propria louvo, por ser boa, melhor até que um olho que só doa e pouco veja, coisa que acho chata. Por isso mesmo, gozo com a grata imagem do rival de quem caçoa a gente appós cegal-o. Coisa à toa ser elle e não nós. Chupa! Dose exacta!

50


MISCELLANEA THEOLOGICA [5989]

Quem é que responsavel foi por isto? Alguem precisa estar por traz de tudo que pode accontescer si eu não me adjudo. Mas nem por isso um deus será bemquisto. Appenas por ser Pae, que foi de Christo, não acho omnipotente esse marrudo Senhor que nos opprime. Não me illudo. Em seitas doutrinarias não invisto. Não posso responder pelo que quero mas nunca realizo, ou por aquillo que evito mas occorre. O risco zero jamais exsiste, como o mar tranquillo. Si penso eu temo; Si fallo mas algo

no poder dum deus severo, si não penso, me horripillo. como bardo, sou sincero, eu exaggero, ao meu estylo.

51


MEME DO ASSOBIO [5994]

Mulheres infelizes, quantas são! Casada está, mas acha que o marido por ella não demonstra ter libido. A amiga diz da falta de tesão: “Preciso lhe contar isso, Glaucão! Não quero ser vulgar quando decido fallar, mas meu amigo cê tem sido... Escute então a minha confissão!” Perdeu a virgindade, certamente, mas outra idéa tinha do que rolla na cama de casal, pois seu potente esposo para o sexo nem dá bolla. Emquanto trepam, elle fuma, o dente palita, pigarreia, cantarola... Só falta assobiar, com eloquente ruido, um samba proprio de viola.

52


MEME DA PEDREIRA [5995]

Não servem para tudo os dictos “saes”. Na casta consciencia peso sente e abusa do pozinho effervescente aquella que trampou, talvez, demais. Fallei de castidade? Não, jamais devia ter fallado, pois decente seu trampo não tem sido, certamente. Questão de vocações profissionaes. Má vida? Má conducta? Sal de fructa não basta, si chupou muito caralho e galla engoliu muita aquella puta. Pesou? Foi accidente de trabalho. Agora bons conselhos ella escuta e toma, appós chupar, um cha com alho, mas nem por isso deixa de ir à lucta. Faz parte, emfim, do trampo tal cascalho.

53


MEME DA DESCONVERSA [5996]

Arrhuma algum pretexto quem quizer. Aquelle simples lanche sahiu caro. A culpa foi da ameixa preta, claro. Assim allega a frivola mulher. Comer, a moça come o que puder. Mas para ser comida, ja reparo, mais facil é, pois ella tem bom faro até p’ra achar, na feira, novo affair. A moça está gordinha, mas não fica immune à mesa farta: tem quindim, curau, doce de abobora, cangica, arroz doce, sagu, pavê, puddim... Depois da indigestão, se justifica: “A calda do manjar branco, foi sim!” Bem outra ser podia aquella dica: A porra tem sabor meio ruim.

54


JUSTIFICANDO OS MEIOS [5998]

E as provas? Onde estão as provas? Hem? Ninguem recibo passa do dinheiro roubado ou desviado ao “companheiro”. Emfim, da porra a culpa ninguem tem. Com cara do maior buddhista zen, o gajo diz que nunca fez primeiro aquillo que fizeram por inteiro mais tarde. Elle innocente está, porem. Si alguem for dedurado e assignatura acharem num contracto, o cara allega jamais ter conhescido quem dedura, embora amigo fosse do “collega”. -- Fui victima! Assignei sem ler! -- nos jura aquelle que no pullo a gente pega. São esses que defendem a censura na midia. Perguntado, o gajo nega.

55


QUEM PAGA PELA PRAGA? [5999]

{Magina! A maioria não vae nem pegar, nem vae sentir a tal da peste! Você vae ver! Qualquer joven que teste será negativado! Ocê tambem! Quem é que vae morrer, Glaucão? Hem? Quem? Os velhos, os doentes! Que moleste alguem saudavel, nunca! Só quem veste pyjama, alguem inutil, grippe tem! Portanto, o tal do virus bom serviço prestou à sociedade! Nos livrar iremos dos enfermos! Vão chorar amigos e parentes? E eu com isso?} -- Não posso, neste caso, ser ommisso. Você duma familia no logar não fica? Pois terá, talvez, azar de estar é sob effeito dum feitiço!

56


DISCRETA META COMPLETA [6000]

Na marca dos milhares, chego aos seis no meio duma crise provocada por esse virus novo, quando cada um segue, em sobrevida, as proprias leis. Parei, sim, por algum tempo, mas eis que contra sonnettismo não ha nada que faça arrefescer a desbragada factura da qual tantos foram reis. Agora, mesmo numa phase tão mais fertil, muito tempo vou levar até que sahir possa do meu lar a fim de palestrar nalgum sallão. Com medo do tal virus, eu ja não acceito, num sarau, num show, num bar, que minha voz ao vivo, no logar dalguma gravação, se escute em vão.

57


MISCELLANEA SOBREHUMANA [6001]

Poderes, todos querem ter a mais. Na Terra vida eterna si não temos, ao menos desfructemos como os demos, ou como os outros meros animaes! Exsistem mais sentidos? Sim? Mas quaes? Não somos, mesmo, deuses, mas queremos levar nossos instinctos aos extremos. No maximo, causamos alguns ais. O anxeio de imitar Mathusalem nos leva a muitos calculos erroneos. Na practica, o segredo é manter bem activos os hormonios e os neuronios. São velhos e saudaveis os que teem fodido e versejado, qual demonios. A mim ainda facil tudo vem à mente. Deixo ao corpo os meus hormonios.

58


MISCELLANEA DA APPARENCIA [6002]

As bellas me desculpem: não o são. Exsiste uma belleza feminina em toda parte, ou algo não combina? A mim é discutivel tal questão. Careca, desdentada, nariguda, orelha grande, olhar de peixe morto, ponctuda sobrancelha... O que é que muda na cara da mulher? Um queixo torto? Tá louco! E quando a dona se desnuda? De corpo inteiro causa descomforto? Ninguem quer na mulher barba comprida? Bochecha pendurada? Sarda farta? Talvez alguem, algures, se decida a ver com olhos livres, numa Esparta longinqua, sua musa preferida com tal feição, que um bardo aqui descharta...

59


MEME DA RISADA [6006]

Viuvas, joviaes nem sempre são. Ephemera, a belleza feminina se appaga, mas o riso se illumina. Algumas, certamente, mais rirão. Ja vi chorar, em frente do caixão, aquella que maldiz a sua signa, mas, quando chega a festa, si junina, celebra com quentão e com rojão. Mulher bonita, aquella nunca fora, porem foi sempre alegre! Seu marido, por outro lado, achava peccadora aquella que ri muito... Foi trahido? Não sei, mas ja morreu, e sua dor a viuva esconde, tanto que tem rido! Não quero ter a bocca accusadora, mas riso, neste caso, faz sentido.

60


MEME DA NYMPHOMANIACA [6008]

Nas ruas não exsiste diplomata. Fallarem que é “furor” seu, “uterino”, revela pouco tacto e pouco tino, mas claro que a pau esse rumor macta. Não é de medicina que se tracta, mas sim de sacanagem. Qual menino não toca nesse assumpto fescennino no pappo com a turma, sobre a gatta? Sim, fora do commum é o que ella tem, concordo, si em repouso a passarinha jamais está, si um fremito lhe vem. Mas faça-se justiça, coitadinha! Evita sahir dando e só traz, bem la dentro, uma cenoura ou... abobrinha! Seria preferivel que ella zen ficasse, mas, coitada, se apporrinha!

61


MEME DO VOCABULO CABULOSO [6009]

Encontram “anilingua” na pesquisa. Lamber o cu de alguem sempre é figura commum, mas de mau gosto, o mestre jura. De breve explicação alguem precisa. Indagam, mas o mestre tem bem lisa a lingua, que excorrega, nessa altura das liberalidades, e censura o pappo. Um euphemismo suaviza. Está no diccionario, elle garante. Na practica, porem... Nunca! Jamais! Pergunto: e lamber bota? Ha quem se expante com solas sobre boccas e quetaes? “Não, botas não expantam!”, diz o amante das lettras. Ja o cu... Fique entre animaes! Alheio o pé descalço ou o pisante Prosegue dessas practicas carnaes.

62


MISCELLANEA IRRESIDENTE [6010]

A gente meio nomade é na vida. Bastava eu ter ficado, certo dia, no Rio, e meu conceito outro seria. Mas sempre nós estamos de partida. Partimos porque a vida nos convida a novos ares, como quem confia no tacco, procurar. A poesia nos leva ao Pão de Assucar, suicida. Morei por pouco tempo la. Fatal foi ter voltado a Sampa, porque aqui é sempre um escriptor tractado mal. Ganhei alguma chance e um Jaboty. Porem maior valor, na capital, teria um justo premio ao que escrevi. Foi algo que perdi, mas não faz mal. Amigos eu conservo por alli.

63


MEME DA MADRUGADA SEM BATTUCADA [6011]

Sabendo que tem chance bem pequena de ser contaminado, ou mesmo não sabendo, um joven solta o vozeirão na noite, descumprindo a quarentena. Deserta a madrugada, elle não crê na urgencia de fechar o bar que, tão lotado, frequentava. Agora são trez horas da madruga. Alguem lhe accena? Ninguem. Não ha ninguem na rua, nada funcciona, ja não passa mais nem carro. Resolve elle cantar, tirar um sarro daquelle que do carcere se enfada. Descompta agora a falta da ballada cantando “Chupa aqui...!” Não, nunca exbarro num gajo desses. Sonho, emquanto narro, chupal-o, mas punhetas... Batto cada!

64


MISCELLANEA DA PASSAGEM [6012]

Na Terra a gente passa. Alguem se salva? Pensando no Neil Diamond, tambem faço a minha lista branca neste espaço. Mas fica a Terra, fica a Estrella d’Alva. Lamarca, Lampeão, Senna, Tancredo, Chacrinha, Tiradentes, Golbery, Golias, Calabar, Noel, Loredo, Dolores, Irman Dulce, Hebe, Dercy. Millor, Filinto Müller, Azevedo, Elis, Nara, Raul, Satan, Fleury, Getulio, Janio, Plinio, Figueiredo, Garrincha, Ary, Vavá, Jobim, Didi. Cazuza, Padim Ciço... cada, a dedo listado, de passagem por aqui, seu prazo consummou, mais tarde ou cedo. Inglorio ou não, meu tempo não perdi.

65


TURBA DA DESURBANIDADE [6013]

Nas ruas o convivio bem se estima. Caminha olhando para qualquer poncto, excepto para a frente, aquelle tonto. Em vez de olhar p’ra baixo, olha p’ra cyma. No meio da calçada, desanima e fica alli parado. Olha um descompto na loja? Nada! Delle mais lhes conto no proximo quartetto, noutra rhyma. Carrega a saccolinha do mercado, observa a cor das nuvens, a imprudencia dos motoboys, um omnibus lotado. Attento ao cellular, não tem urgencia. Exbarra na velhinha andando ao lado e a xinga, caso contra um poste prense-a. Ha muito cara assim, despreparado na vida para tanta convivencia.

66


MEME DA MÃE DO PUNK [6014]

Madura. Ja passada ficará. Accorda. Sem kosmeticos, vermelho é o olho approximando-se do espelho. Irá se preoccupar. É para ja. Bem sabe que remedio ja não ha. De sua mãe nem segue mais conselho algum. Pensa no filho, um rapazelho gaiato, gozador da avó gagá. Sem cremes nem pinctura, ella se vê mais velha e se appavora com o seu cabello arrepiado. Mas cadê aquella formosura que ja deu? Deu motte aos sonnettistas. Caso o dê ao filho, um cantor punk, ahi fodeu! Moleque, em seu estylo bem plebeu, o gajo da mamãe faz um auê.

67


VALENTES VIGILANTES [6020]

Em plena quarentena, dum vigia nocturno ouço o assobio, bem no meio da muda madrugada. Até receio por elle, mas mais riscos ha de dia. Saber que elle está alli ja me allivia um pouco. Não por elle ser esteio da lei contra ladrões do bem alheio, mas por estar bem vivo. Que alegria! Allivio tambem sinto quando escuto pessoas nas janellas, panellaço fazendo. Ouço e, si egual auê não faço, estou dissonnettando, tambem puto. Nas redes sociaes eu ja permuto meu Casa de Ferreiro, um novo espaço de livros digitaes, e dou o braço a todos que resistem no reducto.

68


BARULHO NA JANELLA [6022]

Na rua a cachorrada não está podendo passear. Ficam em casa, lattindo la de dentro, o que bem casa com nossa paciencia, cheia ja. Ja muito panellaço ouvi de la de fora. Não da rua que extravasa a raiva, mas do ghetto, como em Gaza, Varsovia, confinado no sofá. Chineza, a grippe Do nosso seremos,

koreana ou hespanhola, não tem raça nem paiz. nós, o povo, seu juiz pois janella... Alguem controla?

Talvez para bassês ninguem dê bolla, mas, para quem defende seus civis direitos, a ração não tem matiz. Appenas “sahidinha” ja não colla.

69


MISCELLANEA DYSFUNCCIONAL [6035]

Casaes escondem tudo num escudo bem simples e decente. Eu não me illudo. Nas rodas, só fofoca a mulherada accerca de, na cama, quem aggrada. Ao macho, não bastou ser caralhudo, pois delle espera a femea mais que tudo. Se queixa a mulher delle: o camarada, que duas dava, agora não dá nada. Damnada ficou ella. Se até para as vizinhas, machão, que da mulher Seu phallo de cavallo

gabava, do marido fazia escrava. anda cahido.

Pudera! A cara della, onde se aggrava a acção do tempo, é caso ja perdido! No macho, quando vejo cara brava, daquellas apparencias eu duvido.

70


MISCELLANEA EUPHEMINISTA [6037]

A certas putas, rotulos bons são. Ja foi “Mulher Aranha”, “Mulher Mosca”... Agora é “Mulher Pulga” e está mais tosca. A bichos quem gostou duma allusão? A bicha acha mais facil. Seu cuzão, queimado na funcção, ja virou “rosca”. À bella seu espelho mostra fosca a cara, na verdade, dum canhão. Modello é profissão? Bem, eu não acho. Appenas euphemismo é para a puta, que encarna mero insecto ao chucro macho. Só “Chupa, vagabunda!” a puta escuta. Affeita, emfim, à vida de capacho, depois de ser chupada, ex-”Mulher Fructa”, accaba desistindo, por relaxo, dum termo que por outro se permuta.

71


MEME DA BICHA MACONHEIRA [6048]

Qualquer coincidencia não é mera. Si está faltando assumpto, na novella, no templo, na campanha, a quem se appella? Aos homosexuaes! Tambem, pudera! Quem Quem Quem Quem

é é é é

que a propaganda mais paquera? que deixa a bunda na janella? que, em Portugal, usa a panella? que, travesti, vira panthera?

É o gay, que em tudo expalha seu aroma! Um padre, ou um pastor, com elle sonha. Seu beijo, na tevê, mais ponctos somma. Por elle os candidatos battem bronha. Tem fama, seja em Roma ou em Sodoma, tamanha, que o Demonio se envergonha. Alguem deseja até que o cu lhe coma a bicha mais adepta da maconha.

72


MISCELLANEA DA INFORMATICA [6049]

Um No em na

cego de informatica precisa. meu computador, archivo tudo “obras”, ou em “sobras”, e me adjudo hora de escrever ou da pesquisa.

Quem usa duas pastas suaviza o trampo. Quem tem muitas, mais ossudo encontra seu officio. Sim, sahudo quem seu computador bem organiza. Eu tinha divisões diversas, pastas infindas, galhos de arvore no outomno, das classes mais carnaes às castas castas, mas tudo alli perdi que collecciono. Agora diz o micro: “Tu te bastas com duas? Nem conhesço mais meu dono!” Quem tem opiniões iconoclastas nem sempre ao desmazello deu abbono.

73


RASPA DO TACHO [6051]

Tentei approveitar uns madrigaes, mas, como dissonnetto, n達o funcciona la muito bem a coisa, pois a nona ou outra linha nexo pede mais. Sim, claro, um decasyllabo jamais se perde em meio ao todo duma zona estrophica, mas, quando se ambiciona moldar, as exigencias s達o fataes. Valeu. Experiencia sempre cabe. Alem do mais, ter達o melhor proveito aquelles madrigaes, aos quaes dou jeito de thema que se encaixe e bem accabe. N達o quero que, por isso, alguem me enrabe, mas, ao dissonnettal-os, eu suspeito que ganham, no final, maior effeito, ainda que eu do feito nem me gabe.

74


QUARENTENA NA QUARESMA [6052]

No meu isolamento, que ja dura dois dias, trez ou quattro, uma semana (a compta perco: o tempo nos enganna) estou na... quadragesima leitura. Appenas ler não basta. A picca dura me fica, si a leitura for sacana. E toca a punhetar-me! Quem se damna é o pobre do caralho que me attura. Catholicos affirmam que, durante os dias de quaresma, não se pode siquer pensar em scena que incommode a rolla. Ella que deite e não levante! Mas eu aqui, não sendo practicante (e como quem faz barba faz bigode) performo o masochista que se fode lambendo o pó da sola dum pisante.

75


POST SCRIPTUM [6053]

Que vida de ironias, esta minha! Quem muita mão, por annos, me tem dado tambem se chama Glauco. Do meu lado esteve e revisou-me em cada linha. Mas eis que quem cegueta ficou tinha que ter mais um amigo dedicado, capaz de editar livros. Esse fado cabia ao cego mago que escrevinha. Meus livros digitaes, quem os edita se chama Lucio, um nome que tambem a ver tem com alguem que ficou sem visão e de olho alheio necessita. Em tempos duma peste que, maldicta, na rua não deixou quasi ninguem, em boa hora Lucio ouvir me vem e em vias virtuaes me posta a escripta.

76


LINGUA CALLEJADA [6054]

Andaram commentando que no chão da rua cae o virus e que fica nas solas dos sapatos essa zica grudada ainda -- Cruzes! -- um tempão. Tambem acconselharam: -- Vocês não terão appenas medo da titica sujando o seu soalho! Nossa dica é para redobrar a precaução! Não saio. Si sahisse, todavia, o tennis não deixava ao pé da porta, tal como o que o bom medico me exhorta. Algum mithridatismo me allivia. De tanto lamber solas, eu teria que estar immunizado. Me comforta saber que em minha lingua fica morta qualquer forma de vida. Addeus, phobia!

77


ITALIA QUE ME CALHA [6055]

Careca e Maradona o campeonato jogavam pelo Napoli e eu os via. Na placa, a propaganda a gente lia: salame e mortadella. Que barato! Da marca Leoncini me retracto babando de vontade todo dia de jogo. Ah, si pudesse essa iguaria comprar! Não importavam! Mas que chato! Fiquei chupando o dedo, mas agora nem posso, na TV, curtir mais nada. A coisa só complica, vez mais cada sem graça. Gol nenhum se commemora. Um unico consolo resta: bora comer pizza, comer maccarronada! Comamos o que, ao menos, nos aggrada emquanto a pandemia não peora!

78


MEME DA SOLIDARIEDADE [6056]

{Fulano declarou que, si tivesse pegado, quereria até compor canções mais animadas, mas de amor. Você o conhesce, Glauco. Não conhesce?} {Sicrano prometteu que nova prece fará por nosso povo si Doutor Beltrano la no culto logo for. Você o conhesce, Glauco. Não conhesce?} {Beltrano, por seu turno, diz que irá seu maximo prestigio, seu dindim doar, neste momento tão ruim. Você está bem por dentro. Não está?} -- Depende. Si disser elle que ja ouviu de mim fallar, direi que sim, que delle sei de nome, pois a mim me cabe ser reciproco, xará.

79


MEME DA QUARENTENA [6057]

Estão em quarentena. Até janella manteem fechada. Tanta paranoia! O filho adolescente os pés appoia na mesa, chulezão que desmazella. Mais fede, todavia, a bufa della, a thia solteirona, que destroe a concordia quando foi servida a boia e todos se revezam na panella. Em vez de sentir cheiro de comida caseira, a turma attura na narina aquella flatulenta fedentina e logo o pae, estupido, revida. Tambem peidou! Paresce insecticida o toxico fedor que elle elimina! Assim toda a familia de toxina se dopa! Nem o virus se convida!

80


MEME DA MÃO LAVADA [6058]

Só fallam em lavar as mãos, lavar as mãos, lavar as mãos! As minhas ja estão ja tão lixadas que não dá nem para mais sentir o pollegar! Agora só mãos lavo, si, em logar do pé, priorizada a mão está! Em casa, ando descalço para la e para ca sem, livre, ter um ar! As solas, encardidas, vão ficando escuras, grossas, asperas! Nem posso chamar aquelle cego que, no nosso eschema, as lambe e lava, ao meu commando! Não saio, nem o cego! Nem sei quando de novo no seu rosto os pés eu roço! Emquanto a mão descasca, a pelle engrosso pisando nesse virus tão nefando!

81


MEME DO ELEVADOR [6059]

Entrou no elevador lotado. Para pavor geral, tossinha secca fez soar, estrepitosa. Fui cortez e disse: “Não se expantem, isso sara...” Que panico, meu! Quando o troço para no andar seguinte, todos duma vez disparam porta affora. Foi soez o gajo que ao doente se compara: {Fingi bem! Não fingi? Assim consigo subir sozinho, risco menor corro! Por que cê não sahiu tambem?} Exporro paresce estar me dando o bom amigo. Respondo: “Ja não corro mais perigo. Estou contaminado. Si não morro, não fico mais em casa, qual cachorro trancado.” O gajo gela ante o que digo.

82


MEME DO DESABBAFO [6060]

{Jamais imaginei qu’ia passar por isso, Glauco! O pé do meu marido fedendo o tempo todo! Si eu decido chiar, a discussão terá logar! Maldicta quarentena! Antes, um par de meias se trocava! Ja a libido vae delle, inversamente ao pé fedido, michando! Tenho qu’isso supportar? Você, sei que supporta chulé forte, amigo! Mas marido não se empresta! Sinão, mando passar elle o que resta do tempo com você, p’ra sua sorte!} -- Amiga, não ha cheiro que eu supporte melhor do que chulé! Farei a festa suppondo, na punheta, depois desta, que, escrava, você cheire e me reporte!

83


DIARIO OFFICIOSO [6061]

A minha quarentena, por decreto que estou para assignar neste momento, terá quarenta dias, cem por cento cumpridos nos limites do meu tecto. Mas, como um optimista ja nem tento ser, acho que esses dias eu completo pensando em prorogal-os. O correcto será me dar um prazo bem mais lento. Quarenta, sim... semanas! É prudente ficar em casa, assim, sem fazer nada, curtindo, dia a dia, a data a cada minuto sem estar, talvez, doente. Quarenta mezes! Numa cannetada, ter tempo de viver! Um cego sente mais tedio, mas passei eu, de repente, quarenta annos recluso! Não enfada?

84


DAY AFTER [6062]

{Mas, Glauco, ja accabou! Você não pensa em dar uma voltinha por ahi, expairescer um pouco? Nunca vi alguem com tanto medo da doença!} -- Não! Medo, não: pavor! Ha differença! Estou traumatizado! Não sahi durante a quarentena! Ja daqui não saio mais! Você que me convença! {A vida continua, Glauco! O mundo precisa renovar-se! Não se pode ficar chorando os mortos! Accommode as magoas! Não percamos um segundo!} -- Bah! Pensa que nas magoas eu affundo querendo? Um cego bardo mais se fode depois da pandemia! Quem fez ode fará nenia, carente e gemebundo...

85


FORTISSIMO LUNGO [6063]

{Cecê, Glauco, tem cheiro de café de machina! Não acha? Pô, você, que é cego, tem olfacto de bassê! Não vae me contestar nisso, não é?} -- Depende do sovaco. O bom chulé tambem depende muito do que dê de estar calçando o gajo. Mas buquê senti qu’isso confirma. Ponho fé. {Até que emfim você concorda! Assim me sinto bem melhor! Cheiro de “espresso”, concorda? Qual o typo, Glauco? Peço que cite, que rotule para mim!} -- “Fortissimo”, um gostoso que ja vim provando, tambem “lungo”. Sim, confesso tomar diariamente. Mais successo fará si ja tomei pirlimpimpim.

86


PLENA QUARENTENA [6064]

{Tá certo o dictador das Philippinas, Glaucão! Tem que attirar para mactar quem, nessa quarentena, no seu lar não fica! Tu commigo não opinas? Não acho que essas ballas assassinas ser possam! Tu concordas? Não, logar a rua não será de passear, tampouco de parar pelas exquinas! Senhoras, senhoritas ou meninas, ninguem excappa à balla, si tentar sahir, entrar num posto ou similar, siquer para achar umas chloroquinas!} -- Estás é louco! Porra, não attinas? Mactar vão teus escravos! Vaes ficar sem gajos no teu grosso calcanhar! Quem é que irá lamber tuas botinas?

87


FEITOR LEITOR [6065]

Está faltando, Glauco, mais palhaço na praça! Ando bastante entediado! Bem, vamos la, me faça rir! Me enfado si não me divertir! Seja devasso! Humilhe-se! Performe, emquanto faço chacota de você, meu dedicado escravo! Lamba a sola do calçado que eu uso, mais immunda a cada passo! Agora, todavia, ando descalço em casa, apprisionado! Minha sola ficou encardidissima! Lhe exfolla a lingua, si lamber, é o que eu realço! Pisar em sua lingua, quando valso ou sambo, me diverte! Sim, é bolla você para mim! Sabe por que rolla? É cego de verdade, não é falso!

88


ALLEGRO MA NON TROPPO [6066]

Emquanto pisco um olho, o ser humano trabalha por mim, cumpre meu intento. Accabam de inventar, neste momento difficil, mais um virus que faz damno. Assim que eu gosto! Os gajos do mundano planeta jus me fazem! Me contento com isso! Tanto forjam o tormento ao jeito meu, que delles eu me uffano! Admasso-lhes o pão, mas elles -- Porra! -não comem conformados! Uma vela accendem para mim, outra alguem zela a fim de que qualquer sancto os soccorra! Então, nem sempre exguicho minha porra com todo o tesão, mesmo si me fella a bocca desse cego que faz bella e docil oração, antes que morra!

89


PERO NO MUCHO [6067]

Sou contra! Não approvo! Não insista! Não vê que tomo opposta decisão aos actos do governo? Não vê não? Entenda duma vez: sou anarchista! Mas veja bem: qualquer poncto de vista se pode rever, claro! Todos são capazes de mudar de opinião! Aos tempos não ha força que resista! Si tempo for dinheiro, meu amigo, ahi que estou revendo o meu conceito! É claro que vender-me não acceito! Comtudo, fui directo no que digo! Acceito conversar si, sem perigo de nisso ser corrupto, surte effeito a somma do que eu disse, em meu proveito, custar uma assistencia a algum mendigo...

90


DISTANCIAMENTO SOCIAL [6068]

Estão fazendo um puta dum barulho de appartamento para appartamento, pois todo mundo em casa num momento dá nisso. Aguentarei eu até julho? Septembro? Outubro? Sabe Zeus! Attulho meus tympanos com berros dum nojento funkeiro. Ouvir breguices não aguento mais. Falta alguma coisa nesse embrulho? Sim! Altos batteboccas tambem são ouvidos nas paredes, chão e tecto. Divorcios ou heranças são, directo, motivo de estridente discussão. Mas vou ficar tranquillo. Todos vão querer sahir à rua quando o veto findar. Emfim direi que não me affecto com esse isolamento do povão.

91


VIZINHA PUNHETINHA [6069]

Ouvindo o battebocca do vizinho eu toco uma punheta que dá gosto. Me basta approximar um pouco o rosto da porta, da parede, e direitinho... Escuto quando perde elle o carinho da filha, da mulher. Está disposto a baldes chutar. Foi ja descomposto. Agora revidar vae, excarninho. {Cês querem dar o fora? Ja me pego sozinho! Vou ficar é bem tranquillo! Vão logo! Vão à merda! Sem vacillo! Não voltem, hem? Assim é que eu sossego! Vocês não fazem falta! Descarrego um peso dos meus hombros! Para aquillo que importa, meu tesão, posso, sem grillo, foder algum vizinho, um tal que é cego!}

92


VAZIAS PHANTASIAS [6070]

Insomne, escuto tudo o que, durante a noite, em quarentena, a vizinhanรงa discute emquanto fode. Mais advanรงa a hora, mais punhetas me garante. Accyma, a adolescente vacillante, chupando o namorado, faz lambanรงa, mordendo o pincto. Um berro o joven lanรงa e chuta a nymphetinha. Ah, ri bastante! Abbaixo, um casal briga, pois o cara metteu fundo demais na bocca aberta de menos. Elle em cyma della accerta um tapa. Agora a bocca se excancara. Divirto-me com esse show e, para gozar, dos machos sempre tenho offerta de rollas chupar quando a coisa apperta na vida conjugal de excassa tara.

93


TYRANNICO PANICO [6071]

A vida social accabou para nós todos, no momento. Mais ninguem sae para se junctar. Mais ninguem tem contactos pessoaes. Ninguem se encara. Um dia, accabará, para quem para em casa, a paranoia. Ahi, ja sem estar em quarentena, vae alguem sahir, se libertar do que o trancara. Mas, para mim, a vida social accaba mesmo. Nunca mais terei coragem de sahir. Ja não verei motivo para achar nada normal. Ja quasi não sahia, mas é tal meu medo, que nem duma dura lei dependo. Só pyjamas guardo. Sei que nunca vem visita a mim egual.

94


INIMIGO INVISIVEL [6072]

É como um filme, desses Me lembro dum chamado, de Andromeda”. A acção dum microorganismo, ou

de terror. acho que “Enigma rolla toda em cyma o que for.

O ser humano é minimo. Urdidor de engenhos scientificos, se estima accyma da bacteria, duma enzyma. Se julga aos outros bichos superior. O virus, microscopico, é maior que nós, mas invisivel. Tem coroa, pretende, sim, reinar, cada pessoa de subdito fazer, sempre em redor. Nos ronda. Nem siquer sabe de cor aquillo que nos arda, que nos doa. Sim, somos vulneraveis, mas à toa não cremos, não creamos Baccho, ou Thor.

95


AMERICAN WOMAN [6073]

Fallar mal da mulher virou tabu politico, mas algo que ser dicto precisa da mania de delicto que exsiste nesse mytho do “Me too”. Em vez de só mandar tomar no cu essas opportunistas, me limito a lhes dizer que escutem meu subscripto rock “American Woman” do Guess Who. Um homem ja não serve para aquella mulher que tudo entende ser “abuso”? Então ella que tente fazer uso dum cabo de vassoura, ou de panella! A dona só me accusa de mazella? Tambem eu de mazella agora a accuso! Ficamos empattados, eu deduzo, embora sendo eu feio, ou ella bella!

96


MEME DO SEXO VIRTUAL [6074]

{Não basta trepar, Glauco! Tenho, nua, que me photographar! Você sabia? Sinão, como, durante a pandemia, irei mostrar que a vida continua? A gente trepa, cada qual na sua, mas meu corpão a rede ja vigia! Assim todos verão que estou sadia! Pellada só não orna andar na rua! Não acha, Glauco? Sei que cegos não se importam com imagens! Todavia, você concorda, né? Quem, todo dia, trepar vae sem fazer divulgação?} -- Amiga, si me vissem, o tesão brochava! Melhor faço si na pia me lavo da punheta que vicia um cego. Que se expalhe escuridão!

97


EDUCAÇÃO À DISTANCIA [6075]

Ao vivo, o molecote estuda deante da tela de seu novo cellular. Remotamente, para leccionar com emphase, se exforça alguem bastante. O mestre, em attitude provocante, faz mimica, torcendo o maxillar, abrindo bem a bocca cavallar, a lingua a lhe espichar, egual bacchante. Assanha-se, de facto, o molecote, mas, nessa quarentena, a prole toda se juncta alli na salla. “Que se foda!”, decide-se em commum. Alguem que note! O joven quer mostrar, tambem, seu dote. Abbaixa as calças, tira a rolla, açoda a mão battendo bronha. Se incommoda a mãe. Ninguem notou o seu decote.

98


HOME OFFICE [6076]

No gruppo de trabalho, um advogado, em teleconferencia, faz de casa a sua parte. Toda a these embasa com technica. Detalha cada dado. Estão engravatados. Só o coitado destoa, de pyjama, pois se attraza e exhibe, ‘inda, remellas, ja que em braza os olhos tem. Paresce extremunhado. Os outros, por emquanto, fingem nem notar, mas o causidico se sente em casa mesmo. Passa, de repente, a cravos pela cara achar que tem. Expreme saliente espinha, sem o minimo pudor. Aquella gente formal emfim se coça. Ah, clima quente! Agora todos cravos teem, tambem.

99


HORMONAL DESHARMONIA [6078]

Por causa da maldicta quarentena os animos accirram-se. Quem ria reclama ja da aguda gritaria e muito bom humor não mais enscena. A thia do cachorro não tem pena. A sogra accusa a sanha má da thia. A filha nymphetinha se entedia. Os paes acham que a casa está pequena. Emfim, o battebocca na roptina se installa: “Va tomar no cu, caralho!” “Não falle assim commigo, seu pirralho!” “Pirralho é o cu da mãe dessa menina!” Quem xinga é um enteado que azucrina geral. Ja demittido do trabalho, vae, por computador, ver que eu lhe calho bem como chupador. É gente fina.

100


EMPATHIA COM QUEM CHIA [6079]

{Emquanto a classe media fica ahi fazendo a quarentena de motivo appenas de diario, eu, que convivo com gente da peripha, sou cricri! Não, Glauco, pense bem! Quem é que ri brincando com um drama collectivo, com tanto desemprego? Não! Passivo não fico! Não é mero mimimi! Tem gente sem comida! Ja não é questão só de ficar entediado! Não é como chiar porque o calçado produz, num pé estressado, mais chulé!} -- Concordo. No povão pensei, até. Mas esse seu exemplo foi forçado demais! Por que citar o pé estressado? Da cuca alguem ficou, tambem, lelé.

101


CARAS MASCARADAS [6080]

No banco, mascarado, um assaltante confunde-se com mero correntista edoso. Não dará, portanto, pista. Agguarda até que alguem sua vez cante. Mas, antes que a vez chegue, num instante a coisa se complica. Que desista do roubo quem perdeu de vez a vista fará, pois esperou, tambem, bastante. O cego um baita accesso tem de tosse e assusta o bandidão, que sae de perto. Na pressa, a arma derruba, ja que experto jamais foi. Fica, agora, sem a posse. Aggarram-no. Ja preso, que farão outros detentos que, estão contaminados. Falla, o cego: “Me curei, ja. Foi

102

se coce decerto, aberto, precoce.”


ISOLAMENTO SELECTIVO [6081]

Visitas? Nem pensar! Eu não recebo ninguem! Na minha pagina, sim, faz quem queira a visitinha, Glauco, mas que muitos não curtiram ja percebo. Não quero saber, Glauco! Sou mancebo de poucos predicados! Sou rapaz nojento, repulsivo! Sou mordaz, sarcastico! Na rolla juncto sebo! Sim, esta quarentena me complica. Não posso visitar algum cliente que cheiros meus, fortissimos, aguente e pague si chupar a minha picca. Mas ahi não Nem

noto que você, cego, que fica sempre trancado, mais doente vae ser. Visital-o vou. Consente? cobro. Ver você ja gratifica.

103


ISOLAMENTO VERTICAL [6082]

Os velhos que se fodam! Um que morra a menos ou a mais, ah, tanto faz! Sou joven, sou saudavel, sou rapaz athletico! Não vejo quem mais corra! Você, não, Glauco! Foda-se, então, porra! Alem de velho, é cego! Não tem gaz nenhum! Em casa fique, porra! Mas entenda não haver quem o soccorra! Não! Caso um gajo joven, como eu, faça alguma visitinha a um velho cego, não corre riscos! Virus si não pego, dará tesão curtir sua desgraça! Sim, Glauco, ja pensou? Você, que passa ja preso tanto tempo, tem um ego de verme! Em você, quando descarrego meu gozo, penso: Foda-se essa raça!

104


ISOLAMENTO HORIZONTAL [6083]

Que posso concluir da Em casa todo mundo, o a ser foder bastante, a ser um penitente se

quarentena? jeito vem que ninguem condemna.

Familia grande, em casa tão pequena, mais soffre, confinada, ja que sem foder vão ficar. Claro, ninguem tem coragem de exhibir-se em nua scena. Mas sempre se resolve. Põe um mano deitado o pé na cara doutro, quando, dormindo de valete, vae ficando durissimo o caralho sob o panno. Irmãos sempre se chupam, não me enganno na analyse. Desfructem, pois, si bando formaram numa cama, no commando estando o mais thalludo ou mais tyranno.

105


ACCHATAMENTO DA CURVA [6084]

Emquanto não se pode sahir, bota na cara do menor o seu pé chato o mano que, mais velho, de insensato ja posa, ja postura adulta adopta. Deitados de valete numa quota restricta de colchão, ninguem de facto tranquillo dormirá. Por mim, ja batto punhetas mil, pensando na patota. Dá nisso quarentena, num pequeno espaço, de familia numerosa. Ninguem conseguirá contar em prosa metade do que conto em meu terreno. Faltou dizer que curva não se vê no pé chato do menor, tambem. Não goza lambendo só chulé ninguem. Gostosa foi tal introducção, num tom ameno.

106


COCEIRA NA BOCETA [6085]

Velhota, a mulher segue, ‘inda, solteira. Morando só, dispensa até empregada chamar para a faxina. Quer em cada centimetro da casa ser ligeira. E varre, e limpa, lava... Faxineira questão faz de virar. Jamais se enfada si escuta aquella aguda barulhada do velho adspirador, ou barulheira. Me irrito, porque estou, no meu andar, ouvindo tudo, inclusa a cantoria da doida solteirona. Ah, vae, enfia o cabo da vassoura! Puta azar! Podia vibradores enfiar na chota, até cenouras, sim, podia usar a bruxa, aquella velha thia! Mas deixa... A quarentena vae passar...

107


EXCESSO DE ESTRESSE [6086]

Scismou de consertar a casa inteira! Vizinho mala! Aqui do meu andar a gente escuta tudo! Martellar adora aquelle estupido! Toupeira! Eu, puto, torço para que elle queira seu dedo martellar! Si elle deixar debaixo do martello o pollegar, que scena, linda, bella, prazenteira! O cabo do martello, por que não enfia bem no rabo o desgraçado? Por que é que elle não faz, do meu aggrado, alguma coisa audaz, que dê tesão? A cara alli no vaso, o cagalhão ainda sem descarga, affunde! Estado bem critico, o meu! Logo -- Ufa! -- me evado da raiva! Ah, meu calmante! Irmão, perdão!

108



SUMMARIO MOLYSMOPHOBIA [6077].........................................9 FARRA NA MARRA [5919].......................................10 MEME CHAMMUSCADO [5920].....................................11 ACCERTO DE TRACTAMENTO [5921]...............................12 MOLECA SAPECA [5922]........................................13 MEME DA CERCA PULLADA [5923]................................14 MEME DA BABA [5924].........................................15 MEME DO DISCURSO [5925].....................................16 EM TORNO DUMA PHRASE [5927].................................17 VALE QUANTO FELLA [5928]....................................18 PHALLICO ACTO FALHO [5929]..................................19 NOITE SOB AÇOITE [5930].....................................20 INIMIGAVEL VESTUARIO [5931].................................21 WEIRD DISSONNET [5932]......................................22 QUADRO DESEMMOLDURADO [5933]................................23 VINHO NACIONAL [5934].......................................24 MISCELLANEA SUPPEDANEA [5935]...............................25 MEME DO MARÇO AZUL MARINHO [5936]...........................26 MEME DA MENINA MALHADA [5937]...............................27 MEME DA MENINA ENSABOADA [5938].............................28 MEME DA VERRUGA [5939]......................................29 MACHINA DO TEMPO [5940].....................................30 MEME DA MASCARA [5941]......................................31 VINHO DE SAFRA [5942].......................................32 OPHIDIO SEM OFFICIO (II) [5943].............................33 HESITANTE INSTANTE [5944]...................................34 TOO GOOD TO BE TRUE [5945]..................................35 CHINEZA SEM DEFESA [5946]...................................36


RESPOSTA IMMUNOLOGICA [5947]................................37 VIGARIO SOLITARIO [5948]....................................38 LINGUA PENDENTE [5949]......................................39 PULLO DE SUSTO [5950].......................................40 HILARIO PLENARIO [5953].....................................41 MISCELLANEA MONARCHISTA [5958]..............................42 MISCELLANEA TROPICAL [5966].................................43 MEME DO PAU DOADO [5975]....................................44 DOSE EXACTA (I) [5977]......................................45 MISCELLANEA VERBIVOCOVISUAL [5983]..........................46 MISCELLANEA COPROPHILICA [5985].............................47 MISCELLANEA BUCCAL [5986]...................................48 MISCELLANEA CATARRHAL [5987]................................49 DOSE EXACTA (II) [5988].....................................50 MISCELLANEA THEOLOGICA [5989]...............................51 MEME DO ASSOBIO [5994]......................................52 MEME DA PEDREIRA [5995].....................................53 MEME DA DESCONVERSA [5996]..................................54 JUSTIFICANDO OS MEIOS [5998]................................55 QUEM PAGA PELA PRAGA? [5999]................................56 DISCRETA META COMPLETA [6000]...............................57 MISCELLANEA SOBREHUMANA [6001]..............................58 MISCELLANEA DA APPARENCIA [6002]............................59 MEME DA RISADA [6006].......................................60 MEME DA NYMPHOMANIACA [6008]................................61 MEME DO VOCABULO CABULOSO [6009]............................62 MISCELLANEA IRRESIDENTE [6010]..............................63 MEME DA MADRUGADA SEM BATTUCADA [6011]......................64 MISCELLANEA DA PASSAGEM [6012]..............................65 TURBA DA DESURBANIDADE [6013]...............................66 MEME DA MÃE DO PUNK [6014]..................................67


VALENTES VIGILANTES [6020]..................................68 BARULHO NA JANELLA [6022]...................................69 MISCELLANEA DYSFUNCCIONAL [6035]............................70 MISCELLANEA EUPHEMINISTA [6037].............................71 MEME DA BICHA MACONHEIRA [6048].............................72 MISCELLANEA DA INFORMATICA [6049]...........................73 RASPA DO TACHO [6051].......................................74 QUARENTENA NA QUARESMA [6052]...............................75 POST SCRIPTUM [6053]........................................76 LINGUA CALLEJADA [6054].....................................77 ITALIA QUE ME CALHA [6055]..................................78 MEME DA SOLIDARIEDADE [6056]................................79 MEME DA QUARENTENA [6057]...................................80 MEME DA MÃO LAVADA [6058]...................................81 MEME DO ELEVADOR [6059].....................................82 MEME DO DESABBAFO [6060]....................................83 DIARIO OFFICIOSO [6061].....................................84 DAY AFTER [6062]............................................85 FORTISSIMO LUNGO [6063].....................................86 PLENA QUARENTENA [6064].....................................87 FEITOR LEITOR [6065]........................................88 ALLEGRO MA NON TROPPO [6066]................................89 PERO NO MUCHO [6067]........................................90 DISTANCIAMENTO SOCIAL [6068]................................91 VIZINHA PUNHETINHA [6069]...................................92 VAZIAS PHANTASIAS [6070]....................................93 TYRANNICO PANICO [6071].....................................94 INIMIGO INVISIVEL [6072]....................................95 AMERICAN WOMAN [6073].......................................96 MEME DO SEXO VIRTUAL [6074].................................97 EDUCAÇÃO À DISTANCIA [6075].................................98


HOME OFFICE [6076]..........................................99 HORMONAL DESHARMONIA [6078]................................100 EMPATHIA COM QUEM CHIA [6079]..............................101 CARAS MASCARADAS [6080]....................................102 ISOLAMENTO SELECTIVO [6081]................................103 ISOLAMENTO VERTICAL [6082].................................104 ISOLAMENTO HORIZONTAL [6083]...............................105 ACCHATAMENTO DA CURVA [6084]...............................106 COCEIRA NA BOCETA [6085]...................................107 EXCESSO DE ESTRESSE [6086].................................108


SĂŁo Paulo Casa de Ferreiro 2020




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.