1ª Edição
Rio de Janeiro Editora Betel 2013
Deus na Prisão Copyright © Editora Betel Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei dos Direitos Autorais 9610/98. Solicitamos que breves citações, com fins acadêmicos, nos sejam previamente comunicadas. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, sob quaisquer meios (eletrônico, fotográfico e outros). O conteúdo original da obra é de total e exclusiva responsabilidade do autor.
Sobre o livro Categoria: Missões e educação religiosa 1ª Edição - Setembro de 2013 Projeto Gráfico: Anderson Rocha Ilustrações: Beto Martins Revisão: Giovani Corrêa Formato: 16 x 23 cm ISBN: 978-85-8244-006-3
Contatos do Autor Site: www.direitoereligiao.com.br E-mail: acarlos_juridico@yahoo.com.br Editora Betel Rua Carvalho de Souza, 20 - Madureira - RJ Site: www.editorabetel.com.br Telefone: (21) 3575-8900 Impresso no Brasil - Rio de Janeiro
Sumário
Apresentação do Pr. Abner Ferreira_____________________________________ 7 Prefácio do Dr. Rogério Greco_________________________________________ 9 Prefácio da Ph.D. Vilma “Nina” Balmaceda______________________________ 11 Prefácio do Rev. Dr. Hernandes Dias Lopes______________________________ 13 AGRADECIMENTOS_____________________________________________ 15 INTRODUÇÃO__________________________________________________ 17 1. A ASSISTÊNCIA RELIGIOSA E O DIREITO_________________________ 1.1. Um breve histórico da assistência religiosa nas constituições______________ 1.2. Os parâmetros infraconstitucionais vigentes nacionalmente______________ 1.3. O caso do Estado do Rio de Janeiro________________________________ 1.4. Alguns temas já decididos por nossos tribunais________________________ 1.4.1. Batismo fora da prisão__________________________________________ 1.4.2. Participação em culto público______________________________________ 1.4.3. Limitação de horários___________________________________________ 1.4.4. Formação teológica do capelão______________________________________ 1.5. Em suma____________________________________________________
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2. CRIME E PRISÃO: REINCIDÊNCIA OU RESSOCIALIZAÇÃO?__________ 2.1. Como está o sistema prisional?____________________________________ 2.2. Quais as propostas do Estado?____________________________________ 2.3. Ainda assim é possível crer na ressocialização?________________________ 2.4. O que a religião tem a ver com isso?________________________________ 2.5. Os fatos comprovam a teoria?____________________________________
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3. A RESPOSTA CRISTÃ PARA A RESSOCIALIZAÇÃO DO PRESO_________ 75 3.1. A realidade da criação__________________________________________ 75 3.2. O homem afastado de Deus _____________________________________ 83 3.3. A corrupção dos padrões bíblicos__________________________________ 86 3.3.1. O fundamento último das normas humanas____________________________ 89 3.3.2. Alguns princípios bíblicos maculados pelo pecado_________________________ 92 3.3.2.1. Os relacionamentos familiares____________________________________ 92 3.3.2.2. Oposição à ganância e ao amor ao dinheiro __________________________ 96 3.3.2.3. O pecado estrutural___________________________________________ 99 3.4. A ação graciosa de Deus destinada a todos os homens__________________ 100 3.4.1. Meios e frutos da graça comum ___________________________________ 102 3.4.2. A aplicação da graça comum na capelania prisional _____________________ 110 3.5. A conversão dentro das prisões___________________________________ 115 3.6. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça___________________ 119 CONCLUSÃO__________________________________________________ 127 REFERÊNCIAS_________________________________________________ 129 APÊNDICE 1. CITAÇÕES EM TEMAS FUNDAMENTAIS_______________ A) A desestrutura familiar é uma das causas para o cometimento de delitos_____ B) Falência da pena de prisão no alcance do seu ideal ressocializador__________ C) A pena privativa de liberdade como fator criminógeno__________________ D) Estigmatização da pena de prisão__________________________________ E) Funções das penas e medidas alternativas____________________________ F) A imperiosa união do Estado e da sociedade para a ressocialização__________ G) Necessidade de que o delinquente tenha vontade de se ressocializar________ H) Revisão moral e prestação de serviço à comunidade____________________ I) A reforma moral como um veículo imprescindível para a ressocialização______ J) A religião como principal forma, senão única, de se promover a alteração moral no criminoso_______________________________________________ K) A dignidade humana como princípio reconhecidamente conquistado pelo cristianismo____________________________________________________
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APÊNDICE 2. DEPOIMENTOS DE AUTORIDADES CIVIS______________ 173 ANEXO. LEGISLAÇÃO DE REFERÊNCIA___________________________ Lei nº 9.982, de 14 de julho de 2000__________________________________ Resolução nº 8, de 9 de novembro de 2011_____________________________ Portaria SSAUP – SEAP nº 5, de 31 de janeiro 2004______________________
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS_______________________________ 197
Apresentação do Pr. Abner Ferreira
A ordem para que os cristãos prestem assistência espiritual aos presos existe desde a época de Cristo. Foi Ele mesmo quem nos ordenou vestir o nu, cuidar do enfermo e visitar o preso (Mateus 25.31-40). A expansão da Igreja, nesse sentido, fez com que surgissem ministérios específicos para a realização de cada um dos compromissos cristãos, dentre os quais o da capelania prisional. Contudo, mesmo assaz importante, poucos se dedicaram a estudar esse tema com profundidade. Não é sem motivo, pois, que tenho a honra de apresentar ao público brasileiro o mais novo lançamento da Editora Betel, Deus na prisão. A tríplice abordagem – jurídica, sociológica e teológica – feita pelo autor abarca a essência do que se pode pensar nessa seara. Em razão de sua análise meticulosa, o livro pode ser considerado um marco naquilo que se propõe: balizar o referencial teórico da prestação da assistência religiosa aos encarcerados. Tenho a convicção, pois, que o livro é uma valiosíssima contribuição para aqueles amados irmãos que exercem a capelania nos presídios. Através desses escritos somos habilitados a confrontar os que tentam minimizar o impacto transformador e regenerador que Jesus Cristo promove na vida daqueles que O conhecem. Afinal, Ele veio salvar os doentes (Mateus 9.12).
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Por tudo isso, e muito mais, recomendo a leitura desta inestimável obra, tanto para aqueles já envolvidos com o fazer pastoral quanto para os que desejam se aprofundar no assunto. Que Deus continue agindo na prisão!
Pr. Abner Ferreira Advogado e Teólogo Presidente da Convenção Estadual do Ministério de Madureira no Estado do Rio de Janeiro Presidente da Catedral Histórica das Assembleias de Deus do Ministério de Madureira
Prefácio do Dr. Rogério Greco
Já de há muito tempo se vem discutindo os problemas inerentes ao processo de ressocialização do condenado. Nos últimos tempos a sociedade, de uma forma geral, principalmente motivada pelas opiniões divulgadas pela mídia, tem questionado sobre a real possibilidade de ressocialização do preso. Assim, seria ela possível, mesmo para condenados que tenham praticado crimes graves, a exemplo de homicídios, estupros, extorsões mediante sequestro, tráfico de drogas etc.? Haveria efetivo interesse por parte do Estado em promover a reinserção do egresso ao convívio social? A sociedade estaria preparada para recebê-lo? Parece que essa mesma sociedade, e também o Estado, desistiram dos condenados, e não acreditam mais na sua recuperação. Em boa hora, Antonio Carlos da Rosa Silva Junior, na presente obra intitulada, sugestivamente, de Deus na Prisão, vem trazer um sopro de esperança, analisando o processo de ressocialização sob um enfoque diferente: a necessidade da ministração da Palavra de Deus para que o processo ressocializador seja bem sucedido. Aqueles que militam perante a Justiça Criminal podem testemunhar a diferença entre um preso convertido, ou seja, que teve um encontro verdadeiro com Jesus Cristo, e aquele que não tomou essa decisão de vida. Raramente os presos convertidos causam algum problema durante
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a execução de sua pena. Não se rebelam, atendem a todas as autoridades e otimizam seu tempo com trabalho, lazer e, principalmente, com o conhecimento diário das Sagradas Escrituras. Assim, meu querido irmão em Cristo, Antonio Carlos Junior, em um trabalho de fôlego, analisa detidamente cada detalhe necessário para se concluir pela imprescindibilidade da apresentação da Palavra de Deus para que o homem, realmente, se recupere. Essa obra, a partir de agora, deverá nortear as políticas penais, lançando luz em problemas até então impossíveis de serem resolvidos simplesmente com a criação legislativa. Deus não desistiu do homem. Deus não desistiu de você.
Dr. Rogério Greco Procurador de Justiça do MPMG Mestre e Doutor em Direito
Prefácio da Ph.D. Vilma “Nina” Balmaceda
Antonio Carlos da Rosa Silva Junior é um jovem valor do mundo jurídico brasileiro conhecido por seu excepcional compromisso com a integração da fé cristã à reflexão e prática no campo do Direito. Este trabalho é principalmente um convite a considerar com seriedade os argumentos jurídicos, sociológicos e teológicos que exigem um olhar crítico sobre o sistema penitenciário, especialmente no Brasil, mas com implicações certas para todos os países das Américas. Como afirma o autor, rejeitando o extremismo do naturalismo materialista, é necessário olhar cada pessoa não apenas como objeto do amor de Deus, mas como sujeito que carrega a imagem do Criador. A promessa de redenção em Cristo não está limitada ao que acontece após a morte. A nova vida que Ele prometeu é relevante aqui e agora, e é uma fonte de transformação tanto para indivíduos quanto para nossas comunidades. A ciência nos ajuda a entender os mecanismos que a natureza, criada por Deus, usa para cumprir sua missão. Os seres humanos devem viver em harmonia com ela, mas não somos seres meramente materiais; nossos intelecto e espírito transcendem explicações puramente mecânicas sobre a origem e o propósito da vida. A luta contra o crime e a busca pela reabilitação dos reclusos requerem identificar e entender a complexidade dos fatores que influenciam
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na criminalidade, por um lado, e na recuperação, por outro. Muitas das pessoas que hoje passam seus dias na prisão foram, primeiro, vítimas de abandono moral, emocional e socioeconômico. Em vez de se enfurecer com os presos, a sociedade e o Estado necessitam promover políticas públicas que confrontem as causas da criminalidade fora da prisão, com especial atenção à infância e juventude em risco; e apoiar os esforços holísticos que oferecem atenção e oportunidades de desenvolvimento espiritual, emocional e intelectual dentro das prisões, facilitando a reconciliação familiar e o aprendizado de disciplinas e habilidades práticas nos campos social, laboral, artístico e dos negócios. Não se deve ignorar que a grande maioria das pessoas na prisão sofrem e continua sofrendo de inanição, não somente em termos materiais e de oportunidades, mas notadamente de amor e aceitação como pessoas. Este trabalho que tenho a honra de prefaciar é um chamado a continuar os esforços de investigação na busca de políticas mais efetivas de redignificação, humanização e atenção holística para os reclusos. Espero que muitos leitores entendam a urgência de considerar os temas levantados pelo autor e se unam ativamente a esta causa. Nesse espírito, é particularmente gratificante a mim recomendar a leitura deste livro a todos aqueles que anelam por um mundo mais justo, esperando que a ação que ele inspira contribuirá para a construção de sociedades mais pacíficas e equitativas em nosso continente.
Ph.D. Vilma “Nina” Balmaceda Diretora do Center for Scholarship and Global Engagement Nyack College and Alliance Theological Seminary, Nova Iorque (EUA)
Prefácio do Rev. Dr. Hernandes Dias Lopes
Tenho a subida honra de prefaciar esse importante livro do meu amigo Antonio Carlos Jr.. Faço-o com entusiasmo e profunda alegria, e isso por três sobejas razões. Primeiro, por causa da importância do assunto. A violência, com seus diversos desdobramentos no Brasil e no mundo, é aguda, agônica, endêmica e sistêmica. As prisões fracassam em lograr êxito na recuperação e ressocialização dos prisioneiros. Muitas vezes, chegam a ser escolas do crime. Antonio Carlos mostra com vívida eloquência que o evangelho, nesse território árido e cinzento, é o único poder que transforma o homem e liberta os encarcerados de dentro para fora. A mensagem deste livro é oportuna, necessária e vital para a nação brasileira, pois abre os portais da esperança num cenário de dor e acende uma clareira no meio da escuridão, oferecendo libertação verdadeira aos prisioneiros do pecado. Segundo, por causa do caráter ao autor. Antonio Carlos não é um escritor epidérmico que escreve da plenitude do seu coração e do vazio de sua cabeça. Reúne erudição com piedade, conhecimento com experiência, caráter com desempenho. Sua vida é o avalista de suas palavras. Seu exemplo, a maior recomendação de sua obra. O autor tem autoridade para escrever, pois a dor dos aflitos pulsa em seu peito, e a luta para uma
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libertação plena e completa dos que jazem nas celas escuras transborda de sua alma saturada de compaixão pelos aflitos. Terceiro, por causa de seu estilo refinado e de sua clareza irretocável. O livro que você tem mãos é claro, convincente, erudito. Sua mensagem vem adornada pela persuasão de um homem apaixonado pelo que diz e toca profundamente o coração. Meu ardente desejo é que este livro seja uma ferramenta preciosa nas mãos das autoridades brasileiras e um bálsamo para muitos que enfrentam esse grande drama social. Boa leitura e que Deus abençoe seu coração!
Rev. Dr. Hernandes Dias Lopes Doutor em Ministério pelo Reformed Theological Seminary, Mississippi (EUA) Presidente da Comissão Nacional de Evangelização da Igreja Presbiteriana do Brasil
Agradecimentos
Nada mais honroso que, reconhecendo minhas limitações e finitude, agradecer ao Deus Triúno, eternamente gracioso, que me manteve com fôlego de vida até aqui; sem Ele, reconheço, nada posso fazer que seja proveitoso. Depois dEle, agradeço à minha esposa, Kenya, e à minha filha, Maria Eduarda, que me incentivaram à escrita e suportaram os momentos de distância, necessários à pesquisa e redação do livro. Aos meus pais – Antonio Carlos e Vilma – e irmã – Aline –, pelo apoio incondicional e imensurável. A todos os demais parentes e amigos, pela alegria em tê-los. Não poderia deixar de agradecer, também, ao Prof. Dr. Rogério Greco, à Profª. Ph.D. Vilma “Nina” Balmaceda e ao Rev. Dr. Hernandes Dias Lopes, mestres notáveis nas três áreas que abarco no livro (respectivamente, Direito, Sociologia e Teologia), que emprestaram seus nomes para referendar esses escritos. Isso muito me honra e é fruto, única e exclusivamente, das bênçãos de Deus. Devo distinguir, ainda, três pessoas importantíssimas para que o livro fosse finalmente produzido. O diretor da Editora Betel, pastor Abner Ferreira, que abraçou a ideia, inerte desde 2009. Além de ter aguardado, pacientemente, uma ampla
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revisão do que eu já havia produzido sobre o tema, disponibilizou sua equipe para a realização de entrevistas com autoridades civis (Governador, Deputados Federais e Senadores da República), várias delas não evangélicas, que ratificam as ideias do livro. O pastor Cristiano Franco, titular da 5ª Igreja Presbiteriana de Juiz de Fora, amigo, zeloso por minha vida e família, ao qual agradeço pelas recomendações de leituras e sugestões de organização do texto, essencialmente no que se refere ao capítulo 3. O amigo das madrugadas (nosso maior rendimento intelectual começa já bem tarde da noite), Luís Eduardo Quirino Sobreira, a quem sou grato por ter passado horas debruçado sobre os originais, apontando e clarificando com muita perspicácia questões que poderiam ficar mais precisas ao leitor. A essas duas pessoas em especial compartilho os créditos do livro, assumindo para mim tudo o que, eventualmente, possa restar equivocado nas ponderações. No mais, agradeço ao ilustrador Beto Martins pelas artes que antecedem cada capítulo, bem como aos queridos da Editora Betel, os quais fizeram um belo trabalho na produção do material que, agora, lhe chega às mãos. Enfim, a todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para que esse livro nascesse. Muito obrigado!
Introdução
Desde meus estudos na pós-graduação em Ciências Penais tenho pesquisado sobre os elementos religiosos nos presídios. Intrigava-me – e ainda me intriga – como pessoas que cometem crimes e são lançadas nos cárceres brasileiros poderiam experimentar algum tipo de recuperação, ou noutros termos, sair da prisão e não voltar a delinquir. Teria a religião algum papel nesse processo? Por isso meu interesse em estudar a capelania prisional, que pode ser definida como a assistência religiosa prestada nos estabelecimentos reservados ao cumprimento de penas de ordem criminal. Tal assistência abrange tudo o que envolve a religiosidade, como a participação em cultos públicos (abertos aos adeptos de todas as matrizes religiosas, embora possam estar direcionado aos que pertencem à comunidade de fé), a realização de rituais próprios que não geram riscos ao sistema carcerário como um todo e às pessoas que ali estão (como batismo e casamento) e o oferecimento de orientação espiritual individualizada. Contudo, em respeito à liberdade de consciência e crença, ninguém pode ser obrigado ou constrangido a participar de nenhuma dessas atividades, nem impedido de ter acesso àquelas que são abertas a todos. Disso decorre, certamente, que embora um preso não possa ser forçado a presenciar um culto público, possa restar impedido de receber, por exem-
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plo, o batismo ou a ceia, se, por algum motivo, não seguir os preceitos religiosos de determinada instituição. O fato é que inexiste até o momento – ao menos eu desconheço – um material teórico abrangente que se proponha a abordar o tema da capelania prisional de forma consistente, conjugando conhecimentos de vários ramos acadêmicos. O objetivo desse livro, pois, é suprir essa lacuna, ou, no mínimo, minorá-la, já que a temática é abordada a partir de três perspectivas, distintas mas complementares: jurídica, sociológica e teológica. O viés jurídico (capítulo 1) nos traz a compreensão de como se consolidou a assistência religiosa no contexto constitucional, alcançando o status atual de ser assegurada como um direito dos presos e das instituições religiosas. Após, ingressamos no plano normativo ordinário, esmiuçando a legislação vigente, para apontar seus acertos e equívocos. Depois, tecemos considerações sobre a normatização da assistência religiosa prisional no Estado do Rio de Janeiro, escolhido porque sistematiza a atuação hodierna e sinaliza para o futuro: além de já vigorar uma Portaria da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, existe um Projeto de Lei em tramitação. Por fim, analisamos o conteúdo de algumas decisões dos nossos tribunais sobre questões que nos afetam: a (im)possibilidade de batismo e participação em cultos promovidos fora dos presídios, a (não) limitação de horários para a realização da capelania e a (des)necessidade de formação teológica do capelão. No prisma sociológico (capítulo 2) expomos dados oficiais que demonstram o estado caótico pelo qual passa o sistema prisional (em dezembro de 2012, por exemplo, eram quase 550.000 presos para pouco mais de 310.000 vagas), ocasionando um índice de reincidência entre 70% e 85%. Por isso mesmo, a ressocialização do infrator, uma das principais funções da pena, não é minimamente cumprida: o encarceramento se ajusta mais a uma “escola do crime” e é potencializador de um estigma degradante. Visando minorar essa realidade, visualizamos as propostas estatais para evitar que pessoas que cometem crimes de menor potencial ofensivo sejam presas.
INTRODUÇÃO
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Diante desse quadro, verificamos que ainda é possível acreditar na ressocialização de presos, notadamente quando uma reforma moral é levada a efeito no delinquente. Mas como conseguir essa reestruturação moral? Sobretudo, se não de maneira única, através da religião. Tudo isso é comprovado a partir de estudos acadêmicos feitos em unidades prisionais: eles nos dão conta que a religiosidade cristã-evangélica opera, a partir da conversão, uma reformulação de comportamentos. No capítulo 3, a seu turno, analisamos a capelania prisional sob a perspectiva teológica, demonstrando como as proposições cristãs respondem, de forma integral e satisfatória, à realidade do crime e às possibilidades de ressocialização. Para tanto, expomos as verdades bíblicas acerca da criação (como o homem é dignificado por ser o primor da criação divina) e do pecado e seus trágicos efeitos, enfatizando a corrupção dos padrões divinos. Em seguida, discorremos sobre a graça de Deus dispensada a todos os homens e sobre como Ele usa da consciência humana, dos governos, das relações sociais e das recompensas e punições para trazer à humanidade percepções de verdade e moralidade, práticas do bem público e da justiça civil e refreamento do pecado. Depois de aplicarmos esse arcabouço ao papel ressocializador da assistência religiosa, apresentamos as mudanças conseguidas pela atuação do Espírito Santo na conversão pessoal. Por fim, realizamos uma breve meditação sobre a justiça que será realizada no porvir, ansiando pelo estado de perfeição que nos aguarda. Cabem, ainda, quatro considerações finais nessa introdução. A primeira delas se refere à nomenclatura utilizada para designar o processo de mudança no comportamento do criminoso que, através da reforma de seus valores, não mais volta a delinquir, se livra dos atrativos do crime e passa a instrumentalizar uma influência positiva naqueles que o tinham, enquanto delinquente, como modelo. Preferimos o termo ressocialização – a “tratamento”, “reabilitação” e “reintegração social”, por exemplo – por três motivos principais: i) a terminologia empregada em nada altera o conteúdo tratado; ii) esse é o vocábulo mais utilizado pelos
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estudiosos quando escrevem sobre o fenômeno, restando por isso consagrado; e iii) a adoção de um padrão evita desencontros terminológicos. A segunda tem razão por conta de o presente estudo querer balizar o tema da capelania prisional de forma técnica e aprofundada. Ao final do livro há um apêndice no qual constam citações de vários autores sobre temas-chave (indicados por um asterisco no curso do raciocínio), como a falência da pena de prisão em cumprir seu ideal ressocializador e a dignidade humana como princípio notoriamente conquistado pelo cristianismo. Evitamos, com isso, o excesso de referências no texto, dando-lhe fluidez, tendo essa parte do livro dois papéis fundamentais: a) mostrar que os posicionamentos esposados não são exclusivos desse autor; e b) dar consistência argumentativa ao leitor quando estiver em diálogo com aqueles que, por algum motivo, tentam minimizar a importância da assistência religiosa aos presidiários. Uma terceira decorre da inserção de outro apêndice. Nele colacionamos a opinião das autoridades civis (Governador, Deputados Federais e Senadores da República) entrevistadas a pedido do pastor Abner Ferreira, que apresenta o livro. Tais autoridades falam sobre a realidade do sistema penitenciário no Brasil, a importância do cristianismo no processo de ressocialização do detento e as possíveis formas de atuação da igreja evangélica nesse contexto. A quarta, por fim, traz nossa explicação quanto à forma de citação bíblica. Eis um exemplo: Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele. (...) E a condenação é esta: Que a luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras eram más. Porque todo aquele que faz o mal aborrece a luz e não vem para a luz para que as suas obras não sejam reprovadas. Mas quem pratica a verdade vem para a luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque são feitas em Deus. (João 3.16-17,19-21)
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“João” se refere ao livro citado. Enquanto o número antes do “ponto final” traz o capítulo, os números depois dele indicam os versículos. O “travessão” expressa que a citação se dá de um versículo até o outro; a “vírgula” significa “e”. Assim, no trecho acima, temos a citação do livro de João, capítulo 3, versículos 16 a 17 e 19 a 21. Feitas essas observações, iniciemos o estudo.