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CAPÍTULO XIX - DUAS CARTAS

CAPÍTULO XIX

Duas cartas

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Foi no final de junho que a carta de Della Wetherby chegou a Poliana.

"Estou escrevendo para lhe pedir um favor – escreveu a senhorita Wetherby. – Espero que você possa me indicar alguma família particular tranquila em Beldingsville que esteja disposta a ficar com a minha irmã no verão. Seriam três pessoas, a Sra. Carew, sua secretária, e seu filho adotivo, Jamie. (Você se lembra do Jamie, não é?) Eles não querem ficar em um hotel ou pensão. Minha irmã está muito cansada e o médico a aconselhou a ir ao interior para um descanso completo e mudança de ares. Ele sugeriu Vermont ou New Hampshire. Na hora, pensamos em Beldingsville e em você. Então, nos perguntamos se não poderia recomendar o lugar certo para nós. Eu disse a Ruth que te escreveria. Eles gostariam de ir logo, no início de julho, se possível. Seria pedir demais que nos avisasse se souber de algum lugar? Por favor, me escreva neste endereço. Minha irmã está conosco aqui no hospital por algumas semanas em tratamento.

Na esperança de uma resposta favorável,

Cordialmente,

Della Wetherby."

Nos minutos após ler a carta, Poliana se sentou com a testa franzida, procurando mentalmente algum lugar em Beldingsville que pudesse hospedar seus velhos amigos. Então, de repente, algo lhe deu um novo rumo e, com uma alegre exclamação, correu até sua tia na sala de estar.

– Tia, tia – ela ofegou. – Eu acabei de ter a ideia mais adorável de todas. Eu lhe disse que algo aconteceria, e que eu desenvolveria um talento maravilhoso algum dia. Bem, eu desenvolvi. E foi agora mesmo. Ouça! Recebi uma carta da senhorita Wetherby, irmã da Sra. Carew. Lembra da senhora que me hospedou naquele inverno em Boston? Bem, eles querem vir para o interior no verão, e a senhorita Wetherby escreveu para perguntar se conheço algum lugar para eles. Eles não querem um hotel ou uma pensão. Achei que não soubesse de nenhum lugar, mas eu sei. Eu sei, tia Poli! Adivinhe onde é. – Minha querida criança – disparou a Sra. Chilton –, você é incontrolável! – Parece que você ainda tem doze anos e não uma mulher adulta. Do que está falando agora? – Sobre um lugar para a Sra. Carew e Jamie ficarem. Eu encontrei – balbuciou Poliana. – Não duvido. Bem, e daí? No que isso me afeta? – murmurou a Sra. Chilton, tristemente. – Porque é aqui. Vamos recebê-los aqui, tia. – Poliana! – A Sra. Chilton estava sentada, ereta e horrorizada. – Tia, por favor, não diga não... por favor, não – implorou Poliana, ansiosa. – Não vê nossa chance? É a chance pela qual tenho esperado, e acabou de cair em minhas mãos. Nós podemos fazer isso de forma adorável. Temos muito espaço e eu posso cozinhar e cuidar da casa. Assim, teríamos dinheiro, pois eles pagariam bem, eu sei. E tenho certeza de que adorariam a ideia. São três pessoas... vem uma secretária com eles. – Não posso, Poliana! Transformar essa casa em uma pensão... a propriedade dos Harrington se tornar uma pensão comum? Ah, Poliana, não, não! – Mas não seria uma pensão comum, querida. Seria incomum. Além disso, eles são nossos amigos. Seria como se nossos amigos viessem nos visitar, mas eles pagariam como hóspedes, então ganharíamos dinheiro enquanto isso... dinheiro de que precisamos, tia, dinheiro de que precisamos – enfatizou ela.

Um espasmo de orgulho ferido cruzou o rosto de Poli Chilton. Com um murmúrio sutil, ela se jogou na cadeira. – Mas como poderia fazer isso? – ela perguntou, afinal, fracamente. – Você não daria conta de tudo sozinha, criança!

– Ah, não, claro que não – brincou Poliana. (Poliana pisava em terreno seguro agora. Ela sabia que já tinha vencido.) – Mas poderia cozinhar e supervisionar, e tenho certeza de que conseguiria a ajuda de uma das irmãs mais novas de Nancy. A Sra. Durgin cuidaria da lavanderia, como já faz. – Mas, Poliana, eu não estou muito bem... você sabe que não. Não poderia fazer muito. – Claro que não. Mas não será preciso – menosprezou Poliana, com um certo ar de arrogância. – Ah, tia, não seria esplêndido? Parece bom demais para ser verdade... dinheiro caindo em minhas mãos assim! – Caindo em suas mãos, de fato! Você ainda tem algumas coisas para aprender neste mundo, Poliana, e uma delas é que os veranistas não jogam dinheiro nas mãos de ninguém sem analisar muito bem o retorno que terão. Quando estiver cheia de trabalho e extremamente cansada ou quando estiver se matando para atender a todos os pedidos, desde ovos frescos até a temperatura, vai acreditar em mim. – Tudo bem, vou me lembrar disso – riu Poliana. – Mas não vou me preocupar agora. Vou escrever à senhorita Wetherby imediatamente e entregar a carta a Jimmy Bean para que ele a leve ao correio, quando vier aqui esta tarde.

A Sra. Chilton se mexeu inquieta. – Poliana, eu realmente gostaria que usasse o nome correto desse rapaz. Esse “Bean” me dá arrepios. Seu nome é “Pendleton” agora, pelo que sei. – Está bem – concordou Poliana. – Mas eu esqueço disso o tempo todo e falo o nome errado, o que é terrível. Sei que ele foi adotado e tudo mais. Ah, estou tão animada – ela terminou, enquanto dançava na sala.

Quando Jimmy chegou às quatro horas a carta estava pronta. Ela ainda estava tremendo de entusiasmo, e não perdeu tempo em contar-lhe a novidade. – Estou louca para vê-los – ela chorou, quando lhe contou sobre seus planos. – Nunca mais os vi desde aquele inverno. Contei a você sobre o Jamie, não? – Ah, sim, você contou. – Havia um toque de restrição na voz do jovem.

– Não é esplêndido se vierem mesmo? – Não sei se chamaria isso exatamente de esplêndido. – Não é maravilhoso ter a chance de ajudar a tia Poli em tão pouco tempo? Ah, Jimmy, claro que é. – Mas acho que vai ser bastante difícil... para você – reprimiu Jimmy, um pouco irritado. – Acho que sim. Mas ficarei muito feliz pelo dinheiro. Veja – ela suspirou – como sou interesseira, Jimmy.

Por um longo minuto não houve resposta; então, um pouco abruptamente, o jovem perguntou: – Quantos anos tem esse Jamie agora?

Poliana olhou para cima com um sorriso alegre. – Ah, lembrei... você nunca gostou do nome dele, “Jamie” – ela piscou. – Não importa, ele foi adotado legalmente, acredito eu, e recebeu o nome de Carew. Então você pode chamá-lo assim. – Ainda não me disse quantos anos ele tem – lembrou Jimmy, rigidamente. – Ninguém sabe exatamente, eu acho. Quer dizer, ele não sabia, mas imagino que ele tenha a sua idade. Fico pensando em como ele deve estar agora. Eu perguntei tudo a respeito nesta carta. – Ah, você perguntou! – Pendleton olhou para a carta na mão e virou-a, um pouco rancoroso. Ele quis jogá-la fora, rasgá-la, entregá-la a alguém para jogá-la fora, fazer qualquer coisa com ela... Menos enviá-la pelo correio.

Jimmy sabia muito bem que estava com ciúmes, que sempre tivera inveja daquele jovem com o nome tão parecido com o dele. Não que ele estivesse apaixonado por Poliana, assegurou-se com ironia. Ele não estava, claro. Só se importava que esse jovem desconhecido com nome de menininha viesse para Beldingsville e estivesse sempre por perto para estragar todos os seus bons momentos. Ele quase disse isso para Poliana, mas alguma coisa o segurou. Ele se despediu e levou a carta com ele.

O fato é que Jimmy não se desfez da carta, já que, alguns dias depois Poliana recebeu uma pronta resposta da senhorita Wetherby. Na visita seguinte de Jimmy, ele ouviu da carta que Poliana leu para ele:

– No começo da carta diz que estão muito felizes por vir, e tudo mais. Eu não vou ler isso. Mas acho que você gostaria de ouvir o resto, porque você me ouviu falar muito sobre eles. Além disso, você mesmo os conhecerá logo, é claro. Dependo muito de você, Jimmy, para que tudo dê certo. – É mesmo? – Não seja sarcástico, só porque você não gosta do nome do Jamie – reprovou Poliana, com uma severidade fingida. – Você vai gostar dele quando o conhecer, tenho certeza. E vai amar a Sra. Carew. – Vou? – retrucou Jimmy, asperamente. – Bem, é uma perspectiva bem séria. Espero que, se eu conseguir, essa senhora seja bastante bondosa em retribuir. – Claro que sim – sorriu Poliana. – Agora ouça, vou ler a carta. É da irmã dela, a senhorita Della... do hospital. – Tudo bem. Vá em frente! – orientou Jimmy, com uma tentativa um tanto evidente de interesse educado. E Poliana, ainda sorrindo maliciosamente, começou a ler. "Você me pediu para contar sobre todos. Essa é uma grande tarefa, mas farei o melhor que puder. Para começar, você vai ver que minha irmã mudou bastante. Os novos interesses que entraram na vida dela nos últimos seis anos fizeram maravilhas. Agora ela está um pouco magra e cansada por causa do excesso de trabalho, mas um bom descanso ajudará. E você verá como ela está jovem, florescente e feliz. Observe que eu disse feliz. Isso não deve significar tanto para você como para mim, é claro, pois você era jovem demais para perceber quão infeliz ela estava durante aquele inverno em Boston. A vida era algo tão triste e sem esperança para ela. E agora é tão cheia de interesse e alegria.

Primeiro que ela tem o Jamie. Quando você os vir juntos, não terá dúvida do que ele representa para ela. Ainda não sabemos se ele é o verdadeiro Jamie ou não, mas minha irmã o ama como um filho e o adotou legalmente, mas acho que já sabia disso.

E tem as meninas também. Você se lembra de Sadie Dean, a vendedora? Bem, ao se interessar por ela e tentar ajudá-la a ter uma vida mais feliz, minha irmã ampliou seus esforços pouco a pouco, e acabou acolhendo diversas garotas que a consideram agora um bondoso anjo.

Ela fundou um lar para essas meninas com base em novos princípios e conta com a ajuda de algumas pessoas ricas e influentes, mas é ela quem lidera e gerencia tudo. Ela nunca hesita em se doar a cada uma das garotas. Você não pode imaginar como isso tudo é trabalhoso. Seu braço direito é sua secretária, a própria Sadie Dean. Você vai ver que ela também mudou, mas sua essência continua a mesma.

Quanto a Jamie... pobre Jamie! A grande tristeza de sua vida é que ele tem certeza agora de nunca mais poderá andar. Nós tivemos esperanças no início. Ele foi atendido no hospital com o Dr. Ames por um ano, e melhorou a ponto de andar de muletas. Mas nunca poderá andar sozinho... mas isso não o impede de fazer alguma outra coisa. De algum modo, depois de conhecer Jamie, não conseguimos pensar nele como um rapaz com restrições, pois sua alma é tão livre. Não consigo explicar, mas você vai entender quando o vir. Ele ainda mantém aquele antigo entusiasmo juvenil e alegria de viver. Tem só uma coisa... e apenas uma, acho... que acabaria completamente com esse espírito brilhante e o levaria ao desespero: descobrir que ele não é Jamie Kent, nosso sobrinho. Ele pensa nisso há tanto tempo, e tão ardentemente, que chegou a acreditar que é o verdadeiro Jamie. Se ele não for, espero que nunca descubra." – Enfim, é isso o que ela diz sobre eles – anunciou Poliana, dobrando a carta em suas mãos. – Não é interessante? – Sem dúvida! – Havia um tom de genuinidade na voz de Jimmy agora. Começou a pensar, de repente, no que suas próprias pernas significavam para ele. Chegou até a desejar que esse pobre rapaz fizesse parte dos pensamentos e atenções de Poliana, desde que não fosse em exagero, é claro! – Por Deus! É difícil para o pobre rapaz, não há dúvida. – Difícil! Você não tem ideia, Jimmy Bean – sufocou Poliana. – Mas eu tenho. Já fiquei sem poder andar uma época. – Eu sei! Sim, claro, claro – o jovem franziu a testa, inquieto em sua cadeira. Olhando para o rosto terno de Poliana e os olhos cheios de lágrimas, de repente Jimmy já não estava mais tão certo de que realmente gostaria que Jamie viesse... pois só de pensar nele, Poliana ficava mexida!

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