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CAPÍTULO XXIII - PRESO ÀS MULETAS

CAPÍTULO XXIII

Preso às muletas

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Aconteceu no último dia de acampamento. Para Poliana, foi uma pena, pois foi a primeira nuvem a trazer uma sombra de pesar e infelicidade ao seu coração durante toda a viagem, e ela se viu suspirando, futilmente: “Queria ter voltado para casa antes de ontem, assim isso não teria acontecido”.

Mas eles não tinham ido embora, e isso acontecera. Era assim que tinha de ser.

No início da manhã do último dia, todos caminharam por três quilômetros até o lago. – Vamos pescar mais uma vez antes de irmos – Jimmy disse.

E os demais concordaram alegremente. Com o almoço e o equipamento de pesca, começaram cedo. Rindo e chamando, felizes, um ao outro, seguiram a trilha estreita pelo bosque, liderados por Jimmy, que conhecia melhor o caminho.

No início, logo atrás de Jimmy, vinha Poliana. Mas aos poucos ela recuou com Jamie, que era o último na fila. Ela notou no rosto do rapaz aquela expressão que já conhecia de quando ele chegava ao máximo de sua capacidade física. Ela sabia que o ofenderia se percebesse algo. Mas sabia também que ele aceitaria uma eventual ajuda para superar algum obstáculo no caminho se fosse preciso. Assim, quando pôde, ela retardou seus passos até alcançar seu objetivo, Jamie. E ela foi recompensada no mesmo instante quando viu a forma como o rosto de Jamie se iluminou e a segurança com que ele

passou por um tronco de árvore caído no caminho, sob a agradável observação (cuidadosamente promovida por Poliana) de que a estava ajudando a atravessar.

Fora da mata, caminharam por um tempo ao longo de um antigo muro de pedra, com amplos pastos ensolarados e inclinados de cada lado, e uma casa de fazenda pitoresca mais adiante. Foi no pasto ao lado que Poliana viu algumas flores do campo, que cobiçou imediatamente. – Jamie, espere! Vou apanhar algumas – exclamou ansiosamente. – Vou fazer um buquê muito bonito para o nosso piquenique! – E agilmente subiu a parede de pedra alta e desceu do outro lado.

Era estranho quão atraentes eram aquelas flores. Por todo lado, ela via ramos, cada um deles mais fino do que o outro. Com exclamações alegres e pedindo carinhosamente para que Jamie aguardasse, Poliana, em seu suéter vermelho, ia de ramo em ramo, aumentando seu buquê. Ela estava com as mãos cheias quando ouviu o mugido alto de um touro, o grito aterrorizado de Jamie e o som do galope pela encosta.

O que aconteceu depois nunca ficou claro para ela. Ela deixou cair todas as flores e correu... como nunca correra antes, como achava que nunca poderia correr... de volta ao muro e em direção a Jamie. Ela sabia que as batidas dos cascos estavam se aproximando. Vaga e desesperadamente, muito à sua frente, viu o rosto agoniado de Jamie e ouviu seus gritos roucos. Então, de algum lugar, veio uma nova voz... a de Jimmy... gritando para encorajá-la.

Ainda assim, ela corria cegamente, ouvindo cada vez mais perto o baque daqueles cascos. Ela tropeçou uma vez e quase caiu. Endireitou-se e começou a correr novamente. Ela sentiu sua força desaparecer quando, de repente, perto dela, ouviu novamente o tom encorajador de Jimmy. No minuto seguinte, notou que havia sido erguida do chão e sentiu algo pulsante, que era o coração de Jimmy. Tudo era um horrível borrão de gritos, respirações ofegantes e batidas de cascos cada vez mais próximas. Quando percebeu que os cascos estavam quase em cima dela, ainda nos braços de Jimmy, sentiu-se empurrada para o lado, mas não tão

longe que ainda podia sentir o hálito quente do animal enraivecido quando passou correndo. Quase imediatamente, estava do outro lado do muro, com Jimmy curvado sobre ela, implorando para que dissesse que estava viva. Com uma risada histérica que ainda era meio soluçante, ela lutou para sair de seus braços e ficou em pé. – Viva!, Sim... graças a você, Jimmy. Estou bem. Estou bem. Ah, como estou feliz, feliz, feliz de ouvir sua voz! Ah, isso foi esplêndido! Como você fez isso? – disse ofegante. – Ahhh! Isso não foi nada. Eu só... – um soluço de asfixia fez com que parasse de repente de falar. Ele se virou e encontrou Jamie de bruços no chão, um pouco distante. Poliana correu em direção a ele. – Jamie, Jamie, o que foi? – disparou. – Você caiu? Se machucou?

Não houve resposta. – O que houve, amigo? Está ferido? – perguntou Jimmy.

Ainda não havia resposta. De repente, Jamie levantou-se com apoios e se virou. Eles viram o rosto dele e ficaram chocados e consternados. – Ferido? Se estou ferido? – ele engasgou com a voz rouca, gesticulando com as mãos. – Acha que não dói ver uma coisa dessas e não poder fazer nada? Estar amarrado, impotente, a um par de muletas? Eu lhes digo que não há dor no mundo que se iguale a isso! – Mas... mas... Jamie – hesitou Poliana. – Não! – interrompeu o rapaz, quase duramente. Ele havia se esforçado para ficar de pé agora. – Não diga... nada. Eu não queria fazer drama... não desse jeito – ele terminou de forma entrecortada, quando se virou e voltou para a trilha estreita que levava ao acampamento.

Por um minuto, como se estivesse paralisado, os dois atrás dele o observaram partir. – Bem, por Deus! – respirou Jimmy, com a voz um pouco trêmula. – Essa foi... difícil para ele! – E eu não pensei e agradeci você bem na frente dele – soluçou Poliana. – E as mãos dele... você viu? Estavam... sangrando, com as unhas na carne... – ela terminou, quando se virou e tropeçou pelo caminho.

– Mas, Poliana, aonde está indo? – perguntou Jimmy. – Atrás do Jamie, claro! Acha que vou deixar ele ir assim? – Venha, vamos trazê-lo de volta.

E Jimmy, com um suspiro que não era por Jamie, foi.

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