Toxina Botulínica - Aplicações em Odontologia

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Irineu Gregnanin Pedron

Toxina Botulínica

Aplicações em Odontologia



Irineu Gregnanin Pedron

Toxina Botulínica

Aplicações em Odontologia 1. Edição - Florianópolis/SC 2016


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Título Toxina Botulínica em Odontologia 1ª Edição, 2016 Editora Ponto Ltda. ISBN 978-85-60023-15-8 Irineu Gregnanin Pedron

Autor Irineu Gregnanin Pedron Design Gráfico Daiane Martins Machado Emmanuel Fontes Revisão Giovanni Secco

Este livro é uma publicação da Editora Ponto Ltda., Rua Vila Kinczeski, 23, Centro, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, CEP 88020-450.

Mais informações: editoraponto@editoraponto.com.br www.editoraponto.com.br (55 48) 32239150

0800 704 4018

P372t

Pedron, Irineu Gregnanin Toxina botulínica: aplicações em odontologia / Irineu Gregnanin Pedron. Florianópolis: Editora Ponto, 2016. 196p.; il. ISBN: 978-85-60023-15-8 1. Toxinas botulínicas tipo A. 2. Odontologia. I. Título. CDU 616.314 Catalogação na fonte por: Vera Ingrid Hobold Sovernigo CRB-14/009

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Prefácio

O inicialmente aluno, depois amigo e professor sempre se destacou, não apenas por seu envolvimento, mas pela pessoa que é. Não adianta sermos ou nos considerarmos, caso estejamos distantes do nosso caráter, seres humanos. Já nos primórdios de sua formação, destaco o empenho e desempenho do autor - graduando em Odontologia - quando tive a oportunidade de ser Professor de Graduação e Pós-graduação no Curso de Odontologia da Universidade Camilo Castelo Branco - Unicastelo, onde atualmente ocupo o cargo de Reitor. Ao final de sua graduação e durante sua pós-graduação em nível lato sensu (especialização) e, posteriormente, stricto sensu (mestrado), acompanhei-o pelo interesse científico, mesmo que em áreas clínicas distintas. Atualmente percebo, no acirrado mercado odontológico, a oferta de diversos cursos de capacitação sobre a aplicação da toxina botulínica em odontologia. Enalteço seu peculiar interesse e dedicação, tanto na confecção desta obra, como no propósito de transmitir os conhecimentos de forma adequada e plena ao aprendizado para o colega cirurgião-dentista, futuro prescritor da toxina botulínica na odontologia. O livro “Toxina Botulínica em Odontologia” contempla a filosofia proposta por Irineu Gregnanin Pedron, conhecida por Bottoxindent, a qual preconiza a ministração de curso de capacitação de 3 dias, com retorno do aluno após 30 dias, para avaliação e retoque do paciente, quando necessário. Essa filosofia permite o melhor aproveitamento por parte do cirurgião-

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dentista, bem como o correto processo de acompanhamento, follow-up, do paciente. Entretanto, percebo que, mesmo para aqueles que já realizaram a formação em outros cursos de capacitação e respectivas filosofias, é uma obra para a complementação do conhecimento, condição sine qua non para o desenvolvimento técnicocientífico da odontologia e incremento das propostas terapêuticas à sociedade, de forma a promover qualidade de vida aos pacientes. Sempre vi o autor como um formador de opiniões, um verdadeiro professor, e hoje me sinto extremamente feliz ao escrever estas palavras, pois o mais gratificante é ver seus amigos, aqueles que você ajudou a formar, agora diante de seus olhos formando pessoas. Parabéns, Irineu!

Prof. Dr. José Carlos Pettorossi Imparato Especialista em Radiologia Odontológica, Odontopediatria e Arqueologia. Mestre, Doutor e Livre-Docente em Odontopediatria pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Professor do Programa de Pós-Graduação em Odontologia na Faculdade São Leopoldo Mandic - Campinas/SP. Reitor da Universidade Camilo Castelo Branco - Unicastelo.

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Apresentação

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Apesar de estar cada vez mais convicto de que a essência da odontologia deva estar fundamentada em uma prática simples e que brinde, em primeiro lugar, a saúde, é inegável que procedimentos que envolvam a aparência dos indivíduos, tanto aqueles relacionados aos dentes como aos tecidos moles e face, são cada dia mais conhecidos e utilizados pelos dentistas. Isso, sem dúvida alguma, abre novas perpectivas para a nossa profissão, ao mesmo tempo em que traz também “novas responsabilidades”. Quando fui convidado para escrever esta apresentação, confesso que pensei, por completa ignorância sobre o assunto, prontamente, em dizer não. Pensei um pouco, resolvi ler o livro e então decidi deixar aqui o meu registro. Após ler o livro e indo buscar mais informações sobre o tema, portanto deixando de ser tão ignorante, quero dizer que é uma grande honra e satisfação fazer a apresentação do livro TOXINA BOTULÍNICA: APLICAÇÕES EM ODONTOLOGIA, de Irineu Gregnanin Pedron. Mesmo que você não faça esse tipo de procedimento, ou que sequer sonhe em vir a fazer, acredito que a leitura desta obra possa o ajudar de forma expressiva em vários aspectos. O livro é didático, bem revisado e traduz a experiência do autor e dos seus colaboradores nessa “nova fronteira” da nossa profissão. Vale conferir. Aproveito para parabenizar o Irineu e todos os colaboradores. Luiz Narciso Baratieri

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Apresentação do autor A busca do conhecimento sobre a aplicação da toxina botulínica do tipo A em Odontologia ocorreu, a priori, secundariamente, pelo interesse sobre os preenchedores faciais, que presumidamente poderiam ser utilizados em nível periodontal. Alguns experts sugeriram a possibilidade da aplicação dos preenchedores faciais, usualmente apresentados na forma de géis densos, em casos de “reconstrução” tecidual de papilas interdentárias, nas quais perderam sua conformação original após a realização do tratamento periodontal, ou em decorrência da perda óssea e gengival, o que caracteriza o “black space”. Seria possível, nessa perspectiva, a aplicação do gel no interior da papila interdentária, para aumentar o volume e recuperar, mesmo que temporariamente (haja vista ser absorvível), a conformação gengival, incrementando a estética dentogengival. Geralmente, os cursos ministrados atrelam as duas técnicas, aplicação de toxina botulínica e de preenchedores faciais na região peribucal. A partir daí, por tratar-se de emprego terapêutico em diversas áreas de atuação do cirurgião-dentista, a aplicação da toxina botulínica na odontologia tem aumentado dia a dia. As indicações terapêuticas incrementaram as possibilidades nas condutas e manejo dos pacientes e suas necessidades, condições ou doenças, no sistema estomatognático, de forma a favorecer a saúde e a estética bucal. Esqueçamos momentaneamente o modismo e o frisson gerados pela toxina botulínica em decorrência da fama oriunda da estética e da cosmética. Enalteçamos a possibilidade do uso da toxina botulínica em tratamentos de condições ou patologias de nossos pacientes, porque, mesmo considerada uma opção terapêutica temporária ou transiente, é bem aceita, tolerada e requisitada por eles. A utilização da toxina botulínica em odontologia vem

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conquistando cada vez mais interesse do público profissional e dos pacientes, bem como angariando mais indicações nas clínicas odontológicas. Cada um de nós, autor e coautores, utilizamos, no universo de nossas especialidades, a toxina botulínica, por confiar que, respeitando-se os conhecimentos adquiridos, podemos usufruir dos benefícios advindos do emprego desse fármaco na odontologia, em prol da saúde de nossos pacientes. O propósito desta obra é complementar a formação adquirida nos cursos de capacitação da aplicação da toxina botulínica do tipo A em odontologia, haja vista entendermos que são necessários exercícios de prática clínica para a sedimentação do conhecimento nessa atividade odontológica. Não recomendamos a leitura deste livro-texto como única fonte do conhecimento. Reiteramos a importância do estudo aprofundado sobre o assunto nas diversas áreas do saber, conciliando a inter-relação entre as ciências básicas e as clínicas. Nessa perspectiva, citando o adágio de Paracelso (1493-1541), considerado o Pai da Bioquímica e da Toxicologia, “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”, enaltecemos a fundamentação do estudo sobre essa atuação de vanguarda do cirurgião-dentista. Gostaria de salientar que os capítulos referentes às indicações clínicas abordaram características introdutórias en passant, não tendo se aprofundado em detalhes inerentes às definições, diagnósticos e outras modalidades terapêuticas, a não ser que necessárias por estarem associadas à aplicação da toxina botulínica do tipo A. Espero que apreciem a leitura e que o livro lhes seja útil em sua atividade profissional. Muito sucesso! Irineu Gregnanin Pedron

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Autores AUTOR Irineu Gregnanin Pedron Cirurgião-dentista. Especialista em Periodontia e Implantodontia. Mestre em Ciências Odontológicas (Clínica Integrada e Terapêutica Medicamentosa) pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Habilitação em Fitoterapia, Laser e Analgesia Inalatória pelo Conselho Federal de Odontologia. Professor das Disciplinas de Periodontia I e II da Universidade Camilo Castelo Branco – Unicastelo (São Paulo/SP). Instrutor no Centro de Simulação Realística do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein. Professor do Curso de Capacitação na Aplicação de Toxina Botulínica em Odontologia no Instituto Vellini (São Paulo/SP), Clínica Chedid (São Paulo/ SP), APCD Guarulhos (Guarulhos/SP), APCD Sorocaba (Sorocaba/SP), Funorte (Porto Alegre/RS e Santo André/SP), Unochapecó (Chapecó/SC), Sobresp (Santa Maria/RS), São Leopoldo Mandic (Brasília/DF) e ABO (Recife/PE). Editor do site www.bottoxindent.com. COLABORADORES Alessandra Reyes Cirurgiã-dentista. Especialista em Homeopatia e Odontopediatria. Mestre e Doutora em Odontopediatria pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Professora de Clínica Integrada Infantil e Dentística Operatória do Curso de Odontologia Uniararas. Professora dos cursos de Especialização e Mestrado da São Leopoldo Mandic Fortaleza. Ana Carla Santana Tavares Juíza do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP). Especialista em Direito do Trabalho, Processual do Trabalho e Direito Previdenciário.

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Cláudio Osiris de Oliveira Cirurgião-dentista. Mestre em Neurofisiologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo. Coordenador Acadêmico de Graduação da Universidade Braz Cubas. Leopoldo Penteado Nucci da Silva Cirurgião-dentista. Mestre em Ciências Neurológicas pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo. Doutor em Ciências Odontológicas (Clínica Integrada e Terapêutica Medicamentosa) pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Pós-doutorado em Ciências Neurológicas pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Pesquisador do Instituto do Cérebro, do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein. Professor efetivo da Universidade Estácio de Sá - Campus Goiânia/GO. Luiz Altruda Filho Doutor em Ciências Morfofuncionais pelo Instituto de Ciências Biomédicas na Universidade de São Paulo. Responsável pelas disciplinas de Anatomia da Universidade de Santo Amaro (Unisa), Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul) e Universidade Metropolitanas Unidas (UniFMU). Maria Eugenia da Silva Cezere Cirurgiã-dentista. Aluna do Programa de Aprimoramento em Odontologia Hospitalar no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Estágio realizado no Hospital de Aeronáutica de São Paulo (HASP).

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Marina Edwirges Rocha Gouveia Cirurgiã-dentista. Estágio realizado no Hospital de Aeronáutica de São Paulo (HASP). Melissa Medrano Gomes Graduada em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Mestre em Farmácia (Análises Clínicas) pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP). Paulo Ricardo Ronconi Larosa Cirurgião-dentista. Mestre em Ciências Morfofuncionais pelo Instituto de Ciências Biomédicas pela Universidade de São Paulo. Professor das disciplinas de Anatomia da Universidade Anhembi Morumbi e Universidade Metropolitanas Unidas (UniFMU). Professor do Curso de Capacitação na Aplicação da Toxina Botulínica em Odontologia. Rafael Guerra Cintra Médico. Pediatra e Neurologista. Neurologista da Infância e da Adolescência da Faculdade de Medicina do ABC. Médico do Hospital Infantil Márcia Braido de São Caetano do Sul e do Hospital Cruz Azul de São Paulo.

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Rubens Oquillas Martins Cirurgião-dentista. Especialista em Periodontia e Implantodontia. Advogado. Pós-graduado em Direito Civil. Capacitação na Aplicação de Toxina Botulínica em Odontologia. Sandra Tomaz Cirurgiã-dentista. Mestre em Neurociências e Comportamento pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Professora da disciplina de Anatomia da Universidade Paulista (Unip). Thiago Mendes Branco Enfermeiro. Cirurgião-dentista. Estágio realizado no Hospital de Aeronáutica de São Paulo (HASP). Zilson Malheiros Magalhães Cirurgião-dentista. Mestre em Odontologia Legal pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.

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Agradecimentos

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Agradeço a Deus, pelo dom da vida, por tudo, pelas possibilidades que se transformaram em oportunidades. Aos meus pais, Irineu e Mara, meus exemplos e a quem devo gratidão, amor e respeito. Procuro honrá-los por tudo o que vocês fizeram e fazem por mim. Aos meus irmãos, Thiago e Bruno, pelo apoio e carinho fraternal. A Ana Carla, obrigado pela força, apoio e amor, que têm me incentivado a me empenhar ainda mais. Aproveito a oportunidade para agradecer cordialmente a todos os colaboradores desta obra pela contribuição e pela crença, acreditando na confecção do livro e que podemos sempre, por meio do estudo dirigido e de muito trabalho, desenvolver a odontologia para atendermos sempre melhor aos desejos dos nossos pacientes. Ao Prof. Dr. Luiz Narciso Baratieri, por acreditar na realização desta obra e pelo apoio na sua concretização. Ao Prof. Dr. José Carlos Pettorossi Imparato, Reitor da Universidade Camilo Castelo Branco, pela consideração e carinho ao prefaciar esta obra. Às instituições de ensino (www.bottoxindent.com) que nos acolheram e nos confiaram a oportunidade de ministrar os cursos de capacitação de toxina botulínica em odontologia, por acreditarem na valorização profissional e na formação de cirurgiões-dentistas mais bem preparados.

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Dedicat贸ria

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Dedico esta obra a toda a classe odontológica, para o desenvolvimento profissional e para que possamos promover a valorização da odontologia. Aos nossos pacientes, pela confiança no nosso trabalho e pelo incentivo ao conhecimento, para que possamos oferecer sempre mais qualidade e excelência na nossa atuação profissional.

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Sumário Capítulo 1: Histórico da utilização da toxina botulínica do tipo A em odontologia

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Capítulo 2: Microbiologia e patologia: aspectos de interesse do cirurgião-dentista sobre Clostridium botulinum e botulismo

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Capítulo 3: Farmacologia da toxina botulínica

32

Capítulo 4: Aspectos neurofisiológicos do mecanismo de ação da toxina botulínica na placa motora

42

Capítulo 5: Considerações anatômicas às aplicações da toxina botulínica do tipo A em odontologia

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Capítulo 6: Protocolo de aplicação e orientações pós-aplicação

64

Capítulo 7: Indicações e contraindicações da aplicação da toxina botulínica do tipo A

72

Capítulo 8: Aplicação da toxina botulínica do tipo A em sorriso gengival

78

Capítulo 9: Aplicação de toxina botulínica do tipo A em pacientes portadores de hábitos parafuncionais – bruxismo e briquismo

88

Capítulo 10: Aplicações da toxina botulínica do tipo A em disfunções temporomandibulares

96

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Capítulo 11: Aplicação da toxina botulínica do tipo A na hipertrofia massetérica

104

Capítulo 12: Aplicações coadjuvantes da toxina botulínica do tipo A em cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial

112

Capítulo 13: Aplicações da toxina botulínica do tipo A em implantodontia

120

Capítulo 14: Aplicações da toxina botulínica do tipo A em dor orofacial

128

Capítulo 15: Aplicação de toxina botulínica do tipo A em paralisia facial

144

Capítulo 16: Aplicação de toxina botulínica do tipo A em sialorreia

152

Capítulo 17: Eventos adversos e complicações decorrentes das aplicações da toxina botulínica do tipo A em odontologia

158

Capítulo 18: Proposta de protocolo fotográfico simplificado às aplicações de toxina botulínica do tipo A em odontologia

164

Capítulo 19: Marketing aplicado ao emprego da toxina botulínica do tipo A na odontologia

174

Capítulo 20: Considerações ético-legais sobre a aplicação de toxina botulínica do tipo A pelo cirurgião-dentista

182

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capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron


Histórico da utilização da toxina botulínica do tipo A em odontologia


ANTECEDENTES HISTÓRICOS Os primórdios do histórico da toxina botulínica iniciam-se

casos de pacientes com botulismo e escreveu uma monogra-

no final do século XVIII, pela ocorrência de 234 mortes no Rei-

fia sobre a toxina encontrada em linguiças, na qual observou

no de Württemberg, na Alemanha, entre os anos de 1793 e

que a toxina botulínica se desenvolve em linguiças azedas em

1827, causadas por envenenamento alimentar após o consu-

condições de anaerobiose. A capacidade de interrupção da

mo de linguiças de sangue e de carne. A Guerra Napoleônica

transmissão motora no sistema nervoso periférico e autônomo

(1795-1813) acarretou problemas econômicos e, consequen-

e a letalidade em pequenas doses também foram achados de

temente, a negligência nas medidas sanitárias de controle da

Kerner. Entretanto, o pesquisador, suspeitando que a toxina

produção rural de alimentos, o que contribuiu para a epidemia

tivesse origem animal, não percebeu que era produzida por um

do então chamado “envenenamento por linguiça”. Entre os

microrganismo.1

sintomas apresentados pelas vítimas, observaram-se a midrí-

A ocorrência de vários casos de botulismo suscitou algu-

ase e a paralisia muscular progressiva, sugerindo a intoxica-

mas investigações sobre a possível fonte da toxina. Van den

ção por atropina.

Corput postulou um fungo, o qual denominou Sarcina botulina,

1

Em 1811 o Departamento de Assuntos Internos de Reino de Württemberg atribuiu o “envenenamento por linguiças” a

como a fonte da toxina, alegação desconsiderada por não ter conseguido isolá-lo.2

uma substância conhecida como “ácido prússico”, atualmen-

Entre 1895 e 1897 o microbiologista belga Emile Van Er-

te conhecido por ácido hidrociânico ou cianídrico. A análise

mengem (1851-1922) (Figura 2), de Ghent, e Wilhelm Kempner,

dos casos relatados no decorrer dos anos resultou no anún-

de Berlim, ambos treinados por Robert Koch (1843-1910), cor-

cio público pelo governo alemão de sintomas gastrointesti-

relacionaram a epidemia de botulismo ocorrida em um funeral

nais, autônomos e neuromusculares relacionados aos enve-

no vilarejo belga de Ellezelles, Hainaut, com o isolamento de

nenamentos alimentares. Essa patologia foi posteriormente

uma bactéria encontrada em alimentos servidos no evento. O

denominada de botulismo, termo que vem do latim, botulus,

cardápio contou com a oferta de um típico presunto salgado.

que significa linguiça.

O animal foi morto 4 meses antes, sua carne foi parcialmente

1

1,2

Justinus Kerner (1786-1862), médico alemão (Figura 1),

consumida até então, e foi salgado para consumo a posteriori

Em 1820 Ker-

até o momento do funeral. Trinta e quatro pessoas foram con-

ner sumarizou 76 casos de pacientes que apresentavam sinais

taminadas, entre eles os músicos contratados para o evento

clínicos do botulismo. Dois anos depois Kerner relatou 155

fúnebre, os quais apresentaram estrabismo, diplopia, ptose

Figura 1: Médico alemão Justinus Kerner. (Extraído de http://www.van-ham. com/datenbank-archiv/datenbank/julius-hamel/portraetbildnis-des-justinuskerner.html).

Figura 2: Microbiologista belga Emile Van Ermengem. (Extraído de http://www. snipview.com/q/%C3%89mile_van_Ermengem).

iniciou os estudos sobre botulismo em 1817.

2,3

1

22


palpebral, rouquidão e disfagia como sinais clínicos da intoxica-

cerrasse essa atividade.2 Em 1973 Scott et al.7 publicaram um

ção 24 a 36 horas após a ingestão. Três pacientes evoluíram a

trabalho experimental em macacos, nos quais injetaram toxina

óbito. Nos restos de alimentos servidos no funeral Van Ermen-

botulínica do tipo A nos músculos oculares para o tratamento

gem isolou esporos de um bacilo anaeróbio, o qual chamou

de estrabismo. Anos mais tarde (1977-1981) Scott8 apresentou

de Bacillus botulinus. Adicionalmente, Van Ermengem provou

os resultados do tratamento do estrabismo em humanos com

se tratar de uma toxina ao utilizar um filtrado do cultivo livre de

a toxina botulínica.

2

bacilos e esporos em animais de laboratório, os quais manifes-

O interesse científico em se estudar a toxina botulínica

taram sinais de paralisia. Posteriormente, Kempner conseguiu

se intensificou pela ocorrência do botulismo infantil, causado

produzir a antitoxina neutralizante em cabras.

pela ingestão de mel contaminado por esporos de Clostri-

2

Em 1900 e 1904, em Hesse e Darmstadt respectivamente,

dium botulinum. Em 1976 Pickett et al.11 descreveram as ca-

outras epidemias foram observadas pela ingestão de feijão em

racterísticas clínicas e eletrofisiológicas do botulismo infantil,

conserva. Posteriormente, o Bacillus botulinus foi renomeado,

causado pela ingestão de mel contaminado por esporos con-

passando a ser chamado de Clostridium botulinum. Sucessi-

duzidos pelo vento por crianças lactantes menores de 1 ano.

vos estudos em todo o mundo foram realizados demonstrando

A geminação dos esporos no cólon e a subsequente síntese

que a C. botulinum é capaz de produzir sete tipos distintos de

da toxina disseminam-se por via hematogênica, alcançando

toxina botulínica, designados pelas letras A, B, C1, D, E, F e G.

as placas pré-sinápticas, com o desenvolvimento da doen-

Desde 1822, com os estudos de Kerner, era especulada a

ça e morte súbita. Portanto, a ingestão de mel por crianças

possibilidade de uso terapêutico da toxina botulínica em condi-

lactantes menores de 1 ano não é recomendada, justamente

ções de hipercontração muscular, hiperidrose e hipersalivação,

por elas não terem microflora intestinal madura. Já a micro-

já que esses sintomas eram observados em seus pacientes

flora indígena impede a colonização e o desenvolvimento dos

avaliados, relativos ao bloqueio neuromuscular autônomo e

esporos da C. botulinum.2

2

1

periférico.1,4 Burgen et al.6 descobriram, somente em 1949,

A partir de 1977 o uso terapêutico da toxina botulínica do

que a toxina botulínica era capaz de bloquear a transmissão

tipo A foi consolidado, inicialmente com o surgimento do pro-

neuromuscular.

duto farmacêutico denominado Oculinum®, hoje denominado

Entretanto, durante a II Guerra Mundial, em 1943, o Ser-

Botox® (Allergan Inc., Irvine, California, EUA).1,5

viço de Inteligência britânico informou que os alemães estu-

Em 1989 a Food and Drug Administration (FDA) aprovou

davam bombardear Londres com toxina botulínica usando

a toxina botulínica para tratamento de estrabismo, blefaroes-

como vetores as famosas bombas V-1. A Academia Nacional

pasmo e espasmos hemifaciais. Em 2000 a toxina botulíni-

de Ciências, por meio do físico Frank Baldwin Jewett, e sob o

ca foi aprovada para o tratamento de distonia cervical, e em

auspicioso Exército americano, montaram um laboratório de

2002 como recurso estético das linhas hiperfuncionais glabe-

combate em Camp Detrick (anos mais tarde Fort Detrick) para

lares. Desde então a toxina botulínica tem indicação off-label

estudar o problema da guerra biológica e propor soluções de-

para o tratamento de desordens de espasticidade e dores

fensivas. Carl Lamanna obteve a toxina botulínica do tipo A em

musculares.9,10

sua forma mais pura e cristalina, com fração tóxica de 150.000

A falta de aprovação para indicações específicas não

daltons, unida a outra fração não tóxica de 750.000 daltons,

prejudicou o uso da toxina botulínica, que foi experimenta-

que protegia a digestão enzimática no intestino. Os alemães

da em casos de nistagmo, torcicolo, distonia espasmódica

nunca chegaram a bombardear Londres, mas os estudos de

e outras doenças relacionadas a disfunção muscular. Em

Fort Detrick não foram inúteis e tiveram aplicações pacíficas

1999 o editorial do New England Journal of Medicine intitu-

a partir de 1970, no tratamento do estrabismo rebelde. Em

lado “One Man’s Poison - Clinical Applications of Botulinum

1972 foi assinada a Convenção de Armas Biológicas e Toxi-

Toxin”, escrito por Hallet,12 apresentou diversas indicações

nas, que pôs fim à investigação nesse campo, e Nixon, então

de utilização da toxina botulínica, como no alívio de espas-

presidente dos Estados Unidos, ordenou que o Fort Detrick en-

mos em membros inferiores em crianças, em fissuras anais,

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2

capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron


Microbiologia e patologia: aspectos de interesse do cirurgi達o-dentista sobre Clostridium botulinum e botulismo


INTRODUÇÃO Parafraseando Paracelsus (1493-1541), o “Pai da Bio-

O gênero Clostridium é extremamente heterogêneo,

química e da Toxicologia”, que escreveu que “a diferença

composto de cerca de 150 espécies. A ampla diversidade

entre o veneno e o remédio está na dose”, justifica-se a im-

do gênero inclui o crescimento das bactérias na presença

portância do conhecimento por parte do cirurgião-dentista

ou ausência de oxigênio, sendo conhecidas algumas espé-

sobre a origem da toxina botulínica e considerações sobre

cies anaeróbias obrigatórias, como C. perfringens, algumas

microbiologia e patologia de um fármaco que apresenta pro-

aerotolerantes, como C. tertium, e algumas, raras, que não

pósitos terapêuticos, mas que é, sobretudo, um veneno.

toleram traços de oxigênio, como C. haemolyticum e C. novyi tipo B.1

MICROBIOLOGIA GÊNERO CLOSTRIDIUM

O gênero está amplamente distribuído na natureza, sendo encontradas bactérias no solo, em vegetações, em sedimentos marinhos e no intestino do homem e de outros

Clostridium é um gênero de bactérias do filo Firmicutes,

vertebrados, além de insetos.1,2 A espécie C. perfringens já

e sua denominação origina-se do grego, kloster, que signifi-

foi encontrada em praticamente todos os solos examinados,

ca roca. A maioria das espécies são bacilos retos ou curvos,

com exceção das areias do deserto do Saara. São, em sua

variando de pequenas formas de bastonetes cocoides a for-

maioria, avirulentas, embora algumas espécies possam ser

mas longas, filamentosas, com extremidades arredondadas

isoladas de infecções endógenas, enquanto outras são pa-

ou retas. São classificados como gram-positivos, embora, em

tógenos reconhecidos pela produção de potentes toxinas ex-

cultivos prolongados, sejam encontrados bacilos com apa-

tracelulares, como C. botulinum.1

rência gram-negativa, e em muitas ocasiões formas gram-positivas e gram-negativas podem ser observadas em uma

CLOSTRIDIUM BOTULINUM

mesma lâmina. Os endosporos ovais ou esféricos usualmente

C. botulinum (Figura 1) é um bacilo gram-positivo esporu-

são maiores que as células vegetativas. Certas espécies só

lado, sendo amplamente encontrado na natureza, ocorrendo

produzem esporos sob condições especiais, como é o caso

em solos cultivados ou indígenas; em sedimentos em fundos

de C. perfringens. A maioria das espécies não é capsulada,

de rios, lagos e águas costeiras; no trato intestinal de peixes e

e praticamente todas são catalase-negativas. Os clostrídeos

mamíferos, em brânquias e vísceras de caranguejos e outros

usualmente são fermentadores e/ou proteolíticos. A maioria

crustáceos. Também pode ser encontrado em grande varie-

das espécies apresenta mobilidade por meio de flagelos pe-

dade de produtos industrializados, como salsichas, produtos

ritríqueos, exceto as espécies C. perfringens, C. ramosum e

de carne, vegetais enlatados e derivados de frutos do mar.

C. innoccum.

Os esporos são resistentes ao calor (120 °C por 15 minutos)

Figura 1: Bacilo gram-positivo Clostridium botulinum. (Extraído de https:// microbewiki.kenyon.edu/index.php/Clostridium_botulinum_Neurotoxins).

Figura 2: Complexo estrutural da toxina botulínica. (Extraído de http://flipper. diff.org/app/items/3265).

1,2

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e podem sobreviver em alimentos que são processados incorretamente.

Botulismo é uma intoxicação alimentar causada pela ingestão de alimentos que contêm a toxina botulínica sintetiza-

1,3-5

A espécie, que produz sete subtipos antigênicos de toxi-

da durante o crescimento do microrganismo. A toxina é lábil

na botulínica, designados de A, B, C1, D, E, F e G, é dividida

ao calor e pode ser destruída quando aquecida a 80 °C por

em quatro grupos fisiológicos. O grupo I reúne os micror-

10 minutos. A incidência do botulismo é baixa, embora tenha

ganismos proteolíticos que produzem as toxinas A, B ou F.

grande interesse pela elevada taxa de mortalidade, desde que

O grupo II reúne os microrganismos não proteolíticos, que

não tratada adequada e imediatamente. A maioria dos ca-

podem produzir as toxinas B, E ou F, enquanto o grupo III

sos que são relatados anualmente nos EUA está associada

engloba os produtores de toxinas C e D. O grupo IV define o

com alimentos em conservas ou caseiros mal processados.

tipo G, descoberto na Argentina, o qual não tem sido causa

Entretanto, ocasionalmente, alimentos industrializados foram

de doença humana ou animal. As toxinas A, B, E e F são as

envolvidos em surtos. Qualquer tipo de alimento com pH não

principais causas de botulismo em humanos, enquanto os ti-

muito ácido (acima de 4,6) pode suportar o crescimento e a

pos C e D estão associados ao botulismo que ocorre em aves

produção de toxina por C. botulinum. Carnes, frango, peixes

e mamíferos.

e frutos do mar, queijos, sopas, embutidos (presunto, salsi-

1-5

Assim como a toxina tetânica, a toxina botulínica é uma

cha, linguiça) e vegetais (berinjela recheada, milho enlatado,

metaloprotease dependente de zinco, sintetizada como uma

pimentão, feijão verde, beterraba, espargos, cogumelos,

cadeia polipeptídica de 150 a 165 kDa (Figura 2), cuja ati-

azeitonas, espinafre, palmito) são os veículos mais frequente-

vação depende da clivagem protelítica em duas cadeias

mente causadores de botulismo humano.3-5 O botulismo clás-

polipeptídicas ligadas por pontes dissulfeto, sendo potente

sico ocorre após a ingestão de alimento contendo a toxina

inibidora de neurotransmissores. A toxina botulínica se as-

botulínica pré-formada. A absorção ocorre primariamente no

socia às proteínas não tóxicas para formar complexos cujos

duodeno e jejuno, e por meio da corrente sanguínea alcança

respectivos genes estão reunidos em um segmento de DNA

as sinapses colinérgicas periféricas (incluindo-se as junções

denominado locus botulínico, localizado provavelmente em

neuromusculares), para então alterar a liberação de acetilco-

um elemento móvel.

1,2

A toxina botulínica é termolábil, sendo

inativada pelo calor em uma temperatura de 80 °C por no mínimo 10 minutos.

lina.1,4 O botulismo infantil, identificado pela primeira vez em 1976, acomete crianças com menos de 12 meses de idade.

4

É causado pela ingestão de esporos de C. botulinum que colonizam e produzem a toxina no trato intestinal de lactentes. PATOLOGIA

O intestino é colonizado por esporos de C. botulinum, es-

BOTULISMO

pecialmente nos primeiros meses de vida, pelas condições

satisfatórias para a colonização, haja vista a imaturidade da

A toxina botulínica é considerada uma das toxinas mais

microflora intestinal. Após a germinação e consequente pro-

potentes que se conhece. Sua potência está em sua habi-

dução de neurotoxina no intestino grosso, a toxina botulíni-

lidade de bloquear transmissões neuromusculares e levar à

ca é absorvida pela corrente sanguínea, sendo carreada às

morte através da paralisia da musculatura envolvida na respi-

terminações nervosas periféricas, particularmente às junções

O botulismo é uma doença de notificação compulsó-

neuromusculares dos neurônios motores, onde se liga irre-

ração.

2,3

ria quando do acometimento em humanos.

4,5

versivelmente às membranas pré-sinápticas, causando para-

O botulismo em seres humanos apresenta-se sob qua-

lisia aguda flácida.1,3-5 O botulismo infantil apresenta-se por

tro formas: o botulismo infantil, que acomete bebês, muito

constipação, letargia, fraqueza, sialorreia, disfonia e perda do

comum nos EUA e raro nos demais países; o botulismo clás-

controle da cabeça. O tratamento é sintomático, e a terapia

sico; o botulismo de lesão (ou em ferimentos); e o botulismo

antimicrobiana não é recomendada.3

após colonização em adultos.1,3-5

Em contrapartida, o botulismo em adultos (excluindo a

29


3

capĂ­tulo

Melissa Medrano Gomes Irineu Gregnanin Pedron


Farmacologia da toxina botulĂ­nica


INTRODUÇÃO A toxina botulínica é produzida pela bactéria Clostridium botulinum, um bacilo gram-positivo anaeróbico obrigatório (Figura 1) capaz de produzir sete toxinas antigenicamente distintas: tipos A, B, C1, D, E, F e G. Todos os sete tipos são neurotoxinas produzidas na forma inativa.1 São cadeias polipeptídicas simples com uma massa molecular de cerca de 150 kDa e com elevado grau de homologia de sequência de aminoácidos entre seus tipos. A cadeia polipeptídica é constituída por uma cadeia pesada (H) e uma cadeia leve (L), de cerca de 100 e 50 kDa respectivamente, unidas por uma ligação dissulfeto2 (Figura 2).

Figura 1: Bacilo gram-positivo Clostridium botulinum. (Extraído de https:// microbewiki.kenyon.edu/index.php/Clostridium_botulinum_Neurotoxins).

O complexo da neurotoxina botulínica também está associado a várias outras proteínas não tóxicas, as quais têm as propriedades hemaglutinante e não hemaglutinante.3 A porção ativa da molécula é envolta pelas proteínas hemaglutinina e não aglutinina. Esse complexo se denomina toxina progenitora e possui a tarefa de proteger e estabilizar a molécula da neurotoxina do pH do estômago até que ela seja internalizada, bem como facilitar sua absorção intestinal. Por ação de proteases, a toxina progenitora se torna derivativa, o que corresponde à toxina em sua forma ativa.4 A neurotoxina do tipo A é a mais potente, seguida pe-

Figura 2: Complexo estrutural da toxina botulínica. (Extraído de http://flipper. diff.org/app/items/3265).

los tipos B e F. É a substância mais venenosa conhecida atualmente, com dose letal para humanos, em média, de

PROCESSO DE FABRICAÇÃO

1,3 a 2,1 ng/kg de peso para doses intramusculares ou intravenosas, e de 10 a 13 ng/kg de peso quando inalada.5

As informações a seguir sobre o processo de isolamento e

Os tipos A, B, E, F e G são comumente associados ao

liofilização são referentes à toxina botulínica do tipo A produzi-

botulismo sistêmico em seres humanos.1

da pela Allergan Inc., representada no Brasil pela Allergan Pro-

Hoje as aplicações clínicas da toxina botulínica de-

dutos Farmacêuticos Ltda., e cujo nome comercial é Botox®.7

sempenham papel muito importante na conduta de uma

A toxina botulínica do tipo A é comercializada na forma de

grande variedade de condições médicas, com aprovação

pó liofilizado, a vácuo e estéril, produzido a partir de cultura de

da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O

Clostridium botulinum, desenvolvido em meio contendo caseí-

uso da toxina botulínica para fins cosméticos tem aumen-

na hidrolisada, extrato de levedura e dextrose, o que possibilita

tado nos últimos anos, particularmente desde a aprova-

a obtenção de toxina livre de materiais antigênicos que não

ção da toxina botulínica do tipo A para o tratamento de

sejam os da própria toxina. A toxina é liberada durante a lise

linhas glabelares. No Brasil apenas médicos e dentistas,

e ativada por meio de proteases presentes na cultura. A purifi-

ambos devidamente habilitados, podem realizar procedi-

cação da solução da cultura é feita por uma série de precipita-

mentos com essa toxina.6

ções em meio ácido, até a obtenção de um complexo cristalino constituído por proteína ativa de alto peso molecular e proteína do tipo hemaglutina associada.

34


O complexo cristalino é redissolvido em solução salina com albumina e a seguir é filtrado esterilmente (0,2 micra)

liofilizada são os fatos de apresentar sua estrutura inalterada e de ser de fácil dissolução e reidratação.

antes do envasamento e congelamento a vácuo. Após 4 dias de incubação, a precipitação ácida é utilizada para con-

FORMA FARMACÊUTICA, APRESENTAÇÃO, VIAS DE

centrar o complexo da toxina a partir da cultura fluida. Esse

ADMINISTRAÇÃO E USO

complexo é então solubilizado e precipitado, depois purificado, e os ácidos nucleicos são removidos por cromato-

Trata-se de pó liofilizado para uso injetável com comple-

grafia em pH ácido. A toxina é então separada do complexo

xo toxina-hemaglutinina do tipo A de Clostridium botulinum,

proteico não tóxico por cromatografia em pH alcalino, e os

sendo necessária sua reconstituição em solução fisiológica

traços de contaminação são extraídos.

estéril a 0,9% antes do uso. Apresenta-se em embalagem

Assim como em outras proteínas biologicamente ati-

contendo frasco-ampola com unidades especificadas para

vas, a toxina botulínica do tipo A perde estabilidade quando

cada formulação comercial, bem como seus excipientes,

diluída na proporção de nanogramas, necessária para ser

que geralmente são solução de albumina humana a 20%

disponibilizada como agente terapêutico. Esse fato pode ser

e lactose.9

muito minimizado na presença de outra proteína, como a al-

Uma unidade (U) é definida como dose letal intraperito-

bumina, na proporção de 2 g/L, em solução. Por outro lado,

neal média em camundongos. Dose letal (DL50) é a quanti-

o emprego de albumina humana pode causar riscos, como

dade de toxina que mata 50% de um grupo de camundon-

a possibilidade da transmissão de doença viral (hepatites)

gos-fêmeas Swiss-Webster com 18 a 20 gramas de peso.10

ou priônica (doença de Creutzfeuld-Jakob), provenientes do

A toxina botulínica do tipo A é uma substância reserva-

doador. No entanto, a literatura não descreve nenhum caso

da para uso hospitalar ou clínica médica e odontológica, sob

de contaminação por essa via, provavelmente devido ao ri-

prescrição médica ou odontológica, para uso intramuscular ou

goroso processo de seleção dos doadores.

subcutâneo em adultos e crianças. Somente pode ser aplica-

8

O processo de purificação é extremamente importante, porque, para se evitarem reações adversas e aumento da

da por especialistas (médicos e dentistas) experientes, que tenham recebido orientação e treinamento para sua aplicação.

antigenicidade, é necessário se extraírem todos os resíduos, de modo a deixar a toxina livre dos ácidos ribonucleicos e de outros materiais contaminantes. A produção contínua de

FORMULAÇÕES

uma toxina de alta qualidade apresenta problemas que merecem ser analisados. A alta qualidade de uma toxina com

Atualmente existem no mercado diferentes formulações

finalidade terapêutica é fundamental. Os critérios que garan-

de toxina botulínica do tipo A, e uma para o tipo B, as quais

tem uma produção de qualidade com pureza, toxicidade e

são descritas a seguir.

estabilidade são recomendados pelo Food and Drug Administration (FDA). Após a purificação, a toxina sofre o processo de liofili-

ONABOTULINUM TOXIN A (BOTOX®, ALLERGAN INC., EUA)

zação, que consiste na secagem do produto em condições

Foi o primeiro tipo disponível comercialmente nos Esta-

de pressão e temperatura capazes de remover água e ou-

dos Unidos. Sua segurança está bem estabelecida. A des-

tros solventes previamente congelados, passando do esta-

vantagem é que, uma vez que o conteúdo de um frasco

do sólido diretamente para o estado gasoso, ou seja, por

é dissolvido, o produto reconstituído perde sua potência.

sublimação. A liofilização é utilizada em produtos instáveis,

É produzido a partir da cultura da estirpe de C. botulinum

sensíveis ao calor, quando se requer uma rápida e completa

e purificado por uma série de precipitações ácidas até um

reidratação, em produtos de elevado valor e para a minimi-

complexo cristalino contendo a toxina e outras proteínas.

zação do peso. A vantagem de ter o produto final na forma

Cada frasco de Botox® contém 50 ou 100 unidades do

35


4

capĂ­tulo

Irineu Gregnanin Pedron Melissa Medrano Gomes ClĂĄudio Osiris de Oliveira Leopoldo Penteado Nucci da Silva


Aspectos neurofisiológicos do mecanismo de ação da toxina botulínica na placa motora


INTRODUÇÃO A priori, para o entendimento do mecanismo de ação

muscular e aproximadamente 125 vesículas de acetilcolina

da toxina botulínica é necessária a contextualização da

são liberadas dos terminais no espaço sináptico. Na su-

neurofisiologia.

perfície interna da membrana neural se encontram as bar-

As fibras musculares esqueléticas são inervadas por

ras densas lineares (Figura 1). Em ambos os lados de cada

grandes fibras nervosas mielinizadas, que se originam nos

barra densa se localizam partículas proteicas que pene-

grandes neurônios motores nos cornos anteriores da me-

tram na membrana neural, denominadas canais de cálcio

dula espinhal. Cada fibra nervosa, após penetrar no feixe

controlados por voltagem. Quando o potencial de ação se

muscular, se ramifica e estimula de três a centenas de fibras

propaga para o terminal, esses canais se abrem e permi-

musculares esqueléticas. Cada terminação nervosa faz uma

tem que os íons cálcio se difundam do espaço sináptico

junção, denominada junção neuromuscular ou mioneural, ou

para o terminal nervoso. Considera-se que os íons cálcio,

ainda placas motoras terminais, as quais se associam às fi-

por sua vez, exercem atração sobre as vesículas de acetil-

bras musculares esqueléticas. O potencial de ação, iniciado

colina, atraindo-as para a membrana neural adjacente às

na fibra muscular pelo sinal nervoso, é conduzido em ambas

barras densas. Dessa forma, as vesículas se fundem com a

as direções até as extremidades da fibra muscular.

membrana neural e lançam a acetilcolina no espaço sináp-

1,2

O nervo motor, ao aproximar-se da junção neuromus-

tico, pelo processo de exocitose. Esse fenômeno ainda é

cular, perde a bainha de mielina, divide-se e forma um com-

especulativo, embora seja conhecido o papel do estímulo

plexo de terminais nervosos ramificados, que se invaginam

efetivo da entrada dos íons cálcio, que causa a liberação

na superfície extracelular da fibra muscular. Essa estrutura

de acetilcolina das vesículas por meio da membrana neural

complexa compõe a placa motora (Figura 1), recoberta por

adjacente às barras densas.1,2

uma ou mais células de Schwann, que a isolam dos líquidos circunjacentes.

A acetilcolina desempenha efeito na membrana pós-sináptica da fibra muscular para abrir os canais iônicos.

1,2

A membrana invaginada é chamada de goteira ou ca-

Diversos receptores de acetilcolina se encontram na mem-

naleta sináptica, e o espaço entre o terminal e a membrana

brana da fibra muscular, definindo os canais iônicos contro-

da fibra é chamado de espaço sináptico ou fenda sináp-

lados pela acetilcolina (Figura 1). Esses canais se localizam

tica, com 20 a 30 nanômetros (nm) de largura. No fundo

quase que exclusivamente próximo às aberturas das fen-

da goteira se encontram numerosas pequenas dobras da

das subneurais, situadas imediatamente abaixo das áreas

membrana muscular, denominadas fendas subneurais, que

das barras densas, onde a acetilcolina é lançada no espaço

aumentam consideravelmente a área de superfície na qual

sináptico.1

o transmissor sináptico pode agir.1,2

Cada receptor é um complexo proteico com peso

No terminal axonal há muitas mitocôndrias que forne-

molecular total de 275.000 Daltons (Da). O complexo é

cem adenosina trifosfato (ATP), fonte de energia utilizada

composto de cinco subunidades proteicas, sendo duas

na síntese de acetilcolina, um neurotransmissor excitatório.

subunidades α e as outras três subunidades β, δ e ϒ. Es-

A acetilcolina excita a membrana da fibra muscular e é sin-

sas moléculas proteicas penetram por toda a extensão da

tetizada no citoplasma do neurônio terminal, mas é absor-

membrana, situando-se lado a lado em círculo para formar

vida rapidamente por inúmeras pequenas vesículas sináp-

o canal tubular (Figura 2). O canal mantém-se fechado (Fi-

ticas (aproximadamente 300.000), as quais normalmente

gura 2A) até que duas moléculas de acetilcolina se liguem

se encontram nos terminais de uma única placa motora.

às duas subunidades proteicas α, provocando alteração

No espaço sináptico há grandes quantidades da enzima

conformacional, o que abre o canal (Figura 2B).1,2

acetilcolinesterase, que degrada a acetilcolina após alguns milissegundos de sua liberação pela vesícula sináptica.

1,2

O canal regulado pela acetilcolina tem diâmetro aproximado de 0,65 nm, suficiente para permitir a passagem e

A secreção de acetilcolina pelos terminais nervosos

o transporte de íons como Na+, K+ e Ca++. Entretanto, íons

ocorre quando o impulso nervoso atinge a junção neuro-

negativos como os cloretos (Cl-) não passam pelos canais

44


devido às fortes cargas negativas na abertura deles que os repelem. Há muito mais íons Na+ que fluem pelos canais regulados pela acetilcolina em comparação com quaisquer outros íons, haja vista ser o íon em maior concentração no meio extracelular, e os íons K+ no meio intracelular. Adicionalmente, o potencial muito negativo no lado interno da membrana muscular (de -80 a -90 milivolts – mV) atrai os íons Na+ com carga positiva para o interior da fibra e simultaneamente se opõe ao efluxo dos íons K+, com carga positiva. Nos canais controlados pela acetilcolina há grande número de cargas positivas, carregadas pelos íons Na+, o que provoca alteração potencial local positiva no lado interno da membrana da fibra muscular, denominado potencial da placa motora. Esse potencial da placa motora inicia um potencial de ação que se propaga ao longo da membrana muscular causando a contração muscular.1,2 A acetilcolina, uma vez liberada no espaço sináptico,

Figura 1: Desenho esquemático com a liberação de acetilcolina nas vesículas sinápticas na membrana neural da junção neuromuscular. Observe a proximidade entre os locais de liberação na membrana neural para os receptores de acetilcolina na membrana muscular nas aberturas das fendas subneurais.1 (Extraído de Hall JE. Excitação do musculo esquelético: transmissão neuromuscular e acoplamento excitação-contração. In: Hall JE, Guyton AC. Tratado de fisiologia medica. Rio de Janeiro: Elsevier; 2011. p. 87-94).

continua a ativar os receptores de acetilcolina enquanto esta persistir nesse espaço. Entretanto, a acetilcolina é removida rapidamente por dois modos: (1) a maior parte é

A

destruída pela enzima acetilcolinesterase, que está ligada principalmente à camada esponjosa do tecido conjuntivo fino que preenche o espaço sináptico, entre o terminal nervoso pré-sináptico e a membrana muscular pós-sináptica; e (2) pequena quantidade de acetilcolina se difunde para fora do espaço sináptico e dessa forma deixa de estar disponível para agir sobre a membrana da fibra muscular.1 O tempo reduzido em que a acetilcolina se mantém no espaço sináptico – alguns milissegundos – é normalmente

B

suficiente para excitar a fibra muscular. A rápida remoção da acetilcolina evita a reexcitação continuada do músculo depois que a fibra muscular se recuperou de seu potencial de ação inicial.1 O influxo de íons Na+ para a fibra muscular, quando os canais colinérgicos se abrem, causa variação do potencial elétrico no interior da fibra no local da placa motora, para aumentar na direção positiva (por 50 a 75 mV), criando um potencial local chamado potencial da placa motora. O aumento súbito no potencial da membrana nervosa de mais de 20 a 30 mV é normalmente suficiente para iniciar a abertura de mais canais de Na+, iniciando assim um potencial de ação na membrana da fibra muscular.1

Figura 2: Canal colinérgico. A: Estado fechado. B: Após a ligação da acetilcolina (Ach) e a abertura do canal pela alteração da conformação somente é permitido que íons Na+ penetrem na fibra muscular, estimulando a contração. Observe as cargas negativas na abertura do canal, que impedem a passagem dos íons negativos (Cl-).1 (Extraído de Hall JE. Excitação do musculo esquelético: transmissão neuromuscular e acoplamento excitação-contração. In: Hall JE, Guyton AC. Tratado de fisiologia medica. Rio de Janeiro: Elsevier; 2011. p. 87-94).

45


5

capĂ­tulo

Luiz Altruda Filho Sandra Tomaz Paulo Ricardo Ronconi Larosa Irineu Gregnanin Pedron


Considerações anatômicas às aplicações da toxina botulínica do tipo A em odontologia


INTRODUÇÃO A atuação do cirurgião-dentista com relação à utilização

xa transparecer linhas de expressão horizontais (“rugas”) na

da toxina botulínica refere-se, na maioria das vezes, à apli-

pele da região. Sua ação transmite a expressão de surpresa

cação em músculos da face. Nessa perspectiva, daremos

(Figura 2).

neste capítulo maior enfoque ao estudo da miologia facial. Os músculos localizados na região da cabeça, face e

MÚSCULO TEMPOROPARIETAL

pescoço apresentam características diferenciadas em rela-

Discreto feixe muscular na região lateral do couro ca-

ção a alguns músculos estriados esqueléticos do corpo hu-

beludo, tem origem na pele do vértice da orelha e na fáscia

mano. Talvez a mais interessante dessas características seja

temporal, para inserir-se na aponeurose epicrânica. Sua ação

sua inserção em tecido mole, a pele, o que confere a suas

auxilia o movimento do couro cabeludo.

ações as expressões faciais. Nossas expressões faciais são determinadas pelas ações constritoras, dilatadoras ou de

2º GRUPO: MÚSCULOS AO REDOR DA ORELHA

tração dos diversos músculos existentes na região da cabeça, face e pescoço. Em função desse resultado, são deno-

São músculos delgados e superficiais, considerados ves-

minados como músculos da expressão facial, ou músculos

tigiais no ser humano, de pequena ação, agindo nos discretos

da mímica.

movimentos da orelha. A priori são considerados secundários

Todos esses músculos possuem origem a partir do me-

na relevância clínica para a aplicação da toxina botulínica.

soderma dos segundos arcos faríngeos através de uma lâmina muscular subcutânea, que se estendem do pescoço à face, levando consigo os ramos do nervo facial (VII par craniano). Essa formação explica a frequente mistura de fibras

MÚSCULO AURICULAR ANTERIOR Origina-se na fáscia temporal e insere-se na hélice da orelha, atuando na tração da orelha para frente e para cima.

entre esses músculos e suas intrincadas inserções na pele. De forma didática, podemos descrever os músculos da

MÚSCULO AURICULAR SUPERIOR

expressão facial por meio de grupos ou por regiões da face.

Origina-se na aponeurose epicrânica e insere-se no con-

Pelo propósito clínico deste livro, julgamos como sendo me-

torno superior e posterior da orelha, para movimentá-la para

lhor a descrição por grupos, haja visto a facilidade de visu-

trás e para cima.

alização do trajeto das fibras, para ter melhor entendimento de suas ações.

MÚSCULO AURICULAR POSTERIOR Origina-se no processo mastoide do osso temporal e in-

1º GRUPO: MÚSCULOS DO COURO CABELUDO

sere-se na parte posterior do contorno da orelha, movimentando-a para trás.

MÚSCULO OCCIPITOFRONTAL É o músculo que reveste a parte superior da calota crania-

3º GRUPO: MÚSCULOS AO REDOR DO OLHO

na, formando grande parte do couro cabeludo. Esse músculo apresenta dois ventres distintos, sendo, portanto, um músculo

Os músculos localizados ao redor dos olhos atuam qua-

digástrico. Seu ventre anterior é o músculo frontal, cuja inser-

se sempre em conjunto, sendo algumas vezes árdua a indivi-

ção está na pele da fronte, glabela e região superciliar. Origina-

dualização da ação isolada, possível apenas por meio do uso

-se na aponeurose epicrânica, uma parte da fáscia superficial

da eletromiografia.

do couro cabeludo (Figura 1). O ventre posterior é o músculo occipital, com origem na linha nucal superior e inserção na aponeurose epicrânica.

MÚSCULO ORBICULAR DO OLHO Esse músculo circunda a região dos olhos, como um es-

A ação desse músculo é movimentar o couro cabeludo

fíncter, e possui duas porções distintas. A parte orbital apre-

e enrugar a pele da fronte. Com o decorrer do tempo, dei-

senta extensa origem, desde a parte lateral da sutura fronto-

52


nasal, processo frontal da maxila, osso lacrimal e ligamento

gura 4), enquanto que a ação da parte orbital está relacionada

palpebral medial. Essa porção tem inserção no ligamento pal-

ao fechamento forçado das pálpebras e a compressão do

pebral lateral, circundando a órbita e se estendendo dentro

saco lacrimal (Figura 5).

das pálpebras. A parte palpebral tem sua origem no ligamen-

Pela sua disposição em forma de esfíncter, é o respon-

to palpebral medial e inserção no ligamento palpebral lateral

sável pelo aparecimento das marcas de expressão ou linhas

(Figura 3). Sua ação é de fechar suavemente a pálpebra, nos

hiperfuncionais ao redor dos olhos, conhecidas como “pés de

movimentos delicados, como o piscar natural dos olhos (Fi-

galinha” (como pode ser observado na Figura 5).

Figura 1: Músculo occiptofrontal - ventre anterior.

Figura 2: Expressão de surpresa, definida principalmente pela contração do músculo frontal.

Figura 3: Músculo orbicular dos olhos.

Figura 4: O fechar suave das pálpebras ou o piscar natural dos olhos.

Figura 5: Fechamento forçado das pálpebras e a compressão do saco lacrimal, provocados pela contração do músculo orbicular do olho.

53


MÚSCULO ABAIXADOR DO SUPERCÍLIO

abaixa a pele da região da fronte e a extremidade medial do

Discreto feixe muscular, muitas vezes é ignorado por al-

supercílio, enrugando a pele do dorso do nariz (vide Figura 7).

guns autores, por se confundir tanto em sua disposição como em sua ação com o músculo corrugador do supercílio. Sua

4º GRUPO: MÚSCULOS DO NARIZ

origem é na parte nasal do osso frontal e na pele do dorso do nariz, de onde envia fibras para sua inserção no terço medial da pele do supercílio. Pela origem inferior, durante a ação,

Neste grupo descrevemos os músculos que atuam diretamente no nariz.

abaixa a pele da fronte e o supercílio, formando uma prega transversal na raiz do nariz.

MÚSCULO NASAL Esse músculo apresenta duas porções distintas, que re-

MÚSCULO CORRUGADOR DO SUPERCÍLIO

cobrem o dorso e a asa do nariz, formados por cartilagem.

De aspecto mais horizontalizado em relação ao músculo

O feixe transverso é a maior porção e recobre o dorso do

abaixador do supercílio, tem origem na extremidade medial

nariz, tendo sua origem na fóvea alveolar dos dentes cani-

do arco superciliar, ligamento palpebral medial e osso lacri-

nos, e sua inserção na cartilagem lateral do nariz e na lâmina

mal, e insere-se na parte lateral média da pele e no super-

tendínea mediana do dorso do nariz. O feixe alar tem origem

cílio, tracionando o supercílio medial e inferiormente (Figura

na fóvea alveolar dos dentes incisivos laterais e inserção na

6). Devido a sua ação a pele forma uma prega vertical sobre

asa do nariz e margem das narinas, estreitando a abertura

a raiz do nariz. É a expressão característica da preocupação

destas (Figura 9). Na ação conjunta dos dois feixes temos a

(Figura 7).

movimentação das narinas e o movimento da pele do nariz (Figuras 10A e 10B).

MÚSCULO PRÓCERO Faixa de músculo verticalizada e central aos supercílios,

MÚSCULO ABAIXADOR DO SEPTO NASAL

apresenta sua origem na parte inferior do osso nasal e cartila-

Pequeno feixe muscular que tem sua origem na fóvea al-

gem nasal lateral, e insere-se na pele da região da glabela (par-

veolar dos dentes incisivos centrais, e sua inserção na cartila-

te mediana entre os arcos superciliares) (Figura 8). Sua ação

gem do septo nasal, estendendo-se até as narinas. Sua ação

Figura 6: Músculo corrugador do supercílio.

54

Figura 7: Expressão característica da preocupação.

Figura 8: Músculo prócero.


é bem discreta e fecha a abertura das narinas, deprimindo o ápice do nariz. 5º GRUPO: MÚSCULOS AO REDOR DA BOCA É o maior grupo muscular da face. Apresenta diversos músculos que trocam fibras ao redor dos lábios, fazendo os movimentos necessários para a mastigação, deglutição, fonação e diversas expressões faciais. MÚSCULO ORBICULAR DA BOCA Massa muscular que circunda a rima da boca formando a espessura dos lábios. Pode ser separado em duas partes distintas, já que apresenta inervação diferente para a parte superior e a inferior. Entretanto, funcionalmente é considerado como unidade única. De origem controversa, podemos considerar como fixado às fibras periféricas provenientes do septo do nariz e fóvea do incisivo lateral superior em sua porção superior; em sua porção inferior, na eminência alveolar do dente canino inferior; e inserção de ambas as partes na região da comissura labial no ângulo da boca, região onde troca fibras com diversos músculos, como o bucinador, elevador do ângulo da boca, abaixador do ângulo da boca, zigomático maior e risório (Figura 11). A região desse cruzamento de fibras na comissura

Figura 9: Feixes transverso e alar do músculo nasal.

A

B

Figura 10: Movimento da pele do nariz (A). Movimentação das narinas (B).

Figura 11: Músculo orbicular da boca.

55


6

capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron


Protocolo de aplicação e orientações pós-aplicação


A aplicação da toxina botulínica é um procedimento

sobre o ponto de aplicação deve permanecer por 10 a 15

simples, rápido, seguro e eficaz, desde que respeitados os

minutos (Figura 4). A aplicação prévia de gelo é sugerida para

pré-requisitos de sua utilização. Entretanto, alguns cuidados

reduzir a sintomatologia dolorosa durante a aplicação.1

devem ser seguidos na pré, trans e pós-aplicação, aborda-

A reconstituição do produto (ver Capítulo 3, Farmacologia da toxina botulínica) deve seguir as orientações do fabricante,

dos a seguir.

e a toxina deve ser adequadamente armazenada, entre 5 °C CUIDADOS PRÉ-APLICAÇÃO

a 8 °C (ao fundo da primeira prateleira da geladeira, abaixo do congelador), evitando-se o congelamento e o uso de outras

Inicialmente, a indicação de cada caso deve ser avaliada

áreas da geladeira, como a porta, na qual, pelas recorrentes

e particularizada, bem como verificadas as possíveis contrain-

aberturas, há maior aumento de temperatura, com possível

dicações ou cuidados aos pacientes, de acordo com o Capí-

risco de aquecimento e perda de ação da toxina botulínica.

tulo 7, Indicações e contraindicações da aplicação da toxina

No momento de cada aplicação a tampa de borracha do frasco deve ser desinfectada com gaze e álcool etílico a 96°.

botulínica do tipo A. No ato do planejamento de cada caso é indicado o pro-

Para cada indicação estomatológica há agulhas e serin-

tocolo fotográfico de face (sugerida a leitura do Capítulo 18,

gas específicas, sendo utilizadas as seringas de aplicação de

Proposta de protocolo fotográfico simplificado às aplicações

insulina (Figura 5), graduadas por unidades de medida (U).

de toxina botulínica do tipo A em odontologia), que deverá

É recomendado o emprego de seringas que já apresentam

conter expressões faciais exageradas (em caso de aplica-

agulhas unidas, haja vista que os outros modelos (seringas

ções faciais) e tomadas fotográficas laterais (para aplicações

e agulhas separadas) podem facilitar o desperdício da toxi-

em músculos da mastigação).

na no ato da aplicação. Após a seleção da seringa, a agulha

1

Dependendo da região e da indicação, é recomendado

deve ser introduzida no centro da borracha, vencendo sua

utilizar a eletromiografia para identificar o músculo que rece-

resistência. Aspiração cuidadosa e lenta deve ser realizada

berá a aplicação.

com o ápice (bisel) da agulha encostado na parede de vidro

1

do frasco, com o propósito de evitar a inclusão de bolhas de PROTOCOLO DE APLICAÇÃO

ar. Ao perceber bolhas de ar no conteúdo da seringa, deve-se devolver o conteúdo lentamente, empurrando o êmbolo

A pele deve estar limpa. Para tanto, a higienização pode

da seringa, e realizar nova aspiração. Definida e alcançada a

ser feita com água abundante e sabão neutro. Adicionalmen-

quantidade do conteúdo da toxina (pela graduação da serin-

te, no ato da aplicação, deve-se higienizar a pele com gaze

ga), deve-se remover o conjunto (agulha e seringa) do frasco,

embebida em álcool etílico. É recomendada a utilização de

que deve ser imediatamente armazenado sob refrigeração (5

tocas descartáveis, principalmente em mulheres, recolhendo

°C a 8 °C). A Tabela 1 sintetiza as características do conjunto

cabelos longos, o que facilita a percepção da face da pacien-

agulha-seringa e suas respectivas indicações.

te (Figura 1). De acordo com a indicação, deve ser realizado o

Com o paciente em posição na cadeira odontológica,

planejamento de aplicação com a utilização de canetas mar-

decorridos de 10 a 15 minutos para a ação do anestésico

cadoras ou lápis de olhos. É recomendada a caneta de cor

tópico, cada ponto no ato da aplicação deve ser limpo com

branca, haja vista o maior contraste com a pele (Figura 2). A

gaze estéril seca, ou levemente embebida em álcool etílico,

de cor preta não apresenta bom contraste, e em pacientes

para a remoção do creme anestésico e da tinta da caneta

melanodermas o contraste é ainda menor, o que dificulta a

demarcadora. Remove-se o remanescente da tinta, evitando

percepção dos pontos de aplicação.

a inclusão de pigmentos no interior da derme quando da in-

1

Após a limpeza da pele e a demarcação dos pontos de

jeção da agulha.

injeção, deve ser aplicado o anestésico tópico dermatológi-

A região do músculo referente ao ponto de aplicação deve

co, constituído pela associação entre lidocaína de 25 mg/g

ser apreendida bidigitalmente, quando possível, e a inserção

®

e prilocaína de 25 mg/g (Emla , Astra-Zeneca do Brasil, Co-

da agulha deve ser realizada cuidadosamente em movimento

tia, São Paulo, Brasil) (Figura 3). O creme anestésico aplicado

único, evitando-se a sintomatologia dolorosa, e perpendicular

66


Figura 2: Para auxiliar o planejamento de aplicação, utilize caneta marcadora ou lápis de olhos preferencialmente de cor branca, haja vista o maior contraste com a pele.

Figura 1: A utilização de tocas descartáveis é recomendada particularmente em mulheres, o que facilita a percepção da face da paciente.

Figura 3: Anestésico tópico dermatológico (Emla®, Astra-Zeneca do Brasil, Cotia, São Paulo).

A

B Figura 4: O creme anestésico deve permanecer por 10 a 15 minutos.

Figura 5: Seringas e agulhas utilizadas na aplicação de toxina botulínica (A). Detalhe do comprimento das agulhas (B).

67


7

capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron


Indicações e contraindicações da aplicação da toxina botulínica do tipo A


INTRODUÇÃO A toxina botulínica apresenta diversas variedades de

no – músculos palatoglosso, palatofaríngeo, salpingofaríngeo,

Indubitavelmente

tensor e elevador do véu palatino – causam elevação rítmica

a aplicação cosmética angariou reconhecimento e sucesso

do palato mole, podendo ocasionar desordens de deglutição

para a toxina botulínica, inicialmente indicada em casos de

e fonação, incluindo zumbido, pela insuficiência velofaringea-

linhas faciais hiperfuncionais, mais frequentemente observa-

na. Para otimizar a correta detecção do músculo-alvo, reali-

das nas regiões glabelar, frontal e periorbitais (laterocantal),

za-se a aplicação da toxina botulínica guiada por eletromio-

rugas profundas do lábio superior, nariz, linhas profundas

grafia.2,7

indicações terapêuticas e cosméticas.

1-3

de marionete, banda do platisma e ondulações das boche-

Em condições que apresentam espasticidade, tais como

Frequentemente, como a maioria dessas aplica-

AVC, injúria cerebral traumática, paralisia cerebral, esclerose

ções pode interferir em funções fisiológicas, as respectivas

múltipla, injúria da espinha dorsal, a toxina botulínica do tipo A

aplicações devem ser cuidadosas.

apresenta benefícios na redução do tônus muscular.1,3,7

chas.

1,3-5

1

Relatou-se a aplicação da toxina botulínica em algumas INDICAÇÕES GERAIS E ESTOMATOLÓGICAS

desordens de hiperatividade de músculos lisos, como dissinergia do esfíncter do músculo detrusor, acalasia da cárdia e

Independentemente da finalidade, terapêutica ou cos-

fissura anal crônica.1,7

mética, para a aplicação da toxina botulínica o paciente e o

A toxina botulínica pode ser aplicada em condições sob

profissional devem discutir exaustivamente o caso para evi-

a regência do sistema nervoso autônomo, tais como a hiper-

tar desapontamentos e insatisfações. Geralmente homens

salivação ou sialorreia (Capítulo 16), em que os pacientes não

apresentam maior massa muscular em comparação com as

apresentam capacidade correta de deglutição da saliva (po-

4

mulheres, sendo necessárias quantidades maiores da toxina.

dendo ser causada por doenças neurológicas, doença de

Entre as desordens do movimento, a toxina botulínica do

Parkinson, esclerose lateral amiotrófica, paralisia cerebral, car-

tipo A foi indicada em casos de distonias focais, com ativida-

cinoma do trato digestivo superior, síndrome de Frey, sialoceles

de muscular involuntária e espasmódica, como a distonia cer-

e parotidite), ou sua contenção na cavidade bucal, podendo

vical, truncal, laringeal, em membros, cólica muscular heredi-

aspirá-la e causar pneumonia por aspiração.1-3,7 Todas as apli-

tária, tremor, tiques, blefaroespasmo, estrabismo e nistagmo.

cações, exceto na síndrome de Frey, são realizadas percutane-

Entre as indicações estomatológicas encontram-se a distonia

amente, injetadas no parênquima glandular ou perilesional. A

oromandibular e orolingual, paralisia facial periférica (Capítulo

xerostomia é a primeira manifestação do botulismo, caracterís-

15), mioquimia ou sinquinese seguida de reparação deficiente

tica que originou investigações da utilização da toxina botulíni-

do nervo facial, espasmo hemifacial, mioclonus, tremor pala-

ca em sialorreia.3 A sudorese gustatória é sequela comum após

tal e prevenção da formação de cicatrizes (Capítulo 12).1-3,6,7

cirurgia da glândula parótida. Para melhor resultado, Laskawi2

Sinquinese é uma sequela inevitável cujo movimento muscu-

sugeriu a divisão e a aplicação em boxes, usando o teste de

lar não coordenado é involuntário causada pela reconstrução

Minor. O tratamento da hiperidrose de face ou cabeça segue

do nervo facial em pacientes que apresentaram tumores das

os mesmos princípios do tratamento de sudorese gustatória.2

4

glândulas parótidas. São caracterizados por movimentos sincronizados mas involuntários de certos músculos da mímica,

A aplicação da toxina botulínica em casos de hiperlacrimação foi indicada.2,7

incluindo o platisma, sendo frequentes em casos de paralisia

Em pacientes com rinite alérgica ou intrínseca que apre-

Em casos de distonia oromandibular que afetam a

sentam rinorreia (coriza) a toxina botulínica pode ser injetada na

região do soalho lingual, e dependendo do tipo de desordem

mucosa que recobre as conchas nasais médias e inferiores, ou

do movimento, a musculatura intrínseca da língua deve ser

mediante aplicação tópica em esponjas em posição (absorção

evitada, pela possibilidade de causar eventos adversos como

pela mucosa nasal). Redução da secreção nasal foi observada

No tremor palatal, as

após 12 semanas. Epistaxe ou crostas nasais são eventos ad-

facial.

2,3

disfagias, disfonias e hipossalivação.

2,3,7

contrações distônicas repetitivas dos músculos do véu palati-

74

versos comuns.2


Pacientes com dor crônica requerem usualmente manejo

indicada.2,3,7 Adicionalmente, os pacientes podem apresen-

multidisciplinar. A toxina botulínica do tipo A tem apresenta-

tar assimetrias faciais causadas pela hipertrofia massetérica

do diversos benefícios em sua utilização em casos de sín-

(Capítulo 11), uni ou bilaterais, e a aplicação recorrente pode

dromes de dor não distônicas, como dor orofacial (Capítulo

causar a hipotrofia muscular com ganho da simetria facial.2-5

14), dores miofasciais, dor lombar crônica, torcicolo, cefaleia

Em pacientes que apresentam sorriso gengival (Capítulo

cervicogênica e tensional, migrânia, neuralgia do nervo trigê-

8), a aplicação da toxina botulínica causa a deiscência do lá-

meo, bruxismo sintomático, cefaleia secundária aos hábitos

bio superior, o que angaria benefícios estéticos e funcionais.1,3

parafuncionais e contratura hemifacial após injúria do sétimo

Resultados promissores têm sido reportados em casos

nervo craniano. Benefícios foram apresentados pela toxina

de paralisia facial (Capítulo 15, Aplicação de toxina botulínica

botulínica em casos de dor pós-cirúrgica.

do tipo A em paralisia facial), induzindo intencionalmente a

1-3,5-8

Diversas indicações têm sido reportadas – discutidas no

ptose com o propósito de proteger o ressecamento da cór-

Capítulo 10 – em disfunções da articulação temporomandibu-

nea, em casos de paralisia do músculo elevador da pálpebra

lar (ATM), tais como dores musculares mastigatórias, reduzida

superior.3 A sinquinese oriunda da paralisia facial também foi

capacidade na abertura da boca, deslocamento recorrente

citada como sequela tratada pela aplicação da toxina botu-

As disfunções tem-

línica.3 Em casos de pacientes com assimetria facial a inje-

poromandibulares (DTM) são a maior causa de dores orofa-

ção contralateral à paralisia facial tem sido de grande valia

ciais. Podem ser classificadas em miofasciais (relacionadas

na redução da hiperquinese relativa, resultando em melhores

à ação do músculo) ou artrogênicas (relacionadas à articula-

funções simétricas da face.3 Adicionalmente, em casos de

ção).3 Foi indicada para a luxação da ATM, quando o côndilo

hiperlacrimação excessiva, a toxina tem sido utilizada com

mandibular é deslocado anteriormente à eminência articular,

sucesso.2,3 Outras causas de paralisias têm sido indicadas,

causada por hiperatividade do músculo pterigóideo lateral.2,3

como em casos de acometimento por trauma.3

da ATM e hiperatividade mastigatória.

1-3,5-7

Ocorre frequentemente em pacientes com distonia oroman-

Em casos de cirurgia bucal eletiva, com acessos extrabu-

dibular, disquinesias tardias ou precoces induzidas neuro-

cais, nos quais podem existir movimentos involuntários pelo

lepticamente, epilepsia ou síndromes troncocerebrais. Tem

paciente, a aplicação da toxina botulínica pode auxiliar por

sido reportada ainda a melhora da verbalização, mastigação

imobilizar a musculatura em casos de fratura dos maxilares,

e qualidade de vida em pacientes que apresentaram desloca-

especialmente quando a imobilização mecânica não é pos-

mento da ATM, que sofreram AVC, eventos cerebrovascula-

sível.3 Tem sido relatada a utilização clínica da toxina em im-

res ou encefalopatia anóxica.3 Para a inspeção exata, palpa-

plantodontia para a redução profilática da força de contração

Pacientes

dos músculos masseter e temporais após implantação em

que apresentam abertura de boca reduzida (trismo) podem

carga imediata de implantes.6 Também têm sido observadas

ter relaxamento muscular e redução da inflamação muscular

melhorias no aspecto clínico de queloides e cicatrizes hiper-

e da dor após a aplicação de toxina botulínica do tipo A nos

tróficas, ao inibir seu crescimento, causadas pela redução

músculos masseter, temporais, pteriogoideos e digástricos

da contração muscular adjacente à ferida, sendo reportada

(Capítulo 12, Aplicações coadjuvantes da toxina botulínica

ainda a influência sobre a apoptose e proliferação celulares.3

do tipo A em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial).3,7 O

As aplicações da toxina botulínica do tipo A coadjuvantes em

deslocamento do disco articular, após a aplicação da toxina

procedimentos inerentes à cirurgia e traumatologia bucoma-

botulínica, pode apresentar redução do estalido no músculo

xilofacial e à implantodontia são discutidas respectivamente

pterigóideo lateral. Coadjuvante à artrocentese, a aplicação

nos Capítulos 12 e 13.

3

ção e eletromiografia ou ultrassom são indicados.

2,3

3

de toxina botulínica pode ser utilizada, caracterizando pro-

Futuras indicações da aplicação da toxina botulínica têm

cedimentos menos invasivos em comparação à cirurgia. A

sido reportadas na redução do peso corporal e da ingestão

toxina botulínica vem sendo amplamente usada em casos de

alimentar no interior do antro gástrico para retardar o esva-

bruxismo ou briquismo (Capítulo 9), estando a eletromiografia

ziamento gástrico. Foi citada a aplicação da toxina botulínica

3

75


no esfíncter de Oddi para o alívio da sintomatologia doloro-

É considerada contraindicada ainda a aplicação da toxina

sa biliar após a colescistectomia. É importante lembrar que

botulínica em pacientes em que são administrados antibióti-

diversas indicações preconizadas pela medicina podem ser

cos aminoglicosídeos (estreptomicina, gentamicina, tobrami-

transferidas para a área de atuação da odontologia.

cina, amicacina, netilmicina, paramomicina, espectinomicina)

7

e outros fármacos que interferem na transmissão neuromusCONTRAINDICAÇÕES

cular (bloqueadores não despolarizantes do tipo curare, quinidina, sulfato de magnésio e succinilcolina).3-5,10

Como qualquer outro fármaco, a toxina botulínica está contraindicada em casos de pacientes que apresentem hiper-

Também foi considerada contraindicação relativa a infecção local preexistente no sítio de aplicação.10

sensibilidade aos componentes da fórmula. Entre os constituintes da formulação destacam-se as proteínas do leite bo-

ADVERTÊNCIAS E PRECAUÇÕES DE USO

vino (lactose) e a albumina. Esta última apresenta função na estabilidade do complexo toxina-proteína. Nessa perspectiva,

A aplicação da toxina botulínica pode causar reações

a toxina botulínica torna-se contraindicada em pacientes com

alérgicas, embora não haja casos documentados na literatura

hipersensibilidade à lactose e à albumina.

médica. Os efeitos colaterais potencialmente relacionados à

5,9,10

A aplicação da toxina botulínica é contraindicada também

aplicação da toxina botulínica foram cefaleia, reações no local

em crianças menores de 2 anos de idade, haja vista a pos-

da aplicação e ptose palpebral, esta última relacionada ao

sibilidade de comorbidades, baixo peso e carência de base

volume da injeção, topografia muscular injetada e experiência

de dados literários específicos nessa subpopulação. Dastoor

profissional.9

9

et al.1 recomendam que crianças menores de 12 anos não recebam aplicações de toxina botulínica.

A cefaleia é usualmente transiente e cede ao analgésico comum. Em nosso protocolo recomendamos a adminis-

A aplicação em gestantes e lactantes é contraindicada

tração de trometanol cetorolaco de 10 g (Toragesic®, EMS

- categoria de risco na gravidez igual a C, na qual não foram

Sigma Pharma Ltda., Hortolândia, São Paulo, Brasil). Em ca-

realizados estudos reprodutivos, não havendo dados sobre

sos de nódulos cutâneos e edema na região da aplicação,

a segurança de seu uso em gestantes ou lactantes.

pressão e bolsas de gelo podem ser utilizadas.13,14 Não reco-

1,3-5,7,9,10

Pacientes portadores de deficiências na transmissão

mendamos a utilização da pressão local, tendo em vista evitar

neuromuscular, tais como miastenia gravis, síndrome de Ea-

o espalhamento da toxina em áreas indesejadas. Segundo

ton-Lambert e esclerose lateral amiotrófica, podem apresen-

Saeliw et al.,14 a aplicação de bolsas de gelo sobre a região,

tar aumentada sensibilidade à toxina botulínica, resultando

antes ou depois da aplicação, não apresentou diferença es-

em fraqueza muscular excessiva.

tatisticamente significante em relação à analgesia. Contudo,

1,3-5,10,11

Em pacientes portadores de alterações respiratórias ou

a aplicação de gelo 5 minutos antes da aplicação da toxina

de deglutição a toxina também deve ser evitada, haja vista

botulínica apresentou redução estatisticamente significante

a possibilidade de, quando aplicada em planos musculares

no sangramento após a aplicação.

profundos, atingir os respectivos músculos afetados. Em bai-

As fórmulas comerciais de toxina botulínica (exceto Xe-

xa frequência, já foram reportadas na literatura broncoaspi-

omin®, Merz-Biolab, São Paulo, Brasil) contêm pequena

ração, pneumopatia, disfagia e anafilaxia, causando inclusive

quantidade de albumina sérica humana, visando aumentar a

óbito em pacientes com astenia significativa.

estabilidade do complexo toxina-proteína. Portanto, a possi-

5,9,12

A formação de anticorpos antitoxina botulínica é evento

bilidade da transmissão de doença viral (hepatites) ou priôni-

raro. Clinicamente, a existência de quantidades significativas

ca (Doença de Creutzfeuld-Jakob) não deve ser excluída.5,9,15

de anticorpos neutralizantes pode ser presumida pela deterio-

Pedron et al.15 ressaltam a importância da seleção dos bio-

ração substancial da resposta terapêutica e/ou pela necessi-

materiais, também em implantodontia e periodontia, diante

dade constante do aumento das doses.

da possibilidade, mesmo que pequena, de infecção priônica,

76

9


REFERÊNCIAS mesmo que esses incidentes não tenham sido reportados na literatura médica.

9

Em pacientes com insuficiência renal ou hepática, não há necessidade de redução das doses.9 A aplicação em pacientes com alterações da agregação plaquetária e coagulação, ou sob tratamento com fármacos antiagregantes plaquetários ou anticoagulantes, deve ser ponderada, ou seja, quando estritamente necessária, considerando-se a injeção intramuscular.9 Os efeitos da toxina botulínica podem ser potencializados por fármacos que interferem direta ou indiretamente na função neuromuscular. Antibióticos aminoglicosídeos e relaxantes musculares utilizados em procedimentos anestésicos devem ser usados com precaução nesses pacientes.9,16 Vale ressaltar que, por orientação do fabricante, os profissionais que fizerem uso da toxina botulínica devem ter abrangente conhecimento sobre anatomia da região a ser aplicada, conceitos de eletroneuromiografia, ultrassonografia e eletroestimulação. O fabricante ainda recomenda o uso de um frasco por paciente, o que é inviável na odontologia. Atenção deve ser dada à inutilização e ao descarte especial do frasco.9 Pacientes psicológicos instáveis, com expectativa não realística ou com medo não realístico da toxina, devem ser evitados.10

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77


8

capĂ­tulo

Irineu Gregnanin Pedron Maria EugĂŞnia da Silva Cezere


Aplicação da toxina botulínica do tipo A em sorriso gengival


INTRODUÇÃO A busca pela beleza e harmonia da face humana re-

Dessa forma, o escopo deste capítulo é ambientar o ci-

monta desde os tempos da Antiguidade, sendo retrata-

rurgião-dentista a alguns conceitos sobre sorriso gengival e

da pela História, Artes e Medicina. É também objetivo da

à aplicação de toxina botulínica como opção não cirúrgica.

odontologia a reprodução natural dos dentes e gengiva relacionando-se harmonicamente com os lábios e a face dos pacientes. O conhecimento dos princípios estéticos

SORRISO GENGIVAL E ESTÉTICA DENTOGENGIVO-

aplicados à odontologia (tamanho, forma e proporcionali-

LABIOFACIAL

dade), anatomia e inclinação axial, em acordo com as características do paciente, são fundamentais na construção

O sorriso gengival é conceituado pela exposição de mais de 2 mm a 3 mm de tecido gengival durante a excursão

de sorrisos agradáveis e harmônicos.

1

A “proporção áurea”, concebida pelo escultor grego

do sorriso.6-8 Apresenta maior predileção no sexo feminino.

Fídias (490-430 a.C.), tem sido empregada na odontologia

A maior predominância nas mulheres pode ser explicada

e, por meio de conceitos matemáticos, busca a harmonia

pelo fato de pacientes do sexo masculino apresentarem a

visual, observada pela percepção da proporção entre ele-

linha do sorriso mais baixa.5,6,9

mentos distintos de determinada estrutura. Entretanto, a

Diversas etiologias foram sugeridas ao sorriso gengival,

“proporção áurea” é aplicada nas relações proporcionais

como o excesso vertical da maxila,1,5,7-12 a erupção passi-

entre os dentes, buscando a harmonia do sorriso em norma

va tardia,5,7,9,10,12 hiperatividade dos músculos envolvidos no

frontal.1 O relacionamento entre dentes e gengiva determi-

sorriso1,5,7,10,12 e comprimento reduzido da coroa clínica dos

nam a forma de cada dente, que deve ser particularizada

dentes,1-7 que podem ocorrer isoladamente ou em conjunto

de acordo com a forma da face (braquifacial, mesofacial e

e determinam o tipo de tratamento a ser empregado. Com

2,3

dolicofacial) e biótipo (brevilíneo, normolíneo e longilíneo).

o decorrer da idade, há redução da exposição dos dentes

Estética bucal é um dos principais objetivos do trata-

superiores durante a excursão do sorriso e aumento da ex-

mento odontológico na sociedade moderna e deve estar

posição dos dentes inferiores. Esse fenômeno ocorre pelo

em harmonia com a estética facial. O aspecto individual

desgaste fisiológico dos dentes e pela perda de elasticidade

dentofacial influencia não somente na atratividade e no re-

dos lábios.1,4,5

lacionamento social como também na mudança de ênfase

Câmara13 preconizou a utilização dos diagramas de re-

no conceito de saúde, que tem sido definido como estado

ferências estéticas dentárias (DRED) e faciais (DREF), que,

completo de bem-estar físico, psíquico e social, e não me-

de forma simples e individualizada, auxiliam no diagnóstico e

ramente a ausência de doença ou enfermidade.

planejamento dos tratamentos multidisciplinares. Os diagra-

1,4

Diversos estudos ortodônticos têm reportado a re-

mas visualizam características como simetria, eixos dentá-

lação entre maloclusão e estética. Alguns autores enal-

rios, limite do contorno gengival, nível do contato interdentá-

teceram a importância do estudo fotográfico do sorriso

rio, bordas incisais, proporções dentárias e linhas do sorriso.

adicionalmente ao estudo cefalométrico, verificando as

Seixas et al.5 sugeriram o diagnóstico do sorriso gen-

possíveis divergências entre linha do sorriso, linha média

gival por meio de um check-list constituído pelo registro

dentária, assimetrias oculares, nasais e mentuais, cor-

sistematizado de alguns itens, como a distância interlabial

redor bucal, formas incisais, simetria e proporções (de-

em repouso, exposição dos incisivos superiores durante o

finidas pela “proporção áurea”), contatos e inclinações

repouso e fonação, arco do sorriso, proporção largura/com-

dentárias, características inerentes ao diagnóstico e tra-

primento dos incisivos superiores e características morfo-

tamento ortodônticos.

1,4

Entretanto, há poucos estudos

funcionais do lábio superior.

que relacionam a estética dentária à gengival e à facial

De acordo com cada fator, o diagnóstico é direciona-

mediante sua composição com os tecidos moles bucais

do ao planejamento e à execução do tratamento adequado.

e peribucais.

Nessa perspectiva, quanto maior a distância interlabial em

80

4,5


repouso, provavelmente mais haverá limitações no tratamen-

e favorecendo a harmonia entre lábios e face do paciente,

to ortodôntico, sugerindo a necessidade de tratamento pela

angariando o equilíbrio entre os componentes do sorriso,

medicina estética. A exposição dos incisivos superiores du-

particularmente em pacientes portadores de sorriso gengi-

rante o repouso e a fonação é geralmente maior em mulheres

val.2,3 Esses procedimentos são coadjuvantes à aplicação

do que em homens, variando de 2 mm a 4,5 mm e de 1 mm

da toxina botulínica e alcançam resultados satisfatórios. En-

a 3 mm respectivamente. Nesse item, além das fotografias

tretanto, sugerimos a realização do procedimento cirúrgico

em norma frontal, a radiografia cefalométrica também pode

prévio à aplicação da toxina botulínica nos pacientes por-

auxiliar no diagnóstico. A maior exposição dos incisivos su-

tadores de sorriso gengival, como pode ser observado nas

periores está relacionada ao padrão dolicofacial, à extrusão

Figuras 7 e 12. Enfatizamos ainda a necessidade do envio

deles, ao excesso vertical maxilar e ao lábio superior curto,

da submissão do fragmento de gengiva removida para exa-

requerendo o tratamento ortodôntico-cirúrgico. A proporção

me histopatológico.14,15

entre largura e comprimento determina o formato do dente, usualmente correspondendo a largura a 80% do compri-

APLICAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNICA PARA O SOR-

mento do incisivo central superior (aceita entre 65% e 85%)

RISO GENGIVAL

e de 70% nos incisivos laterossuperiores. Alterações nessa proporção conduzem às variações morfológicas e podem

Além da indicação terapêutica em diversas outras de-

ser causadas ora por reduções da borda incisal dos dentes

sordens estomatológicas, a toxina botulínica tem-se tornado

(por atrição ou fraturas), ora por crescimento gengival. De

excelente meio auxiliar no tratamento estético e funcional do

acordo com a causa etiológica, a reabilitação dentária ou a

sorriso gengival ou exposição gengival acentuada.6-12,16

cirurgia gengival ressectiva podem ser empregadas (Figuras

A atividade do sorriso é determinada por diversos mús-

7 e 12). Diversos músculos desempenham ação durante a

culos faciais, como o elevador do lábio superior, da asa do

excursão do sorriso, entre eles o músculo elevador do lábio

nariz, zigomáticos menor e maior, do ângulo da boca, or-

superior, o músculo elevador do lábio superior e da asa do

bicular da boca e risório.6,8-12 Entre eles os três primeiros

nariz, o músculo elevador do canto da boca, o zigomático

desempenham maior função e determinam a quantidade de

maior, o zigomático menor, o depressor do septo nasal e

elevação labial, devendo ser, portanto, os músculos afeta-

o músculo orbicular da boca. Adicionalmente pode existir

dos pela injeção da toxina. As fibras desses músculos con-

hiperatividade muscular, e nessa situação estão indicados

vergem para a mesma área, formando um triângulo, sugerin-

procedimentos de cirurgia plástica, como a instalação de

do-se que o ponto de eleição adequado compreenda os três

silicone no fundo dos vestíbulos, aplicação de toxina botulí-

músculos em uma única injeção. A toxina, ao ser injetada,

nica e procedimentos ressectivos musculares. Enaltecemos

pode se espalhar em área de 10 mm a 30 mm, o que per-

que nem todos os fatores diagnósticos têm relacionamento

mite seu alcance efetivo.6,9 O local de injeção proposto foi

direto com o sorriso gengival.

lateralmente à asa do nariz.8,9,11,12 Ao ser injetada em locais

5

No sorriso gengival causado pela hiperfunção muscular

predeterminados, a toxina diminui a contração dos múscu-

foi indicada a aplicação de toxina botulínica, tratamento de

los responsáveis pela elevação do lábio superior, o que re-

primeira escolha pela facilidade e segurança das aplicações,

duz a exposição gengival.6-12,16

efeito rápido e por ser um método mais conservador quando

Cada músculo envolvido na elevação do lábio superior

comparado aos procedimentos cirúrgicos, como a miecto-

apresenta uma função durante a atividade do sorriso. Os

mia ou a cirurgia ortognática.

locais para as injeções são determinados pela contração de

6-12,16

Quando da presença de coroa clínica curta, há a indica-

grupos musculares específicos, que resultam em diferentes

ção da realização de procedimentos cirúrgicos ressectivos,

áreas de visualização gengival. Diversas classificações fo-

com o propósito da exérese do crescimento gengival exces-

ram propostas ao sorriso gengival, anterior, posterior, misto

sivo, buscando melhorar a relação entre dentes e gengiva

e assimétrico, envolvendo grupos musculares diferentes.6,8

81


9

capĂ­tulo

Maria EugĂŞnia da Silva Cezere Irineu Gregnanin Pedron


Aplicação de toxina botulínica do tipo A em pacientes portadores de hábitos parafuncionais – bruxismo e briquism


INTRODUÇÃO O bruxismo, termo derivado do grego, brychein, que

gião posterior, pois a estabilidade da prótese permite

significa “triturar ou ranger os dentes” , tem sido definido

maior pressão nessa região. Adicionalmente, o desgas-

como uma atividade parafuncional diurna ou noturna que

te dentário está associado a outros distúrbios, como a

consiste em movimentos rítmicos involuntários ou espasmó-

hipersensibilidade dentária e a redução da altura da co-

dicos que incluem o ranger e o triturar dos dentes. Briquismo

roa, causando alterações oclusais e subsequentemente a

é definido pelo apertamento dentário.

redução da dimensão vertical de oclusão (DVO). Outras

1,2

3-5

da

manifestações associadas podem ocorrer, como fratura

população, podendo apresentar-se em qualquer faixa etária.

de restaurações, próteses e implantes dentários, sons

A ampla variação reportada pode ser explicada por diferen-

oclusais audíveis de rangimento, hipertrofia dos músculos

ças na metodologia de alguns estudos e pelas definições

mastigatórios, cefaleia, sintomatologia dolorosa e des-

distintas de bruxismo. O bruxismo pode ainda acometer

conforto na ATM. Na fase inicial o diagnóstico pode ser

crianças, variando de 7% a 88% da população infantil. Foi

mais crítico, sendo auxiliado pelos relatos dos familiares

reportado que apenas 5% a 20% dos pacientes portadores

(pais, irmãos ou cônjuges) sobre o ruído audível produzido

de bruxismo têm conhecimento da atividade.

pelo paciente durante o sono. Nas radiografias periapicais

A incidência do bruxismo varia entre 5% a 96%

1-6

4

2

Diversos fatores etiológicos foram propostos, embora o

podem ser observados sinais sugestivos, como o aumen-

mecanismo etiopatológico ainda seja incerto. Fatores como

to do espaço pericementário e o espessamento da lâmina

o estresse emocional (incluindo o transtorno do déficit de

dura.2,6

atenção e hiperatividade, medo e ansiedade), desordens

Diversas modalidades terapêuticas foram relatadas

oclusais, distúrbios neurológicos, como a síndrome de Rett,

para o tratamento do bruxismo, entretanto ainda não há

retardo mental, encefalopatia anóxica, paralisia cerebral, dis-

consenso sobre a melhor opção terapêutica.4,6 Com o pro-

tonia craniocervical, pós-lesão cerebral anóxica, pacientes

pósito de evitar o desgaste dentário, podem ser emprega-

comatosos, dano e hemorragia cerebelar, doença de Hun-

dos protetores bucais e placas miorrelaxantes (Figuras 3

tington, doença de Whipple, desordens do sono e a admi-

e 13), coroas de aço inoxidável, medicação espasmolítica

nistração de alguns fármacos, como os inibidores seletivos

e terapia de relaxamento. Contudo, essas intervenções

da recaptação da serotonina ou antidepressivos como a

apresentam, na maioria das vezes, resultados limitados,

venlafaxina podem estar relacionados ao aparecimento do

haja vista a incapacidade dos pacientes em cooperar em

bruxismo, que em alguns casos parece ter uma etiologia

consequência da severidade do bruxismo.1 Em casos em

multifatorial.1-6

que os sinais e sintomas do bruxismo e briquismo forem

Tem sido documentada a associação entre bruxismo e danos cerebrais orgânicos e estado de consciência alte-

significativos, a aplicação da toxina botulínica poderá ser considerada.6

rados. Em pacientes comatosos, o início do bruxismo é frequentemente observado no retorno do ciclo sono/vigília.

1,3-6

O bruxismo também ocorre pela falta de inibição

APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM BRUXISMO E BRIQUISMO

da atividade motora da mandíbula durante o despertar do estado de sono.6

A toxina botulínica atua no músculo, no bloqueio da trans-

O diagnóstico é clínico, baseando-se em relatos de

missão do nervo à placa motora, variando de 2 a 6 meses de

ranger, caracterizando o bruxismo, ou apertar os dentes,

acordo com o volume da dose, até a regeneração neurológica

referente ao briquismo, associados aos sinais clínicos de

no músculo.4,6 A aplicação da toxina botulínica apresenta efei-

desgaste dentário anormal.3 O desgaste dentário apre-

to positivo na redução da contração muscular e subsequen-

senta-se geralmente mais severo nos dentes anteriores

temente na força oclusal, preservando os dentes e próteses.7

(Figuras 1, 2 e 12). Nos pacientes edêntulos reabilitados

Entretanto, a utilização da placa miorrelaxante é aconselhada

pela prótese total, o maior desgaste é observado na re-

para atenuar os possíveis efeitos deletérios do bruxismo e bri-

90


quismo, tais como a proteção aos dentes presentes e próteses

culos masseter e temporal.5,7-9 Cada ponto de aplicação pode

já instaladas.6

receber de 5 a 15 unidades, iniciando-se pela quantidade me-

As injeções devem ser bilaterais e realizadas nos princi-

nor, sendo ajustada de acordo com os resultados obtidos.9,10

pais músculos responsáveis pela mastigação, particularmente

Podem ser utilizadas seringas para insulina com até 100

haja vista serem os principais mús-

unidades e agulhas de 12,7 mm de comprimento e 0,33 mm

culos envolvidos nos movimentos de rangimento e apertamen-

de calibre (29G). As injeções bilaterais são realizadas em linha

to no bruxismo e briquismo respectivamente. Alguns autores

paralela 1 cm acima da borda inferior da mandíbula, introduzin-

preconizam uma única injeção de toxina botulínica no múscu-

do a agulha perpendicularmente ao músculo (Figuras 6 e 10).

lo masseter como suficiente para inibir a contração muscular

Para o conforto do paciente, bolsa de gelo pode ser aplicada

causada pela disseminação da toxina, além da facilidade de

no local da injeção durante 5 minutos.9 As orientações pós-

aplicação.4,9,10

-aplicação são as mesmas reportadas no Capítulo 6, Protocolo

o masseter e o temporal,

5,8

9

Diversos protocolos de aplicação foram sugeridos pela

de aplicação e orientações pós-aplicação.

literatura. A priori o músculo a receber a aplicação deve ser

O início da ação da toxina botulínica ocorre entre 2 e 5

identificado clinicamente (Figuras 4 a 6 e 11), de acordo com

dias, e a duração do efeito perdura de 4 a 6 meses.4,5,9 É re-

a queixa do paciente, e a posteriori pela palpação (Figura 7). O

portado ainda pela literatura que em alguns casos é requerida

músculo masseter deve ser localizado por cuidadosa palpação

mais de uma aplicação da toxina.9,10 A injeção da toxina botulínica pode gerar algumas compli-

no local de sua inserção (ângulo e corpo da mandíbula).4,9,10 Após a reconstituição da toxina, a pele deve estar limpa e desinfectada com álcool.9 Deve ser considerada a região de segurança à aplicação da toxina, determinada por trapézio limitado por uma linha imaginária superior entre lobo da orelha e a comissura labial; a borda inferior corresponde à margem inferior da mandíbula; a margem anterior pode ser sentida na palpação quando o músculo é contraído (solicitando-se ao paciente o apertamento); e a borda posterior corresponde à margem posterior do ramo da mandíbula (Figura 8). São realizadas três aplicações projetando-se um triângulo com a base inferior paralela à base da mandíbula, com distância de 15 mm entre cada vértice.7 Deve ser utilizado anestésico tópico dermatológico (Emla® Creme, As-

A

tra-Zeneca do Brasil, Cotia, São Paulo, Brasil), anteriormente à aplicação, e deve ser mantido no local por 10 a 15 minutos (Figura 9). Lee et al.3 ainda sugerem, complementarmente, outros dois pontos 5 mm anterior e posteriormente ao ponto superior do triângulo. De acordo com a queixa do paciente, pode ser necessária a aplicação bilateral no músculo temporal (Figuras 14 e 15). Preconiza-se que o paciente deve ser colocado em decúbito dorsal.4,9,10 Entretanto, sugerimos que esteja sentado, para a melhor definição dos pontos (formação do triângulo). A dose preconizada é variada, pois depende do tamanho e da intensidade da contração do músculo.4 Usualmente a quantidade varia de 25 a 100 unidades, abrangendo os mús-

B Figura 1: Aspectos clínicos do paciente portador de bruxismo. Observe o desgaste avançado dos dentes. A: Vista frontal. B: Vista lingual.

91


capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron Thiago Branco Mendes

10


Aplicações da toxina botulínica do tipo A em disfunções temporomandibulares


INTRODUÇÃO As disfunções temporomandibulares (DTM) são subgru-

A APLICAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A NO

pos de lesões musculoesqueléticas e reumatológicas, e são

DESLOCAMENTO DO DISCO ARTICULAR E LUXAÇÃO

consideradas as principais causas de dor na região orofa-

DA ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR

cial. A causa mais comum de DTM é o deslocamento anterior ou medial do disco articular, também conhecido como

O deslocamento do disco articular é um dos principais

desarranjo interno da articulação temporomandibular (ATM).

achados das DTM, bem como a causa mais frequente para os

O deslocamento do disco articular pode resultar em diminui-

ruídos temporomandibulares, embora nem sempre exista tal

ção do espaço articular, ruídos (“click”, “estalo” ou crepita-

associação, haja vista o fato de a ATM ter grande capacidade

ção) durante a função mandibular, artrite, reabsorção condi-

de adaptação. Fatores como idade, doenças sistêmicas, le-

lar, deformidades da mandíbula, maloclusão e compressão

sões anteriores e carga excessiva podem perturbar o equilíbrio

do tecido bilaminar, que podem causar vários graus de dor e

entre respostas catabólicas e anabólicas do tecido articular,

disfunção. Deslocamento crônico do disco pode causar de-

produzindo hesitação do disco e alongamento dos anexos, o

formação do disco, perda de flexibilidade e composição da

que constitui um possível fator de risco para o deslocamento

fibrocartilagem que recobre a cabeça da mandíbula (côndilo)

do disco articular.3

e a fossa articular. Geralmente o disco ou o tecido bilaminar

Luxação da ATM é definida pelo movimento de avanço

posterior pode perfurar, podendo originar aderências intra-

excessivo da cabeça da mandíbula além da eminência articular

capsulares, o que conduz ao agravamento progressivo da

com a separação completa da superfície articular e sua fixa-

função mandibular.

ção da posição original.4,5 Pode ser redutível, quando regressa

1,2

As DTM podem apresentar sinais e sintomas clínicos

espontaneamente à cavidade articular (glenoide), ou irredutí-

como ruídos da ATM, sintomatologia dolorosa na ATM, face,

vel, quando uma ou duas cabeças da mandíbula permanecem

pescoço, ombro e nas costas, bem como cefaleias, limita-

deslocadas. Nessa posição, a boca permanece aberta pela

ção dos movimentos mandibulares, alterações na oclusão,

ação dos músculos elevadores com ou sem desvio lateral, de-

dificuldades na mastigação, otalgias, zumbido e vertigem.

pendendo se o deslocamento apresenta-se uni ou bilateral.4

Os pacientes portadores de DTM e dores orofaciais crônicas

Usualmente a luxação é classificada como aguda, recorrente

apresentam má qualidade do sono e risco aumentado no de-

ou habitual. A luxação aguda é comum e pode ser pós-traumá-

senvolvimento de transtornos psiquiátricos, particularmente

tica, espontânea ou associada a doença psiquiátrica. Quando

afetivos, como a depressão, o que interfere negativamente

a luxação se torna mais frequente e progressivamente pior é

no relacionamento social. Entretanto, alguns pacientes po-

classificada como habitual ou recorrente, sendo condição mais

dem apresentar deslocamento assintomático.

rara.5

1,2

O tratamento deve ser considerado multiprofissional,

Deslocamento da mandíbula é incomum, mas angustian-

incluindo acompanhamento fisioterapêutico e psicológico

te. Os pacientes que sofrem luxação neurogênica da ATM

(particularmente nos casos de dor crônica), embora geral-

apresentam dores locais e severas dificuldades alimentares,

mente incida sobre a oclusão, com a utilização de placas

associados à inconveniência de repetidas visitas aos centros

miorrelaxantes.

de emergência, o que causa ansiedade tanto nos pacientes

1,2

6

A toxina botulínica tem sido aplicada no músculo pteri-

quanto em seus familiares. Nesses casos a luxação da ATM

goideo lateral com o propósito de controlar o deslocamento

ocorre pela perda de coordenação dos músculos da mandíbu-

do disco articular, bem como tem sido usada em desloca-

la e hipertonia dos músculos que abaixam a mandíbula.4

mentos recorrentes da ATM, capacidade reduzida de aber-

A luxação recorrente da ATM apresenta como fatores etio-

tura de boca, hiperatividade mastigatória, dor nos músculos

lógicos a fraqueza muscular, por movimentos involuntários,

da mastigação e da ATM.

pela abertura máxima da boca durante o bocejo, trauma, e em

1-10

decorrência de tratamentos odontológicos e otorrinolaringológicos. Pode ainda ocorrer como complicação da anestesia ge-

98


ral ou como evento adverso de alguns fármacos administrados

em outros grupos musculares, como os músculos masseter,

no tratamento psiquiátrico ou quimioterápico; ou ainda obser-

temporal e digástrico.1,4,8

vado em distúrbios do metabolismo do colágeno, tais como

Ziegler et al.7 apresentaram os resultados da aplicação da

a hipermobilidade ligamentar e a síndrome de Ehler-Danlos,

toxina botulínica do tipo A em 21 pacientes com luxação recor-

doenças neurológicas, com deterioração cognitiva e motora,

rente da ATM. Quatro pacientes foram tratados com sucesso

como a esclerose múltipla, doença de Parkinson e Alzheimer,

pela fisioterapia e utilização de placas oclusais miorrelaxantes.

doença de Steinert, síndrome de Hallervorden-Spatz, síndro-

Os 17 pacientes restantes apresentaram insucesso, pois eram

me de Cri-Du-Chat, paralisia cerebral pós-traumática e após

portadores de doenças neurológicas, e a adesão ao tratamen-

AVC.

to não foi total. As aplicações foram realizadas a cada 3 meses,

4-7

Diversos tratamentos são indicados para a luxação de

com o propósito de manter o efeito prolongado. Foram feitas

ATM. O reposicionamento manual é o tratamento primário,

aplicações de 50 a 100 unidades nos músculos pterigoideos

mas, se recorrente, requer medidas preventivas. A sedação e

laterais bilateralmente, guiados pela eletromiografia. Durante

a anestesia geral foram indicadas para alcançar o relaxamento

o período de estudo, que variou de 6 meses a 3 anos, ape-

do músculo desejado para o reposicionamento manual. Imobi-

nas 2 dos 21 pacientes sofreram o deslocamento. Inicialmente

lização da mandíbula por fixação maxilomandibular e fisiotera-

os pacientes necessitaram de aplicações repetidas. Contudo,

pia ativa têm sido utilizadas sozinhas ou com outros tratamen-

após quatro aplicações, eles permaneceram livres de sintomas

tos, mas não conseguiram alcançar resultados satisfatórios e

por mais de meio ano após a cessação das aplicações. Esse

permanentes. A injeção de agentes esclerosantes ou sangue

fato sugeriu que os músculos pterigoideos laterais podem não

autólogo no interior da cavidade da ATM tem sido usada,

recuperar seu grau de hiperatividade original, supondo a invo-

com baixa taxa de sucesso, com o propósito terapêutico de

lução por hipotrofia muscular. Foi relato geral dos pacientes e

causar fibrose e limitar o movimento da mandíbula. Procedi-

familiares a melhora na qualidade de vida a partir da supressão

mento cirúrgico também foi descrito. Diversas técnicas foram

dos sintomas iniciais.

reportadas, como artroscopia, cirurgia de eminectomia (téc-

Aquilina et al.8 reportaram um caso de um paciente que

nica Myrhaug) ou técnicas de interposição (redirecionamento

apresentou paralisia facial do lado direito com inclinação e he-

da inserção do músculo temporal; emprego de enxerto alo-

miparesia faciais e disfagia expressiva, associadas à sintoma-

plástico ou de tecido ósseo; fratura e deslocamento do arco

tologia dolorosa na ATM direita, após internação por evento

zigomático). Entretanto, os pacientes que sofrem episódios

cerebrovascular. O paciente apresentou-se edêntulo maxilar e

recorrentes de luxação da ATM, causados pelo excesso de

com dor à palpação nos músculos masseter, temporal e pte-

contração muscular e espasticidade nos músculos, deprimem

rigoideo laterais (bilateralmente). A radiografia da ATM confir-

a mandíbula. Eles estão frequentemente associados a graves

mou o diagnóstico de luxação bilateral. Sob anestesia geral, a

distúrbios do sistema nervoso central, contraindicando, assim,

mandíbula foi deslocada, e fixação intermaxilar com parafusos

Nessa perspectiva, opções te-

e elásticos ortodônticos foi realizada. No terceiro dia pós-cirúr-

rapêuticas mais conservadoras, como a aplicação da toxina

gico, sob controle eletromiográfico, foi realizada a aplicação bi-

botulínica do tipo A, apresentam melhores resultados e são a

lateral da toxina botulínica do tipo A nos músculos pterigoideo

primeira escolha.

lateral e feixes anteriores do músculo temporal, com o propósi-

cirurgia sob anestesia geral.

2-7

3-8

O músculo pterigoideo lateral atua em movimentos hori-

to de reduzir a atividade muscular. Bilateralmente, os músculos

zontais do côndilo e gera força contralateral e em protrusão.

pterigoideos laterais receberam por via intrabucal 30 unidades,

As principais funções desse músculo são produzir movimentos

e por meio do entalhe sigmoide e acesso extrabucal mais 30

laterais por ação muscular unilateral, movimentar o disco e o

unidades. Os feixes anteriores do músculo temporal receberam

côndilo para frente por ação muscular bilateral, e estabilizar o

bilateralmente outras 20 unidades, totalizando 80 unidades

disco. Diversas pesquisas têm preconizado a aplicação bila-

em cada lado. Na avaliação pós-aplicação foram observadas

e

maior amplitude dos movimentos mandibulares e ausência da

3

teral da toxina botulínica no músculo pterigoideo lateral

3-6,8

99


11

capĂ­tulo

Marina Rocha Gouveia Irineu Gregnanin Pedron


Aplicação da toxina botulínica do tipo A na hipertrofia massetérica


INTRODUÇÃO O padrão de beleza contemporâneo é definido por fa-

ção de exercícios para a reeducação muscular. A redução

ces magras e sutis, que usualmente destacam o osso zigo-

cirúrgica foi descrita pela primeira vez em 1947. Adicional-

mático, popularmente conhecido como “maçã do rosto”.

mente à exérese muscular, pode tornar-se necessária a re-

A população, particularmente a feminina, é ávida na busca

alização de osteotomias, para a regularização da estrutura

desse padrão, e diversos tipos de tratamentos almejam

óssea. Entretanto, em decorrência da intervenção cirúrgica

essas características. Entretanto, elas podem ser realça-

(miectomia ou osteotomia), vários riscos foram relatados,

das ou depreciadas de acordo com a etnia ou a cultura

como hemorragia, hematoma, infecção, formação de cica-

da sociedade. A face quadrada ou o terço inferior da face

trizes, trismo pós-cirúrgico, assimetria, fratura do côndilo e

com largura aumentada são características masculinas e

do ramo mandibular, e lesão dos nervos alveolar inferior e

grosseiras, sendo mais frequentemente observadas em

facial.1-3,5-9

pacientes asiáticos do sexo feminino, embora o atual pa-

A aplicação da toxina botulínica do tipo A tem sido

drão (caucasiano) determine formas triangulares como as

considerada como procedimento eficaz, confiável e me-

ideais.

nos invasivo em comparação com a intervenção cirúrgica.

1-3

A hipertrofia massetérica é caracterizada por alar-

A toxina atua bloqueando a liberação do neurotransmissor

gamento assintomático ou sintomático (desconforto e

(acetilcolina) e causa a paralisia muscular seletiva e transi-

dor leve, sensação de musculatura pesada e limitação

tória, e subsequentemente a hipotrofia muscular, promo-

na abertura de boca) uni (Figuras 3 e 10) ou bilateral e é

vendo o efeito estético de afinamento da face, pela redu-

usualmente causada por hábitos parafuncionais, particu-

ção da espessura do músculo masseter.1-7,9-11

larmente o briquismo (apertamento) e o bruxismo, sendo que apenas 20% dos pacientes portadores conhecem a

PROTOCOLO DE APLICAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNI-

situação causal. Entretanto, outras causas também foram

CA DO TIPO A NA HIPERTROFIA MASSETÉRICA

reportadas, como maloclusão, disfunções temporomandibulares (DTM) durante o sono, uso constante de goma de mascar e mastigação de alimentos mais resistentes.

1,2,4-6

A identificação do músculo, por meio do exame clínico visual e palpação, antecede a aplicação (Figuras 3 a 5).

A hipertrofia massetérica bilateral é mais comum. A unila-

A região da aplicação pode ser visualizada demarcan-

teral é mais frequentemente observada em pacientes que

do-se um trapézio: a borda superior transversa corresponde

apresentam mastigação ipsilateral. A hipertrofia torna-se

ao arco zigomático; a borda inferior corresponde à margem

também aparente pelo edema causado pela hiperfunção.

inferior da mandíbula; a margem anterior pode ser sentida na

Ao exame clínico (palpação) observa-se o alargamento fir-

palpação quando o músculo é contraído (solicitando-se ao

me e tenso, correspondente à configuração anatômica do

paciente o apertamento); e a borda posterior corresponde à

músculo masseter. O músculo masseter hipertrofiado, situ-

margem posterior do ramo da mandíbula (Figura 6). Adicio-

ado na região do ângulo da mandíbula, aumenta o formato

nalmente sugerimos a definição da linha imaginária entre lobo

retangular ou quadrado da face, definindo o diagnóstico.

da orelha e comissura labial. A região a ser aplicada é as-

Tomografia computadorizada, ressonância magnética ou

sim definida, sendo recomendada a aplicação na região com

ultrassom são elucidativos quando o exame clínico não

maior espessura da hipertrofia massetérica.1,2,5 Três pontos

determina o diagnóstico final.2,4-7 A hipertrofia massetérica

de aplicação são determinados, formando um triângulo com

está geralmente associada ao desgaste dentário (Figura 1)

base inferior (Figura 7). Esse protocolo de aplicação é o mes-

decorrente do atrito causado pelo briquismo (apertamento

mo apresentado no Capítulo 9, Aplicação de toxina botulínica

maxilomandibular) ou DTM.

do tipo A em hábitos parafuncionais – bruxismo e briquismo.

2,4

Diversas opções terapêuticas têm sido reportadas,

Wu1 preconiza a injeção da toxina em 6 a 10 pontos nes-

como a administração de fármacos relaxantes musculares,

sa região com o propósito de impedir a difusão indesejada

o emprego de placas miorrelaxantes (Figura 2) e a aplica-

abaixo do processo coronoide até os músculos pterigoide-

106


os e de evitar o excesso do esvaziamento do terço superior

pois o espalhamento pode alcançar locais indesejados, com

do músculo masseter, causando grandes assimetrias faciais.

possíveis eventos adversos ou complicações.

Entretanto, nossa conduta é mais conservadora, não sendo

Adicionalmente, Wu1 sugere a aplicação suplementar na

recomendados mais do que três pontos de aplicação nessa

glândula parótida e no músculo platisma, que podem favore-

limitada região.

cer a estética em alguns pacientes que apresentam suposto

Após a demarcação dos pontos é recomendada a apli-

edema na região pré-auricular, não somente causada pela

cação do anestésico tópico dermatológico (Figura 7). A po-

hipertrofia massetérica, com aspecto clínico de “pescoço de

sologia para o manejo da hipertrofia massetérica varia de 25

touro” ou “gargalo”. Tem sido recomendada a aplicação men-

a 70 unidades de toxina botulínica do tipo A por lado.

1,4,6,9

sal de 40 unidades no interior do parênquima glandular em

Entretanto, deve-se considerar que o lado acometido pela

3 ou 4 sessões, até que o edema glandular se torne menos

hipertrofia massetérica deve receber o dobro da quantidade

aparente. O autor não reportou casos de xerostomia ou re-

do lado não acometido (quando da hipertrofia massetérica

dução da produção de saliva como eventos adversos. Essa

unilateral). Portanto, em nosso protocolo de aplicação, su-

aplicação, segundo ele, permite aspecto mais rejuvenescedor

gerimos de 5 a 6 unidades em cada ponto de aplicação no

à região cervical, com efeito elevado do pescoço por méto-

lado não afetado e de 10 a 15 unidades no lado hipertrofia-

do não cirúrgico, sendo bastante apreciado por pacientes do

do. Enaltecemos ainda que ambos os lados devem receber

sexo feminino. Entretanto, a xerostomia foi citada como pos-

as aplicações de toxina botulínica. É recomendada ainda a

sível evento adverso. Kwon et al.8 citam a possível difusão

dose inicial de 40 unidades por músculo masseter, reapli-

às glândulas parótidas por meio da distribuição vascular local

cadas na mesma dose após 1 mês, até a percepção de

pelo fluxo sanguíneo ou pelo transporte axonal retrógrado.

paralisia muscular total e ausência de briquismo, podendo

Essas aplicações complementares não são admitidas em

alcançar a dose de 60 unidades, dependendo da dimen-

nosso protocolo, haja vista que realmente podem existir efei-

Contudo, Wu ressalta a possibilidade

tos residuais em glândulas parótidas, tais como a redução

da difusão da toxina botulínica em volumes superiores a 1,5

do fluxo salivar e a xerostomia. Mesmo quando da indicação

mL (acima de 60 unidades) na região adjacente, causando o

em casos de sialorreia (Capítulo 16, Aplicação de toxina bo-

enfraquecimento dos músculos risório e elevador do ângulo

tulínica do tipo A em sialorreia), devemos ponderar sobre a

da boca, o que provoca assimetrias durante a excursão do

aplicação da toxina botulínica em vista de possíveis eventos

sorriso. Não sugerimos a reaplicação em 1 mês, haja vista a

adversos decorrentes da redução do fluxo salivar, tais como

possibilidade da ocorrência de eventos adversos. Recomen-

mucosite, candidose e aumento da incidência de cáries e do-

damos aplicação única, com no máximo 60 unidades por

enças periodontais.

são do músculo.

1,10

1

músculo masseter, divididas em três pontos de aplicação

Wu1 reporta melhora da estética facial alcançada pela

(cada ponto pode receber de 5 a 20 unidades, de acordo

aplicação da toxina botulínica em comparação com a osteo-

com a hipertrofia ou sintomatologia). A reaplicação depende

tomia do ângulo mandibular, promovendo ainda a redução da

da sintomatologia (pelo briquismo), ou no mínimo a cada 6

largura bizigomática. O autor denomina a técnica como es-

meses. Kim et al. preconizam a aplicação de 100 a 140

cultura e emagrecimento faciais. Entretanto, cuidados devem

unidades de toxina botulínica. Tal posologia se deve ao fato

ser tomados com o propósito de evitar o aspecto caquético,

da reconstituição em maior quantidade de soro fisiológico, o

pelo emagrecimento e afinamento exagerado da região.

2

que também não é recomendado por nós, haja vista que os

A aplicação da toxina botulínica é uma opção terapêutica

músculos da face, na área de atuação do cirurgião-dentista,

efetiva e mais conservadora em comparação à intervenção

são músculos de dimensões reduzidas.

cirúrgica (miectomia ou osteotomia), embora o resultado seja

A massagem regular pós-aplicação em até 48 horas

transitório. Contudo, Chang et al.3 consideram que a aplica-

para o espalhamento uniforme em toda a massa muscular é

ção da toxina botulínica pode ser um procedimento comple-

recomendada.

5,7,10

Entretanto, não sugerimos essa prática,

mentar ao procedimento cirúrgico.

107


capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron

12


Aplicações coadjuvantes da toxina botulínica do tipo A em cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial


INTRODUÇÃO A toxina botulínica do tipo A vem sendo amplamente

apresentam a capacidade de engolir a saliva pela esteno-

utilizada de modo coadjuvante na atuação da cirurgia buco-

se do esfíncter superior do esôfago, causada pela possível

maxilofacial, indicada em pacientes oncológicos (particular-

formação de cicatrizes após a ressecção do tumor. Outros

mente os de cabeça e pescoço) no tratamento de afecções

pacientes apresentam reduzido controle sensorial da entrada

ou complicações decorrentes de outras modalidades tera-

da laringe; consequentemente, pode ocorrer a passagem da

pêuticas (cirurgias ressectivas); em pacientes que apresen-

saliva da laringe à traqueia e aos brônquios, causando aspira-

tam trismo ou dificuldade na abertura de boca e que neces-

ção permanente e pneumonia por aspiração. Adicionalmente,

sitam de procedimentos cirúrgicos; ou ainda como auxiliar

a permanência prolongada da saliva pode apresentar efeito

no processo de reparação de feridas cutâneas ou em muco-

deletério sobre feridas cirúrgicas, de forma a dificultar o pro-

sas do sistema estomatognático.

cesso de reparação e cicatrização, causando, por exemplo,

1-3

fístulas após laringectomia. O procedimento de aplicação da APLICAÇÕES DA TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM

toxina botulínica pode ser guiado pela ultrassonografia das

PACIENTES ONCOLÓGICOS DE CABEÇA E PESCOÇO

glândulas parótida e submandibular. Foram preconizadas 22 unidades distribuídas em três pontos em cada glândula paró-

Os tipos de câncer que acometem a cabeça e o pescoço apresentam elevada mortalidade. Particularmente o câncer

tida e 15 unidades em um ou dois pontos em cada glândula submandibular, com poucos eventos adversos.6

bucal apresenta diversas condições ou comorbidades que

A aplicação de toxina botulínica do tipo A foi indicada em

afetam a sobrevida. Infelizmente mais de 50% dos casos de

casos de fístula no ducto parotídeo após a ressecção de car-

câncer bucal são diagnosticados tardiamente e em estágios

cinoma basocelular ou espinocelular em pele na região sobre

avançados da doença, o que compromete a qualidade de

a glândula parótida.7,8 Hill et al.7 preconizam a aplicação de

vida e a sobrevivência dos pacientes.4,5 A toxina botulínica do

225 unidades (reconstituídas em 5 ml de solução salina) nos

tipo A tem proporcionado importantes conquistas à comple-

lobos superficiais e profundos da glândula parótida, alcançan-

mentação da saúde geral e à qualidade de vida dos pacientes

do a redução do fluxo salivar que drenava pelo acesso cutâ-

oncológicos.

neo e ferida cirúrgica após a ressecção da lesão. A aplicação

6-8

Diversos empregos vêm sendo destacados na aplicação

de toxina botulínica foi considerada como opção terapêutica

da toxina botulínica do tipo A em pacientes oncológicos de

satisfatória, haja vista que a correção cirúrgica da fístula no

cabeça e pescoço, indicada na paralisia muscular adjacen-

ducto parotídeo apresenta risco significativo de lesão no ner-

te aos procedimentos cirúrgicos ressectivos (como pode ser

vo facial e que a resolução espontânea de fístulas parotídeas

observado na Figura 1 do Caso 1), distúrbios de movimentos

agudas tem pequena probabilidade e pobre prognóstico. A

oriundos do nervo facial (paralisia facial e sinquinesia), hipera-

dose elevada preconizada pelos autores foi justificada pela

tividade do músculo cricofaríngeo, sialorreia, hiperlacrimação

tentativa de supressão total dos sintomas da secreção salivar,

e sudorese decorrente da condição patológica.

evitando-se visitas repetitivas ao paciente idoso.7 Krishnan et

4-6

Em alguns casos, os pacientes não são capazes de de-

al.8 reportaram a supressão da salivação pela aplicação de

senvolver um nível adequado de fonação para a comunica-

23 unidades de toxina botulínica após o diagnóstico tardio de

ção ideal, causada pela ocorrência de espasmos do múscu-

fístula do ducto parotídeo causada pela ressecção de carci-

lo cricofaríngeo. A aplicação da toxina botulínica do tipo A

noma espinocelular na face sobre a glândula parótida.

pode reduzir a atividade muscular e melhorar a qualidade da

Sudorese gustatória tem sido observada como seque-

fonação. Laskawi e Ellies preconizam 20 unidades em três

la comum após ressecção de tumores ou da própria glân-

pontos de aplicação, o que pode ser utilizado como teste an-

dula parótida. Laskawi e Ellies6 preconizam a marcação da

tes do planejamento da miectomia ou como simples opção

área de transpiração pelo teste de Minor, dividindo a área de

terapêutica, devendo ser repetido.

transpiração em sítios menores e demarcando-a com cane-

6

6

Alguns pacientes oncológicos de cabeça e pescoço não

114

ta à prova d’água. As aplicações devem ser subcutâneas. O


efeito das aplicações demonstrou ser mais duradouro que as

sendo pior do lado direito, provocando disfagia e dificulda-

aplicações em músculos.

des na higiene bucal. Com a melhora cognitiva do paciente,

6

Hiperlacrimação pode ser originada por tumores da ma-

e após a realização de diversos procedimentos na tentativa

xila, causado pela estenose do canal lacrimal por fibras secre-

frustrada de melhorar a mastigação, optou-se pela aplicação

tórias mal direcionadas após paresia degenerativa do nervo

de toxina botulínica do tipo A. Foram realizadas três aplica-

facial (“lágrimas de crocodilo”) ou após irritação mecânica da

ções em tempos distintos até a evolução do caso. Inicial-

córnea (em pacientes com lagoftalmo). A aplicação da toxina

mente foram aplicadas somente nos músculos masseteres,

botulínica foi indicada na redução da produção de lacrimação

sendo 25 unidades do lado direito e 15 do lado esquerdo. A

patológica nesses pacientes. Laskawi e Ellies preconizam a

segunda aplicação foi realizada 4 meses após a primeira, nos

aplicação de 5 a 7 unidades de toxina nas glândulas lacrimais.

músculos masseteres e temporais (bilaterais e percutâneas,

6

6

sendo 35 unidades do lado direito e 25 do lado esquerdo), e APLICAÇÕES DA TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM

nos músculos pterigoideos medial e lateral do lado direito (15

TRISMO

unidades, em aplicações intrabucais), haja vista a maior dificuldade na abertura de boca deste lado. A terceira aplicação

Trismo é um sintoma encontrado no acometimento de diversas doenças ou condições sistêmicas, como o tétano,

ocorreu 13 meses após a segunda aplicação, com 50 unida-

9,10

des nos músculos masseter e temporal (bilaterais) e 25 unida-

Pode causar a

des nos músculos pterigoideos medial e lateral (bilaterais). A

mordedura involuntária da língua, dificultando a deglutição, a

aplicação da toxina botulínica do tipo A resultou em melhora

fonação e a higiene bucal.

do trismo, com abertura de boca de 25 mm.

acidente vascular cerebral

11

e radioterapia.

12

A aplicação da toxina botulínica do tipo A foi preconi-

Dor e trismo foram reportados como consequências da

zada no controle do trismo em pacientes acometidos pelo

radioterapia em pacientes oncológicos de cabeça e pescoço,

tétano, com resultados satisfatórios. Herrman et al. descre-

podendo ainda existir cólica e espasmos musculares, disto-

veram melhora do trismo após aplicações bilaterais de toxina

nia mandibular, ainda que mais raros. Hartl et al.12 realizaram

botulínica nos músculos masseter e temporal em mulher de

um estudo prospectivo em 19 pacientes que apresentaram

82 anos que apresentou paresia do nervo facial, dor e alodí-

redução no movimento mandibular, trismo, dor na região dos

nia na região oftálmica do lado direito, protrusão e espasmos

músculos masseteres e contrações involuntárias (cólicas e

linguais, com abertura de boca de 3 mm, causando disfagia

espasmos musculares), decorrentes da radioterapia, radiote-

e dispneia, com diagnóstico de tétano cefálico. Foram aplica-

rapia associada a quimioterapia ou radioterapia bifracionada

das 25 unidades em cada músculo masseter e 10 unidades

(excluindo procedimentos cirúrgicos). Foram realizadas duas

em cada músculo temporal. Decorridos 5 dias, a abertura de

aplicações (bilaterais) no músculo masseter, identificado pela

boca foi mensurada em 15 mm, e após 3 semanas foi de 35

palpação. Não foi preconizada ultrassonografia. Foram apli-

mm. Os autores concluíram que a toxina botulínica é excelen-

cadas 50 ou 250 unidades por músculo, de acordo com a

te opção terapêutica, reduzindo a necessidade da administra-

marca comercial (Botox® ou Dysport® respectivamente). Não

ção de fármacos relaxantes musculares de ação central, que,

foram observadas melhorias estatisticamente significantes na

por sua vez, podem causar distúrbios psiquiátricos, particu-

redução do trismo, embora tenham sido reduzidos os níveis

larmente do paciente idoso.

de sintomatologia dolorosa, cãibras e espasmos musculares

9

Spillane et al. reportaram um caso de criança saudável 11

(distonia oromandibular).

de 9 anos de idade que apresentou trismo em decorrência de hemorragia da fossa posterior direita idiopática, diagnostica-

APLICAÇÕES DA TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A NA

do como acidente vascular cerebral hemorrágico (AVC), com

REPARAÇÃO DE CICATRIZES E FERIDAS CIRÚRGICAS

quadriparesia espástica, ataxia, disartria e disfagia. A dificuldade na abertura de boca foi mensurada de 4 mm a 7 mm,

Usualmente na prática clínica as medidas empregadas para

115


13

capĂ­tulo

Marina Edwirges Rocha Gouveia Irineu Gregnanin Pedron


Aplicações da toxina botulínica do tipo A em implantodontia


INTRODUÇÃO É notória a importância do restabelecimento da função

A aplicação profilática (bilateral) da toxina botulínica,

e estética estomatológicas por meio da instalação de im-

prévia à instalação cirúrgica dos implantes ósseo-integra-

plantes ósseo-integrados e a subsequente reabilitação pro-

dos, promove a redução das forças mastigatórias geradas

tético-implantodôntica na clínica odontológica. Entretanto,

pelos músculos masseter e temporal, o que pode anular

cuidados devem ser tomados mesmo após a reabilitação

possível fator de risco às perdas e/ou fraturas dos implan-

protética do paciente. A perda do implante – ainda que ós-

tes e próteses, ou ainda dificultar o processo de ósseo-in-

seo-integrado – e/ou da prótese pode apresentar diversas

tegração na interface osso-implante.2 Ihde1 sugere que a

causas, entre elas sobrecarga excessiva sobre a reabilita-

aplicação de toxina botulínica pode apresentar efeito po-

ção, maloclusão prévia à instalação de implantes (extrusão

sitivo no processo de equilíbrio e restabelecimento da in-

ou migração dos dentes da arcada dentária antagonista),

terface osso-implante quando houver perda óssea gerada

inclinações do plano oclusal, relação maxilomandibular em

pela incidência de carga mastigatória excessiva sobre os

função e preexistência de disfunções temporomandibula-

implantes ósseo-integrados.

res ou hábitos parafuncionais, como o bruxismo ou briquisPROTOCOLO DE APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNI-

mo.1 O processo de ósseo-integração é complexo e de-

CA DO TIPO A EM PACIENTES IMPLANTADOS

pende de diversos fatores intrínsecos (relacionados ao paciente) e extrínsecos (relacionados aos implantes). Grande

As doses recomendadas para aplicações em pacientes

parte se deve às doenças peri-implantares e da sobre-

submetidos à terapia reabilitadora com implantes ósseo-in-

carga oclusal (Figura 1). A inexistência da propriocepção,

tegrados devem seguir os mesmos parâmetros em casos

pela ausência de ligamento periodontal, favorece a baixa

de hábitos parafuncionais, como o bruxismo e o briquismo.

resistência do implante em pacientes submetidos a essa

Inicia-se com doses menores (5 unidades por ponto) e evo-

terapêutica, particularmente à carga imediata. O processo

lui para doses maiores (10 unidades por ponto). A literatura

de ósseo-integração deve ser respeitado, haja vista que

não é objetiva, e os protocolos são especulativos. É acon-

as cargas mastigatórias podem influenciar a adaptação

selhado o registro adequado para acompanhar o histórico

da interface osso-implante e diminuir a densidade do osso

do paciente.5

trabecular (compactação).2 A instalação de implantes em

A aplicação deve ser realizada bilateralmente nos mús-

áreas de tensão mastigatória é desfavorável para o proces-

culos masseteres. Quando necessário, a aplicação pode

so de ósseo-integração. Nessa perspectiva, a redução das

ser feita nos músculos temporais. Geralmente, quando da

forças mastigatórias é uma opção terapêutica viável já na

aplicação única e exclusivamente nos músculos masseteres

fase inicial do processo de ósseo-integração, após a fase

(bilateral), podem ser observados aumentos dos contatos

de instalação dos implantes em carga imediata.

dentários anteriores, causados por ligeira luxação anterior

1-3

No entanto, mesmo em condições normais, as forças mastigatórias regulares e simétricas podem exceder o limi-

da mandíbula. Essas alterações podem ser compensadas por pequenos ajustes das superfícies oclusais.1

te de carga mastigatória sobre o implante. Também nessa

O protocolo de aplicação, com sugestão de doses e

situação pode se tornar útil a redução da força dos mús-

recomendação de pontos de aplicações, é o mesmo pre-

culos mastigatórios. A aplicação da toxina botulínica nos

conizado no Capítulo 9, Aplicação de toxina botulínica do

músculos mastigatórios (masseter e temporal) pode anga-

tipo A em pacientes portadores de hábitos parafuncionais

riar a redução da força mastigatória, prevenindo fraturas e

– bruxismo e briquismo. A repetição das aplicações é preco-

perdas de implantes ósseo-integrados e próteses implan-

nizada a cada 4 a 8 meses, dependendo da sintomatologia

tossuportadas nas reabilitações bucais.

1-4

A toxina botulíni-

ca bloqueia a liberação de acetilcolina, causando paralisia muscular e reduzindo as forças de contração muscular.1-3

122

ou da necessidade de cada paciente.


APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM

instalação de implantes ósseo-integrados. Entretanto, Ihde2

PACIENTES IMPLANTADOS COM HÁBITOS PARA-

reportou a aplicação de toxina botulínica profilática previa-

FUNCIONAIS

mente à cirurgia de instalação de implantes ósseo-integrados em paciente portador de hábito parafuncional. Após 4

Pela alta prevalência dos hábitos parafuncionais, torna-

semanas não foi observada contração muscular excessiva,

-se necessária a devida avaliação desses possíveis fatores

sendo observada estabilidade e ósseo-integração dos im-

de risco ao insucesso dos implantes e/ou próteses implan-

plantes instalados. Adicionalmente, o paciente reportou re-

tossuportadas, para que cada caso seja particularizado, evi-

laxamento dos músculos masseteres, particularmente pela

tando-se perdas do sistema estomatognático e alcançando-

manhã, haja vista o período de maior queixa e desconforto

-se a previsibilidade e o sucesso longitudinal do tratamento

pelo paciente. A força muscular foi gradualmente norma-

com implantes ósseo-integrados. O bruxismo vem sendo

lizada após 3 meses, embora não apresentando a rigidez

implicado como o hábito parafuncional mais relacionado às

muscular prévia.

falhas em tratamento com implantes ósseo-integrados, sen-

Ihde2 ainda preconizou a melhora particular em pacien-

do considerada uma contraindicação relativa, desde que se-

tes com relação esquelética Classe II de Angle, haja vista

jam realizados tratamentos integrados para sua contenção.

que esses pacientes apresentam maior desconforto pela

A aplicação da toxina botulínica deve ser feita em con-

necessidade de movimentos de protrusão da articulação

junto com outras modalidades de tratamento para o bruxis-

temporomandibular e adicionalmente à reabilitação enquan-

mo e particularizada caso a caso. Pode ser utilizado ajuste

to persistir a relação.

oclusal, restauração das superfícies dentárias com coloca-

Ihde e Konstantinovic,6 em revisão sistemática, consta-

ção de coroas e próteses, ortodontia e dispositivos intrabu-

taram que houve maior prevalência de reações adversas em

cais (placas miorrelaxantes).

pacientes em que foram aplicadas doses terapêuticas mais

Hábitos parafuncionais deletérios como o bruxismo e o briquismo são considerados contraindicações relativas à

A

elevadas (acima de 100 unidades), como em disfunções temporomandibulares e distonias cervicais.

B

Figura 1: Associação entre doença peri-implantar e sobrecarga oclusal favorecendo a perda dos implantes ósseo-integrados. A: Aspecto clínico. B: Aspecto radiográfico.

123


14

capítulo

Maria Eugênia da Silva Cezere Rafael Guerra Cintra Irineu Gregnanin Pedron


Aplicações da toxina botulínica do tipo A em dor orofacial


INTRODUÇÃO O cirurgião-dentista apresenta importante função no

temporomandibular (ATM) e suas estruturas associadas. Tais

diagnóstico e no tratamento das dores orofaciais. A dor oro-

estruturas afetadas podem comprometer funções primordiais

facial é uma queixa muito frequente na clínica estomatológi-

e essenciais, como a deglutição, a fonação e a respiração.

Nessa perspectiva, é fundamental que o cirurgião-den-

Entre os principais sintomas reportados pelos pacientes afe-

tista reconheça o problema e encaminhe o paciente, quando

tados pelas DTM encontram-se a sintomatologia dolorosa

necessário, ao neurologista para o tratamento adequado.

nos músculos da mastigação, músculos faciais (occipito-

Em geral é indicado o tratamento multidisciplinar para o ma-

frontal, prócero, corrugadores e orbicular dos olhos), além

nejo do caso.

da possibilidade de ocorrência de disfonia, disfagia e otalgia.

ca.

1-4

O paciente que se submete à avaliação do cirurgião-

Pode ainda ocorrer a associação com cefaleia, dor miofascial

-dentista geralmente apresenta dor orofacial em decorrên-

na região cervical, dor periauricular, hipermobilidade mandi-

cia de disfunções temporomandibulares. Entretanto, outras

bular, redução da amplitude de movimentos mandibulares,

patologias estomatológicas (odontogênicas ou não) podem

trismos mandibulares e ruídos articulares durante a excursão

acometer a região orofacial, sendo necessária a intervenção

de movimentos mandibulares. A dor relacionada à ATM e

do cirurgião-dentista.

músculos associados é uma queixa muito frequente na clínica

Em vista do amplo diagnóstico diferencial, o propósi-

estomatológica.1-4

to deste capítulo é informar e orientar o cirurgião-dentista

Os fatores causais identificados para a DTM incluem ati-

para um correto diagnóstico e, quando possível e indicado,

vidade anormal (hiperatividade) dos músculos da mastigação,

iniciar o tratamento utilizando a toxina botulínica do tipo A.

trauma, fatores psicológicos ou doenças como a artrite reu-

A seguir apresentaremos uma breve revisão sobre algumas

matoide. O papel da oclusão como fator etiológico da DTM

patologias e condições neurológicas que podem manifestar

ainda não foi totalmente elucidado, embora apresente forte

dores orofaciais, bem como os resultados alcançados com

associação.1,6 É também mencionado que mudanças nos

a aplicação da toxina botulínica do tipo A.

proprioceptores e distúrbios nas vias motoras poderiam ser

A toxina botulínica do tipo A tornou-se uma opção terapêutica aceita para as condições dolorosas quando outros

fatores causais da hiperatividade dos músculos mastigatórios e da dor.7

tipos de tratamento apresentam insucesso e falhas. Estas

Embora os achados clínicos como ruídos articulares, sin-

outras técnicas de tratamento incluem alongamento, fisio-

tomatologia dolorosa em musculatura mastigatória e maloclu-

terapia e exercícios de fortalecimento, tratamento de calor e

são possam conduzir ao diagnóstico de DTM, componentes

frio, estimulação nervosa transcutânea, estimulação elétrica

psicológicos como depressão, ansiedade e somatização es-

muscular, ultrassom, iontoforese, liberação miofascial, mas-

tão sendo cada vez mais reconhecidos como fatores sinérgi-

sagem, hidroterapia, farmacoterapia e injeções em pontos-

cos em pacientes que buscam tratamento. Recentes linhas

-gatilho (trigger points). Ainda não são totalmente conheci-

de pesquisa têm enfatizado a base cognitiva e neurológica

dos os mecanismos de atuação da toxina botulínica do tipo

para processamento da dor e da interação entre os sistemas

A, embora seja presumida sua ação na redução da sintoma-

nervoso periférico e central.3

tologia em síndromes dolorosas.5

A dor crônica apresenta impacto negativo na qualidade de vida, o que interfere significativamente nas relações inter-

PROCESSOS ÁLGICOS RELACIONADOS ÀS DESOR-

pessoais e nos deveres profissionais, e aumenta o risco de

DENS TEMPOROMANDIBULARES

desenvolvimento de transtornos psiquiátricos, como a depressão.3

As dores orofaciais são geralmente causadas ou estão

O tratamento da dor orofacial crônica é paliativo e sin-

associadas às disfunções temporomandibulares (DTM), ter-

tomático, com base principalmente no alívio e na eliminação

mo utilizado para descrever um grupo de condições patoló-

dos sintomas. Entretanto, a hiperatividade dos músculos

gicas que afetam os músculos mastigatórios, a articulação

mastigatórios se manifesta por vários sintomas, sem neces-

130


sariamente envolver distúrbios funcionais ou dor, como a hi-

mento conservador. Segundo Freund e Schwartz,10 o tra-

pertrofia dos músculos masseter e temporal, hipermobilidade

tamento das DTM com relaxantes musculares, aparelhos

mandibular, hábitos parafuncionais (bruxismo e briquismo)

intrabucais ou infiltrações em pontos-gatilho nos músculos

com desgaste oclusal ou incisal nas superfícies dentárias,

mastigatórios têm sido utilizado como terapia eficaz para a

bem como os casos de distonia. Geralmente a dor miofascial

maioria dos pacientes, porém de curto prazo. Outras aborda-

resulta frequentemente em hiperatividade muscular e hiper-

gens podem também ser indicadas, incluindo o exercício e o

mobilidade mandibular. Usualmente os músculos elevadores

ajuste da dieta.1,3

da mandíbula (temporal, masseter, pterigóideo medial) e os

O tratamento farmacológico de primeira linha para as

7

DTM inclui medicamentos anti-inflamatórios e relaxantes

Em certos casos a DTM é de difícil diagnóstico clínico e

musculares. É recomendada ainda a realização coadjuvante

pode ser “confundida” com outras dores no segmento cefáli-

da terapia física como fisioterapia, acupuntura e massagem,

co, como cefaleia rinogênica, DTM secundária à fibromialgia,

entre outras.1,3

abaixadores da mandíbula (pterigóideo lateral) são afetados.

neuralgia do trigêmeo, cefaleias tensionais e enxaquecas.3

Modalidades mais invasivas, como intervenções cirúrgi-

Em 1992 foram introduzidos os Critérios Diagnósticos de

cas, seja artrocentese, injeção intra-articular de esteroides,

Pesquisa em Disfunção Temporomandibular (RDC/TMD, do

artroscopia ou artrotomia aberta,1,3 também foram reporta-

inglês Research Diagnostic Criteries/Temporomandibular

das, embora apresentem elevada taxa de recorrência, tornan-

Disorders), que têm sido usados para classificar os pacientes

do o tratamento insatisfatório e incompleto.3

com DTM baseados no diagnóstico físico (Eixo I) e incapaci-

A aplicação da toxina botulínica do tipo A vem sendo

dade relacionada à dor e estado psicológico (Eixo II). Tais cri-

sugerida para pacientes refratários, que não respondem às

térios permitiram a padronização do diagnóstico para DTM.

medidas conservadoras, ou seja, após a falha do tratamento

8

As DTM musculares são as mais frequentes, destacan-

conservador e prévio às intervenções cirúrgicas.3 Nesses ca-

do-se alguns subtipos, como a síndrome dolorosa miofas-

sos, o efeito terapêutico temporário e efetivo pode ser alcan-

cial, caracterizada por estado doloroso crônico, regional e

çado com a toxina botulínica.7

presença de pontos-gatilho.9 A dor miofascial é o primeiro

Embora inicialmente indicada para o tratamento das dis-

grupo de desordens diagnosticadas pelo RDC/TMD, sendo

tonias focais, a toxina botulínica do tipo A tem-se tornado

definida por três critérios principais: relato de dor em repouso

cada vez mais comum no tratamento coadjuvante das do-

ou durante a função; dor a palpação em três ou mais locais

res em região de cabeça (enxaquecas, cefaleias tensionais)

definidos; e pelo menos um ponto doloroso bilateral segundo

e pescoço (distonia cervical, lesão em chicote), sendo uma

a percepção do paciente. A dor muscular é transmitida por

modalidade terapêutica efetiva, menos invasiva e, portanto,

fibras nervosas aferentes, que conduzem ao sistema nervoso

mais segura.2,3

8

central, sendo processada a quantidade, intensidade, duração e localização do estímulo nocivo.

A toxina botulínica vem apresentando eficácia em: tratamento para as DTM;2,6,10 dores miofasciais secundárias às

9

O correto diagnóstico de DTM é fundamental para o iní-

DTM, com efeito analgésico pela redução da carga secun-

cio de instituição da modalidade terapêutica e deve ser reali-

dária da capacidade da muscular; hábitos parafuncionais

zado após anamnese completa do paciente, sendo sugerida,

(bruxismo e briquismo), que, além de causar alterações nos

sempre que possível e indicada, a realização do tratamento

músculos da mastigação, podem ainda originar lesões arti-

conservador, como compressas quentes, fisioterapia, terapia

culares; hipertrofia dos músculos masseter e temporal, que

comportamental, massagens e aparelhos intrabucais. Pos-

causam deformidade facial cosmética em razão do excesso

teriormente são instituídas medidas mais invasivas, como

de massa muscular pela hiperatividade dos músculos acome-

a administração de fármacos, infiltrações ou agulhamento

tidos; trismo; hipermobilidade mandibular e suas consequên-

Von Lindern et al. referem que cerca de 80% dos

cias, como luxação; queixas álgicas após crises de distonia

pacientes apresentam resultados satisfatórios com o trata-

oromandibular – subconjunto de distonia focal caracterizada

3

seco.

3,6,8

7

131


15

capĂ­tulo

Thiago Branco Mendes Irineu Gregnanin Pedron


Aplicações de toxina botulínica do tipo A em paralisia facial


INTRODUÇÃO O nervo facial – sétimo par dos nervos cranianos –

envolvimento do nervo facial) ou idiopáticos.1,2,15,16 Adicio-

inerva os músculos da região frontal, orbital, lábios supe-

nalmente, eventos denominados gatilhos são reportados

rior e inferior e cervical, promovendo, por conseguinte, a

como potenciais para o desenvolvimento da paralisia fa-

expressão facial.

cial de Bell, como gestação, infecções locais e sistêmi-

1

A paralisia facial idiopática ou paralisia de Bell é definida por lesão em qualquer parte do trajeto do nervo facial

cas, alteração da pressão atmosférica, otite média aguda, exposição ao frio, etc.3

que promova paralisação unilateral e autolimitante total

A paralisia do nervo facial periférico é marcada por al-

Em decor-

terações ipsilaterais, enquanto a lesão neurológica central

rência da paralisia, os músculos tornam-se flácidos, o que

pela presença de alterações contralaterais. A paralisia do

consequentemente, dis-

nervo facial periférico ocorre no neurônio motor inferior do

funções funcionais e psicológicas são observadas, cau-

nervo facial, que acarreta em perda da função muscular,

sando constrangimento social e afetando a qualidade de

tanto no terço médio da face quanto no terço inferior.4,8,17

dos músculos mímicos no lado acometido. resulta em assimetrias faciais;

4,5

2,3

vida do indivíduo.2,5-11

O diagnóstico da paralisia facial é baseado nas carac-

A paralisia facial caracteriza-se clinicamente pela

terísticas clínicas supracitadas, e outros sinais e sintomas

perda repentina do controle muscular hemifacial e, por

podem ser observados, como lacrimação aumentada,

consequência, pela ausência de linhas hipercinéticas

dificuldade em fechar os olhos, dor no ouvido ou ao re-

(rugas) na região frontal; atenuação da sulco nasolabial;

dor dele, seguidos por fraqueza facial após 2 ou 3 dias,

inclinação do ângulo da boca, com desvio do sorriso ipsi-

hiperacusia, anormalidades do paladar, sulco nasolabial

lateral, podendo causar, pela falta de controle, sialorreia;

menos evidente, inclinação da boca e sobrancelha.1,2

3

elevação ipsilateral da sobrancelha; e ptose palpebral ou

No exame de ressonância magnética, o nervo facial

dificuldade na oclusão completa das pálpebras, lagof-

poderá exibir imagem intensificada, em decorrência da

talmia ou redução da secreção lacrimal (Figuras 1 a 6).

paralisia.18

Essas características ocorrem pela hipercinese muscular

Para o correto diagnóstico de paralisia facial de Bell

contralateral (lado não paralisado), opondo-se à flacidez

ou idiopática, outras possíveis causas etiológicas devem

podendo cursar com

ser eliminadas do diagnóstico diferencial.3 Foram citados

dificuldades na mastigação, deglutição e fonação, cau-

tumores ou abscessos da glândula parótida, fraturas de

Nessa fase, os desvios la-

região petrosa do temporal, hemorragias e infartos das

terais da face podem ser observados com a musculatura

fibras pontinas, síndromes (de Ramsay-Hunt, Guillan-Bar-

Tais características

ré, Moebius e Melkersson-Rosenthal), doença de Lyme e

são notadas quando solicitada ao paciente a execução de

infecção por HIV. Para o correto diagnóstico das causas

alguns movimentos com os lábios (sorriso), sobrancelhas

etiológicas, outros exames podem ser necessários, como

(Figuras 2 a 6).

ressonância magnética, eletromiografia, coleta de análise

muscular do lado paralisado, sando ainda a disfonia.

1,3,5,6,13

6,7,12,13

em repouso ou durante a contração.

5,9

(elevação), testa e olhos (fechamento)

5,12,14

Raros são os casos com envolvimento bilateral.

3

A paralisia facial não apresenta predileção quanto ao sexo e a idade. No entanto, observa-se maior predomínio no sexo feminino.

2,3,8,10

do liquor cefalorraquidiano e tomografia computadorizada (Figuras 7 a 12).18 Diversas modalidades terapêuticas podem ser empregadas no manejo da paralisia facial. Entretanto, a ampla

Entre os fatores etiológicos da paralisia facial foram

diversidade terapêutica depende do correto diagnóstico,

reportados traumas faciais ou craniofaciais (acidentes

etiologia e prognóstico de reversibilidade. Fatores como

automobilísticos, agressão física), acidente vascular cere-

o tempo (início do acometimento e transcorrer da condi-

bral, síndromes, tumores adjacentes ao trajeto do nervo,

ção), características clínicas (ruptura total ou preservação

infecções virais (herpes simples do tipo 1), fatores iatrogê-

do segmento nervoso) e deletérias (atróficas e fibróticas

nicos (em decorrência de procedimentos cirúrgicos com

do nervo), tanto em nível muscular como em placa moto-

146


ra, tornam-se críticos para a conduta adequada.2,13

A toxina botulínica do tipo A também foi indicada para

Técnicas cirúrgicas ou procedimentos minimamente

condições de sincinesias (contração muscular involuntária

invasivos têm sido apresentados com resultados varia-

do lado afetado pela paralisia facial, após contração volun-

dos. Em casos de assimetria facial complexa, a conduta

tária de outro músculo, causado pela regeneração neural

cirúrgica é mais difícil e necessita de sucessivas interven-

aberrante),16 comumente observadas nas paralisias em pro-

ções.5,6,10 As modalidades cirúrgicas têm o propósito de

cesso de recuperação,7-9 trazendo bons resultados, mesmo

restabelecer as funções alteradas, bem como a estética

que por período limitado, de 3 a 4 meses. Tal condição tam-

facial. As principais técnicas reportadas foram a descom-

bém está relacionada com períodos prolongados de parali-

pressão cirúrgica em paralisia facial aguda; instalação de

sia facial, o que é prejudicial à simetria facial.16,19

carga estática na pálpebra superior ou polímero eletroati-

Sistemas de classificação facial, como o de Sunnybroo-

vo palpebral (favorecem o fechamento palpebral); MACS

ck e House-Brackmann, foram propostos para avaliar a si-

- prolongamento e suspensão craniana de acesso míni-

metria facial em repouso e em movimento, sendo utilizados

mo (visa à elevação da pálpebra superior); transferências

com propósito de classificar o tipo e o grau de assimetria fa-

(transplante autógeno) de nervos (visa devolver a função

cial e sincinesia, norteando a eleição dos pontos musculares

mimética do paciente); e transferências musculares (indi-

a serem abordados.7-9 Adicionalmente, sistemas de classifi-

cadas quando a transferência do nervo não é viável).12,13

cação de bem-estar social e psicológico também foram em-

Técnicas minimamente invasivas também foram indi-

pregados com o objetivo de avaliar aspectos de isolamento

cadas visando restabelecer a função das estruturas debili-

social e autoestima, antes e após o tratamento com a toxina

tadas concomitantemente aos demais tratamentos ou em

botulínica do tipo A. Esses sistemas de classificação têm

casos em que a cirurgia não é pretendida pelo paciente. A

demonstrado a efetividade da ação da toxina botulínica do

reabilitação miofuncional vem sendo amplamente empre-

tipo A na paralisia facial e colaborado imensamente com a

gada por meio de fisioterapia desenvolvida por fonoaudi-

melhora da condição psicossocial do indivíduo com paralisia

ólogos. A toxina botulínica vem sendo aplicada como co-

facial.5

adjuvante nessa prática, o que contribui positivamente à reabilitação funcional e estética dos pacientes.1,5-7,9,12-15,19

PROTOCOLO DE APLICAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM PARALISIA FACIAL

APLICAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNICA EM PACIENTES ACOMETIDOS POR PARALISIA FACIAL

Previamente às aplicações da toxina botulínica, o paciente deve ser avaliado por meio de exames clínicos e

A toxina botulínica do tipo A promove bloqueio da li-

imagiológicos, com o propósito de elucidar o diagnóstico

beração pré-sináptica de acetilcolina, causando a denerva-

final de paralisia facial (Figuras 2 a 9). Complementarmen-

ção temporária das placas motoras locais, o que reduz a

te, o protocolo fotográfico auxilia o cirurgião-dentista tanto

ação muscular local. O lado acometido pela paralisia facial

no diagnóstico inicial como na avaliação do prognóstico e

apresenta ausência de tônus muscular ipsilateral; adicional-

proservação do caso, até, possivelmente, a reversão total

mente, a musculatura contralateral demonstra condições

do quadro clínico. No protocolo são solicitadas ao paciente

de hipercinesia antagonista. Nessa perspectiva, a aplicação

a realização e a exigência muscular da mímica, conforme

contralateral da toxina botulínica do tipo A promove incre-

mostram as Figuras 2 a 9. É solicitada ao paciente também

mento dos distúrbios funcionais decorrentes da assimetria,

a execução da contração dos músculos frontal, da glabela,

bem como melhora o aspecto estético facial, pois permite a

dorso do nariz, região periorbitária, orbicular dos lábios e

harmonia entre as musculaturas dos lados paralisado e não

sorriso, bem como o fechamento dos olhos. Após a realiza-

A absorção sistêmica é mínima, promoven-

ção do protocolo fotográfico, são identificados os pontos de

paralisado.

5,6,10,20

do raros efeitos sistêmicos.

5

eleição (Figura 10) à aplicação da toxina botulínica, visando,

147


16

capĂ­tulo

Maria Eugenia da Silva Cezere Irineu Gregnanin Pedron


Aplicação de toxina botulínica do tipo A em sialorreia


INTRODUÇÃO As glândulas salivares, em indivíduos saudáveis, secre-

vação e conduz à postura de boca aberta; e avaliação da

tam aproximadamente 750 ml de saliva a cada 24 horas.

cavidade nasal, já que a obstrução nasal pode conduzir à

As glândulas submandibulares produzem cerca de 70% de

postura de boca aberta.1

saliva, seguidas pelas parótidas, com 25% da produção, e

Múltiplas estratégias terapêuticas têm sido propostas

Quando a

para reduzir a hipersalivação. As opções atuais incluem tra-

produção de saliva é excedente, há a condição denominada

tamento farmacológico e cirúrgico. A terapêutica farmaco-

sialorreia. Também conhecida como hipersialia, hipersaliva-

lógica envolve o uso de anticolinérgicos sistêmicos, o que

ção, babação ou babugem, a sialorreia é definida como a

não é bem tolerado ou utilizado em crianças.5,7 Como efeitos

excessiva e involuntária secreção de saliva.1,3-5 É considera-

colaterais ao uso dos anticolinérgicos sistêmicos encon-

da um fenômeno fisiológico em recém-nascidos, que cessa

tram-se visão turva, agitação ou sonolência, constipação e

por volta dos 15 aos 18 meses de idade, quando ocorre o

xerostomia. Apesar da efetiva redução da hipersalivação, a

processo de maturação da função motora orofacial e a co-

ocorrência dos efeitos colaterais pode estabelecer o fim da

ordenação da deglutição. Entretanto, quando persiste além

indicação dessa modalidade terapêutica.2,5

pela sublingual, com 5% da produção de saliva.

1,2

dos 4 anos de idade é considerada anormal, sendo mais

A terapêutica cirúrgica é mais invasiva e radical, pro-

São incluídos nesse

pondo-se a reposição ou remoção do ducto, ou a completa

grupo a paralisia cerebral, encefalopatias, doenças neuro-

remoção das glândulas, que podem originar graves compli-

lógicas motoras, paralisia facial, acidente vascular cerebral,

cações estomatológicas, como possíveis danos aos nervos,

doença de Parkinson, retardo mental, síndrome de Down,

aumento da incidência de doenças periodontais, cáries, xe-

entre outros.

rostomia, mucosite, ardência bucal, queilite angular, ulcera-

frequente em indivíduos neuropatas.

1,3-6

1-7

Entre as características clínicas do paciente portador de sialorreia foram observados acúmulo de saliva na cavidade

ções na língua e no palato e parotidite (quando da remoção do ducto).1,2,5-7

bucal, com contínua necessidade de eliminação; dificulda-

A aplicação de toxina botulínica do tipo A vem sendo

de e interferência na fonação e deglutição, pelo acúmulo

reportada na literatura como método clinicamente eficaz no

de saliva na cavidade bucal; aumento da suscetibilidade de

tratamento da sialorreia, haja vista tratar-se de um proce-

infecções peribucais oportunistas (Candida albicans), como

dimento menos invasivo, com resultado favorável e raras

queilites, ulcerações na comissura labial e dermatite peribu-

complicações.

cal (em pacientes com paralisia cerebral ou retardo mental);

A avaliação odontológica prévia à determinação da op-

Adicionalmente, a sialorreia pode favore-

ção terapêutica deve ser realizada. Deve-se enfatizar que,

cer condições sistêmicas significativas, como a pneumonia

dependendo do tipo de tratamento realizado para a sialor-

por aspiração e problemas psicossociais. Em pacientes neu-

reia, é presumível a ocorrência de complicações à saúde

ropatas, há ainda a sobrecarga ao cuidador, com a neces-

bucal, uma vez que a saliva apresenta função de lubrificante

sidade de troca e lavagem frequente de roupas, além das

natural das mucosas, agente protetor (pela presença de imu-

questões psicológicas que conduzem ao impacto negativo

noglobulinas), iniciador do processo de digestão e fonte de

na interação social.

íons no processo de remineralização dos dentes.1

e desidratação.

1,6

1-3,5

Previamente ao tratamento, é essencial a identificação de alguns fatores como possíveis eventos adversos causa-

APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA DO TIPO A EM

dos pela administração de fármacos, como os colinérgicos,

PACIENTES COM SIALORREIA

entre eles os anticonvulsivantes, que podem causar sialorreia; avaliação da postura e da posição da cabeça, visto que

A toxina botulínica do tipo A apresenta efeito na inibição

a posição anormal da cabeça pode causar excesso do fluxo

nos receptores colinérgicos das células da glândula salivar,

salivar; alterações como o overjet (trespasse horizontal da

causando a depressão da capacidade secretória das glându-

maxila em relação à mandíbula), que favorece a hipersali-

las salivares.1,2

154


Após a reconstituição da toxina botulínica, ela deve ser

cas (paralisia cerebral e encefalopatia), com melhora conside-

aplicada no interior da glândula com uma agulha de 22G a

rável na intensidade e frequência dos sintomas após 15 dias

A injeção deve ser guiada sob a orientação do ultras-

da aplicação de toxina botulínica do tipo A (100 unidades)

som, com o propósito de verificar a localização e a profundi-

bilateralmente nas glândulas parótida e submandibular, utili-

Sidebottom et al., ao realizar a

zando a ultrassonografia como guia. Não foram observados

aplicação de toxina botulínica em 30 indivíduos, relataram a mi-

eventos adversos, e o efeito da aplicação da toxina perdurou

gração da toxina para a massa muscular envolvente, causando

por 4 meses.

25G.

2,7

dade exatas da glândula.

2,4-7

5

disfagia temporária. Foi reportada a técnica imprecisa, e para

Manrique8 reportou 4 casos de redução da sialorreia em

evitar tais complicações o uso do ultrassom se faz necessário,

5 pacientes com esclerose lateral amiotrófica (ELA), nos quais

pois permite posicionar corretamente a agulha no interior da

foram injetadas 30 unidades em um ponto por glândula sub-

glândula, melhorando a eficácia e a segurança da técnica.

mandibular e 20 unidades em dois pontos de ambas glândulas

Para a realização da técnica de aplicação, se faz necessário que o paciente se prostre em posição supina, em que a cabe-

parótidas, guiadas por ultrassonografia. Três pacientes apresentaram xerostomia durante 4 meses.

ça pode ser rodada para ambos os lados. Embora a técnica 2

de aplicação seja fácil, é necessária a cooperação do paciente.

PROTOCOLO DE APLICAÇÃO

Entretanto, como a maior parte dos pacientes apresentam condições neurológicas que impossibilitam a compreensão e a co-

Há muita divergência entre os protocolos existentes. A

operação para a realização da técnica, alguns autores sugerem

posologia também se apresenta variável pelas distintas mar-

cas comerciais existentes, haja vista que cada produto deve

Jeung et al. reportaram a aplicação sob orientação da ultrasso-

ser reconstituído de modo diferente. Dessa forma, os diversos

nografia, sem anestesia geral, pois pode ser aplicada facilmente

protocolos apresentados foram sintetizados na Tabela 1. As

em nível ambulatorial. Foi também relatada a possibilidade da

diferenças existentes entre os protocolos apresentados ocor-

realização da aplicação sob sedação com midazolam.

rem, ainda, pelas distintas marcas comerciais, pelas glându-

que a aplicação deve ser realizada sob anestesia geral.

3,5,7,8

2

3,6

Yuan e Shelton apresentaram resultados satisfatórios 6

em 7 indivíduos com sialorreia por diferentes causas etiológi-

Autor

Marca comercial

Manrique8 (2005)

Botox® (Allergan)

Yuan, Shelton6 (2011)

Não informada

Jeung et al.2 (2012) Rodwell et al.3 (2012)**

Botox® (Allergan)

las a serem aplicadas e pela própria dimensão entre as glândulas (parótida e submandibular).

Glândula*

Quota de unidades

Submandibular

30 unidades

Parótida

20 unidades

Parótida

30 unidades

Submandibular

20 unidades

Parótida Submandibular

15 a 80 unidades

Botox® (Allergan)

Parótida

10 a 100 unidades

Dysport (Ipsen)

Submandibular

140 unidades

Parótida

30 unidades

Submandibular

20 unidades

Garcia-Ron et al.4 (2012)

Botox® (Allergan)

Sidebottom et al.5 (2012)

Dysport (Ipsen)

Submandibular

18 a 80 unidades

Gok et al.7 (2012)

Não informada

Submandibular

25 a 40 unidades

* Aplicações bilaterais. ** Revisão sistemática.

155


17

capĂ­tulo

Irineu Gregnanin Pedron Melissa Medrano Gomes Maria EugĂŞnia da Silva Cezere


Eventos adversos e complicações decorrentes das aplicações da toxina botulínica do tipo A em odontologia


A utilização da toxina botulínica em odontologia apresen-

com a localização anatômica das aplicações e a dissemina-

ta grande margem de segurança, desde que respeitadas as

ção da toxina. Portanto, torna-se condição sine qua non a

indicações clínicas, regiões anatômicas e posologia. Imuno-

orientação ao paciente em não realizar massagem ou pressão

genicidade, reações de hipersensibilidade (alérgicas) e com-

sobre os pontos de aplicação, de forma a evitar seu espalha-

plicações locais são os eventos adversos mais importantes

mento e disseminação em áreas adjacentes.

1-4

A pele da região periorbitária deve ser limpa, com o pro-

As causas mais frequentes de eventos adversos foram

pósito de visualizar pequenos vasos sanguíneos, evitando-se

relacionadas tanto à distribuição da toxina botulínica em mús-

assim o extravasamento sanguíneo, bem como a formação

culos próximos aos grupamentos injetados quanto pela ação

de pigmentações cutâneas.

que podem ocorrer, sendo normalmente leves e transientes.

nos receptores colinérgicos no sistema nervoso autônomo

Em aplicações altas (região frontal e glabelar) foi citada a

No longo prazo, a possível

possibilidade de cefaleia, “aparência de máscara”, blefarop-

formação de anticorpos neutralizantes da toxina pode causar

tose ou ptose palpebral (Figura 2), epífora, diplopia, xeroftal-

a perda do efeito do tratamento. Resistência clínica tem sido

mia, visão turva, edema palpebral, fraqueza muscular facial,

estimada como relativamente alta (7%), e a toxina botulínica

assimetria e tontura. Edema e escurecimento (mácula erite-

do tipo B, avaliada como agente terapêutico alternativo.

matosa) palpebral podem ser evitados resguardando-se a

simpático ou parassimpático.

7,8

3

A albumina humana é utilizada na preparação da liofili-

aplicação no músculo elevador da pálpebra superior. A ptose

zação da toxina, o que pode causar reação alérgica, embo-

palpebral pode persistir por até 3 meses.2,3,5,6 A ptose palpe-

ra nenhum caso tenha sido descrito na literatura.3 O tipo de

bral pode ser evitada aplicando-se a toxina 1 cm acima da

solução salina utilizado na reconstituição da toxina também

margem superior da cavidade orbitária.1 A apreensão bidigital

pode auxiliar na redução da sintomatologia dolorosa, sendo

dos músculos prócero e corrugadores no momento da aplica-

recomendada a solução salina estéril não preservada. Entre-

ção (Figura 3) é sugerida e, segundo Pena et al.,5 pode evitar

tanto, a reconstituição com solução salina preservada não

o espalhamento indesejado na região glabelar e, subsequen-

melhora a estabilidade da toxina botulínica, e o preservati-

temente, a ptose palpebral.

vo (álcool benzílico) atua como agente anestésico, reduzindo

Em casos de ptose palpebral, deve-se administrar colírio

a dor local. Adicionalmente, quando a toxina é reconstituí-

com antagonista alfa-adrenérgico apraclonidina a 0,5%, na-

da com preservativo (álcool benzílico), o armazenamento é

fazoloína ou solução oftalmológica de fenilefrina a 2,5%, que

prolongado e o remanescente é conservado, reduzindo-se o

estimulam o músculo de Müller a elevar a pálpebra superior

risco de contaminação bacteriana.

em 1 mm a 2 mm. O tratamento sintomático é iniciado com

5

Entre as principais complicações locais observadas após a aplicação da toxina botulínica encontram-se dor, edema,

duas gotas, duas a três vezes por dia, até a resolução da ptose.1,5,6

eritema (Figura 1), equimose e hipoestesia de curta dura-

Em aplicações no terço médio da face foram relatadas

O eritema pode ser prevenido, evitando-se a injeção,

possíveis injúrias locais dos ramos do nervo facial, regurgita-

ção.

1-5,7,8

1,5

mesmo que subcutânea, em vasos sanguíneos superficiais.

ção e fonação nasal.3 Paralisia do músculo zigomático maior

A equimose pode ser evitada orientando-se o paciente pela

pode resultar em ptose labial em casos de aplicação em li-

suspensão da administração de ácido acetilsalicílico, anti-in-

nhas hiperfuncionais periorbitárias.1,5 Aplicações nessas regi-

flamatórios não esteroidais e altas doses de vitamina E, dez

ões podem ainda causar ectrópio, diplopia e ptose nos lábios

dias antes do procedimento de aplicação da toxina.

e nas bochechas.

Muito embora Pena et al. tenham sugerido a aplicação

Pacientes que já realizaram cirurgia na pálpebra inferior

de pressão local e compressa fria sobre os locais onde foi ad-

devem ser excluídos.5 Em caso de aplicação nos músculos

ministrada a toxina, não recomendamos essa prática, porque

periorbitárias, pode ocorrer visão turva, exotropia ou endo-

assim se evita a indesejável disseminação da toxina em áreas

tropia, diplopia, fotofobia, lacrimejamento, piscamento ex-

adjacentes à aplicação, uma vez que a área de atuação do ci-

cessivo, xeroftalmia e irritação ocular. Fraqueza muscular ex-

rurgião-dentista ocorre em músculos de reduzidas dimensões.

cessiva, com dificuldade em abrir e fechar os olhos, e ptose

5

A ocorrência das complicações apresenta-se de acordo

160

palpebral são possíveis, mas melhoram em 2 semanas.7,8


No terço inferior da face e região peribucal, flacidez das

cais, alterações de voz, rouquidão e fraqueza da musculatura

bochechas, incompetência bucal, assimetria labial, xerosto-

cervical. Redução da salivação e xerostomia, com possível

mia, cálculo em ducto salivar (possivelmente causado pela

infecção, redução da sudorese e constipação podem ser ob-

xerostomia), paralisia muscular peribucal, inclinação labial,

servadas, bem como injúrias locais da artéria carótida. Com-

disfagia transiente, abertura de boca restrita, deslocamento

prometimento respiratório associado é evento raro, porém

recorrente dos maxilares, disfonia e disartria podem ocor-

potencialmente grave, podendo estar relacionado aos grupos

Assimetria do sorriso foi reportada como consequência

musculares injetados ou como manifestação a distância de

rer.

3,4,5

da disseminação da toxina para o músculo zigomático maior.

1

Pacientes que requerem função labial completa, tais como músicos de instrumentos de sopro, cantores e mergulhadores, não devem ser submetidos ao procedimento.

5

doses excessivas.3,5,7-9 As regiões da faringe e do músculo esternocleidomastóideo devem ser evitadas.5 Sintomas de ordem generalizada como fadiga, náusea, prurido, dor de estômago e fraqueza transiente (mesmo a

No tratamento de distonias ou na aplicação em músculos

distância do sítio da injeção) foram citados.3,4,5,8 Fascite ne-

cervicais, ou como distribuição dos efeitos a distância, a to-

crosante foi citada em pacientes imunocomprometidos, de-

xina botulínica pode causar disfagia, paralisia das pregas vo-

vendo ser evitada a aplicação nesses casos.2 Incontinência

Figura 1: Eritema após a aplicação da toxina botulínica.

Figura 2: Ptose palpebral. (Extraído de Niamtu III, 200311).

Figura 3: A apreensão bidigital dos músculos corrugadores no momento da aplicação é preconizada, evitando-se a difusão da toxina em áreas adjacentes indesejadas.

161


capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron Alessandra Reyes

18


Proposta de protocolo fotográfico simplificado às aplicações de toxina botulínica do tipo A em odontologia


INTRODUÇÃO A fotografia desempenha papel fundamental na rea-

sas variáveis pertinentes à câmera fotográfica, tais como

lidade profissional do cirurgião-dentista em diversas ati-

quantidade de luz, abertura de diafragma, velocidade de

vidades, seja na atuação clínica, na documentação dos

exposição ao CCD, foco, nitidez, estilo, fotometria, qua-

casos como instrumento legal constituinte do prontuário

lidade da imagem, ISO, tipos de lentes; e ainda carac-

odontológico, na apresentação e discussão do caso para

terísticas inerentes ao objeto a ser fotografado – neste

o próprio paciente, na divulgação científica, em trabalhos

caso, o nosso paciente: temperatura da cor, iluminação

publicados, e na apresentação de aulas e cursos.

ambiente, tipo de pele, etnia, etc.7 Além disso, aspectos

1,2

O emprego da toxina botulínica em odontologia vem

psicológicos (“estado de espírito”) ou fisiológicos (enve-

chamando a atenção dos cirurgiões-dentistas, haja vista

lhecimento, variações orgânicas ou hormonais) podem

a sua aplicação terapêutica, indicada em casos de dis-

alterar o aspecto da face. Tais desequilíbrios, dependen-

funções temporomandibulares, distonia oromandibular,

do de cuidados internos (injeções subcutâneas, microci-

hábitos parafuncionais, hipertrofia massetérica, sialorreia,

rurgias) ou externos (limpeza de pele, massagem facial e

assimetrias faciais de origem muscular, sorriso gengival e

maquiagem), podem alterar a epiderme.8 Portanto, torna-

assimetrias labiais, que podem causar exposição acentua-

-se difícil a padronização da câmera fotográfica, haja vis-

da da gengiva. Recentemente vem sendo indicada a apli-

ta as diversas variáveis intrínsecas ou extrínsecas, sendo

cação profilática de toxina botulínica do tipo A em casos

necessário aprofundamento do estudo. Adicionalmente

após reabilitações sobre implantes dentários, para reduzir

ao estudo dirigido, sugerimos a realização de cursos de

forças mastigatórias e proteger as próteses e implantes de

fotografia odontológica, ministrados em todo o país, que

Também para a aplicação de

transmitem os conhecimentos do universo da fotografia

cargas oclusais excessivas.

3,4

toxina botulínica pelo cirurgião-dentista, a fotografia desempenha papel importante na documentação dos prontu-

ao cirurgião-dentista.

Quanto ao hardware, sugerimos como modelos

ários odontológicos. Portanto, o recurso da fotografia deve

introdutórios as câmeras fotográficas digitais Canon EOS

ser empregado diariamente em nossos consultórios.

Rebel T3i (Figura 1) ou a Nikon D3200 (Figura 2). Entre-

Como é notório hoje o predomínio da fotografia digital,

tanto, ressaltamos que outras câmeras fotográficas apre-

fare-

sentam características similares e que essas máquinas

mos aqui menção exclusivamente à aplicação da fotografia

compõem nossa experiência. Recomendamos ainda a

digital. Não é nosso intuito neste momento discorrer sobre

aquisição de acessórios que podem auxiliar o cirurgião-

conceitos básicos de fotografia. Para tanto, sugerimos lei-

-dentista no exercício da fotografia na clínica odontológi-

Obser-

ca, tais como lentes, flashes, tripés, cartões de memória e

pela facilidade de uso, baixo custo e alta resolução,

1,2

tura complementar e específica sobre o assunto.

5-7

vamos com frequência que o emprego da fotografia digital

baterias adicionais, leitor de cartão e HD externo.

não obedece à padronização de parâmetros estabelecidos em protocolos fotográficos, nem mesmo seguem um mes-

PROPOSTA DE PROTOCOLO FOTOGRÁFICO SIMPLI-

mo padrão entre o pré e o pós-tratamento, o que torna os

FICADO

resultados dúbios ou facilmente questionáveis. O escopo deste capítulo é orientar o cirurgião-dentista na padroniza-

Embora a fotografia desempenhe papel fundamental

ção do protocolo fotográfico simplificado, haja vista a ne-

como documento legal no prontuário do paciente e ofereça

cessidade da documentação na pré, trans e pós-aplicação

o histórico e a evolução do caso, acompanhando o trata-

da toxina botulínica em odontologia. Desse modo, faremos

mento passo a passo, o cirurgião-dentista não tem o hábito

considerações sobre as especificações da câmera digital

de fotografar.

com o propósito de documentação do protocolo intra e extrabucal de forma prática, simples e objetiva. No universo da fotografia, entendemos que há diver-

166

Através da fotografia extrabucal pode ser observada a existência ou não de harmonia entre as estruturas estomatognáticas de nosso interesse (dente, gengiva, lábios, língua)


e face do paciente para aplicação da toxina botulínica do

atua como recurso na contemplação das expectativas, an-

tipo A. Atenção especial deve ser dada aos músculos da

seios e desejos do paciente.9,10 Entretanto, cuidados devem

mímica e sorriso. Analisando a foto do próprio paciente, as

ser tomados quando a expectativa do paciente excede o

proporções são mais bem estudadas e consequentemente

bom senso, tornando-se não realista e escondendo traços

mais bem explicadas, facilitando a apresentação e o diá-

de doenças psiquiátricas.

logo com o paciente, bem como a razão do investimento

Compõem o protocolo fotográfico extrabucal as toma-

devido à escolha de determinada conduta, associados aos

das frontal e laterais (direita e esquerda), ressaltando que

procedimentos odontológicos para o manejo de condições

todas devem ser realizadas nas etapas inicial e final dos

que podem, consequentemente, harmonizar e rejuvenescer

procedimentos odontológicos (Figuras 3 a 5). O protocolo

a face, como é o caso de aplicações da toxina botulínica do

fotográfico extrabucal pode ser modificado, sendo parti-

tipo A para dor orofacial e sorriso gengival. Para a aplicação

cularizado caso a caso, de acordo com a necessidade do

da toxina botulínica, é condição sine qua non a avaliação

paciente. Por exemplo, em casos de sorriso gengival, o pro-

sobre as fotos de estudo (iniciais), bem como as de resul-

tocolo deve ser realizado normalmente e devem ser feitas as

tados (finais), comparando ambas. A fotografia extrabucal

mesmas tomadas com o paciente sorrindo. Adicionalmente,

comprova a existência do estado inicial da cavidade bucal,

podem ser realizadas as tomadas meio perfil (direito e es-

haja vista que raramente os pacientes (leigos) se reconhe-

querdo), de acordo com a necessidade ou observação de

cem pela foto da própria cavidade bucal.

7,9

A fotografia ainda

determinados aspectos clínicos (Figuras 6 e 7).

Figura 1: Câmera fotográfica digital Canon EOS Rebel T3i.

Figura 2: Câmera fotográfica digital Nikon D3200.

Figura 3: Tomada fotográfica extrabucal frontal.

Figura 4: Tomada fotográfica extrabucal lateral direita.

Figura 5: Tomada fotográfica extrabucal lateral esquerda.

Figura 6: Tomada fotográfica extrabucal meio-perfil direita.

Figura 7: Tomada fotográfica extrabucal meio-perfil esquerda.

167


capĂ­tulo Zilson MagalhĂŁes Malheiros Irineu Gregnanin Pedron

19


Marketing aplicado ao emprego da toxina botulĂ­nica do tipo A na Odontologia


UMA BREVE DEFINIÇÃO DE MARKETING

MARKETING APLICADO À TOXINA BOTULÍNICA

Segundo Kotler e Keller,1 o marketing envolve a identifi-

Até bem pouco tempo, falar de marketing na saúde era

cação e a satisfação das necessidades humanas e sociais.

considerado um grande tabu. Muitos profissionais da área

Para defini-lo de uma forma bem simples, podemos dizer

como médicos, cirurgiões-dentistas, enfermeiros, entre ou-

que ele supre as necessidades de forma lucrativa. A Ame-

tros, acreditavam saber o que era melhor para o paciente e

rican Marketing Association define o marketing como uma

acreditavam que as atividades de marketing eram desne-

função organizacional e um conjunto de processos que en-

cessárias para atender às necessidades dos usuários. Sil-

volvem a criação, a comunicação e a entrega de valor para

veira e Hayashi3 afirmam que os profissionais desconhecem,

os clientes, bem como a administração do relacionamento

portanto, que o mercado espera ter também os benefícios

com eles, de modo que beneficie a organização e seu públi-

agregados que acompanham a tecnologia e a técnica: aten-

co interessado. Para Drucker2, um dos principais estudiosos

ção no atendimento, preço compatível com os serviços ofe-

na Administração, o objetivo do marketing é tornar supérfluo

recidos, comodidades, etc.

o esforço de venda. Assim, o marketing praticado na odon-

O emprego da toxina botulínica vem angariando espaço

tologia deve conhecer e entender seu cliente (paciente) tão

no mercado odontológico. Diversas indicações são propostas

profundamente que o serviço oferecido a ele seja adequa-

nos demais capítulos deste livro e, nessa perspectiva, apre-

do e se venda sozinho. Na odontologia o cirurgião-dentis-

sentam grande impacto no comportamento do paciente.

ta deve então procurar conhecer seu paciente, de modo a

Segundo Carvalho et al.,4 por possuir conhecimento so-

satisfazê-lo técnica e emocionalmente, procurando agregar

bre as estruturas de cabeça e pescoço, o cirurgião-dentista

valor ao seu atendimento mediante a utilização das mais di-

pode tratar certas afecções da face e da cavidade bucal

versas ferramentas de comunicação.

de forma conservadora e segura com a aplicação da toxina botulínica, desde que possua treinamento específico e co-

Servir é a ferramenta, fazer brilhar os olhos é a es-

nhecimento sobre a sua utilização, e desde que não exceda

sência.

as suas atribuições.

A IMPORTÂNCIA DO MARKETING

CONSIDERAÇÕES ÉTICAS SOBRE A UTILIZAÇÃO DA TOXINA BOTULÍNICA

Perdurou por longo tempo, mas finalmente os profissionais da área da saúde começaram a aceitar a ideia de que

Assim como em outros tratamentos, sugerimos que o

o marketing é uma importante ferramenta para o dia a dia

profissional apresente aos pacientes opções distintas de

profissional. Atualmente, o sucesso financeiro do empreen-

tratamento, detalhando os benefícios de cada uma das pos-

dimento está muitas vezes relacionado à habilidade de fazer

sibilidades terapêuticas apresentadas. Nessa perspectiva, o

uso adequado do mix de marketing.

profissional deixa o paciente à vontade diante da escolha do

Esse mix de marketing auxiliará o profissional na mudança de atitude e comportamento, no sentido de impulsio-

tratamento que lhe pareça mais adequado, após ouvir as sugestões do profissional.

nar mudanças duradouras para o seu negócio. Ele é criado

Em setembro de 2011 o Conselho Federal de Odontolo-

para definir a estratégia para atrair, vender, satisfazer e fide-

gia publicou a Resolução CFO 112/2011,5 que dispõe sobre

lizar seus clientes (pacientes). Cada consultório ou clínica

o uso da toxina botulínica e do ácido hialurônico. A Resolu-

deve fazer uma análise da sua própria estrutura, cultura e

ção regulamenta o uso terapêutico da toxina botulínica em

ambições, para assim identificar as melhores oportunidades

procedimentos odontológicos, desde que não seja para fins

e ameaças ao seu negócio.

exclusivamente estéticos. Além da resolução supracitada, o cirurgião-dentista deve observar os preceitos éticos da profissão, que po-

176


dem ser encontrados na Lei 5.081/666 e no Código de Éti-

A priori, a utilização da toxina botulínica em odontologia

ca Odontológico (CEO) vigente, encontrado no website do

é um procedimento de vanguarda e diferenciado. Espera-se

Conselho Federal de Odontologia (www.cfo.org.br). Adicio-

que a apresentação pessoal, bem como a da clínica (deco-

nalmente, sugerimos a leitura do Capítulo 20, Considera-

ração, ergonomia, higiene) e o cartão de visitas estejam de

ções ético-legais sobre a aplicação de toxina botulínica do

acordo com a competência técnica.

7

tipo A pelo cirurgião-dentista. COMUNICAÇÃO COMO ANUNCIAR A APLICAÇÃO DE TOXINA BOTULÍNICA

É fundamental que todo material de comunicação seja padronizado. Assim, antes de simplesmente solicitar a cria-

Conforme mencionado no Capítulo 20, de acordo com

ção de um fôlder sobre um novo serviço, sugerimos que

o Código de Ética Odontológica,7 é permitida ao cirurgião-

se faça uma breve análise sobre três elementos críticos da

-dentista a realização de publicidade das técnicas por ele

identidade visual da clínica.

utilizadas, sendo, portanto, possível a divulgação da aplica-

Logotipo: representa o empreendimento; deve constar nas peças de comunicação com a finali-

ção da toxina botulínica em odontologia.

dade de fixar o nome e a imagem do consultório/

Destacamos que constitui infração ética fazer publicidade e propaganda com imagens do paciente pré e pós-tratamento (imagens “antes e depois”), conforme o artigo 44 do CEO. No 7

clínica. •

Tipologia: deve-se padronizar a tipologia e, de pre-

entanto, não há impedimento do cirurgião-dentista de apre-

ferência, que seja uma fonte de fácil leitura. O uso

sentar ao paciente durante a consulta fotografias de resultados

de uma peça com diversas fontes pode demonstrar

finais de casos. Vale ressaltar que a odontologia é uma ciência

falta de profissionalismo, além de dificultar o enten-

de meio e que não devem ser prometidos resultados.

dimento.

O registro de imagem desempenha papel fundamental

Cores: as cores causam impacto na tomada de

no marketing do empreendimento, auxiliando na divulgação

decisão das pessoas e refletem na construção da

da técnica de aplicação da toxina botulínica pelo cirurgião-

imagem da instituição pelo cliente.

-dentista. A imagem, representada pela fotografia clínica, seja ela intra ou extrabucal, auxilia o profissional de várias for-

MARKETING DIRETO

mas: no arquivo de informações pertinentes ao caso, como documentação; e na demonstração de casos; na evolução

Representa a comunicação direta da empresa com o seu

do tratamento; na divulgação da técnica para a comunidade

público-alvo. Na área da saúde é utilizado por meio de news-

odontológica, por meio de publicações científicas, e para a

letters, mala-direta, fôlderes no consultório, etc. Essa comuni-

sociedade, por meio de informativos. Recomendamos ainda

cação é mais individualizada quando comparada ao anúncio,

que todos os pacientes fotografados devem assinar um ter-

pois é possível selecionar melhor o público-alvo.

mo de consentimento, em que será apresentada a finalidade

O profissional poderá elaborar fôlderes informativos e dis-

do registro fotográfico. Esse documento deve ser arquivado

ponibilizá-los na recepção para que os seus pacientes enten-

com o prontuário do paciente.

dam melhor os tratamentos oferecidos. Além disso, há também

Sugerimos a leitura do Capítulo 18, Proposta de proto-

o e-mail marketing, uma ferramenta de fácil desenvolvimento e

colo fotográfico simplificado às aplicações de toxina botulí-

baixo custo. Para evitar que o e-mail seja reconhecido como

nica do tipo A em odontologia, em que há diversas técnicas

spam (mensagens enviadas sem a permissão do usuário), su-

para a otimização das fotografias e adequação perante a

gerimos o uso de softwares existentes no mercado que orien-

legislação vigente.

tam na criação, envio e gerenciamento das mensagens.

177


capĂ­tulo Irineu Gregnanin Pedron Rubens Oquillas Martins Ana Carla Santana Tavares

20


Considerações ético-legais sobre a aplicação de toxina botulínica do tipo A pelo cirurgião-dentista


INTRODUÇÃO A toxina botulínica em odontologia vem sendo cada vez

Para melhor entendimento e didática, dividimos este ca-

mais indicada, já compondo o arsenal terapêutico do cirurgião-

pítulo de acordo com as leis e regulamentos, discriminados a

-dentista no tratamento de diversas patologias e condições do

seguir.

sistema estomatognático. Essa terapêutica da “moda” ganhou espaço na mídia, seja entre os profissionais, seja entre os pa-

DA LEI QUE REGULAMENTA O EXERCÍCIO DA

cientes. Esse crescimento e projeção também é acompanha-

ODONTOLOGIA

do por preocupações e, subsequentemente, por precauções por parte do cirurgião-dentista, haja vista a possibilidade de

Apesar de o conhecimento a ser adquirido sobre a aplica-

interpretações errôneas, tanto pelo profissional quanto pelos

ção da toxina botulínica em odontologia fazer parte do apren-

Sabe-se ostensivamente que a aplicação da to-

dizado em pós-graduação, consideramos a Lei 5.081, de 24

xina botulínica pelo cirurgião-dentista tem caráter terapêutico,

de agosto de 1966, que regulamenta o exercício profissional

dadas as várias indicações de uso em nossa atuação.

da Odontologia.4

pacientes.

1,2

3

O propósito deste capítulo é orientar o cirurgião-dentista

As competências do cirurgião-dentista estão determina-

previamente capacitado a receber informações de cunho éti-

das no artigo 6º, e especificamente nos incisos I e II autori-

co-legal sobre a utilização da toxina botulínica em odontologia,

za-se o uso da toxina botulínica, haja vista tratar-se de um

com amparo na legislação.

fármaco e sua aplicação ter finalidade terapêutica.

A utilização da toxina botulínica em odontologia apresenta diversas indicações terapêuticas e, secundariamente, estéticas na área de competência do cirurgião-dentista, como sua indicação no tratamento do sorriso gengival e exposição acentuada da gengiva na excursão do sorriso. Da mesma forma que é possível a correção cirúrgica do sorriso gengival, particularizado e de acordo com a indicação terapêutica, como a necessidade de miectomia ou a indicação da cirurgia ortognática (Capítulo 8, Aplicação da toxina botulínica do tipo A em sorriso gengival), também é possível um tratamento mais conservador e transitório, por decisão do paciente, desde que devidamente orientado quanto às possibilidades, vantagens e desvantagens, benefícios e prejuízos, custos, etc., do tratamento.

Art. 6º Compete ao cirurgião-dentista: I - praticar todos os atos pertinentes à Odontologia, decorrentes de conhecimentos adquiridos em curso regular ou em cursos de pós-graduação; II - prescrever e aplicar especialidades farmacêuticas de uso interno e externo, indicadas em Odontologia;

DO CÓDIGO DE ÉTICA ODONTOLÓGICA Segundo o Código de Ética Odontológica,5 particularmente referente ao Capítulo II, sobre os Direitos Fundamentais, transcrevemos: Art. 5º Constituem direitos fundamentais dos profissionais inscritos, segundo suas atribuições específicas:

A nosso ver o cirurgião-dentista apresenta a nobre missão

I - diagnosticar, planejar e executar tratamentos, com liberda-

do restabelecimento da saúde bucal e da obtenção da estéti-

de de convicção, nos limites de suas atribuições, observados

ca do terço inferior da face em tratamentos reabilitadores em

o estado atual da Ciência e sua dignidade profissional;

todas as especialidades odontológicas, por meio de procedimentos protéticos, implantodônticos, periodontais, cirúrgicos, ortodônticos e em dentística. Embora a área de atuação do cirurgião-dentista se estenda do soalho da cavidade orbitária até o osso hioide, outra nobre função é o restabelecimento es-

Em concordância ao Capítulo III, dos Deveres Fundamentais do mesmo Código, transcrevemos: Art. 9º Constituem deveres fundamentais dos inscritos e sua violação caracteriza infração ética: VI - manter atualizados os conhecimentos profissionais, técnico-científicos e culturais, necessários ao pleno desempenho

tético-funcional alcançado pela especialidade odontológica da

do exercício profissional;

prótese bucomaxilofacial, na qual o especialista confecciona

VII - zelar pela saúde e pela dignidade do paciente;

próteses reabilitadoras em pacientes fissurados, ou que apresentam deficiências anatômicas e estéticas em olhos, nariz e orelhas, entre outras.

184

Adicionalmente, no Capítulo V, do Relacionamento, Seção I - Com o Paciente: Art. 11. Constitui infração ética:


O inciso IV do artigo 11 do Código de Ética Odontológi-

IV - deixar de esclarecer adequadamente os propósitos, riscos, custos e alternativas do tratamento;

ca, supracitado, ainda está em acordo com os incisos II e III

V - executar ou propor tratamento desnecessário ou para o

do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor:8

qual não esteja capacitado;

5

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

A aplicação da toxina botulínica é opção terapêutica

[...]

para diversas condições, como sorriso gengival, condição

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado

que pode ser tratada pela cirurgia ortognática ou miectomia,

dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de esco-

quando indicadas. Entretanto, torna-se infração ética pratica-

lha e a igualdade nas contratações;

da pelo cirurgião-dentista a ausência de esclarecimento sobre

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quan-

opções de tratamento, entre elas a aplicação de toxina botu-

tidade, características, composição, qualidade, tributos

línica. Da mesma forma, torna-se infração ética apresentar a

incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apre-

toxina botulínica como única modalidade terapêutica para o sorriso gengival. Todas as possibilidades de tratamento praticadas pelo cirurgião-dentista devem ser incessantemente ex-

sentem;

Os artigos 31 e 66 tratam sobre oferta da prestação de serviços ou produtos e infrações penais respectivamente:

plicitadas e informadas ao paciente, incluindo todas as carac-

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços

terísticas pertinentes ao procedimento, entre elas vantagens,

devem assegurar informações corretas, claras, precisas,

desvantagens, custos, benefícios, prejuízos, etc. A decisão

ostensivas e em língua portuguesa sobre suas característi-

será sempre do paciente.

cas, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos

DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

consumidores. Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir infor-

Estabelecido pela Lei 8.078, de 11 de setembro de

mação relevante sobre a natureza, característica, qualidade,

1990, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) entrou em

quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço

vigor em 11 de março de 1991 e dispõe como consumidor

ou garantia de produtos ou serviços:

toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. § 1º. Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.

ou serviço como destinatário final (artigo 2º). Serviço, por

§ 2º. Se o crime é culposo:

sua vez, é definido como sendo qualquer atividade forneci-

Pena - Detenção de um a seis meses e multa.

da no mercado de consumo mediante remuneração (artigo 3º, parágrafo 2º). Portanto, é no CDC que está inserida a responsabilidade civil do cirurgião-dentista, e devemos estar atentos aos direitos do consumidor. Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública

DOS CÓDIGOS CIVIL, PENAL E DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Vale salientar que o sigilo profissional, a boa-fé objetiva e a reparação de danos, abaixo transcritos, também estão

ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes

inseridos nos Códigos Civil e Penal, bem como os direitos

despersonalizados, que desenvolvem atividade de produ-

fundamentais oriundos da Constituição Federal.

ção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. [...] § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

DO CÓDIGO CIVIL O Título III, dos Atos Ilícitos, versa sobre responsabilidade civil subjetiva: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

185


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