Revista Jurídica Digital RTM Nº: 12

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ISSN: 2447-4509 | jul-dez 2016

Revista Jurídica Digital RTM O JUIZ AO VOLANTE: Rumos, riscos e desafios da Lei nº.13.103/15 * Márcio Túlio Viana Desembargador aposentado do TRT da 3ª Região. Professor no Programa de Pós-graduação em Direito da PUC-Minas. Ex-professor da UFMG.

FUTURO DA JUSTIÇA DO TRABALHO *Antônio Álvares da Silva Desembargador Federal do Trabalho (aposentado). Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG Professor titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da UFMG

Conteúdo e alcance do dever de fundamentação das decisões judiciais no processo do trabalho *Cleber Lúcio de Almeida

Juiz do Trabalho. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da PUC/MG. Pós-doutor em Direito pela Universidad Nacional de Córdoba/ARG. Doutor em Direito pela UFMG. Mestre em Direito pela PUC/SP.

LEI COMPLEMENTAR Nº 150/15: possibilidades de alterações legislativas em prol dos direitos dos trabalhadores *Lília Carvalho Finelli

Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais; pesquisadora/bolsista pela FAPEMIG; advogada; colaboradora da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da UFMG; bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG; técnica em Administração de Empresas pela Escola Técnica de Formação Gerencial do SEBRAE/MG.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA: SISTEMA PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO E “EFETIVIDADE”

*Domingos Antônio Zatti Pinto da Silva

É bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos (2008). Tem especialização em Direito Público, com Formação para o Magistério Superior, na área do Direito, pelo Centro Universitário Anhanguera (2010) e especialização em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito Milton Campos (2011). É também técnico de nível médio em Segurança do Trabalho, eixo tecnológico saúde e meio ambiente, pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial de Minas Gerais (2013). Atualmente participa de atividades de pesquisa e extensão desenvolvidas pelo Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho e à Administração da Justiça da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (PRUNART-FDUFMG).

DO TRABALHO DOS MÚSICOS ESTRANGEIROS EM TERRITÓRIO NACIONAL: DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL E O REGISTRO DOS CONTRATOS DE TRABALHO PERANTE O MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO *Guilherme da Hora Pereira Advogado e consultor sindical inscrito na OAB/DF sob o n. 36.863, docente das disciplinas de Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho e Direito Sindical, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Superior da Advocacia - ESA, Secretário-Geral Adjunto da Associação Íbero-Americana de Juristas de Direito do Trabalho e Seguridade Social Dr. Guillermo Cabanellas - AIJDTSSGC, ex-Coordenador de Informações sobre Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego e ex-Coordenador da Assessoria de Informações jurídicas da Secretaria de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego.

Os Princípios de Direito do Trabalho e a Tutela da Vida Digna dos Trabalhadores na Atual Ordem Jurídica Constitucional *Fábio Melhorance de Jesus Advogado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho – Pós Graduação Lato Sensu pela Universidade Gama Filho (UGF).

RECONVENÇÃO CONTRA TERCEIRO NO PROCESSO DO TRABALHO *Nara Brito Barro Advogada. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidad de Buenos Aires – UBA, Argentina.

PROIBIÇÃO DE ENTRADA E PERMANÊNCIA DE MENORES DE 18 ANOS EM LOCAIS QUE REALIZAM APOSTA * Felipe Alves de Oliveira Advogado militante, graduado pela Direito da Faculdade de Direito Milton Campos.

NOVOS CONCEITOS PARA O DIREITO CONSTITUCIONAL *Janou Saldanha Professor. Advogado. Mestre em Direito pela Universidade de Itaúna (FUIT). Especialista em Direito Processual pela Universidade Católica de Minas Gerais (IEC PUC Minas). Especialista em Direito Tributário pelo Centro de Atualização em Direito (CAD). Especialista em Gestão Empresarial (MBA Executivo) pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Graduado em Direito pela Universidade de Itaúna (FUIT). Professor da Faculdade de Pará de Minas (FAPAM).

O Processo administrativo disciplinar como fonte de assédio moral sobre o servidor público

* Gláucio Guimarães Medeiros

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário CESMAC, Analista Judiciário pelo Tribunal de Justiça de Alagoas licenciado, Autor da obra “Comentários ao Regime Jurídico dos Servidores Públicos de Alagoas”, Professor de curso preparatório para concursos públicos, membro efetivo do Coletivo Jurídico da FENAJUD - 2011/2014, Diretor Jurídico pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário de Alagoas - SERJAL - 2009/2014, Diretor Jurídico da FESEMPRE em Alagoas.

A igualdade de gênero na proposta de reforma da Previdência Social

*Luana Junqueira Dias Myrrha - Anna Carolina Ianino Lima Andrade - Pamila Cristina Lima Siviero

Luana Junqueira Dias Myrrha – Doutora e Mestre em Demografia, Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Anna Carolina Ianino Lima Andrade – Advogada, pós-graduada em Direito Público e mestre em Demografia Pamila Cristina Lima Siviero - Doutora e Mestre em Demografia, Professora da Universidade Federal de Alfenas.

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Revisores de Periódico Ms. Lília Carvalho Finelli (UFMG) Ms. Isabela Murta De Ávila (UFMG) ISSN 2447-4509 Editoração Eletrônica e Projeto Gráfico - Amanda Caroline Capa - Amanda Caroline Editor Responsável: Mário Gomes da Silva Revisão: os autores Todos os direitos reservados à MARIO GOMES DA SILVA – ME Proibida a reprodução total ou parcial,sem a autorização. Rua João Euflásio, 80 - Bairro Dom Bosco - BH - MG - Brasil. Cep 30.850-050 -Tel: (31) 3417-1628 - (31) 9647-1501 E-mail: rtmeducacional@yahoo.com.br Site: www.editorartm.com.br Loja Virtual: www.rtmeducacional.com.br

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Linha editorial A Revista Jurídica digital RTM publica resenhas, traduções e comentários sobre temas referentes às diversas áreas do direito, bem como artigos científicos e de trabalhos de pesquisa aplicada oriundos de programas de pós-graduação de diversas universidades que versem sobre a dogmática jurídica, teoria do direito, sociologia do direito, filosofia do direito, história do direito, ensino e pesquisa em direito. A revista aceita artigos científicos e trabalhos de pesquisa de diversas vertentes teóricas e metodológicas, inclusive textos interdisciplinares, os quais serão publicados semestralmente mediante sistema de avaliação anônimo por pares (Double Blind Peer Review). A chamada de artigos está permanente aberta, sendo que o envio de artigos científicos e trabalhos de pesquisa deve ser feita em conformidade com as normas de submissão. Os trabalhos deverão ser submetidos para análise do Conselho Editorial, por meio de envio para o endereço eletrônico revistajuridicadigitalrtm@yahoo.com.br.

Normas de submissão 1. A chamada de artigos está permanente aberta, sendo que o envio de artigos científicos e trabalhos de pesquisa deve ser feita em conformidade com as normas de submissão. Os artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada devem ser encaminhados, como anexo, pelo e-mail revistajuridicadigitalrtm@yahoo.com.br com o título “Submissão de artigo” e no corpo do e-mail deve constar o termo de autorização abaixo, devidamente preenchido: TERMO DE AUTORIZAÇÃO .Eu, ____________________________________, residente na _______________, n.º _____, bairro _________, Cidade _______, Estado_______, CEP:_______, telefone celular (DDD) _____________ e-mail ____________________, filiado à [instituição de origem FACULDADE/ UNIVERSIDADE/OUTROS] submeto à REVISTA JURIDICA DIGITAL RTM, o trabalho intitulado __ ____________________________________________ produzido em coautoria com [incluir nomes completos dos coautores, se for o caso], filiados, respectivamente à [instituição de origem], telefone fixo/celular (DDD)___________, e-mail ___________________________, para análise. Declaro que o trabalho ora submetido é uma obra original de autoria dos acima identificados. Sendo o artigo aprovado, autorizo a REVISTA JURIDICA DIGITAL RTM a publicá-lo e disponibilizá-lo em seu acervo por tempo indeterminado. 2. Após o envio, os artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada passarão por uma avaliação prévia (desk review) pelos para análise sua adequação à linha editorial da Revista e às normas de submissão. 2.1. Após essa avaliação, os artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada aprovados são remetidos a dois pareceristas anônimos para a avaliação qualitativa de sua forma e conteúdo (double blind peer review) e, em caso de aprovação, serão remetidos para publicação. Poderão haver, excepcionalmente, convites para publicação de artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada de doutrinadores a critério da Editora. 3. Os artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada serão preferencialmente inéditos e podem ser escritos em português, espanhol ou inglês. 4. Os artigos científicos devem ter até 30 laudas de 2100 caracteres com espaços. Relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada e artigos científicos com texto mais extenso do que o padrão serão publicados, sendo, neste último caso, a critério da editora. Os artigos científicos e relatórios de trabalhos de pesquisa aplicada deverão ser enviados com a seguinte configuração e observância das seguintes regras de formatação. 3


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Editorial

*Antônio Álvares da Silva

A Editora RTM segue em frente e agora presta mais um importante serviço à cultura jurídica nacional, editando a Revista Jurídica digital RTM. Basta uma rápida análise do índice para ver a importância dos temas tratados, sem dúvida, úteis para todas as categorias de juristas: advogados, professores, alunos e cientistas do Direito. A edição eletrônica é hoje o caminho ideal para as publicações científicas. Mais cedo ou mais tarde, os livros tomarão idêntico caminho, superando a versão escrita. O tempo corre veloz. As ideias se multiplicam. A vida, que Guimarães Rosa achava perigosa, agora é também rápida. A ciência, plena de dados e pesquisas, cresce assustadoramente. No ramo jurídico, o que escrevemos hoje já não serve mais amanhã. Tudo muda. Fora a base doutrinária, que permanece como resíduo, o resto se transforma e demanda atualização permanente. A versão escrita está longe de perseguir esta carreira moderna da evolução científica. O que é escrito é por natureza rígido. Estabiliza o pensamento, é verdade, mas também o imobiliza. Já a forma eletrônica é volátil, permite a mudança rápida. Portanto voa junto com os fatos. É de se esperar que este propósito seja obtido pela ciência jurídica em todos os ramos do Direito, a fim de que, sempre rente aos acontecimentos sociais, domine-os a fim de dirigi-los para um norte de justiça e equilíbrio, conciliando os diversos interesses que neles pulsam. A internet é hoje uma poderosa ferramenta que auxilia o Direito sobre diferentes aspectos. A Revista Jurídica digital RTM é mais um instrumento desta renovação.

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Apresentação A Revista Jurídica Digital RTM é mais um serviço que a editora RTM presta à cultura jurídica brasileira. Nela escreve juristas de escol sobre temas atuais do Brasil e do mundo que provoquem discussão e reflexão. A revista é semestral e os artigos são livres e independentes. O Direito no mundo atual se tornou multifário e aberto. Teve que despir-se das formas do passado, para assumir o novo influxo do pós-moderno, com toda sua complexidade. A Editora espera que a revista acolha estes novos valores e cumpra sua finalidade de divulgar opiniões fundamentadas e eruditas através de uma leitura agradável, profunda e proveitosa sobre temas atuais. Mário Gomes da Silva Editor

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Sumário O.Juiz.ao.volante:.Rumos,.riscos.e.desafi.os.da.Lei.nº..13.103/15...............................................................11

Márcio Túlio Viana

Futuro da Justiça do Trabalho......................................................................................................................23

Antônio Álvares da Silva

Conteúdo e alcance do dever de fundamentação das decisões judiciais no processo do trabalho...........27

Cleber Lúcio de Almeida

Lei.Complementar.Nº.150/15:.possibilidades.de.alterações.legislativas.em.prol.dos.direitos. dos trabalhadores............................................................................................................................................37

Lília Carvalho Finelli

Administração da Justiça: Sistema Processo Judicial Eletrônico e “Efetividade”...................................45

Domingos Antônio Zatti Pinto da Silva

Do trabalho dos músicos estrangeiros em território nacional: da contribuição Sindical e o registro dos contratos de trabalho perante o Ministério do Trabalho e Emprego Emprego.....................53

Guilherme da Hora Pereira

Os Princípios de Direito do Trabalho e a Tutela da Vida Digna dos Trabalhadores na Atual Ordem Jurídica Constitucional.....................................................................................................................61

Fábio Melhorance de Jesus

Reconvenção contra terceiro no Processo do Trabalho...............................................................................69

Nara Brito Barro

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Proibição de entrada e permanência de menores de 18 anos em locais que realizam aposta..................73

Felipe Alves de Oliveira

Novos conceitos para o Direito Constitucional.............................................................................................75

Janou Saldanha

O Processo administrativo disciplinar como fonte de assédio moral sobre o servidor público...............83

Gláucio Guimarães Medeiros

A igualdade de gênero na proposta de reforma da Previdência Social ........................................................................87

Luana Junqueira Dias Myrrha - Anna Carolina Ianino Lima Andrade - Pamila Cristina Lima Siviero

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Revista Jurídica Digital RTM O JUIZ AO VOLANTE: Rumos, riscos e desafios da Lei nº. 13.103/15

Márcio Túlio Viana1 1 . Uma breve introdução Em meados do século passado, um famoso autor francês2 lançou um livro chamado: “Brasil, terra de contrastes”. Como, naturalmente, contrastes existem em todos os tempos e lugares, o que ele queria era apenas sublinhar o quanto o nosso país é desigual e heterogêneo, comparado a outros lugares do mundo. Hoje, não apenas os paradoxos do próprio mundo se acentuam, como o Brasil se esforça por merecer – mais ainda - o título daquele livro. A nova lei dos motoristas parece um exemplo disso. Ela nos mostra um pouco do que se passa nesses tempos tão pós-modernos e nesse país com tantas contradições. Mas é uma lei que também nos ajuda a repensar o juiz. Na verdade, como homem de seu tempo, ele próprio se vê imerso em novos paradoxos, que se refletem em seus modos de ver e viver o Direito. Nessas breves linhas, aproveitamos algumas ideias antigas, acrescentando outras tantas, todas elas bastante simples. 2. Os contrastes do mundo Dizíamos que hoje, em todo o mundo, os contrastes se acentuam. Assim, antes de tratarmos do Brasil, vejamos um pouco do que se passa para além de suas fronteiras. Sabemos, por exemplo, que nunca houve tanta miséria, em meio a tanta opulência; ou tantos apelos à paz, convivendo com tantas violências; ou ainda tantos belos discursos, disfarçando tantas realidades amargas. De um lado, cultuamos o corpo; de outro, transitamos nas virtualidades. Talvez como nunca, queremos afirmar o nosso eu; mas ao mesmo tempo mascaramos o nosso rosto e assumimos falsas identidades. Se a modernidade mesclava liberdades e constrições, tentando controlar o presente e projetar o futuro, a pós-modernidade parece romper com esse casamento, celebrando muito mais os impulsos, os desejos, as explosões. Em lugar do homogêneo, o variado; do programado, o casual; do certo, o incerto; do absoluto, o relativo; do simples, o complexo; do unitário, o múltiplo; do contínuo, o entrecortado; da história, o capítulo; do eterno, o efêmero3. Os próprios sonhos, quando existem, tendem a ser pragmáticos, a curto prazo, individuais ou de pequenos grupos. Talvez por isso, em junho de 2013, pessoas queimavam bandeiras nas ruas – metáfora de um desejo de viver sem bandeiras, ou pelo menos sem as grandes e duradouras bandeiras de ontem.4 Por outro lado, e mais do que nunca, as nossas vidas se aceleram. Quando corremos nas ruas ou nas esteiras, não apenas revelamos uma preocupação – também crescente – com os nossos corpos, mas expressamos o que se passa no mundo. Outro elemento importante – e relacionado com a rapidez - é a presença de uma mobilidade crescente.

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Roger BASTIDE.

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A propósito, cf., dentre outros, o já clássico livro de HARVEY, David. A condição pós-moderna. S. Paulo: Loyola, 1992.

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A exceção tem sido a ecologia, talvez por se ajustar a uma tendência de valorizar o “natural” e a aspirações pessoais como a de uma vida mais saudável.

Desembargador aposentado do TRT da 3ª Região. Professor no Programa de Pós-graduação em Direito da PUC- Minas. Ex-professor da UFMG.

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Na verdade, o mundo começou a se mover especialmente com a modernidade, e mais ainda quando o sistema capitalista introduziu a lógica da acumulação, potencializada pela presença da ciência e da tecnologia nas atividades produtivas. Desde aquela época, a multiplicação dos objetos vem acompanhando – e reforçando - a emersão de novos valores, conceitos, crenças e sonhos; era (e é) como se tudo passasse a ser possível, sem limites, como acontece, aliás, com a própria ideia de acumulação. No início da I Revolução Industrial, quando a vida camponesa entrava em choque – ou em estado de choque – com as cidades industriais, até as artes refletiam esse novo modo de ser e de estar no mundo. Assim, por exemplo, enquanto o circo inventava o globo da morte, os jornais publicavam charges sobre o caos do trânsito e os teatros encenavam peças como esta: (...) uma corrida de quatro sentidos entre dois automóveis, uma locomotiva e uma bicicleta, e também uma corrida de barco a motor, carros de bombeiros apressando-se na direção de um edifício em chamas, várias cenas de tortura e um clímax feito de um ciclone no qual o vilão foi morto por um raio” 5 Era um modo de dizer o que já acontecia, mas talvez fosse também uma forma e preparar as pessoas para aquele novo mundo, que potencializava a ruptura com um passado que resistia ou tentava resistir às mudanças. Hoje, porém, damos um novo salto. Todos se movem, ou tentam se mover, de forma ainda mais intensa e constante - não só em termos físicos como em saberes, ofícios, ideias, amores, lugares, desejos e tantas coisas mais. Por isso, quem não consegue se mover tanto, ou tão depressa, pode ser condenado a uma vida pior – embora muitos se movam em condições precárias, exatamente por estarem vivendo também precariamente. A ênfase que o Direito hoje dá aos transportes se insere, é claro, nesse contexto. Mas ela também se explica pela fuga dos campos, pelo consequente inchaço das cidades, pela carência de políticas habitacionais que privilegiem a classe pobre e outros fatores interligados. 3. Alguns contrastes do Direito Quais seriam as novas contradições que afetam o Direito? Certamente, uma pergunta assim exigiria como resposta um livro inteiro, ou uma coleção de livros; mas tendo em vista os limites deste texto, assim como a nossa própria (in)capacidade, tocaremos apenas levemente em um ou outro ponto. Para isso, partimos da premissa de que as ideias brotam não apenas da razão, mas das emoções. É que, como sabemos, tudo interage com tudo, e não há como separar, por exemplo, um trabalhador do sindicato que o protege, ou mesmo um princípio jurídico das pessoas de carne e osso que o elaboraram. Pois bem. O primeiro ponto tem a ver com o nosso olhar diante do Direito. Terá ele se transformado? Parece que sim. Mas até que ponto? É também difícil dizer. Mas como a sede de liberdade se acentuou, somos muito mais avessos às regras, às disciplinas, exceto àquelas que nos prometem mais liberdade ainda6. E esse modo de sentir, ou esse novo olhar, já afeta, por si só, a norma jurídica – especialmente quando tem natureza cogente, imperativa. Por outro lado, como a sede de igualdade também cresceu, somos muito mais refratários às hierarquias – o que se reflete, igualmente, em nossas relações com a lei, fazendo com que ela se torne mais vulnerável às críticas. Até a apologia do novo – potencializada pelo consumo – enfraquece a imagem da norma jurídica, que não apenas por tradição, mas talvez até por natureza carrega em si a utopia de durar para sempre, ou pelo menos por muito tempo. Nesse sentido, também a mobilidade do mundo passa a ser um problema. Assim como pretende durar - ou por isso mesmo – a norma jurídica sonha em se manter igual ao que foi; e essa antiga virtude pode ser hoje sentida como imperfeição7. 5

SINGER, Ben. Modernidade, hiperestímulo e o início do sensacionalismo popular. In: CHARNEY, Leo; SCHWARTZ, R. (org.). O cinema e a invenção da vida moderna. São Paulo: Cosac & Naify, 2001, p. p. 136

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É nesse contexto que se insere, por exemplo, o movimento para a redução da maioridade penal, que supostamente permitiria às classes abastadas transitar com menos medo pelas cidades.

São usuais, por exemplo, as afirmações de que a CLT “está velha”.

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Por outro lado, a onda de relativismos, de dúvidas e desconfianças que - desde as últimas guerras, pelo menos - tem invadido a Ciência e a Filosofia, hoje também se exacerba; e tudo isso vai abalando as certezas do – e no – Direito. E como o eu está em alta – e os selfies são apenas um exemplo – queremos todos nos empoderar, como diz o verbo da moda. Seja nos passeatas, nos programas esportivos, nos enredos das novelas ou até no orçamento das cidades, todos exigem dizer suas verdades, participar. E não é diferente com a interpretação do Direito. Há algum tempo, um ex-aluno8, que é também auditor-fiscal, dizia-nos que o patrão que hoje é multado já não se limita a reclamar da sorte ou a censurar a multa; quer interpretar, ele mesmo, as palavras da lei, ao mesmo tempo que questiona sua razão de ser. E se pensarmos em tudo isso, talvez possamos entender porque – como ensina Canotilho - a fonte de produção normativa vai se deslocando “do centro para a periferia, da lei para o contrato, do Estado para a sociedade”9. Daí também porque, no campo trabalhista, a negociação coletiva ganha novo impulso; conquista mais legitimidade; mais do que nunca, parece democrática, igualitária e justa, politicamente correta, entrando em sintonia com as mesmas tendências de participação e empoderamento. Acontece que se, de um lado, essas tendências parecem fortalecer os protestos e exigências, de outro conspiram contra a sua organização. Desse modo, se é verdade que ainda nos unimos de modo casual e temporário – ao marcharmos de braços dados nas ruas, ou ao ajudarmos as vítimas de um tsunami – somos hoje mais resistentes às instituições, seus projetos e hierarquias. 10 Na medida em que tentamos afirmar a nossa voz e a nossa presença no mundo, desvalorizamos ou desqualificamos crescentemente toda tentativa de nos ordenar – e isso se aplica também ao sindicato. De certo modo, é como se nos tornássemos, todos, um pouco adolescentes... Assim (e não só no campo jurídico), o difuso e o ocasional vão ocupando os espaços do institucional, do coletivo. E o próprio trabalhador - em maior ou menor medida, dependendo até de sua profissão - passa a ser cúmplice no processo de destruição da entidade que o representa. Some-se a isto o fato de que a pós-modernidade também celebra o fluido, o mutante – qualidades quase incompatíveis com o sindicato, ou pelo menos com o sindicato que conhecemos. E a reestruturação produtiva – potencializada pela globalização, e sustentada também pela ideologia - completa o serviço. Nesse último ponto, não custa notar que uma das estratégias da nova empresa - a terceirização - ajuda a superar uma contradição que o próprio sistema havia facilitado mas que acabou lhe criando dificuldades. É que, para produzir, foi preciso reunir os trabalhadores – o que acabou provocando a sua união. Hoje, porém, já é possível produzir sem reunir, com as empresas em rede, e até mesmo reunir sem unir, dadas as diferenças de interesses entre terceirizados e empregados das tomadoras. E enquanto se libera, passo a passo, desta sua contradição, o sistema capitalista vai criando um novo paradoxo, mas desta vez em prejuízo da classe operária. De fato, no mesmo momento em que os sentimentos, as ideias e as emoções e apontam para a participação, para o contrato, para a democracia direta, para a negociação – ou seja, para o sindicato -, entram em cena outros elementos, tanto objetivos quanto subjetivos, que afetam sua posição de força e relativizam muito a noção de que a vontade coletiva, por si só, é suficiente para equilibrar a balança e viabilizar as conquistas. Por outro lado, é interessante notar como o Direito do Trabalho tem interagido - muito mais do que antes - com outros ramos jurídicos, o que aliás, tem tudo a ver com um tempo que também é marcado pelas colagens, pelas misturas, pelas fronteiras cada vez mais porosas, pelo encontro de diversidades; e é importante observar, também, como esse fenômeno faz nascer duas tendências diametralmente opostas. De fato, enquanto as normas trabalhistas típicas vão perdendo força – tanto em termos de construção formal, como no que diz respeito à efetividade – as normas civilistas transpostas para a relação de emprego ga8

Thiago Moraes Raso Leite Soares, chefe de fiscalização na SRTE-MG.

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CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional, Almedina, Coimbra, 1991, p. 21.   Nesse sentido, cf. FERRARESE, Maria Rosaria. Le istituzioni della globalizzazione. Bologna: Il Mulino, passim.

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nham cada vez mais peso e legitimidade. É cada vez mais difícil, por exemplo, construir novos direitos sociais, como nos tempos em que foram inventados o 13º salário, as férias ou a estabilidade no emprego; aliás, até os reajustes salariais enfrentam resistência crescente, ao passo que a efetividade dos antigos direitos diminui. No entanto, são cada vez mais frequentes as leis, sentenças e autos de infração que – em planos diversos - punem as empresas por assédios, discriminações ou violações de intimidade. Talvez esse paradoxo possa ser melhor entendido se pensarmos, de um lado, que as normas trabalhistas típicas afetam diretamente o lucro empresário, opondo-se ao credo neoliberal; e também se notarmos que o mesmo credo entra em curiosa sintonia com nossas aspirações de liberdade e de igualdade (pelo menos em termos formais), na medida em que prega a liberdade de empresa e a igualdade em suas contratações – sejam elas individuais ou coletivas - sem as tradicionais constrições da CLT. Já as normas civilistas, de outro lado, só por vias travessas e episódicas afetam os cofres das empresas; e além disso estão perfeitamente sintonizadas com aquelas mesmas aspirações, o que as torna imunes às pressões do mercado. Basta notar, por exemplo, que as vozes que se levantam contra a “rigidez” das regras salariais não se atrevem a defender explicitamente qualquer forma de discriminação, por mais que possam desejar fazê-lo; ao contrário do primeiro, este último discurso é tido pela sociedade em bloco (inclusive a mídia) como indefensável, ou seja, politicamente incorreto. E nesse campo de proteção crescente se inserem também – pelo menos em teoria – as normas de saúde e segurança no trabalho, e não apenas por razões de fundo social ou humanitário, mas pela convergência com um ambiente que – como dizíamos – celebra o presente, desconfia do futuro (inclusive no céu), transforma o corpo num substituto da alma11, valoriza a “qualidade de vida” e os cuidados pessoais e por essas e outras razões tenta afastar pelo maior tempo possível as múltiplas formas da morte. Além desses fatores – mais ou menos comuns no resto do mundo – o Brasil se vê às voltas com os seus próprios paradoxos. De um lado, por exemplo, tivemos a emersão de um Presidente operário, que encarnava – por sua simples presença, ou por sua presença simples – tanto uma nova postura dos brasileiros em face de seus preconceitos históricos, como o despertar de uma nova sensibilidade diante das questões sociais. Não à toa, ao longo desses anos, a onda neoliberal não produziu tantos estragos quanto certamente provocaria; e o Tribunal Superior do Trabalho, fortalecido pelo idealismo de novos ministros, passou por um processo de transformação - como se ampliasse sua própria competência - deixando de ser apenas um órgão uniformizador da jurisprudência para se postar, até simbolicamente, como defensor do Direito do Trabalho, em face do verdadeiro furacão que o vem abalando – desde, pelo menos, os anos 90. Naturalmente, nem tudo são flores; a jurisprudência do TST nem sempre avança como deveria, e não raras vezes cede às pressões e transige; mas de um modo geral, como dizíamos, tem servido de obstáculo importante – ainda que relativo – aos estragos que se pretendem fazer. Basta olhar à nossa volta, inclusive para o que tem acontecido em países europeus. No entanto, as contradições mais graves ainda estão em curso, ameaçando os trabalhadores – como o projeto que alarga a terceirização, confundindo homens e coisas, ou a perigosa reforma trabalhista que volta e meia é anunciada nos jornais. Mais grave ainda do que isso é o fato de estar renascendo um clima favorável às precarizações, extremamente reforçado pelas crises - política e econômica – que vêm roubando legitimidade do Governo Dilma Rousseff. Nesse sentido, as próprias crises têm um forte traço ideológico, ou mesmo estratégico: cria-se um ambiente que não só conspira contra as políticas sociais, como dificulta a resistência. Um bom exemplo é a fiscalização do trabalho: se antes já era vítima de um processo de fragilização – com poucas verbas, pouco pessoal e importância política decrescente – hoje tende a sofrer ainda mais, sob o argumento de que há déficit fiscal. Embora se insira naquele contexto mais geral, que envolve outros países do mundo, a nova lei dos motoristas é também um exemplo de um clima precarizante que parecia estar se arrefecendo mas que vai ganhando força (de novo) no Brasil. 11

BAUDRILLARD, Jean. La société de consommation. Paris: Denoel, 1970, p. 199.

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Revista Jurídica Digital RTM 3.1 Observações genéricas sobre a nova lei

Como os transportes afetam em grau cada vez maior toda a população, é claro que os motoristas contam com um poder de pressão que falta à maior parte das categorias profissionais12. No entanto, essa mesma razão que parece favorecê-los – ou seja, a importância crescente dos meios de locomoção – milita também a favor da classe patronal. Basta lembrar o peso do lobby do setor não só no Congresso Nacional como junto às prefeituras municipais. Aliás, basicamente, foram as mobilizações de uns, e o lock-out dos outros, que criaram o ambiente favorável, respectivamente, para a Lei no. 12 619/2012 e a Lei no. 13 103/2015, que a sucedeu. Ainda pela mesma razão de fundo, que lhes daria, em tese, peso político, os motoristas se tornam – paradoxalmente - cada vez mais vulneráveis à crítica social, reproduzida e também produzida pela grande mídia – que tende a traduzir toda greve como “baderna” ou “irresponsabilidade”, por se mostrar supostamente insensível aos interesses da população. Esquece-se a mídia, porém, que foi em grande parte graças à greve que as minorias conseguiram humanizar um pouco o sistema capitalista - tarefa que mais parecia uma contradictio in terminis, e que dificilmente teria sido alcançada, no nível em que conseguiu ser, apenas com teorias. Nesse sentido, uma greve de motoristas nunca foi ou será uma simples greve de motoristas, assim como o próprio Direito do Trabalho nunca foi ou será apenas um Direito limitado aos empregados, ou mesmo aos trabalhadores em geral – pois suas águas se expandem, como as enchentes dos rios, seja inspirando, pressionando ou ensinando outros ramos jurídicos. Mas não são fatores apenas midiáticos ou ideológicos que relativizam a força de uma categoria como esta. Embora em menor medida, ela está sujeita às mesmas tendências que põem em crise a classe operária como um todo, e que (como vimos) deslizam por caminhos tortuosos, que vão desde a reestruturação produtiva até às novas subjetividades dos trabalhadores. Tudo isso talvez explique, de um lado, a emersão da Lei no. 12.619/2012, que nasceu basicamente de negociações entre as categorias profissional e econômica; e, de outro, seu atropelamento pela Lei no. 13.103/2015, que parece ter brotado muito mais das mãos empresariais, corrigindo à sua maneira os supostos excessos da primeira13. Vejamos, então, alguns de seus aspectos. Para o bem e para o mal, a nova lei entra em compasso com certas tendências do nosso tempo, e mesmo com as contradições do nosso país. Para começar, ela sucede à outra num intervalo de apenas três anos, o que nos velhos tempos surpreenderia, mas hoje a faz parecer melhor, só por ser nova, mesmo sendo pior; ao mesmo tempo, ou por isso mesmo, não só revela como reforça uma nova ideia a respeito do Direito do Trabalho, como se todo ele fosse agora destinado a ser efêmero, inconstante. Por outro lado, a nova lei parece desrespeitar o princípio da irretroatividade das conquistas sociais14, que - mesmo tendo sido pensado em relação à Constituição - deve ser aplicado ao Direito do Trabalho em geral. Dizemos “parece desrespeitar” porque uma conclusão definitiva a esse respeito mereceria um estudo comparativo maior, mais detalhado, com a lei anterior. No mínimo, porém, se a comparação for feita por tópicos ou temas – como recomenda a melhor doutrina15 – é possível afirmar que vários blocos de direitos (como os 12

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Nesse sentido, escreve Daniel Dias de MOURA – professor e advogado militante no setor sindical rodoviário – que “o projeto que deu origem à Lei no. 12.619/2012 (...) foi fruto do diálogo entre os entes nacionais representantes das categorias econômica e profissional diretamente afetadas pelas condições de trabalho no transporte e que, baseados em estudos e nas experiências das partes, flexibilizaram normas imperativas, visando garantir a atividade econômica e, também, um patamar mínimo de sobrevivência para os trabalhadores”. Já a Lei no. 1303/2015, “além de alterar a CLT e diversas outras normas, revoga dispositivos da Lei 12.619/2015, retirando as garantias mínimas que eram atribuídas aos trabalhadores, como, por exemplo, os limites que eram impostos à negociação coletiva sobre o intervalo intrajornada.” Intervalo intrajornada dos motoristas e cobradores previsto na Lei n. 13.103/2015: o limite da negociação coletiva. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard (org.). Motorista profissional - Aspectos críticos à Lei n. 13.103/2015 - Análise do novo referencial normativo, com remissões à Lei n. 12.619/2012. São Paulo: LTr, 2015, p. 194/203

A propósito, cf. REIS, Daniela Muradas. O princípio da vedação do retrocesso no Direito do Trabalho. S. Paulo: LTr, 2006.

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A propósito, ensina Gabriela Neves DELGADO que o valor que se dá ao trabalho, em cada época ou lugar, responde pela própria valorização do trabalhador. Direito Fundamental ao Trabalho Digno. São Paulo: LTr, 2015.

No sentido dessa forma de interpretação, cf. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. S. Paulo: LTr, 2014;

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Revista Jurídica Digital RTM relativos à jornada de trabalho) foram realmente diminuídos16.

Note-se que há vários pontos da nova lei – a possibilidade de fracionamento do intervalo interjornadas, por exemplo – cujos reais efeitos, em termos de cansaço físico ou mental, talvez só possam ser avaliados com precisão e segurança pelos que têm experiência diária na profissão. No entanto, ou por isso mesmo, a pronta reação dos trabalhadores deve ser um ponto importante a considerar. Veja-se, a propósito, que a lei anterior era conhecida como “lei dos motoristas” ou até mesmo “lei dos descansos” - ao passo que a atual, no dizer de sindicatos profissionais, deveria ser chamada de “lei das empresas de transportes”, ou algo do gênero. Nesse sentido, é bom levar em conta, também, que a primeira surgiu a partir de pressões da classe trabalhadora – reforçadas por uma ação civil pública17 - mas desembocou em amplo acordo, envolvendo a classe empresarial e o MPT; já a segunda ganhou forças com um lock-out, e a ponto de não ter exigido tanto consenso. A nova lei também interage, de forma mais intensa, com outros interesses e mesmo com outros ramos jurídicos, colocando de certo modo o motorista a serviço da política de segurança nas estradas, e chegando a ponto de exigir-lhe exame toxicológico – o que pode ser visto sob dois prismas, positivo ou negativo, mas de qualquer forma revela o quanto a categoria vai se tornando cada vez mais vulnerável às exigências da sociedade, na medida de sua própria importância, ou da importância dos transportes – como dizíamos acima. Outro aspecto a se destacar é o seu algo grau de casuísmo, que se de um lado entra em descompasso com certa tendência – mais genérica – do Direito, de outro lado revela uma contratendência, no sentido de um certo controle do Poder Judiciário, talvez para frear o processo de expansão ocorrido nas últimas décadas18. Sob esse aspecto, a lei parece ter sido feita com extremos cuidados em relação à jurisprudência atual ou futura, tentando a cada momento bloquear as estradas, suprimir os desvios, e assim reduzir, por tabela, as mudanças de rota mais progressistas. Um traço positivo da lei é a ratificação e generalização da tese de que o motorista está (ou deve estar) sujeito às regras de controle da jornada. No entanto, na prática, ela abre espaço para a ampliação das horas extras, mesmo habituais, e flexibiliza (para pior) pausas e repousos, o que vai de encontro ao próprio objetivo paralelo de garantir segurança nas estradas19. A lei também entra em sintonia com a tendência atual de enxugar a relação trabalho-salário, tentando fazer com que o segundo corresponda o mais possível ao primeiro, tanto por tanto, o que por sua vez reflete ou mimetiza, no mundo do Direito, o que vai se passando na própria relação empresa-empregado.20 Não custa notar, ainda, que uma lei que flexibiliza pode ter efeito multiplicador, não só abrindo espaço para outras leis do mesmo gênero, como perturbando a interpretação das normas existentes. Por outro lado, como dizíamos, a presença do sindicato no processo de flexibilização é hoje insuficiente para garantir que o convênio coletivo seja justo; e pode ter também consequências mais amplas, valendo como uma espécie de autorização da própria classe trabalhadora para que o Direito dê marcha a ré. Nesse caso, o Poder Público estaria descartando para o sindicato o serviço sujo, enquanto se aliviaria do desgaste político, neutralizando e DEVEALI, Mario. El Derecho del Trabajo en su aplicacion y tendencias. Buenos Aires: Astrea, 1953. 16

Para Edésio PASSOS, “a Lei n. 12.619/2012 veio confirmar o conceito fundamental do estatuto celetista: proteger- -disciplinando, libertarlimitando. Com a Lei n. 13.103/2015, todavia, a história da CLT é deixada de lado, numa contradição com a natureza tutelar do Direito do Trabalho”. Apresentação. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard. Op. cit., p. 3. Como que referendando essas palavras, declara o Presidente da Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Paraná, João Batista da Silva, que as novas regras “precarizam as condições de trabalho e retiram direitos básicos, como dormir e se alimentar de forma digna” (apud Gunther, Luiz Eduardo. Prefácio. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard. Op. cit., p. 13). No sentido mesmo sentido, cf. GEMIGNANI, Tereza Aparecida; GEMIGNANI, Daniel. Motorista Profissional: análise específica e contextualizada das Leis nos. 12.619/2012 e 13.103/2015. In: MIESSA, Elisson; Correia, Henrique (coord.) Estudos Aprofundados da Magistratura do Trabalho, 2ª. Ed.. Salvador: Podium, 2015, p. 391-417,

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A ação foi movida pelo MTP do Mato Grosso, e obteve liminar que restringia o tempo de direção nas estradas. Segundo análise de Daniel Dias de Moura (op. cit.), essa ação “alavancou a negociação entre as classes profissional e patronal, intermediada pelo próprio MPT, e que culminou na Lei no. 12.619/2012”.

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Nesse sentido, fala-se, com frequência, em “processo de judicialização” ou mesmo em “governo de juízes”.

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A propósito, MOURA (Op. cit., p. 194) observa que “existem centenas de estudos científicos que comprovam os danos que as condições de trabalho no transporte urbano causam aos trabalhadores”.

20

Queremos dizer, com isso, que a empresa de hoje tende a se utilizar, em cada momento, apenas o pessoal estritamente necessário, o que se reflete não só nos índices de desemprego, mas também no grau de efetividade da norma, já que a submissão do trabalhador à violação de seus direitos é diretamente proporcional ao medo de ser despedido.

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as críticas operárias. O resultado final pode ser uma flexibilização ainda mais efetiva e duradoura. Nesse sentido, um aspecto especialmente preocupante da nova lei é a omissão do preceito antigo que condicionava explicitamente a negociação de novas condições de trabalho à ausência de prejuízo à saúde e à segurança do trabalhador (art. 235-H). Embora se possa considerar que uma norma como essa seria redundante, e por isso desnecessária, sua presença poderia evitar, na prática, que a convenção coletiva fosse usada in peius; ao passo que a sua supressão talvez seja interpretada pelos atores sociais como uma espécie de autorização em sentido oposto. 4. A fala dos trabalhadores Enquanto as entidades patronais, de um modo geral, tentam defender a nova lei, os trabalhadores lhe apontam mais defeitos que virtudes. Pelo que se percebe das manifestações sindicais, os aspectos mais criticados são o pagamento do tempo de espera não como hora extra, mas à razão de 1/3 do tempo normal, como se se tratasse de sobreaviso; a possibilidade de fracionamento do intervalo interjornadas; a autorização para trafegar mais tempo no volante, antes do descanso regular; o repouso no próprio veículo, e até mesmo quando ele estiver em movimento, no caso de haver dois motoristas. Muitos chamam a atenção para a figura do “transportador autônomo de cargas auxiliar”, que lembra uma quarteirização. Já os aspectos festejados se resumiriam basicamente a algumas regras sobre o controle da jornada, uma certa valorização da negociação coletiva e o seguro de vida obrigatório. Atualmente, tramita no STF a ADIn no. 5.322, proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres - CNTTT, que questiona vários pontos da Lei no. 13.103/2015, “especialmente” os arts. 4º a 7º. , 9º. , 15 e 22. Em seus argumentos, os trabalhadores apontam os princípios constitucionais da dignidade, dos valores sociais do trabalho, da irredutibilidade salarial, da legalidade, da finalidade social da lei, da impessoalidade, da igualdade e da ordem econômica e social. Já a Advocacia Geral da União, em seu parecer, levanta várias preliminares e, no mérito, opina pela improcedência da ação. Segundo J. R. C., motorista de carga, “com a chegada da lei 12.619-12, tinha melhorado para nós que somos empregados e trabalhamos com carga viajando em carreta, pois com esta lei passamos a ter direito de parar a cada 4 horas para descansar um pouco e isto é fundamental, principalmente quando você dirige um carro pesado, que a cada hora de um carro pequeno é duas e meia para nós. Agora parece que acabou com a nova lei.” Para E. A., que trabalha com caminhão de mudança, com a chegada da lei 12.619. “(... ) tinha até ficado bom, pois as horas de trabalho e de descanso ficou clara (sic). Por exemplo, para nós que viajamos e às vezes ficamos até uma semana fora, quando a gente estava na estrada, sabia que a cada 4 horas podia descansar e que na volta para casa teria folga, mas com esta nova lei que não sei o numero (sic) ficou pior, pois a gente é obrigado a trabalhar até 12 horas por dia e a empresa diz que é o sindicato que assinou.” Na opinião de um motorista de uma empresa distribuidora de bebidas, que não quis se identificar, “Com a lei 12.619 tinha ficado bom, mas depois disso para muitos trabalhadores ficou pior, pois foram demitidos da empresa para continuar trabalhando para ela mesma, como TAC Auxiliar (transportador autônomo de cargas auxiliar), sem direito nenhum. Para os motoristas que tinham caminhão ou muito tempo de casa, foi bom, pois a empresa acertou para eles comprar mais caminhão e agora quem não tem, tem que trabalhar para eles, para o TAC (transportador autônomo de cargas)”. Para Hamilton Dias de Moura, Secretário Executivo do FNDL – Fórum Nacional em Defesa da Lei 12.619/12, e ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviários de Belo Horizonte, “(...) a Lei 13.103/2015 retirou varias garantias atribuídas aos motoristas, mas o maior prejuízo foi redução do intervalo contínuo de 11 horas, entre uma jornada e outra, para 08 horas e, também, o não pagamento do tempo em que o motorista fica aguardando dentro dos caminhões para desembarcar a carga transportada, criando o chamado “tempo de espera”, que na verdade é tempo à disposição.”

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Revista Jurídica Digital RTM 5. O juiz e suas novas contradições

Como certa vez escrevemos21, as novas linhas de montagem ainda produzem mercadorias em massa, mas em pequenos lotes, variados e cambiantes. E de forma muito mais veloz. Além disso, a nova fábrica nunca se satisfaz: cobra performances crescentes. Do mesmo modo, o juiz. Ele deve se mostrar ágil, rápido, decidido. E como as matérias primas que ele utiliza – a lei e o fato – são cada vez mais heterogêneos, as circunstâncias o obrigam a se atualizar picotadamente, em tempo real e sem profundidade – mais ou menos como faz quando assiste ao jornal da TV. No entanto, se o juiz é obrigado a acelerar, nem por isso deixa de pagar multa pelo excesso de velocidade: são cada vez mais frequentes os casos de doenças e mortes ligadas à ansiedade, às preocupações e ao esforço mental.22 Ele tem pressa, é mais pragmático, e não só por isso - mas também porque vive muito mais o presente – já não alimenta as mesmas utopias. Mas se ele tem pressa, é também porque todos têm pressa, como já observamos, e por isso valorizam a pressa, ou medem o valor das coisas pela pressa. A rapidez dos transportes é apenas outro aspecto – talvez o mais visível – desse mundo cada vez mais veloz. Ora, a Justiça do Trabalho também tem pressa. Face ao espírito neoliberal e mesmo pós-moderno, o simples fato de ser um órgão do Estado já a faria submergir numa crise de legitimidade; mas como o próprio trabalho humano por conta alheia tem sido ainda mais depreciado, ela também se deprecia, e o modo mais simples de resgatar o prestígio perdido – também em sintonia com os novos tempos - é mostrar números, bater recordes, dar show. É claro que a preocupação com o tempo também se explica – e se justifica – pela percepção de que uma sentença tardia é sempre injusta. Mas até mesmo uma percepção como esta pode ter se tornado mais viva a partir do momento em que todos ficaram com pressa, ou com mais pressa, seja para caminhar, trabalhar, emitir opiniões ou trocar canais da TV. Seja como for, é evidente que as novas exigências têm o seu lado positivo. O problema é a sua outra face. A cultura da rapidez, a competição pelas estatísticas e até a preocupação com a imagem podem provocar instruções menos cuidadosas, juízes mais impacientes e estressados, terceirizações crescentes nos julgamentos e menos tempo para estudos e reflexões. Sob esses aspectos, uma lei casuísta como esta – e que, em vários pontos, parece caminhar para trás – tem mais chances de ser aplicada em sua literalidade – ou seja, com pressa – do que pensadamente, como elemento de um verdadeiro processo. A menos que o juiz, por sua conta, negocie com o tempo, ou com as pressões que recebe, cadenciando um pouco os seus ritmos. Na verdade, do mesmo modo que o slow tem se oposto ao fast23 em várias dimensões da vida social, o juiz criativo, estudioso, idealista e paciente conta com elementos a seu favor, no que podemos considerar uma outra contradição dos novos tempos. 6. O juiz e suas novas possibilidades Em meados do século passado, escrevia o grande Eduardo Couture: O juiz é um homem que se move dentro do direito como o prisioneiro dentro de seu cárcere. Tem liberdade para mover-se e nisso atua sua vontade; o direito, entretanto, lhe fixa limites muito estreitos, que não podem ser ultrapassados. O importante, o grave, o verdadeiramente transcendental do direito não está no cárcere, isto é, nos limites, mas no próprio homem. 24

Hoje, se o juiz continua no cárcere, parece que o seu espaço se alarga. As constrições que inão impedem que ele se sinta diferente, ou queira ser diferente, comparado ao juiz de ontem. 21

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Veja-se, por exemplo, o “slow food”, que acabou se tornando “slow movement” e já contagia (embora minoritariamente) vários segmentos e práticas sociais.

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COUTURE, Eduardo. Introdução ao Estudo do Processo Civil. Rio de Janeiro: José Konfino, 1951, p. 87.

VIANA, Márcio Túlio. A função judicante: entre a racionalidade taylorista e a pós-modernidade. In: In: MIESSA, Elisson; Correia, Henrique (coord.) Estudos Aprofundados da Magistratura do Trabalho, 2ª. Ed.. Salvador: Podium, 2015 Nesse sentido, Jorge L. Souto Maior e Sebastião Geraldo de Oliveira falam em “direito à desconexão”.

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Na medida de suas forças, e como já escrevemos25, o juiz dos novos tempos estende ou quer estender suas mãos por entre as grades, ávido por tocar o mundo. Se antes acompanhava os acordes de uma sinfonia, com pouca área de manobra, hoje se sente tentado a improvisar, como no jazz ou no chorinho. Não custa lembrar, a propósito, que a doutrina tem conferido aos princípios uma importância e um papel que antes não lhes atribuía, pelo menos na mesma dimensão.26 Mas é provável que a própria evolução doutrinária se ligue às aspirações – hoje, maiores - de liberdade e igualdade, já que, como dizíamos, as ideias acompanham as emoções, e vice e versa. Nesse sentido, o juiz que se apoia nos autores para aplicar um ou outro princípio e assim completar - ou mesmo corrigir - a regra é também o homem que se sente com vontade e até no direito de criar, de inovar, de expressar o seu eu, de participar ativamente da própria produção da norma jurídica. E como, digamos assim, o lugar dos princípios é sobretudo a Constituição, é nela que o juiz procura e encontra soluções que antes pareceriam fora dos autos, da lei ou do mundo. A Carta Magna dos outros tempos, que pairava muito acima de nossas cabeças, e só nos socorria nas grandes questões, é hoje a Cidadã que nos protege diariamente, mesmo nas coisas pequenas, como se passasse de deusa inacessível a santa padroeira. E é também possível que a sua ressignificação – obra dos mesmos autores – se articule igualmente com tudo isso. Além disso, como lembramos, a realidade se tornou muito mais multiforme e cambiante, pondo em crise as pretensões uniformizadoras da lei. Por várias razões as normas jurídicas - especialmente as trabalhistas - já não conseguem cumprir tão bem o seu papel, pelo menos em linha reta: presas em sua camisa de força, e pressionadas por todos os lados, também elas pedem socorro aos princípios.27 Ora, ao lançar os seus olhos para além e para cima da CLT, o juiz se faz mais juiz, se comparado àquele dos velhos tempos - o que não deixa de atender também aos desejos do homem pós-moderno, sempre em busca do mais para si. E é curioso notar como esse alargamento se reflete até fora da sala de audiências, onde o juiz - sem deixar de ser o que é - desliza com facilidade dos congressos jurídicos às manifestações políticas ou às entrevistas nos jornais ou na TV. Desse modo, se um juiz do trabalho - apesar da crise das utopias - sentir-se ainda tocado pela velha chama, e quiser de algum modo lutar o bom combate, terá ao seu dispor um arsenal quase inédito – em que pese a pressão pela rapidez ou a onda legislativa que tenta restringir seus passos, especialmente no primeiro grau. De forma inversa, porém, se o mesmo juiz, ao escolher a carreira, tiver se deixado levar menos pelo sonho de um novo mundo que por seus próprios sonhos de consumo, também terá um vasto material discursivo à sua disposição. Assim, é possível que a afirmação dos valores hedonistas, do “direito de viver bem a vida”, o afete, seja o autorizando a se defender do estresse ou a se realizar de forma mais plena - o que pode, certamente, melhorar a qualidade de suas sentenças - seja justificando eventuais negligências. Neste último caso, o mesmo contexto que o possibilita ser mais juiz o convida a ser menos juiz; cantos de sereia podem seduzi-lo a trocar compromissos com a sociedade pelos compromissos com o corpo, com o salário e o bem-estar - como de resto acontece em tantas profissões; e também aqui, como diria Couture, a dimensão do juiz dependerá do homem ou da mulher que habita dentro dele. Por outro lado, as mesmas razões que levam hoje o juiz a privilegiar os princípios conspiram a favor de uma releitura dos próprios princípios – que pode se tornar tão aberta, tão livre, a ponto de inverter o seu sentido original. É o que acontece, por exemplo, quando se diz que para proteger o trabalhador é preciso proteger a fonte de trabalho, o que implica, em última análise, desproteger o trabalhador... No limite, a mesma liberdade de interpretação, conjugada com um olhar enviesado da realidade, pode levá-lo a questionar a própria essência – protetora - do Direito do Trabalho, devolvendo-o ao seu porto de origem, de forma a transformá-lo, na prática, a um simples ramo do Direito Civil. É claro que não se pode pretender que o juiz seja diferente dos outros homens, o que o faria retornar à condição divina. Também ele pode voltar os olhos para a sua saúde, para o seu corpo ou mesmo para o seu ego. Mas ainda assim é possível conciliar ideias e emoções. Na verdade, se ele optar por um caminho mais 25

VIANA, Márcio Túlio. Op. Cit., p. 195.

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Sobre a matéria, no nosso campo, além da obra clássica de Plá Rodriguez, veja-se o pequeno-grande livro de DELGADO, Maurício Godinho. Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2010.

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FERRARESE, Maria Rosaria. Op. cit., passim. O enfraquecimento das regras tem gerado reações opostas, como a tendência à criminalização de tudo. Talvez se possa dizer o mesmo quanto à super-vigilância de todos sobre todos.

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solidário, ou mais sensível à questão social, estará também escolhendo, de certo modo, uma boa “qualidade de vida”, assim como estará valorizando a própria função e afirmando a sua personalidade. Nesse passo, é importante notar, com vários autores,28 como o esvaziamento dos grandes projetos, valores e instituições tem dificultado a busca de um sentido para as nossas vidas. Ao contrário de antes, em que as utopias eram fortes e as opções já estavam à nossa espera – capitalismo ou comunismo, por exemplo – hoje as escolhas se multiplicam, como num supermercado,29 e as nossas referências são pragmáticas e mutantes. Ora, quando busca um sentido mais humano para a norma jurídica, o juiz pode estar encontrando, também, um sentido para a sua vida. Na hipótese dessa nova lei, o juiz consciente e ativo30 - ao volante de cada processo – poderá questionar, por exemplo, se as horas extras do motorista (assim como as dos outros trabalhadores) poderão ser habituais, mesmo quando a Constituição de 1988 possibilita a interpretação contrária;31 ou se o princípio da vedação do retrocesso se limita ou não às regras constitucionais; ou se a convenção coletiva pode reduzir direitos, sejam ou não salariais, sem que haja uma real e proporcional contrapartida. Poderá ainda entender - como faz com inteligência Luiz Eduardo Gunther 32 – que “se o transporte é um direito fundamental, o motorista, que o executa, deve, também, ter garantias fundamentais” – o que o levaria a concluir, como fazem tantos autores, que mesmo aqueles direitos não formalmente inscritos na Constituição podem estar concretamente dentro dela, não podendo (também por isso) sofrer retroação. Diz um autor33 que em geral vemos o silêncio como falta, como ausência. Seria “um simples resto” da linguagem. Mas na verdade – ele ensina - o silêncio é “reduto do múltiplo”, lugar do possível. Enquanto a palavra nos limita, nos cerceia, o silêncio esconde segredos; e entre eles podem estar, também, novos sentidos para a palavra, mesmo porque “aquilo que é mais importante nunca se diz”. Transportando a lição para o nosso tema, diríamos que, seja qual for a decisão do STF, o juiz poderá encontrar – não só nos inúmeros detalhes da lei, mas sobretudo nos silêncios de suas palavras - alternativas que valorizem o trabalho e a dignidade humana. Se o fizer não estará apenas protegendo uma classe que enfrenta riscos nas estradas, mas expressando uma posição em defesa do verdadeiro espírito do Direito do Trabalho, e desse modo enriquecendo os sentidos de sua própria função.

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A comparação é de AUBERT, Nicole. L´intensité du soi. In: Aubert, Nicole (org.) L´individu hypermoderne. Paris: Éirès, 2010, p. 83.

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Como Lyotard, Bauman, Harvey, Ulrich Beck, Nicole Aubert, Sennet e tantos outros.

Sobre o ativismo judicial, cf. TEODORO, Maria Cecília Máximo. O juiz ativo e os direitos trabalhistas. São Paulo: LTr, 2007. Nesse sentido, veja-se o trabalho pioneiro de ABDALLA, Wantuil. Horas Extras Habituais – Nunca Mais. In: Suplemento Trabalhista LTr, ano XXV, n. 106/89. S. Paulo: LTr, 1989. Adotamos a lição em pequeno livro: Para entender o salário. S. Paulo: LTr, 2015

GUNTHER, Luiz Eduardo. Op. cit., p. 13. Citando texto de Raquel Rolnik, no Jornal Folha de São Paulo, o mesmo autor lembra que “sem possibilidade de se deslocar, não se tem acesso à saúde, à educação, à alimentação, ao lazer”. ORLANDI, Eni Puccinelli. As formas do silêncio. Campinas: Unicamp, 2007, passim.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABDALLA, Wantuil. Horas Extras Habituais – Nunca Mais. In: Suplemento Trabalhista LTr, ano XXV, n. 106/89. S. Paulo: LTr, 1989. AUBERT, Nicole. L´intensité du soi. In: Aubert, Nicole (org.) L´individu hypermoderne. Paris: Éirès, 2010 BASTIDE, Roger. Brasil, terra de contrastes. São Paulo: Difel, 1969 BAUDRILLARD, Jean. La société de consommation. Paris: Denoel, 1970. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, Coimbra, 1991. COUTURE, Eduardo. Introdução ao Estudo do Processo Civil. Rio de Janeiro: José Konfino, 1951 DELGADO, Gabriela Neves. Direito Fundamental ao Trabalho Digno. São Paulo: LTr, 2015 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. S. Paulo: LTr, 2014 DELGADO, Maurício Godinho. Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2010. DEVEALI, Mario. El Derecho del Trabajo en su aplicacion y tendencias. Buenos Aires: Astrea, 1953. FERRARESE, Maria Rosaria. Le istituzioni della globalizzazione. Bologna: Il Mulino, 2000 GEMIGNANI, Tereza Aparecida; GEMIGNANI, Daniel. Motorista Profissional: análise específica e contextualizada das Leis nos. 12.619/2012 e 13.103/2015. In: MIESSA, Elisson; Correia, Henrique (coord.) Estudos Aprofundados da Magistratura do Trabalho, 2ª. Ed.. Salvador: Podium, 2015. GUNTHER, Luiz Eduardo. Prefácio. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard. (org.). Motorista profissional - Aspectos críticos à Lei n. 13.103/2015 - Análise do novo referencial normativo, com remissões à Lei n. 12.619/2012. São Paulo: LTr, 2015 HARVEY, David. A condição pós-moderna. S. Paulo: Loyola, 1992. MOURA, Daniel Dias de. Intervalo intrajornada dos motoristas e cobradores previsto na Lei n. 13.103/2015: o limite da negociação coletiva. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard (org.). Motorista profissional - Aspectos críticos à Lei n. 13.103/2015 - Análise do novo referencial normativo, com remissões à Lei n. 12.619/2012. São Paulo: LTr, 2015 PASSOS, Edésio. Apresentação. In: PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard. PASSOS, André Franco de; PASSOS, Edésio: NICOLADELI, Sandro Lunard (org.). Motorista profissional - Aspectos críticos à Lei n. 13.103/2015 - Análise do novo referencial normativo, com remissões à Lei n. 12.619/2012. São Paulo: LTr, 2015 REIS, Daniela Muradas. O princípio da vedação do retrocesso no Direito do Trabalho. S. Paulo: LTr, 2006. RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2015 SINGER, Ben. Modernidade, hiperestímulo e o início do sensacionalismo popular. In: CHARNEY, Leo; SCHWARTZ, R. (org.). O cinema e a invenção da vida moderna. São Paulo: Cosac & Naify, 2001 TEODORO, Maria Cecília Máximo. O juiz ativo e os direitos trabalhistas. São Paulo: LTr, 2007. VIANA, Márcio Túlio. A função judicante: entre a racionalidade taylorista e a pós-modernidade. In: MIESSA, Elisson; Correia, Henrique (coord.) Estudos Aprofundados da Magistratura do Trabalho, 2ª. Ed.. Salvador: Podium, 2015 VIANA, Márcio Túlio. Para entender o salário. S. Paulo: LTr, 2015 ________________________

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Revista Jurídica Digital RTM FUTURO DA JUSTIÇA DO TRABALHO*

Antônio Álvares da Silva1 A Justiça do Trabalho tem suscitado, nos dias que correm, polêmicas acirradas, em virtude da drástica redução de verbas de seu orçamento: 40% no custeio e 90% no investimento. Para discutir a questão, é preciso ficar claro o ponto sobre o qual se discute. Caso contrário, haverá desvio do real objeto e perderemos a oportunidade a oportunidade de aperfeiçoar nossas instituições democráticas para torná-las ferramentas cada vez mais úteis ao povo e ao país. A primeira distinção deve logo ser colocada: uma coisa são direitos trabalhistas (aviso prévio, 13º, proteção contra a dispensa, FGTS), etc. Outra, bem diferente, é a organização estrutural da Justiça do Trabalho e o procedimento adotado para a solução dos conflitos trabalhistas. Uma reforma para retirar direitos trabalhistas é ilógica e inaceitável, porque tais direitos constituem o único patrimônio do trabalhador. É graça a eles que se faz um equilíbrio entre a força econômica do capital e as reivindicações sociais. O capital busca sempre vantagens econômicas. Já o trabalhador luta por melhores condições de vida. É assim em todos os países. Não existe no mundo atual nação que não tenha direitos de proteção aos empregados. E estes direitos – isto precisa ficar bem claro – não são nem nunca foram a causa dos desarranjos da economia que hoje abateram sobre nosso país: inflação, desemprego, corrupção e impeachment, PiB baixo, economia deficitária. Portanto criar e proteger direitos sociais é a mais bela e necessária missão do Estado Democrático de Direito e um de seus constantes e inadiáveis objetivos. Outro fato, bem diferente, é a solução de conflitos trabalhistas. Mauro Cappelletti, famoso jurista italiano, afirmou que o processo do trabalho e sua tradicional demora, aqui e alhures, “é um dos escândalos mais intoleráveis ” (sic) do direito processual moderno”. ( Veja-se o livro Proceso, Ideologias, Sociedad. Buenos Aires: Ed. Juridicas Europa-America, 1974, página 226. “El proceso en materia asistencial y del trabajo es hoy uno de los escándalos más intolerables de nuestro sistema procedimental.” Por isto, há uma tendência universal de mudança do processo do trabalho. No Brasil, chegou a hora de realizá-la. O que aqui temos é também um “escândalo”. Não podemos admitir que o conflito trabalhista, quando percorre todas as instâncias, dure em torno de 6 anos e se gastem para custeá-lo 17 bilhões de reais. O custo unitário de cada reclamação é de R$ 4.680 e acúmulo em todas as instâncias: Varas, TRTs, TST.( Dados do TST). O processo desliza vagarosamente por uma impressionante e caríssima burocracia, que só serve para emperrar-lhe o andamento em vez de facilitar a solução do litígio. Deve ficar claro que esta demora não se debita ao juiz do trabalho, que se empenha até o limite máximo de suas forças e saúde em todas as instâncias, para enfrentar a onda avassaladora. Nem muito menos ao servidor, que é na jurisdição do trabalho, um dos mais qualificados do país. O problema está no processo, ou seja, nos meios de solução do litígio, que são arcaicos, demorados, burocráticos e infestados de recursos inúteis e desnecessários. Está na hora de remover este obstáculo, para dotarmos o elemento humano que atua na Justiça do Trabalho dos meios necessários para praticar um processo moderno, barato, atual, desburocratizado e econômico. Quais são as propostas? Vamos enumerá-las. Primeiramente, há que instituir meios extrajudiciais de conciliação. As comissões paritárias, previstas no art. 525-A da CLT devem ser instituídas e incentivadas. A competência deve ser elastecida. Não havendo conciliação, poderiam transformar-se em órgão arbitral preliminar, que deverá resolver o conflito em no máximo um mês. A parte que por ventura ficar insatisfeita com o resultado poderá submeter o caso à Vara competente que decidirá, através de sentença sintética e objetiva, mantendo ou corrigindo a solução arbitral. Trata-se assim de um tipo misto de arbitragem e jurisdição, que servirá de transição até que a cultura do país mude e empregados e empregadores se compenetrem de que a melhor solução, a mais rápida e barata que existe, é mesmo a conciliação e a arbitragem fora da máquina pesada e lenta e cara do Judiciário. 1

Professor titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da UFMG Desembargador Federal do Trabalho (aposentado). Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG.

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O STF declarou inconstitucional a passagem obrigatória pelas comissões prévias, numa decisão absurda, conservadora e desatualizada. Foi sem dúvida um dos piores momentos de sua história, demonstrando neste aspecto o atraso, em relação ao que se passa no mundo. É difícil compreender que nossa mais alta Corte não saiba que hoje a tendência universal da Ciência do Direito é criar órgãos extrajudiciais para a solução de conflitos, já que o Judiciário não suporta a enchente de processos que o inunda, ocasionando atrasos que prejudicam as partes e encarecem desnecessariamente o custo dos litígios, geralmente constituídos de pequenas causas do cotidiano do cidadão que nem sequer deveriam ser trazidas ao Judiciário. Lembre-se ainda que a o art.625-F dá às comissões o prazo de apenas 10 dias para tentar o acordo. Se as partes conciliarem, ambas ganham 6 anos de economia de tempo, que seria a duração do processo. Se não se conciliarem o prazo de 10 dias não prejudica em nada a duração da reclamação. Onde está a inconstitucionalidade? A reclamação trabalhista, na grande maioria dos casos, pode e deve ser resolvida fora do Estado. Uma emenda constitucional deverá corrigir este notável erro do Supremo e restabelecer o bom-senso. Outros meios extrajudiciais poderão ser estabelecidos por convenção coletiva, de comum acordo, ficando neste caso precluso o acesso ao Judiciário. Depois do julgamento em primeiro grau, só será permitido recurso ao TRT mediante depósito do valor total da condenação. Por solicitação do reclamante, o juiz de primeiro grau autorizará o levantamento da quantia depositada. Se a sentença for reformada no TRT, o Fundo de Garantia de Indenizações Trabalhistas, criado pelo art.3º da Emenda Constitucional 45/03, garantirá o retorno ao empregador da quantia paga ao empregado, caso este não disponha de meios de fazê-lo. Recurso para o TST só em questões de direito, sem prejuízo da execução definitiva. O juiz do trabalho ficará com a competência expressa de aplicar multas administrativas nos processos de sua competência. Multas serão também aplicadas ao empregado e ao empregador que propuserem reclamações ou defesas infundadas. É preciso restituir o elemento ético nos litígios trabalhistas. O empregado só deve pedir o que tem direito e o empregador não deve protelar o que tem a obrigação de pagar imediatamente. Não se pode transformar a reclamação trabalhista num emprego de capital pelo empregador, que paga seis anos depois o que deveria ter pago 6 anos antes, a juros de 1% ao mês, enquanto os cartões de crédito, apenas para dar um exemplo, cobram mais de 400%. Estas simples medidas farão a reforma do processo do trabalho e agilizarão com toda certeza a reclamação trabalhista, diminuindo drasticamente seu volume e reduzindo-a aos casos em que há real necessidade da intervenção do Judiciário. Oxalá alguém de bom-senso me ouça e leve ao Congresso, nas propostas da reforma que se pretende fazer, estas sugestões que, transformadas numa lei de poucos artigos (cujo anteprojeto já tenho pronto, à disposição de qualquer interessado) modernizará o processo do trabalho em nosso país. É preciso ficar claro que a Justiça do Trabalho não passará pela crise atual sem reformas profundas, já anunciadas em termos gerais por autoridades do governo provisório atual. É melhor, portanto, que nos adiantemos com propostas concretas, antes que se proponha, como alguns já defendem, a sua inclusão na Justiça Comum, cível, penal ou federal. Se isto acontecer, ficará perdida a experiência de 73 anos da vitoriosa experiência brasileira no trato da questão trabalhista com a CLT, uma das melhores leis que se conhece no Direito Comparado, desde que dela se retirem o excesso de recursos e se limite o acesso a instâncias superiores, valorizando assim a primeira instância, a brava e valorosa linha de frente do Judiciário, em qualquer lugar do mundo. É preciso que removamos da jurisdição do trabalho o espírito demandista que protela o recebimento do crédito alimentar e custa 17 bilhões aos cofres públicos, além de fomentar a insatisfação social. É certo que a Justiça do Trabalho não recuperará a drástica redução de verbas que foram retiradas de seu orçamento. Portanto é melhor que proponha medidas simplificadoras, tais como aqui sugeridas, pois com o corte, torna-se impossível movimentar a velha máquina nos padrões anteriores já definitivamente superados. Se lutar apenas por mais verbas em vez de lutar por reformas profundas, correrá realmente o risco de existir como jurisdição autônoma, simplesmente porque se tornará inviável.

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Sujeitando-se, entretanto, às necessárias reformas, continuará na frente, inovando com um processo novo, simplificado e eficiente que servirá de modelo ao processo comum, e e não o contrário, como vem hoje acontecendo. Por muito menos dinheiro e com muito mais eficiência poderemos resolver o conflito trabalhista. Dispomos de um quadro altamente qualificado de juízes e servidores capazes de tornar realidade o anseio de justiça social. Só com a cooperação do capital e o trabalho, pela negociação permanente de seus interesses, é que construiremos as condições de vencer a crise que nos assola. Está na hora de pôr termo ao “intolerável escândalo” da demora do processo trabalhista a que se referiu Cappelletti e também de aproximar o capital e o trabalho para que, com a cooperação entre ambos, possam produzir riqueza e criar empregos, gerando bens e serviços de que o país tanto precisa, para emergir da crise em que se encontra mergulhado. *Este texto é um versão ampliada de artigo que foi publicado no jornal Hoje em Dia, em 2.6.16.

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Conteúdo e alcance do dever de fundamentação das decisões judiciais no processo do trabalho

Cleber Lúcio de Almeida1

Introdução O presente trabalho tem por objetivo verificar a possibilidade de aplicação do art. 489, § 1º, do CPC de 2015, que trata da fundamentação das decisões judiciais, no processo do trabalho. O texto é dividido em seis partes. Na primeira parte, será examinada a relação entre o art. 769 da CLT e o art. 15 do CPC de 2015. Na segunda, ter-se-á em perspectiva a fundamentação das decisões judiciais como direito das partes e dever do juiz. A terceira e quarta partes serão reservadas à definição do conteúdo e alcance da fundamentação das decisões judiciais no direito processual do trabalho e no direito processual civil, respectivamente. Na quinta parte, serão mencionados as Enunciados sobre a fundamentação das decisões judiciais aprovados em Seminário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados e no V Encontro do Fórum Permanentes de Processualistas Civis. Ao final, serão apresentadas as conclusões sobre o tema colocado em destaque, na intenção de fornecer subsídios para enfrentar a problemática que ele envolve. 1. A relação entre o art. 769 da CLT e o art. 15 do CPC de 2015. Ante de examinar a possibilidade de aplicação do art. 489, § 1º, do CPC de 2015 no processo do trabalho, cumpre esclarecer a relação entre o art. 769 da CLT e o art. 15 do CPC de 2015, na medida em que ambos tratam das formas e condições para afastar eventuais lacunas do direito processual do trabalho. Dispõe o art. 769 da CLT que “Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título”, ao passo que, consoante o art. 15 do CPC de 2015, “Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”. Por força dos arts. 769 da CLT e 15 do CPC de 2015, a aplicação do direito processual comum como fonte do direito processual do trabalho pressupõe a existência de omissão do direito processual do trabalho e dar-se-á de forma subsidiária (o que ocorrerá quando o direito processual do trabalho não disciplinar um instituto ou uma situação específica) e supletiva (o que se dará quando o direito processual do trabalho disciplinar um instituto ou uma situação específica, mas o fizer de forma incompleta, do ponto de vista da garantia de acesso à justiça e da adequada, efetiva e tempestiva tutela dos direitos assegurados pela ordem jurídica, o que equivale dizer que fonte supletiva é aquela que atua na hipótese da denominada omissão ontológica). Como as normas jurídicas constituem gênero de que são espécies as regras e os princípios, os arts. 769 da CLT e 15 do CPC de 2015 devem ser entendidos no sentido de que, nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária e supletiva do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as suas regras e os seus princípios.

O CPC de 2015 não revogou, no particular, a CLT.

Primeiro, porque o CPC não regulou inteiramente as formas e condições para afastar lacunas do direito processual do trabalho. É que o art. 769 da CLT estabelece, como condição para a adoção do direito processual comum como fonte subsidiária do direito processual do trabalho, a realização de um controle axiológico prévio ou controle prévio de aptidão social, o que decorre da exigência, nele expressa, de compatibilidade entre o direito processual do trabalho e a norma de direito processual comum a ser importada para aplicação no processo do trabalho, o que não é previsto no art. 15 do CPC de 2015.2

1

2

Juiz do Trabalho. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da PUC/MG. Pós-doutor em Direito pela Universidad Nacional de Córdoba/ARG. Doutor em Direito pela UFMG. Mestre em Direito pela PUC/SP.

O art. 769 da CLT está em sintonia com a advertência de Maria do Rosário Palma Ramalho, no sentido de que “a aplicação das normas civis no domínio laboral não prescinde (...) de um controlo axiológico prévio, destinado a aferir da adequação, in concreto, da norma em questão aos valores laborais - é a operação que GAMILLSCHEG designou controle prévio da ‘aptidão social’ (...) das normas civis na sua aplicação laboral” (Da autonomia dogmática do direito do trabalho. Coimbra: Almedina, 200, p. 998-999), o que alcança as normas processuais. O controle axiológico prévio ou controle prévio de aptidão social,

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Segundo, porque o art. 769 da CLT define como fonte subsidiária do direito processual do trabalho, o direito processual comum, ao passo que o art. 15 do CPC como tal define o Código de Processo Civil, observando-se que o CPC não abarca todo o direito processual civil e, muito menos, todo o direito processual comum, no qual está incluído o direito processual penal. Terceiro, porque o direito processual do trabalho é um direito processual especial3, na medida em que disciplina a solução de conflitos de interesses de natureza especial - conflitos que envolvem a relação de trabalho, notadamente, da relação de trabalho subordinado -, e a norma especial prevalece sobre a comum, o significa que a compatibilidade exigida pelo art. 769 da CLT não é afastada pelo art. 15 do CPC de 2015.

Quarto, porque não ocorreu revogação expressa de uma norma (art. 769 da CLT), pela outra (CPC).

A hipótese, portanto, não é de revogação do art. 769 da CLT pelo art. 15 do CPC de 2015, mas de uma relação de complementariedade entre eles. O art. 769 da CLT não foi revogado pelo art. 15 do CPC de 2015. Estes dois dispositivos legais são complementares: o art. 769 da CLT aduz à compatibilidade necessária para a aplicação do direito processual civil como fonte do direito processual do trabalho, o que é estranho ao art. 15 do CPC de 2015; o art. 15 do CPC permite a aplicação do direto processual civil como fonte não apenas subsidiária, como também supletiva do direito processual do trabalho, o que não é previsto, ao menos expressamente, no art. 769 da CLT. Ademais adotando como parâmetro a doutrina do diálogo das fontes, é afirmado que, ao invés de fazer com que uma das normas em destaque se sobreponha à outra, devem elas dialogar entre si, para, a partir deste diálogo, ser estabelecida solução que conduza à realização concreta do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional adequada, efetiva e tempestiva dos direitos assegurados pela ordem jurídica, notadamente dos direitos humanos e fundamentais.4 2. A fundamentação das decisões judiciais como direito das partes e dever do juiz. A Constituição da República de 1988 a todos reconhece o direito à tutela jurisdicional (art. 5º, XXXV) e dispõe, no art. 93, IX, que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as suas decisões, sob pena de nulidade. Destarte, o juiz, ao responder ao pedido de tutela jurisdicional deverá apontar as suas razões de decidir, em relação às questões, de fato e de direito, suscitadas pelas partes ou apreciáveis de ofício, sob pena de nulidade da decisão. Isto significa que as partes têm o direito à fundamentação das decisões judiciais.

Além de expressamente reconhecido no art. 93, IX, da Constituição, o direito à fundamentação das decisões judiciais constitui um corolário do direito ao devido processo constitucional e legal e uma manifestação do Estado Democrático de Direito, compondo, ainda, o complexo de direitos que conformam o processo justo.5 A hipótese é de direito fundamental processual, que decorre dos princípios de direito processual adotados pela Constituição (art. 5º, § 2º, da Constituição), e, ainda, de um direito humano processual, como tal reconhecido, por exemplo, no art. X da Declaração Universal dos Direitos Humanos, dispositivo no qual a fundamentação apresenta-se como corolário do direito ao justo processo e uma das formas de sua manifestação, que é a publicidade do processo judicial, entendida a publicidade no seu sentido mais amplo, ou seja, para que é expressamente imposto pelo art. 769 da CLT, decorre do caráter especial do direito processual do trabalho e atua como fator de proteção das opções traduzidas pelas suas regras e princípios. 3

Ao aludir ao direito processual comum, o art. 769 da CLT deixa claro que o direito processual do trabalho é de natureza especial.

4

O critério da realização concreta dos direitos fundamentais para aferir a adequação e efetividade da tutela jurisdicional dos direitos, embora importante, não é satisfatório, na medida em que olvida os direitos humanos, que, assim como os direitos fundamentais, são inerentes à dignidade humana.

5

Entende-se por processo justo aquele ao qual se tem acesso fácil e simplificado e que se desenvolve, também de forma simplificada, publicamente, perante juiz previamente apontado como competente, independente e imparcial, em que sejam respeitados o direito das partes ao pleno exercício, com liberdade e em simétrica paridade, do contraditório e da ampla defesa e que seja informado pela finalidade de, em tempo razoável e sem dilações indevidas, com o menor dispêndio econômico possível e de forma fundamentada, concretizar o direito atribuído e garantido pelas normas constitutivas do ordenamento jurídico democraticamente instituído.

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também englobar a ciência das razões de decidir na fixação dos direitos e deveres das partes.6 Ao direito das partes à fundamentação das decisões judiciais corresponde, para o juiz, o dever de proferir decisões fundamentadas. A fundamentação das decisões judiciais participa da legitimação da atuação do Poder Judiciário e serve de remédio contra decisões judiciais arbitrárias. Estabelecida a existência do direito à fundamentação e do dever de fundamentar, cumpre definir as funções da fundamentação, como condição para precisar o conteúdo do direito e do dever já assinalados. A fundamentação das decisões cumpre função: a) endoprocessual, na medida em que é a ciência das razões de decidir que permite às partes exercer o direito ao controle das decisões por meio do exercício do direito ao duplo grau de jurisdição, e, às instâncias superiores, exercer a sua função de controle das decisões das instâncias inferiores (a fundamentação é que torna possível o controle interno das decisões judiciais); b) extraprocessual, posto que a fundamentação garante a possibilidade de controle da atividade jurisdicional pela sociedade (a fundamentação permite o controle externo das decisões judiciais);7 c) endo e extraprocessual, que é a de contribuir para a formação da jurisprudência e dos precedentes, e, com isto, para a definição do que constitui direito em determinadas situações fático-jurídicas, condição em que atua como orientação para as relações sociais.8 3. Conteúdo e alcance da fundamentação das decisões judiciais no direito processual do trabalho. A Constituição da República impõe a fundamentação das decisões judicias, mas não define o alcance e o significado dos fundamentos. A CLT inclui a fundamentação entre os requisitos essenciais da decisão judicial (art. 832, caput), observando-se que, embora a CLT faça, no art. 832, caput, distinção entre a apreciação da prova e fundamentação, estas operações fazem parte do processo de construção das razões de decidir a respeito das questões de fato e de direito suscitadas pelas partes ou apreciáveis de ofício. Com mais propriedade, portanto, o art. 458, II, do CPC de 1973 prevê que, nos fundamentos, o juiz analisará as questões de fato (o que envolve a apreciação da prova) e de direito. Na busca de parâmetros fornecidos pelo direito processual do trabalho para aferir o cumprimento do mandamento constitucional de fundamentação das decisões judiciais, nos deparamos com o art. 897-A da CLT, que, admitindo a interposição de embargos de declaração na hipótese de obscuridade, contradição ou omissão, fornece um valioso indicativo do conteúdo necessário da fundamentação: a fundamentação deve ser 6

Estabelece o art. X da Declaração Universal dos Direitos Humanos que “Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um Tribunal independente e imparcial, para decidir sobre de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ela”. O direito à fundamentação das decisões judiciais compõe o mínimo existencial processual estabelecido pelas normas de Direito Internacional dos Direitos Humanos e pela Constituição. O conceito e o conteúdo do mínimo existencial processual foram examinados com mais profundidade em nosso Elementos da teoria geral da prova: a prova como direito humano e fundamental das partes do processo judicial. São Paulo: LTr, 2013.

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O controle da decisão abarca a verificação da imparcialidade do juiz e da juridicidade da decisão (e não simples legalidade, posto que o ordenamento jurídico é composto por regras e princípios), acrescentando-se que não há possibilidade se controle quando não se tem plena ciência do raciocínio que conduziu à formação da convicção do juiz, não podendo ser desconsiderado, neste sentido, que a exigência de fundamentação está diretamente relacionada com a tentativa de evitar decisões arbitrárias, ou seja, baseadas apenas na íntima convicção do juiz.

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Não se confundem jurisprudência, súmula e precedentes. A jurisprudência é formada, nos tribunais, por meio de reiteradas decisões em um mesmo sentido. A súmula contém o enunciado correspondente à jurisprudência predominante no tribunal que a edita. O precedente corresponde aos fundamentos, fáticos e jurídicos, de determinada decisão ou de um conjunto específico de decisões, ou seja, à sua ratio decidenti (na aplicação do precedente, o julgador irá verificar se a ratio decidenti de uma decisão ou de um conjunto específico de decisões pode ser aplicada ao caso a ser julgado). A distinção entre jurisprudência e precedente é quantitativa: a jurisprudência corresponde a uma pluralidade de decisões, ao passo que o precedente diz respeito a uma determinada decisão ou a um conjunto específico de decisões e qualitativa: a jurisprudência possui, como regra, eficácia apenas persuasiva, enquanto os precedentes possuem eficácia vinculante. No confronto entre súmula e precedente, vale mencionar que a súmula é editada visando a solução de casos futuros, ao passo que a identificação de um precedente ocorre no futuro, quando do julgamento de um caso concreto (neste julgamento, o julgador irá verificar se irá verificar se a ratio decidenti de uma decisão ou de um conjunto específico de decisões pode ser aplicada ao caso a ser julgado), acrescentando-se que as súmulas em regra somente possuem eficácia persuasiva, o que não corre com os precedentes, que são vinculantes. Anote-se, ainda, que os tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência, cujo enunciado pode ser traduzido em uma súmula. No entanto, apenas os tribunais superiores criam precedentes. Registre-se, ainda, que o art. 927, III, do CPC de 2015 estabeleceu uma espécie de jurisprudência vinculante, que é a traduzida por acórdãos proferidos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos repetitivos.

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clara e precisa, isto é, definir, com clareza e precisão, as razões que levaram ao estabelecimento dos direitos e obrigações das partes, e, ainda, ser completa, no sentido de não ser omissa em relação a ponto ou questão sobre o qual deveria pronunciar-se o juiz diante da sua relevância sobre a solução da demanda.9 A completude da fundamentação é também estabelecida pelo art. 852-I da CLT, segundo o qual a sentença mencionará os elementos de convicção do juiz, o que significa que devem ser apontadas na decisão todas as razões de decidir do juiz, o que constitui, inclusive, uma da exigência da publicidade dos atos processuais decisórios. Assim, a completude da fundamentação significa a falta de omissão quanto a ponto ou questão relevante para a decisão do conflito de interesses submetido ao Poder Judiciário e o esclarecimento de todas as razões de decidir do juiz. A esta altura, pode ser afirmado que, no processo do trabalho, a fundamentação deverá conter as razões de decidir em relação às questões de fato e de direito, suscitadas pelas partes ou apreciáveis de ofício, e que estas razões de decidir devem ser claras, precisas e completas. A CLT dá um passo adiante, quando, no art. 895, § 1º, IV, estabelece que o acórdão, no caso de a sentença proferida no procedimento sumaríssimo ser confirmada, consistirá unicamente na certidão de julgamento, com a indicação suficiente das razões de decidir do voto prevalente. Destarte, a CLT exige a suficiência da fundamentação. Portanto, a fundamentação deve conter, de forma suficiente, as razões de decidir do juiz. No entanto, não se pode olvidar que o direito processual do trabalho prima pela concisão, como o demonstram, na CLT, o art. 840, § 1º, (segundo o qual a petição inicial deverá conter um breve relato dos fatos de que resulte), o art. 852-I (que dispensa o relatório nas sentenças proferidas no procedimento sumaríssimo) e o art. 895, § 1º, IV (que estabelece, em relação ao julgamento de recurso ordinário concernente ao procedimento sumaríssimo, que, se a sentença for confirmada pelos seus próprios fundamentos, a certidão de julgamento, registrando tal circunstância, servirá de acórdão).10 Nesta perspectiva, é lícito concluir que, no processo do trabalho, a fundamentação deve conter, de forma clara, precisa, completa, suficiente e concisa, as razões de decidir do juiz sobre as questões, de fato e de direito, enfrentadas na decisão. Existe outro parâmetro para aferir a suficiência da fundamentação das decisões judiciais, que é inferida do art. 794 da CLT, segundo o qual, nos processos sujeitos à apreciação da Justiça do Trabalho, só haverá nulidade quando resultar dos atos inquinados manifesto prejuízo às partes litigantes. Sob este prisma e considerando as funções da fundamentação, esta será insuficiente quando não permitir a controlabilidade interna e externa da decisão. Não se olvide que não há nulidade quando o ato processual, em que pese não atender a todos os seus requisitos de eficácia jurídica, atende à finalidade a que se destina (princípio da instrumentalidade das formas). De outro lado, cumpre recordar que, no direito processual do trabalho, eventual contrariedade a súmula, jurisprudência ou precedente não é causa de nulidade, como deixa claro o art. 896, alínea a e § 10, da CLT, quando autoriza a interposição de recurso de revista na hipótese de contrariedade a súmula, inclusive vinculante, e divergência jurisprudencial. Importa acrescentar, por fim, a exigência de adequação da decisão ao caso concreto, constante do art. 852-I, § 1º, da CLT, que deixa clara a restrição do direito processual do trabalho às decisões genéricas. Como assinala Michele Taruffo, o respeito aos precedentes e à jurisprudência está inserido no debate entre o universalismo jurídico, fundado “essencialmente sobre a ideia de que existem regras gerais destinadas a serem aplicadas de forma uniforme pelos tribunais, e que a respectiva decisão se justifica apenas se o caso particular que é objeto da decisão pode ser ‘subsumido’ em uma norma geral que deve se aplicar do mesmo 9

É omissa a decisão que não se manifesta sobre pontos ou questões relevantes para a solução do conflito de interesses levado ao Poder Judiciário.

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O CPC de 1973, no art. 165, estabelece que as decisões interlocutórias serão fundamentadas, ainda que de modo conciso, o que não foi repetido no CPC de 2015. O direito processual do trabalho, como foi acima demonstrado, prima pela concisão dos atos processuais. Assim, enquanto no CPC de 2015 é exigida fundamentação exaustiva, no direito processual do trabalho o que se exige é a fundamentação suficiente e concisa.

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modo em todos os casos iguais ou semelhantes” e que “se refere à justiça como a correta interpretação dos dispositivos normativos, ou seja, aquela que se poderia chamar ‘justiça da norma’ identificada de modo autoritativo, possivelmente vinculante, com as formulações gerais, da parte dos órgãos de vértice do sistema judiciário”, e o particularismo jurídico, segundo o qual a decisão não é “fruto da aplicação mecânica das normas gerais, e, ao invés, a aplicação da norma não pode ser feita sem a referência à complexidade do caso particular sobre o qual se refere a decisão” e que se refere à “‘justiça da decisão’, relativa ao singular caso concreto, ou seja, à justiça substancial em que o juiz relaciona as normas às situações reais e efetivas, vistas em todos os seus aspectos relevantes, que são objeto de decisão”.11 Sob este prisma, o direito processual do trabalho, considerando a exigência de adequação da decisão ao caso concreto, optou pelo particularismo jurídico. Em suma, a CLT exige que a fundamentação seja clara, precisa, completa, suficiente, concisa e adequada ao caso concreto, considera insuficiente a fundamentação que cause manifesto prejuízo à possibilidade do controle interno e externo da decisão judicial e afasta a possibilidade de equiparar o fato de o juiz deixar de aplicar súmula, jurisprudência ou procedente à ausência de fundamentação. Destarte, não há omissão do direito processual do trabalho, quanto aos parâmetros para aferir o cumprimento do mandamento constitucional de fundamentação das decisões judiciais, a ser suprida por meio do recurso ao art. 489, § 1º, do CPC, como sua fonte subsidiária ou supletiva. 4. O conteúdo e alcance da fundamentação das decisões judiciais no direito processual civil. O CPC de 1973 trata dos requisitos essenciais da sentença no art. 458, incluindo dentre eles os fundamentos, esclarecendo que, neles, o juiz analisará as questões de fato e de direito, o que é repetido no art. 489, II, do CPC de 2015. O CPC de 2015 reitera, expressamente, a exigência de fundamentação das decisões judicias (art. 11: “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”) e aponta no sentido de que ela deve ser clara e precisa (art. 298). O CPC (de 1973 e de 2015), ao tratar dos embargos de declaração, também define as situações de deficiência de fundamentação, apontando no sentido de que ela deve ser, além de clara, precisa e completa. No entanto, o CPC de 2015 foi muito além, estabelecendo, no art. 489, § 1º, as situações de ausência de fundamentação, cuja consequência é a nulidade da decisão. Com efeito, dispõe o art. 489, § 1º, do CPC de 2015 que não se considera fundamentada a decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida. Cumpre ao juiz, sob este prisma, proceder à individualização dos atos normativos aplicados na solução das questões de fato e de direito enfrentadas na decisão, ou, dito de outra forma, demonstrar a pertinência dos atos normativos invocados na decisão com a causa ou a questão decidida; II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso. Trata-se de exigência de esclarecimento do sentido atribuído a conceito jurídico indeterminado (termos vagos utilizados em atos normativos, tais como “bem comum” e “boa-fé”) invocado na decisão, o que constitui exigência relacionada com a pertinência de tal conceito com a causa ou a questão decidida; III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão. Do juiz é exigido que adote razões de decidir (motivos) que atendam às especificidades do caso concreto; IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador. Sob este enfoque, cabe ao juiz enfrentar todos os argumentos deduzidos pelas partes, inclusive aqueles que, ao menos em tese, serviriam para infirmar as suas conclusões; V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos. Ao invocar um prece11

As funções da uniformidade e justiça das cortes supremas, palestra proferida no I Colóquio Brasil-Itália de Direito Processual Civil, realizado em São Paulo em agosto de 2014.

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dente ou súmula como razão de decidir, o juiz deve identificar os seus fundamentos, fáticos e jurídicos, determinantes e demonstrar a sua pertinência ao caso concreto, ou, dito de outra forma, demonstrar a inexistência distinção entre aqueles fundamentos e o caso concreto (art. 489, § 2º, do CPC de 2015);12 VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”. Ao juiz é vedado deixar de seguir súmula, jurisprudência ou precedente invocado pelas partes sem demostrar a existência de distinção entre os seus fundamentados determinantes e o caso concreto (distinguishing) ou a sua superação (overruling).13 Nota-se, assim, que, tanto no direito processual do trabalho quanto no direito processual civil, a fundamentação deve ser clara, precisa e completa e ser adequada ao caso concreto, mas o primeiro faz opção pela fundamentação suficiente e concisa, enquanto o segundo exige a fundamentação exaustiva, com a ressalva de que o CPC de 2015 introduziu, expressamente, a vinculação aos precedentes, na perspectiva de que respeitá -los evita decisões arbitrárias, assegura maior efetividade à garantia constitucional do contraditório, serve de instrumento de combate à litigância excessiva e assegura a igualdade, a segurança jurídica (traduzida pela previsibilidade das decisões judiciais) e a maior credibilidade no Poder Judiciário. 5. Enunciados aprovados no Seminário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados. Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. No sentido de dar a conhecer os embates sob a fundamentação das decisões judiciais no contexto do CPC de 2015 serão apontados, em seguida, enunciados aprovados por magistrados e processualistas civis sobre temas a ela relacionados. A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados realizou, nos dias 26 a 28 de agosto de agosto de 2015, seminário denominado “o Poder Judiciário e o Novo Código de Processo Civil”, no qual foram aprovados vários enunciados, alguns dos quais relativos à fundamentação das decisões judiciais. Também no V Encontro do Fórum Permanente de Processualistas Civis, realizado nos dias 1º a 3 de outubro de 2015, foram aprovados enunciados sobre o tema.

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A jurisprudência referida no citado comando legal é aquela representada pelos acórdãos proferidos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos repetitivos e não a jurisprudência traduzida por decisões reiteradas de um tribunal no mesmo sentido, como permite afirmar o art. 927, III, do CPC de 2015, que ordena a observância daquele e não desta. Anote-se que: a) o incidente de assunção de competência é regulado pelo art. 947 do CPC de 2015, sendo admissível quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária, envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos e, por força da sua instauração, o recurso será julgado pelo órgão colegiado que o regimento interno do tribunal definir, vinculando o acórdão proferido todos os juízes e órgãos fracionários, exceto se houver revisão de tese (este incidente já era previsto no CPC de 1973, como se vê do seu art. 555, § 1º); b) o incidente de julgamento de demandas repetitivas é disciplinado nos arts. 976 a 987 do CPC de 2015 e constitui procedimento de julgamento de causas repetitivas de competência dos tribunais (não dos tribunais superiores, como decorre do art. 976, § 4º, de acordo com o qual o incidente não será instaurado quando um dos tribunais superiores já tiver afetado recurso para definição de tese sobre a questão de direito material ou processual repetitiva). Neste caso, o órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa obrigatória ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal e aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo se ocorrer a sua revisão; c) do julgamento de recursos repetitivos tratam os arts. 1.036 a 1.041 do CPC de 2015, sendo relevante observar que: a) decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada; b) publicado o acórdão paradigma, o presidente ou vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior; c) o órgão colegiado que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa obrigatória ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior; d) os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada no tribunal superior (o julgamento de recursos repetitivos já era previsto no CPC de 1973, como se vê do seu art. 543-B).

Por força desta previsão legal, os tribunais devem apontar nas suas decisões, preferencialmente nas respectivas ementas, os fundamentos, fáticos e jurídicos, determinantes de suas decisões, observando que os motivos determinantes da decisão a serem considerados para efeito de definição do procedente são aqueles adotados pela maioria dos membros do colegiado, tenha sido este entendimento sumulado ou não.

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Neste sentido, merecem referência os seguintes enunciados aprovados no Seminário da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados: 1. Entende-se por “fundamento” referido no art. 10 do CPC/2015 o substrato fático que orienta o pedido, e não o enquadramento jurídico atribuído pelas partes. 2. Não ofende a regra do contraditório do art. 10 do CPC/2015, o pronunciamento jurisdicional que invoca princípio, quando a regra jurídica aplicada já debatida no curso do processo é emanação daquele princípio. 6. Não constitui julgamento surpresa o lastreado em fundamentos jurídicos, ainda que diversos dos apresentados pelas partes, desde que embasados em provas submetidas ao contraditório. 7. O acórdão, cujos fundamentos não tenham sido explicitamente adotados como razões de decidir, não constitui precedente vinculante.

8. Os enunciados das súmulas devem reproduzir os fundamentos determinantes do precedente.

9. É ônus da parte, para os fins do disposto no art. 489, § 1º, V e VI, do CPC/2015, identificar os fundamentos determinantes ou demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento, sempre que invocar jurisprudência, precedente ou enunciado de súmula. 10. A fundamentação sucinta não se confunde com a ausência de fundamentação e não acarreta a nulidade da decisão se forem enfrentadas todas as questões cuja resolução, em tese, influencie a decisão da causa. 11. Os precedentes a que se referem os incisos V e VI do § 1º do art. 489 do CPC/2015 são apenas os mencionados no art. 927 e no inciso IV do art. 332. 12. Não ofende a norma extraível do inciso IV do § 1º do art. 489 do CPC/2015 a decisão que deixar de apreciar questões cujo exame tenha ficado prejudicado em razão da análise anterior de questão subordinante. 13. O art. 489, § 1º, IV, do CPC/2015 não obriga o juiz a enfrentar os fundamentos jurídicos invocados pela parte, quando já tenham sido enfrentados na formação dos precedentes obrigatórios. 19. A decisão que aplica a tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos não precisa enfrentar os fundamentos já analisados na decisão paradigma, sendo suficiente, para fins de atendimento das exigências constantes no art. 489, § 1º, do CPC/2015, a correlação fática e jurídica entre o caso concreto e aquele apreciado no incidente de solução concentrada. 40. Incumbe ao recorrente demonstrar que o argumento reputado omitido é capaz de infirmar a conclusão adotada pelo órgão julgador. 42. Não será declarada a nulidade sem que tenha sido demonstrado o efetivo prejuízo por ausência de análise de argumento deduzido pela parte. No V Encontra do Fórum Permanente de Processualistas Civis foram aprovados os seguintes enunciados relacionados à fundamentação das decisões judiciais: 162. (art. 489, §1º) Para identificação do precedente, no processo do trabalho, a decisão deve conter a identificação do caso, a suma do pedido, as alegações das partes e os fundamentos determinantes adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado. 166. (art. 926) A aplicação dos enunciados das súmulas deve ser realizada a partir dos precedentes que os formaram e dos que os aplicaram posteriormente. 167. (art. 926; art. 947, § 3º; art. 976; art. 15) Os tribunais regionais do trabalho estão vinculados aos enunciados de suas próprias súmulas e aos seus precedentes em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas. 168. (art. 927, I; art. 988, III) Os fundamentos determinantes do julgamento de ação de controle concentrado de constitucionalidade realizado pelo STF caracterizam a ratio decidendi do precedente e possuem efeito vinculante para todos os órgãos jurisdicionais. 169. (art. 927) Os órgãos do Poder Judiciário devem obrigatoriamente seguir os seus próprios precedentes, sem prejuízo do disposto nos § 9º do art. 1.037 e §4º do art. 927. 33


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170. (art. 927, caput) As decisões e precedentes previstos nos incisos do caput do art. 927 são vinculantes aos órgãos jurisdicionais a eles submetidos. 171. (art. 927, II, III e IV; art. 15) Os juízes e tribunais regionais do trabalho estão vinculados aos precedentes do TST em incidente de assunção de competência em matéria infraconstitucional relativa ao direito e ao processo do trabalho, bem como às suas súmulas. 172. (art. 927, § 1º) A decisão que aplica precedentes, com a ressalva de entendimento do julgador, não é contraditória. 173. (art. 927) Cada fundamento determinante adotado na decisão capaz de resolver de forma suficiente a questão jurídica induz os efeitos de precedente vinculante, nos termos do Código de Processo Civil. 174. (art. 1.037, § 9º) A realização da distinção compete a qualquer órgão jurisdicional, independentemente da origem do precedente invocado. 306. (art. 489, § 1º, VI). O precedente vinculante não será seguido quando o juiz ou tribunal distinguir o caso sob julgamento, demonstrando, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta, a impor solução jurídica diversa. 307. (arts. 489, §1º, 1.013, §3º, IV) Reconhecida a insuficiência da sua fundamentação, o tribunal decretará a nulidade da sentença e, preenchidos os pressupostos do §3º do art. 1.013, decidirá desde logo o mérito da causa. 308. (arts. 489, § 1º, 1.046). Aplica-se o art. 489, § 1º, a todos os processos pendentes de decisão ao tempo da entrada em vigor do CPC, ainda que conclusos os autos antes da sua vigência. 314. (arts. 926 e 927, I e V). As decisões judiciais devem respeitar os precedentes do Supremo Tribunal Federal, em matéria constitucional, e do Superior Tribunal de Justiça, em matéria infraconstitucional federal. 316. (art. 926). A estabilidade da jurisprudência do tribunal depende também da observância de seus próprios precedentes, inclusive por seus órgãos fracionários. 317. (art. 927). O efeito vinculante do precedente decorre da adoção dos mesmos fundamentos determinantes pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado. 319. (art. 927). Os fundamentos não adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão julgador não possuem efeito de precedente vinculante. 320. (art. 927). Os tribunais poderão sinalizar aos jurisdicionados sobre a possibilidade de mudança de entendimento da corte, com a eventual superação ou a criação de exceções ao precedente para casos futuros. 326. (arts. 927 e 15). O órgão jurisdicional trabalhista pode afastar a aplicação do precedente vinculante quando houver distinção entre o caso sob julgamento e o paradigma, desde que demonstre, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta, a impor solução jurídica diversa. 335. (arts. 947 e 15). O incidente de assunção de competência aplica-se ao processo do trabalho. 453. (arts. 926 e 1.022, parágrafo único, I) A estabilidade a que se refere o caput do art. 926 consiste no dever de os tribunais observarem os próprios precedentes. 454. (arts. 926 e 1.022, parágrafo único, I) Uma das dimensões da coerência a que se refere o caput do art. 926 consiste em os tribunais não ignorarem seus próprios precedentes (dever de autorreferência). 455. (art. 926) Uma das dimensões do dever de coerência significa o dever de não-contradição, ou seja, o dever de os tribunais não decidirem casos análogos contrariamente às decisões anteriores, salvo distinção ou superação. 456. (art. 926) Uma das dimensões do dever de integridade consiste em os tribunais decidirem em conformidade com a unidade do ordenamento jurídico. 457. (art. 926) Uma das dimensões do dever de integridade previsto no caput do art. 926 consiste na observância das técnicas de distinção e superação dos precedentes, sempre que necessário para adequar esse entendimento à interpretação contemporânea do ordenamento jurídico. 458. (arts. 926, 927, §1º, e 10) Para a aplicação, de ofício, de precedente vinculante, o órgão julgador 34


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Revista Jurídica Digital RTM deve intimar previamente as partes para que se manifestem sobre ele.

459. (arts. 927, §1º, 489, §1º, V e VI, e 10) As normas sobre fundamentação adequada quanto à distinção e superação e sobre a observância somente dos argumentos submetidos ao contraditório são aplicáveis a todo o microssistema de formação dos precedentes. 460. (arts. 927, §1º, 138) O microssistema de aplicação e formação dos precedentes deverá respeitar as técnicas de ampliação do contraditório para amadurecimento da tese, como a realização de audiências públicas prévias e participação de amicus curiae. Registre-se que os processualistas que participaram do Encontra acima mencionado aprovaram, inclusive, um enunciado sobre a aplicação do art. 489 do CPC de 2015 no processo do trabalho, qual seja, o Enunciado n. 304, in verbis: As decisões judiciais trabalhistas, sejam elas interlocutórias, sentenças ou acórdãos, devem observar integralmente o disposto no art. 499, sobretudo o seu §1º, sob pena de se reputarem não fundamentadas e, por conseguinte, nulas. 6. Conclusão. As decisões proferidas pelos órgãos da Justiça do Trabalho devem ser fundamentadas, visto que também no contexto do processo do trabalho a fundamentação das decisões constitui direito das partes e dever do juiz. O art. 769 da CLT não foi revogado pelo art. 15 do CPC de 2015. Estes dois dispositivos legais são complementares: o art. 769 da CLT aduz à compatibilidade necessária para a aplicação do direito processual civil como fonte do direito processual do trabalho, o que é estranho ao art. 15 do CPC de 2015; o art. 15 do CPC permite a aplicação do direto processual civil como fonte não apenas subsidiária, como também supletiva do direito processual do trabalho, o que não é previsto, ao menos expressamente, no art. 769 da CLT. A CLT estabelece que a fundamentação deve ser clara, precisa, completa, suficiente, concisa e adequada ao caso concreto, considera insuficiente somente a fundamentação que cause manifesto prejuízo à possibilidade de controle interno e externo das decisões judiciais e afasta a possibilidade de equiparar o fato de o juiz deixar de aplicar súmula, jurisprudência ou procedente à ausência de fundamentação. Não há omissão do direito processual do trabalho, no que comporta ao alcance e significado da fundamentação, a ser suprida por meio do recurso ao art. 489, § 1º, da CLT. No entanto, este fato não significa que o direito processual do trabalho e o direito processual civil não podem dialogar entre si, visando encontrar o ponto de equilíbrio entre a fundamentação suficiente e concisa, imposta pelo direito processual do trabalho, e a fundamentação exaustiva, exigida pelo direito processual civil.

De qualquer forma, cumpre observar que:

a) não há necessidade de explicar a pertinência do ato normativo invocado na decisão como razão de decidir com o caso concreto quando ela não houver sido objeto de controvérsia entre as partes; b) o juiz não está obrigado a mencionar, a cada questão de direito enfrentada, os atos normativos em que sustenta a sua decisão, valendo lembrar, por exemplo, a hipótese de decisão em que, reconhecida a identidade de função e a ausência de fatos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito à equiparação salarial, o autor tem reconhecido o direito às diferenças salariais por ele pleiteadas, situação em que não há necessidade de expressa referência ao art. 461 da CLT como ato normativo que autoriza a conclusão do juiz; c) não havendo controvérsia sobre o sentido do conceito jurídico indeterminado invocado no debate entre as partes e na decisão, não há necessidade de que nesta o seu sentido seja explicitado; d) desde que a decisão seja adequada ao caso concreto, não há nulidade pelo fato da possibilidade de as razões de decidir nela invocadas serem passíveis de utilização em demandas similares. Aliás, o instituto do julgamento de recursos repetitivos e a valorização dos precedentes demonstram que uma mesma razão de decidir pode ser utilizada em vários processos, desde que eles versem sobre a mesma situação fática e jurídica; e) ao juiz é lícito enfrentar apenas os argumentos principais (argumentos capazes de, por si só, determinar o acolhimento ou a rejeição de uma pretensão), não sendo razoável examinar argumentos que, apenas em tese, permitiram infirmar a conclusão adotada quando outros existem que, concretamente, são suficientes para justificá-la, não havendo razoabilidade na exigência de exame de argumentos sem um mínimo de rele35


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Revista Jurídica Digital RTM vância para o julgamento da demanda;14

f) a referência a precedentes e súmulas de domínio comum dispensa a identificação, na decisão, dos seus fundamentos determinantes, notadamente quando aqueles forem autoexplicativos ou não exista controvérsia entre as partes sobre a pertinência de seus fundamentos determinantes com o caso concreto; g) a imposição da obrigação de respeito a súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte afronta a Constituição da República, que somente atribuiu caráter vinculante a determinadas súmulas do STF (súmula vinculante), cuja edição atende, inclusive, a rígidos requisitos (art. 103-A, da Constituição da República).15 Ademais, se as partes já debateram sobre a súmula, jurisprudência ou precedente invocado por uma delas ou levado ao debate pelo juiz, a este é lícito, optando pela sua aplicação, apenas indicá-lo na decisão.16 A eficácia vinculante dos precedentes, se admitida a sua constitucionalidade, não dispensa o respeito à lei, por força do disposto no art. 5º, II, da Constituição. Não podem ser confundidas ausência de fundamentação com fundamentação não convincente, vez que o direito à fundamentação das decisões judicias não comporta o direito ao seu acerto e, notadamente no direito processual do trabalho, com fundamentação concisa, ou seja, fundamentação em que, embora de forma concisa, sejam enfrentadas todas as questões relevantes para a resolução do conflito de interesses submetido ao Poder Judiciário. O formalismo exagerado em relação as exigências apontadas no art. 489, § 1º, do CPC de 2015 pode conduzir ao formalismo, também exagerado, na exigência de cumprimento, pelas partes, dos itens I, II, V e VI do art. 489, §1º, do CPC de 2015, em prejuízo aos princípios da facilitação do acesso à justiça, da simplificação de formas e procedimentos e do favorecimento do julgamento do mérito da demanda ou da satisfação do crédito objeto da execução. A afirmação da suficiência do direito processual do trabalho em relação à fundamentação das decisões judiciais não implica relegar a segundo plano o diálogo entre as partes e entre estas e o juiz, o que não impede considerar que o diálogo não vale por si mesmo, mas em razão da sua seriedade e transparência e da sua contribuição para a participação útil das partes na construção da decisão a cujos efeitos estarão sujeitas e a plena realização do direito à uma tutela adequada, efetiva e tempestiva, notadamente quando se trate da realização prática de direitos humanos e fundamentais.

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Aliás, o CPC de 2015 deixa claro, no art. 1.013, §§ 1º e 2º, que não há nulidade quando o juiz não examina todas as questões suscitadas e discutidas no processo ou todos os fundamentos do pedido e da defesa. Se a hipótese fosse de nulidade, ao tribunal caberia anular a decisão e determinar o seu retorno à instância de origem e não proceder o enfrentamento do que não foi examinado em primeira instância. É relevante anotar, inclusive, que, nas hipóteses dos §§ 1º e 2º do art. 1.013 do CPC de 2015, sequer há necessidade de interposição de recurso (independente ou adesivo) pela parte vencedora, como condição do exame de questão ou fundamento não examinado pela instância superior, posto que a hipótese é de devolução automática (ex vi legis) do seu exame à esta instância. Somente quando determinado pedido não foi examinado é que há necessidade de apresentação de recurso pelo vencedor (a devolução automática acima referida diz respeito a questão e fundamento não enfrentado).

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De acordo com o art. 489, § 1º, VI, do CPC de 2015, o juiz somente está autorizado a deixar de seguir súmula, jurisprudência ou precedente quando demonstrar a existência de distinção com o caso concreto ou a superação do entendimento pelo tribunal que o adotou ou por tribunal superior, o que está em sintonia com art. 927, também do CPC de 2013, segundo o qual os juízes e tribunais observarão: a) decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade. Note-se que as decisões proferidas pelo STF em controle concentrado de constitucionalidade possuem eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário, nos termos do art. 102, § 2º, da Constituição da República, o que significa que o inciso I do art. 927 do CPC de 2015 somente pode estar se referindo aos precedentes representados pelos fundamentos, fáticos e jurídicos, determinantes da decisão - ratio decidendi ou holding – proferida pelo STF ao realizar o controle concentrado de constitucionalidade. Estes precedentes passam a vincular, por força do art. 927, I, também o STF, o que é reforçado pelo inciso V do mesmo dispositivo legal); b) súmulas vinculantes; c) acórdãos em incidentes de assunção de competência (IAC) ou de resolução de demandas repetitivas (IRDR) e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; d) súmulas do STF e matéria constitucional e do STJ em matéria infraconstitucional; e) orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados, o que, pelas razões já expostas, é de constitucionalidade discutível.

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Note-se que o texto legal em destaque alude, genericamente, à jurisprudência, sem esclarecer se se trata da jurisprudência que se manifesta na forma do art. 927 do CPC de 2015.

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Revista Jurídica Digital RTM Referências Bibliográficas Da autonomia dogmática do direito do trabalho. Coimbra: Almedina, 200, p. 998-999.

Elementos da teoria geral da prova: a prova como direito humano e fundamental das partes do processo judicial. São Paulo: LTr, 2013.

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Revista Jurídica Digital RTM LEI COMPLEMENTAR Nº 150/15:

possibilidades de alterações legislativas em prol dos direitos dos trabalhadores Lília Carvalho Finelli1* O Brasil, tradicionalmente, teria optado pelos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, pelo fundamento na dignidade da pessoa humana, além da prevalência dos direitos humanos na seara internacional (arts. 1º e 4º da Constituição da República), o que deveria ter levado à ratificação da maioria das convenções internacionais trabalhistas, diretamente conectadas a esses fundamentos e princípios. No entanto, no âmbito da Organização Internacional do Trabalho, o país ratificou apenas 98 das 189 convenções2. Desse valor menor que uma centena, ainda denunciou 14 delas3. Contando, portanto, com menos de 45% de ratificações, era de se esperar que o país não fosse considerado modelo pela instituição. Porém, a OIT assim o conceituou em diversas oportunidades, apontando os esforços no combate ao trabalho escravo4, ao trabalho infantil5 e na regulamentação do trabalho doméstico6. Ledo engano quanto ao último ponto. Quando se trata do trabalho doméstico, apenas uma das franjas que circulam entre o trabalho precário e o escravo, o país não evoluiu democraticamente como deveria. A uma, por não ter ratificado a Convenção 189 da OIT7 nem sua consequente Recomendação 2018 e, a duas, por terem a Emenda Constitucional nº 72/20139 e sua regulamentação via Lei Complementar nº 150/201510 escamoteado novamente a categoria dos domésticos, ao invés de equiparar seus direitos. Diferentemente do divulgado pela mídia, não houve real concessão dos mesmos direitos, havendo uma disparidade já na emenda do parágrafo único do art. 7º da CR/88, diferença essa que apenas aumentou com a edição da LC 150/15. Ao invés de efetuar o lógico, ou seja, revogar o referido parágrafo único, extinguindo de uma vez por todas a diferenciação que a Constituição erroneamente fez, o que houve foi sua modificação, para acrescentar mais alguns direitos – frise-se, não todos – aos trabalhadores domésticos.

Mestranda em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais; pesquisadora/bolsista pela FAPEMIG; advogada; colaboradora da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da UFMG; bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG; técnica em Administração de Empresas pela Escola Técnica de Formação Gerencial do SEBRAE/MG.

1

2

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Em especial o interessante retrocesso na denúncia da Convenção nº 158, que trata da dispensa sem justa causa.

4

OIT. As boas práticas da inspeção do trabalho no Brasil: a inspeção do trabalho no Brasil pela promoção do trabalho decente. Brasília: OIT, 2010. Disponível em: <http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/labour_inspection/pub/trabalho_decente_ inspecao_280.pdf>. Acesso em: 08 nov. 2015.

5

OIT: o Brasil é modelo contra o trabalho infantil perigoso. Portal G1, 10 jun. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/ economia/noticia/2011/06/oit-brasil-e-modelo-contra-trabalho-infantil-perigoso.html>. Acesso em: 08 nov. 2015.

6

PARA OIT, PEC das domésticas é medida modelo. Brasil de debate, 11 jun. 2015. Disponível em: <http://brasildebate.com. br/para-oit-pec-das-domesticas-e-medida-modelo/>. Acesso em: 08 nov. 2015.

7

OIT. Convenção nº 189, de 2011. Convenção sobre o trabalho decente para os trabalhadores domésticos. Entrada em vigor em 05 set. 2013. Disponível em: <http://www.ilo.org/dyn/normlex/en/f?p=NORMLEXPUB:12100:0::NO::P12100_ INSTRUMENT_ID:2551460>. Acesso em: 08 nov. 2015.

8

OIT. Recomendação nº 201: relativa ao trabalho decente para trabalhadores domésticos. Disponível em: <http://www.ilo. org/dyn/normlex/en/f?p=NORMLEXPUB:12100:0::NO:12100:P12100_INSTRUMENT_ID:2551502:NO>. Acesso em: 08 nov. 2015.

9

BRASIL. Emenda Constitucional nº 72, de 02 de abril de 2013. Altera a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais. Diário Oficial da União, 03 abr. 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Emendas/Emc/emc72.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015.

10

OIT. Convenções ratificadas pelo Brasil. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/convention>. Acesso em: 08 nov. 2015.

BRASIL. Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015. Dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico; altera as Leis no 8.212, de 24 de julho de 1991, no 8.213, de 24 de julho de 1991, e no 11.196, de 21 de novembro de 2005; revoga o inciso I do art. 3o da Lei no 8.009, de 29 de março de 1990, o art. 36 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, a Lei no 5.859, de 11 de dezembro de 1972, e o inciso VII do art. 12 da Lei no 9.250, de 26 de dezembro 1995; e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp150.htm>. Diário Oficial da União, 02 jun. 2015. Acesso em: 08 nov. 2015.

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Revista Jurídica Digital RTM Assim, veja-se o quadro comparativo dessa evolução, por nós elaborado:

TABELA COMPARATIVA DO ARTIGO 7º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA Incisos

I II III IV V VI VII VIII IX X XI XII

XIII XIV XV XVI XVII XVIII XIX XX XXI XXII XXIII XXIV

Direitos Relação de emprego protegida Seguro-desemprego FGTS Salário mínimo Piso salarial Irredutibilidade salarial, salvo CCT e ACT Garantia do mínimo para remuneração variável 13º salário Adicional noturno Proteção salarial Participação nos lucros e resultados Salário família ao trabalhador de baixa renda Limitação da jornada a 8 diárias e 44 semanais, facultada compensação e redução via ACT ou CCT Jornada de 6 horas para turnos ininterruptos, salvo negociação coletiva Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos Hora extra com adicional de no mínimo 50% Férias mais 1/3 Licença-maternidade por 120 dias Licença-paternidade Proteção do mercado de trabalho da mulher Aviso prévio proporcional Redução dos riscos inerentes ao trabalho Adicional de penosidade, insalubridade e periculosidade Aposentadoria

Domésticos Domésticos Para regulaUrbanos antes da depois da mentação pose rurais EC 72/13 EC 72/13 terior Sim

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XXV XXVI XXVII XXVIII

XXIX

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XXXI XXXII

XXXIII XXXIV

Assistência gratuita aos filhos até os 5 anos Reconhecimento de CCTs e ACTs Proteção em face da automação Seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador Prescrição de 5 anos, até o limite de 2 anos após a extinção do contrato de trabalho Proibição de discriminação salarial ou de critérios de admissão por sexo, idade, cor ou estado civil Proibição de discriminação salarial ou de critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência Proibição de distinção entre o trabalho manual, técnico ou intelectual Proibição do trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e de qualquer trabalho ao menor de 16, salvo aprendiz a partir dos 14 anos. Igualdade de direitos entre o empregado e o avulso.

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Obviamente, há alguns direitos não concedidos que não poderiam se aplicar aos domésticos, como é o caso da participação nos lucros e resultados, haja vista que a caracterização do empregado doméstico envolve a inexistência de finalidade lucrativa na prestação do serviço. Porém, o que dizer dos incisos que tratam da prescrição11, da proibição de distinção do trabalho manual, técnico e intelectual e, pior ainda, da proteção do mercado de trabalho da mulher? E a impossibilidade de negociar um piso salarial? Por essas e outras, alegamos em outra oportunidade12 que a Emenda Constitucional nº 72/13 não equiparou os domésticos aos empregados urbanos e rurais. Além disso, a Lei Complementar nº 150/15 conseguiu a façanha de piorar tal ausência de equiparação. Assim, deixou a categoria de fora do Programa de Integração Social (PIS), possibilitou a instituição de banco de horas e de jornada 12 x 36 sem negociação coletiva, o que entendemos inconstitucional, dentre muitas outras disposições discriminatórias, como regras diferenciadas para a concessão do seguro-desemprego. Diante da falta de técnica legislativa da LC 150/13, restaria a esperança de que, como a maioria das leis trabalhistas, o conteúdo fosse sendo modificado ao longo dos anos. Todavia, almejamos tratar de um possível problema que a categoria poderia ver diante de si ao tentar defender seus direitos: a dificuldade de alterações 11

12

Embora a mudança constitucional não abranja esse inciso, a Lei Complementar 150/15 determinou em seu art. 43 que a prescrição é a mesma dos empregados urbanos e rurais.

MELO, Geraldo Magela; FINELLI, Lília Carvalho. A nova lei dos domésticos comentada. Belo Horizonte: RTM, 2015.

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Revista Jurídica Digital RTM legislativas, por se tratar de lei complementar.

Poder-se-ia alegar que haveria um engessamento da legislação, o que deve ser rechaçado. Entendemos que a EC 72/13 foi regulamentada mediante tal espécie legislativa por um simples motivo: ao querer dar tratamento total aos domésticos, instituiu um sistema tributário simplificado, o Simples Doméstico. Assim, em semelhança ao Simples instituído pela Lei Complementar nº 123/2006, cumpriu-se o determinado no art. 146, da CR/88, que assim dita: Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: I - será opcional para o contribuinte; II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.

Ressalte-se que inexiste hierarquia entre a lei complementar e a ordinária, estando a diferenciação apenas nas matérias e na forma de aprovação. Assim, serão regulamentadas por lei complementar todas as hipóteses que estão previstas de forma taxativa na CR/88, passando pelo processo legislativo em que estejam presentes a maioria absoluta dos parlamentares componentes da casa, com quórum de instalação também por maioria absoluta. Veja-se ainda que, por expressa determinação constitucional, não poderá haver edição de medida provisória nem delegação com relação às matérias reservadas à lei complementar (art. 62, §1º, III e art. 68, §1º, CR/88). Porém, a própria LC 150/15 determina a possibilidade de alterar as matérias que constitucionalmente seriam reguladas por lei ordinária dessa mesma forma: Art. 45. As matérias tratadas nesta Lei Complementar que não sejam reservadas constitucionalmente a lei complementar poderão ser objeto de alteração por lei ordinária.

Entendemos assim, comprovada a possibilidade de alterar os dispositivos que apontamos como inconstitucionais e/ou discriminatórios, via lei ordinária. Conforme exposto, ainda serão necessárias muitas discussões e um forte senso de justiça para conseguir ao final uma equiparação real desses trabalhadores, o que deverá passar imprescindivelmente por uma substituição de artigos da LC 150/15. Por isso, há de ser reafirmado que a espécie legislativa escolhida no momento não poderá servir como empecilho ao progresso.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 out. 1988. Diário Oficial da União, 05 out. 1988. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015. BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial da União, 09 ago. 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015. BRASIL. Emenda Constitucional nº 72, de 02 de abril de 2013. Altera a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais. Diário Oficial da União, 03 abr. 2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc72.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015. BRASIL. Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972. Dispõe sobre a profissão de empregado doméstico e dá outras providências. Diário Oficial da União, 12 dez. 1972. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5859.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015. BRASIL. Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015. Dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico; altera as Leis no 8.212, de 24 de julho de 1991, no 8.213, de 24 de julho de 1991, e no 11.196, de 21 de novembro de 2005; revoga o inciso I do art. 3o da Lei no 8.009, de 29 de março de 1990, o art. 36 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, a Lei no 5.859, de 11 de dezembro de 1972, e o inciso VII do art. 12 da Lei no 9.250, de 26 de dezembro 1995; e dá outras providências. Diário Oficial da União, 02 jun. 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/LCP/Lcp150.htm>. Acesso em: 08 nov. 2015. MELO, Geraldo Magela; FINELLI, Lília Carvalho. A nova lei dos domésticos comentada. Belo Horizonte: RTM, 2015. OIT. As boas práticas da inspeção do trabalho no Brasil: a inspeção do trabalho no Brasil pela promoção do trabalho decente. Brasília: OIT, 2010. Disponível em: <http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/labour_inspection/pub/trabalho_decente_inspecao_280.pdf>. Acesso em: 08 nov. 2015. OIT. Convenções ratificadas pelo Brasil. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/convention>. Acesso em: 08 nov. 2015. OIT. Convenção nº 189, de 2011. Convenção sobre o trabalho decente para os trabalhadores domésticos. Entrada em vigor em 05 set. 2013. Disponível em: <http://www.ilo.org/dyn/normlex/en/f?p=NORMLEXPUB:12100:0::NO::P12100_INSTRUMENT_ID:2551460>. Acesso em: 08 nov. 2015. OIT. Recomendação nº 201: relativa ao trabalho decente para trabalhadores domésticos. Disponível em: <http://www.ilo.org/dyn/normlex/en/f?p=NORMLEXPUB:12100:0::NO:12100:P12100_INSTRUMENT_ID:2551502:NO>. Acesso em: 08 nov. 2015. PARA OIT, PEC das domésticas é medida modelo. Brasil de debate, 11 jun. 2015. Disponível em: <http://brasildebate.com.br/para-oit-pec-dasdomesticas-e-medida-modelo/>. Acesso em: 08 nov. 2015. OIT: o Brasil é modelo contra o trabalho infantil perigoso. Portal G1, 10 jun. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/06/ oit-brasil-e-modelo-contra-trabalho-infantil-perigoso.html>. Acesso em: 08 nov. 2015.

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Revista Jurídica Digital RTM ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA:

SISTEMA PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO E “EFETIVIDADE” ADMINISTRATION OF JUSTICE: SYSTEM JUDICIAL PROCESS ELECTRONIC AND “EFFECTIVENESS” Domingos Antônio Zatti Pinto da Silva1 RESUMO De modo geral, a “efetividade” interessa qualquer ramo do Direito Processual. Por exemplo, Processo do Trabalho, Processo Civil, Processo Penal, etc. É porque há muito tempo a “efetividade” é alvo de autoridades da Justiça. Sucede, também, que há muito tempo o processo é a principal técnica de resolução dos conflitos. Assim, se há muito tempo o processo está doente, então, eventuais medidas legislativas de desemperramento do processo não curam o processo. Realmente, o Processo Judicial Eletrônico (PJ-e) representa um grande avanço ao quesito tecnologia. Por outro lado, na Justiça especializada trabalhista existe uma crise de demanda. Por exemplo, demanda do setor das telecomunicações, recusa de homologação de rescisões, etc. Esses problemas atingem a “efetividade”, exigindo um rearranjo dos meios de composição dos conflitos, mecanismo de solução dos conflitos e modificação da mentalidade de demanda. Palavras-chaves: “Efetividade”. Direito Processual. Processo do Trabalho. Autoridades da Justiça. Resolução dos conflitos. Processo Judicial Eletrônico. Justiça especializada trabalhista. Crise de demanda. Meios de composição dos conflitos. Mentalidade demandista. In general, the “effectiveness” is any branch of Procedural Law. For example, the Work Process, Civil Procedure, Criminal Procedure, etc. is because for a long time the “effectiveness” is the target of the authorities for Justice. True, also, that for a long time the process is the main technique of conflict resolution. Thus, if there is a long time, the process is sick, then, any legislative measures of desemperramento process does not cure the process. Really, the Judicial Process Electronic (Pj-e) represents a great step forward in terms of technology. On the other hand, Justice specialized labor there is a crisis of demand. For example, demand of the telecommunications industry, refusal of approval of terminations, etc. These problems reach the “effectiveness”, requiring a rearrangement of media composition of conflict, mechanism for the resolution of conflicts and change in mentality of demand. Key words: “Effectiveness”. Procedural Law. The Work Process. Authorities for Justice. Resolution of conflicts. Judicial Process Electronic. Justice specialized labor. Crisis of demand. Media composition of conflicts. Mentality of demand.

1. INTRODUÇÃO O projeto de lei n. 5.828, de 2001 de autoria da Comissão de Legislação Participativa foi apresentado à Câmara dos Deputados e propôs um novo modelo de comunicação de atos e da transmissão de peças processuais através do uso de meio eletrônico. Esse projeto de lei tramitou por alguns anos entre as casas iniciadora (Câmara dos Deputados) e revisora (Senado Federal), mas foi devidamente votado e revisado na forma estabelecida na Constituição de 1998 e no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (Resolução da Câmara dos Deputados n. 17, de 1989) e do Senado Federal (Resolução do Senado Federal n. 93, de 1970). De modo global, o projeto de lei (o qual foi transformado em lei ordinária, lei n. 11.419, de 2006) em questão atendeu ao “Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano”, cujo documento básico apresentou algumas propostas fundantes capazes de modernizar a entrega da prestação jurisdicional.

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É bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos (2008). Tem especialização em Direito Público, com Formação para o Magistério Superior, na área do Direito, pelo Centro Universitário Anhanguera (2010) e especialização em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito Milton Campos (2011). É também técnico de nível médio em Segurança do Trabalho, eixo tecnológico saúde e meio ambiente, pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial de Minas Gerais (2013). Atualmente participa de atividades de pesquisa e extensão desenvolvidas pelo Programa Universitário de Apoio às Relações de Trabalho e à Administração da Justiça da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (PRUNART-FDUFMG). Pesquisador Voluntário do Programa. Participante do grupo de estudo Trabalho e Economia do Prunart. Ex-participante do grupo de estudo de Administração da Justiça (2014), pelo PRUNART-FDUFMG. E mais, tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Processual e Individual do Trabalho, Segurança do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho. Twitter: @domingoszatti.

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Por outro lado, alguns sintomas o qual tradicionalmente atingem o processo comum (o processo de papel) devem permanecer atormentando o Poder Judiciário, Ministério Público, Administração Pública, Advogados e partes, uma vez que a desejadíssima modernização pretendida pelo projeto de lei em referência não foi capaz de “dessacralizar” o processo. 2. O SISTEMA PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO Como acontece frequentemente as pessoas creem que a lei é o principal instrumento de transformação da realidade. Com todo respeito aos que pensam segundo o trecho em questão, as transformações excedem qualquer alteração legislativa bem-intencionada, porque para uma esmagadora maioria a inflação legislativa não alterou significativamente a preocupante realidade do sistema de Justiça. Os membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que são um dos responsáveis pela iniciativa das leis complementares e ordinárias no Brasil (art. 61, caput, da Constituição, de 1988), certamente colaboram para essa situação. Por exemplo, através da regulamentação da terceirização e da possível transformação em lei do projeto de lei n. 4.330, de 2004 (sem olvidar o projeto de lei do senado n. 87, de 2010), o qual se propõe encerrar as dúvidas sobre o conceito de atividade-fim, bem assim viabilizar a terceirização, produzirá uma lei sem validez. Nessa linha, se alguns parlamentares, membros da comunidade jurídica e sociedade divergem a respeito da definição de atividade-fim e, até mesmo, sobre a legalidade do tema, então, o consenso sobre o tema ficou prejudicado. Por outro lado, não tenho nenhuma dúvida que muitas empresas vão continuar terceirizando indiscriminadamente suas atividades, vão descumprir parte das obrigações trabalhistas e assessórias, muitos trabalhadores e trabalhadoras terceirizados vão sofrer acidentes de trabalho, e, por fim, lamentavelmente, essa contratação vai deixar muitos trabalhadores mutilados ou, pior que isso, vai produzir muitos cadáveres, independentemente dessa indefinição. De lá para cá, outras três situações cercam a terceirização de serviços e deixam aproximadamente 30 mil processos paralisados no Tribunal Superior do Trabalho (TST). No ARE 713.211 RG/ MG que tem como relator o Ministro Luiz Fux a discussão sobre a terceirização é mais ampla (uma vez que diz respeito a todas as terceirizações), enquanto no ARE 791.932 RG/ DF que conta com a relatoria do Ministro Teori Zavascki o debate diz respeito ao tema da terceirização no trabalho em teleatendimento/ telemarketing (apelidada de terceirização da atividade de call center). Por último, a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) manejou ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 324) e pediu ao órgão de cúpula a ilegalidade do enunciado da súmula 331 de jurisprudência do TST e, consequentemente, o fim da proibição da atividade da terceirização da atividade-fim. Qual o ponto de contato entre o projeto de lei n. 4.330, de 2004; o projeto de lei do senado n. 87, de 2010; a ADPF 324 e a informatização do processo judicial? Agora desenvolvo o meu ponto de vista: Levando-se em consideração o aspecto modernizante geral do projeto de lei n. 5.828, de 2001, posteriormente transformado em lei ordinária, lei n. 11.419, de 2006, a legislação em questão teve um grande peso no aperfeiçoamento do processo judicial. Somando-se ao surpreendente percentual (de 94%, diz pesquisa do Centro de Estudos Temáticos de Administração Pública) de adesão dos tribunais ao modelo 2.0 da Web, à internet, às inovações tecnologias (WhatsApp), com frequência a comunidade jurídica rejeita sua ineficácia, abafa eventuais críticas atribuídas ao novo modelo de comunicação de atos e da transmissão de peças processuais e não tolera opiniões contrárias ao sistema em questão, sacralizando o sistema processo judicial eletrônico, simplesmente proíbe a crítica ao sistema. Sou a favor do modelo informatizado, não obstante manifestar minha discordância da tecnologia em questão perante o Sistema Processo Judicial Eletrônico (PJ-e). É apenas uma lei que trouxe um novo modelo de comunicação de atos e transmissão de peças processuais – a desigualdade deve continuar, uma vez que o método de solução entre conflitos não favorece a “efetividade”. Assim como outros institutos jurídicos, o uso do meio eletrônico na tramitação de dados em processos judiciais extrapolou a legislação ordinária com, por exemplo, a MP n. 2.200-2, de 2001. Na Justiça especializada trabalhista a engenharia da informatização do processo judicial já alcançou resoluções (Ato CSJT/ GP/ SG n. 42, de 2013; Resolução CNJ n. 185, de 2013; Resolução CSJT n. 136, 2014), 46


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outros códigos (improvisos) e acórdãos do TST (RR-259300-41.2009.5.02.0056). Outro elemento é a relativa confusão a respeito da transmissão de dados e suas tecnologias, uma vez que e-DOC (Justiça especializada trabalhista), e-PROC (Justiça comum federal), Jpe (Justiça comum estadual, TJ-MG 2ª instância), Projudi (Justiça comum estadual, TJ-MG juizados), etc., não são considerados PJe. A confusão permanece. É porque algumas questões já foram parar no STF, como nos casos da suspensão do art. 44 da Resolução CNJ n.185, de 2013 (MS 32767) e da eficácia dessa resolução (MS 32888). O último foi rejeitado, uma vez que a OAB-SP e AASP deixaram de apontar o ato concreto que ameaçou ou lesou o direito líquido e certo dos impetrantes. O outro, que teve a medida cautelar indeferida (art. 22, § 2º, lei n. 12.016, de 2009) está em processamento. Mais especificamente, existe relativa desconfiança na agilidade, “efetividade”, estabilidade do PJ-e, dado que não há uma “inteligência” no sistema, nem garantia de uma melhoria da prestação jurisdicional em relação ao meio convencional, nem compatibilidade tecnológica. Contextualizando, o sistema é centralizado no operador, não atinge os problemas do modismo demandista judicial e com frequência os registros de interrupção desse sistema não são fornecidos imediatamente ao mal funcionamento da tecnologia. Seguramente o Brasil é desigual. Essa desigualdade é reproduzida com frequência no sistema de Justiça. De modo geral, tal desigualdade é replicada no processo judicial e, por consequência, reprisada no PJ-e. Sei que não se deve generalizar, com isso não pretendo abominar o PJ-e, nem mensurar aqui níveis de embaraço, nem quantificar a desigualdade em tese, mas desejo mencionar genericamente as dificuldades em relação ao acesso à justiça, pressão sobre juízes e a crise de “efetividade processual”. A par disso, a possibilidade de assegurar o acesso de um trabalhador ou até pequeno empregador decorrente da ampliação das tecnologias da Justiça especializada trabalhista não considerou a ideia do acesso ao judiciário trabalhista através do jus postulandi (art. 791, da CLT), uma vez que não se tem notícia sobre ações desse sistema o qual aborde estratégias, programas ou metas nesse sentido. E, por fim, para adicionar outra dificuldade decorrente desse novo aparelhamento é a crescente sobrecarga de autoridades da Justiça, promotores, servidores, advogados, decorrentes de metas, jornada excessiva, etc., em razão das dificuldades de adaptação e aperfeiçoamento dessa nova tecnologia. Como se vê, essa pequena reflexão merece uma análise mais acurada, uma vez que se trata de matérias jornalísticas, notícias jurídicas, além de preocupações a qual merecem um aprofundamento técnico. De outro lado, imperioso “dessacralizar” esse novo modelo de comunicação de atos e transmissão de peças processuais, até para assegurar seu aprimoramento, continuidade, segurança, universalidade de acesso, “efetividade”, etc. 3 . “EFETIVIDADE PROCESSUAL” Antes de tudo, não vejo o processo do trabalho como sub-ramo do processo civil, uma vez que tem princípios próprios (conciliação, irrecorribilidade das interlocutórias), métodos (instrumental que decorre da natureza da verba: salarial) e organização (divisão e competência) distinta de outras Justiças. De outro lado, a autonomia do processo do trabalho não se confunde com seu isolamento, uma vez que em Direito existem institutos heterotópicos que influenciam o processo trabalhista, como o caso da prescrição. A tecnologia da informação tem alta demanda e está em todo lugar. Apesar dessa constatação, no meio judicial nem sempre os sistemas e ferramentas tecnológicas garantem a desejável máxima “efetividade” processual do trabalho. Na última década, o sistema de Justiça viveu o boom da tecnologia da informação em razão do processo virtual, redes sociais, aparelhamento, segurança da informação. Contudo, pessoas divergem sobre o funcionamento dessa tecnológica, melhoria da gestão do Poder Judiciário e da “efetividade processual”. Em sentido geral, a gestão do Poder Judiciário decorre da organização, dos indivíduos, enquanto a “efetividade processual” está conectada a ideia de “sistema processual” ou “sistema judicial” (idealização de “acesso à ordem jurídica justa”), por outro lado, em menor abrangência, a “efetividade” do processo (civil, trabalhista, penal, administrativo, etc.). Atualmente, compete ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o planejamento e a gestão estratégica no âmbito do Poder Judiciário (Resolução CNJ n. 70, de 2009). O Conselho instituiu o Sistema Processo Judicial 47


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Eletrônico (Resolução CNJ n. 185, de 2013) como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais, ao passo que só identifiquei em Doutrina o devido destaque ao problema da “efetividade”. A discussão sobre “efetividade processual” também interessa ao processo do trabalho, mas em que pese o texto base de Augusto Tavares Rosa Marcacini (tese de doutoramento distribuída eletronicamente pela licença creative commons) eliminar alguns ramos do processo, com exceção do processo civil, tais como, processo penal, do trabalho, não o descredencia, nem impede de usar seu estudo sobre “efetividade” para auxiliar esta proposta reflexão. Há muitas definições para o vocábulo “efetividade”, identificou Marcacini. Segundo a definição dicionarizada, a “efetividade” é a “qualidade de efetivo”, “atividade real; resultado verdadeiro: a efetividade de um serviço, de um tratamento”, “realidade, existência”. Há também uma explicação de José Carlos Barbosa Moreira, assinalou Marcacini, a qual fixa um “programa básico em prol da efetividade” a partir de cinco tópicos: “o processo deve dispor de instrumento de tutela adequados”, “esses instrumentos devem ser praticamente utilizáveis”, impende assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição de fatos relevantes”, “o resultado do processo há de ser tal que assegure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento”, “cumpre que se possa atingir semelhante resultado com o mínimo de dispêndio de tempo e energias”. Na visão de Augusto Tavares Rosa Marcacini, erige-se “a efetividade como a realização prática, real, dos fins que a que o processo se propõe”; “o cumprimento das finalidades que ele promete alcançar”; “importa em confrontar os ideais buscados pelo sistema processual – ideais que irão variar no tempo e no espaço – com os resultados alcançados”; “O processo moderno promete a pacificação com justiça dos conflitos sociais; será efetivo, portanto, o processo que chegue o mais perto possível do cumprimento dessa promessa”. E o que é a “efetividade do processo”? É para Marcacini, “maior correspondência possível entre os resultados obtidos e os fins esperados de um sistema processual”. É preciso entender que os princípios tipicamente trabalhistas conferem ao processo do trabalho uma “efetividade processual” diferenciada. Por exemplo, a conciliação, a concentração (art. 764), a oralidade (art. 847), a celeridade (art. 893, §1º), nulidades (art. 794), a irrecorribilidade das decisões interlocutórias (art. 799, §2º), o protetivo (divergência doutrinária), já viabilizam uma melhor correspondência entre “resultados obtidos” e “fins esperados”. Entre outros exemplos, o projeto de lei n. 4.693, de 1998 de autoria do Poder Executivo (lei ordinária, lei n. 9.957, de 2000) o qual instituiu o procedimento sumaríssimo no processo trabalhista (“art. 852-A. Os dissídios individuais cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo vigente na data o ajuizamento da reclamação ficam submetidos ao procedimento sumaríssimo”), também colaborou para uma mair correspondência entre “resultados obtidos” e “fins esperados” por meio do dinamismo ao processo do trabalho. A despeito disso, vê se desenvolvendo o problema da “efetividade processual” da Justiça especializada trabalhista em razão de fatores variados. As dificuldades são inúmeras, por exemplo, o aumento da litigiosidade (taxa de congestionamento), a recusa de sindicatos a homologar rescisões contratuais, o grande acervo de execução (judiciais, extrajudiciais fiscais e não-fiscais). Em suma, todos os mecanismos apontados em prol da “efetividade” processual do trabalho no Judiciário trabalhista tiveram pouco impacto no total de processos novos e estocados da Justiça do Trabalho. Em resumo, há casos mais relevantes em que a Justiça especializada trabalhista não alcançou a efetividade desejável. Por exemplo, os princípios tipicamente do processo trabalhista, concomitantemente o projeto de lei n. 4.693, de 1998, não asseguraram uma “efetividade processual” capaz de minimizar o deficit de efetividade. Não se pode deixar de reconhecer que a lei ordinária, lei n. 11.416, de 2006, trouxe uma considerável incorporação tecnológica, remanescendo velhas dificuldades do processo tradicional (execuções trabalhistas) e subaproveitamento da nova tecnologia (as intimação não são feitas pelo próprio sistema) no que pertine à “efetividade processual”. Por detrás desses argumentos, está o indesejável fracasso do atual modelo de processo eletrônico herdado do processo físico, uma vez que não foi dado nem condições, nem uma outra perspectiva de institutos e praticas, sendo visível a pouca contribuição do processo judicial eletrônico em prol da “efetividade” processual do trabalho.

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Revista Jurídica Digital RTM 4. QUE DIREÇÃO TOMAR?

Há que se notar que as modificações legislativas não atendem às necessidades do processo do trabalho. Em especial, o novo modelo de comunicação de atos e da transmissão de peças processuais através do uso de meio eletrônico, porque utiliza os mesmos métodos do modelo de processo convencional. Aliás, mesmo toda a sofisticação prevista na legislação e regulamentação do sistema processo judicial eletrônico, até o presente o processo trabalhista digital não atingiu níveis esperados de “efetividade”. Mais que um problema de tecnologia, na verdade, é uma questão que nem o conjunto de princípios, nem a especificidade da legislação processual trabalhista, foram capazes de corrigir o problema da “efetividade”. Em geral, a dificuldade de uma “efetividade” do direito processual trabalhista é consequência de um mix de situações-problemas. Por exemplo, a ampliação do acesso à justiça, o excesso de demanda, a overdose de pedidos, a recusa de homologações de rescisões, etc. Além disso, a impermeabilização do processo ao princípio protetor (regra da norma mais favorável, da condição mais benéfica e in dubio pro operario) no processo do trabalho, a meu ver, são as possíveis causas da ineficiência do processo na área trabalhista. Estou convencido de que o processo judicial eletrônico, hoje, não é suficiente para alcançar uma “efetividade processual” constitucionalmente desejável, uma vez que tal tecnologia não foi capaz de “dessacralizar” suficientemente o processo, entre outros obstáculos. Daí importante o diagnóstico e tratamento das dificuldades enfrentadas no processo clássico trabalhista, o controle dessas dificuldades a fim de impedir ou reduzir sua reprodução sobre o processo eletrônico, a consolidação de uma cultura de meios compositivos, etc. Apesar das deficiências mencionadas, admito que é possível obter através do processo trabalhista e dos operadores da Justiça especializada trabalhista uma recomposição mínima da dignidade do trabalhador. Além disso, a resolução das lides via jurisdição é muito importante, uma vez que ela é um serviço público, viabiliza o controle de constitucionalidade e das autoridades judiciárias. Isso, todavia, não resolve o problema da “efetividade processual”. Na cogitação de uma alternativa para os problemas da “efetividade” existem outros canais alternativos de composição da lide. Por exemplo, a arbitragem, a mediação e a conciliação, são, segundo a doutrina, as práticas alternativas mais comuns a resolução de lides. A arbitragem que foi prevista inicialmente nos arts. 1.072 a 1.102, lei n. 5.869, de 1973 foi revogada pela lei n. 9.307, de 1996. Atualmente, a arbitragem só é permitida para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis entre pessoas capazes de contratar (art. 1º). De início, os “desavindos” entregam a solução de certo conflito a um terceiro, podendo ou não ser restringida, adverte Adriana Goulart de Sena Orsini. No que diz respeito a arbitragem em conflitos individuais não há previsão expressa. Seja como for, existe entendimento admitindo a utilização da arbitragem em conflitos individuais trabalhistas caso as partes façam voluntariamente tal escolha, diz Lutiana Nacur Lorentz. Em sentido geral, a mediação auxilia as partes negociar uma solução consensual de conflitos através de um terceiro. Segundo Adriana Sena, “a mediação é um processo que busca a resolução de situações de conflito, através do qual uma terceira pessoa neutra – o mediador – auxilia as pessoas envolvidas a resgatarem o diálogo e construírem uma solução”. Adverte a doutrina de Adriana Sena que a mediação “em sua forma clássica” é incompatível no conflito trabalhista, todavia isso não impede o uso de suas técnicas pelo juiz trabalhista. É certo que a mediação estimula a composição de conflitos trabalhistas, individuais e coletivos. Entre os meios alternativos de composição do conflito trabalhista, a conciliação tem ampla aceitação. É porque os dissídios individuais e coletivos sempre se sujeitam à conciliação (art. 764, da CLT). Consoante magistério de Adriana Sena, “A conciliação é o método de solução de conflitos em que as partes agem na composição, mas dirigida por um terceiro. No caso, o terceiro é um juiz trabalhista ciente das desigualdades entre os litigantes e da intensidade de proteção do trabalhador. Como quer que seja, independentemente das peculiaridades dos institutos em questão, indiscutível a importância de cada um, da sua utilização, do constante aperfeiçoamento e adaptação compatível dentre todos os meios alternativos de composição na solução conciliada das lides trabalhistas.

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Revista Jurídica Digital RTM 5. NÚCLEOS INTERSINDICIAS DE CONCILIAÇÃO TRABALHISTA

A propósito do que foi abordado sobre o problema da “efetividade” do processo e desníveis da entrega da prestação jurisdicional a questão vem causando uma profunda preocupação entre autoridades do Judiciário trabalhista. O processo do trabalho e toda sua moderna tecnologia inerente ao problema do conflito trabalhista entre pessoas e pessoas e empresas desperta grande preocupação. Diante dos muitos propósitos da jurisdição especializada trabalhista, está o de resolver os conflitos cuja competência constitucional (art. 114 da Constituição, de 1988) foi em tempo ampliada. Esse complexo mecanismo de composição, aliás, dentro da organização dos Poderes do Estado vem sendo sobrecarregado de processos (aproximadamente 95,14 milhões de processos no Judiciário). Dentre essa enxurrada de demandas, destacamos os novos direitos do trabalhador, o excesso de demanda, demandas de massa, partes/ litigantes habituais, a overdose de pedidos, a recusa de homologações de rescisões, etc. Essas dificuldades enfrentadas no âmbito da Justiça, aos quais se somaram ao problema da “efetividade processual”, no nosso sentir, exige uma alternativa constitucionalmente compatível. Por isso, destacamos a importância dos Núcleos Intersindicais de Conciliação, cuja legitimidade legal (art. 625-H, da CLT) e social (advindas dos resultados), ganham destaque dentro da Justiça especializada trabalhista. Eis o artigo em questão in verbis: “Aplicam-se aos Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista em funcionamento ou que vierem a ser criados, no que couber, as disposições previstas deste Título, desde que observados os princípios da paridade e da negociação coletiva na sua constituição”. Os núcleos intersindicais não se confundem com as comissões de conciliação prévia, constituindo-se em espaços permanentes de diálogos sociais, cuja promoção é prevenir e conciliar questões individuais e coletivas decorrentes da relação de trabalho. De modo geral, esses núcleos só podem tratar de questões de menor complexidade, todavia tal especificidade não reduz sua importância. Dentre os princípios informativos do núcleo intersindical, a doutrina dá destaque à livre associação (entre sindicatos); paridade (igual representação); legalidade, tripartismo (de base local); autonomia coletiva (regulamentação via instrumentos normativos); equidade jurisdicional (diálogo permanente); interação e integração entre os agentes públicos (vivência); honestidade, lealdade e boa-fé. Na cogitação do núcleo intersindical combater todas as dificuldades enfrentadas pelo Judiciário trabalhista, exige-se uma composição mínima a partir de um conselho tripartite (diagnóstico), diretoria executiva (função administrativa) e seção intersindical de conciliação (operacional). Claro está que a conciliação dentro da estrutura do núcleo intersindical equilibra melhor o número de lides trabalhistas, sem cogitar da contrariedade à Constituição existente entre os dissídios trabalhistas, a arbitragem e a mediação. É curial, portanto, a relevância desse meio de resolução e prevenção de conflitos. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em virtude disso, podemos concluir, lembrado que o presente artigo tem uma análise abrangente, que o Sistema Processo Judicial Eletrônico não resolverá o problema da “efetividade processual” no Judiciário trabalhista. É nesse sentido que para a solução desse problema passa por outras formas de resolução de conflitos, tais como, arbitragem, mediação e outros espaços extrajudiciais apropriados para análise da realidade de cada caso com vista a pacificação, como, por exemplo, os Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista.

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DO.TRABALHO.DOS.MÚSICOS.ESTRANGEIROS.EM.TERRITÓRIO.NACIONAL:. DA. CONTRIBUIÇÃO. SINDICAL. E. O. REGISTRO. DOS. CONTRATOS . DE.TRABALHO.PERANTE.O.MINISTÉRIO.DO.TRABALHO.E.EMPREGO 1

Guilherme.da.Hora.Pereira I.-.INTRODUÇÃO:

1. É de notório conhecimento a instauração de controvérsia jurídica acerca da necessidade (ou não) do registro do contrato de trabalho de músico estrangeiro perante a autoridade competente do Ministério do Trabalho, bem como o recolhimento da “taxa” devida em favor do respectivo sindicato representativo da categoria e da Ordem dos Músicos do Brasil, na proporção de 10% divididos em partes iguais. 2. A abordagem não é simples, especialmente considerando que a legislação que prevê o pagamento da mencionada “taxa” remonta à década de 1960 (Lei n. 3.857/60), levantando lamuriosos questionamentos acerca da sua recepção pela Constituição de 1988. 3. Nesse aspecto, importa destacarmos, com os devidos cuidados e vênias de ordem jurídica e social, qual o efetivo fato gerador incidente em relação à dita “taxa sindical” apontada ao art. 53 da Lei n. 3.857/60 e que vem fomentando intensa discussão no âmbito dos tribunais pátrios, bem sedimentar os limites da vergastada decisão proferida no seio dos autos n. RE 509409/SP, equivocadamente empregada como fundamento para a dispensa do aludido pagamento por parte das produtoras culturais. II.-.DA.IDENTIFICAÇÃO.DO.PROBLEMA: 4. O fenômeno da globalização é latente, não se restringindo apenas aos aspectos econômicos e políticos, mas também estabelecendo seus tentáculos no âmbito social e cultural em escala planetária. Desnecessário traçar comentários acerca das toneladas diárias de cultura “enlatada” advinda de outros países consumidas, diariamente, pela população brasileira. 5. Assim também ocorre no mundo da música. Cada vez mais o Brasil é palco, literalmente, para apresentações de grupos e conjuntos musicais estrangeiros que movimentam verdadeiras multidões de seguidores pelas cidades em que passam. 6. Evidentemente tais apresentações movimentam, além das multidões, enormes quantias em dinheiro, cujo trânsito, por ser oriundo do trabalho humano, merece ser objeto de regulamentação e cuidados especiais por parte das autoridades públicas e entidades de controle e fiscalização do trabalho. 7. Tais cuidados demandam recursos, os quais advém de taxas e contribuições estabelecidas na forma da Lei, dentre as quais se destaca a ora debatida “taxa” devida pelo contratante quando da contratação de músicos estrangeiros na proporção de 10% (dez por cento) sobre o valor do contrato, recolhida em favor da Ordem dos Músicos do Brasil e do respectivo sindicato local: Art. 53. Os contratos celebrados com os músicos estrangeiros somente serão registrados no órgão competente do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, depois de provada a realização do pagamento pelo contratante da taxa de 10% (dez por cento) sôbre o valor do contrato e o recolhimento da mesma ao Banco do Brasil em nome da Ordem dos Músicos do Brasil e do sindicato local, em partes iguais. Parágrafo único. No caso de contratos celebrados com base, total ou parcialmente, em percentagens de bilheteria, o recolhimento previsto será feito imediatamente após o término de cada espetáculo.

8. Contudo, há verdadeira corrente instaurada no meio patronal musical pelo apoio às produtoras culturais no sentido de se tentar consolidar hipótese jurídica de dispensa do recolhimento da “taxa” sindical inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857/60 tanto em relação à Ordem dos Músicos do Brasil quanto em relação ao sindicato local. 1

Guilherme da Hora Pereira é advogado e consultor sindical inscrito na OAB/DF sob o n. 36.863, docente das disciplinas de Direito do Trabalho, Direito Processual do Trabalho e Direito Sindical, especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Superior da Advocacia - ESA, Secretário-Geral Adjunto da Associação Íbero-Americana de Juristas de Direito do Trabalho e Seguridade Social Dr. Guillermo Cabanellas - AIJDTSSGC, ex-Coordenador de Informações sobre Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego e ex-Coordenador da Assessoria de Informações jurídicas da Secretaria de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego.

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9. Tal situação (de inadimplemento por parte das produtoras e contratantes dos serviços dos músicos estrangeiros em geral) não merece prosperar, eis que ilegítima, irregular e ilegal, senão vejamos. III - DAS FALÁCIAS EMPREGADAS PARA REQUERER A DISPENSA DO ADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR: 10. Inicialmente , vale ressaltar que nossos comentários serão válidos, quase que exclusivamente, em relação às entidades sindicais, haja vista a sua finalidade especial de representação obreira dos trabalhadores músicos profissionais e sua natureza jurídica diametralmente diversa da Ordem dos Músicos do Brasil. 11. Nesse sentido, impõe-se desmascarar os argumentos jurídicos usualmente empregados pelas produtoras culturais em geral quando requerem a sua dispensa do pagamento da “taxa” sindical inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857 em relação aos sindicatos locais. 12. São eles, em síntese: a) a impossibilidade, reconhecida pelo STF, de se condicionar a apresentação dos músicos estrangeiros ao pagamento de “taxa sindical” ante a impossibilidade de violação ao direito de livre manifestação artística e/ou de fiscalização da profissão de músico, conforme posicionamento assumido pelo STF no âmbito do RE 509409/SP; e b) a ilegitimidade do sindicato para figurar no polo ativo da obrigação tributária em questão, haja vista a sua natureza jurídica de direito privado.

13. Pois bem, a seguir abordaremos alguns aspectos e fundamentos pelos quais se tem por devido o pagamento da obrigação em questão em favor das entidades sindicais representativas dos músicos profissionais. III.A) DA NATUREZA JURÍDICA DA ENTIDADE SINDICAL. DO FATO GERADOR DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR. DA DIVERSIDADE ENTRE A REPRESENTAÇÃO CLASSISTA E A FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. 14. Em contraponto ao primeiro argumento falacioso, já citado, insta que demonstremos a perfeita adequação e subsunção dos termos do art. 53 da Lei n. 3.857/60 aos ditames da Constituição da República naquilo que diz respeito às prerrogativas da entidade sindical. 15. Veja-se que a argumentação trazida pelas produtoras musicais usualmente fazem menção à “regra de liberdade” estabelecida em relação ao controle do exercício profissional. Valem-se de fundamento assumido pelo Supremo Tribunal Federal de que o art. 5º, XIII, da Constituição preconiza ser “livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. 16. Ora, em momento algum as entidades sindicais de representação dos músicos profissionais tem qualquer objetivo de restringir a liberdade artística ou personalística do músico. 17. Ao contrário, não se vê sob nenhum prisma a desconexão entre as prerrogativas jurídico-sindicais e a exegese do Supremo Tribunal Federal acerca da liberdade artística, qual seja: A liberdade de expressão artística não se sujeita a controles estatais, pois o espírito humano, que há de ser permanentemente livre, não pode expor-se no processo de criação, a mecanismos burocráticos que imprimam restrições administrativas, que estabeleçam limitações ideológicas ou que imponham condicionamentos estéticos à exteriorização dos sentimentos que se produzem nas profundezas mais recônditas da alma de seu criador. Daí a observação do notável ensaísta e escritor mexicano OCTAVIO PAZ (“O Arco e a Lira”) no sentido de que nada se revela mais nocivo e estéril do que a intervenção do Estado nos domínios da cultura, da arte e do pensamento, que representam expressões fundamentais da própria liberdade humana. Isso significa, no contexto de nosso sistema normativo, que não se mostra constitucionalmente aceitável nem se revela juridicamente compatível com o modelo consagrado em nosso estatuto fundamental a imposição, 2 pelo Poder Público, de indevidas restrições ao processo de exteriorização das obras artísticas.

18. É que se depreende, à evidência da própria natureza das entidades sindicais, elevadas que são à patamares fundamentais na defesa do trabalhador brasileiro ou estrangeiro pela própria Constituição da República. 2

cf. RE 509409/SP

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19. O sindicato é o arauto constitucionalmente instaurado para o exercício da defesa coletiva (e individual) dos trabalhadores de uma determinada categoria. Não exerce a entidade sindical prerrogativa de fiscalização do exercício profissional (atividade tipicamente realizada pelos Conselhos Profissionais), mas sim atribuições de preservação dos direitos e garantias fundamentais oriundos do trabalho em favor dos seus representados. 20. No mundo artístico não é diferente. 21. Também influenciado pelo fenômeno da globalização, clama pela preservação e pela garantia 3 do “bem comum global” , impossível de ser alcançado pelos próprios mecanismos do capital. 22. A própria Declaração da OIT sobre os princípios e direitos fundamentais no trabalho e seu seguimento, adotada durante a Conferência Internacional do Trabalho de 1998 ressalta a necessidade de se atribuir uma “feição mais humana à mundialização, de modo a assegurar o respeito aos direitos fun4 damentais dos trabalhadores” . 23. É que o fenômeno da globalização e da capitalização do trabalho humano resultam em estratégias empresariais de redução, a qualquer custo, das expensas associadas a produção/investimento. Como bem salientado pelo e. professor Márcio Túlio Viana: “se o empresário de ontem calculava os custos, projetava o lucro e fixava o preço, o de hoje estima o preço possível, fixa o lucro desejado e - como que retroce5 dendo - vai cortando os custos” , sempre com ganas especiais em relação aos encargos trabalhistas. 24. Aí exsurge o dano estrutural às relações de trabalho digno e a flexibilização desarrazoada dos direitos e garantias advindos do trabalho, em face dos quais deve o SINDICATO atuar em prol dos seus representados. 25. E não se diga que tal situação não ocorre no âmbito das apresentações artísticas, posto que até mesmo nos grandes festivais de música se verificou recentemente, em flagrante, as péssimas condições 6 de trabalho a que estão submetidos alguns dos trabalhadores . 26. Assim, ao sindicato cumpre o papel de exercer as suas respectivas funções de representação constitucionais, agindo em nome e em prol de uma determinada categoria nas suas relações perante o Estado, os empregadores ou outros órgãos enquanto intérprete das suas pretensões e reivindicações. 27. Não se confunde o sindicato com o conselho profissional (no caso, a OMB). A esse respeito, repise-se o posicionamento assumido pelo STF a partir do Voto do Ministro Rodrigues ALCKMIN nos autos da Representação n. 930/DF: [...] Mas – e é aqui que se põe o centro do problema – o que se pretende é que, como acontece com a Ordem dos Advogados, ou dos Médicos, ou com as profissões de engenheiros e de contadores, o de que se cuida não é de um sindicato, mas de uma ordem. E tal como a dos advogados, a dos corretores de imóveis seria lítica. Há entretanto, um fundamental equívoco nesse argumento. É certo que Ordens profissionais e sindicatos não se confundem. […]

28. Também nessa linha, é célebre a passagem inscrita por Minvielle em Ordres et Syndicats Professionnels, a qual, com a devida vênia por não empregar o vernáculo, relevamos transcrever: Le syndicat est le premier groupement qui ait pu se constituer librement en vue de la défense des intérêts 3

Relatório do Diretor-Geral da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre trabalho digno, em tradução livre.

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REEDS, Augustina. YATES, Charlotte. The ILO Declaration on Fundamental principles and Rights ar Work: The Limitations to Global Labour Standards in IRISH, Maureen. The Auto PAct: Investment, Labour and the WTO. The Hague: Kluwer Law Intl., 2004.

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VIANA, Márcio Túlio. A proteção Social do Trabalhador no Mundo Globalizado.

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“Rio de Janeiro – O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagraram, nesta sexta-feira (25), alojamento irregular de trabalhadores no Rock in Rio 2015. O local ficava na sede administrativa do evento, que foi cedido à empresa de limpeza Garrana para guarda de utensílios. Cerca de 15 empregados terceirizados dormiam sobre papelões, com roupa de cama particular e em meio a materiais de limpeza e restos de comida. Eles também cumpriam jornada de trabalho acima do combinado em contrato, em turnos sucessivos.” Disponível em http://portal.mpt.mp.br/wps/portal/ portal_mpt/mpt/sala-imprensa/mpt-noticias/ 3702e434-4202-4538-9d9a6808d2985452/!ut/p/z0/jYzJDoIwFEV_BRcsm_coZVoiMUQJUXfYjXkCahXK1Dj8vfgDxuW5OfeAhAKkpoe6kFGdpmbmg SPTopivdxilma7AOO9k6_WqcMTDGAD8rcwF_iYJ_kFZE_mypQ- d 1 C 4 A f J a u I I J j p w J z w 1 Z V E X E _ B D D i k e h J z z - varbMMgYZNlpU78MFG1vbJyoIauqLdX2Y60nsnGeLd0ZVSqabPyr3t_l6f2MFx_Bz7wT/ consulta realizada em 12.01.2015.

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de ses membres. Il est charge d’exprimer leus désirs et leus craintes, de provoquer les reformes utiles, de d’opposer à celles qui leur seraient. préjudiciables. Il représente une force qui s’exerce pour la création du droit. Pratiquement, le syndicat peut user pour une lutte efficace de l’arme de la grève et en user légalement puisque la Constitution de 1946 a reconnu le droit de grève et qu’aunée loi n’en a réglementé encore l’exercice. L’ordre est, au contraire, l’organisme charge de défendre l’état juridique établi. Il exige de ses membres le respect de la légalité. En comprenant dans cette légalité le respect de la moralité professionnelle. Il exerce, sous le control de l’stat, le pouvoir réglementaire et le pouvoir disciplinaire. Il défend les droits de ses membres, mais seulement si ces droit sont atteints d’une façon illicite. Il participe, par conséquente, à l’exercice du pouvoir politique si on prend cette expression. Dans son sens le plus large. [...] En créant les ordres, le législateur a établi l’organisation corporative de certaines professions et il doit réglé le domaine et les limites de l’autorité corporative. – l’ordre fait partie de l’administration de l’état. Le syndicat reste dans le domaine de la liberté etil peut exercer une action plus efficace comme promoteur des reformes désirées.

29. Tal ilação é importante, eis que demonstra, à clarividência, que as entidades sindicais e os conselhos profissionais se afastam quer pela sua personalidade jurídica, quer pela sua finalidade social. Nesse prisma, a análise mais acuidosa do posicionamento do STF no seio do RE. 414.42 permite concluir que é a atividade fiscalizatória do Conselho Profissional, e tão somente esta, que não se coaduna com a finalidade da expressão artística, nada havendo que se falar acerca da prerrogativa de representação obreira das entidades sindicais. 30. Assim, por óbvia conclusão, não se pode questionar alegalidade ou aconstitucionalidade da “ taxa sindical” (que, em verdade, possui natureza de contribuição, como veremos adiante) inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857/60, na sua proporção devida ao sindicato local, sob o mesmo fundamento empregado em relação à taxa devida em favor da Ordem dos Músicos do Brasil. 31. Com efeito, seria ingenuidade do legislador (e do hermeneuta) atribuir o mesmo fato gerador às duas exações, dada a diversidade da finalidade inata a cada uma das instituições. Evidencia-se, portanto, que o fato gerador da “taxa sindical” de 5% (cinco por cento) devidos em favor do sindicato não corresponde ao exercício de qualquer atribuição de fiscalização profissional, mas sim ao exercício da representação sindical de toda uma categoria profissional, reconhecido e consagrado na forma do art. 8º da Constituição da República. 32. Tal representação tem por escopo a preservação dos direitos e garantias do trabalho, bem como a própria dignidade do trabalho, independente da nacionalidade do músico/artista que performará em uma determinada apresentação. 33. Naturalmente, ao sindicato devem ser garantidos os meios e as receitas necessárias ao desenvolvimento da sua ação destinada a atingir os fins para os quais foi constituído. 34. É dessas premissas que parte a conclusão no sentido de que o fato gerador da “taxa sindical” constante do art. 53 da Lei n. 3.857/60 é, essencialmente, a representação sindical da categoria dos músicos, am7 8 parada assim pelos termos do art. 8º, IV , c/c art. 149, caput , ambos da Constituição Federal. 35. Nesse aspecto, mostra-se insubsistente o argumento de que o pagamento da modalidade contributiva inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857/60 em favor do sindicato malfere o direito à livre expressão artística. 36. Ao contrário, este garante a livre expressão artística desde que devidamente protegida 7

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: […] IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

8

Art.149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

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a sua esfera pertinente ao trabalho humano a partir da atuação de entidade sindical legitimada à defesa dos direitos e interesses de uma determinada categoria profissional. III.B) DA NATUREZA JURÍDICA ESPECÍFICA DO TRIBUTO. DA IRRELEVÂNCIA DA DENOMINAÇÃO DA “TAXA SINDICAL”. DA LEGITIMAÇÃO DO SINDICATO PARA O RECOLHIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO PREVISTA NO ART. 53 DA LEI N. 3.857/60. 37. Os principais aspectos a serem observados com relação à questão da legitimação da entidade sindical para o recolhimento da “taxa” constante do art. 53 da Lei n. 3.857/60 são, basicamente, a denominação “taxa” e a impossibilidade de pessoa jurídica de direito privado (caso dos sindicatos) se definir enquanto sujeito ativo de tal modalidade tributária. 38. Ocorre que qualquer análise sob tal ótica é equivocada, sendo por demais simplista e até mesmo contra legem, como veremos a seguir. 39. É fato que o nomen juris da exação em comentário se deu sob a denominação “taxa”, a partir do texto normativo contido na Lei n. 3.857/60. Taxa, como se sabe, é modalidade tributária imediatamente 9 vinculada à ação do Estado e à atividade pública , tendo por sujeito ativo (legitimado ao seu recolhimento), exclusivamente a pessoa jurídica de direito público legalmente habilitada para tanto. 40. Sob tal aspecto, é forçosa a conclusão no sentido de que sindicato não possui legitimidade para recolher qualquer taxa. 41. Ocorre que o Código Tributário Nacional, introduzido no ordenamento normativo brasileiro na forma da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 (posterior, portanto, à legislação de regência da profissão de músico) é bastante claro ao proclamar que “a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la a denominação e demais características formais adotadas pela lei ou a destinação legal do produto da sua arrecadação”10. 42. Nessa toada, sendo já evidente que o fato gerador da exação em questão é a contratação do músico estrangeiro para apresentação em território nacional, acrescida do exercício das prerrogativas sindicais de representação da categoria profissional dos músicos, não há que se falar em taxa sindical, mas sim em hipótese de contribuição corporativa de interesse da respectiva categoria profissional. 43. É que as taxas, nos termos da Constituição Federal, podem ser cobradas, exclusivamente, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição. 44. Ora, dada a própria natureza jurídica da entidade sindical, bem como as suas finalidades e prerrogativas constitucionais, não se verifica a subsunção da exação em questão à espécie tributária “taxa”. 45. O caso em questão reclama a acepção de Karl Larenz para a “redução teleológica”, consagrada no já mencionado art. 4º do CTN, mediante a qual se restringe a amplitude demasiada da expressão literal da norma, de modo a reconduzi-la ao âmbito correspondente ao seu sentido finalista11. 46. Nessa esteira, é pacífico o caráter tributário, “parafiscal” da exação/contribuição em questão, na medida em que: i) se trata de prestação compulsória (não voluntária); ii) de natureza pecuniária (em moeda); iii) não se constitui em sanção de ato ilicito; iv) encontra previsão legal na forma do art. 53 da Lei n. 9

Constituição Federal: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: […] II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; Código Tributário Nacional: Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a impôsto nem ser calculada em função do capital das emprêsas. (Vide Ato Complementar nº 34, de 1967) 10   Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá- la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.

11

Metodologia da Ciência do Direito. 1989.

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3.857/60; e v) é cobrada (ou haveria de ser) mediante atividade administrativa, cuja verificação seria feita no ato do registro do contrato de trabalho do músico estrangeiro junto ao Ministério do Trabalho. Ri12 gorosamente configurado o tributo, assim definido no art. 3º do CTN. 47. Portanto, tem-se por evidente o equívoco na compreensão da exação em questão como “taxa”, devendo esta ser analisada essencialmente sob a ótica de contribuição corporativa, tributo que é, porém dotado de especificidades decorrente do seu fato gerador e da sua destinação. 48. Resta óbvia, assim, a legitimação do sindicato para o recolhimento dos valores arrecadados sob a rubrica da “taxa sindical” inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857/60, porquanto esta se convole em espécie de contribuição corporativa prevista no art. 149 da Constituição Federal e tenha destinação insculpida na própria legislação de regência dos músicos. 49. Afastado, nessa linha, o argumento “tributário” que questionava a obrigação de pagar ex lege, sob análise. IV - DO REGISTRO DO CONTRATO DE TRABALHO PERANTE A AUTORIDADE COMPETENTE DO MINISTÉRIO DO TRABALHO: 50. Ao fim e ao cabo, tem-se que a comprovação do recolhimento da taxa/contribuição ora analisada configura requisito indispensável ao registro dos contratos de trabalho dos músicos estrangeiros, a fim de que estes tenham concedidos os seus respectivos vistos temporários para o exercício profissional em território nacional. 51. A concessão de visto temporário para o trabalho de artista estrangeiro necessita de autorização prévia junto à autoridade competente do Ministério do Trabalho, atualmente regulada na forma da Resolução Normativa n. 69/2006, do Conselho Nacional de Imigração e da Norma Operacional n. 3/2014, da Secretaria de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho e Emprego. 52. A esse respeito, conclusão do Tribunal de Contas da União nos autos do processo n. 020.515/2013-8: […] Em primeiro lugar, há que se considerar que a expedição do visto de trabalho de músicos estrangeiros depende necessariamente da emissão prévia de autorização de trabalho pelo MTE. Em segundo lugar, é importante lembrar que a lei estabelece, como condição para o registro do contrato de trabalho no MTE, a comprovação do pagamento da taxa pelo contratante. Por conseguinte, entendo que esta Corte possa determinar ao Conselho Nacional de Imigração e à Coordenação-Geral de Imigração do Ministério do Trabalho e Emprego que realizem estudo conclusivo com vistas a efetuar adequações nas normas que regem o procedimento de concessão d e autorização de trabalho a músicos estrangeiros de forma a permitir que sejam atendidas as disposições do art. 53 da Lei 3.857/60 […].

53. Nesse sentido, em nada se verifica a possibilidade de que qualquer artista estrangeiro se apresente em território nacional sem o registro do seu contrato de trabalho junto ao Ministério do Trabalho, aí inseridas todas as formalidades essenciais ao tal registro, inclusive a comprovação do recolhimento da taxa sindical inscrita ao art. 53 da Lei n. 3.857/60. V - CONCLUSÃO 54. Diante de toda a exposição acima, concluímos que: a) há uma intensa movimentação patronal, capitaneada pelas produtoras culturais nacionais, no sentido de se tentar dissuadir o adimplemento da obrigação tributária devida em favor das entidades sindicais na forma do art. 53 da Lei n. 3.857/60; b) tal movimentação tem por esteio principal 2 (dois) argumentos falaciosos, quais sejam a impossibilidade de cerceio da atividade artística e a ilegitimidade do sindicato para o recolhimento de “taxa”; c) ocorre que, conforme demonstrado acima, a atividade sindical em nada se confunde com a fiscalização profissional promovida pelas autarquias especialmente erigidas para tanto, tendo prerrogativa exclusiva de representação da categoria para a defesa dos seus interesses, direitos e garantias, independente 12

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

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d) também, verifica-se que a “taxa” ora aludida possui natureza jurídico-tributária de contribuição corporativa, parafiscal, sendo devida para todos os fins na forma da Lei, caracterizando, assim, a legitimação do sindicato para o seu recolhimento; e e) por fim, superados os argumentos em sentido contrário, se depreende a manutenção da obrigatoriedade do registro dos contratos de trabalho junto ao Ministério do Trabalho, após e somente se comprovado o preenchimento dos demais requisitos para tanto, aí inseridos, evidentemente, o recolhimento da contribuição estabelecida ao art. 53 da Lei n. 3.857/60, sob pena de caracterização de trabalho ilegal. 55. São as nossas considerações sobre o tema. Brasília, 12 de janeiro de 2016. Hora & Crispim Advogados Associados REFERÊNCIA REEDS, Augustina. YATES, Charlotte. The ILO Declaration on Fundamental principles and Rights ar Work: The Limitations to Global Labour Standards in IRISH, Maureen. The Auto PAct: Investment, Labour and the WTO. The Hague: Kluwer Law Intl., 2004. VIANA, Márcio Túlio. A proteção Social do Trabalhador no Mundo Globalizado. “Rio de Janeiro – O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagraram, nesta sexta-feira (25), alojamento irregular de trabalhadores no Rock in Rio 2015. O local ficava na sede administrativa do evento, que foi cedido à empresa de limpeza Garrana para guarda de utensílios. Cerca de 15 empregados terceirizados dormiam sobre papelões, com roupa de cama particular e em meio a materiais de limpeza e restos de comida. Eles também cumpriam jornada de trabalho acima do combinado em contrato, em turnos sucessivos.” Disponível em http://portal.mpt.mp.br/wps/portal/ portal_mpt/mpt/sala-imprensa/mpt-noticias/ 3702e4344202-4538-9d9a-6808d2985452/!ut/p/z0/jYzJDoIwFEV_BRcsm_coZVoiMUQJUXfYjXkCahXK1Dj8vfgDxuW5OfeAhAKkpoe6kFGdpmbmg SPTopivdxilma7AOO9k6_WqcMTDGAD8rcwF_iYJ_kFZE_mypQ- d 1 C 4 A f J a u I I J j p w J z w 1 Z V E X E _ B D D i k e h J z z varbMMgYZNlpU78MFG1vbJyoIauqLdX2Y60nsnGeLd0ZVSqabPyr3t_l6f2MFx_Bz7wT/ consulta realizada em 12.01.2015.

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Os Princípios de Direito do Trabalho e a Tutela da Vida Digna dos Trabalhadores na Atual Ordem Jurídica Constitucional Fábio Melhorance de Jesus1 SUMÁRIO 1. Introdução; 2. Desenvolvimento: 2.1. Abordagem Constitucional; 2.2. Princípios de Direito do Trabalho; 2.2.1. Princípio da Proteção, Tutelar ou Protetor; 2.2.2. Princípio da Primazia da Realidade; 2.2.3. Princípio da Irrenunciabilidade; 2.2.4. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego; 2.2.5. Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva; 2.2.6. Princípio da Intangibilidade Salarial; 2.3 Flexibilização e Desregulamentação das Normas Trabalhistas e o Papel dos Princípios como Instrumentos Limitadores de Alterações Prejudiciais aos Empregados; 2.4. A Tutela da Vida Digna do Trabalhador sob a Ótica Principiológica; 3. Considerações Finais. Referências. 1. INTRODUÇÃO O presente artigo visa a demonstrar a importância dos princípios do Direito do Trabalho e de como esses, considerados em sua ótica de verdadeiras normas jurídicas, podem servir de amparo à efetividade dos direitos dos trabalhadores, de modo a garantir-lhes uma vida digna, em consonância com os fundamentos da República Federativa do Brasil consubstanciados nos incisos II, III e IV do artigo 1º da Constituição (cidadania, dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho) e com os direitos e garantias fundamentais estatuídos nos artigos 5º a 11 da Lei Maior. Será verificado que as normas trabalhistas, bastante rígidas no passado, tornaram-se mais flexíveis ao longo dos últimos anos, sobretudo em razão do avanço do fenômeno da globalização mundial e da consequente necessidade de diminuição de custos para o empregador, o que acabou gerando a previsão normativa de algumas situações de relativização de direitos dos empregados, mitigação essa que pode ocorrer, nas estritas hipóteses legais ou, para alguns, também nos casos de necessidade de preservação da função social da empresa, mas, em qualquer caso, desde que os princípios básicos trabalhistas sejam devidamente respeitados, evitando-se, assim, uma possível desregulamentação, o que desvirtuaria por completo o sistema jurídico protetivo do Direito do Trabalho. 2. DESENVOLVIMENTO 2.1 ABORDAGEM CONSTITUCIONAL Existem quatro fases de evolução do Direito Constitucional que são fundamentais para o entendimento e o enquadramento dos princípios de direito do trabalho na perspectiva atual do ordenamento jurídico2, as quais serão expostas abaixo, de forma resumida. A primeira fase tem como marco histórico a Revolução Francesa (1789), que adveio para combater o Estado Absolutista da época, criando-se um Estado Moderno, com poderes separados e independentes, a fim de conter o poder absoluto existente até então. Nessa fase, são criados os direitos fundamentais, entretanto com um viés marcadamente liberal, de defesa dos cidadãos em face do Estado, o que significava que este deveria se abster de praticar atos que violassem a liberdade dos indivíduos, limitando, assim, a atuação estatal nas relações privadas (atuação negativa por parte do Estado). São os chamados direitos fundamentais de primeira geração ou dimensão, pautados no dogma da liberdade. De modo a combater o liberalismo exacerbado que marcou a primeira fase, surgiu a segunda fase de evolução do Direito Constitucional, marcada pela publicização do direito privado, “...fruto da pressão exercida pela reação dos trabalhadores explorados, que exigiu a intervenção do Estado nas relações privadas.”3,

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Advogado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho – Pós Graduação Lato Sensu pela Universidade Gama Filho (UGF).

CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do Trabalho. 6. ed. Niterói: Impetus, 2012, p. 169-171.

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CASSAR, op. cit., p. 170.

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Revista Jurídica Digital RTM aproximando o direito privado do direito público.

Em consonância com o movimento intervencionista do Estado que marcou a segunda fase, surge a terceira fase de evolução do Direito Constitucional, a partir da transposição de direitos sociais, especialmente os direitos trabalhistas, para a Constituição. É a denominada socialização dos direitos constitucionais. Surgem os direitos fundamentais de segunda geração ou dimensão, voltados a uma perspectiva de prestigiar mais a igualdade que a liberdade, estando neles inseridos os direitos sociais, de que são exemplos os direitos trabalhistas. Contudo, apesar do esforço observado na terceira fase, no sentido de positivar os direitos sociais na Constituição, alguns direitos sociais constitucionais eram interpretados como normas não autoaplicáveis, o que continuava por fragilizar a proteção dos grupos sociais menos favorecidos, dentre eles os trabalhadores. Por outro lado, havia, ainda, a fragilidade da efetividade dos direitos sociais (eficácia social), tendo em vista que, apesar de previstos nas leis e na Constituição, possuindo, assim, existência, validade e eficácia jurídica, alguns direitos sociais não eram devidamente respeitados, observados, aplicados por todos os indivíduos e pelo Estado. Conforme Vólia, após a Segunda Guerra Mundial, percebeu-se a necessidade de mudança do direito, pois, até então, as diversas violações aos direitos humanos tornavam seus infratores impunes, pois a lei posta não previa o caso como antijurídico; daí a necessidade de se buscar nos princípios constitucionais o comando imperativo. Surge, assim, a quarta e última fase de evolução do Direito Constitucional, a chamada fase do pós-positivismo ou da constitucionalização do Direito, momento em que o Direito se aproxima da ética, da justiça e da moral, afastando-se da concepção clássica de norma como sinônimo de regra, tão-somente. Assim, o pós-positivismo apresenta uma visão dicotômica de norma, entendida esta como gênero, do qual são espécies as regras e os princípios (e para alguns doutrinadores, como, por exemplo, Humberto Ávila, também os postulados – visão tricotômica, havendo, ainda, quem sustente os valores dentro do conceito de norma, a exemplo de Vólia Bonfim Cassar). Dessa maneira, a visão pós-positivista se pauta na ideia de que a interpretação da lei deve se dar não apenas conforme as regras positivadas na Constituição, mas sim com as normas constitucionais, as quais abrangem as regras, os princípios e, para alguns autores, os postulados e os valores; ademais, é importante observar que o sistema de direitos fundamentais influencia o direito infraconstitucional e vincula todas as funções e órgãos estatais. Modernamente, tais direitos não vinculam mais apenas o Estado (eficácia vertical dos direitos fundamentais), na relação jurídica entre Estado e indivíduos, mas, também, os particulares nas relações jurídicas travadas entre si. É a denominada eficácia horizontal dos direitos fundamentais. A Constituição é norma de conduta ou de comportamento (dever-ser), e não mera diretriz; logo, sendo integrada por normas-regras e normas-princípios, o Estado e os indivíduos deverão respeitá-la em sua inteireza, o que faz com que os princípios, nos dias atuais, sejam vistos como verdadeiras normas, em especial os princípios constitucionais. A Constituição é norma e traz diversos valores em forma de princípios. Portanto, na visão atual pós-positivista, os princípios constitucionais são considerados fontes formais do direito, dotados de imperatividade, já que são verdadeiras normas. Nesse diapasão, Luis Roberto Barroso4: “Na trajetória que os conduziu ao centro do sistema, os princípios tiveram de conquistar o status de norma jurídica, superando a crença de que teriam uma dimensão puramente axiológica, ética, sem eficácia jurídica ou aplicabilidade direta e imediata.”. Seguindo essa linha de raciocínio, pode-se dizer que os princípios de direito do trabalho, ainda que alguns não estejam previstos expressamente na Constituição, possuem natureza de normas constitucionais fundamentais, tendo em vista que estão embasados em diversos dispositivos da Lei Maior, explícita ou implicitamente. Isso porque, segundo a grande maioria da doutrina, os direitos fundamentais não são apenas aqueles elencados no Título II da Constituição (arts. 5º a 17). Nesse sentido, Alexandre de Moraes5, com amparo no disposto no art. 5º, §2º, da Constituição, afirma que “Os direitos e garantias expressos na Constituição Federal não excluem outros de caráter constitucional decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, desde que expressamente previstos no texto constitucional, mesmo que difusamente.”. 4

BARROSO, Luis Roberto (organizador). A Nova Interpretação Constitucional: Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações Privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 30.

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MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19.ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 106.

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Assim, pode-se concluir que os princípios de direito do trabalho são normas constitucionais, uma vez que visam a proteger a pessoa do trabalhador, tutelando, dessa forma, a sua dignidade, a partir da busca de melhores condições de trabalho, tanto no aspecto individual e coletivo, como também no próprio meio ambiente do trabalho, a partir da necessidade de redução dos riscos inerentes à atividade profissional. Logo, tutelando-se a dignidade do trabalhador, estar-se-á atendendo não somente à dignidade humana, considerada como princípio ou postulado máximo constitucional, mas também ao valor social do trabalho, ambos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III e IV, primeira parte, da Constituição) e da própria ordem econômica (art. 170 da Constituição – “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social...”), atendendo-se, dessa maneira, como um todo, à própria Constituição da República. 2.2. PRINCÍPIOS DE DIREITO DO TRABALHO A doutrina juslaboral diverge acerca do rol de princípios específicos ou peculiares de Direito do Trabalho, sendo certo que alguns autores apresentam um rol mais abrangente, ao passo que outros indicam uma lista mais restrita. No presente artigo, serão abordados, tão-somente, os princípios em que a controvérsia quanto à sua aplicação não existe ou é mínima. Assim, a reflexão se pautará nos seguintes princípios: princípio da proteção, que se subdivide nos princípios do in dubio, pro operario ou in dubio pro misero, da norma mais favorável e da condição mais benéfica; princípio da primazia da realidade; princípio da irrenunciabilidade; princípio da continuidade da relação de emprego; princípio da inalterabilidade contratual lesiva e princípio da intangibilidade salarial. 2.2.1. Princípio da Proteção, Tutelar ou Protetor O princípio da proteção, tutelar ou protetor é o fundamento e a base do Direito do Trabalho. Isso porque a diretriz básica do Direito do Trabalho é a proteção do trabalhador, tendo em vista que o empregado é a parte hipossuficiente e vulnerável da relação de emprego travada com o empregador, não tendo, portanto, a mesma igualdade jurídica que o empregador, como acontece com as partes das relações contratuais regidas pelo Direito Civil. Assim, a finalidade do Direito do Trabalho, é alcançar a igualdade substancial entre as partes, tendo em vista que o empregado já ingressa na relação de emprego em situação de desvantagem, seja porque é vulnerável economicamente, seja porque depende daquele emprego para sua sobrevivência, aceitando condições cada vez menos dignas de trabalho, seja, ainda, porque primeiro trabalha para, só depois, receber sua contraprestação6. Desse modo, sendo necessário proteger a parte mais frágil da relação de emprego, que é o empregado, justifica-se, nessa seara, a aplicação do princípio da proteção ao trabalhador, a fim de equilibrar juridicamente essa relação naturalmente desigual. Ou seja, pode-se dizer que o princípio da proteção consiste na aplicação ao Direito do Trabalho do princípio da igualdade em seu aspecto material ou substancial, já que, para compensar a desproporcionalidade econômica desfavorável ao empregado, na relação capital/trabalho (empregador x empregado), o Direito do Trabalho lhe destinou uma maior proteção jurídica, por meio da criação de outras desigualdades, de acordo com a máxima sempre lembrada de Ruy Barbosa: tratar de forma igual os iguais e de forma desigual os desiguais, na medida de suas desigualdades. Dessa maneira, o princípio da proteção se caracteriza pela intensa intervenção estatal nas relações de emprego, limitando, dessa forma, a autonomia de vontade das partes. Por meio dessa intervenção, o Estado legisla e impõe regras mínimas imperativas que formarão a estrutura basilar do contrato de trabalho celebrado entre empregado e empregador. A doutrina majoritária sustenta7, com base em Americo Plá Rodriguez, que o princípio da proteção é gênero do qual decorrem os subprincípios do in dubio, pro operario, da norma mais favorável e da condição mais benéfica, apesar de existir parcela minoritária da doutrina que entende que do princípio da proteção decorrem, também, todos os outros princípios trabalhistas.

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CASSAR, op. cit., p 185-186.

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CASSAR, op. cit., p. 186.

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O subprincípio do in dubio, pro operario, é utilizado para fins de definição do alcance da intepretação das normas trabalhistas, isto é, na dúvida do significado de uma determina norma, define-se a favor do empregado, parte mais frágil da relação capital/trabalho. Na verdade, cuida-se, mutatis mutandi, da aplicação, no Direito do Trabalho, do in dubio, pro reo, aplicado no campo penal. Em suma, o subprincípio em tela informa que, se uma determinada norma permite duas ou mais intepretações razoáveis e distintas, estará o intérprete vinculado à escolha daquela que se mostre mais favorável ao empregado, parte mais frágil da relação de emprego. Por sua vez, o subprincípio da norma mais favorável é utilizado no campo de dúvida de aplicação entre duas ou mais normas possivelmente incidentes no mesmo caso concreto, pressupondo, assim, a existência de um conflito de normas. Segundo esse princípio, não prevalece, necessariamente, no Direito do Trabalho o critério hierárquico tradicional de aplicação das normas, consagrado por Hans Kelsen, a partir de sua concepção piramidal de hierarquia de normas (Constituição é o fundamento último de validade em um ordenamento jurídico, a partir do qual emergem as demais normas, sendo a norma jurídica hierarquicamente superior fundamento de validade para a norma jurídica hierarquicamente inferior), mas sim o critério da norma que se demonstrar, no caso concreto, mais vantajosa para o empregado. Dessa forma, independentemente do seu posicionamento na escala hierárquica, existindo duas ou mais normas aplicáveis ao mesmo caso concreto, dever-se-á aplicar a que for mais favorável ao empregado, salvo se o aplicador do direito estiver diante de uma norma proibitiva estatal, a exemplo da que fixa prazos prescricionais (art. 7º, XXIX, da Constituição), caso em que não poderá negar incidência, mesmo sendo prejudicial ao empregado. A identificação da norma mais favorável se dá mediante os critérios de comparação entre as normas existentes que versem sobre o objeto da controvérsia, sendo três os mais conhecidos, a saber: teoria da acumulação ou atomista, que, em síntese, sustenta a soma de todas as partes favoráveis de todas as normas, ou seja, são selecionados, em cada uma das normas comparadas, os dispositivos mais favoráveis ao trabalhador; teoria do congloblamento, em que é buscado o conjunto normativo mais favorável, isto é, não há uma soma de todas as partes favoráveis de todas as normas, mas sim a aplicação de apenas uma das normas, tida como mais benéfica em seu conjunto, no seu todo, de forma global; teoria do conglobamento orgânico, por instituto ou da incindibilidade dos institutos, em que se extrai a norma aplicável a partir da comparação parcial entre grupos homogêneos de matérias ou institutos (férias, garantias provisórias de emprego, piso salarial, plano de saúde, jornada, repousos, percentuais de adicionais, benefícios concedidos por normas coletivas etc.), de uma e outra norma. Deve-se ressaltar que, apesar de a teoria do conglobamento ser a mais prestigiada na doutrina e na jurisprudência, em especial no que tange aos conflitos envolvendo normas coletivas (convenções coletivas e acordos coletivos de trabalho), no caso de conflito entre uma norma coletiva e uma lei, haverá que se utilizar o critério da acumulação, pois as leis trabalhistas são imperativas, não admitindo observância parcial ou derrogações. Assim, nesse caso, aplicar-se-á a lei, como patamar civilizatório mínimo, e as cláusulas mais benéficas da norma coletiva. O subprincípio da condição mais benéfica, também incidente no campo de aplicação das normas, tem correlação com a ideia de direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da Constituição), significando que deverão prevalecer as cláusulas mais vantajosas previstas no contrato individual de trabalho ou no regulamento de empresa, que incorporariam ao patrimônio do empregado, sem que, posteriormente, normas menos benéficas lhe fossem aplicadas. Ademais, ainda que as vantagens sejam concedidas de forma tácita, desde que com habitualidade, a incorporação deverá se fazer presente. 2.2.2. Princípio da Primazia da Realidade O princípio da primazia da realidade, que, para alguns, é a aplicação, no Direito do Trabalho, do princípio processual da verdade real, tem incidência com base no art. 9º da CLT (“serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”), significando que os fatos serão sempre mais relevantes que os ajustes formais, isto é, prima-se pelo que realmente aconteceu no cenário fático em detrimento do que foi formalizado no mundo do direito, sempre que não haja coincidência entre esses dois elementos (fatos e direito). 64


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Trata-se de princípio amplamente aplicado na seara trabalhista, diante das inúmeras tentativas de se mascarar a realidade dos fatos, principalmente no que tange à existência do vínculo de emprego. Assim, hodiernamente, é comum a existência de diversas técnicas fraudulentas que são objeto de combate efetivo e permanente do Ministério Público do Trabalho, como guardião dos direitos sociais dos trabalhadores. A título de ilustração, podem ser citadas as seguintes: utilização de falsas cooperativas de trabalho (as chamadas cooperativas “de fachada”); estágios irregulares; terceirizações ilícitas e constituição de trabalhador como pessoa jurídica (a chamada “pejotização”). 2.2.3. Princípio da Irrenunciabilidade Também denominado de princípio da indisponibilidade de direitos, princípio da inderrogabilidade ou princípio da imperatividade das normas trabalhistas, o princípio da irrenunciabilidade informa que os direitos trabalhistas não podem ser objeto de despojamento por parte do seu titular, pois decorrem, em sua grande maioria, de normas de ordem pública ou cogentes, portanto imperativas, não se incluindo no âmbito de livre disposição pelo empregado, configurando, assim, verdadeira mitigação do princípio civilista da autonomia da vontade. Assim, ao contrário do direito comum, em que os direitos patrimoniais são, via de regra, renunciáveis pelo seu titular, no Direito do Trabalho a regra é a irrenunciabilidade, excepcionada, tão-somente, pelos casos expressamente previstos na lei (um exemplo é o art. 14, §§2º e 4º da Lei nº 8.036/90, que prevê a opção retroativa pelo regime do FGTS a renúncia à estabilidade decenal) e na Constituição (art. 7º, incisos VI – redução de salário por meio de negociação coletiva; XII – compensação de horários e redução de jornada por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho; e XIV – aumento da jornada do trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, desde que autorizado por negociação coletiva). 2.2.4. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego Pelo princípio da continuidade da relação de emprego, tendo em vista que há interesse do empregado na permanência do contrato, fonte de sua subsistência, presume-se que os contratos tenham sido pactuados por prazo indeterminado, somente se admitindo excepcionalmente os contratos por prazo determinado. A regra, portanto, é que o empregado passe a integrar a estrutura da empresa de forma permanente. Nessa linha de entendimento, o TST se posiciona por meio de sua Súmula 212, in verbis: “O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado”. 2.2.5. Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva O princípio da inalterabilidade contratual lesiva possui previsão no art. 468 da CLT (“Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”), significando, em síntese, que, em regra, são vedadas as alterações do contrato de trabalho que tragam prejuízo ao empregado. Diz-se em regra, pois há hipóteses em que a própria lei ou a Constituição permitem alterações prejudiciais, como são exemplos o disposto no parágrafo único do art. 468 da CLT, que cuida da reversão do empregado ao cargo de origem, deixando de exercer a função de confiança, e o art. 7º, VI, da Lei Maior, que prevê a possibilidade de, por meio de negociação coletiva, ser reduzido o salário do empregado. 2.2.6. Princípio da Intangibilidade Salarial Pelo princípio da intangibilidade salarial, cujo principal fundamento é a natureza alimentar do salário, não se admitem o impedimento ou restrição à livre disposição do salário pelo empregado, sendo certo que a lei assegura ao empregado alguns mecanismos de proteção, podendo ser citados os seguintes: prazo para pagamento dos salários (art. 459 e 466 da CLT); modo e local para pagamento dos salários (art. 465 da CLT); vedação a descontos indevidos (art. 462 da CLT); impenhorabilidade dos salários como regra (art. 649, IV, do CPC); preferência dos créditos trabalhistas em caso de falência do empregador (Lei nº 11.101/2005).

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2.3. FLEXIBILIZAÇÃO E DESREGULAMENTAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS E O PAPEL DOS PRINCÍPIOS COMO INSTRUMENTOS LIMITADORES DE ALTERAÇÕES PREJUDICIAIS AOS EMPREGADOS Com o surgimento da globalização, o excesso de proteção ao trabalhador começou a ser questionado, sustentando os partidários do neoliberalismo a necessidade de uma revisão das garantias mínimas destinadas aos empregados. Assim, atualmente, o Direito do Trabalho vivencia uma fase de transição, em que se questiona o paternalismo estatal, isto é, a intervenção estatal em regras privadas. Nesse cenário, alguns estudiosos pretendem a desregulamentação, que significa a ausência total do Estado nas relações de trabalho, o que implicaria a ideia de um Estado mínimo, permitindo-se a livre manifestação de vontade (autonomia privada da vontade). Outros, no entanto, com base em algumas exceções já admitidas pela Constituição, em especial as contidas nos incisos VI, XIII e XIV do art. 7º, pretendem uma flexibilização, o que significaria a ausência parcial do Estado nas relações de trabalho, permitindo-se regras menos rígidas, sobretudo diante da real necessidade de recuperação da empresa, a chamada flexibilização necessária, mas com a garantia de condições mínimas de trabalho (mínimo existencial), que encontra respaldo no princípio da dignidade da pessoa humana, protegendo-se, dessa forma, os direitos básicos do trabalhador, a partir da manutenção de um núcleo mínimo de normas intangíveis, os denominados por Godinho8 direitos de indisponibilidade absoluta, que fazem parte do patamar civilizatório mínimo. Os princípios de Direito do Trabalho possuem um papel extremamente relevante no atual cenário brasileiro, uma vez que funcionam como verdadeiros instrumentos limitadores de alterações prejudiciais aos direitos dos trabalhadores. Isso porque não se deve esquecer o caráter protecionista que impera, ainda hoje, no Direito do Trabalho, cujo princípio basilar é o da proteção, já que a figura do empregado, como parte mais vulnerável da relação de emprego, no eterno embate entre capital e trabalho, deve ser protegida de toda forma de abuso ou desrespeito aos direitos trabalhistas por parte do empregador, sendo certo que este não só detém os meios de produção como também se encontra em situação muito mais vantajosa, pois não é ele que desprende sua força de trabalho em benefício de outrem, que gasta suas energias físicas e mentais em proveito de outra pessoa, mas sim o empregado, que, infelizmente, ainda nos dias atuais, é muitas vezes explorado econômica, social e juridicamente, por meio de estipulação de condições injustas de trabalho em troca de uma colocação no mercado de trabalho e de um pagamento de salário, muitas vezes aquém do mínimo legal ou do justo valor que deveria receber pelo desempenho de um determinado serviço. 2.4 A TUTELA DA VIDA DIGNA DO TRABALHADOR SOB A ÓTICA PRINCIPIOLÓGICA O novo contexto mundial, surgido nas últimas décadas, tem origem em vários fatores que proporcionaram grandes mudanças do mercado nos últimos anos: a exigência por uma maior agilidade dos serviços, a busca incessante de aumento nos lucros e a fuga da pesada carga tributária decorrente das relações de emprego. Tais fatores resultaram no fenômeno da globalização, com o cenário mundial sendo tomado por um paradoxo, uma vez que, ao mesmo tempo, deu-se o aumento do desemprego e o aumento da produção. No plano nacional, o único caminho capaz de propiciar a garantia, a efetividade e a implementação dos direitos fundamentais, se dá por meio da construção do Estado Democrático de Direito adotado na Constituição da República. Os dispositivos constitucionais devem servir como fundamento e como princípio norteador para a globalização econômica, pois somente assim, será possível efetivar os direitos sociais, dentre eles, os direitos trabalhistas, a fim de promover, juntamente com o desenvolvimento econômico, o desenvolvimento social. Um fator importante a salientar, quando se discute o problema do impacto da integração econômica sobre as relações de trabalho, é o chamado “dumping social”, que se relaciona com a grave violação dos direitos sociais, em especial pelo pagamento de baixos salários por parte de alguns Estados como mecanismo de redução de custos e, consequentemente, aumento da competitividade no mercado integrado. O neoliberalismo busca a preponderância do mercado em detrimento da pessoa, por meio do aumento incessante de lucro em detrimento da valorização da vida humana; no entanto, é importante observar que o 8

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004, p. 217-219.

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caput do art. 7° da Constituição apresenta como meta a melhoria das condições sociais dos trabalhadores urbanos e rurais. Assim, em busca da vida digna, o trabalho deve ser visto como fundamento da ordem econômica, funcionando os princípios jurídicos, em especial os princípios de Direito do Trabalho, como instrumentos limitadores de abusos por parte do empregador e, ao mesmo tempo, como ferramentas indispensáveis para a preservação da dignidade dos trabalhadores. Nessa linha de raciocínio, os direitos sociais, incorporados ao rol dos direitos fundamentais no texto constitucional vigente, ressaltam o trabalho como o elemento necessário para a construção de uma sociedade mais justa e digna. A Constituição da República define o trabalho como direito social fundamental (art. 6°); a sua valorização como fundamento do Estado Democrático de Direito (art. 1°, IV) e da economia (art. 170); servindo como base primária da ordem social (art. 193). Todos esses elementos conduzem a um princípio maior e mais amplo, que acabou por fundamentar todas as normas aqui apontadas, servindo de “mandamento nuclear de um sistema”, qual seja, o princípio da dignidade da pessoa humana. A importância de vincular o princípio de proteção ao trabalho ao princípio da dignidade da pessoa humana torna-se ainda mais necessária diante da existência de denúncias de trabalho análogo à condição de escravo em algumas regiões do Brasil, além das situações de absoluta penúria ou precarização em que trabalham diversas pessoas. Isso porque uma importante forma de caracterizar um direito como fundamental prende-se a sua contribuição para a dignificação do homem, que se projeta na liberdade individual, no convívio social e em todas as esferas possíveis de alcançar a plenitude do desenvolvimento humano, daí porque os direitos sociais são fundamentais, atingindo também as pessoas na produção e potencialização de sua personalidade. A dignidade engloba o respeito pelo trabalhador, sendo certo, ainda, que os direitos fundamentais envolvem a proteção de conservar a relação empregatícia contra a despedida arbitrária ou sem justo motivo, na medida em que, a sua agressão injustificada atenta contra a própria humanidade do indivíduo enquanto trabalhador empregado, levando-se em conta que, diante do status atribuído ao trabalho no contexto constitucional, o disposto no art. 7º, I, da Constituição deve ter a máxima eficácia possível, no sentido de garantir o emprego contra o despedimento arbitrário ou sem justa causa a todos os trabalhadores empregados. Portanto, o princípio (ou, para alguns, postulado) da dignidade da pessoa humana, que, aqui, pode-se adaptar para dignidade do trabalhador, se constitui em valor unificador de todos os direitos fundamentais, enquanto direitos humanos, servindo como elemento referencial para a aplicação e interpretação das normas constitucionais e infraconstitucionais, notadamente no âmbito do Direito do Trabalho, devendo ter, não apenas, existência e validade, mas plena eficácia e eficiência, sob pena de se tutelar de forma indigna os direitos dos trabalhadores. Assim, não se concebe, atualmente, como Estado Democrático de Direito aquele país em que se permite a violação dos direitos humanos, pois tal Estado deve ser visto não apenas como aquele em que tudo que se realiza ou se executa é com base no Direito, mas também como aquele atrelado a um conteúdo de justiça, já que somente existirá, na concepção moderna, quando forem respeitados os direitos fundamentais dos indivíduos, dentro dos quais se inserem, como visto, os direitos sociais dos trabalhadores. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a exposição acima, pode-se concluir que, no atual estágio de desenvolvimento do Direito, calcado, sobremaneira, no pós-positivismo e na ideia de Estado Democrático de Direito, princípio é espécie de norma jurídica. A importância dos princípios é notada em todos os campos em que o operador do Direito atua, a saber: no momento da elaboração ou confecção da norma, cuja função típica pertence ao Poder Legislativo; na interpretação das leis (consideradas em sentido amplo); e na aplicação das demais normas, aplicação essa que pode ocorrer tanto nos casos em que o ordenamento jurídico não prevê em suas normas uma solução para o caso concreto (aplicação indireta, consubstanciada na função supletiva ou integradora, utilizada nos casos de lacuna legal) como nas hipóteses em que há a previsão de uma norma, sendo o princípio, que também é norma, utilizado de forma direta e imediata, mesmo não existindo, nesse último caso, qualquer lacuna na lei. 67


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Dentro da sistemática de aplicação dos princípios, é importante sublinhar que o princípio da proteção é a base de todo o sistema jurídico trabalhista, tendo em vista a necessidade de se proteger a figura do empregado, parte mais vulnerável da relação de emprego. Assim, nessa linha interpretativa, existindo dúvidas em saber qual das normas aplicar (princípio da norma mais favorável), entre qual interpretação realizar (princípio do in dubio, pro operario), bem como em saber se uma determinada condição integra ou não o contrato individual de trabalho (princípio da condição mais benéfica), o intérprete e aplicador do Direito irá encontrar a resposta no princípio da proteção, pois irá interpretar e aplicar a norma com base no que for mais favorável ao empregado. Da mesma forma, na dúvida da duração de um contrato de trabalho, se por prazo determinado ou por prazo indeterminado, não havendo qualquer cláusula expressa a respeito da vigência, a presunção será que o contrato vigora por prazo indeterminado, tendo em vista que é a saída mais segura, juridicamente, aos anseios do trabalhador (princípio da continuidade da relação de emprego). Ao contrário do Direito Civil, essencialmente formalista, o Direito do Trabalho é notadamente marcado pela realidade dos fatos, ou seja, privilegia-se, no âmbito trabalhista, a realidade à forma jurídica utilizada (princípio da primazia da realidade sobre a forma). Desse modo, sendo dotado de intensa proteção ao empregado, o Direito do Trabalho, apesar de ser um ramo do Direito Privado, tem forte feição pública, pois é composto de diversas normas de ordem pública, cogentes, imperativas e indisponíveis. Essa excessiva proteção, que para alguns defensores do pensamento neoliberal não deve mais se sustentar, é, na verdade, de fundamental importância para o alcance da plena efetividade dos direitos do trabalhador, uma vez que somente com uma forte atuação estatal no proceso de elaboração de normas jurídicas favoráveis ao empregado é que se estará, efetivamente, protegendo os trabalhadores dos abusos diuturnamente praticados pelos empregadores. Portanto, tal proteção se justifica, levando-se em conta que os direitos dos trabalhadores, ainda que não previstos na Constituição, são de cunho social e, mais que isso, ostentam natureza de direito fundamental, já que o trabalho é direito social estampado expressamente na Lei Maior (art. 6º), sendo, ainda, a dignidade humana e o valor social do trabalho fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III e IV, da Constituição), o que robustece, ainda mais, a necessidade de se tutelar a figura do trabalhador, conferindo-lhe condições para o exercício de um trabalho digno, a fim de igualá-lo juridicamente ao empregador, pois, somente assim, se estará respeitando plenamente a sua dignidade. REFERÊNCIAS ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed., 2ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2005. BARROSO, Luis Roberto (org). A Nova Interpretação Constitucional. Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações Privadas. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do Trabalho. 6. ed. Niterói: Impetus, 2012. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Eletrônico, versão 7.0.2. 5. ed. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Regis Ltda., 2010. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19.ed. São Paulo: Atlas, 2006. SUSSEKIND, Arnaldo. et al. Instituições de Direito do Trabalho, vol. 1. 18. ed. São Paulo: LTr, 1999. _________________________

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RECONVENÇÃO.CONTRA.TERCEIRO.NO.PROCESSO.DO.TRABALHO Nara Brito Barro1 O instituto da Reconvenção iniciou seu histórico no direito brasileiro com o Código de Processo Civil de 1939, que influenciado pelo direito canônico, autorizava a reconvenção quando o réu tivesse ação que visasse a “modificar ou excluir o pedido” do autor (Art. 190). O Código de 1973 dispôs que o réu poderia reconvir ao autor, no mesmo processo, sempre que a reconvenção fosse conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa. Trata-se de uma modalidade de resposta em que o réu demanda em face do autor na mesma relação jurídico-processual. A natureza jurídica da reconvenção é de uma ação autônoma conexa ao processo, com pressupostos processuais específicos. Não é defesa, é demanda, ataque. Esta ação amplia objetivamente o processo, isso significa que o processo passa a ter novo pedido. Referido instituto está previsto atualmente no art. 343 do Novo Código de Processo Civil, devido as alterações previstas no projeto primitivo que acabou restabelecendo-a, pois havia a intenção de substitui-la pelo pedido contraposto, diante da busca por uma maior simplificação de procedimentos e garantia de economia processual. Contudo, a reconvenção foi flexibilizada no novo Codex, em busca destes princípios. Existe cizânia doutrinária quanto à sua aplicação no processo do trabalho. A doutrina que defende sua não aplicação, sendo um de seus representantes Manoel Antônio Teixeira Filho, argumenta que houve silêncio eloquente do legislador celetista ao não tratar sobre referido instituto, pois quando a CLT foi elaborada, o CPC/39 já cuidava da ação reconvencional e, ainda assim, a norma trabalhista não tratou do instituto, não caracterizando, portanto, uma omissão. Ademais, fundamentam que a reconvenção, ao ampliar objetivamente o debate, compromete a celeridade na solução do litígio, princípio este que norteia todo o processo do trabalho. Em sentido diverso, há quem defenda sua aplicação no processo trabalhista, pois presente a lacuna e compatibilidade da reconvenção do processo comum com o laboral (art. 15 do CPC e 769 da CLT). Representando esta corrente, Mauro Schiavi defende que a utilização deste instituto traz maior eficiência da jurisdição trabalhista e atende aos princípios da economia processual e acesso à Justiça do Trabalho, pois num sentido macroprocessual, haveria apenas uma demanda na qual solucionaria o conflito de forma abrangente, atingindo maior pacificação social. É esta a corrente majoritária doutrinariamente e adotada pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho. A grande inovação do novo Código se deu na instauração do procedimento da reconvenção que, doravante, será proposta na petição da contestação (NCPC, art. 343, caput). No tempo da lei anterior, embora oferecida simultaneamente com a contestação, a reconvenção deveria sempre ser deduzida em petição autônoma, que, contudo, não reclamava autuação apartada e era, tão somente, juntada aos autos, tal como a da contestação. Agora, a reconvenção será proposta na própria contestação, como parte integrante da respectiva petição, da qual formará um capítulo. É importante ressaltar, porém, que, a despeito da alteração procedimental, a reconvenção continua a ser uma ação autônoma, e não um simples meio de defesa. No Direito Processual do Trabalho, há muito a jurisprudência aceita que a reconvenção seja aduzida no próprio corpo da contestação com fundamento no princípio da informalidade que o rege, mesmo quando vigente o Código de Processo Civil de 1973. O art. 847 da CLT disciplina que a contestação seja apresentada de forma oral na própria audiência, e como a reconvenção também deve ser apresentada em audiência junto com a defesa, esta pode ser aduzida de forma oral, no mesmo ato, e o registro dos dois atos constará da mesma ata de audiência. Sendo assim, não há razão para não se admitir, no Processo do Trabalho, que a reconvenção seja articulada na própria peça de contestação. Assim, a reconvenção na Justiça Laboral pode ser escrita ou verbal, mas deve observar os requisitos 1

Advogada. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidad de Buenos Aires – UBA, Argentina.

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da petição inicial trabalhista elencados no art. 840 da CLT e demais pressupostos específicos. Dentre os pressupostos da reconvenção estão: a existência de causa pendente; sua apresentação na fase de defesa, sendo que no processo do trabalho, como não há prazo para o oferecimento de resposta, por parte do réu, este deverá apresentar reconvenção na audiência destinada à sua defesa; os procedimentos terem a mesma identidade, pois a ação e a reconvenção deverão ser julgadas na mesma sentença; sua conexão com a ação principal ou com o fundamento da defesa, sendo que no caso do processo do trabalho, cumpre ser entendido, na maioria dos casos, como o contrato de trabalho firmado entre as partes; e ainda que a competência do juízo seja a mesma, pois é inadmissível que a reconvenção fosse apresentada a juízo incompetente para examiná-la, embora este possuísse competência para a ação principal. Justamente a existência deste último pressuposto para a reconvenção é que se discute ser possível a reconvenção contra terceiro na Justiça do Trabalho. Para que o réu (reconvinte) reconvenha ao autor (reconvindo), não pode a relação ser meramente civil ou mercantil. O art. 343 do Novo Código de Processo Civil traz expressamente a previsão de reconvenção contra terceiro no seu parágrafo 3º, sendo esta a redação: “A reconvenção pode ser proposta contra o autor e terceiro.”. Numa primeira leitura, pode-se entender que seria apenas possível que o terceiro estivesse no polo passivo da reconvenção, contudo, a reconvenção também poderá ser proposta pelo réu em litisconsórcio com terceiro (§4º do referido artigo). Esta previsão resolve a divergência doutrinária e jurisprudencial sobre o tema. Por exemplo, Cândido Rangel Dinamarco já admitia que houvesse a ampliação de sujeitos com a reconvenção, tanto no polo ativo como passivo. O autor afirma que: A admissibilidade da reconvenção subjetivamente ampliativa é expressão da legítima tendência a universalizar a tutela jurisdicional, procurando extrair do processo o máximo de proveito útil que ele seja capaz de oferecer (supra, n.40 e 42)2. Sobre o tema, foi editado o Enunciado 18 do 1º Fórum Nacional de Processo do Trabalho, o qual defendese não ser possível a reconvenção contra terceiro no processo do trabalho e que conta com a seguinte redação: Enunciado 18: CLT, ART. 769 E NCPC, ART. 343. RECONVENÇÃO. Diante de lacuna da CLT quanto à reconvenção, a regra do art. 343 que possibilita ao réu apresentar essa ação contra o autor na contestação, aplica-se no processo do trabalho. Não se admite a possibilidade de ampliação subjetiva da lide prevista nos parágrafos 3º e 4º do art. 343 do NCPC. Resultado: aprovado por maioria qualificada. Apesar do entendimento consubstanciado acima, a Instrução Normativa 39 de 2016 editada pelo Tribunal Superior do Trabalho, que dispõe sobre as normas do novo Código de Processo Civil aplicáveis e inaplicáveis ao processo do trabalho, nada apontou se o referido parágrafo aplica-se ou não ao processo do trabalho. O fato da referida Instrução ter silenciado sobre o tema, demonstra a intenção por parte da Corte Trabalhista sobre o amadurecimento de um debate ao longo do tempo sobre sua viabilidade nesta seara. Os defensores sobre a sua não aplicação no processo do trabalho argumentam que poder-se-ia comprometer a rápida solução do litígio. Desta forma, reverenciam os princípios da celeridade e economia processual que são basilares nesta seara. Em linha diversa, embora no processo civil tal providência tenha sido elogiada pela doutrina, o presente dispositivo pode ser aplicado na Justiça do Trabalho, mas com interpretação restrita, sendo aceita apenas quando houver competência desta especializada para apreciar a matéria, que ela seja comum ao autor e ao terceiro, não gerando complicadores ao processo e nem atrase em demasia a prestação jurisdicional. Contudo, em se tratando de litisconsórcio passivo necessário na reconvenção, cuja ação principal se processa pelo rito ordinário, tal instituto deve ser utilizado, pois já estariam implicitamente presentes os requisitos para sua análise, não comprometendo princípios basilares desta seara. Ademais, garantir-se-ia a validade ou a eficácia da decisão (se litisconsórcio unitário ou simples, respectivamente), bem como se evitaria decisões conflitantes referentes a uma mesma situação jurídica.

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DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, 5º ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 505.

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Fredie Didier Jr, acrescentando que a ampliação subjetiva, em tese, ocorre em duas hipóteses: a primeira, quando for uma hipótese de litisconsórcio necessário e a segunda, quando a formação do litisconsórcio derivar do mesmo fundamento de fato ou de direito3. Leonardo Greco4 refere-se ao tema admitindo que, a partir da previsão do novo CPC, seja formado o litisconsórcio tanto no polo ativo como passivo. Exemplo hipotético de sua aplicação no processo do trabalho, seria quando direcionado a terceiro estranho à lide principal, ampliando o limite subjetivo da demanda, em que o empregador entra com ação principal alegando que a rescisão se deu por justa causa, e o empregado (réu) apresenta além da contestação, sua reconvenção em face do autor e terceiro, empregado gerente da empresa, alegando que houve abuso sexual por parte deste, e que a rescisão se deu por justa causa patronal. Nesta hipótese, a relação de fundo é a empregatícia, sendo que caberia a condenação por danos morais em face do terceiro. Ressalta-se que para Manoel Antônio Teixeira Filho, caso o terceiro seja um assistente, isso pode trazer uma complicação quando sua intervenção ocorrer após o oferecimento da reconvenção – que por motivo óbvio, não terá sido dirigida ao terceiro. Nesse caso, caberá ao magistrado consultar o reconvinte para que se manifesta sobre sua intenção de dirigir a reconvenção ao terceiro, pois não seria uma obrigação sua inclusão na referida ação. Caso o reconvinte concorde com essa inclusão, o juiz deverá intimar o assistente para que apresente resposta à reconvenção no prazo de 15 dias. Contudo, o doutrinador afirma que tal hipótese somente seria possível se caso ainda não realizada a instrução oral do processo (depoimento das partes, inquirição de testemunhas). Do contrário, tumultuaria o procedimento com possível produção de novas provas por parte do assistente depois de realizada a instrução alusiva à ação. Desta forma, em que pese argumentos em sentido contrário, da não aplicação da reconvenção contra terceiro no processo trabalhista, caso referido instituto seja utilizado com respeito aos pressupostos específicos, tal modalidade pode trazer maio celeridade à prestação jurisdicional, pois em um mesmo processo se decidiria duas lides, havendo maior probabilidade de acordo entre as partes, o que preveniria ação futura de regresso da empresa contra o terceiro empregado, utilizando o exemplo dado acima, e em respeito à efetividade e duração razoável do processo, evitando, ainda, decisões conflitantes ou contraditórias. Referência bibliográfica DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento, 17ª ed. Salvador: Jus Podvm, 2015. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, 5º ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 505. GRECO, Leonardo. Instituições de Processo civil – Processo de Conhecimento, v. II. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. RAMOS, Fernanda de Oliveira Santana. In Comentários aos enunciados do 1º fórum acional de processo do trabalho. [org.: MIZIARA, Raphael; PINHEIRO, Iuri Pereira; LEME, Ana Carolina Paes]. Belo Horizonte: RTM, 2016. (no prelo) SCHIAVI, Mauro. Manual de processo do trabalho. 10ª edição. São Paulo: LTr, 2016. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. Comentários ao novo código processo civil sob a perspectiva do processo do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 2016. THEODORO JUNIOR, Humberto: colaboradores, Humberto Theodoro Neto, Adriana Mandim Theodoro de Mello, Ana Vitoria Mandim Theodoro. Código de Processo Civil Anotado. 20ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2016. ________________________

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DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento, 17ª ed. Salvador: Jus Podvm, 2015, 658/659.

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GRECO, Leonardo. Instituições de Processo civil – Processo de Conhecimento, v. II. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, página 73.

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PROIBIÇÃO DE ENTRADA E PERMANÊNCIA DE MENORES DE 18 ANOS EM LOCAIS QUE REALIZAM APOSTA Felipe Alves de Oliveira1 A Constituição da República de 1988, estabeleceu igualdade e proteção de todos perante o Estado democrático de direito, bem como a corresponsabilidade da sociedade perante a criança e adolescente. Políticas de proteção que estão definidas na CF/88 nos artigos 204 e 227 transcrevem a descentralização político-administrativa e a participação popular nas políticas públicas referentes à proteção dos menores de 18 anos. A responsabilidade passa não ser única e exclusivamente do Estado, sendo ampliada para a família e toda sociedade. (Doutrina da Proteção Integral). O art. 227 da CF/88, preceitua a característica de lei protetiva, ou seja, uma norma legal que estabelece direitos e responsabilidades. O Estatuto da Criança e Adolescente ECA - (Lei nº 8.069/90) – propõe a proteção integral dos menores de 18 anos de idade e também estabelece direitos e responsabilidades para toda a sociedade, entidades e entes federados, o que caracterizada a corresponsabilidade em garantir a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, no que tange à educação, lazer, cultura e dignidade. Com o objetivo de otimizar os afazeres do dia a dia, nos foi colocado à disposição a possibilidade de pagamento de contas, boletos e carnês nas casas lotéricas. Com essa facilidade oferecida para a sociedade surgem também problemas. As agências lotéricas passam a ser mais visadas pelos assaltantes como também há facilidade de acesso das crianças e adolescentes as referidas agências lotéricas, até mesmo a pedido dos pais para cumprir alguma obrigação financeira, o que é vedado conforme a seguir exposto. O ECA, no seu art. 80 descreve que: “Os responsáveis por estabelecimentos que explorem comercialmente bilhar, sinuca ou congênere ou por casas de jogos, assim entendidas as que realizem apostas ainda que eventualmente, cuidarão para que não seja permitida a entrada e a permanência de crianças e adolescentes no local, afixando aviso para orientação do público.” Entendemos que nesta prescrição se enquadra as agências lotéricas em relação ao acesso e permanência de menores de 18 anos aos seus estabelecimentos. Devemos observar que além de proibido, o acesso acompanhado também com os pais ou responsáveis acarretará prejuízo para a formação psíquica, moral e ética do menor de 18 anos. Não devemos nos esquecer que as crianças sempre se espelham em seus pais e tentam copiá-los ao máximo. Vendo os seus pais jogarem poderá despertar na criança e no adolescente o interesse pelos jogos de azar, e, de uma forma indireta incentivados pelos pais, que têm dever protetivo. A prática nos mostra que na maioria das cidades, o acesso dos menores de 18 anos é “tolerável” nas casas lotéricas. Algumas vezes encontramos crianças brincando com canetas e cartões de marcação de jogos lotéricos. Geralmente as crianças e adolescentes estão nesses locais para pagamentos de contas, mas não é raro também nos depararmos com os menores de 18 anos realizando apostas para os pais ou para eles mesmos, o que sem dúvida, caracteriza um enorme prejuízo para o seu desenvolvimento sadio. Devemos observar que certos ambientes não são propícios à criança e ao adolescente porque podem influenciar de forma negativa na sua formação. Nesse sentido, faz-se necessário trazer o entendimento do ilustre Tarcísio José Martins Costa, que assevera: “ Quanto aos jogos de aposta a que se refere o artigo, incluem-se tanto os legalmente permitidos como os tolerados. Note-se no artigo 31, VI, do ECA proíbe a venda de bilhetes lotéricos a crianças e adolescentes. A expressão bilhetes lotéricos abrange todos os jogos de apostas: loteria esportiva, raspadinha, sena, sorteca, totobola e dezenas de outras modalidades existentes. Embora as casas lotéricas tenham se transformado em agências arrecadadoras da Caixa Econômica Federal, os menores de 18 anos estão proibidos de ter acesso às suas dependências, até mesmo para pagamento de contas. Na realidade, o Brasil está se transformando num grande cassino, bancado pelos governos federal e estaduais, com as mais variadas modalidades de jogos, entre eles os bingos e caça-níqueis, que se espalham por todos os cantos da nossa cidades como cogumelos venenosos”2.

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Artigo escrito por Felipe Alves de Oliveira, advogado militante, graduado pela Direito da Faculdade de Direito Milton Campos. Artigo elaborado conjuntamente com o Prof. MS. Paulo Tadeu Righetti Barcelos (Advogado e Professor das Faculdades Milton Campos- Nova Lima).

COSTA,Tarcísio José Martins. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado,Belo Horizonte, p.156,2004

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Os locais em que, são realizados os jogos, mesmo que eventualmente, são inadequados para os “menores”, para acesso e permanência das nossas crianças e adolescentes. Como é por nós sabido, o jogo pode trazer de forma grave e irredutível, prejuízos à formação moral, psíquica e afetar de forma direta a saúde econômica e financeira dos pais e familiares. Depois que o “menor” é afetado pelos jogos de azar, uma vez que esses passam a sustentar o seu vício causado pelo jogo, podem acabar com as finanças daqueles que vivem a sua volta e em casos mais extremos passam a cometer atos infracionais para sustentar a dependência pelo jogo. O que nos chama a atenção é que a União e os Estados membros proíbem veementemente os jogos de azar não aceitos pelas suas legislações específicas, mas é o grande operador e responsável pelos jogos de prognósticos no país, jogados nas agências loterias é por ela autorizada. Querendo ou não, o jogo autorizado também é caracterizado como de “azar” devendo recair a fiscalização e responsabilização sobre casas lotéricas quando permitirem o acesso de crianças e adolescentes ao seu recinto. Devemos nos manter em alerta, pois essas agências estão espalhadas pelo país em grande proporção, e daí poderemos chegar a seguinte conclusão: as mesmas proporções que elas crescem seus estragos também serão de grande vulto. Importante observar que os prejuízos que as agências poderão ocasionar a formação das nossas crianças e adolescentes, será na mesma proporção em que elas se espalham pelo país, como as drogas que invadem a nossa sociedade, e se não tomarmos nenhuma providência será irreversível. Conforme prescreve o art. 81, VI, do ECA, o qual proíbe a venda de bilhetes lotéricos e equivalentes aos menores, em nossa legislação específica há uma grande preocupação com a profissionalização, formação e escolarização das crianças e adolescentes (arts. 4º, 53 a 59 e 60 a 69), sendo esse o caminho a ser trilhado por elas. O jogo é prejudicial para a formação da moral e dignidade do homem, devendo os menores serem afastados desses vícios, para um desenvolvimento pleno e sadio. Segundo o art. 258 (ECA) o responsável pelos referidos estabelecimentos, se negligente, pode ser condenado à pena de multa de três a vinte salários, e, em caso de reincidência, o juiz da Infância e Juventude poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até quinze dias. A Câmara Especial do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação Cível n.13.385-03, tendo como relator o Desembargador Torres de Carvalho, decidiu que o fato dos menores estarem apenas assistindo a uma disputa de sinuca não descaracteriza a infração, pois não foi impedida a sua entrada nem anexado aviso necessário em locais onde se praticam esses jogos. Diante do exposto, devemos observar que a nossa legislação protetiva analisada de forma sistemática, mostra que o ECA e a nossa Constituição se preocupam com a formação, dignidade, escolarização e profissionalização das crianças e adolescentes, tratados nos artigos 227 da constituição e 18 do ECA. O intuito do legislador é afastar as crianças e adolescentes desses “cogumelos venenosos” conhecidos como jogos de azar que destroem de forma impiedosa a formação da moral, honra e saúde mental e física dos indivíduos, durante e depois a fase adulta. Todos temos a obrigação de prevenir de forma rigorosa, por meio de uma fiscalização conjunta da sociedade, família e Estados, pois, à nós também foi atribuída essa responsabilidade, devemos afastar os nossos jovem de quaisquer vícios que posam afetar o seu futuro, destruir sua moral, saúde e afetar o físico e em muitos casos a família que é a base da nossa sociedade. Inclusive o simples acesso não obstante tolerável, é proibido, por ser o ambiente inadequado para o desenvolvimento saudável do menor, conforme os artigos acima mencionados. Referência bibliográfica JOÃO ELIAS, Roberto. Comentários ao Estatuto da Criança e Adolescente, Ed. Saraiva,2008 COSTA,Tarcísio José Martins. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado,Belo Horizonte, p.156,2004 ISHIDA,Valter Kenji.Estatuto da Criança e Adolescente.Doutrina e Jurisprudência , Atlas, 10ª Ed.2009

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JOÃO ELIAS, Roberto. Comentários ao Estatuto da Criança e Adolescente, Ed. Saraiva,2008

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NOVOS CONCEITOS PARA O DIREITO CONSTITUCIONAL Janou Saldanha1 Sumário: 1 Introdução; 2 Da teoria formal da Constituição à teoria material concretizante da lei fundamental; 3 A força normativa dos direitos fundamentais: efeitos vinculantes e irradiantes dos direitos fundamentais; 4 Neoconstitucionalismo e sua contribuição para a efetivação dos direitos fundamentais; 5 Summa divisio constitucionalizada: um modelo constitucional brasileiro; 6 Considerações finais; Referências.

Resumo: O presente trabalho tem como desafio apresentar novos conceitos para o Direito Constitucional à luz dos Direitos Fundamentais, notoriamente concebidos como medula do Direito Constitucional, na realidade do Estado Democrático de Direito. O desafio se impõe como medida necessária à clamada modificação social, estatuída na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, carente até a atualidade de esforços para a implementação da democracia concretizante dos Direitos Fundamentais. Palavras-chave: Direito constitucional. Direitos fundamentais. Constitucionalismo. Teoria dos direitos fundamentais. Novos conceitos. Abstract: This present work has as its challenge to introduce new concepts for Constitutional Law in light of fundamental rights, notably designed as the backbone of Constitutional Law, in reality, of the democratic rule of law. The challenge is imposed as a necessary measure to the long-sought social change, set forth in the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, which still lacks, to date, the efforts to implement a realizing democracy of fundamental rights. Keywords: Constitutional Law. Fundamental Rights. Constitutionalism. Theory of fundamental rights. New concepts. 1 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como desafio apresentar novos conceitos para o Direito Constitucional à luz dos Direitos Fundamentais1, a fim de oportunizar não só a interpretação Constitucional, mas a implementação de um modelo brasileiro de Estado Democrático de Direito. Já de início ressalta-se, como objeto de estudo dos direitos e garantias fundamentais, o próprio conceito atual do Direito Constitucional2. Disciplina notadamente responsável pela estruturação do poder político, controles jurídicos e limites de atuação. Vinculação esta, de viés existencial entre Direito Constitucional e poder, pressuposto da existência do político, que direciona conhecimentos sobre paradigmas e problemas do Estado Democrático de Direito. Para iniciar a proposta de um novo paradigma é necessário recolher algumas compreensões sobre o Direito Constitucional, vez que as mesmas encontram-se arraigadas nos “saberes” dos juristas que militam, interpretam e dão aplicação às normas (regras e princípios) do Direito pátrio. Nesse recorte, apontam-se duas definições de direito constitucional. A primeira, do constitucionalista José Afonso da Silva, e a segunda, do jurista e escritor De Plácido e Silva: A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria então, a organização dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma de Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício de poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos do Estado. (SILVA, 2001, p. 33-34). DIREITO CONSTITUCIONAL. Elaborado por um poder especial, denominado de Constituinte, que se entende instituído da vontade soberana de um povo politicamente organizado, o Direito Constitucional, como o mais fundamental dos Direitos Públicos, de ordem interna, enfeixa todos os princípios jurídicos, indispensáveis à organização do próprio Estado, à constituição do seu governo, dos poderes públicos, à declaração de direitos das pessoas, quer físicas, quer jurídicas, traçando assim os limites de ação do Estado, na defesa de seus precípuos objetivos e na defesa dos interesses da coletividade que o compõe. [...]. (SILVA, 2007, p. 464-465).

Contudo, os conceitos apresentados não se mostram suficientes às necessidades coevas, pois, o reconhe1

Professor. Advogado. Mestre em Direito pela Universidade de Itaúna (FUIT). Especialista em Direito Processual pela Universidade Católica de Minas Gerais (IEC PUC Minas). Especialista em Direito Tributário pelo Centro de Atualização em Direito (CAD). Especialista em Gestão Empresarial (MBA Executivo) pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Graduado em Direito pela Universidade de Itaúna (FUIT). Professor da Faculdade de Pará de Minas (FAPAM).

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cimento e efetivação dos Direitos Fundamentais desafiam relação inseparável e concomitante ao mesmo esforço despendido à consolidação do Estado Democrático, haja vista que a eficácia dos Direitos Fundamentais identifica-se com o necessário respeito ao Estatuto Fundamental, na medida em que o interpreta em simultânea razão, concretizando-o adequadamente na medida máxima: aplicação concreta, vinculatória e irradiante.3 Desta forma, toda interpretação de Direitos Fundamentais realiza-se em conexão com a Teoria dos Direitos Fundamentais, e esta última, com uma Teoria da Constituição, segundo ensina Paulo Bonavides: Toda interpretação dos direitos fundamentais vincula-se, de necessidade, a uma teoria dos direitos fundamentais; esta por sua vez, a uma teoria da Constituição, e ambas – a teoria dos direitos fundamentais e a teoria da Constituição – a uma indeclinável concepção do Estado, da Constituição e da cidadania, consubstanciando uma ideologia, sem a qual aquelas doutrinas, em seu sentido político, jurídico e social mais profundo, ficariam de todo ininteligíveis. De tal concepção brota a contextura teórica que faz a legitimidade da Constituição e dos direitos fundamentais, traduzida numa tábua de valores, os valores da ordem democrática do Estado de Direito onde jaz a eficácia das regras constitucionais e repousa a estabilidade dos princípios do ordenamento jurídico, regido por uma teoria material da Constituição. (BONAVIDES, 2008, p. 596).

Nessa esteira de pensamento, não se poderia olvidar a contribuição do neoconstitucionalismo – recentemente introduzido no vernáculo jurídico – para a implementação dos Direitos Fundamentais, mesmo sob o influxo das interpretações contrariamente postas ao tema. Em seguida, importante análise da nova summa divisio constitucionalizada no Brasil, com a promulgação da Constituição da República de 1988, que abandona a clássica divisão – direito público/direito privado –, propiciando experiência única da realização de um modelo constitucional assegurador e concretizante dos direitos fundamentais, cuja modificação social deverá ser exemplo para o mundo. 2 DA TEORIA FORMAL DA CONSTITUIÇÃO À TEORIA MATERIAL CONCRETIZANTE DA LEI FUNDAMENTAL Apesar dos inúmeros sentidos empregados à expressão lei fundamental ou norma fundamental, parece correto o enquadramento proposto por Inocêncio Mártires Coelho, ao classificar como norma fundamental aquela norma que em determinada comunidade política, unifica e confere validade às normas jurídicas que em razão e a partir delas, se organiza e se estrutura em sistemas.4 Sobre a definição de Lei Fundamental apresentada, cumpre expor a extremada juridicidade conferida aos textos constitucionais, que apresentou seu ápice com o normativismo kelseniano, capaz de legitimar o arbítrio do legislador ao identificar direito e força, despido de qualquer vínculo jurídico-moral, ou valorativo, considerando assim, todo Estado como Estado de Direito. Sobre o positivismo e a teoria formal da Constituição, especificamente sobre as consequências da redução a uma classificação legalista, assevera Paulo Bonavides que esse positivismo confere um poder ilimitado ao legislador para dispor sobre o Direito, amparado na crença fácil de que a sociedade, ou melhor, a realidade do Estado constitucional, se deixa reger todo por regras ou normas jurídicas. (BONAVIDES, 2008, p. 171) O formalismo de Hans Kelsen ao validar todo conteúdo constitucional, desde que observada legalidade estrita, coincide os conceitos de legalidade e legitimidade, o que acaba por legitimar toda espécie de ordenamento estatal ou jurídico, inclusive o Estado nacional-socialista de Hitler. Nas palavras do próprio autor: Era o colapso do Estado de Direito Clássico, dissolvido por essa teorização implacável. Medido por seus cânones lógicos, até o Estado nacional-socialista de Hitler fora Estado de Direito. Nada mais é preciso acrescentar para mostrar a que ponto inadmissível pôde chegar o positivismo jurídico-formal. A juridicidade pura se transformou em antijuridicidade total. (BONAVIDES, 2008, p. 175).

Na sequência histórica desenvolve-se a teoria do antiformalismo, caminho do decisionismo de Carl Schmitt, no contexto histórico do constitucionalismo da República de Weimar, que propôs sua teoria para legitimar a teoria materialista, com base em conteúdos oriundos de pressupostos da ordem material e na realidade, dando assim significado à decisão conjunta e fundamental sobre o modelo e a forma de unidade de um povo, e deixando o formalismo em plano secundário. Apesar da sedutora teoria de Schmitt, a abertura desvincula Constituição e Lei Constitucional sob o fundamento de que a Constituição não se acha em Leis ou normas, porque a essência dela se encontra na decisão política fundamental emanada em última instância pelo povo, abrindo caminho ao desvirtuamento da juridicidade das Constituições, como adverte Paulo Bonavides: 76


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Desmembrar a Constituição da norma, desvalorizar a normatividade, fazê-la inferior, cativa, secundária, relativa ou sujeitá-la a um decisionismo político extremo, significa pois desfazer, pela via material, a juridicidade das Constituições, cujos conteúdos se tornam assim indiferentes, desde que um só valor – o daquele órgão de vontade que atua como poder constituinte – sobrerresta soberano e supremo. (BONAVIDES, 2008, p. 177).

O mesmo autor, ao analisar as teorias apresentadas (formal e material), aponta a falibilidade de cada uma, pois, mesmo que em vias diversas, reafirmam os valores liberais: Representa essa teoria da Constituição, como se vê, uma legitimação dissimulada do Estado absoluto e totalitário. Caminhando por vias opostas, Kelsen com a norma, Schmitt como decisionismo, ambos se reencontram no resultado final: a dissolução da Constituição como fundamento axiológico de um Estado de Direito, de acordo com a pauta dos valores liberais. (BONAVIDES, 2008, p. 177).

Aproximando-se da necessária compreensão da Constituição como Lei Fundamental, que tem sua formalidade escrita não limitada à taxatividade desprovida de valores e contextos sociais, abrangência material e aberta com limitações lógico-jurídicos, faz-se necessária a apresentação de uma definição à luz dos Direitos Fundamentais.5 Nesta seara, mister apontar a contribuição do jurista alemão Konrad Hesse, que partiu da incompreensão prevalente sobre a essência da Constituição, valendo-se das teorias existentes para delas extrair uma forma de compreender determinado aspecto ou dimensão constitucional, afirmando que: [...] a Constituição deve ser entendida como: “a ordem jurídica fundamental de uma comunidade ou o plano estrutural para a conformação jurídica de uma comunidade, segundo certos princípios fundamentais”, uma tarefa cuja realização só se torna possível porque a Lei Fundamental: fixa os princípios diretores segundo os quais se deve formar a unidade política e desenvolver as tarefas estatais; define os procedimentos para a solução dos conflitos no interior da comunidade; disciplina a organização e o processo de formação da unidade política e da atuação estatal; e cria as bases e determina os princípios da ordem jurídica global. (HESSE apud MENDES; COELHO; BRANCO, 2010, p. 55).

Decerto que a seara mais crítica após o estabelecimento do Estado de Direito era a organização jurídica dos Poderes e a definição de suas competências em harmonia funcional no Estado liberal; no Estado social, a ocupação preponderante era o protecionismo econômico e o desenvolvimento dos direitos sociais que se operavam mediante a aplicação de políticas públicas específicas. Hoje, no Estado Democrático, a posição estrutural dominante pertence aos Direitos Fundamentais.6 Assim, os Direitos Fundamentais alcançam a importante matriz de eficácia e juridicidade, abandonando a função programática antes prevalente, sendo possível visualizar como Häberle, citado por Paulo Bonavides: os direitos fundamentais já não têm eficácia “em função da lei”, mas ao contrário, as leis ganham eficácia “em função dos direitos fundamentais”. (HÄBERLE apud BONAVIDES, 2008, p. 611) 3 A FORÇA NORMATIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: EFEITOS VINCULANTES E IRRADIANTES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS A ocupação em estudo dos direitos e garantias constitucionais somente ganhou relevo com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Conquista histórica que resultou no amplo processo de discussão oportunizada pela redemocratização do país após vinte anos de ditadura militar.7 Entretanto, nas constituições precedentes à de 1988, pode-se falar em direitos fundamentais, não com a tutela e eficácia hodierna. Esta referência é importante por propiciar comparativamente a disposição geográfica dos Direitos Fundamentais nos textos constitucionais, o que bem esclarece Kildare Gonçalves Carvalho: Outro aspecto que deve ser salientado é o de que a declaração dos direitos fundamentais foi deslocada para o início do texto constitucional (Título II), rompendo assim a Constituição Vigente com a técnica das Constituições anteriores, que situava os direitos fundamentais na parte final da Constituição, sempre depois da organização do Estado. Essa colocação topográfica da declaração dos direitos no início da Constituição, seguindo modelos das Constituições do Japão, México, Portugal, Espanha, dentre outras, tem especial significado, pois revela que todas as instituições estatais estão condicionadas aos direitos fundamentais, que deverão observar. Assim, nada se pode fazer fora do quadro de declarações dos direitos fundamentais: Legislativo, Executivo e Judiciário, orçamento, ordem econômica, além de outras instituições, são orientados pelos direitos humanos. (CARVALHO, 2006, p. 495).8

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O abandono da carta política e das normas Fundamentais meramente programáticas, já é percebido no Preâmbulo da Constituição, ao trazer em primeiro plano a mudança paradigmática, diretrizes transformadoras da realidade social: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia (sic) Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL, 1988).

Segundo Ingo Wolfgang Sarlet, a inovação constitucional mais importante está disposta no artigo 5.º, § 1.º, da Constituição Federal, que confere aplicação imediata às normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, excluindo o cunho programático destes preceitos e consagrando assim, o status jurídico diferenciado e reforçado dos direitos Fundamentais na Constituição de 1988. (SARLET, 2010, p. 66) Diante desta nova realidade é que se desdobram os impulsos e parâmetros para a elaboração, interpretação e aplicação do direito, sejam eles formais ou materiais, constitucionais ou infraconstitucionais, com caráter vinculante assim expressado: Konrad Hesse destacou que a função diretriz da Constituição consiste, sobretudo, em dotar os direito fundamentais de força vinculante para todo ordenamento jurídico. Com isso, a Constituição contribui profundamente para a garantia da existência de um ordenamento jurídico moralmente reto. (HESSE apud ALMEIDA, 2008, p. 335-336).

Dentre várias disposições constitucionais, ganha relevo o artigo 3.º, que estabelece os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988).

Confirmado o efeito irradiante9 dos Direitos e Garantias Constitucionais Fundamentais nas funções legislativa, judiciária e administrativa, nas pessoas em geral, ensina Gregório Assagra de Almeida: Em um Estado Democrático de Direito, os direitos e garantias constitucionais fundamentais compõem o núcleo da Constituição e, por isso, possuem eficácia irradiante para o legislativo, o executivo e o judiciário, bem como a todas as outras pessoas individuais ou coletivas. Eles funcionam como diretrizes da ordem jurídica constitucional e dos seus respectivos modelos. (ALMEIDA, 2008, p. 335).

Conforme exposto neste título, aos direitos e garantias fundamentais foi conferido local de destaque no texto constitucional, posição topográfica racionalmente coerente com a própria essência desses direitos auto -aplicáveis, não delimitados formalmente, com irradiação e vinculação inquestionáveis. 4 NEOCONSTITUCIONALISMO E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS O novo constitucionalismo (neoconstitucionalismo), ao propor a integração da moral ao direito a partir da consideração dos valores existentes em determinada sociedade, volta-se à concretização dos direitos fundamentais. Trata-se de relevante contribuição jurídico-interpretativa que se distancia inovadoramente dos modelos políticos clássicos que não vinculavam a efetivação dos preceitos constitucionais. A origem e a força que fomentaram um novo constitucionalismo são propostas por Thays Oliveira de Brito e Walber de Moura Agra nos seguintes aspectos: [...] a) falência do padrão normativo que fora desenvolvido no século XVIII, baseado na supremacia do parlamento; b) influência da globalização; c) pós-modernidade; d) superação do positivismo clássico; e) centralidade dos direitos fundamentais; f) diferenciação qualitativa em princípios e regras; g) revalorização do direito. (FRANCISCO, 2012, p. 22).

As críticas ao neoconstitucionalismo, sinteticamente, apontam o subjetivismo do órgão julgador como 78


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sua cláusula de falibilidade, por ser a “livre” interpretação causa inquestionável de insegurança jurídica. Há ponto de considerável relevância nas observações feitas pela doutrina, pois o ativismo judicial pode sim acarretar a ditadura do Judiciário, deslocando o problema da concentração de poder no Legislativo para o Judiciário. Entrementes, a inobservância da realidade de que o exercício da função judicial é realizado por seres humanos, portanto influenciados pelos valores individuais e sociais, valores que inclusive propugnam realização, mostra-se mais favorável a uma Teoria dos Direitos Fundamentais, se baseada de forma indissociável dos direitos fundamentais. Nessa mesma esteira de pensamento, segue Susanna Pozzolo citada por Thays Oliveira de Brito e Walber de Moura Agra: Para Susanna Pozzolo, adotar um modelo prescritivo leva o neoconstitucionalismo a sustentar as medidas voltadas a individualizar e solucionar as contradições normativas, em especial os conflitos entre normas constitucionais e legislativas, não sejam somente juízos de valor definidos pelo intérprete, isto é, atribuições de significado, mas sejam juízos de valor que reconheçam o significado objetivo de uma aparente contradição fática. (FRANCISCO, 2012, p. 20).

Após breve análise do neoconstitucionalismo, é correto afirmar que esta nova interpretação constitucional – centrada nos direitos fundamentais, propiciadora da reaproximação entre Direito e Ética e reconhecedora da força normativa da Constituição – contribui para a proposta de um constitucionalismo dos direitos fundamentais. 5 SUMMA DIVISIO CONSTITUCIONALIZADA: UM MODELO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO Nos estudos realizados não só por juristas, mas por vasta gama de pesquisadores das ciências sociais, outra não é a conclusão senão a de que a divisão do direito entre público e privado não representa a realidade nem contribui para a concretização dos direitos fundamentais, por ser a dicotomia clássica suficiente ao individualismo do Estado Liberal com aplicabilidade também no Estado Social, contudo, insuficiente ao Estado Democrático de Direito. Então, não havendo sucedâneo à antiga divisão (público versus privado), qual seria a solução? A solução foi exposta pelo constituinte de 1988, que no Título II, Capítulo I da Constituição da República Federativa do Brasil, consagrou os direitos e garantias fundamentais em direitos e deveres individuais e coletivos. Mencionada distinção que supera a divisão clássica, de viés individualista, é tese apresentada ao mundo jurídico por Gregório Assagra de Almeida com a superação da summa divisio direito público e direito privado por uma nova summa divisio constitucionalizada: [...] A summa divisio constitucionalizada no País é Direito Individual e Direito Coletivo. Trata-se de summa divisio constitucionalizada relativizada, pois no topo encontra-se o Direito Constitucional, representado pelo seu objeto formal, a Constituição, composta tanto de normas de Direito Individual, quanto de normas de Direito Coletivo. (ALMEIDA, 2008, p. 361).

Dos ensinamentos de Gregório Assagra de Almeida é possível visualizar, sem sombras, que a resposta para a superação da divisão clássica está na summa divisio constitucionalizada, pois ela proporciona a construção de novos paradigmas para a relação ente sociedade e Estado ou entre indivíduos e Estados. O enquadramento da nova summa divisio para a formulação de novos conceitos do direito constitucional à luz dos direitos fundamentais é informado por Almeida: A exploração metodológica da nova summa divisio faz-se necessária para a devida compreensão da própria teoria dos direitos constitucionais fundamentais positivada na Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988. A teoria dos direitos constitucionais fundamentais compõe o núcleo de uma Constituição democrática, como a brasileira, a partir da qual devem ser constituídos os novos modelos explicativos. Os direitos fundamentais possuem eficácia irradiante de ordem jurídica e força vinculativa de todos operadores jurídicos oficiais e não-oficiais. (ALMEIDA, 2008, p. 362).

Por ser o novo paradigma constitucional assentado na Constituição da República, assegurador do firme posicionamento de ruptura com a clássica dicotomia “público e privado”, elevando os direitos fundamentais ao posicionamento central da Constituição, por consequência, de todo ordenamento jurídico, com força vinculatória e irradiante, objetivando a concretização dos direitos fundamentais, é que se acredita ser uma exemplar conceituação, verdadeiro paradigma para o mundo.10

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Revista Jurídica Digital RTM 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cediço que o Estado Democrático de Direito carece de contínuos esforços na busca da concretização dos Direitos Fundamentais, é inegável a contribuição do Direito Constitucional para a efetivação desses direitos de primeira ordem, tanto em razão da sua supremacia, quanto em relação aos estreitos laços com o poder, tornando assim, a elaboração de novas definições uma necessidade imanente. Inclusive a nova hermenêutica constitucional afasta a até então prevalente metodologia formalista (gramatical, histórica, sistemática e teleológica), trazendo para o núcleo constitutivo a Teoria dos Direitos e Garantias Fundamentais, produto das conquistas históricas, decorrentes das sucessivas modificações constitutivas do Estado que clama a revisitação e comtemporânea construção nos campos da semântica, da hermenêutica e da principiologia. Ressalta-se a importância do neoconstitucionalismo para a elaboração de conceitos novos ao Direito Constitucional. Tudo, por apresentar interpretação constitucional através de valores, rompendo com a “estrita legalidade”, realçando os direitos fundamentais como: balizas; direitos garantias e direitos a serem concretizados. Decerto que o merecido status a ser alcançado pelos Direitos Fundamentais na Constituição da República Federativa do Brasil, que abandonou a dicotomia clássica (direito público versus direito privado), adotando a nova summa divisio constitucionalizada relativizada, somente realizará a tão esperada modificação social com o afastamento do pensamento individualista, tão comum aos liberais, mas que ainda influenciam juristas e sociedade. O novo paradigma estatal que se impõe através da legitimidade constituinte democrática, se depara com inegáveis forças contrárias, mormente a globalização e neocapitalismo, dispensando mais energia para reconhecer e efetivar a vasta gama de direitos fundamentais de uma sociedade complexa, multifacetada, em permanente modificação. Assim, a contribuição do Direito Constitucional será aferida na medida e proporção que os direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, sob os auspícios das diretrizes principiológicas e interpretativas oriundas da conjugação do caráter subjetivo e objetivo, exercerem seu papel vinculativo e irradiante, início e destino de todas as normas, norte das funções estatais e baliza das relações individuais ou coletivas. REFERÊNCIAS ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. 669 p. ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito material coletivo: superação da summa divisio direito público e direito privado por uma nova summa divisio constitucionalizada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. 670 p. BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil. Rio de Janeiro: Revista de Direito Administrativo. v. 240, p. 1-43, 2005. BENDA, Ernest; MAIHOFER, Werner; VOGEL, Hans-Jochen; HESSE, Konrad (orgs.). Manual de derecho constitucional. 21. ed. Tradução de Antônio López Pina. Madrid-Barcelona: Marcial Pons, Ediciones Jurídicas y Sociales S.A., 2001. 250 p. BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. 827 p. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 05 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 nov. 2016. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: teoria do estado e da constituição: direito constitucional positivo. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. 1.078 p. FRANCISCO, José Carlos (coord.). Neoconstitucionalismo e atividade jurisdicional: do passivismo ao ativismo judicial. Belo Horizonte: Del Rey, 2012. 504 p. HESSEL, Konrad. Elementos de direito constitucional da república da alemanha. 20. ed. Tradução de Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris, Editor, 1998. 576 p. LEITE, George Salomão; SARLET, Ingo Wolfgang (coord.). Direitos fundamentais e estado constitucional: estudos em homenagem a J. J. Gomes Canotilho. São Paulo: Revista dos Tribunais/Coimbra, 2009. 432 p. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 1616 p. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. 504 p. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. 1.501 p. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. São Paulo. 2001. 878 p.

(Endnotes) 80


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Notas explicativas: Em razão da proposta inovadora deste artigo não se revela imprudente apresentação de nova abordagem norteadora dos direitos fundamentais, mesmo ciente dos riscos inerentes às definições. Direitos fundamentais: Garantia e capacidade intrínseca ao ser pensante de instituir, reconhecer e defender, de forma participativa e isonômica, direito fundante às necessidades vitais. 2 “Em suma, o estabelecimento de poderes supremos, a distinção da competência, a transmissão e o exercício da autoridade, dos direitos e garantias individuais e sociais são o objeto do Direito Constitucional contemporâneo. Revela-se este mais pelo conteúdo das regras jurídicas – a saber, pelo aspecto material – do que por efeito de aspectos ou considerações formais, dominantes historicamente, conforme veremos, no constitucionalismo do Estado liberal, ponto de partida que foi para a sistematização dessa importantíssima disciplina do conhecimento jurídico.” (BONAVIDES, 2008, p. 36). 3 Sobre o constitucionalismo no futuro, expõe José Levi Mello do Amaral Júnior: “O constitucionalismo no futuro parece caracterizarse, sobretudo, por uma tendência de expansão global. A democracia tende a se internacionalizar por meio de estruturas institucionais supranacionais. Nelas, os direitos fundamentais buscam novo vigor da efetividade por meio de sua internacionalização, inclusive permitindo que cidadãos de um determinado Estado Nacional, busquem, em estruturas supranacionais, proteção jurídica, até mesmo contra o próprio Estado.” (FRANCISCO, 2012, p. 15). 4 “Registrando, desde logo, que são múltiplos os sentidos atribuídos à expressão norma fundamental – a que correspondem outras tantas funções correlatas –, inclusive na obra de Hans Kelsen, a quem se deve a sua mais ampla utilização no jogo de linguagem do Direito, esclarecemos que, numa determinada comunidade política, unifica e confere validade às suas normas jurídicas, as quais, em razão e a partir dela, se organizam e/ou se estruturam em sistema.” (MENDES; COELHO; BRANCO, 2010, p. 45). 5 Nesse sentido, afirma Paulo Bonavides: “[...] a pluridimensionalidade, a par da plurifuncionalidade dos direitos fundamentais, dantes vistos no antigo Direito Constitucional tão-somente pelo prisma de sua subjetividade; a expressão normativa do Direito Constitucional a todos os ramos do Direito, acompanhada de uma afirmação definitiva de superioridade hierárquica, e, finalmente, a tese vitoriosa de que a Constituição é direito, e não ideia ou mero capítulo da Ciência Política, [...]” (BONAVIDES, 2008, p. 599) 6 “A densidade problemática dos direitos fundamentais desdobra-se em quatro dimensões sucessivas ou camadas cumulativas superpostas: direitos da primeira, da segunda, da terceira e da quarta gerações, tomando os da segunda, terceira e quarta gerações, do ponto de vista hermenêutico, uma importância contemporânea incomparavelmente superior à de todas as questões que outrora, no contencioso constitucional, envolviam as relações entre Poderes.” (BONAVIDES, 2008, p. 601). 7 No cenário internacional, a mudança paradigmática que desloca a teoria dos direitos fundamentais para o núcleo constitucional, é assim descrita por Gregório Assagra de Almeida: “Não há de se esquecer que, mesmo no plano mundial, o novo constitucionalismo, que tem no coração e no espírito a teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais, somente se ergueu, para apresentar uma proposta interpretativa de superação do positivismo legalista, após a Segunda Grande Guerra Mundial, principalmente a partir das décadas de 50 e 60 do século XX.” (ALMEIDA, 2008, p. 338). 8 No mesmo sentido: “Dentre as inovações, assume destaque a situação topográfica dos direitos fundamentais positivados no início da Constituição, logo após o preâmbulo e os princípios fundamentais, o que além de traduzir maior rigor lógico, na medida em que os direitos fundamentais constituem parâmetro hermenêutico e valores superiores de toda a ordem constitucional e jurídica, também vai ao encontro da melhor tradição do constitucionalismo na esfera dos direitos fundamentais. Além disso, a própria utilização da terminologia ‘direitos e garantias fundamentais’ constitui novidade, já que nas Constituições anteriores costumava-se utilizar-se a denominação ‘direitos e garantias individuais’, desde muito superada e manifestamente anacrônica, além de desafinada em relação à evolução recente no âmbito do direito constitucional e internacional. A acolhida dos direitos fundamentais sociais em capítulo próprio no catálogo dos direitos fundamentais ressalta, por sua vez, de forma incontestável sua condição de autênticos direitos fundamentais, já que nas Cartas anteriores os direitos sociais se encontravam positivados no capítulo da ordem econômica e social, sendo-lhes, ao menos em princípio e ressalvadas algumas exceções, reconhecido caráter meramente programático. (SARLET, 2010, p. 66). 9 Sobre o efeito irradiador das normas de direitos fundamentais no Tribunal Constitucional da Alemanha, Robert Alexy inicia o desenvolvimento sobre a tese da irradiação nesse sentido: “O Tribunal Constitucional Federal procura conhecer o ‘efeito irradiador’ das normas de direitos fundamentais no sistema jurídico com o auxílio do conceito de ordem objetiva de valores. Para usar as palavras do tribunal: ‘Segundo a jurisprudência reiterada do Tribunal Constitucional Federal, as normas de direitos fundamentais contêm não apenas direitos subjetivos de defesa do indivíduo contra o Estado, elas representam também uma ordem objetiva de valores, que vale como decisão constitucional fundamental para todos os ramos do direito, e que fornece diretrizes e impulsos para a legislação, a Administração e a jurisprudência.’ Os conceitos centrais dessa construção são o conceito de valor e o conceito de objetivo. A questão é saber, então, como eles devem ser compreendidos.” (ALEXY, 2008, p. 524-225). 10 Sobre a real possibilidade de desenvolvimento de uma metodologia jurídico-constitucional que sirva de exemplo ao mundo, assevera Gregório Assagra de Almeida: “Esse novo modelo permite, principalmente em relação à nova summa divisio constitucionalizada relativizada, proposta nesta obra, a construção de um constitucionalismo brasileiro que sirva de parâmetro para o mundo.” (ALMEIDA, 2008, p. 357). 1

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O Processo administrativo disciplinar como fonte de assédio moral sobre o servidor público Gláucio Guimarães Medeiros1 RESUMO: Este trabalho pretende encetar novos caminhos sobre o instituto do assédio moral, fenômeno social que tem se alastrado nos meios laborais por todo o globo, como real obstáculo a qualquer relação hierárquica saudável entre empregado e empregador, seja na iniciativa privada ou na esfera pública. Sua prática hodierna assentasse basicamente na continuidade de uma subjugação moral, minando o trabalhador emocionalmente, de maneira a reduzir drasticamente sua produtividade, interferindo até mesmo nos âmbitos familiar e social. Desta feita, retornado ao espeque deste estudo, cabe-nos realçar um novo meio de se praticar o assédio moral, qual seja, a deturpação finalística do Processo Administrativo Disciplinar, tornando-se alto simulacro legal, mas que passa a carregar em seu organismo, vírus mortal capaz de exterminar todo o PAD, com base no mais claro desvio de finalidade, espécie de abuso de poder tão combatido pelos Princípios Constitucionais. PALAVRA-CHAVE: Assédio moral, servidor público, processo administrativo disciplinar, dano moral. INTRODUÇÃO: Inicialmente, antes de enfrentarmos o mérito deste trabalho, necessário se faz demonstrar quais são os contornos doutrinários, legais e jurisprudenciais sobre o instituto do assédio moral, também chamado de bossing, bullying, mobbing, manipulação perversa, ou mesmo de terrorismo psicológico, como ensina a renomada professora Vólia Bomfim2, que afirma ser o assédio moral “ato caracterizado pelas condutas abusivas praticadas pelo empregador direta ou indiretamente, sob o plano vertical ou horizontal, ao empregado, que afetem seu estado psicológico. Normalmente, refere-se a um costume ou prática reiterada do empregador”. O Assédio moral, restando configurado, seguirá os mesmos preceitos jurídicos referente ao dano moral, ou seja, os ditames do art. 5º, X da Constituição Federal c/c o art. 186 e 187, ambos do Código Civil. Em segundo ato, passamos a realçar que a Constituição Federal, em base normativa afasta qualquer ação ou omissão que contenha o assédio moral em sua gênese constitutiva, se não assim, perderia razão de ser e existir os Princípios da Dignidade da Pessoa Humana, dos valores sociais do trabalho, da impessoalidade, da moralidade e eficiência, entre outros residentes em casos concretos. Jurisprudencialmente, trazemos à baila interessante julgado do Superior Tribunal de Justiça, onde amplia as consequência do assédio, reverberando violentamente sobre a culpabilidade do assediador, senão vejamos: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ASSÉDIO MORAL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 11 DA LEI 8.429/1992. ENQUADRAMENTO. CONDUTA QUE EXTRAPOLA MERA IRREGULARIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. 1. O ilícito previsto no art. 11 da Lei 8.249/1992 dispensa a prova de dano, segundo a jurisprudência do STJ. 2. Não se enquadra como ofensa aos princípios da administração pública (art. 11 da LIA) a mera irregularidade, não revestida do elemento subjetivo convincente (dolo genérico). 3. O assédio moral, mais do que provocações no local de trabalho - sarcasmo, crítica, zombaria e trote -, é campanha de terror psicológico pela rejeição. 4. A prática de assédio moral enquadra-se na conduta prevista no art. 11, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, em razão do evidente abuso de poder, desvio de finalidade e malferimento à impessoalidade, ao agir deliberadamente em prejuízo de alguém. 5. A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e/ou afastar da atividade pública os agentes que demonstrem caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida. 6. Esse tipo de ato, para configurar-se como ato de improbidade exige a demonstração do elemento subjetivo, a título de dolo lato sensu ou genérico, presente na hipótese. 7. Recurso especial provido. (REsp 1286466/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 18/09/2013).

O STJ, com este indicativo, de suma importância para futuras decisões sobre o tema, além de impingir ao demandado o dever de indenizar moralmente a(s) vítima(s), impõe também a pecha de improbo, o que gera automaticamente a aplicação das penas contidas no art. 12, III, da citada Lei, quais sejam, ressarcimento integral do dano, se houver, perda 1

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Bacharel em Direito pelo Centro Universitário CESMAC, Analista Judiciário pelo Tribunal de Justiça de Alagoas licenciado, Autor da obra “Comentários ao Regime Jurídico dos Servidores Públicos de Alagoas”, Professor de curso preparatório para concursos públicos, membro efetivo do Coletivo Jurídico da FENAJUD - 2011/2014, Diretor Jurídico pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário de Alagoas SERJAL - 2009/2014, Diretor Jurídico da FESEMPRE em Alagoas.

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da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos. No âmbito penal, existem 02 (dois) Projetos de lei federal: a) nº 5.887/2001, que tipifica como crime a conduta enquadrada como assédio moral, introduzindo alínea “A” ao art. 146 do Código Penal, impondo pena de detenção de três meses a um ano e multa; e b) nº 4.742/2001, que também introduz o tipo no Código Penal. Sob o receio de tomarmos uma coisa pela outra, quid pro quo, deixamos claro os elementos matizes do assédio moral, são eles: a) continuidade temporal; b) conduta humana comissiva ou omissiva; c) existência de relação hierárquica; e d) violência psicológica. Há vozes que defendem a possibilidade do assédio moral invertido, ou seja, de baixo para cima, de empregado a empregador. Mesmo considerando possível no caso concreto, é de difícil constatação. Este trabalho não possui a arrogante presunção de esgotar o tema relativo ao assédio moral, mormente por encontrarmos vastíssima bibliografia de qualidade sobre o assunto, mas sim, trazer à tona jurídica um novo perfil do instituto, uma nova forma de alienar o trabalhador/servidor, dentro da própria máquina estatal, mediante fórmula estipulada em Lei: o Processo Administrativo Disciplinar – PAD. A Constituição Federal, em seu art. 41, §1º, II, estipula a gênese legiferante protetora do servidor contra demissões equivocadas, garantindo, para tanto a obrigatoriedade de processo administrativo para seu desligamento. Em ato contínuo, o processo administrativo disciplinar, tem fonte secundária na Lei Federal n.º 8.112/1990, especificamente no seu título V, de modo a garantir duas balizas constitucionais, quais sejam, o Princípio da Legalidade e o da Ampla Defesa e Contraditório, o primeiro em prol da sanidade estatal, ao passo que o segundo visa proteger o servidor público de eventuais desmandos, que infelizmente ainda assolam a máquina pública. Devemos recordar que a própria Constituição, quando da atribuição de competências administrativas e legislativas, atribuiu a concorrência de atuação estatal sobre o Direito Administrativo, como podemos destacar o voto do então Ministro Ayres Britto3, senão vejamos: “A competência legislativa atribuída aos Municípios se restringe a seus servidores estatutários ”. Ou ainda na ADI 104, na então relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence: “Anistia de infrações disciplinares de servidores estaduais: competência do Estado-membro respectivo ”. Considerando tais informações preambulares, podemos ratificar a ideia inicial de que a matéria em discussão, qual seja, processo administrativo disciplinar, deverá ter seus contornos gerais inseridos no Regime Jurídico Único do respectivo ente público ao qual pertença o servidor, de modo a se evitar futuros conflitos de competência administrativa entre União, estados federados e municípios. Doutra banda, não podemos olvidar do fenômeno “copiar e colar” que assola o país, posto que a maioria esmagadora dos regimes jurídicos próprios ao redor de nosso território são meras cópias remendadas da Lei Federal 8.112/1990. Em rasa pesquisa, poderá o operador do direito notar verdadeiras conchas de retalhos, contudo, em regra, sempre no sentido de prejudicar o servidor. Devido as considerações realizadas no parágrafo anterior, utilizaremos a citada Lei Federal como norte acadêmico sobre o tema em comento, ignorando as demais normas estaduais e municipais, sem nenhum prejuízo para o tema e espeque. O PAD, como instrumento de fiscalização, hierárquico e punitivo, requer, para seu início, dois braços de atuação, um, que seja iniciado por autoridade superior ao servidor presumidamente infrator, como bem demonstra o art. 149 do novel estatuto; e dois, que essa autoridade forme comissão de servidores estáveis de patamar hierárquico idêntico ou superior ao investigado. Sem tais medidas, pensamos que o processo é nulo de pleno direito, por se tratar de vícios que atacam os pressupostos de existência do processo administrativo. No início deste trabalho, realçamos e defendemos a possibilidade de assédio moral sobre o servidor público, mediante processo administrativo disciplinar, concretizando desvio de finalidade, o que tornaria o referido procedimento em contraditório nulo de pleno direito. Esse vírus subjetivo que destrói o PAD pode ser vislumbrado em vários momentos do processo, senão vejamos: a) na ciência de irregularidade; b) na expressa identificação do denunciante; c) na tipificação das infrações administrativas; d) na abertura de processo disciplinar para penas de pequena monta; e) no afastamento preventivo; f) na escolha da comissão; g) na confusão dos poderes instrutórios e de julgamento; h) no estouro dos prazos imotivados; e i) na inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 168. O rol acima citado é meramente exemplificativo, contudo, se percebe nestes nódulos processuais, os momentos mais propícios para o assédio moral durante um sindicância ou processo administrativo, impelindo ao servidor uma condição permanente de exército vencido, independente das armas que utilize, haja vista que neste tipo de processo, a 3

RE 632.713 em AgR.

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triangularização inexiste, pois as figuras entre acusador e juiz se confundem. O assédio moral, como vício insanável, encontra na estrutura do processo administrativo disciplinar pátrio, campo fértil para se proliferar, pois os espaços discricionários ofertados à autoridade julgadora, como percebido nas alíneas acima citadas, são amplos em demasia, o que muitas vezes, perdem qualquer baliza de legalidade ou até mesmo de equidade. Considerando que as regras da Lei 8.112/90 são frutos elastecidos das Leis francesas n.º 83-634/83 e 84-53/84, país que possui um sistema administrativo independente do próprio Poder Judiciário, nos faz perceber, mediante análise de direito comparado, que o processo administrativo brasileiro é consequência de conclusões distorcidas dos tribunais franceses. A exemplo do afirmado, vemos a bipartição dos poderes instrutórios e decisórios, o que se justifica numa estrutura independente, imparcial e indiferente aos interessados e envolvidos nos processos administrativos, o que não ocorre no Brasil, considerando que aqui, as comissões e autoridade julgadora pertencem a mesma estrutura do investigado. Defendemos a bandeira que o processo administrativo pátrio é uma visão corporativa do Poder instituído, ferindo de morte o Princípio do Juiz Natural, pois quem instrui não julga, sendo agravado ainda mais quando o STF afirma que o PAD prescinde da presença de advogado4, como se tal matéria não requisite conhecimento técnico bastante para defender o bom direito. Ora, se a própria Justiça Laboral reconhece a necessidade de advogado nas causas extraordinárias, mesmo sendo uma instituição paternalista, o que pensar de um processo administrativo pensado como máquina opressora ao servidor, em que se inicia com presunção de culpabilidade. Ademais, em muitas estruturas estatais, encontramos autoridades julgadoras que ocupam cargos em comissão reservados a indivíduos estranhos a máquina pública, ou seja, não concursados, de modo que o Princípio implícito do processamento de servidor por seus pares não se concretize, eivando o PAD com o vírus da perseguição. CONCLUSÃO: Como afirmado no início deste trabalho, nossa intenção não é esgotar a matéria atinente ao assédio moral, mas trazer à tona uma nova possibilidade de seu acontecimento, qual seja, a utilização da sindicância e do processo administrativo disciplinar para tal intento ilegítimo e ilegal. O assédio moral, em sua essência espiritual, atua como agente de desequilíbrio emocional, prejudicando diretamente a produtividade do servidor público, de tal sorte a conduzi-lo para um caminho muitas vezes sem volta. REFERÊNCIA Curso de Direito do Trabalho. 9ª edição, 2015. editora método.

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Súmula vinculante n.º 05

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A igualdade de gênero na proposta de reforma da Previdência Social Luana Junqueira Dias Myrrha 1 Anna Carolina Ianino Lima Andrade 2 Pamila Cristina Lima Siviero 3 No final do ano de 2016, o Presidente da República encaminhou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição – PEC 287/2016 - que altera regras paramétricas da Previdência Social, tanto para o Regime Geral quanto para o Regime Próprio. Uma das principais alterações propostas é a igualdade de gênero nas regras previdenciárias, fixando os critérios cumulativos de idade mínima 65 anos e tempo de contribuição 25 anos, para ambos os sexos. Pela legislação atual, o homem pode se aposentar pelo Regime Geral com 35 anos de contribuição ou aos 65 anos de idade e 15 anos de contribuição, ao passo que as mulheres devem comprovar 30 anos de contribuição ou 60 anos de idade e 15 anos de contribuição. Essa diferença no tempo de contribuição e na idade de aposentadoria foi proposta pela Carta das Mulheres aos Constituintes de 1987, que reuniu diversas solicitações para reduzir as desigualdades sociais vivenciadas pelas mulheres. Parte significativa dessas solicitações foi inserida na Constituição de 1988, que garantiu legalmente vários direitos às mulheres, incluindo o bônus de 5 anos a menos para concessão de aposentadorias. Considerando que as mulheres atualmente se aposentam, em média, aos 54 anos e os homens aos 60 anos, ao impor a idade mínima de 65 anos, eles deverão trabalhar em média por mais 5 anos e elas por mais 11 anos. A pergunta que surge é: A proposta de igualdade de gênero na previdência é justa para o atual contexto brasileiro? A insegurança quanto ao acesso à aposentadoria é ainda maior com a previsão na PEC 287/2016 de aumentar a idade para o acesso ao benefício sempre que houver o incremento mínimo de um ano inteiro na média nacional única, correspondente à expectativa de sobrevida da população brasileira aos sessenta e cinco anos, para ambos os sexos. Na proposta do governo constam as seguintes justificativas para a igualdade de gênero nas regras previdenciárias: a maior expectativa de vida das mulheres ao nascer, a redução das diferenças salariais entre os gêneros, a redução do tempo dedicado aos afazeres domésticos pelas mulheres e a maior proteção trabalhista e social alcançada pelas mulheres com sua inserção no mercado de trabalho. Além disso, por meio de uma análise comparativa internacional, argumentam que o padrão europeu é adotar uma igualdade ou uma aproximação do tratamento de gênero nos sistemas previdenciários. Em relação à expectativa de vida ao nascer, de fato, a da mulher é cerca de 7 anos superior à do homem. No entanto, a análise não deve ser pautada na expectativa de vida ao nascer, que representa o tempo médio a em que se pretende estabelecer a idade mínima de aposentadoria, que corresponde ao tempo médio de gozo do benefício previdenciário. Para o Brasil, atualmente, essa diferença aos 65 anos é de 3,2 anos, de acordo com a tábua de mortalidade do IBGE 2015. Além disso, é preciso observar que existem diferenças significativas nos níveis de mortalidade entre as regiões brasileiras e entre classes sociais, resultando em expectativas de vida distintas. Consequentemente a fixação da idade mínima elevada penalizará a população mais carente e tende a agravar as desigualdades sociais, principalmente entre os idosos. As diferenças salariais no mercado de trabalho ainda permanecem e a redução tem ocorrido de forma lenta. Em 2014, de acordo com o IBGE, as mulheres recebiam em média 81% do rendimento dos homens. Conforme a justificativa da PEC 287/2016 aponta, em 19 anos a diferença proporcional dos salários de homens e mulheres reduziu apenas 15,5 pontos percentuais, ou seja, menos de um ponto percentual por ano. Assim, de uma forma prospectiva, faltariam quase 23 anos para as mulheres alcançarem a garantia constitucional da igualdade salarial. Cabe destacar que essa desigualdade é consequência de dois fatores. O primeiro é que em várias ocupações os salários femininos são menores, mesmo quando as mulheres apresentam qualificação idêntica à dos homens. Ademais, parte significativa das mulheres assume trabalhos mais precários, geralmente ligados à prestação de serviços, como o trabalho doméstico, serviço social, saúde e alimentação, os quais tem baixa remuneração e/ou são informais (MARRI, 2009; WAJNMAM, 2001; WAJNMAN, 2006). Muitas mulheres optam por trabalhos informais, com baixa remuneração, para ter uma jornada de trabalho mais flexível, que as permitam assumir as demandas familiares, como o cuidado com filhos e idosos. A sobrecarga da dupla jornada ainda é uma realidade na vida das mulheres brasileiras. De acordo com o IBGE, entre 2004 e 2014, p tempo de dedicação da mulher aos afazeres domésticos passou de 22,3 horas semanais para 20,5

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Doutora e Mestre em Demografia, Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Advogada, pós-graduada em Direito Público e mestre em Demografia Doutora e Mestre em Demografia, Professora da Universidade Federal de Alfenas.

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horas semanais, ao passo que para os homens se manteve em 10 horas semanais, correspondendo à metade do tempo de trabalho feminino dedicado ao lar. O argumento presente na proposta do governo de que “Os novos rearranjos familiares, com poucos filhos ou sem filhos, estão permitindo que a mulher se dedique mais ao mercado de trabalho, melhorando a sua estrutura salarial” desconsidera que a mulher se dedica, em média, o dobro do tempo do homem, fato que evidencia o papel da mulher na sociedade brasileira como cuidadora da família e do lar. Além disso, a proposta do governo não menciona que nos novos rearranjos familiares há o aumento da permanência dos filhos na casa dos pais e as novas demandas impostas pelo idosos, que mesmo não residindo no mesmo domicílio dos filhos, também necessitam de cuidados, em geral, assumidos pelas mulheres. Não é de hoje que o governo brasileiro busca referências internacionais para adotar como padrão no país e é até plausível que o Brasil se esforce para alcançar a igualdade de gênero, já que constitui um dos objetivos fundamentais da República previsto na Constituição Federal de 1988. No entanto, em um contexto previdenciário, os países que apresentam essa igualdade de regras, em sua maioria, são Estados com um maior desenvolvimento e que possuem políticas direcionadas a igualdade de gênero há muito tempo. A Suécia, a Finlândia, a Islândia, a Noruega e a Dinamarca são os países nórdicos da Europa com maior igualdade de gênero, de acordo com o Relatório das Diferenças de Gênero, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em 2014. O Brasil está longe de alcançar uma igualdade de gênero vivenciada pela Suécia, por exemplo, onde há uma organização pública voltada para a introdução de regras trabalhistas que facilitam a conciliação entre o trabalho com a educação dos filhos e a participação no mercado de trabalho. Infelizmente essa não é a realidade brasileira, portanto tal conjuntura não pode ser descartada pelo governo ao adotar novas regras de aposentadoria, pois muito do que se viveu (tempo de serviço, intervalos entre trabalho e maternidade, valor das remunerações, carga do trabalho) repercutirá na aposentadoria programável. Para o Regime Geral, ao se impor condições tão penosas para o acesso à aposentadoria programável, corre-se o risco de gerar uma insegurança grande na população, desestimulando não só a formalização do trabalho, mas também a fecundidade. De acordo com Melo (2016), a redução de filhos por mulher pode se intensificar num contexto de redução da proteção previdenciária em conjunto com a escassez de serviços gratuitos que permitam uma maior permanência da mulher no mercado de trabalho. Uma menor fecundidade compromete consideravelmente o sistema de financiamento do RGPS, uma vez que reduz cada vez mais a quantidade de ativos na população e aumenta o peso proporcional das idades mais avançadas. Embora as justificativas apresentadas pelo governo evidenciem que a desigualdade de gênero no mercado de trabalho e nos afazeres domésticos reduziram com o tempo, elas também demonstram que essas desigualdades ainda são muito presentes na sociedade brasileira. O texto da proposta de reforma apresenta a seguinte afirmação “observando-se uma regra de transição mais gradual para as mulheres”. Se a transição deve ser gradual, porque impor o mesmo tempo de contribuição e idade mínima para homens e mulheres de imediato, sem conceder nenhum tipo de bônus? Diante desse contexto, o ideal é propor uma evolução paulatina da diferença entre gêneros, em consonância com o histórico de melhorias desses diferenciais no Brasil, visando garantir a igualdade na previdência.

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