Conexão 2.0 - CAMINHOS DA FÉ

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TEXTO E CONTEXTO: a pior escolha do homem e a melhor jogada de Deus P. 20

Out-Dez 2019 – Ano 12 no 52

Exemplar: 9,50 – Assinatura: 30,20

ENTENDA. EXPERIMENTE. MUDE

CAMINHOS DA FÉ O desafio de escolher ou não uma religião num mundo cada vez mais relativizado e com múltiplas opções P. 10

AO PONTO: O ÁLCOOL PRECISA SER LEVADO MAIS A SÉRIO P. 5

ARTIGO: DE QUE LADO VOCÊ ESTÁ NO CONFLITO? P. 16

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LIÇÃO DE VIDA: O AUTOCONTROLE FAZ PARTE DA MASCULINIDADE P. 30

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Da redação

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Editor Wendel Lima

O PODER DA ESCOLHA Daniel Oliveira

PARA 2020, a CPB, editora que produz a revista Conexão 2.0 e os materiais didáticos da rede educacional adventista no Brasil, está lançando um novo produto: um devocional para jovens. Essa era uma lacuna do nosso catálogo. E como material de estreia teremos uma meditação escrita pelo pastor José Venefrides, que tem quase 30 anos de experiência na liderança espiritual de jovens, em várias regiões do país. O devocional Inegociável vai abordar, ao longo de 366 dias e 52 semanas, valores que podem fazer a diferença para quem vive a fase das escolhas numa sociedade em constante mudança. Selecionei para este editorial quatro insights que o autor compartilha logo na primeira semana da sua meditação, na qual trata do mesmo tema da nossa edição: escolhas. 1. Entre o certo e o certo. Venê, como é chamado carinhosamente, acredita que “viver é escolher”. Desde as decisões mais simples e cotidianas até as mais complexas e com consequências de longo prazo, nossa existência é moldada pelas nossas escolhas. Porém, ele argumenta que mais difícil do que escolher entre o certo e o errado, é decidir entre duas boas opções. Nesses casos, o melhor é pedir a sabedoria divina, escolher, se satisfazer com a decisão e estar preparado para as consequências dela. 2. Obediência. Escolher obedecer a vontade de Deus é um grande sinal de liberdade para pecadores como nós, que nascemos escravos de uma natureza corrompida. Porém, para que isso seja possível, a decisão pela obediência não pode ser repentina e esporádica, mas resultado de um processo de constante escolha do que é certo. A repetição de boas escolhas cria conexões neurais favoráveis à obediência. 3. Cuidado com as emoções. Nosso coração é teimoso. Por isso, é difícil não escolher o errado, ainda que saibamos o que é certo. O que costuma tornar tudo isso mais complexo são nossas emoções. É comum nos arrependermos de decisões tomadas por impulso ou com base em sensações passageiras. Portanto, procure manter suas emoções sob controle e faça um exame diário de sua consciência para entender melhor suas reais motivações e intenções. 4. A decisão mais importante. Nossa liberdade é limitada, porque nem tudo podemos escolher, principalmente o que tem que ver com nossa herança genética e a condição social em que nascemos. Inclusive, podemos nos sentir injustiçados por causa desses fatores. E o mundo realmente é injusto. Contudo, a cada ser humano é concedida a liberdade de fazer uma escolha que pode oferecer uma solução parcial agora e final, no futuro, para essas desvantagens da vida. Podemos decidir a que ou a Quem servir (Js 24:15), e isso muda nosso modo de viver no presente e o que receberemos de recompensa na eternidade. Espero que o devocional Inegociável e esta revista ajudem você a usar com responsabilidade uma das maiores capacidades ofertadas por Deus à humanidade: o poder da escolha.

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4 CONECTADO

OPINIÃO DE QUEM SEGUE E CURTE A REVISTA

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GLOBOSFERA

SÉRIES, LIVROS, ESTATÍSTICAS E REFLEXÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DAS ESCOLHAS

8 ENTENDA

COMO FUNCIONAM OS ALGORITMOS

24 PERGUNTAS

BÊNÇÕES E MALDIÇÕES, LIVRE-ARBÍTRIO E A RELAÇÃO ENTRE CORPO E MENTE

32 APRENDA 33 NA CABECEIRA

A ESCOLHER SUA CARREIRA

5 AO

A CI SOB PSIC

1

LIVRO CONTA HISTÓRIA DE ADVENTISTA PERSEGUIDO NA CHINA COMUNISTA

34 GUIA DE PROFISSÕES A CARREIRA QUE ESTUDA AS LEIS QUE REGULAM A VIDA EM SOCIEDADE

16 ARTIGO

CONHEÇA SEU INIMIGO E A ESTRATÉGIA DELE NO CONFLITO ENTRE O BEM E O MAL

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UE

STICAS

OLHAS

S, LAÇÃO E

REIRA

26 IMAGINE

... SE NÃO HOUVESSE LIBERDADE

5 AO PONTO

A CIENTISTA QUE PESQUISA SOBRE O CONSUMO DE PSICOTRÓPICOS NO BRASIL

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CAPA

A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE RELIGIOSA

DE DO

Ilustração da capa: Renan Martin

CASA PUBLICADORA BRASILEIRA

Editora da Igreja Adventista do Sétimo Dia Rodovia Estadual SP 127 – km 106 Caixa Postal 34 – 18270-970 – Tatuí, SP Fone (15) 3205-8800 – Fax (15) 3205-8900 Site: www.cpb.com.br / E-mail: sac@cpb.com.br

SÕES

DA AS VIDA

EA ONFLITO

Revista trimestral – ISSN 2238-7900 Out-Dez 2019 Ano 12, no 52

Serviço de Atendimento ao Cliente Ligue grátis: 0800-9790606 Segunda a quinta, das 8h às 20h Sexta, das 8h às 15h45 Domingo, das 8h30 às 14h

20 TEXTO E CONTEXTO SAIBA QUANDO E COMO A HUMANIDADE COLOCOU TUDO A PERDER

28 MUDE SEU MUNDO

O MÉDICO SUL-AFRICANO QUE DECIDIU VIVER ENTRE OS REFUGIADOS

Editor: Wendel Lima Editores Associados: André Vasconcelos e Márcio Tonetti Projeto Gráfico: Éfeso Granieri e Marcos Santos Designer Gráfico: Renan Martin Diretor-Geral: José Carlos de Lima Diretor Financeiro: Uilson Garcia Redator-Chefe: Marcos De Benedicto Gerente de Produção: Reisner Martins Gerente de Vendas: João Vicente Pereyra Chefe de Arte: Marcelo de Souza Colaboradores: Alexander Dutra, Almir Afonso Pires, Almir Augusto de Oliveira, Eder Fernandes Leal, Edgard Luz, Henilson Erthal de Albuquerque, Ivan Góes, Raquel de Oliveira Xavier Ricarte, Rérison Vasques, Rubens Paulo Silva e Vanderson Amaro da Costa Assinatura: R$ 30,20 Avulso: R$ 9,50 www.conexao20.com.br 90117/40292

30 LIÇÃO DE VIDA

EXECUTIVO CRISTÃO DE HOLLYWOOD FALA SOBRE IMPULSOS E AUTOCONTROLE

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio, sem prévia autorização escrita do autor e da editora.

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Informação Conectado & Opinião Globosfera Ao ponto Entenda

AUTOESTIMA Quero agradecer aos editores por abordar assuntos tão atuais, relevantes e necessários na Conexão 2.0. A edição de julho-setembro, que tratou o tema da autoestima, foi muito eficaz para mim, pois as mídias sociais e os padrões de beleza de hoje nos colocam sob a ditadura da aparência. Isso prejudica tanto nosso relacionamento com a gente mesmo como nossas interações sociais. Obrigada por trazerem informações que colaboram para a saúde emocional, o que é fundamental para o desenvolvimento completo da vida. Ludimila Tainã Bogenhofen, Áustria

TODO MUNDO QUER SER POP (P. 5) A entrevista foi muito relevante e objetiva. É interessante notar que os próprios gestores das mídias sociais perceberam que a busca pela popularidade pode ser nociva. Recentemente, uma das maiores empresas desse segmento fez a experiência de ocultar a quantidade de likes das fotos. Muitos reclamaram da mudança, pois nisso baseiam sua popularidade. A gente se viciou facilmente nesses números. Alex Bittencourt Galindo Hortolândia (SP)

OS DOIS LADOS DA CULPA (P. 24) Alberto Nery escreveu sobre um tema comum, mas muitas vezes não resolvido: a culpa. Cada pessoa lida com esse sentimento de uma forma diferente; por isso, temos que tomar alguns cuidados. Há quem se culpe excessivamente, sem avaliar o próprio erro e sem entender que, em qualquer situação, sempre haverá necessidade de melhorar. Não há razão para se pressionar. Por outro lado, precisamos observar nossas falhas e assumir a responsabilidade por elas. Deixar de culpar os outros 4 |

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(ou até mesmo Deus) é um passo de maturidade. O ideal é observar o que pode ser melhorado e seguir adiante com a certeza de que Deus nos ajudará a lidar com a culpa, sem o peso que colocamos sobre nós. Homero Nascimento Brasília (DF)

FUTURO BRILHANTE (P. 28, 29) O projeto “Garotas brilhantes” me fez pensar em como posso fazer a diferença na vida das pessoas. Muitos jovens de famílias desestruturadas têm dificuldades em mudar a realidade em que vivem. Porém, com algum incentivo, eles podem ter um futuro diferente. A exemplo do projeto, cada um de nós pode e deve fazer algo para melhorar a vida de alguém e aliviar seus fardos. Angélica Vasconcelos Tatuí (SP)

EM PÉ (P. 30, 31) Ao ler a matéria “Em pé”, pensei nos cuidados de Deus por nós. O relato sobre essa jovem que, apesar de todos as dificuldades enfrentadas, nunca desistiu da vida, nos motiva a buscar maneiras de alcançar nossos sonhos, crendo plenamente que Deus já está providenciando tudo de que precisamos. A verdade é que, se nos colocarmos inteiramente nas mãos do Senhor, Ele fará o impossível para nos ajudar.

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Diani Becker Lamborghini São Roque do Canaã (ES)

NÃO PERCA TEMPO (P. 33) Os conselhos trazidos pelo livro Nem Tudo Que Cai na Rede é Peixe (CPB, 2013) são importantes. Eu aproveitei o tempo de solteiro para orar bastante e esperar em Deus. Fiz isso por muitos anos. Foi uma bênção para mim. Raélton Guimarães dos Santos Itaí (SP)

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P p B A m á b d s c u lê d a u

E á E n m fô e á d u c p


Ao ponto

Texto Wendel Lima Ilustração Paulo Vieira

COM ÁLCOOL NÃO SE BRINCA ELA TEM APENAS 40 anos e é uma das maiores referências acadêmicas no Brasil quando o assunto é prevenção do consumo de drogas. Com formação inicial em Farmácia-Bioquímica pela USP, Zila Sanchez cursou mestrado e doutorado em Psicobiologia na Unifesp, universidade na qual trabalha como coordenadora da pós-graduação em Saúde Coletiva. Seu interesse principal é entender que fatores favorecem o consumo de psicotrópicos entre adolescentes e jovens adultos. Zila tem levantado a bandeira de que a sociedade brasileira precisa levar o álcool mais a sério.

Por que o álcool é a droga psicotrópica mais consumida no Brasil? As duas drogas mais consumidas no país são legalizadas: álcool e tabaco. No caso da bebida, certamente a facilidade de acesso, o pouco controle sobre as vendas e a baixa percepção de risco por parte dos usuários explicam as prevalências de consumo e danos decorrentes. Precisamos levar a sério o fato de que o álcool é uma droga. Existe consumo seguro de álcool? Em agosto de 2018 foi publicado na prestigiada revista acadêmica The Lancet um estudo de fôlego evidenciando que não existe consumo seguro de álcool (bit.ly/2MkPdBi). Apesar de haver alguma evidência de um possível efeito cardiovascular benéfico decorrente de pequenas doses, no fim das

contas, esse possível benefício não compensa os riscos. O álcool aumenta, por exemplo, a chance do desenvolvimento de diversos tipos de câncer, acidentes em geral e infecções. Quais foram os dados mais importantes coletados por sua equipe na pesquisa Balada com Ciência? O mais importante diz respeito ao modelo open bar. Essa modalidade de venda de álcool em baladas, permitida em nosso país, está associada à maior intoxicação alcoólica nesses estabelecimentos e, inclusive, a um consumo muito maior de drogas ilícitas pelos frequentadores. Destacou-se ainda a identificação de altas prevalências de beber e dirigir após a saída do estabelecimento e episódios de apagão alcoólico. Nas últimas décadas, o Brasil se destacou como um exemplo

mundial na redução do consumo de tabaco. Qual foi a receita? A receita envolveu uma estratégia da OMS conhecida como MPOWER, que visava: (1) proteger a população contra a fumaça do tabaco; (2) oferecer ajuda para vencer o vício; (3) advertir sobre os perigos do tabaco; (4) fazer cumprir as proibições sobre publicidade, promoção e patrocínio do cigarro; e (5) aumentar os impostos sobre o tabaco. O que falta no caso do álcool é aplicar essas mesmas medidas, além de vencer o lobby da indústria do álcool nas instâncias legislativas. Por que o consumo de drogas é mais danoso para o cérebro durante a adolescência? Porque o cérebro do adolescente ainda está em fase de total desenvolvimento, assim como o da criança. A formação

das mais importantes conexões neurais se dá até por volta dos 23 anos. Nessa etapa, o consumo de psicotrópicos afeta de maneira mais explícita o desenvolvimento neurocognitivo. E o que dizer do discurso de que a maconha é medicinal? Afirmar que a maconha é medicinal virou quase um slogan dos adolescentes que, diante de seus pais, querem defender o uso dessa droga. No entanto, a evidência de possível uso medicinal do canabidiol ainda é restrita a alguns casos, como na epilepsia refratária. O ponto é que nos países em que a maconha foi liberada, seu efeito medicinal ainda não foi adequadamente testado. Em contrapartida, os danos da maconha no cérebro do adolescente são claros e devem ser considerados, como o maior risco de um primeiro episódio psicótico. out-dez

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Texto Wendel Lima Coolaboradores Fernando Borges e Frank Campbell

PARA ASSISTIR Tudo disponível na plataforma feliz7play.com

© Keisergala | Adobe Stock

Documentários O Menino que Vendia Doces e Entregava Sonhos (2014, 1h12min.): a história do empresário e filantropo Milton Afonso. Ele foi dono de um dos maiores planos de saúde do Brasil e já ajudou milhares de jovens a estudar.

Rest – The Experience (2017, 1h17min.): acompanhe como 13 pessoas ao redor do mundo experimentam a guarda do sábado. Curta-metragens Endzone (2019, 15min.): como é ter um texto bíblico como base de um namoro no século 21? Melissa e Gustavo, do universo Fora de Série, mostram como. Séries Renascidos (2019, sete episódios de 20min.): a história de uma família que decide nascer de novo depois de ser separada pela traição e abalada por uma doença.

Separado (2019, quatro episódios de 9min.): Antônio tinha escolhido o crime, mas Deus tinha outros planos para ele. Eu Penso Assim (2017, seis episódios de 4min.): bate-papo sobre sexualidade e relacionamentos entre um pastor e um grupo de jovens. Além da Busca (2017, 14 episódios de 29min.): questões existenciais como dor, culpa e morte são discutidas à luz da Bíblia, numa viagem pelos cinco continentes.

Filmes Opostos (2017, 45min.): a trajetória de superação de Luiz Cietto, o menino de rua que se tornou doutor em Direito e teve uma bem-sucedida carreira acadêmica.

A Esperança Não Morre (2017, 37min.): quando um casal encontra um grande problema em sua família, eles têm que decidir entre uma vida de aparências ou um relacionamento real com Deus. O Silêncio de Lara (2015, 26min.): médiametragem sobre uma adolescente que conseguiu romper com o ciclo de abuso na sua família. Escolhas (2017, 21min.): uma história de encontro e reencontro envolvendo uma jornalista e uma mãe que procurava seu filho havia sete anos.

PARA LER

Ouse Pedir Mais (CPB, 2017, 335 p.), de Melody Mason 6 |

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Risco Calculado (CPB, 2011, 255 p.), de Ben Carson e Gregg Lewis

Soldado Desarmado (CPB, 2016, 174 p.), de Frances M. Doss

Namoro Completo (CPB, 2019, 240 p.), de Nancy Van Pelt

Profissional de Sucesso (CPB, 2006, 106 p.), de Cristiano Stefenoni

r a v p im c m s d p A

P p q A a

p p m P d

T C fe s c


e

o

Aprendemos a pensar no que realmente precisamos para viver, a dar valor às pequenas coisas da vida, a ser hospitaleiros com quem precisa, a ter paciência em situações imprevisíveis e a respeitar nossas diferenças como casal. [...] Não sabemos o que o futuro nos prepara, mas temos planos de continuar envolvidos em causas sociais onde estivermos. De fato, em todos os rincões do mundo existem necessidades e não é preciso percorrer longas distâncias para ajudar o próximo. Ao contrário, o próximo é quem está ao nosso lado.”

Arquivo pessoal

PARA SABER Inúmeras pesquisas tentam identificar padrões e entender o comportamento da chamada geração Z (10 a 24 anos), o pessoal que nasceu a partir de 1995. Um desses estudos foi publicado pelo UOL Tab. Veja alguns destaques:

86%

80%

acreditam que a carreira define para os outros quem eles são

desejam ter filhos

56%

acham que consumismo é a principal marca da sua geração

43%

Paulo (engenheiro naval) e Ingrid Azevedo (médica), casal paulista, falando sobre o aprendizado da viagem de dois anos que estão fazendo pelo mundo. Eles participam de projetos da ADRA em vários continentes e fazem campanhas on-line para apoiar a agência humanitária adventista (shortlifebigworld.com)

Aquele dia foi escuro. [...] Um pedaço de mim foi arrancado e nada pode tirar essa dor. [...] Ele matou minha família, mas eu o perdoei. [...] Perdão não é um evento, é um estado de espírito.”

querem casar ou ter um relacionamento sério

35%

Adventist Messenger

m a,

PARA PENSAR

Trechos do testemunho de Vas Pejcinovski para a revista Canadian Adventist Messenger (adventistmessenger.ca) de fevereiro. Ele contou como perdoou o homem que assassinou sua ex-mulher, um filho e uma filha, em março de 2018, na cidade de Ajax, em Ontário, Canadá.

alegam já terem sofrido depressão

29%

dizem que são muito ansiosos Entre os adolescentes de 10 a 19 anos...

65%

acompanham a situação política do país

60%

estão com o celular na mão 12 horas por dia

58% 51 Atitudes Para a Pesquisa Inteligente (CPB, 2010, 112 p.), de Eliel Unglaub e Delton Lehr Unglaub

O Encanto de Hollywood (CPB, 2019, 144 p.), de Fernando Beier

se consideram ativistas, militantes ou simpatizantes de alguma causa

47%

52%

não se definem politicamente como de direita, esquerda ou centro

deles se informam pelo Facebook

Fontes: Consumoteca (2017) e pesquisa on-line Phone Life Balance out-dez

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Entenda

Texto Guilherme Cavalcante Design Renan Martin

COMO FUNCIONAM OS A (E SE ELES INFLUENCIAM SUAS ESCOLHAS)

ELES ESTÃO POR AÍ, fazendo pop-ups e aparecendo em sua tela com propagandas de produtos que você estava procurando ou recomendando um vídeo com assuntos que o incomodam há algum tempo. Que eles facilitam a vida moderna, não há dúvida, e dificilmente abriríamos mão dessas comodidades. Porém, escândalos recentes envolvendo grandes plataformas de mídias digitais levantaram uma discussão importante sobre ética no ambiente virtual. Esse debate inclui a política de uso dos dados dos usuários, questões de privacidade e a formação de “bolhas de opinião”, o que acaba acirrando a polarização da sociedade e a disseminação da intolerância. Por tudo isso, mais e mais pessoas gostariam de abrir a “caixa-preta” dos algoritmos, para entendêlos melhor. E nós fizemos isso para você. Confira.

O QUE SÃO?

Algoritmos são uma tentativa de descrever o passo a passo para a realização de um procedimento de forma tão precisa, que possa ser executado sem qualquer interpretação de quem (ou o que) o executa. Dessa forma, economiza-se tempo e esforço. Receitas de bolo, manuais de instrução de eletrodomésticos ou orientações para se chegar em determinado lugar são exemplos de algoritmos que você usou toda a vida e não sabia.

COMO FUNCIONAM?

Todo algoritmo começa com um problema a ser solucionado e uma sequência de passos para resolvê-lo (uma fórmula), que resultará numa ou em várias possibilidades. No âmbito da computação, alguns algoritmos inclusive podem se retroalimentar, isso é, modificar seus próprios termos a partir de suas próprias conclusões ou das de outros algoritmos. Ou seja, as máquinas também aprendem (machine-learning), e isso traz uma série de implicações.

Ilustração: © hanss | Adobesctok | Ícones: Eucalyp; Smashicons; Pixelmeetup; SimpleIcon; Freepik

Algoritmos não são instrumentos neutros. Eles têm influenciado, nem sempre positivamente, processos de escolha com sérias implicações. Confira alguns casos: 8 |

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Ficha criminal

Segundo um algoritmo de análise de casos criminais, usado para auxiliar na promulgação de sentenças nos Estados Unidos, era dez de dez a chance de o afro-americano Bernard Parker ser reincidente criminal. Seu crime anterior? Resistir à uma abordagem policial. Após isso, nenhum registro contra ele foi computado. O mesmo sistema deu nota três para o jovem branco Dylan Fugett, indiciado por tentativa de roubo somada às três detenções posteriores por posse e venda de drogas. Os algoritmos erraram feio!


Fontes: artigos “Repensando big data, algoritmos e comunicação: para uma crítica da neutralidade instrumental”, de Tales Tomaz e Guilherme Cavalcante Silva, em revista Parágrafo, v. 6, no 1, p. 31-42, 2018; e “A Relevância dos Algoritmos”, de Tarleton Gillespie, em revista Parágrafo, v. 6, no 1, p. 95-121, 2018; sites ProPublica (bit.ly/algoritmopropublica), HuffPost (bit.ly/algoritmohuffpost), Wired (bit.ly/algoritmowired) e Pesquisa Fapesp (bit.ly/pesquisafapesp).

OS ALGORITMOS

t,

POR QUE FALAMOS TANTO DELES?

Desde nossa origem como humanidade, pensamos em criar procedimentos para facilitar a realização de atividades repetitivas. Porém, com a invenção do computador, passamos a contar com uma máquina que é capaz de ler e realizar qualquer tipo de algoritmo, desde que seja descrito numa linguagem matemática, a qual chamamos de sistema formal. Descobrimos que computadores podem nos substituir em tarefas como sacar dinheiro, fazer uma sutura cirúrgica e avaliar os riscos de uma estrutura de engenharia. O fato é que cada vez mais os algoritmos estão mediando nosso cotidiano.

QUAIS SÃO SUAS LIMITAÇÕES?

Quando procuramos informações sobre algo ou alguém em buscadores como o Google, o que vemos como “melhores resultados” são na verdade uma seleção feita por poderosos algoritmos, capazes de considerar centenas de variáveis. Assim como, ao longo da história, recorremos ao senso comum, método científico, especialistas e livros sagrados para identificar o que precisamos saber, hoje confiamos isso aos algoritmos, o que é bastante significativo. Apesar da eficácia sem precedentes deles, os algoritmos têm uma limitação básica: não refletem nem “pensam” com base na subjetividade. Com isso, eles não conseguem “raciocinar” além da lógica binária do “verdadeiro” ou “falso”.

Site de relacionamento

O site Match.com foi processado em 2011 pela norte-americana Mary Kay Beckham porque seus algoritmos formaram um “match” entre ela e Wade Ridley, o homem que, mais tarde, tentou matá-la a facadas. Antes desse caso, Ridley já havia assassinado uma mulher que tinha conhecido pela mesma plataforma.

Reconhecimento facial

Gorilas, foi assim que os algoritmos de reconhecimento facial do Google Photos identificaram amigos negros do engenheiro de softwares Jacky Alciné, em 2015. O caso gerou uma chuva de críticas à empresa Google, que prometeu aperfeiçoar seu sistema. out-dez

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Interpretação Capa & Reflexão Artigo

Texto Alysson Huf Ilustrações Renan Martin

Texto e contexto Perguntas Imagine

EM BUSCA DE DIREÇÃO Escolher uma religião pode ser uma das importantes decisões tomadas na adolescência. Saiba como a geração atual tem trilhado o caminho da fé

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DÚVIDAS, DÚVIDAS, DÚVIDAS. Esse parece ser o resumo do ensino médio para muitos estudantes, especialmente para os do terceirão. Que faculdade cursar? Qual a melhor profissão a seguir? Como fazer escolhas corretas? A perspectiva da vida adulta se aproximando com um calhamaço de responsabilidades costuma jogar sobre os alunos uma pressão difícil de lidar. E no meio desse turbilhão de perguntas e emoções instáveis, uma questão ainda mais profunda perpassa todas as demais: qual religião devo seguir? Preciso seguir alguma ou posso trilhar meu próprio caminho? Muitas vezes mal compreendida pelos adultos, a escolha da identidade religiosa é determinante para os adolescentes. Isso porque ela serve de base para muitas outras decisões: a vivência da sexualidade, a escolha profissional e o engajamento na sociedade, por exemplo. Afinal, é a partir da própria visão de mundo que alguém estabelece seus valores e prioridades. No entanto, escolher uma religião quase nunca é algo simples, pois envolve decisões que podem gerar conflitos com amigos e familiares. Nascida num lar evangélico bastante conservador, a estudante Mariana (pseudônimo), de 16 anos, era considerada uma “menina de muita fé” pela família e pelos membros da igreja a que seus pais pertencem. Frequentava os cultos, orava com as pessoas, participava dos "junta panelas", envolvia-se nos retiros espirituais e cantava os hinos tradicionais. No entanto, as coisas começaram a mudar quando ela completou 14 anos. Após algum tempo refletindo sobre a religião que seguia, reconsiderou sua fé e abandonou as antigas crenças. “Usando como espelho os meus pais e suas atitudes, acredito que a religião deles é um pouco hipócrita, assim como o Deus bíblico, o conceito de vida eterna e de quem tem ou não direito a ela”, explica a estudante de um colégio público, numa cidade do interior de São Paulo. Indagada sobre quais são, na visão dela, os principais problemas das religiões atuais, a adolescente resume sem titubear: “Muitos." O exclusivismo de algumas denominações, no entanto, parece ser o que mais a incomoda. “O problema principal da maioria das igrejas é achar que apenas elas são as certas, que apenas o seu deus é real, esquecendo-se de que existem inúmeras religiões no mundo”, justifica. “Acredito que cada um tem o livre-arbítrio para acreditar no que bem quiser e que lhe faça bem.” E se engana quem pensa que as pessoas que compartilham das opiniões de Mariana representam uma pequena parcela da população. Essa opção de não se vincular a nenhuma religião institucionalizada

(ou seja, com nome, endereço e regras bem definidas) é um fenômeno crescente nas últimas décadas. Isso vale inclusive para aqueles que não abandonaram sua religiosidade particular. Em outras palavras, muitas pessoas que ainda alimentam a fé em Deus ou em algum poder sobrenatural que dê sentido à vida não querem mais saber de ir à igreja. De acordo com o Censo de 2010, o último realizado pelo IBGE, 15,3 milhões de brasileiros ou 8% da população do país se declararam sem religião. Além disso, existem os “evangélicos não determinados” – indivíduos que se identificam como religiosos, mas que afirmam não possuir vínculo com qualquer denominação cristã: eles eram 9,2 milhões de pessoas há quase dez anos ou 4,85% da população nacional. E você sabe quem está no centro desse movimento? Exatamente, os adolescentes e jovens. O próprio Censo demonstra isso. A proporção de pessoas de 15 a 19 anos (9,7%) e de 20 a 24 anos (10,6%) que se declararam sem religião era maior do que o índice geral do país (8%). E quando analisada a idade mediana dos principais grupos religiosos do Brasil, os sem religião são o segmento com a média etária mais jovem: 26 anos. A socióloga Silvia Fernandes é professora na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e estuda justamente a relação entre juventude e religião. Segundo ela, o declínio da vinculação dos jovens com instituições religiosas ocorre tanto entre católicos quanto entre evangélicos. “No caso específico das igrejas evangélicas de corte pentecostal, há muita rotatividade e circulação dos jovens e pouco engajamento. Isso já foi constatado não apenas em minha pesquisa, mas em outros estudos”, comenta a doutora em Ciências Sociais. Essa tendência tem sido sentida pelos líderes religiosos que lidam diretamente com pessoas nessa faixa etária, como o pastor Lucas Silva. “Vejo que os jovens e adolescentes de hoje não estão fechados para a religião, para a ideia do sobrenatural. Eles estão abertos, só que a maioria (para não dizer todos) procura algo baseado em sensações, em sentimentos”, comenta o capelão do Colégio Adventista de Pedreira, na capital paulista. As ideias que muitos estudantes compartilham com ele ecoam as palavras da Mariana. “Vejo que para eles não existe muito a ideia do certo e do errado. Muitos falam que ‘o certo para mim pode não ser o certo para você’, e que se alguma religião o reprime e proíbe de alguma coisa que gosta, isso é sinal de que essa religião não é a melhor para ele”, detalha Lucas. out-dez

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CONFLITOS DA IDADE Agora, por que o número de pessoas sem religião ou que abandonam a igreja que frequentam desde pequenos é maior entre adolescentes e jovens? Em primeiro lugar, é importante ressaltar que, apesar de parecer um fenômeno recente, a postura questionadora é praticamente uma marca registrada da juventude ocidental no período pós-guerra. “A gente vê isso crescendo nos últimos anos, talvez porque a liberdade de expressão aumentou, e a possibilidade de externalizar os questionamentos aumentou também”, postula o pastor Tiago Rodrigues, capelão do Instituto Adventista Paranaense (IAP). Ou seja, os questionamentos dessa idade sempre existiram, mas, por causa das possibilidades trazidas pelos meios de comunicação e a popularização da internet, as dúvidas e incertezas dos adolescentes alcançaram muito mais repercussão nas últimas décadas. Outro ponto a ser considerado para entender a postura dos adolescentes é seu próprio desenvolvimento pessoal. De acordo com o psicólogo Alberto Nery, que é doutor em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP), é nessa fase que o indivíduo começa a se diferenciar dos pais e dos modelos que recebeu, passando a ter mais autonomia. “O adolescente começa a ter uma religião mais autônoma, começa a avaliar por si mesmo os caminhos que deseja seguir, em que ele acredita ou não e quais são os sentidos das crenças para ele”, comenta o psicólogo, que também tem formação em teologia. Nesse período da vida, o que pesa mais no processo de tomada de decisão não é o que o pai e a mãe acham do assunto, mas aquilo que tem mais significado para o jovem. Alberto acrescenta que a postura questionadora é própria da adolescência, não apenas em relação à religião, mas a outros fatores. “Ao meu ver, o grande problema não são as perguntas dos adolescentes, mas o fato de que muitas vezes as comunidades religiosas, as denominações ou até a própria família não estão prontas para respondê-las”, comenta. Por ser uma fase em que ocorre essa confrontação natural com os valores familiares, a grande busca do adolescente é por coerência. “O indivíduo começa a enxergar o mundo pelos próprios olhos e, consequentemente, passa a avaliar as explicações de mundo que ele já tem, e comparar com aquelas que ele acha mais coerentes”, afirma o psicólogo. Porém, um ponto a se considerar, é que na adolescência a adesão e rejeição de crenças costuma ser motivada pela emoção. Na busca por referências e coerência, na necessidade de ter uma causa pela qual “viver e morrer”, o jovem pode acabar assumindo uma 12 |

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O grande problema não são as perguntas dos adolescentes, mas o fato de que muitas vezes as comunidades religiosas, as denominações ou até a própria família não estão prontas para respondê-las


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postura dogmática. Contudo, com a maturidade da fase adulta, ele tende a perceber que as coisas não são necessariamente pretas ou brancas, existem outras tonalidades de cores, inclusive variações de cinza. É na transição da infância para a fase adulta que tem início uma jornada de perguntas, respostas e mais perguntas para encontrar algo que dê sentido à sua inclinação religiosa. “Ele procura entender a razão de certa crença, as implicações e consequências dela. E, quando ele não vê um alinhamento entre a crença, a doutrina em si, e os efeitos práticos dela, tende a ter suas concepções abaladas”, pontua Alberto. Com base na sua experiência de capelania escolar, para Lucas Silva, outra palavra define bem o processo de construção da identidade religiosa: “propósito”. Ele argumenta que quem está atrás de um caminho espiritual para seguir busca encontrar razão e sentido, um motivo para sair da cama e enfrentar os desafios da vida, uma bandeira para levantar e pela qual lutar. “E esse propósito costuma estar ligado a servir ao próximo”, sublinha o pastor. FATORES EXTERNOS Apesar de a escolha de uma religião ser um processo permeado por questões internas, como a necessidade de propósito e coerência, alguns fatores externos são determinantes na resolução dos questionamentos e na formulação de novas indagações. O primeiro desses elementos, como não poderia deixar de ser, é a família. “A família, ao mesmo tempo em que acaba sendo a primeira fonte de experiências religiosas do adolescente, também é o primeiro ambiente em que se confrontam as fragilidades da religião, como a incoerência”, destaca o pastor Tiago Rodrigues. Dessa forma, à medida que se desenvolve, o adolescente entra em contato com outras formas de pensar a existência – o mundo fora de casa. Naturalmente, ele passa a comparar aquilo que aprendeu com a família e aquele conhecimento novo que adquiriu em contato com outros círculos sociais. E se encontra inconsistências naquilo que aprende com os pais, o questionamento surge, podendo dar lugar aos conflitos familiares. Agora, isso não significa necessariamente que o adolescente irá automaticamente abandonar a fé que seus pais lhe transmitiram. “O fato de dizer que a religião do jovem vai se tornar autônoma não significa necessariamente que ele irá contra o que aprendeu dos pais. Ele pode então, por ele mesmo, passar a crer nas mesmas coisas”, ressalta o psicólogo. Logo, a herança espiritual que ele recebe dos pais é muito importante.

Em consonância com isso, um segundo fator importante no processo de formação da identidade religiosa do adolescente é o ambiente social. “Se o jovem não encontra uma amizade na religião, um grupo para fazer parte ou uma comunidade para pertencer, isso acaba sendo um desafio para ele”, adverte o pastor Lucas Silva. Ele pontua que essa é uma fase em que o jovem costuma se autoafirmar com base no grupo com o qual convive. “E isso muitas vezes vira um conflito entre os jovens religiosos e seus amigos que adotam padrões e princípios de vida diferentes”, acrescenta. “Para estabilizar as significações que produzem a fim de dar um sentido à sua experiência cotidiana, os indivíduos raramente podem se contentar com sua própria convicção. Eles têm necessidade de encontrar no exterior a garantia de que suas crenças são pertinentes”, explica a socióloga da religião Danièle Hervieu-Léger, em seu livro O Peregrino e o Convertido (Vozes, 2008, p. 158). Em outras palavras, o adolescente não consegue abraçar por muito tempo uma crença que apenas ele validou, que faz sentido apenas para ele. Para que algo seja “crível”, é preciso que mais pessoas creiam nisso. O ponto é que, se durante séculos, as instituições religiosas e as famílias foram esses elementos externos de validação da fé das novas gerações, hoje o quadro é mais complexo. O contato com inúmeras narrativas e visões de mundo disponíveis na troca de informações e experiências, presencial ou virtualmente, faz com que esse processo não seja tão linear e previsível, mas caótico. Porém, no fim das contas, ainda que alguém escolha seu caminho espiritual por influência de livros, séries ou youtubers, vai precisar de uma comunidade para validar suas crenças. De gente que creia como ele. É por isso que, mesmo com o atual declínio das instituições religiosas, as igrejas locais, como comunidades de validação da fé, ainda parecem ser relevantes. Um terceiro fator, também fundamental na formação da identidade religiosa dos adolescentes é o próprio espírito da sociedade na qual eles se encontram. “A gente vive numa sociedade em que a fluidez dos valores, das experiências, das relações e da própria religião contribui para que haja uma expectativa de que a espiritualidade também seja mais fluída”, explica Tiago Rodrigues. Ele acrescenta que, quando a experiência religiosa vem formatada pela religião, com uma forma mais rígida e com menos espaço para essa fluidez, costuma haver conflitos. “Quando isso ocorre, o jovem tende a ficar arredio e passa a olhar a religião como algo a ser evitado ou como algo que não deve ser abraçado out-dez

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com tanta paixão como as gerações anteriores fizeram”, argumenta o pastor. Nesse contexto, os discursos contemporâneos sobre escolhas, autonomia e afirmação de identidade afetam diretamente os jovens. “Isso não acontece apenas com os modos como se relacionam com a religião, mas também no campo da moral sexual, das composições de família e nas escolhas profissionais”, destaca a socióloga Silvia Fernandes. “São tempos que exigem mais reconhecimento e tolerância e menos imposições discursivas. O desafio está, portanto, colocado para todas as instituições”, resume a pesquisadora. RELIGIÃO PRÓPRIA Laura (pseudônimo) é uma estudante do terceiro ano do ensino médio numa escola particular de São Paulo (SP) e frequenta regularmente, com sua família, uma igreja protestante. Apesar disso, ela mantém uma mentalidade bastante aberta em relação à suas práticas religiosas e não tem medo de criticar aspectos da denominação a que pertence. “Não acho que Deus ligue muito para essas coisas. Claro que certas normas são necessárias, mas com a grande maioria delas eu não concordo muito”, comenta a jovem de 16 anos. Parte de sua visão relativizada a respeito da religião se deve ao que ela considera errado em muitas igrejas. “Acredito que muitas religiões perderam o principal foco, que é pregar sobre Deus, o que Ele é e representa”, explica a estudante. Para ela, as religiões têm focado apenas em julgar o próximo, criticar a aparência alheia e inventar regras sobre a forma de se vestir e falar. Laura representa uma outra parcela dos jovens que compõem o complexo cenário religioso brasileiro. Por mais que muitas pessoas estejam abandonando as igrejas, muitos jovens têm caminhado na contramão disso e se empenhado em participar assiduamente de religiões formais – ainda que ao seu próprio modo. “Observa-se um recrudescimento de movimentos religiosos juvenis, ao mesmo tempo em que cresce o desejo de composição religiosa de acordo com os próprios princípios e necessidades subjetivas”, aponta Silvia. Ou seja, apesar de o número de jovens vinculados às religiões organizadas ser maior que o dos sem religião, a forma como a fé desses “jovens institucionalizados” se manifesta é bem diferente da que se via nas gerações de seus pais e avós. Por isso, torna-se cada vez mais comum encontrarmos adolescentes que não veem problema algum em ir à missa e ao terreiro de candomblé ou visitar uma igreja evangélica num dia e no outro ir ao centro espírita. 14 |

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Isso reitera o argumento anterior de que não é o elemento religioso que tem sido rejeitado entre os jovens, mas a forma de alcançar e lidar com esse aspecto religioso da vida é que tem mudado. “Muitas vezes, essas alterações estão relacionadas com os momentos decisivos que as pessoas atravessam, com questões subjetivas e com uma certa busca de ordenação”, reforça Silvia. A pesquisadora salienta que as formas de participação e vínculo religioso também não são lineares nem necessariamente tradicionais, o que pode representar um desafio para as instituições que entendem que pertencer a uma denominação religiosa implica frequentar suas reuniões, contribuir financeiramente para a instituição e adotar seu modelo de conduta. “Os jovens têm ensaiado muitas maneiras de serem religiosos ou espirituais que não passam necessariamente pela presença assídua aos templos”, acentua Silvia. PREPARANDO O CAMINHO Nesse cenário cada vez mais complexo, como escolher seu caminho religioso da maneira mais saudável e madura possível? Talvez a primeira coisa a se levar em conta ao responder essa questão seja o papel que as famílias e as comunidades religiosas possuem nesse processo, preparando o caminho para que os mais jovens consigam decidir por si mesmos quais rumos desejam seguir. De acordo com Alberto Nery, o melhor que pais e “irmãos de fé” podem fazer para ajudar os estudantes nessa fase é entender com naturalidade que esse é um momento de questionamento. Por isso, o melhor é evitar pressões desnecessárias sobre eles. “Temos que entender que essa dúvida é necessária até para o eventual fortalecimento da fé”, aconselha o psicólogo. “Cabe aos pais e à igreja ter paciência e saber oferecer recursos que ajudem a responder as perguntas que eles trazem – e não encarar isso como uma ofensa.” O pastor Tiago Rodrigues destaca que os pais precisam entender que os filhos não vão apenas herdar passivamente a tradição religiosa que comunicaram. “Eles precisam manter o espaço aberto para o diálogo, para o questionamento, e providenciar conteúdo religioso que responda o senso crítico que os adolescentes estão desenvolvendo”, orienta. O pastor também explica que questionar a própria tradição religiosa necessariamente não levará alguém a romper com esse caminho de fé. As dúvidas fazem parte da caminhada. A questão é como os jovens, pais e líderes lidam com esse processo. De acordo com uma pesquisa divulgada em 2011 pelo The Barna Group, uma companhia de pesquisas focadas na intersecção entre fé e cultura, um dos


principais motivos para os jovens abandonarem as igrejas nos Estados Unidos era a hostilidade dispensada por algumas denominações àqueles que questionam. Segundo Tiago Rodrigues, essa é a principal atitude que as igrejas precisam repensar. “É importante que a comunidade acolha bem a dúvida, que lide bem com a diversidade, que repense a maneira como ela recebe e aceita as pessoas”, lista o pastor, acrescentando que os jovens esperam não apenas serem aceitos, mas perceberem que suas comunidades também acolhem a diversidade e os diferentes, ainda que não legitimem qualquer estilo de vida.

A espiritualidade pessoal é aquela que testa, que se expõe, que vai, por exemplo, até um livro sagrado como a Bíblia descobrir por si só o que o livro está dizendo

ESCOLHENDO A DIREÇÃO Apesar de não existir uma fórmula para definir o caminho espiritual que cada um deve seguir, algumas dicas podem tornar essa decisão muito mais fácil e segura. A primeira delas é ter humildade e compreender que a religião que foi oferecida pelos pais é aquilo que, na compreensão deles, foi o que melhor poderiam fazer. Por isso, ainda que você discorde de alguns pontos, talvez não precise rejeitá-la. Lembre-se de que as tradições religiosas podem ser aperfeiçoadas com a contribuição de cada nova geração. Entender esse ponto evitará conflitos com parentes e decisões precipitadas. Uma segunda dica é compreender o que é uma espiritualidade saudável. “Pessoas com espiritualidade sadia conseguem se relacionar de forma mais tranquila e mais confiante com as instabilidades da vida”, afirma Rodrigues. Uma religião que coloca você em constante atrito com as pessoas não faz bem, assim como uma religiosidade que não ofecere conforto para os momentos mais dif íceis da vida. O terceiro conselho é desenvolver uma fé pessoal, uma espiritualidade que talvez tenha como ponto de partida a herança familiar, mas que se defina pela experiência particular. “Por espiritualidade pessoal, quero dizer a espiritualidade que testa, que se expõe, que vai à Bíblia para descobrir por si só o que ela está dizendo”, arremata Rodrigues. E se você for à Bíblia para construir uma espiritualidade mediada pela interpretação do texto, talvez se surpreenda com a distância que existe entre o que a revelação diz e o que boa parte dos cristãos professa. Se a maioria dos que rejeitam o cristianismo fizesse esse exercício, provavelmente veria que o Cristo que rejeitam não é o das Escrituras, mas uma caricatura Dele. Assim, teriam a chance de aceitar ou rejeitar, por si mesmos, Aquele que é “o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14:6). out-dez

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Texto Felipe Carmo Ilustração Kaleb

Você precisa identificar o inimigo e conhecer sua estratégia para se posicionar no conflito entre o bem e o mal

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VOU CONTAR UMA história um pouco desconcertante. Certo dia me encontrei com um aluno meu no campus do Unasp, em Engenheiro Coelho (SP), enquanto eu voltava do trabalho para casa. Gosto muito de conversar com estudantes e conhecer a vida deles, mas dessa vez eu não fazia ideia do que me esperava. Pelo fato de já ter certa proximidade com esse aluno, acho que ele se sentiu à vontade para compartilhar uma tragédia pessoal. Ele me contou que havia sido casado e que tinha formado uma família maravilhosa com a esposa e duas filhas. Porém, certo dia, quando estava no trabalho, ele recebeu um telefonema urgente: era um vizinho dizendo que a casa dele estava pegando fogo. Desesperado, ele chegou ao local e percebeu que era tarde demais. Os bombeiros haviam controlado o incêndio, mas a casa e a família tinham sido consumidas pelo fogo. Era por isso que ele estava cursando uma faculdade no Unasp: queria recomeçar a vida. Fiquei chocado com a história e sem palavras. Por uns dez minutos devo ter resmungando alguma coisa, mas sem acrescentar nada à vida dele. Acredito que ele já estivesse lidando melhor com aquele trauma, pois me contou a história com tranquilidade e não se chateou com minha tentativa frustrada de dizer algo construtivo. Você já deve ter passado por situações parecidas e talvez até piores do que essa. São aqueles momentos em que você se vê na responsabilidade de dar sentido ao sofrimento dos outros e achar um culpado para o que não tem explicação aparente. A intenção costuma ser boa, mas quando tentamos consolar com palavras, ou explicar, há uma grande chance de piorar a situação. Depois de refletir um pouco a respeito das maneiras de lidar com essas situações, pensei na história de Jó, a clássica narrativa bíblica sobre o sofrimento. Entendi que precisamos conhecer a verdadeira face do responsável pelo mal, a fim de entender as estratégias dele na guerra invisível que envolve toda a humanidade. Se você não sabe disso, corre o risco de se aliar às forças inimigas e acabar escolhendo o lado errado da batalha.

DORMINDO COM ELE O livro de Jó conta a respeito de um homem bom, muito religioso, que perdeu todos os bens, os filhos e até mesmo a saúde, tudo de uma vez só! Ao contrário do que se esperava, ele não blasfemou contra Deus, mas aceitou a situação com paciência, chegando a dizer: “O Senhor o deu, e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21). E a narrativa poderia acabar por aí. Só que não... A história continua com a aparição de três amigos, que se sentaram ao seu lado para o “consolar”. Eles até começaram bem, ficando sete dias em silêncio, em respeito à grande dor de Jó (2:13). Porém, depois disso, eles chegaram ao absurdo de chamar Jó de pecador, mentiroso e convencido (11:1-4; 15:5, 6; 22:5-11). Eles fizeram isso porque Jó insistia em dizer que era inocente e que aquele drama pessoal era imerecido (13:14, 15; 34:5). Contudo, os amigos não aceitaram: escolheram “defender” Deus e condenar Jó. Na visão deles, o Senhor não poderia fazer um homem bom sofrer. O mais natural era pensar que Jó havia cometido um pecado grave e que se negava a confessar sua culpa. Esse é o grande erro daqueles que decidem “consolar” seus amigos. Eles não fazem ideia de quem é o responsável pelo sofrimento. Ficam tão preocupados em “defender Deus” que acabam acusando a pessoa errada: o próprio sofredor. Os amigos de Jó também não tinham noção da guerra invisível que estava sendo travada entre Deus e Satanás (1–2). Por isso, não entendiam o contexto que estava por trás do sofrimento do protagonista e, infelizmente, escolheram inconscientemente fazer parte do exército inimigo que, desde o início da narrativa, queria desmoralizar Jó. Um australiano chamado David Clines, da Universidade de Sheffield, na Inglaterra, em um artigo publicado em 2004 na revista Biblical Interpretation, pesquisou as explicações mais comuns que os leitores da história de Jó davam para seu sofrimento. Ele descobriu coisas preocupantes: algumas pessoas acreditavam que o sofrimento de Jó fosse um privilégio e que out-dez

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Deus estivesse fazendo um favor para ele (imaginem só!). Alguns também argumentaram que Jó estaria sofrendo, pois talvez precisasse corrigir seu caráter. Contudo, se essas pessoas tivessem lido os dois primeiros capítulos do livro, perceberiam que o sofrimento de Jó não foi um privilégio, mas uma desgraça (2:10, 12 e 13), e que desde o começo da história ele era considerado justo pelo próprio Deus (1:1, 8; 2:3). Devido a essas leituras, um estudioso chamado John Collins, da Universidade Yale (EUA), em um artigo publicado em 2016 na revista Journal of Bible and Theology, comentou que a atitude dos amigos de Jó não deve ser a mesma daqueles que pretendem falar em nome de Deus. O leitor honesto deve avaliar o texto e entender o que a história está dizendo, de verdade. Nossa primeira responsabilidade é ler a narrativa e não sair por aí como se fôssemos os “advogados” do Todo-poderoso. Mergulhar no texto bíblico e ouvir o que ele diz pode nos ajudar a reagir de maneira equilibrada, honesta e inteligente ao sofrimento humano. Do contrário, podemos ser usados pelo inimigo da humanidade, a fim de intensificar a infelicidade das pessoas. O QUE OS OLHOS NÃO VEEM Em primeiro lugar, a história deixa claro que o responsável pelo sofrimento de Jó é um personagem chamado Satanás. Ao que parece, ele não é a inspiração dos discos da Xuxa nem o desenhista do símbolo da Coca-Cola. A Bíblia diz que ele tem uma função muito mais cruel: ele é o “acusador da humanidade” (é isso o que a palavra satan significa em hebraico). No Antigo Testamento, Satanás é aquele que deseja insultar a dignidade humana (Zc 3:1, 2; Sl 109:5-7); ele quer dizer ao Universo que você não vale nada e que não merece a misericórdia de Deus, assim como no caso de Jó (1:9-11; 2:4, 5). E, se você prestar atenção, vai perceber que essa atitude acusadora foi repetida pelos próprios amigos de Jó que, em vez de consolar o pobre homem, preferiram insultá-lo. A pior coisa que Satanás deseja fazer ao ser humano é convencê-lo de sua incapacidade e imerecimento de receber a graça de Deus. Em Apocalipse 12:10, Satanás é chamado de “o acusador dos nossos irmãos”, aquele que faz isso de dia e de noite diante de Deus. Nessa guerra invisível, o inimigo não é um “diabinho” que quer simplesmente convencer você a escutar aquela música ou vestir determinada roupa; na verdade, ele quer convencê-lo de que, por causa daquela música ou daquela roupa, você não merece o amor de Deus. Cruel, né? Outro detalhe: ele não aceita a lei divina. Ele prega que essa lei não é boa, pois foi estabelecida por Alguém que não é justo e que, no fim das contas, não quer nos ver livres (Gn 3:1-5; 1Cr 21:1-7; Mt 4:5-7). Foi por isso que Ellen White, escritora norte-americana e pioneira da Igreja Adventista, explicou que desde os tempos de Adão 18 |

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até hoje a questão central no grande conflito entre o bem e o mal é a obediência à lei de Deus” (Patriarcas e Profetas, p. 49). Por outro lado, Jesus pregou justamente o contrário. Ele olhou nos olhos do diabo e disse: “Vai-te, Satanás, porque está escrito: ao Senhor teu Deus adorarás, e só a Ele servirás” (Mt 4:10). O fato é que Satanás fica indignado quando alguém é obediente. Por isso ele é descrito como um dragão irado, que procura destruir aqueles que são a prova de que a lei de Deus traz felicidade (Ap 12:17). Não sem razão, Cristo avisou Pedro que ele deveria ficar esperto, pois Satanás queria passá-lo numa peneira, a fim de achar algum erro que pudesse usar contra ele (Lc 22:31). Quando o diabo encontra algum erro nos filhos de Deus (e ele não precisa se esforçar muito para isso), começa a protestar por aí declarando que a lei de Deus não é boa e que o ser humano é indigno da misericórdia divina. Foi isso o que aconteceu na história de Jó e acontece com muitos de nós também. Às vezes, uma pessoa boa é alvo de uma tragédia. Então ela se pergunta: “O que eu fiz para merecer isso?” A resposta é a mesma do caso de Jó: nada! O problema é que estamos envolvidos numa guerra invisível, na qual o inimigo nos questiona constantemente, principalmente quando sofremos, se compensa seguir a lei de Deus (Jó 1:9) e se somos dignos do amor Dele. AMIGO, ESTOU AQUI! Você e eu somos convidados a tomar uma decisão nesse campo de batalha, às vezes como vítimas do sofrimento, às vezes como representantes do bem ou do mal. Em todo caso, sempre podemos fazer a escolha certa para nosso benefício e dos outros. Como vítimas, é importante escolher o exemplo de Jó como modelo: manter a consciência limpa e reconhecer a soberania de Deus sobre todas as coisas, tanto boas quanto ruins (Jó 1:21; 2:10). Eu sei que não é fácil pensar assim quando as coisas vão mal e talvez seja por isso que Deus gastou dois capítulos inteiros do livro de Jó (38 e 41) repetindo, de todas as formas possíveis, o quanto Ele é insondável, que Seus verdadeiros desígnios são impossíveis de ser descobertos pela mente humana. O próprio Jó entendia isso: “Como se justificaria o homem para com Deus? Se quiser contender com ele, nem a uma de mil coisas lhe poderá responder” (Jó 9:2, 3). E foi justamente o que aconteceu no fim do livro: Deus lançou várias perguntas sobre o funcionamento da natureza e nenhum dos personagens foi capaz de responder qualquer uma delas. Assim como os leitores iniciais do livro de Eclesiastes não sabiam qual é o caminho do vento nem como se forma o bebê no ventre materno, assim também eles, e nós, não entendemos completamente as ações e “omissões” de Deus (Ec 11:5). Há coisas nesta vida que simplesmente não conseguimos compreender...


Você também pode ser “convocado” a fazer parte dessa guerra invisível sem saber. Não como vítima, mas como um soldado no front de batalha! Por isso, precisa escolher a qual exército pretende se aliar diante do sofrimento que nos cerca. Nessa batalha, precisamos seguir o conselho do estrategista chinês Sun Tzu, no livro A Arte da Guerra: Para vencer, você deve conhecer a geografia (o mundo caótico em que vivemos), a si mesmo (os seres humanos são aqueles que erram e buscam obedecer a Deus na medida do possível) e o inimigo (Satanás, que tenta nos convencer de que não temos chance de solução). De fato, ninguém tem acesso ao “outro lado da cortina” dessa guerra invisível. Por isso, explicar o sofrimento sempre será uma tarefa frustrante... O que nos resta é ter consciência da guerra e tomarmos o lado certo nela, com base no que conseguimos perceber. Definitivamente, nosso papel não é sair por aí procurando e dando explicações racionais para o sofrimento alheio, porque nunca saberemos o que se passa na mente de Deus, nem porque Ele toma as decisões que toma. Com base numa relação de submissão e obediência, cabe a nós confiar nas escolhas Dele. Portanto, se você tiver a oportunidade de consolar alguém que está sofrendo, primeiro siga o conselho de Paulo: alegre-se com os que se alegram e chore com os que choram (Rm 12:15). Geralmente, quem sofre não quer explicações, pois elas não vão reparar sua perda nem curar sua dor. Na verdade, aquele que chora precisa de alguém que escute suas tristezas. O silêncio é um sinal de respeito às lágrimas (Jó 2:13). Em segundo lugar, tente na medida do possível, encorajar essa pessoa com as palavras de Gálatas 6:9 (NVI): “E não nos cansemos de fazer o bem, pois no tempo próprio colheremos, se não desanimarmos.” Seu papel é ajudar quem sofre a não desistir de fazer o que é correto. O desânimo veio, mas Jó não entregou os pontos: “Eu sei que meu Redentor vive, e que no fim Se levantará sobre a Terra” (19:25, NVI). Hoje mesmo você pode escolher em qual lado estará nessa batalha que envolve a minha e a sua fidelidade. Se está sofrendo, tome a decisão correta: aceite a soberania de Deus e acredite nos Seus desígnios, mesmo sem entendê-los completamente. Por outro lado, se você está vendo alguém sofrer, não se junte aos acusadores dos pecadores e supostos “defensores” de Deus. Sente-se ao lado do seu colega, chore com ele e o ajude a seguir em frente, confiando Naquele que é o Autor da nossa fé (Hb 12:2). Lembre-se de que você e eu somos o alvo incansável do amor de Deus, quando erramos e quando acertamos. Por isso, vale a pena ser fiel a Ele em qualquer circunstância! out-dez

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Texto e contexto

Texto André Vasconcelos Ilustração Vandir Dorta Jr.

A pior jogada “O Senhor Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Gn 2:16, 17)

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UM GRUPO DE pessoas está assentado ao redor da mesa. Alguém explica as regras do jogo e distribui as cartas igualmente. Dois participantes inexperientes estão empolgados, mas o entusiasmo deles não dura muito. Após algumas jogadas, ambos são enganados pelo blefe de um adversário e perdem todas as fichas. Essa história é uma boa analogia ao relato de Gênesis 3, que narra a pior jogada de todos os tempos, realizada por um casal inexperiente: Adão e Eva. Eles tiveram a oportunidade de escolher entre obedecer a Deus ou satisfazer a própria vontade; porém, infelizmente, não tomaram a melhor decisão. Mas o que aconteceu naquela “partida” para que os pais da humanidade fossem enganados pelo adversário? Qual foi o resultado da transgressão deles? E como Deus está consertando a situação? REGRAS DO JOGO O relato da queda do ser humano em Gênesis 3 é antecedido pela ordenança divina no capítulo 2:16 e 17: “O Senhor Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás.” A narrativa deixa claro que Deus é quem determina as regras do jogo. Esses dois versos apresentam características típicas de uma aliança. Em 1955, o teólogo norte-americano George Mendenhall publicou o livro Law and Covenant in Israel and the Ancient Near East [Lei e Aliança em Israel e no Antigo Oriente Próximo]. Na obra, ele comparava os antigos tratados políticos dos hititas (séculos 14 e 13 a.C.) com o acordo firmado entre Deus e Israel. Ao fazê-lo, Mendenhall percebeu que os pactos na Bíblia seguiam a mesma estrutura desses tratados que, em sua maioria, apresentavam um acordo entre um senhor e um servo. Nesses antigos documentos, os senhores estipulavam as leis que os servos deveriam obedecer, além de pronunciar bênçãos e maldições que ocorreriam em resultado da fidelidade ou infidelidade à aliança. De maneira semelhante, Deus estipulou que o primeiro casal poderia comer o fruto de toda árvore do jardim, menos da árvore do conhecimento do bem e do mal. De fato, Gênesis 2:16 é a primeira vez que o verbo “ordenar” (do hebraico tsavah) é usado na Bíblia, o qual tem a mesma raiz da palavra “mandamento” (mitsvah). Isso demonstra que, ao fazer aquela proibição, o Senhor havia promulgado uma lei. Conforme o rito da aliança, Deus pronunciou uma bênção e uma maldição, que dependeriam da fidelidade do primeiro casal à Sua palavra: se Adão e Eva fossem fiéis, teriam acesso à árvore da vida e viveriam eternamente (Gn 3:22); se desobedecessem, seriam banidos do jardim e punidos com a morte (Gn 2:17; 3:23). BLEFE DO ADVERSÁRIO A narrativa segue, e uma nova personagem é apresentada: a serpente. Essa víbora não era um animal comum. O texto

a qualifica por meio do artigo “a” (do hebraico ha), demonstrando que se tratava de uma cobra especial, que era mais “sagaz” que todos os animais que haviam sido criados por Deus. A Bíblia menciona apenas duas ocasiões em que um animal falou com um ser humano: a serpente no Éden (Gn 3) e a jumenta de Balaão (Nm 22:28-31). No segundo caso, as Escrituras informam que a jumenta falou por meio da intervenção de um anjo, que se colocou diante do profeta como seu adversário (satan). Esse paralelo sugere que a serpente também serviu de “boca” para um anjo. Porém, no caso de Gênesis 3, o anjo não se colocou como um adversário; ele era o próprio adversário. O Novo Testamento revela claramente a identidade dele: “Foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo” (Ap 12:9; ver 20:2). A serpente se aproveitou do fato de que Eva era uma “jogadora” iniciante e a enganou. O contraste entre a sagacidade da serpente e a inocência de Eva é acentuado na narrativa por meio de um jogo de palavras. Gênesis 2:25 menciona que Adão e Eva estavam “nus” (‘arumim), ao passo que a serpente é retratada no verso seguinte como uma criatura “sagaz” (‘arum). Apesar de serem duas palavras diferentes, elas possuem a mesma sonoridade. Assim, o leitor é induzido a interpretar a nudez do primeiro casal em contraste com a sagacidade da serpente. Nesse caso, a nudez é um símbolo da pureza e inocência de Adão e Eva, características que eles perderam logo após o pecado (Gn 3:7). A serpente blefou ao simular ser um agente divino. Gênesis 3:1 indica essa leitura por duas razões: (1) a fala da serpente é introduzida com as palavras “e disse” (vayo’mer), a mesma expressão utilizada para iniciar as declarações de Deus em todo o relato da criação (ver Gn 1:3, 6, 9, 11, 14, 20, 22, 24, 26, 28 e 29); (2) a serpente cita a ordem divina – “É assim que Deus disse: Não comereis de toda a árvore do jardim?” –, mas omite a proibição de comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2:17). Eva respondeu à serpente dizendo que Deus havia proibido que ela e seu esposo comessem aquele fruto, sob pena de morte. Então Satanás partiu para sua jogada final e disse: “É certo que não morrereis” (Gn 3:4). Ele atribuiu ao fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal a imortalidade oferecida por meio da árvore da vida (v. 22). E, para piorar a situação, o engano pode ter se tornado ainda mais forte devido ao fato de as duas árvores estarem no centro do jardim (2:9; 3:3). O texto menciona que Eva contemplou a árvore e viu que “era boa” para se comer (Gn 3:6). A expressão “e viu… que era bom” é uma clara alusão à atividade criadora de Deus (ver 1:4, 10, 12, 18, etc.). Gênesis 3:6 ainda menciona que Eva comeu o fruto e “deu” (natan) a seu marido para que ele também “comesse” (’akhal). A ideia de “dar” para “comer” é mais uma referência à atividade criadora de Deus pois, em Gênesis 1:29, é o Senhor quem “dá” (natan) o “mantimento” (’akhlah) para os seres humanos. out-dez

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Esses paralelos parecem sugerir uma tentativa de Eva assumir indevidamente o lugar de Deus na narrativa. O mais interessante é que, ao tentar se tornar “como Deus” (3:6), Eva adotou a mesma postura da serpente (3:1; ver Is 14:12-15). Em resumo, Gênesis 3 mostra a verdadeira natureza do pecado: levar o ser humano a substituir a palavra de Deus pelo próprio desejo e inverter os papéis da aliança, de modo que o servo assuma as prerrogativas do senhor. Ao agir dessa maneira, o ser humano se torna igual à Satanás (o adversário) e passa a ser seu próprio deus. APOSTA FRACASSADA Após terem desobedecido ao Senhor e comido do fruto, Adão e Eva foram confrontados com as consequências de sua decisão. Como servos, eles podiam optar por ser fiéis ou não. O que eles não podiam controlar era o resultado de suas escolhas. O texto relata que, ao ouvirem a voz de Deus, eles perceberam que estavam nus e fizeram cintas de folhas de figueira para si (Gn 3:7). Após Adão e Eva terem sido influenciados pela “sagacidade” da serpente, a “nudez” deles, que era um símbolo de pureza, se tornou motivo de vergonha (comparar com Isaías 20:2, 4). Além de terem tentado solucionar seu erro com as próprias mãos, fazendo vestes de folhas de figueira, eles se esconderam de Deus. A Bíblia diz que o casal procurou refúgio “entre as árvores do jardim” (3:8). No original hebraico, porém, esse verso diz literalmente que eles se esconderam “no meio da árvore do jardim”. A expressão “no meio” (betokh) é a mesma utilizada para se referir à localização das árvores da vida e do conhecimento do bem e do mal. Curiosamente, a tradição judaica ensina que Adão e Eva se refugiaram na árvore da tentação (Abravanel, Sobre a Torá, Gênesis 3:8). Se considerarmos o fato de que, na cena seguinte, Deus Se encontra com o casal na presença da serpente (Gn 3:12-14), essa afirmação faz todo sentido. Isso quer dizer que, ao pecar, Adão e Eva se afastaram de Deus e se aproximaram moral e geograficamente da serpente. Na sequência, Adão tentou se justificar atribuindo sua falha à mulher que o Senhor lhe tinha dado (v. 12), e Eva se desculpou transferindo seu erro à serpente (v. 13). Em última instância, eles estavam responsabilizando Deus, o Criador da mulher e da serpente, pelo pecado que haviam cometido. Essa experiência nos revela que, embora seja mais fácil negar nossos erros e culpar os outros, nada está oculto aos olhos de Deus. Quando Deus Se colocou diante de Adão, Eva e a serpente, o jardim do Éden se transformou num tribunal. Visto que o casal havia sido infiel à aliança, ficou sujeito às maldições que acompanhavam a violação do pacto (v. 16-19; ver Dt 27:12-24). Avesso ao mal (Hc 1:13), o Senhor pronunciou Seu veredito sobre cada transgressor. Na esfera animal, a serpente foi condenada a rastejar sobre o ventre e a comer pó todos os dias de sua vida; na esfera espiritual, Satanás, que havia falado por intermédio da serpente, foi condenado a viver em inimizade com a mulher e a ser destruído pelo Descendente dela, isto é, 22 |

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Jesus (ver Gn 3:15; Sl 110; Hb 2:14; Ap 12:1-9). O texto também menciona que a “descendência” de Satanás estaria em constante conflito com o Descendente da mulher (Jo 8:44; ver 1Jo 3:10). A mulher, por sua vez, foi condenada a sofrer dores na gravidez e a ser governada pelo homem (Gn 3:16). No entanto, é importante lembrar que isso não fazia parte do plano original de Deus, pois Ele havia criado ambos, homem e mulher, iguais diante Dele (Gn 1:27). Logo, a maldição sobre a mulher não deve ser usada como uma desculpa para oprimi-la. Por último, Adão foi condenado a lavrar o solo com dificuldade. Devido ao pecado do homem, a terra se tornaria infértil; por isso, Adão teria que trabalhar arduamente para obter dela seu sustento. Mas o pior de tudo foi a última parte da sentença divina: “Porque tu és pó e ao pó tornarás” (Gn 3:19). Deus havia advertido o primeiro casal de que, se comessem o fruto proibido, morreriam (Gn 2:17), e a palavra do Senhor não falha. JOGADA DE MESTRE Quando o “jogo” parecia estar perdido por causa de uma escolha catastrófica dos participantes, Deus reverteu a situação. Conforme já observado, a violação da aliança requeria a morte dos transgressores. Ou seja, por terem perdido as fichas, Adão e Eva teriam que ser “eliminados” do jogo. O Senhor, porém, não permitiu que isso acontecesse. Ele assumiu a dívida dos participantes e deu novas fichas para que eles continuassem jogando. Mas como Deus fez isso? A resposta para essa pergunta está em Gênesis 3:21: o sacrifício substitutivo. Um animal teve que ser sacrificado para vestir Adão e Eva com peles (comparar com Lv 7:8). As vestes providenciadas pelo Senhor contrastavam diretamente com as cintas de folhas de figueira confeccionadas por eles mesmos (Gn 3:7). Isso mostra que o problema do pecado e das más escolhas humanas necessita de ajuda externa para ser solucionado. Ao encenar a maldição da aliança por meio de um sacrifício, Deus revelou Seu plano de redenção ao primeiro casal: Ele mesmo assumiria a culpa dos seres humanos e pagaria o preço da lei. Por isso Paulo afirmou: “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se Ele próprio maldição em nosso lugar” (Gl 3:13). Sendo “o Cordeiro de Deus” (Jo 1:29), Jesus assumiu o “castigo que nos traz a paz” (Is 53:5) e morreu por nós, cumprindo os requerimentos da transgressão de nossos primeiros pais. O brado de Cristo “está consumado!” (Jo 19:30) é a garantia da vitória dos seres humanos sobre a morte. Por mais que uma escolha errada de Adão e Eva tenha trazido maldição sobre toda a criação, Cristo, por meio de Seu sacrifício, providenciou uma solução para o problema do pecado (ver Rm 5:18, 19). Com uma “jogada de mestre”, Deus ofereceu e ainda oferece a cada ser humano a oportunidade de ser vitorioso na batalha contra o adversário (Tg 4:7). Portanto, para vencer o jogo do grande conflito entre o bem e o mal, basta seguir a orientação Daquele que dá as cartas e fazer a escolha correta (Dt 11:26-28).


POR MAIS QUE UMA ESCOLHA ERRADA DE ADÃO E EVA TENHA TRAZIDO MALDIÇÃO SOBRE TODA A CRIAÇÃO, CRISTO, POR MEIO DE SEU SACRIFÍCIO, PROVIDENCIOU UMA SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA DO PECADO

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Básica

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A aliança ou acordo entre Deus e Israel tinha muitas semelhanças com os contratos que são feitos hoje

BÊNÇÃOS E MALDIÇÕES O que você faria para ser abençoado por Deus? Pediria a intercessão de um líder espiritual? Participaria de cultos sobre um monte? A Bíblia nos conta a história de um homem que fez tudo isso: Balaque, o rei dos moabitas. Embora ele tenha se esforçado, não conseguiu obter a bênção divina; e, para piorar, seus inimigos é que a receberam. Depois que os israelitas saíram do Egito e pararam nas campinas de Moabe, Balaque temeu que acontecesse com seu povo o mesmo que havia ocorrido com os amorreus. Por isso, ele pediu ao profeta Balaão que amaldiçoasse Israel (Nm 22:6) por meio de dezenas de sacrifícios (Nm 23:1, 2, 14, 28-30), que foram oferecidos sobre montes sagrados (Nm 22:41). Apesar disso, o rei dos moabitas não conseguiu lançar uma praga contra seus inimigos. Balaque achava que podia abençoar e amaldiçoar as pessoas por meio da magia, ou seja, usando rituais para manipular as divindades. Porém, para desgosto do rei, as coisas não aconteceram como ele esperava. E por quê? Bênçãos e maldições na Bíblia aparecem no contexto da aliança entre Deus e Israel. Esse acordo tinha muitas semelhanças com os contratos que fazemos hoje: (1) apresentar as duas partes representadas no contrato e a relação entre elas (Dt 1:1–4:43); (2) a explicação sobre as obrigações de cada participante (Dt 4:44–7:11; 12:1–26:19); (3) os benefícios e penalidades para quem cumprir ou descumprir o contrato (Dt 27 e 28); (4) o consentimento dos participantes (Dt 30:15-20); e (5) a necessidade de o contrato se tornar público. Como não havia cartórios naquela época, os termos da aliança deveriam ser lidos diante de todo o povo (Dt 31:9-13). A Bíblia revela que as bênçãos e maldições eram, na verdade, o resultado da relação pactual entre Israel e Deus, e não o produto de mandingas e superstições. As bênçãos eram consequência da obediência, enquanto as maldições, da desobediência. Isso nos ensina que são nossas escolhas que determinam nosso destino. E ninguém pode decidir por nós. Fonte: Nosso Criador Redentor (Unaspress, 2016), de Hans K. LaRondelle.

Curiosa

Texto Ágatha Lemos

CORPO E MENTE Sabe aquela história de que você é o que come, vê e pensa? Então, isso não é exagero não! Apesar de ainda misteriosa, a relação entre o corpo e a mente tem sido cada vez mais estudada pelos cientistas. O que mais tem chamado a atenção é o impacto da alimentação na saúde mental. É isso mesmo! O cérebro e suas conexões podem ser prejudicados pelo que você leva à boca. Proteínas, gorduras boas, triptofano (aminoácido essencial), minerais como zinco e magnésio e as vitaminas do complexo B (B6, B9, B12) turbinam o cérebro. Você pode encontrar esses elementos em cereais (aveia, arroz integral), frutas (banana, ameixa-seca, abacate, manga), feijões (grãode-bico), legumes (beterraba, quiabo, abóbora), castanhas (amendoim, amêndoas, nozes) e sementes (chia, linhaça). Já os alimentos que contêm glutamato monossódico estão ligados à disfunção sexual, colesterol, diabetes, hipertensão e distúrbios de comportamento-hiperatividade, 24 |

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além de, em longo prazo, poder desenvolver doenças como esclerose lateral amiotrófica (ELA) e Mal de Alzheimer e Parkinson. Para tanto, evite os temperos artificiais e alimentos industrializados, principalmente os congelados e embutidos. Pesquisadores da Universidade de Loma Linda (EUA) também descobriram que há ligação entre a má alimentação e problemas como depressão, ansiedade e bipolaridade. E pasme! A saúde do intestino está intimamente relacionada aos pensamentos e emoções, porque eles têm 500 milhões de neurônios,

que produzem 90% de toda a serotonina do corpo. Esse neurotransmissor controla o apetite, o sono, o humor, a percepção de dor, além das funções neuroendócrinas e cognitivas. Por isso, vale a pena parar e pensar em como você está cuidando do seu corpo e sua mente. Fontes: Palloma de Almeida Soares Hocayen. Efeito da Administração Oral do Extrato de Baccharis dracunculifolia na Obesidade Induzida por Glutamato Monossódico (MSG). 2012. 108 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Biológicas). Universidade Estadual de Ponta Grossa (PR), (bit.ly/2S6UEUe); artigo “Mental health status and dietary intake among California adults: a populationbased survey”, em International Journal of Food Science and Nutrition, v. 70, 2019 (bit.ly/2BQVIEP); e revista Vida e Saúde, agosto de 2018, p. 9-13, matéria de Ivan Stabnov.

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Ponto de vista

Tudo ligado

Texto Bruno Flávio Carmo Lopes Imagem © 1STunningART | Adobe Stock

Texto Márcio Tonetti

DA DROMOCRACIA À FILANTROPIA Dromocracia

LIVRE-ARBÍTRIO Você se sentiria injustiçado se fosse a uma entrevista de emprego e descobrisse que a vaga já havia sido preenchida antes de o processo seletivo começar? Mas, se a empresa paga o salário, não seria justo ela escolher quem acha melhor? Esse dilema ilustra um debate cristão de milênios: somos livres para escolher o caminho da salvação (livre-arbítrio) ou é Deus quem decide quem vai se salvar (predestinação)?

Não

Hoje os principais defensores da predestinação são os seguidores da teologia de João Calvino (calvinistas), reformador protestante francês do século 16. Com base nas ideias de Agostinho de Hipona, teólogo cristão do século 4, Calvino acreditava que nascemos totalmente corrompidos e escravos do pecado (Sl 51:5; Ef 2:3). E se não fosse pela graça irresistível de Deus, seríamos incapazes de escolher o bem. Por isso, o Senhor predestina alguns para a salvação. A decisão Dele é soberana e unilateral, de modo que o salvo não é livre para abandonar a fé, nem o perdido é capaz de escolher a salvação.

Sim

Contrariando Agostinho, Pelágio, outro pensador do 4o século, acreditava que a crença na predestinação levava alguns a desistir de lutar contra o pecado, tendo em vista que seu próprio destino estaria definido, independentemente de como se vive. Ele e seus seguidores (pelagianos) argumentavam que o ser humano nasce bom, mas escolhe o mal por causa do exemplo e da educação. Para Pelágio, o que Deus exigia do ser humano era que ele escolhesse o caminho correto (Js 24:15; Gl 5:13), já que cada um é livre para rejeitar ou se render ao pecado.

Depende

Por sua vez, Jacó Armínio, um teólogo holandês do século 16, contemporâneo de Calvino, entendia que a ideia da predestinação era incompatível com a noção de um Deus amoroso. Para ele, se o Senhor escolheu quem iria se salvar, também teria decidido quem se perderia. Além disso, essa crença implicaria entender que Deus teria predestinado a queda de Adão e Eva (Gn 3). Os arminianos não discordavam apenas de Calvino e Agostinho quanto à predestinação, mas também de Pelágio em relação à bondade da natureza humana. Eles defendiam que o ser humano nasce totalmente corrompido (Rm 3:16) e incapaz de agradar a Deus por meio do seu esforço (Rm 8:3). Como resposta a essas duas teologias, tanto de Calvino/Agostinho quanto de Pelágio, Armínio demonstrou que Deus deseja que todos se salvem (1Tm 2:3 e 4; 2Pe 3:9). Portanto, Ele providenciou as condições para isso: (1) colocou inimizade entre o ser humano e Satanás (Gn 3:15), capacitando assim o pecador a aceitar ou rejeitar Cristo (Jo 12:41-48); e (2) enviou Jesus para pagar a dívida de toda a humanidade (Jo 3:16; Rm 6:23; 1Jo 2:2). Sendo assim, arminianos não acreditam que sejamos livres por natureza para escolher entre o bem e o mal, mas que fomos libertados a fim que essa opção fosse possível. Logo, com base na dívida já paga e no poder que já está disponível, cada ser humano pode aceitar ou rejeitar o plano divino de salvação. Fontes: Três livros do teólogo norte-americano Roger Olson: História da Teologia Cristã (Vida, 2001); Teologia Arminiana: Mitos e Realidade (Reflexão, 2013) e Contra o Calvinismo (Reflexão, 2013).

Não confunda com “democracia”. O termo deriva de dois radicais gregos: dromos, que quer dizer “veloz” (daí também vem a palavra autódromo) e kratia, que quer dizer “força”, “poder”, “governo”. Ou seja, a palavra dromocracia pode ser traduzida como “governo da velocidade” e alguns estudiosos a têm usado para definir a sociedade atual, dominada pela lógica do

Imediatismo Um modo de proceder centrado no agora, segundo a definição do dicionário Michaelis. Em outras palavras, uma pessoa imediatista tem dificuldade de esperar. Será que foi por isso que inventaram o cartão de crédito? Não resta dúvida de que essa cultura da ansiedade e impaciência tem sido bastante explorada pela

Publicidade Veio do latim publicus, que deu origem ao termo francês publicité. Inicialmente era restrito ao universo jurídico, sendo usado para se referir ao ato de tornar públicas as leis e sentenças. Porém, no século 19, adquiriu um significado exclusivamente comercial, determinando os padrões de consumo. Ela identifica e cria necessidades; mapeia e define tendências; convence, mas às vezes também entedia, embora a maioria não resista aos seus apelos. Em vez de ceder à tentação de gastar mais do que se possui ou de preencher “necessidades” que muitas vezes são irreais, seria bom que as pessoas fossem mais controladas e menos consumistas, e se dedicassem também à obra de

Filantropia Vem do termo grego philantropia, que quer dizer “amor pela humanidade”. Embora alguns não gostem dessa palavra por associá-la ao assistencialismo, certamente é uma virtude a ser exercitada. Devido à pressa e à correria, é possível que muitos tenham se esquecido de valores como o amor ao próximo e necessitem escolher uma vida menos centrada no imediatismo e nos bens, produtos, serviços e ideologias que o mercado publicitário quer vender. Fontes: dicionário Michaelis; Eloá Muniz, “Publicidade e propaganda origens históricas”, Caderno Universitário, no 148, Canoas, Ed. Ulbra, 2004; José Luiz Setúbal, “Os ricos doam pouco”, revista Veja, 29 de maio de 2019. out-dez

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Imagine

Texto Jessica Manfrim Ilustração © natbasil | Adobestock

... se não existisse

liberdade ESTADOS UNIDOS, 1839. O navio espanhol La Amistad é surpreendido por um motim de negros escravizados, originários de Serra Leoa, na África, quando estava indo para Cuba, onde a carga humana seria comercializada. Os negros mataram os tripulantes espanhóis, preservando apenas dois deles para que os guiassem de volta para casa. No entanto, os dois tripulantes sobreviventes levaram o navio para os Estados Unidos, onde a embarcação foi apreendida. Logo, uma disputa judicial se levantou envolvendo questões sobre liberdade, direito natural e civil. No centro do debate, residiam as perguntas: Aqueles ne-

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gros eram livres? Eles pertenciam à rainha da Espanha, aos tripulantes espanhóis, à Inglaterra que proibiu o tráfico negreiro internacional ou aos norte-americanos que apreenderam o navio? Eles deveriam ser condenados pelo assassinato da tripulação? A ideia de liberdade está intimamente ligada a seu oposto, a escravidão, tendo sido definida de diferentes formas e experimentada em níveis distintos ao longo da história e por diversos povos. Liberdade pode ser discutida num viés mais filosófico e abstrato, mas também ter sua presença ou ausência observada no dia a dia das pessoas. Afinal, o que é ser livre? E se não existisse a liberdade?

P g c N h a ( f C e d c a s

A o e l m q c s D l i c a n I

P c m r o p v d c e q t n o ç s


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SEM TRAÇOS DISTINTIVOS DO SER HUMANO

Para os antigos gregos e romanos, o escravo não era gente. Com o mesmo status dos animais, era tratado como objeto: o dono podia dispor dele como quisesse. Naquele contexto, a liberdade era uma questão de herança: pais livres geravam filhos livres. Por sua vez, alguém nascia ou se tornava escravo por causa de sua origem (nascimento), por ser espólio de guerra ou por ter que vender-se, a fim de pagar uma dívida ou superar a condição de fome ou pobreza. Com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada em agosto de 1798, durante a Revolução Francesa, houve um resgate do direito natural. A compreensão sobre esse direito tem que ver com a noção de que o ser humano nasce livre, seja porque Deus ou a natureza assim quiseram, e com o direito inato à vida, liberdade, segurança, propriedade e resistência contra a opressão.

2

SEM LIVRE-ARBÍTRIO, VONTADE OU PENSAMENTO PRÓPRIOS

A escravidão, a servidão medieval, as ditaduras e os governos absolutistas ou autoritários têm algo em comum: retiram a voz de seus dominados, seja limitando ou proibindo o exercício da escolha e a manifestação do livre pensamento. O que ocorre nesses contextos é que poucos pensam e decidem no lugar de muitos, geralmente uma classe usurpadora, violenta, poderosa, restrita e privilegiada. Nesse sentido, ao afirmar que os homens nascem livres, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi um marco, pois pontuou que liberdade de pensamento, expressão, crença e religião é um direito inato e irrevogável. Aldous Huxley, escritor de vários livros que descrevem futuros sombrios, dizia que o sistema de escravidão perfeito é aquele que aparenta ser democrático, mas nele as pessoas são prisioneiras de alguma condição, que faz com que não sonhem com a fuga. Isso ocorre porque o pensamento crítico é sufocado ou desestimulado.

3

SEM DIREITO DE IR, VIR, AGIR E TER

Para o direito romano, o cidadão era aquele que podia circular livremente, acionar tribunais e outros mecanismos de justiça e ter propriedades. Escravos não podiam recorrer à justiça, porque civilmente eram considerados objetos. Também não tinham direito a constituir família, pois seu proprietário podia desmembrá-la ao decidir vender separadamente seus membros, gerando assim um processo de dessocialização. Por sua vez, na Idade Média, o servo não podia ir contra seu senhor nem denunciá-lo por maus-tratos físicos, porque esse tinha a prerrogativa de governar, criar leis e julgar as pessoas que viviam sob sua jurisdição. Além disso, o servo estava preso à terra que cultivava, sem o direito de ir e vir, e sem a possibilidade de negociar a própria força de trabalho como desejasse. Nesse período, o isolamento dos feudos ajudou a manter o controle sobre a circulação de pessoas e de ideias, evitando que oposição, motins e revoltas se levantassem contra a ordem instaurada.

Estados Unidos, 1841. A Suprema Corte americana considera homens livres os negros do navio La Amistad. A justificativa: eles haviam sido capturados ilegalmente e não eram culpados de assassinato, pois agiram em defesa da própria liberdade. John Quincy Adams, então ex-presidente norteamericano e advogado de defesa no caso, usou o argumento do direito natural, que está acima da lei do Estado, para conseguir a libertação dos africanos. A luta pela liberdade é marcada por rebeliões, revoltas e revoluções. Por exemplo, o atual conceito de liberdade, que está fundamentado na autonomia individual (direito de ir e vir, de expressão, de comprar e vender, e dispor da força de trabalho) e na igualdade perante a lei, é herança da Revolução Francesa. A introdução da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão diz que o esquecimento, a ignorância a respeito dos direitos naturais e o desprezo por eles geram as desgraças públicas e a corrupção nos governos. O documento também afirma que todos os seres humanos, de todas as épocas e lugares, nascem livres e iguais (universalidade de direitos). O respeito a essas ideias e a separação dos três poderes (executivo, legislativo e judiciário) fazem parte da base da democracia. Há cerca de 70 anos, a experiência francesa inspirou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela ONU em 1948, logo após a Segunda Guerra Mundial, a fim de relembrar o direito à liberdade, paz e justiça para toda a humanidade.

Fontes: verbetes “Cidadania” e “Liberdade”, no Dicionário de Conceitos Históricos (Contexto, 2009), de Kalina Vanderlei Silva e Maciel Henrique Silva (p. 47-51; 262-266); verbete “Liberdade e servidão”, no Dicionário Temático do Ocidente Medieval, v. 2, p. 63-77 (Edusc, 2006), de Jacques Le Goff e Jean-Claude Schmitt; A Revolução Francesa Explicada à Minha Neta, p. 42-52 (Unesp, 2007), de Michel Vovelle; 1789: O Surgimento da Revolução Francesa, p. 213-225 (Paz e Terra, 1989), de Georges Lefebvre; Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789), disponível em bit.ly/1h6Elwi; Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948), disponível em bit.ly/2APIx5U; “O direito natural para o ordenamento jurídico”, artigo de William Pires Fernandes e Igor Vinícius Amaral Rezende no site jus.com.br (bit.ly/2Z8xxeD); Cinema, melodrama e história em Steven Spielberg: da representação dos traumas aos mitos fundadores, tese de doutorado de Fábio Luciano Francener Pinheiro (USP, 2018), disponível em bit.ly/2JXO9iT. out-dez

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Ação Mude seu mundo

Texto Ruben Santana Imagem Michael John von Hörsten

Lição de vida Aprenda Na cabeceira Guia de profissões

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O MÉDICO DOS

REFUGIADOS O jovem sulafricano que trocou altos salários em importantes corporações pelo trabalho voluntário entre aqueles que fugiram para sobreviver 28 |

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A CASA DELE ficava a menos de 8 km da praia, cercada de vegetação diversificada, lagos e da beleza típica da Rota Jardim, entre Port Elizabeth e a Cidade do Cabo, na África do Sul. Foi ali que nasceu MichaelJohn von Hörsten. Na sua infância, o pai foi convidado para trabalhar como pastor e a mãe como professora no Helderberg College, uma faculdade adventista localizada a uma hora de carro da Cidade do Cabo. Diferentemente de outros médicos ou pastores, ele não vivenciou nenhuma experiência dramática que o inspirasse a abraçar sua profissão. Criado num lar com forte senso missionário, a única certeza que tinha era de que precisava fazer algo significativo

na vida. Quando o irmão mais velho, Friedrich, começou a cursar Medicina, o caçula seguiu o mesmo caminho. Michael graduou-se em 2008 pela Universidade Stellenbosch, a 50km da Cidade do Cabo. Por ter feito estágio em hospitais rurais nas regiões mais pobres da África do Sul, Michael foi exposto, desde cedo em sua formação, aos desafios de saúde pública de um país em desenvolvimento. Logo depois de graduado, ele passou a trabalhar para uma grande corporação internacional, que o enviava para gerenciar clínicas de atendimento às companhias petrolíferas e de minério em áreas isoladas da África, sudeste da Ásia e Sul do Pacífico.

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PREPARO PARA A MUDANÇA Em 2014, Michael trabalhava na província de Gulf, em Papua-Nova Guiné. Certo dia, depois de uma consulta, um senhor comentou que o pai dele havia sido o líder da aldeia da ilha que ficava situada em frente à clínica e que, quando jovem, havia matado o primeiro homem branco que tinha tentado entrar ali. Enquanto aquele senhor falava, Michael pesquisou na internet sobre a história e chegou ao nome de James Chalmers. Membro da Sociedade Missionária de Londres, ele foi o primeiro a trabalhar na região, na segunda metade do século 19. Depois de servir por 24 anos entre os nativos do sul de Papua-Nova Guiné, foi morto e comido por canibais na Ilha de Goaribari, em 1901. Ele estava tratando o filho do homem que comeu o missionário escocês! No entanto, o que gerou mais reflexão em Michael foi que mais de um século depois, aquela região havia se pacificado muito com a presença cristã e adventista. ADVENTIST HELP Após quase um ano desse episódio, a carreira do jovem médico mudou radicalmente. Ele se ofereceu para trabalhar como voluntário no Hospital Adventista Scheer Memorial, a 30 km de Katmandu, capital do Nepal. A razão? O país, que é cortado pela cordilheira do Himalaia, havia sido o mais atingido em 25 de abril de 2015 pelo terremoto Gorkha, de magnitude 7,8 na escala Richter. No Nepal, o sismo matou quase 9 mil pessoas e feriu outras 22 mil. Por isso, foram organizadas clínicas temporárias abaixo do monte Everest. Conseguir chegar a comunidades como essas e prestar cuidados médicos foi uma experiência muito significativa para Michael e fez crescer em seu coração um desejo de fazer mais. No mesmo ano, ele se juntou à recém-formada organização Adventist Help, para atuar na ilha de Lesbos. A crise de refugiados no Oriente Médio tinha acabado de eclodir, com milhares de pessoas que fugiam da Síria, pegando pequenos barcos superlotados na Turquia para atravessar um perigoso canal marítimo até a Grécia. A equipe de atendimento improvisou uma unidade de emergência num ônibus,

de frente para a praia, exatamente onde milhares de pessoas chegavam diariamente. Todas as noites, dezenas de crianças e idosos doentes, sobreviventes de uma zona de guerra, eram tratados. Muitos deles não tinham acesso a assistência médica fazia anos. Michael se recorda com detalhes das crianças e bebês afogados que precisou reanimar em mesas de restaurantes improvisadas no porto. Ele conta, com fala ofegante e olhos arregalados, de suas lembranças sobre aquelas noites em que ouvia gritos na escuridão infinita, enquanto os barcos afundavam. Ali em Lesbos, Michael experimentou sensações ambivalentes: a angústia para atender quem chegava desesperado e fragilizado em terra firme e o alívio de estar no local certo e na hora certa. IRAQUE Desde então, o ministério Adventist Help ganhou mais força e visibilidade, e novos desafios logo foram estabelecidos. Em 2017 viria o grande passo de fé. Servindo como coordenador médico, ele ajudaria a estabelecer um hospital de campanha a 25 km de Mossul, no Iraque, quando o Estado Islâmico estava deixando algumas partes da cidade. Adventist Help, ADRA (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais) e ONU juntaram forças para atender às dezenas de milhares de pessoas que precisaram fugir de casa. Enquanto trabalhava na linha de frente do atendimento, dentro da cidade tomada, a um quilômetro do centro do conflito, Michael sentia o chão tremer durante os ataques aéreos. Para ele, ver de perto o que há de mais horrível numa guerra lhe mostrou quanto costumamos subestimar a paz e a segurança. DE VOLTA PARA A ÁFRICA Com o sucesso do Adventist Help também no Iraque, os líderes foram convidados pela ADRA Uganda a estudar a abertura de um hospital de campanha no oeste do país africano. Apesar de não estar em guerra, Uganda tem aproximadamente 50% do seu território de fronteira divididos com Sudão do Sul e República Democrática do Congo, dois países que apresentam as taxas mais elevadas de vio-

lência étnica do mundo, com inúmeros abusos aos direitos humanos. O resultado foi a fuga de 1,3 milhão de refugiados para Uganda, sobrecarregando os serviços de saúde do país. A base será no campo de refugiados Kyaka 2, a 70 km da fronteira com a República Democrática do Congo. Ali estão assentadas mais de 100 mil pessoas que precisam urgentemente de um hospital. A primeira fase do projeto, que estava prevista para agosto, consiste em estabelecer uma unidade de emergência e um ambulatório. Depois de tantas experiências, em vários momentos distintos de sua vida, Michael enfatiza que todas as fases pelas quais passou o prepararam para abraçar a causa humanitária do Adventist Help. Ele revela ainda que o ministério é mantido exclusivamente com doações e a atuação de voluntários. “Temos mais de 150 médicos voluntários de todo o mundo participando de nossos projetos. Queremos realmente fornecer atendimento de alta qualidade com o menor custo possível para as comunidades vulneráveis em áreas de crise”, Michael resume a visão que está por trás do Adventist Help. Ainda que ocupe o cargo simbólico de vice-presidente na organização, Michael também é voluntário. Durante alguns meses do ano, ele trabalha para uma companhia privada e assim se mantém durante o tempo que passa servindo entre os refugiados. O voluntariado é tão importante para ele, que sua vida foi reorganizada em torno desse objetivo. “Não viajo com muita bagagem, porque passo no campo a maior parte do meu tempo. Hoje me considero mais rico do que quando trabalhava somente para as empresas privadas”, garante. Um de seus maiores sonhos é que o ministério Adventist Help consiga fortalecer ainda mais o foco médico-humanitário do serviço prestado pela Igreja Adventista na regiões em crise. Para saber mais adventisthelp.org

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Lição de vida

Texto Thamires Mattos Ilustração Joseilton Gomes

Treinado pelo

MESTRE HOLLYWOOD É DAQUELES lugares sobre os quais costumamos ter uma imagem bem definida: megaproduções cinematográficas, muita grana circulando, gente bonita, glamour e power couples. No entanto, por trás dessa fachada, existe muito trabalho e uma pressão intensa para se assumir certos comportamentos. Quem conta isso é o produtor DeVon Franklin, que trabalha por lá há quase 20 anos. Enquanto cursava Administração e Cinema na Universidade do Sul da Califórnia, ele foi contratado como estagiário pela Overbrook Entertainment, companhia de produção de Will Smith. Em 2000, após a formatura, aceitou uma posição permanente na empresa. Depois, trabalhou para a Metro Goldwyn Mayer – aquela produtora que abre seus filmes com um leão rugindo – e com a prestigiada Columbia Pictures. Na época, ele ficou intensamente envolvido em projetos como a série Um Maluco no Pedaço e os filmes Hancock, Sete Vidas, À Procura da Felicidade, Karate Kid, A Pantera Cor de Rosa 2 e O Céu é de Verdade. Desde 2014, DeVon atua como presidente de sua própria produtora: a Franklin Entertainment. OLHAR PARA DENTRO DE SI Contudo, ele percebeu que todo esse sucesso não é suficiente para trazer satisfação completa. Em meio aos escândalos de abuso sexual envolvendo astros e produtores de Hollywood, além da realização de campanhas contra comportamentos sexistas nessa indústria, como o movimento #MeToo e a organização Time’s Up, a memória do produtor foi despertada – e ele abriu os olhos para problemas que enfrenta desde a infância. Educado num lar cristão, seus conceitos sobre moralidade sempre foram bem firmados. Amor, respeito e cuidado eram os exemplos dados por sua mãe, suas tias, seus avós e um tio, pastor adventista. 30 |

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Executivo cristão de sucesso em Hollywood fala sobre impulsos destrutivos e explica que o autocontrole faz parte da masculinidade responsável

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No entanto, seu pai não era sua referência. Os pais de DeVon tiveram um casamento conturbado e se separaram quando ele e seus dois irmãos ainda eram crianças. Anos depois, DeVon descobriria a razão da separação: seu pai havia tido um caso extraconjugal com outra mulher da família. Há quem diga que todo “homem é cachorro”. E, apesar de também ter tido contato com boas referências masculinas na sua família, a decepção com o próprio pai levou DeVon a acreditar no ditado popular. Enquanto crescia, ele não conseguia fugir do padrão imoral adotado por tantos homens. Os valores de respeito, cuidado e amor que havia aprendido, passaram a dar lugar à luxúria. E engana-se quem pensa que essa inclinação se refere apenas à promiscuidade sexual. Ela tem que ver com a vida como um todo. “Luxúria é um impulso egoísta esmagador direcionado para a realização a qualquer preço, seja sexual, financeira ou profissional”, define DeVon em seu livro The Truth About Men: What Men and Women Need to Know (A Verdade Sobre os Homens: o que Homens e Mulheres Precisam Saber, em tradução livre), lançado em fevereiro. Na obra, o autor retrata sua experiência como um homem em posição de poder na indústria cinematográfica, que busca agir não pelo impulso, mas com base no autocontrole. Com uma linguagem franca e informal, DeVon educa sem atacar e evidencia as vantagens de uma vida “adestrada” pelo Mestre Jesus Cristo. A obra é um alerta aos homens, crescidos ou ainda em formação, sobre a importância de se repensar a noção mainstream de masculinidade. Para as mulheres, por sua vez, DeVon dá dicas de como ajudar homens irresponsáveis, e, de tempos em tempos, fugir deles. TREINAR A SI MESMO Embora o produtor defenda a ideia de que todo homem tem algo intrinsicamente indomado dentro de si, isso não é, de forma alguma, desculpa para a imoralidade e comportamentos repulsivos como assédio e abuso sexual. Afinal, existe distância entre o desejo e a ação. No entanto, o homem que não “treina”

seu autocontrole está mais propenso a prejudicar outras pessoas e a si mesmo. É assustador, por exemplo, saber que, desde 1998, 17,7 milhões de mulheres registraram ocorrências de estupro nos Estados Unidos. Apesar de inaceitáveis, os dados trazidos pelo Departamento de Justiça do país representam somente uma parcela do problema, tendo em vista que muitas vítimas silenciam por causa de vergonha, culpa ou ameaça. O ponto é que toda a sociedade sofre com esse drama: as mulheres porque se sentem ameaçadas e os homens porque se veem pressionados. DeVon conta que começou um processo de autodescobrimento de sua masculinidade. Embora o respeito para com as mulheres estivesse estabelecido em seu caráter, não sentia que era o melhor marido e filho possível. A luxúria colocava obstáculos à sua existência plena. E, após buscar respostas na Bíblia e com profissionais respeitados, o executivo chegou à conclusão de que há esperança. Afinal, nem só de desejo escravizador vive o homem. Dentro de todos nós existe uma semente de amor: resquício da semelhança com Deus, que a humanidade não perdeu de todo (Gn 3:15; Rm 2:14, 15). E o poder de Deus, fortalecendo a vontade humana, é capaz de domar todos os “animais” que possam existir dentro de nós (Fp 2:13). A submissão ao treinamento do Mestre (1Co 9:27) nos ajuda a alcançar segurança e liberdade, pois a impaciência e a insatisfação dão lugar para a mansidão e o contentamento. Para tanto, é preciso reconhecer que suas inclinações estarão sempre dento de você e que poderão destruí-lo a qualquer momento, caso não vigie. Como escreveu o apóstolo Paulo: “Aquele, pois, que pensa estar em pé, veja que não caia” (1Co 10:12, NTLH). VIDA EQUILIBRADA Segundo DeVon, uma vida completa é resultado do equilíbrio entre prazer, responsabilidade e sacrifício. A busca incessante pelo prazer deve ser vencida, mas se engana quem acredita que responsabilidade e sacrifício, em si mesmos, não trazem problemas. Muitos homens reprimem seus desejos. E isso não funciona. É preciso canalizar a energia desses impulsos incorretos para atitudes saudáveis. O executivo oferece algumas dicas práticas:

1 Respire fundo. Conte até dez e pense antes de reagir. É melhor esperar o pico de adrenalina passar para então tomar uma decisão.

2 Ore. Ser um bom homem (ou boa

mulher) depende do quanto você se submete ao Mestre. O contato com Deus lhe dará força para identificar e superar seus desejos destrutivos.

3

Olhe para o futuro. Será que valeria a pena arriscar tudo o que você tem hoje por uma gratificação momentânea?

4 Exercite seu lado criativo. Use suas

potencialidades para fazer algo que valha a pena. Desenvolva um projeto, seja de escrita, pintura, em vídeo, por meio de design ou qualquer outro hobby culturalmente enriquecedor.

5 Faça exercícios. Isso gasta energia,

faz bem para a saúde, areja a cabeça e melhora a autoconfiança.

6 Ajuste sua visão sobre sexo. Há um

debate se ele é mais do que um desejo, uma necessidade. Porém, ninguém morre por falta de sexo. As necessidades estão em outro patamar.

7 Espere a pessoa e a hora certa.

DeVon e sua esposa, a atriz Meagan Good, já falaram sobre isso no livro The Wait (A Espera, em tradução livre). Eles se abstiveram de relações sexuais até o casamento, e isso trouxe uma união mais forte e estável para eles. O executivo também confessa que a decisão de exercitar autocontrole e paciência o preparou para o sucesso profissional.

Após tantas lições, DeVon Franklin mostra que, mais do que nunca, o mundo precisa de homens (e mulheres!) que assumam a responsabilidade por seus atos (incluindo seus erros). Para tanto, é preciso reconhecer que há um “cachorro” dentro de você que precisa ser adestrado segundo as técnicas do Mestre. Afinal, “melhor é o homem paciente do que o guerreiro, mais vale controlar o seu espírito do que conquistar uma cidade” (Pv 16:32). Para saber mais

Veja o perfil do DeVon (bit.ly/2LCI9iT) e a entrevista dele (bit.ly/2K2aKL8) que a Conexão 2.0 publicou em 2013 a respeito de integridade e sucesso profissional.

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Aprenda

Texto Nádia Teixeira Imagem © gpointstudio | Adobe Stock

A escolher sua profissão JÁ DEFINIU QUAL carreira seguirá? Sim? Não? Essa escolha costuma ser difícil para muita gente, pois envolve uma decisão que poderá acompanhar você por muitos anos, talvez a vida toda. Escolher algo que lhe traga realização, senso de utilidade e boa remuneração seria o ideal. Porém, nem sempre é possível conciliar tudo isso no primeiro momento. Para fazer uma escolha mais certeira, é bom se munir de informações, procurar conhecer a si mesmo, conversar com profissionais das áreas que lhe interessam e, se possível, vivenciar um pouco dessa carreira. Separei a seguir cinco dicas para você. Depois me diga se elas o ajudaram. Vamos lá.

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AUTOCONHECIMENTO

2

TESTES VOCACIONAIS

Cinco questões podem auxiliar nessa jornada: (1) Quem é você? (2) O que o faz feliz? (3) O que dizem sobre você? (4) Qual é sua história? e (5) Que marca você está deixando? Se quiser fazer um curso de autoconhecimento on-line e gratuito, acesse este site mudanca.estudar.org.br/autoconhecimento-online.

Eles não são exatos, mas podem ajudar e servem para avaliar mais de uma fase da vida, pois a gente muda enquanto amadurece. Vários exames estão disponíveis gratuitamente na internet e há também em muitos colégios adventistas o serviço de orientação educacional, que costuma aplicar esses testes e oferecer oportunidades de contato com profissionais de diversas áreas.

3

PREFERÊNCIAS X OPORTUNIDADES

4

PRÓS E CONTRAS

5

PESQUISE SOBRE A CARREIRA ESCOLHIDA

Verifique se suas preferências pessoais estão em alta no mercado de trabalho da sua região ou de onde pretende trabalhar. Talvez você gostaria muito de atuar num restaurante vegetariano (nutrição ou gastronomia) ou investir numa loja de produtos naturais (administração), mas no seu entorno o que pode estar aquecido é o mercado imobiliário (arquitetura ou engenharia civil). Por isso, é preciso pesar os prós e contras de preferências e oportunidades. Seguindo a dica anterior, talvez você precise optar por um curso que lhe traga um retorno financeiro mais rápido para que depois invista na área de estudos dos seus sonhos. Ou você pode escolher pela sua carreira preferida, desde que esteja disposto a esperar mais por retorno financeiro. Na minha formação inicial, comecei simultaneamente enfermagem e pedagogia. A carreira de saúde me ofereceria uma renda maior a curto prazo, enquanto a área de educação me permitiria estudar e trabalhar, com a possibilidade de estabilidade financeira no futuro. Escolhi a segunda opção e estou super realizada.

Com base no resultado do teste vocacional, você terá um perfil desenhado. Com ele, você poderá olhar com mais atenção as carreiras que lhe interessam. Pesquise a matriz curricular de cursos que se relacionam com você. Frequente eventos e converse com profissionais dessa área de interesse. Pesquise sobre cargos, salários e áreas de atuação dessa carreira. Tudo isso vai ajudar a limitar as opções. O mais importante é que você ponha os pés no chão (realidade), mas não deixe de ter a cabeça nas nuvens (sonho). Afinal, provavelmente você passará as melhores horas do dia e os melhores anos da vida na carreira que escolheu. Fontes: sites guiadacarreira.com.br, infoescola.com e estudarfora.org.br.

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Na cabeceira

Texto Rebbeca Ricarte Design Renan Martin

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O preço da fé

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Trechos

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“Ele não era sábio, nem rico, nem influente na comunidade. Ninguém na rua poderia dizer que ele era um homem de sucesso. Disso ele tinha certeza. Por causa de sua determinação em guardar o sábado, ele havia perdido o emprego, a esposa e o filho em um único dia” (p. 32). “Ele estava com dor por causa das feridas feitas pelas algemas em seus pulsos, e os roncos de seu estômago vazio o incomodavam. Mas aquele era o lugar em que Deus queria que ele ficasse, e isso era o suficiente para Chen” (p. 107). “Mal sabia Chen do bem que ele havia feito por seus companheiros de prisão. Tempos difíceis foram superados por um cristão fiel que se atreveu a defender suas convicções, e então, de uma forma simples, aqueles homens compreenderam o testemunho também” (p. 124).

NO PLANO DE fundo, os efeitos da Primeira e Segunda Guerra Mundial na Ásia erguem o governo comunista de Mao Tsé-Tung, trazendo anos de perseguição e escuridão para os cristãos na China. As políticas austeras do ditador não apenas fecharam as portas das igrejas, mas oprimiram qualquer motivação à prática religiosa, mesmo que se tratasse de uma simples oração. A guarda do sábado era algo totalmente fora de questão, e os adventistas do sétimo dia foram duramente marginalizados, punidos e humilhados. Em Perseguido na China (CPB, 2019, 183 p.), Bradley Booth relata a saga verídica de um dos personagens reais desse enredo sangrento da história do século 20. A narrativa é protagonizada pelo jovem Chen, e começa na cidade de Xangai, onde ele aprendeu a desenvolver sua fé ministrando estudos bíblicos e comercializando livros religiosos de porta em porta. Mais tarde, ao se casar e ter um filho, ele se viu diante do seu primeiro dilema: seguir os mandamentos de Deus ou se separar da família que constituiu? Para tomar essa difícil decisão, Chen tomou como base os valores que aprendeu desde criança, e escolheu trilhar o caminho mais árduo para um jovem em sua época. Na igreja, ele encontrou sua casa, e na tradução de livros proféticos, um vislumbre do chamado de Deus para exercer um ministério. Com a prisão de líderes religiosos, a trama desse personagem é ampliada para uma narrativa que não deixa fôlego para qualquer tipo de sossego. Sem família, emprego, comida e dinheiro, ele encontrou abrigo em uma região longínqua do país, a pequena cidade de Wu Xi.

Foi nesse local que Chen descobriu sua verdadeira vocação, e começou a influenciar outras pessoas, desde aquelas que estavam mais predispostas ao evangelho até monges idosos que precisaram repensar seus paradigmas. Mas foi também em Wu Xi que o jovem missionário chegou ao fundo do poço, por não negociar sua fé. As experiências e provações que Chen enfrentou em nome de suas crenças são narradas de maneira direta, não poupando detalhes ao seu sofrimento. Perseguido na China é uma leitura inspiradora para quem recebeu as boas-novas do evangelho e entende que não pode deixar de compartilhá-las, seja em circunstâncias favoráveis ou adversas. Mas também é motivo de inspiração para quem ainda não achou o caminho de fé que deve seguir. O livro pode ser crucial para se tomar a decisão mais importante da vida. out-dez

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Guia de profissões

Texto Mairon Hothon Ilustração © colorfulworld | Adobe Stock

DIREITO Saiba mais sobre a carreira que estuda o funcionamento jurídico da sociedade e pode propor mudanças estruturais nela

PERFIL DO PROFISSIONAL

É preciso que o aluno tenha um forte hábito de leitura, a fim de que desenvolva pensamento crítico e habilidades de comunicação, entre outras competências necessárias para o dia a dia. O curso tem a função principal de tornar seus estudantes analistas sociais, que desejem transformar o meio em que vivem.

MATRIZ CURRICULAR

No primeiro ano do curso, o aluno estuda as disciplinas introdutórias que procuram compreender a sociedade. E a partir do segundo ano, ele tem contato com as mais diversas áreas do Direito: civil, penal, tributária, econômica, trabalhista, previdenciária, ambiental, constitucional, internacional, digital, eleitoral e até a disciplina de bioética.

ÁREAS DE ATUAÇÃO

Existem várias possibilidades. Quem deseja seguir carreira acadêmica, precisa continuar estudando em nível de stricto sensu, a fim de trabalhar como pesquisador ou professor universitário. Para atuar em funções técnicas, como escrevente, cartorário ou investigador de polícia, não é necessária a aprovação no exame da OAB, apenas em concurso público. Porém, para seguir carreira jurídica, o candidato precisa ter o registro da OAB, acumular pelo menos três anos de experiência como advogado e prestar concurso público para delegado de polícia, juiz, defensor público, promotor de justiça, procurador, entre outros cargos.

OAB

EM TEMPOS DE operação Lava Jato e de grande visibilidade do poder judiciário, a tradicional carreira do Direito está em alta. Para se ter uma ideia, no Brasil existem 1,4 mil faculdades de Direito e 800 mil advogados. Apesar de parecer saturado, ainda existe espaço para bons profissionais. Considerada uma ciência social aplicada, em sua essência, essa área do conhecimento estuda como as sociedades se organizam a partir das leis. Saiba mais. ONDE ESTUDAR

Quem deseja ser advogado, além de estudar a graduação em cinco anos, precisa passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), um comitê de classe da categoria que outorga ao bacharel o poder de advogar. A prova, que é dividida em duas fases e pode ser realizada a partir do 9o semestre do curso, costuma reprovar 85% dos seus candidatos. Para reverter isso, o Unasp, campus Engenheiro Coelho, criou um programa de preparação dos seus alunos desde o primeiro período, que inclui a realização de simulados, aulas de revisão de conteúdo e acompanhamento do estudante no dia do exame. Como resultado, somente neste ano, a taxa de aprovação de alunos da instituição foi de 45%.

SALÁRIO

Em São Paulo, um advogado começa sua carreira ganhando em média R$ 3.000,00. Contudo, esse valor aumenta de acordo com a experiência do profissional e complexidade dos casos que acompanha. As carreiras públicas, por sua vez, nas quais se ingressa por meio de concurso, oferecem estabilidade e bons salários. Um delegado civil ganha em média R$ 15.000,00 e um procurador do Trabalho em torno de R$ 25.000,00.

Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp) São Paulo / Engenheiro Coelho / Hortolândia – 120 vagas em cada campus Nota 5 (reconhecido) R$ 1.242,80 (curso) / R$ 2.951,00 (curso + internato) Manhã e noite, dez semestres unasp.br/cursos

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Fontes: Filipe Piazzi, doutorando em Direito Político e Econômico e coordenador da Faculdade de Direito do Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP), e os sites guiadacarreira. com.br e cnj.jus.br.


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ESCO LHA DECLARE SUA

ANTE AO CONFLITO

#DECLARE


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