Página UM 104

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TAMIRIS NEVES

EDUCAÇÃO

NOTAS DAS ESCOLAS PARTICULARES NO ENEM SÃO 50% SUPERIORES ÀS DA REDE PÚBLICA 13 Ano XX | Número 104 Distribuição Gratuita

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes paginaum@umc.br Fale conosco: /paginaumc TAÍS MORENO

AGRICULTURA

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FORMAÇÃO TÉCNICA PARA AGRICULTURA FAMILIAR É INSUFICIENTE Embora o setor responda por 70% dos alimentos que chegam às casas dos brasileiros, praticamente não há incentivo à formação profissional. Boa parte dos agricultores não tem acesso a informações sobre as melhores práticas para o cultivo de hortifrutigranjeiros. Cícero Antônio da Silva, 46, cultiva uma horta em Arujá juntamente com a família há 25 anos

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CIDADANIA

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PROJETO PROCURA CONSCIENTIZAR JOVENS SOBRE IMPORTÂNCIA DA POLÍTICA LARISSA BATALHA

Projeto que prepara adolescentes para o mercado de trabalho inclui disciplina Voto Consciente, sobre importância da política.

MEIO AMBIENTE

DESCARTE IRREGULAR DE LIXO REFLETE FALTA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL FÁBIO PALODETTE

Na cidade há cerca de 20 pontos de descarte irregular. Educação das crianças pode gerar nova mentalidade.


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OPINIÃO

2018 | Ano XX | Nº 104

artigo

editorial

Educação para uma nova realidade O tema proposto para esta edição 104 do Página UM é Educação para uma nova realidade. Mas o que seria essa nova realidade? De que forma vivenciamos o novo e o que justificaria reflexão sobre o assunto? Se experimentamos de fato necessidades que nos surpreendem a cada dia, em que sentido essas se diferenciam daquelas que já conhecíamos? A onipresença da tecnologia em nossas vidas é um dos fatores mais impactantes deste século 21. O mundo digital invadiu todas as formas de atividade humana. Da agricultura aos cuidados com a saúde, dos setores administrativos aos processos de formação acadêmica, da estruturação familiar às novas formas de relacionamento, da indústria ao comércio, da comunicação ao mercado financeiro, tudo funciona na base dos gigabytes, em velocidade vertiginosa. E como ficamos nós seres humanos com nossa essência primeva, nossa psique primordial, nossas buscas internas? Adaptar-se à nova era é fundamental. Entender que profissões desaparecem enquanto outras surgem é imprescindível. Compreender que métodos e procedimentos se transformam a cada instante e exigem constante atualização é indispensável. Saber que quanto mais pessoas habitam o planeta mais se acirra a competição é imperioso. Discutir sobre o futuro próximo é importante, é vital. Só não é obrigatório desconstruir a ética, a moral e os valores humanitários erigidos no decorrer da História, com muito labor e conhecimento.

crônica

Falta ensino superior público no Alto Tietê Patrícia Schafer Para os moradores da região, a inexistência de bacharelado em instituições públicas de ensino superior é um empecilho para quem não se dispõe a pagar pelo ensino privado. Há instituições públicas, como as FATECs de Itaquaquecetuba e de Mogi das Cruzes, e o IFSP (Instituto Federal de São Paulo) de Suzano. No entanto, o foco destas instituições são cursos tecnólogos. O IFSP oferece licenciatura em Química, além dos tecnólogos. Levantamento do IBGE em 2015 mostra que 24% dos moradores do Alto Tietê trabalham ou estudam fora, gerando um deslocamento diário de mais de um milhão de pessoas. Em Poá, dos

Educação para quê? Daniela Gomes

106.013 habitantes, 41.792 trabalham ou estudam fora da região. As universidades públicas mais próximas são o campus da USP Leste, cujo acesso é provido pela linha 12- Safira da CPTM, e o da UNIFESP, em Guarulhos. A presença de universidades federais e estaduais numa zona que tende a ser incorporada pela metrópole de São Paulo pode ser benéfica para a região. Em 2012, Mogi das Cruzes, Poá, Itaquaquecetuba, Ferraz de Vasconcelos e Suzano estavam entre as 100 cidades do estado que mais geravam empregos. Investimento em políticas públicas de incentivo à criação de centros universitários poderia contribuir com o desenvolvimento socioeconômico dos indicadores dessas cidades. SIMONE LEONE

Estudantes de 5º e 6º semestres do curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) vivenciaram, no fim de maio, as rotinas de “fechamento” de um jornal impresso. Sob a supervisão dos professores Elizeu Silva, Sérsi Bardari, Simone Leone e Fábio Aguiar, a turma se reuniu num sábado de manhã e colocou as mãos na massa, ou melhor, nos textos, para deixar a edição “redonda”. A experiência, pela segunda vez, complementou o aprendizado teórico e prático das aulas.

Quem nunca cruzou com um mal-educado, uma mal-educada por aí? Seja no transporte público ou no trânsito, todos os dias, situações em que a falta de educação aparece são recorrentes. E posso citar várias aqui. Tem o mal-educado que ao conseguir um lugar para sentar no trem, metrô ou ônibus, magicamente dorme ao embarcar um idoso, uma grávida ou qualquer outra pessoa que tem direito ao assento garantido por lei. A vida é bastante corrida e estamos sempre muito cansados, não é mesmo? Também tem aquele mal-educado que adora estacionar nas vagas preferenciais. É mais cômodo e só vai levar um minutinho. Que mal tem? Faixa de pedestre? Para alguns é só enfeite. E não falo só dos motoristas mal-educados que odeiam esperar alguns segundos, não. Tem muito mal-educado por aí que corre na rua em meio dos carros como se não houvesse amanhã. Se der tempo, não tem problema, certo? Ah! Ainda tem o mal-educado que sempre fura fila. Afinal, não faz mal a ninguém usar o famoso “jeitinho brasileiro”, concorda? E o mal-educado que ama “elogiar” fazendo “fiu-fiu”? Claro, aquela mulher andando na rua é tão linda! Quem sabe ouvindo um “fiu-fiu”, talvez ela te note? E se educação vem de casa, o que dizer quando os mal-educados são adultos, marmanjas de salto alto e marmanjos de barba na cara? Se esse tipo de educação deveria vir de casa, com quantos mal-educados e mal-educadas ainda iremos cruzar? Se há tantos mal-educados assim por aí, o que o futuro nos reserva?

PRODUÇÃO

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Jornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) Ano XX – Nº 104 Fechamento: 12/junho/2018

O jornal-laboratório Página UM é uma produção de alunos do curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), em conformidade com o Projeto Pedagógico do curso. Esta edição foi produzida por alunos do 5º e 6º períodos. *Conteúdos refletem tão somente a opinião dos autores que os assinam, não correspondendo necessariamente à opinião da Universidade ou do Curso de Jornalismo.

Professores Orientadores: Prof. Elizeu Silva – MTb 21.072-SP (Orientação geral, Edição e Planejamento Gráfico) | Profª. Simone Leone – MTb 399.971-SP (Pautas e Edição de Textos) | Prof. Sérsi Bardari - MTb 20.256-SP (Pautas e Edição de Textos) | Prof. Fábio Aguiar (Fotografias) Equipe de Fechamento: 5ºA: Bianca Schmidt | Marcos Lima | Mirely Teles 5ºB: Daniela Souza | Fábio Palodette | Ingrid Mariano | Isabelle Correa | Melissa Roberta Projeto Gráfico: Alunos do curso de Design Gráfico da UMC, sob orientação do Prof. Fábio Bortoloto: Rafael Alves de Oliveira | Gilmar Amaral Lamberti Rafael Marques dos Santos | Daniel Miranda Ribeiro

Chanceler: Prof. Manoel Bezerra de Melo Reitora: Profª. Regina Coeli Bezerra de Melo Pró-Reitor de Graduação do Campus (sede): Prof. Cláudio José Freixeiro Alves de Brito Pró-Reitor Acadêmico – Campus Fora de Sede – Villa Lobos/Lapa: Prof. Ariovaldo Folino Júnior Diretor de EaD: Prof. Ariovaldo Folino Junior Diretor de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão: Prof. Cláudio José Freixeiro Alves de Brito Diretor Administrativo: Luiz Carlos Jorge de Oliveira Leite Gestor dos Cursos de Design Gráfico e Jornalismo: Prof. Esp. André Luiz Dal Bello

Avenida Doutor Cândido Xavier de Almeida Souza, 200 – CEP: 08780-911 – Mogi das Cruzes – SP | Tel.: (11) 4798-7000 E-mail: paginaum@umc.br


CIDADANIA

Nº 104 | Ano XX | 2018

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Jovens esperam futuro melhor com educação política Iniciativas isoladas procuram informar adolescentes sobre a importância da política para a sociedade FOTOS: LARISSA BATALHA

Apenas 1,33% dos eleitores tem menos de 18 anos, revela TSE AMANDA PAULO

A estudante Mariana Carolina de Siqueira Santana tirou o título esse ano

Amanda Paulo

Solenidade na Câmara de Suzano. Para o professor Carlos Cardoso (embaixo), faltam projetos de longo prazo

Larissa Batalha

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total de eleitores o Alto Tietê chegou a 1.135.885 em março deste ano, conforme o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desses, 0,80% são jovens na faixa etária de 16 a 17 anos, aptos a votar nas eleições de 2018. Embora o número total de eleitores tenha crescido em 1%, a participação de adolescentes nas eleições é cada vez menor. Artur Chagas, psicólogo, explica que isso talvez ocorra pelo fato do sistema educacional não trabalhar o tema com os alunos. Instituições de ensino podem exercer um papel fundamental na educar política sem viés partidário, esclarecendo sobre o funcionamento das democracias representativas. Segundo Carlos Roberto Cardoso, mestre em Ciências Sociais e professor da Universidade de Mogi (UMC), o que se tem hoje são ações paliativas. “Algumas instituições oferecem conteúdos de educação política, mas não há um projeto nacional nesse sentido. Ajudaria muito se houvesse um

projeto pensado para o futuro, para daqui a 20 ou 30 anos”. Em Suzano, um projeto idealizado pela Guarda Mirim, dedicado à preparação de jovens para o mercado de trabalho, inclui a disciplina Voto Consciente através da qual os alunos aprendem sobre a importância da política para a sociedade. “Convidamos um cientista político para apresentar uma palestra sobre a importância do voto. Depois os alunos simulam um processo eleitoral”, explica Alessandra Vitorino, assistente social da Instituição. Organizados em equipes, os alunos simulam a atuação do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), fazem pesquisas para seguir à risca os trâmites eleitorais, constituem partidos e criam campanhas políticas. André Souza, 16, que participou do projeto em 2017, aprendeu que os candidatos precisam apresentar propostas coerentes com as necessidades da população. “Às vezes a gente acha que é muito fácil, mas é preciso estudar as leis e ter boas propostas”, afirma. “A educação política se faz ne-

cessária no cenário atual, principalmente se queremos mudanças para o futuro”, afirma Jacira Silva, professora de História e Geografia. Para a Nathali Caroline, a política é a base da democracia. “Tem a ver com o dia-a-dia da gente”. Na contramão, é possível ver a crescente onda de movimentos contrários à educação política, como o projeto Escola Sem Partido encabeçado pelo MBL (Movimento Brasil Livre), que visa limitar a atuação dos professores em sala de aula.

A partir dos 16 anos os jovens já podem tirar o título de eleitor, mas apenas 1.953.553 pessoas na faixa etária entre 16 e 17 anos votaram nas eleições de 2016, revela o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Considerando que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem cerca de 6,8 milhões de jovens com idade entre 16 e 17 anos, apenas 28% desses jovens participam do processo eleitoral. Em relação ao total de eleitores do país, eles representam apenas 1,33%. As manifestações populares nos últimos anos mostraram que a população brasileira tem se interessado mais por política, mas a falta de conhecimento sobre esse tema também ficou evidente, o que pode ser reflexo de problemas na educação básica. Um estudo realizado pelo TSE revelou que a maioria dos jovens não se aprofunda em política. Alguns seguem os candidatos que os familiares escolheram ou os mais bem posicionados nas pesquisas eleitorais. Ainda segundo pesquisa de informação e estratégia realizada em 2017 pela empresa Opinião Consultoria e divulgada pelo TSE, os jovens entre 16 e 17 anos encaram o voto como algo que não al-

tera a realidade, por não conseguirem ver resultados concretos depois das eleições. Para o professor de Filosofia da educação básica, Gilson dos Santos, o debate político é fundamental principalmente na adolescência, pois contribui para a formação do cidadãos conscientes de como funciona o contexto da sociedade. Os posicionamentos intransigentes e a falta de cultura política dos alunos estão entre os príncipais desafios para levar o debate político para a sala de aula, comenta o professor. Em Mogi das Cruzes, 6.650 jovens entre 16 e 17 anos já tiraram o título de eleitor. Uma dessas jovens, a estudante Mariana Carolina de Siqueira Santana, 17, irá votar pela primeira vez em 2018. “Votar é exercer seu direito de cidadão”, diz a estudante. Ela afirma que não gostava de política, mas passou a se interessar para decidir em quem votar de forma consciente. Segundo o professor Gilson dos Santos, a conscientização política dos jovens na escola é o que alimenta a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. “A boa formação ajuda na construção de um cidadão consciente, que com sua atuação na sociedade possibilitará a transformação”, completa o professor.


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CIDADANIA

2018 | Ano XX | Nº 104 FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL

Maioria dos brasileiros não confia em políticos

Parceria estimula aprendizado político entre estudantes

Corrupção e impunidade são alguns dos fatores que contribuem para a descrença

FELIPE ANTONELLI

Plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília. Pelo menos 155 dos 513 deputados são investigados no STF FOTOS: DANIELA GOMES

Daniela Gomes Câmara de Vereadores receberá VI edição do projeto Simula Mogi

P

esquisa realizada pela organização alemã GFK Verein em 2016 aponta que apenas 6% dos brasileiros confia na classe política. A pesquisa, realizada a cada dois anos, abrangeu 27 grandes países. O Brasil ocupou a última posição no ranking da confiança em políticos, juntamente com Espanha e França. Os escândalos de corrupção, somados à crise econômica que o país enfrenta, contribuem para a desconfiança da população. Uma evidência disso é a reprovação do atual presidente Michel Temer. Segundo pesquisa do Datafolha divulgada em abril de 2018, 70% da população considera o governo ruim ou péssimo. Para Luci Bonini, pesquisadora em Políticas Públicas, a impunidade também afeta a confiança dos brasileiros. “Hoje, no Brasil, temos 55 mil pessoas com foro privilegiado. O foro foi criado como mecanismo para garantir a inviolabilidade do mandato dos políticos, mas alguns a usam como um escudo para a corrupção”. A autônoma Vilma Silva, 55, está entre a parte da população

Felipe Antonelli Leonardo Nolasco

Vilma Silva, 55 anos, autônoma

Manoel dos Anjos, 24, professor

que não confia em políticos. “Tudo poderia ser tão diferente, tão melhor. Mas, infelizmente, quem está no poder não pensa na classe pobre, nos trabalhadores e nos necessitados”. Vilma admite que conhece pouco sobre o cenário político atual por não ter tempo para se informar. Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que o Brasil está em quarto lugar no ranking dos países com maior jornada de trabalho. A cientista política Andréa Gozetto ressalta que a política determina questões importantes na vida das pessoas. “Muitos lutaram e morreram para que, hoje, fôssemos capazes de participar do processo decisório. Ao afastar-se da política, o brasileiro ofende a memória des-

sas pessoas e abre mão de seu direito de construir um país melhor”. O professor de informática Manoel dos Anjos, de 24 anos, faz parte da minoria que confia na política. “Participo ativamente de movimentos liberais e vejo a força que a população tem ao decidir tomar partido, não de um ícone político, mas de uma causa”. Para a cientista Andréa, é necessário criar caminhos para levar informação de qualidade às pessoas. “É preciso entender que reformas superficiais não resolverão nossos problemas. É melhor participar e levar seu ponto de vista aos governantes do que delegar o poder e esquecer. Quando o brasileiro se conscientizar de que as coisas do Estado também são suas, tudo mudará”, alerta.

Em ano de eleição, jovens de Mogi das Cruzes e região reúnem-se para debater questões relacionadas à participação política e à cidadania. Colégio particular, em parceria com a Câmara de Vereadores de Mogi das Cruzes, realizará em outubro de 2018 a VI edição do projeto Simula Mogi. Por meio de simulações, tem-se por objetivo estimular o poder da argumentação dos estudantes, que discutem temas atuais em papéis fictícios de representantes políticos ou de movimentos sociais. Assim como nas edições anteriores, o evento deste ano contará com a presença de alunos do Ensino Médio de escolas públicas e particulares. Para o professor e coordenador do evento, José Henrique Porto, esse tipo de metodologia de ensino estimula o interesse dos estudantes. “O projeto promove o protagonismo estudantil além da educação política. Em meio às mais variadas discussões

sobre diferentes temas, o jovem aprende sobre os temas na prática, tornando-se protagonista do diálogo”, afirma o professor. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Mogi das Cruzes tem atualmente 103.825 jovens com idades entre 15 e 29 anos, o que representa 24% da população. Entre os eleitores, 77.152 estão nessa faixa etária, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Isso significa que o número de jovens votantes é maior do que a soma dos votos recebidos pelos 23 vereadores eleitos em 2016, que receberam juntos 68.679 votos. Alguns desses jovens já começaram a trabalhar na área política, em estágios na prefeitura, na câmara municipal, em secretarias municipais, e com isso passam a vivenciar os problemas do município de perto. “Meu sonho é transformar a realidade da cidade e posteriormente, quem sabe, do estado”. É o que deseja o jovem estudante Rubens Pedro Rodrigues, com pretensões a exercer cargos legislativos no futuro.


CIDADANIA

Nº 104 | Ano XX | 2018

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Combate às fake news passa pela educação Pesquisa da plataforma ‘Aos Fatos’ diz que 30% das pessoas se informam pelas redes sociais FOTOS: NAYARA FRANCESCO

Projeto doa livros para estudantes de escolas públicas ARQUIVO PESSOAL

Estudantes são orientados quanto à importancia da leitura Professora Agnes Arruda (esq.) e a jornalista Bárbara Libório (dir.) no seminário “Se é Fake, Não é News”

Nayara Francesco

A

onda de fake news está muito longe de ser algo exclusivo da atual geração. Boato, desinformação e mentira já existem há muito tempo. O que transformou as notícias falsas em fenômeno foi a velocidade da internet. Pesquisa feita pela agência de fact-checking ‘Aos Fatos’, no início de 2018, indica que mais de 30% dos entrevistados se informam pelas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. “Nesse contexto, é natural que as fake news sejam disseminadas”, diz a jornalista Bárbara Libório, subeditora da plataforma. Bárbara revela que as mesmas ferramentas utilizadas para criar fake news podem ser usadas para combatê-las. “A agência ‘Aos Fatos’ fez parceria com o Facebook neste ano. A ‘Fátima’, que é a nossa ‘robô checadora’, vai ter um boot no messenger por meio do qual as

pessoas vão poder pedir dicas ou ajuda, caso achem notícia com algum grau de falsidade”, explica. “Espalhar fatos não verídicos influencia a realidade social, resultados de eleições, convívio entre pessoas e até relacionamentos pessoais”, defende a editora do programa Esporte D, da TV Diário, jornalista Milena Antunes. O grande desafio para os profissionais de comunicação é, sem dúvida, combater as fake news e trazer de volta a credibilidade da profissão. No livro “O que é Comunicação”, Juan Bordenave diz que, para ser possível uma interação social mais correta, é preciso melhorar a interpretação, formar opiniões críticas, criar habilidades de resolução de problemas e ter menos preconceito. Para tudo isso ser posto em prática, é preciso plantar uma educação com nova responsabilidade com relação à comunicação. O autor ainda diz que a educação para a comunicação deve co-

meçar desde as primeiras séries do ensino regular. A jornalista e professora de Comunicação Social da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), Agnes Arruda, concorda e lamenta não haver interesse político e econômico para fazer isso acontecer. “Seria uma solução para o problema das fake news, não diminuiria, mas faria as pessoas identificarem e consequentemente não cairem nessa roda”, analisa a professora. Além da cautela nas checagens e nas interpretações das notícias, o papel do profissional da informação é o de ser protagonista. A jornalista Milena diz que “o papel do jornalista é continuar trabalhando com o máximo de ética possível. O jornalista é igual ao pedreiro: ele pode construir a notícia do jeito que quiser, mas para prestar um bom serviço público precisa seguir regras. O pedreiro pode construir o muro do jeito que quiser, mas se quiser fazer algo durável precisa seguir regras”, conclui.

Evelin Lopes Preocupados em obter patrocínio para a publicação de seu segundo livro, os autores Anderson Fernandes e Débora Kaoru depararam-se com algumas dificuldades. Com o objetivo de distribuir os livros gratuitamente em escolas públicas eles criaram uma campanha de financiamento coletivo, só que ela não atingiu o necessário para produção dos livros. Foi quando eles tiveram uma ideia inovadora: arrecadar obras literárias para distribuir em uma escola e poder instruir os alunos sobre a importância da leitura. Com a primeira distribuição eles passaram a receber pedidos de professores. A arrecadação de livros usados e novos continuou e o Projeto passou por 27 escolas e distribuiu mais de 7000 livros. A 4ª Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, que busca conhecer o comportamento do leitor, revelou que 44% da população brasi leira não leu um livro, nem mesmo

parte de um nos últimos três meses. É nesse cenário que, na palestra, Anderson apresenta aos jovens a leitura como forma de romper barreiras sociais e promover crescimento pessoal. “A gente continua com o projeto com muita dificuldade, mesmo com nossas limitações. Porque a gente realmene acredita que a leitura, como direito de todos, evita o aprofundamento de divisões sociais, educacionais e culturais. Desta maneira a gente oferece mais como um instrumento de promoção da dignidade”. A Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) recebeu duas ações para arrecadação de livros. A pri meira ocorreu durante o 3º Encontro de Comunicação do Alto Tietê, quando os participantes do evento foram convidados a trazer um livro para doação. Em outro momento, foi organizada a Semana Para Doar Livros, com a disponibilização de um espaço na Universidade para receber as doações de livros.


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CIDADANIA

2018 | Ano XX | Nº 104

MEC autoriza o uso de nome social nas escolas Estudantes poderam solicitar que lista de matrícula e presença conste o nome social e não o do RG FOTOS: HELEN SANTOS

Helen Santos

N

o dia 17 de janeiro de 2018 foi homologa pelo Ministério da Educação (MEC) resolução que autoriza o uso do nome social de travestis e transexuais nos registros escolares da educação básica. O objetivo é diminuir o número de casos de violência e bullying sofridos por essas pessoas, o que vem a acarretar no abandono escolar precoce. Fernanda Yuzu Sanjou, 17, estudante de Design Gráfico na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), relata que começou a se identificar como uma pessoa trans por volta dos 13 anos, quando não se via confortável com o seu próprio corpo. Sofreu preconceito durante o Ensino Médio, mas conta que na Universidade esses momentos cessaram. Ao ingressar no curso superior, a estudante se informou na secretaria da instituição sobre o processo para adotar o nome social nos registros acadêmicos e foi orientada a fazer uma carta de próprio punho autenticada. Fernanda projeta ainda novas metas: “Pretendo passar pelo processo de redesignação sexual, não por obrigação, mas porque eu quero”. Ela faz acompanhamento psicológico regularmente, para saber se está apta ao processo. De acordo com a professora Isabela Lemos de Lima Cascão, da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), a liberação do uso do nome social nas escolas é um passo muito importante para a educação, vista como uma chance de formar pessoas que saibam identificar e reconhecer as diferenças. “Não é pelo fortalecimento do movimento LGBT+, é pelo fortalecimento de uma sociedade que seja mais tolerante, respeitosa e que possa produzir, crescer e evoluir sendo o que realmente é, e não seguindo padrões já impostos”. A psicóloga Bruna Stefanie de Oliveira Bonici, explica que o nome

Igualdade de gênero deve ser promovida na infância Caroline Cecin

Fernanda recebeu orientações na Secretaria sobre uso do nome social

Isabela Cascão (acima) sonha com uma soceidade tolerante. Para a psicóloga Bruna Bonici (abaixo), nome social promove respeito

social faz com que a pessoa se sinta aceita, reconhecida e respeitada. “Isso reflete na forma como ela percebe a si mesma, gerando bem-estar e promovendo saúde mental”. A Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia proíbe tratar as questões de gênero como transtorno, já que essa abordagem remete à busca da cura e as pessoas trans não são doentes.

Em 2017, estudo feito pelo IBOPE constatou que o machismo é o preconceito mais presente no Brasil. Um ano antes, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou que, dentre 83 nações, o Brasil é o quinto país com mais assassinatos de mulheres. Segundo o Mapa da Violência, seis cidades do Alto Tietê estão entre as mil cidades com mais ocorrências de feminicídio. Itaquaquecetuba e Arujá lideram na região, ocupando, respectivamente, as posições 512 e 572 da lista. Carolina Insfran, 23, estudante de História, é a única mulher entre três irmãos e sente na pele a desigualdade de tratamento. “Cresci ajudando minha mãe na cozinha enquanto meus irmãos jogavam bola. Eles sempre tiveram permissão para sair e retornar a hora que quisessem, enquanto eu tinha que seguir uma lista de exigências. Isso sempre me afetou emocionalmente, além de interferir nas minhas relações sociais,” desabafa. Segundo a pedagoga e psicanalista Giseli Cristiani, 43, algumas escolas estão trabalhando na erradicação do sexismo desde o

CAROLINE CECIN

Discriminação faz Carolina se manter distante dos pais

jardim de infância. “Essas instituições permitem que os alunos escolham os tipos de atividades de que querem participar e com quais brinquedos querem brincar, sem que haja distinção de gênero”, diz. Para Giseli, a criança que nasce numa família sexista provavelmente desenvolverá comportamento hostil para com as mulheres. “Através do Programa de Desenvolvimento Pessoal e Social (PDPS), projeto social oferecido por algumas escolas, essas tendências são identificadas e tratadas por meio de conversas”. Mesmo diante das transformações sociais, a maioria das escolas ainda não discute nem promove debates sobre desigualdade de gênero.

União LGBT+ ainda é tabu na região do Alto Tietê Bianca Schmidt Desde a legalização da união igualitária, os casamentos entre homossexuais aumentaram 51,7%, superando o de heterossexuais. O Alto Tietê, contudo, não seguiu a tendência nacional. Dos mais de 11 mil casamentos realizados entre 2013 e 2015, apenas 162 uniram pessoas do mesmo

sexo. Muitos casais não formalizam a união civil por conta de preconceito na família e na sociedade. Tiago Yoshikatsu, 28, mora com Edgar Fernandes, 26, há pouco mais de um ano e lamenta a falta de apoio dos sogros. “Os pais do Edgar não aceitam muito bem, a mãe dele é muito religiosa”. Para a comunidade LGBT+, a oficialização do relacionamento

também é uma conquista emocional. No entanto, pode não ser suficiente para quem busca a cerimônia religiosa. No site da Diocese de Mogi das Cruzes, o Pe. Antonio Robson Gonçalves afirma que o matrimônio religioso pode ser anulado em casos como “alcoolismo, toxicomania, homossexualismo e outras anomalias”. O termo “homossexualismo” é rejeitado pela comunidade LGBT+

por remeter a doença. A homossexualidade não é considerada doença desde a década de 1940 e não pode ser tratada como distúrbio por psicólogos. Entidades religiosas não são obrigadas a realizar cerimônias entre casais do mesmo sexo. Já os cartórios são obrigados a formalizar a união e não podem se recusar a converter união estável em casamento.


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ECONOMIA

Nº 104 | Ano XX | 2018

Internet torna-se ferramenta eficaz para investir Troca de material e experiência entre usuários são fatores diferenciais no mercado financeiro ERICK SANTANA

Erick Santana

Criptomoedas crescem no mercado financeiro

O

perfil do investidor brasileiro vem mudando ao longo do tempo. Em um ambiente cada vez mais conectado, a internet é aliada de um grande número de pessoas que aprendem a aplicar e por em prática variadas opções de investimento, além da poupança. De acordo com a Associação Brasileira das Entidades de Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima), mesmo com os novos meios de investimento, a aplicação na poupança ainda é a preferida de 85% dos brasileiros. A mudança para investimentos de renda fixa tem ganhos maiores que a poupança e já é uma realidade. Com cerca de 2 milhões de investidores, segundo informações da BM&FBOVESPA, a renda fixa vem se provando como uma opção mais atrativa para quem busca diversificar seus investimentos. A aplicação em títulos públicos, como o Tesouro Direto, é indicada principalmente para os investidores conservadores, que são os principais clientes da poupança. A mudança no comportamento dos usuários da poupança pode ser vista na internet. No Facebook, cerca de 94 mil pessoas fazem parte dos principais grupos relacionados à troca de experiências sobre diversos tipos de investimentos. O estudante de engenharia Francisco Costa começou a investir em 2017 e diz que a internet é uma ferramenta importante para conhecer mais sobre o mercado financeiro. “A internet é uma grande ferramenta. Comecei a estudar em 2011 e não havia quase nada de conteúdo em português além de alguns fóruns”. Segundo ele, a popularização dos conteúdos e formatos na web facilita ainda mais o contato com o material de estudo. “Com a popularização do YouTube, hoje se encontra praticamente tudo que precisa para começar”, diz o estudante. Fran-

Luis Carlos

Novas tecnologias facilitam o acesso a informações sobre investimentos

cisco alerta ainda sobre os cuidados que o investidor iniciante deve ter. Segundo ele, é preciso que cada um conheça o seu perfil, para saber o nível de risco que pode tolerar. No mercado financeiro, existem inúmeras formas de aplicações, desde opções para investidores mais conservadores, até aplicações para quem busca lucros maiores em curtos períodos, os chamados derivativos. Uma dessas modalidades é o chamado Day Trade, são operações feitas na bolsa de valores que tem fechamento diario. Ainda segundo Francisco, essa modalidade pode não ser a melhor opção para todos os investidores. “Como o iniciante não está preparado ou simplesmente não conhece os riscos que está correndo, acaba cometendo uma série de erros que se convertem em prejuízos, o mais apropriado é procurar se informar antes de fazer qualquer aplicação financeira.”

As criptomoedas estão no mercado há cerca de dez anos, mas faz pouco tempo que as moedas descentralizadas (não reguladas por um órgão estatal) chamaram atenção. O bitcoin, a mais famosa e mais comercializada dentre as criptomoedas, foi a primeira moeda virtual a ser criada. Entrou no mercado em 2008. No início, cada unidade podia ser comprada por R$ 60 reais. Hoje, uma unidade de bitcoin é negociada por cerca de R$ 27 mil reais, ou seja, houve um aumento de 45.000% em dez anos. Segundo o economista Fernando Ulrich, as criptomoedas apresentam mais vantagens do que desvantagens. “É um investimento rápido, barato e seguro. Além disso, não existem fronteiras, as moedas podem ser transacionadas internacionalmente, é uma quebra de paradigmas no sistema de câmbio.” Fernando explica que, embora seja um mercado emergente, os investimentos em bitcoins devem ser pensados como uma fonte de renda alternativa, e não como fonte principal. “O bitcoin é uma moeda muito volátil por ser um mercado que está começando. Quando me perguntam, aconselho a não investir patrimônios importantes na compra das moedas. Mas, no futuro, é bem provável que o bitcoin possua mais valor que o dinheiro físico, por causa das vantagens que apresenta.

ARTE: LUIS CARLOS


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SAÚDE

2018 | Ano XX | Nº 104

Casos de autismo exigem diagnóstico rápido ONU estima que uma a cada 68 crianças sofre de autismo e recomenda acompanhamento profissional INGRID MARIANO

Ingrid Mariano

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stima-se que no Brasil existam pelo menos 2 milhões de pessoas portadoras do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ainda assim, o diagnóstico do transtorno é lento, o que prejudica o desenvolvimento e o tratamento dos pacientes. Traços do autismo podem ser detectados ainda nos primeiros meses de vida. Junto com os pais e familiares, creches e escolas têm papel fundamental na identificação do transtorno. Segundo a diretora e coordenadora pedagógica Tatiane Vieira, responsável pela Creche Cristo Misericordioso II, em Mogi das Cruzes, a interação com outras crianças é muito importante: “Precisamos levar em consideração o grau do autismo, como e qual auxílio oferecer para essa criança, visando a parceria com a família. A escola precisa buscar sempre mais informações e conhecimentos, por meio de leituras e pesquisas. Não estamos preparados para tudo, mas precisamos participar e entender a vida dessa criança”. Em Mogi das Cruzes, a Escola Municipal de Educação Especial (EMESP) é referência no Alto Tietê em acompanhamento de crianças especiais. Na instituição é oferecido o Atendimento Educacional Exclusivo e também o Atendimento Educacional Especializado. Andreza Melo, mãe de Pedro, 4 anos, que iniciou o tratamento há seis meses, fala como percebeu o autismo do filho. “A partir de um ano, eu percebi que ele tinha medo de sons e músicas altas, não acenava e nem batia palma, coisas que não observei com a Camila, minha primeira filha”, conta. Depois de observação também das professoras da creche, o menino foi encaminhado para a Divisão de Orientação e Promoção, na qual psicólogos fazem uma triagem por meio de questionários e avaliações clínicas.

Brasil é campeão em transtorno de ansiedade ALEÇA MACEDO

“A ansiedade é minha amiga. A gente briga mas depois faz as pazes”, diz Jéssica

Aleça Macedo

Andreza Melo com o filho Pedro, 4 anos, portador de autismo

Para a assistente social Simone Alli, diretora-presidente da associação Inspirare, que presta auxílio a pessoas autistas ou com outras condições neurológicas e a seus familiares, é preciso insistir na divulgação do Transtorno do Espectro Autista, até mesmo porque nascem cada vez mais

autistas. “Os profissionais da área da saúde e da educação precisam dar um passo decisivo nessa questão, abraçar a causa e procurar se inteirar do assunto. Isso já seria subir um degrau muito importante rumo ao respeito e à dignidade da pessoa com deficiência”, defende.

Suar frio, tremer, gaguejar, ter problemas com sono e preocupação excessiva, eram algumas das sensações com as quais a estudante de estética Jéssica Custódio, 23, diagnosticada com transtorno de ansiedade, convivia. “A gente acha que a ansiedade não é algo sério, e eu sofri muito pela falta de conhecimento”. Com 9,4% da população portadora do distúrbio, o Brasil é campeão em transtono de ansiedade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 18 milhões de brasileiros sofrem com o problema. A perturbação causada pela ansiedade é considerada pelos especialistas um mal dos tempos modernos. Expectativa ou inquietude, cansaço, dificuldade de concentração, irritabilidade, tensão muscular também fazem parte dos sintomas. E quem pensa que a ansiedade surge de uma hora para outra, se engana. A psicóloga Thaisy Petegrosso explica que se trata de uma reação normal aos desafios do dia a dia, despertada desde a infância e que só se torna preocupante quando ocorre com muita frequência ou intensidade excessiva. Nas crises, o coração acelera, os brônquios dilatam causando falta de ar, a taxa de glicose aumenta, pode ocorrer di-

senteria e algumas pessoas chegam a desmaiar por falta de oxigênio no cérebro. Há quem confunda os sintomas da crise de ansiedade com os do enfarto. “O que faz a diferença para que a ansiedade não se torne uma questão patológica é como o indivíduo vai lidar com a situação”, afirma a psicóloga. O entendimento do distúrbio foi um longo caminho que Jéssica percorreu sozinha. “Não me dei conta de como essas reações dificultavam minha relação com as pessoas. A maioria achava que era frescura ou encenação, e eu aceitei essa opinião como única e me isolei por meses”. De acordo com a psicóloga, essas condições também provocam o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), estágio mais grave do problema. O número de diagnósticos em mulheres é cerca de duas vezes maior do que nos homens, devido a fatores biológicos e culturais. Gravidez, menopausa e o próprio ciclo menstrual são responsáveis por alterações hormonais e de humor. Segundo a psicóloga é difícil explicar as altas taxas de ocorrência da doença, porque as condições que levam ao transtorno não podem ser isoladas. Jéssica passou por tratamentos e atualmente segue vida normal. O distúrbio não desapareceu, mas ela aprendeu a lidar com ele.


EDUCAÇÃO

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Crianças economizam água e dão exemplo de cidadania

9 BIANCA GODOI

Projetos da Sabesp, do Semae e do Instituto Água Sustentável (IAS) apostam na educação das crianças Bianca Godoi

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m 2016, o estado de São Paulo passou por uma grave crise de abastecimento de água, que impactou fortemente o cotidiano da população. Visando evitar a repetição do problema, instituições como a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), Serviço Municipal de Águas e Esgotos (Semae) e Instituto Água Sustentável (IAS), preocupam-se com o uso correto da água. O IAS se dedica a pesquisas, em nível nacional, voltadas para a preservação do meio ambiente hídrico. A Sabesp, por meio do Programa de Uso Racional da Água (Pura), promove ações que incentivam mudanças culturais entre alunos do ensino médio da rede pública do estado de São Paulo. Para Bruna Soldera, sócia do IAS e doutora em Geociências e Meio Ambiente, o Pura conseguiu mostrar que pequenas ações podem ter grandes resultados. “Promover educação que visa ao uso racional da água tem um grande efeito, principalmente quando é voltada para crianças e jovens”.

Já o Semae de Mogi das Cruzes é uma autarquia municipal responsável pelos serviços de captação, tratamento e distribuição de água na cidade. A secretária de Educação do município, Juliana Guedes, destaca que o uso consciente e racional da água faz parte do cotidiano das escolas que participam das atividades promovidas pelo Semae. Entre elas, se destacam o concurso cultural “Eu sou amigo da água”, ações pelo Dia Mundial da Água e o “Semae de Portas Abertas”. O público-alvo dessas iniciativas é constituído de jovens e crianças, como revela a engenheira ambiental e uma das responsáveis pelos projetos, Camila Candiles: “Há um foco nos estudantes, sobretudo as crianças, pois são multiplicadoras de informação e levam o aprendizado para casa, conversando com os pais, irmãos e colegas”. A professora do ensino infantil Dina Amador acredita que o uso consciente da água é uma questão de relevância mundial. “Quanto mais novas as crianças, mais absorvem o ensino e multiplicam o que é passado na escola”.

JULIO NOGUEIRA/SEMAE

Engenheira ambiental e responsável pelos projetos do Semae defende a participação das crianças na conscientização dos adultos. “Eles são multiplicadores de informação e levam o aprendizado para casa”. À direita, instalações de tratamento de águas do Semae

Priscila Leal, mãe de Davi, de 7 anos, confirma: “Meu filho pede para fecharmos a torneira quando vamos escovar os dentes e com certeza ele aprendeu isso na escola”.

Programa promove plantio de hortas e educação ambiental em escolas Mozart Cirino O programa “Hortas nas Escolas”, desenvolvido pela Secretaria de Educação de Poá, alcança cerca de 200 crianças com ciclos de palestras de conscientização, plantio de mudas de verduras e legumes e orientações nutricionais. O município tem como meta levar o programa para dez escolas

municipais em 2018. No primeiro semestre do ano, a ação foi alcançou quatro escolas municipais. As palestras relacionadas ao Meio Ambiente são oferecidas pela secretaria municipal do Meio Ambiente. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Manoel da Silva Oliveira, o programa iniciado em fevereiro de 2018 reuniu alunos e pais de alunos para a limpe-

za do terreno. “O solo estava muito pobre, sem condições para o plantio”, afirma Samuel Moreira Barbosa, diretor da escola. Além das palestras de conscientização, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente forneceu os insumos necessários para começar a horta. ‘‘Em poucos meses colhemos hortaliças como alface, cebolinha e salsa”, afirma o diretor.

MOZART CIRINO

Horta da EMEF Manoel da Silva Oliveira cultivada pelos alunos


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EDUCAÇÃO

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Ensino a Distância cresce, mas adaptação de alunos desafia educadores

MARIA EDUARDA BARRIOS

Pamela Silva

Estudantes são atraídos por baixo custo Maria Eduarda Barrios

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Ensino a Distância (EaD) cresce a cada dia no país. De acordo com o Censo da Educação Superior de 2016, o ensino presencial teve queda de 0,08% nas matriculas, enquanto o EaD registrou aumento de 7,2%. Esta forma de ensino tem sido escolhida pelo seu baixo custo e pela flexibilidade na hora de estudar. O curso em EaD tem certificado com a mesma validade do presencial, por isso está sendo cada vez mais escolhido pelos estudantes, afinal, uma faculdade mais em conta com o mesmo peso no currículo parece ser muito vantajoso, mas nem sempre é assim. Alunos que fazem faculdade em EaD contam que a dificuldade em aprender o conteúdo pode ser maior, já que o estudante não consegue tirar suas dúvidas na hora em que elas surgem. A plataforma online das instituições de ensino superior conta , muitas vezes, com apostilas de en-

sino e aulas audiovisuais para que o aluno tenha dois meios de aprendizagem, com o objetivo que ele consiga entender por uma das vias a matéria apresentada. A aluna Mayara Silva está matriculada no curso de Pedagogia a distância em uma universidade e conta que a maior dificuldade que encontra é organizar seus horários para que as matérias não fiquem acumuladas. Dedicação Diferentemente de Mayara, Douglas Grau, estudante de História, conta que para ele a faculdade a distância funciona como a presencial: “Eu separo um tempo do meu dia e me dedico somente a isso. Todos os dias, no mesmo horário, eu paro e assisto minhas aulas através da plataforma online. Para mim é como se eu tivesse que ir todos os dias para a faculdade. É um compromisso meu, comigo mesmo”. Apesar de alguns alunos encontrarem dificuldades para se or-

Aulas EaD podem ser feitas em qualquer local com acesso à internet

ganizarem, o EaD é uma forma de trazer oportunidades de estudo para quem mora longe da universidade ou trabalha em horários pouco flexíveis, como é o caso da aluna Juliana Fernandes, que cursava faculdade de Administração de forma presencial, mas que, por

causa do serviço, teve que mudar para o curso online. Juliana conta que as formas de ensino são muito diferentes e que ainda sente muita dificuldade em se adaptar, principalmente, por não existir a interação entre os alunos nos cursos online.

“Método é bom”, afirma educadora Isabella Grisaro Os educadores também encontraram no EaD um bom método de ensino, como explica a pedagoga Adriana Silveira Suzuki, que já fez diversas graduações à distância. “Achei muito válido. Porém, tem que ter muita responsabilidade”. Adriana explica que o EaD é o melhor caminho para driblar a

indisponibilidade de tempo, mas ressalta que os estudantes devem estar centrados. “O que vale é a intenção. Se o aluno quer realmente aprimorar seus conhecimentos, essa modalidade é muito boa”, acredita. Sobre as novas metodologias, o educador e filósofo Mário Sérgio Cortella conta que o livro foi a primeira plataforma de EAD da história. “Existiu esse tempo todo. O

UMC terá EaD no 2º semestre

que temos são outras plataformas”. O educador comenta que a Inglaterra foi o primeiro país a inserir essa tecnologia no campo da formação, por meio da Open University, mas ressalta que não há apenas benefícios. “A questão central da educação presencial é a convivência, que é uma experiência sociocultural insubstituível”, reforça o filósofo. Segundo Cortella, os novos

desafios não são de hoje. “A nova geração vem se preparando junto com as anteriores, pois todos os seres humanos sempre viveram na era contemporânea”, diz. O filósofo observa que os métodos mudam. “Nós não vivemos a contemporaneidade do mesmo modo. Temos modos de vivência múltiplos, o que não tínhamos em tempos passados”.

A partir do segundo semestre de 2018, têm início as aulas das turmas dos cursos 100% a distância da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Após o processo de credenciamento no Ministério da Educação, a Universidade obteve a autorização para oferecer esse modelo de ensino. Empenhada na produção de conteúdo para o projeto há algum tempo, a UMC agora conta com cursos de graduação e pós-graduação em uma plataforma online com polos presenciais distribuídos por 12 cidades do Estado de São Paulo. De acordo com a assessora pedagógica e coordenadora do EaD, Andrea Lícia Oliveira, o objetivo é levar a qualidade do ensino da UMC para várias regiões do país e promover o acesso das pessoas ao ensino superior. O material disponível no portal pode ser acessado via computadores, tablets e smartphones, o que possibilita maior flexibilidade no que se refere a horários e locais de estudo. Luci Bonini, professora da UMC há 23 anos, ministra as disciplinas Língua Portuguesa, nos cursos de graduação, e Ética e Relações Interpessoais, no curso de MBA em Liderança e Gestão de Pessoas do EaD. “Para mim, o grande diferencial é a qualidade do material em sua versão final. Pesquisamos muito, fazemos um material bom, mas, depois que esse material passa pelos designers instrucionais, ele fica fantástico”. São 14 opções de cursos entre graduação, pós-graduação e MBA. A lista completa e informações sobre processos seletivos e matrículas podem ser encontradas no site ead.umc.br, ou solicitadas pelos telefones (11) 4798-7295 e (11) 4798-7299.


EDUCAÇÃO

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Escola de Suzano ensina educação financeira Conteúdo abordado na disciplina de Matemática procura conscientizar sobre hábitos de consumo Cássia Medeiros

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esde o ano passado, alunos da escola estadual Jacques Yves Cousteau Comandante, localizada no bairro Cidade Miguel Badra, em Suzano, aprendem educação financeira nas aulas de Matemática. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a educação financeira foi adotada como tema obrigatório no currículo escolar e deve ser implantada até 2020 em todas as escolas públicas e particulares do Brasil. Para a professora Jullyana Santos, 31, o conhecimento sobre o mundo das finanças é de extrema importância para a formação dos estudantes. “Eles aprendem sobre o sistema monetário, as notas e as moedas, e dessa forma começam a ter noção do preço

das coisas em geral”. De acordo com a professora, só alguns alunos recebem educação financeira dos pais. A maioria só pode contar com a escola para obter informações básicas sobre finanças. Ela ressalta que este é um assunto que deve ser ensinado desde cedo. “Se as crianças aprenderem a educação financeira, serão adultos mais responsáveis com suas finanças, o que diminuirá o número de inadimplentes”. Pesquisa feita pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) revela que 45% dos brasileiros não controlam as próprias finanças. A falta de disciplina é um dos maiores vilões dos que não têm educação financeira. Do total dos entrevistados, 77% narraram pas-

CÁSSIA MEDEIROS

Para a professora Jullyana Santos, é importante ensinar as crianças desde cedo sobre o consumo consciente

sar dificuldades em 2017, isto é, vivenciaram situações em que o orçamento não foi suficiente para pagar as contas mensais. Entre consumidores na faixa de 35 a 49

anos, o percentual é de 87%. Para a estudante de pedagogia Ana Lilian Lopes, 35, a educação financeira é importante para que o indivíduo tenha equilíbrio em seus

gastos, para que possa fazer escolhas conscientes e garantir um futuro promissor. “Jovens educados financeiramente contribuem para o crescimento do Brasil”, conclui.

Rede municipal adota material didático inovador

VITORIA MIKAELLI

Segundo o prefeito Marcus Melo (PSDB), o material poderá ser adotado por outros municípios. “Queremos compartilhar o que temos de melhor”, afirma

Vitoria Mikaelli A Secretaria de Educação de Mogi das Cruzes criou o projeto Interagir, Brincar e Aprender (IBA), destinado à Educação Infantil, que atende crianças de 3 a 5 anos. Foi desenvolvido pelos professores da rede municipal, ao investimento de R$ 15 mil. O projeto tem por objetivo or-

ganizar o trabalho didático-pedagógico, garantir os mesmos direitos de aprendizagem para todas as crianças e oferecer um material personalizado que atenda as necessidades das crianças e dos professores, de forma diferenciada e inovadora. “Acreditamos que a Educação Infantil é uma etapa fundamental na escolaridade das crianças. O IBA é uma ação que reconhece tal

fato e visa a manutenção e constante melhoria da educação ofertada às crianças mogianas”, afirma o coordenador do IBA, Mitch Rodrigo Prado de Almeida, 31. Ele aponta a necessidade de inovações na educação. “Um dos próximos passos será a integração com meios tecnológicos, ou seja, produzir conteúdos do IBA também para tablets”, revela.

Para a professora Thais Rosa, 44, que trabalha com Educação Infantil há 15 anos, novas ferramentas de ensino facilitam muito o trabalho dos professores e incentivam os alunos. “Esse material é, com certeza, um dos melhores que já vi durante minha carreira. A qualidade e a estética colaboram muito para chamar a atenção do aluno e as atividades e interações

que ele nos oferece são muito boas para as aulas”. Cibele Moretti, 31, mãe de uma aluna de Educação Infantil II na escola Escola Municipal Antônio Nassif Saleme, acha gratificante ver a filha aprendendo com material de qualidade. “É muito bom ver que o ensino municipal está buscando se atualizar e oferecer o melhor para as nossas crianças”, afirma.


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EDUCAÇÃO

2018 | Ano XX | Nº 104 TAÍS MORENO

Cícero Antônio (direita) produz verduras e legumes em Arujá, juntamente com a família, há 25 anos. Produção é vendida a feirantes

Falta formação técnica para a agricultura familiar Oferta educacional para o setor não corresponde à relevância econômica da atividade Taís Moreno

N

o Alto Tietê, a atividade agrícola familiar é predominante. Agricultores como Cícero Antônio da Silva, 46, que há 25 anos produz verduras e legumes juntamente com a família, garantem o fornecimento de alimentos não só para as cidades do Alto Tietê, como também para toda a região metropolitana de São Paulo. Em Mogi das Cruzes, agricultores familiares são responsáveis pelo fornecimento de produtos para a merenda escolar de 45 mil alunos das 205 escolas da rede municipal. A agricultura familiar responde por 70% dos alimentos que chegam às casas dos brasileiros, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Apesar da importância do setor, praticamente não há incentivo à formação de profissionais para a agricultura e boa parte dos trabalhadores não tem acesso a informações adequadas sobre sistemas de produção adequados à capacidade de investimentos, ao tamanho das propriedades rurais e ao tipo de mão-de-obra empregada. O Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) é uma das

poucas instituições a oferecer cursos e capacitação para produtores rurais. Essas ações impulsionam a qualificação e o aumento de renda do trabalhador, com práticas voltadas para a agricultura, pecuária, silvicultura, aquicultura, extrativismo, entre outras. Além de cursos de formação profissional, o Senar oferece formação técnica no ensino médio e assistência técnica e gerencial, com foco na adequação tecnológica e na gestão de recursos. Um sistema educacional mais abrangente poderia ajudar a sanar problemas na produção de alimentos e contribuir para o desenvolvimento e a pesquisa na área. Para a professora de agronomia Paola Rebollar, é notável a necessidade de uma cultura de valorização e incentivo do campo, a fim de levar jovens estudantes a buscarem formação profissional que contribua para a ampliação de técnicas e sistemas de produção para a agricultura familiar. Segundo a professora, o retorno é positivo. “Se o aluno consegue voltar para casa com alguma coisa que realmente faça com que os pais consigam continuar produzindo, isso é muito bom. Pode melhorar muito a condição da agricultura familiar no Brasil como um todo.”

Professora leva conscientização ambiental para a sala de aula

DÉBORA FERREIRA

Educação ambiental pode começar no quintal de casa, no cuidado com plantas e separação do lixo

Débora Ferreira Com o intuito de despertar nas crianças o prazer em conhecer, cuidar e proteger o meio ambiente, professores de escolas públicas têm adotado estratégias que vão além dos conteúdos obrigatórios nas disciplinas de Ciências e Biologia. A professora Leticia Cristina, 25, explica como trabalha o tema na sala de aula. “Utilizo filmes que mostram personagens protegendo a

floresta e dinâmicas em que todos se reúnem para achar soluções para problemas ambientais, de forma que eles entendam que existe a reciclagem e deem nova chance a produtos usados”. A professora explica que o incentivo à preservação vai muito além de trabalhar em uma horta nas escolas. “O desperdício custa muito caro. A separação de materiais para reciclagem foi um típico exemplo que dei para eles.” Em 5 de junho, data em que

se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente, a Organização das Nações Unidas (ONU) desenvolve ações para mostrar à população que, ao contrário do que muitos pensam, os recursos naturais não são inesgotáveis. O tema escolhido para 2018 foi “Acabe com a Poluição Plástica”. E esse tema circulará por todas as escolas a fim de unir diretores, professores e alunos por um mundo sustentável.


EDUCAÇÃO

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Educação pública e privada seguem distantes em Biritiba Segundo Inep, notas obtidas no Enem por alunos da rede privada são superiores em 50% em relação a alunos da rede pública

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Falta de inclusão escolar prejudica deficientes auditivos Melissa Roberta

MELISSA ROBERTA

FOTOS: TAMIRIS NEVES

Fila da merenda em escola de Biritiba. Para alguns, alimentação é principal motivo para frequentar as aulas

Tamiris Neves

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egundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), os resultados obtidos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) pelos alunos de escolas particulares são superiores em aproximadamente 50% em relação aos obtidos pelos alunos de escolas públicas, em todo o território nacional. Essa realidade é evidenciada em Biritiba Mirim, cidade com pouco mais de 31 mil habitantes, que exemplifica uma realidade de constante exclusão social. Para Rosália Prados e Bárbara Lucchesi, professoras da pós-graduação em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), essa desigualdade compromete a construção de uma nova realidade. Segundo Rosália, as maiores razões para a diferença de desempenho entre escolas públicas e privadas são a carência de formação e de valorização dos professores verificadas no sistema público de ensino. Essas ausências causam grandes prejuízos à sociedade, gerando evasão escolar e

Coordenador Fernando Luiz: “Nas particulares, há mais comprometimento”

exclusão social. Bárbara compartilha da mesma opinião: “Precisamos de políticas capazes de diminuir as grandes desigualdades sociais e socioeconômicas das futuras gerações”. Segundo Bárbara, em países com desigualdade econômica tão acentuada como o Brasil, o ensino de qualidade não deveria ser exclusividade de quem pode pagar o preço elevado das mensalidades em escolas particulares. Ao contrário, deveria ser acessível a todos. “Países que consideram a educação como setor estratégico para o desenvolvimento humano, social e econômico não entregam a educação para o mercado privado, como se faz aqui”. Fernando Luiz de Souza Brito,

coordenador de escola estadual e professor de Biologia há quase 30 anos, acredita que a postura dos professores varia de acordo com a escola. “Nas particulares, eles tendem a ser mais comprometidos com os resultados”. Na opinião da professora Joyce Dias, que já atuou em escolas públicas e particulares, o abismo de qualidade ocorre porque as particulares investem em materiais e infraestrutura. “Além disso, elas procuram dialogar diretamente com as famílias, o que facilita a interação.” Joyce destaca o modelo de ensino profissionalizante adotado pelas escolas técnicas (Etec) como uma das poucas iniciativas do poder público que contribui para transformar a realidade.

Caio Rocha, 27 anos, nascido em Jacareí, interior de São Paulo, é um exemplo de superação e profissionalismo. Aos dois anos de idade, foi diagnosticado com perda auditiva severa bilateral, condição que o levou a usar aparelho auditivo (AASI) e a fazer terapias fonoaudiológicas. Isso não o impediu de estudar em escolas regulares e cursar o ensino superior. Em 2015, Caio formou-se em Jornalismo pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). “Sempre fui o único deficiente auditivo na sala de aula e tive dificulddes em acompanhar algumas matérias. Mas concretizei meu sonho e me tornei jornalista”, conta. Após dois implantes cocleares, Caio atua como repórter fotográfico na Agência Jornalística Fotoarena, e é autor do livro “Ouvido biônico: a conquista da audição”. Ele torce pela inclusão escolar de outros deficientes, que, assim como ele, possam seguir carreira. “Felizmente, tive pais, professores e amigos maravilhosos que sempre me ajudaram. Todo esse apoio foi fundamental para o meu desenvolvimento pessoal e pedagógico. Não sei o que seria de mim sem eles. Espero que outros possam ter as mesmas oportunidades que tive”. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 9,7 milhões de brasileiros têm deficiência auditiva, o que representa 5,1% da população. Apesar de histórias de superação, como a de Caio, a inclusão no ensino regular ainda é um desafio para os que sofrem com a perda parcial ou total da audição. Para a psicopedagoga Tatiana Platzer, coordenadora do curso de Pedagogia da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), os deficientes auditivos e surdos desenvolvem habilidades próprias para

O jornalista Caio Rocha, 27 anos, enfrentou desafios na formação

alcançar a comunicação, seja através da leitura labial ou da Língua Brasileira de Sinais (Libras). “O papel da escola e dos profissionais é se adaptar a essas necessidades e oferecer o melhor de si para a aprendizagem do aluno. Mas isso nem sempre acontece, principalmente nas escolas públicas, o que prejudica o processo educacional”, explica. De acordo com a psicóloga Camilla Brito, também é de extrema importância a participação dos pais no processo de ensino-aprendizagem do aluno deficiente auditivo. “Muitas vezes o aluno surdo tem seu primeiro acesso à língua materna, libras, na escola, com os intérpretes, pois sua família não utiliza a língua do surdo em casa. Assim, há atrasos de aprendizagem e falta inclusão em seus próprios lares. Portanto, é preciso manter a união de todos os envolvidos na educação desse aluno”, aponta. A Lei 10.436, de 24 de abril de 2002, garante o acesso e a permanência do deficiente auditivo no ensino regular e o atendimento às necessidades especiais, a fim de fortalecer a inclusão educacional nas escolas públicas, e reconhece a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como a segunda língua oficial no Brasil.


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EDUCAÇÃO

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Um terço dos universitários tem mais de 30 anos Principal desafio para esse grupo é conciliar vida acadêmica com responsabilidades da vida adulta Tauane Barbosa

FOTOS: TAUANE BARBOSA

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ngressar no ensino superior após os 30 anos rende bons resultados na carreira profissional, mas também impõe dificuldades. Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), um terço dos cerca de sete milhões de universitários brasileiros tem 30 anos ou mais. Elane Abreu, 36, estudante do último ano do curso de Administração, conta que, ao voltar para a sala de aula, precisou muito do apoio da família até conseguir se adaptar à nova rotina. A escolha do curso foi motivada pela atuação profissional de Elane como assistente de crédito e cobrança. Para a estudante, a sociedade olha de forma diferente quem ingressa num curso de nível superior. “Além disso, surgem novas oportunidades profissionais”, declara. Para o sociólogo Carlos Roberto Cardoso, que leciona na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), uma das dificuldades dos alunos dessa faixa etária é a adaptação à nova rotina acadêmica, por conta das muitas responsabilidades que já possuem. “Muitos acabam desistindo”, afirma. Para Ângela Onça, 34, o curso de Processos Gerenciais abriu novas possibilidades profissionais. “Com a base teórica adquirida no curso me sinto mais segura para tomar decisões”, declara. Ela optou pela graduação semipresencial pela facilidade de não precisar deslocar-se até a universidade. Já Nathaly Rosalino, 30, não conseguiu se adaptar ao curso semipresencial de Engenharia de Produção pela falta de um professor que a ajudasse a sanar dúvidas surgidas durante as aulas, como ocorre em cursos presenciais. Após um semestre, ela se transferiu para um curso presencial, mas aí se deparou com outro problema: a dificuldade para se deslocar até a universidade.

Professora usa músicas como método de ensino Marcos Lima Magda Galiazzi, professora de Suzano, criou um método que usa letras de música para facilitar o aprendizado dos alunos. A ideia surgiu em 2012, quando ela percebeu dificuldades relacionadas à leitura e à escrita, e consistiu em identificar mediante votação qual era o cantor favorito dos alunos e usar letras de músicas para a prática de leitura. “Eu sabia que não poderia fazer mais do mesmo”, afirma a professora. O cantor escolhido foi o sertanejo Daniel. Para agregar mais valor ao projeto, a professora organizou uma excursão ao programa “Domingão do Faustão”, da rede Globo, ocasião em que ela e seus alunos fizeram uma surpresa para o cantor. Sem que ele

soubesse, a produção elaborou uma reportagem na Escola Estadual Roberto Bianchi, da Vila Ipelândia. As crianças foram levadas de Suzano para o Projac, no Rio de Janeiro. A professora conta que o cantor ficou bastante emocionado quando o apresentador Fausto Silva pediu para colocarem a matéria no ar. Hoje aposentada, ela relata que nunca recebeu nenhum incentivo para realizar qualquer atividade com os alunos, mas que ainda assim faria tudo de novo se ainda estivesse atuando. Pondera, contudo, que atualmente falta interesse tanto por parte dos alunos, como dos professores e principalmente do governo, que pensa de forma irresponsável sobre a educação da sociedade.

Escola de Artes oferece cursos para incentivar jovens Hannah Matias

Nathaly Rosalino, 30, desistiu do curso semipresencial em Engenharia de Produção. “Senti falta de professores para me ajudar nos cálculos”

Dificuldade de adaptação é um dos principais desafios para alunos acima dos 30 anos, aponta o sociólogo Carlos Roberto Cardoso

A Escola de Artes AJPS, em César de Souza, oferece a prática e formação de diversas modalidades artísticas, como circo, teatro, música e dança. Vista como uma possibilidade de mudança para a realidade da região, com altos índices de violência e criminalidade, a Escola conta com cerca de 350 crianças e 15 professores. De acordo com Rita Bonfim, uma das coordenadoras, “a iniciativa oferecida pela AJPS é muito importante para os jovens que crescem expostos a inúmeras questões problemáticas”. Vitória de Carvalho, 19, conta que quem participa realmente se envolve. “Muitas crianças do bairro acabam indo para as aulas de

circo ou dança por estarem cansadas de ficar na rua, mas acabam se envolvendo ao ponto de participarem dos espetáculos”. Anualmente, a escola realiza um espetáculo no Theatro Vasques. Segundo Rita, os alunos são formados para atuar em múltiplas vertentes culturais e, por essa razão, muitos se dedicam por anos à escola. “É um espaço que permite ao professor uma maior liberdade de criação e isso contribui para o interesse da comunidade. Aqui a bailarina canta, o músico atua e o ator toca, compõe, e sobe nos aparelhos de circo”. A Escola de Artes AJPS está localizada na rua Catarina Carrera Marcatto, 740, e funciona de segunda-feira a sábado. As aulas e oficinas são gratuitas.


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MEIO AMBIENTE

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Mogi das Cruzes sofre com descarte irregular de lixo Despejos ocorrem diariamente e refletem falta de concientização ambiental por parte da população FOTOS: FÁBIO PALODETTE

Fábio Palodette

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prefeitura de Mogi das Cruzes identificou cerca de 20 pontos da cidade utilizados para descarte irregular de lixo. O ato criminoso é passível de multa no valor de R$ 8.364,50, em caso de flagrante. O descarte irregular causa diversos problemas ao meio ambiente e à população que mora próxima aos locais. Segundo a Secretaria Municipal de Serviços Urbanos são recolhidas mensalmente 900 toneladas de lixo depositado em lugares inadequados. Um desses pontos fica na avenida Glicério de Melo e causa transtornos à família de Georgina Costa. “Eles jogam sacos de lixo, entulho e até móveis velhos. Isso atrai animais, que acabam entrando nas casas. São sempre as mesmas pessoas que jogam o lixo”. O problema com o descarte irregular é constante e reflete falta de consciência ambiental. Segundo a advogada especialista em Direito Ambiental, Abigail Cristine Carneiro, a lei 12780/07, que define a Política Estadual de Educação Ambiental, vê a educação ambiental como processo permanente de aprendizagem e formação individual e coletiva. “A educação ambiental visa a melho-

Lixo descartado na avenida José Glicério de Melo. Embaixo, Raíssa Neves, coordenadora do Jhones: “É necessário criar uma nova mentalidade”

Alunos da rede pública durante atividade de educação ambiental

ria da qualidade de vida da sociedade e uma relação sustentável do homem com o ambiente”, afirma. Segundo Raissa Neves Botelho, coordenadora da Jhones, instituição que apresenta conteúdos sobre educação ambiental nas escolas de período integral de Mogi

Modelo de consumo atual é insustentável Alessandra Diógenes

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odo ano são gerados 1,4 bilhão de tonelada de lixo no mundo. Só no Brasil, são cerca de 3 milhões de toneladas por ano. A ONU estima que daqui a três décadas serão 4 bilhões de toneladas por ano. Esses dados evidenciam a necessidade de se repensar as formas de con-

sumo, alimentação e produção de lixo. O veganismo, por exemplo, é um estilo de vida que se preocupa com a alimentação e outros produtos de consumo desde a produção até o descarte do lixo. Os veganos preferem produtos de origem vegetal a fim de minimizar o impacto sobre o planeta. A pecuária, uma das atividades

das Cruzes, o tema deve ser discutido desde as primeiras séries. “O maior objetivo é tentar criar uma nova mentalidade e ensinar às crianças que a responsabilidade é de todos. Tentamos fazer com que elas compartilhem com os pais tudo que aprendem na escola”. mais poluidoras do meio ambiente, responde por 39% de todo o lixo produzido e é a principal consumidora de água. Para produzir 1 kg de carne bovina gasta-se de 15 a 20 mil litros de água. A produção de carne também exige a transformação de matas nativas em pastagens e elevados gastos com energia elétrica nos processo de industrialização. Veganos e vegetarianos tendem a ser mais comprometidos com a preservação do meio ambiente e com os três “Rs”da sustentabilidade (Redução, Reutilização e Reciclagem). A assistente adminis-

trativo Anália de Carvalho Sanches, 25, vegetariana há sete anos, conta que não foi só pelo aspecto alimentar que aderiu ao vegetarianismo. Para ela, a opção está mais associado à consciência tranquila que sua dieta proporciona, por não contribuir com o abate de animais e os maus tratos a eles infligidos. Para a bióloga Luciane Aparecida Marcelino, a principal causa para a gravidade da questão ambiental atualmente vivida é a falta de politicas públicas em larga escala que mudem a mentalidade do setor produtivo. Ela não acredita que pequenas ações, como coleta seletiva, sejam

eficazes. Enquanto os detentores do poder econômico poluírem, desperdiçarem e produzirem sem consciência dos danos, mantendo tudo atrelado ao acúmulo de capital e à cultura do consumo desenfreado, nenhuma ação de preservação ambiental será efetiva. Para Raphael de Araújo Silva, 30, analista de planejamento estratégico, o consumo de produtos de origem animal é desnecessário. Para ele, que é vegano, isso deveria ser de conhecimento geral. Raphael acredita que o veganismo faz bem tanto ao corpo como ao espírito.


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PERFIL

2018 | Ano XX | Nº 104

O repórter do século e suas histórias Nayara Francesco

M

ito, príncipe dos repórteres, repórter do século, repórter mais premiado do Brasil, jornalista, caipira, santa-rosense. José Hamilton Ribeiro é, sem dúvida, um ícone do jornalismo brasileiro. Experiente, já contou diversas histórias e carrega em sua bagagem cerca de 800 reportagens. Trata-se de um profissional no qual os focas gostam de se inspirar. Com muito vigor e cheio de motivação, o repórter do Globo Rural dedica sua vida à profissão há 60 anos dos seus 80 de vida. Durante esse tempo, o jornalista criou e aprimorou uma fórmula que contém os elementos de uma grande reportagem. GR = (BC+BF) / (TxT) elevado a enésima potência. Zé Hamilton traduz a equação: BC é o “Bom Começo” que toda grande reportagem precisa ter, que exige também um BF, ou seja, “Bom Final”, o fechamento da reportagem. Entre o início e fim, deve ter “Trabalho” vezes “Talento” elevados à enésima potência. “Tudo o que você tiver de talento e de trabalho tem que colocar na reportagem”, instrui. O jeito simples de Zé Hamilton encanta os colegas de profissão e os estudantes que querem seguir seus passos. Quando ele começou na profissão, não havia tecnologias como as atuais, que ajudam a construir uma boa reportagem. “Tudo era feito na raça e na coragem”, diz. Perguntado sobre as qualidades do bom jornalista de TV, Zé Hamilton deixa bem claro que o necessário, na verdade, é ser bom jornalista. “Se é bom jornalista no impresso, vai dar certo na televisão e no rádio, e vice-versa. A tecnologia ajuda, a técnica também é

importante, a experiência traz alguns macetes, mas o essencial o jornalista traz consigo”. O conselho do Repórter do Século, título que faz referência aos sete Prêmios Esso de Jornalismo e 15 livros publicados, é que o jornalista não se torne dependente da tecnologia. “Repórter que acha que vai resolver no Google os problemas de uma reportagem, está perdido. O navegador dá uma visão geral, superficial, que é muito menos do que uma boa reportagem exige”, alerta. Zé Hamilton chama a atenção para as armadilhas que espreitam quem usa apenas a internet como meio de informação: “Ela ajuda a seguir facilmente as informações que o profissional precisa, mas está cheia de afirmações questionáveis e fontes falsas. O jornalista às vezes se baseia nesses conteúdos, publica e no fim descobre que é tudo invenção”. Para Zé Hamilton, a internet é uma farofa de notícias. “Não dá para saber se a informação é verdadeira ou não. No jornal impresso, na televisão e no rádio, há sempre alguém responsável pela notícia, mas na internet não. Não há controle sobre como os conteúdos foram produzidos e então não dá para saber se determinada afirmação é verdadeira ou falsa. É um perigo”. Ele acredita que as chamadas fake news devem ser combatidas com a própria tecnologia, que, utilizada com desconfiança, “com o pé atrás”, pode ser uma importante aliada do repórter. Analitico, sensível, exigente, simples, observador. José Hamilton Ribeiro ensina, encanta e mostra que é a paixão pelo trabalho, a busca pela reportagem primorosa, a dedicação do dia a dia, que fazem um bom profissional.

ERICK SANTANA

COMPORTAMENTO

Idosos querem vida conectada Isabela Macedo A previsão é que até o fim do ano o Brasil terá um smartphone por habitante, e quem não se adequa às novidades acaba ficando isolado. Essa é a impressão do aposentado Diomário Bráulio Macedo, 79, que recentemente comprou um smartphone com acesso à internet. “Vejo a juventude sempre conversando e se informando pelo celular, e senti a necessidade de me atualizar também”, diz. O primeiro contato com o equipamento foi marcado pelo espanto. “Não tem nenhum botão!” A solução foi recorrer aos

ISABELA MACEDO

Vera Aparecida Martins, 69 anos

netos. “Apesar das dificuldades, vejo que este aparelho promove a integração e o conhecimento”. Não são somente os celulares que têm despertado o interesse da terceira idade. A procura por cur-

sos de informática cresceu 40%, segundo a secretaria municipal de Educação de Mogi das Cruzes. Vera Aparecida Cardoso Martins, 69, matriculada no EJA, não deixou passar a oportunidade de aprender informática. ”Tudo na vida requer aprendizagem. No começo eu não sabia nem ligar o computador, mas com calma e perseverança estou me sentindo craque” afirma. Para o professor de informática Otávio Lima, 37, a experiência é gratificante. “É bem legal ver a dedicação e o empenho deles para entender a tecnologia. Muitos acabam descobrindo um mundo novo. É muito gratificante”.


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