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ACERVO PESSOAL/JOSÉ DE OLIVEIRA

MILITÂNCIA CULTURAL

CINEASTA DA PRIMAVERA ESTUDANTIL É ADMITIDO EM ESCOLA RUSSA DE CINEMA Ano XX  |  Número 106 Distribuição Gratuita

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Após dirigir longa sobre mobilização estudantil, cineasta conquistou bolsa de estudos em Casã

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes paginaum@umc.br Fale conosco: /paginaumc GABRIELA DORTA

EMPREENDEDORISMO SOCIAL

CAFÉ COM INCLUSÃO 12

Cafeteria paulistana serve “respeito”, “oportunidade” e “inclusão”. Atendentes são portadores de Síndrome de Down.

OPORTUNIDADES

EDUARDO LYRA QUER AMPLIAR “GERANDO FALCÕES”

HIKARY CRISTINA

Empreendedor foi considerado um dos 15 jovens brasileiros com potencial para transformar o mundo. Em 2019 ele pretende abrir 6 novas unidades.

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ESPORTE INCLUSIVO

SUPERAÇÃO ATRAVÉS DO ESPORTE Atleta da Seleção Brasileira de Vôlei Sentado e capitão do Sesi-SP, Daniel Yoshizawa também faz palestras para estudantes de Educação Física e de Fisioterapia


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OPINIÃO

editorial

Jovens que fazem a diferença Eles já foram denominados “crianças índigo”, “geração Y”, “geração Z”. O que os diferencia é o ano em que vieram ao mundo. O que os iguala é a juventude e o fato de serem todos nativos digitais. Esses jovens, que cresceram e se desenvolveram em paralelo ao avanço tecnológico, parecem trazer no DNA o genes da inovação. A par disso, caso encontrem apoio e incentivo, estarão formadas as condições favoráveis para que coloquem em prática tamanha inventividade. Para esta edição do Página UM, a ideia lançada aos alunos foi a de que pesquisassem sobre jovens criativos, que se destacam e fazem a diferença em suas áreas de atuação. Como ponto de partida, foram buscadas informações sobre o contexto sócio-histórico atual e sobre as dificuldades que pessoas mais novas enfrentam para conseguir colocação no mercado de trabalho. A meta proposta foi a de descobrir de que maneira alguns jovens estão enfrentando a crise econômica, e a consequente carência de emprego, por meio de soluções inusitadas e transformadoras da realidade no século XXI. Quase chega a surpreender o número de iniciativas encontradas. Se, por um lado, a cada dia são descobertos novos nichos de mercado e desenvolvidos novos produtos, por outro, são muitas as atividades voltadas para a área de serviços e para o terceiro setor. Em diversos campos do conhecimento, pessoas têm encontrado caminhos de realização que, para além de garantirem a sobrevivência, estão não só humanizando as relações comerciais como também transformando as bases do sistema socioeconômico. A história de algumas dessas pessoas jovens e dinâmicas é narrada na próximas páginas. Cada aluno-repórter escreveu o perfil de uma delas. Como é apropriado a esse gênero jornalístico, a linguagem empregada nos textos apresenta estilo um tanto quanto literário. Como se percebe, o jornal laboratório do curso de Jornalismo da UMC também inova para oferecer exercícios criativos e em sintonia com as novas gerações.

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crônica

Faz parte do meu show Gustavo Ferreira* O despertador toca às 06h30, como de costume. Levanto, tomo banho, coloco o uniforme da escola e sento à mesa para tomar o café da manhã. Nenhuma novidade nessa rotina. Enquanto mamãe prepara o leite, papai se junta à mesa e liga a televisão da cozinha para assistir o telejornal. Entre uma notícia e outra, uma em especial me chama atenção: “Jovem Cearense desenvolve antídoto que protege cães e gatos contra envenenamento”, dizia a jornalista. Aquilo ficou na minha cabeça durante todo o desjejum. Café tomado, dentes escovados, pego a mochila e estou pronto para mais um dia de estudo. São seis quadras da minha casa até a escola. O dia está lindo! O céu limpo e o sol radiante. Em meu pensamento, uma única questão: que diferença posso fazer para as pessoas? Olho para o lado e vejo uma latinha de refrigerante no chão, recolho e coloco na lixeira mais próxima. - Mas, só tenho 10 anos, não posso fazer muita coisa, ainda sou criança. Outra latinha jogada na rua. Guardo para jogar no lixo. Caminho mais um pouco e folhas de caderno rasgados cobrem parte do gramado da praça. Como as pessoas podem ser tão porcas? Junto tudo e ponho na coleta seletiva. - Eu mudaria o mundo se descobrisse a cura para alguma doença ou se inventasse um automóvel que não prejudicasse o meio ambiente. Meu Deus, quem é capaz de deixar tantas sacolas plásticas caídas no chão? Pelo visto as pessoas não se preocupam com o planeta. Como posso mudar o mundo? Enfim, só mais duas quadras e chego à escola. Olha! Um isopor sujando a rua. Aff... *Estudante de Jornalismo, cursando o 5º Semestre.

Equipe de fechamento da edição 106: Isabela Macedo, Ingrid Mariano, Melissa Roberta, Nara Maísa, Nicolas Takada, Fábio Palodette, Mariana Acioli, e professores Elizeu Silva, Fábio Aguiar e Simone Leone

PRODUÇÃO Alunos regularmente matriculados nas turmas 5º A, 6º A e 6º B de Jornalismo da UMC DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Jornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) Ano XX – Nº 106 Fechamento: 30/11/2018

O jornal-laboratório Página UM é uma produção de alunos do curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), em conformidade com o Projeto Pedagógico do curso. Esta edição foi produzida por alunos do 5º e 6º períodos. *Os conteúdos refletem tão somente a opinião dos autores que os assinam, não correspondendo necessariamente à opinião da Universidade ou do Curso de Jornalismo.

Professores Orientadores: Prof. Elizeu Silva – MTb 21.072-SP (Orientação geral, Edição e Planejamento Gráfico) | Profª. Simone Leone – MTb 399.971-SP (Pautas e Edição de Textos) | Prof. Sérsi Bardari - MTb 20.256-SP (Pautas e Edição de Textos) | Prof. Fábio Aguiar (Fotografias) Projeto Gráfico: Alunos do curso de Design Gráfico da UMC, sob orientação do Prof. Fábio Bortoloto: Rafael Alves de Oliveira | Gilmar Amaral Lamberti Rafael Marques dos Santos | Daniel Miranda Ribeiro

Chanceler: Prof. Manoel Bezerra de Melo Reitora: Profª. Regina Coeli Bezerra de Melo Pró-Reitor Acadêmico do Campus (sede): Prof. Cláudio José Freixeiro Alves de Brito Pró-Reitor Acadêmico – Campus Fora de Sede – Villa Lobos/Lapa: Prof. Ariovaldo Folino Júnior Assessor Pedagógico Campus (sede): Prof. Hélio Martucci Neto Assessor Pedagógico Campus Fora da Sede: Prof. Wilson Pereira Dourado Diretor de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão: Prof. Cláudio José Freixeiro Alves de Brito Diretor de EaD: Prof. Ariovaldo Folino Junior Diretor Administrativo: Luiz Carlos Jorge de Oliveira Leite Gestor dos Cursos de Design Gráfico e Jornalismo: Prof. Andre Luiz Dal Bello

Avenida Doutor Cândido Xavier de Almeida Souza, 200 – CEP: 08780-911 – Mogi das Cruzes – SP | Tel.: (11) 4798-7000 E-mail: paginaum@umc.br


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Negra e advogada, jovem contraria as estatísticas “Me sinto ocupando um espaço que não foi feito para mim, mas que alcancei”, conta Ellen Deuter PAMELA SILVA

Pamela Silva

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uem encontra Ellen Deuter em um domingo, com uma camiseta com os dizeres “empowered woman” (mulher empoderada) não imagina o real nível de representatividade que ela tem. Em 2018 completam-se 130 anos da abolição da escravatura no Brasil, mas a luta pela igualdade racial nunca deixou de existir. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Ethos nas 500 maiores empresas do país revela que menos de 10% dos profissionais negros estão em altos postos hierárquicos em companhias. Destes, 0,4% são mulheres. É contrariando essa estatística que está Ellen, advogada negra de 26 anos. Nascida em Ceilândia, DF, Ellen se mudou para Santa Isabel

Engajada no movimento negro, ela estuda para militar com conhecimento

ainda menina. Estudante de escola pública desde pequena, ela aprendeu a ler cedo e foi uma criança questionadora. Aos 16 anos conquistou a oportunidade de fazer intercâmbio através de um programa do governo, o que abriu seus olhos para a realidade da desigualdade social e o desejo de fazer do

mundo um lugar melhor. No entanto, antes de dar seus primeiros passos na caminhada, a jovem precisou aprender a lidar com algo que sempre foi presente na sua vida: o preconceito racial. “Demorou muito para eu me perceber como mulher negra. Depois que eu cresci que eu entendi que

Do concreto ao piso úmido da terra Aline Silva Formado em Biologia pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), Luccas Rigueiral é um jovem empresário apaixonado pela natureza. Em 2015, com a ajuda de um sócio, criou a empresa de turismo EcoExpirence que tem como objetivo promover o ecoturismo e a preservação do meio ambiente. Desde o ensino médio, Luccas já desejava trabalhar em contato com a natureza. Com orgulho e total satisfação, ele recorda os desenhos que adorava assistir. Todos envolviam a cor verde e o ambiente. A família sempre o incentivou a seguir carreira na área que tanto admirava. Durante a graduação, trabalhou no Parque Estadual Serra do Mar (Núcleo São Sebastião), onde não imaginava que encontraria pessoas tão importantes para a sua vida. Ele costumava identificar plantas em seu tempo livre. Já sabia que queria botânica. Observa-

va professores com pé na terra e sentia-se inspirado por eles. Começou a ver as coisas de maneira prática, como um Biólogo. Queria se encaixar no mercado de trabalho e lutar pelas causas ambientais. Desenvolveu seu primeiro trabalho científico ainda na faculdade, onde fez estudos sobre a Balneabilidade na praia de Cambury, que avaliou a qualidade da água do mar. Esse estudo foi tema do TCC e publicado em uma revista de engenharia ambiental. No mestrado, Luccas foi pesquisador de Hibiscos nativos (plantas com flor), existentes no sudeste do Brasil. Viajou por essa região para estudar o tema. “Foram as coisas mais lindas que já vi”, conta. A pesquisa também foi publicada na revista Rodriguésia, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Começou a realizar seus sonhos quando deixou São Paulo e mudou-se para o litoral de São Sebastião que, segundo ele, contribuiu para sua saúde. Ele considera essa mudança o melhor momento

FOTO: ALINE SILVA

na escola, quando me chamavam de ‘neguinha da beija-flor’ era uma associação a minha cor. Na época não fazia muito sentido para mim, até porque meus irmãos são brancos. Quando eu entrei na faculdade, cortei o meu cabelo alisado e assumi o crespo eu entendi tudo o que tinha vivido”, explica ela. Ellen cursou Direito, em uma das mais renomadas universidades privadas de São Paulo. Até então decidida a se tornar diplomata, ela acabou se interessando pela área Empresarial e seguiu carreira. Hoje como advogada sênior de uma grande empresa na capital, a jovem conta que ainda sente o racismo de perto. A OAB afirma não ter contabilizada a quantidade de mulheres negras exercendo a advocacia no país e no estado. “Eu sou a exceção nos ambientes que

O catador de latas que virou economista premiado Bianca Tiburcio

Lucas Rigueiral em palestra

de sua vida. “Acho que não seria um botânico se morasse em São Paulo”, relatou. Atualmente, trabalha no Plano de Manejo da APA Baleia-Sahy, que é uma área de preservação ambiental. “Antes dessa unidade ela não era protegida”, conta. O que o move são os trabalhos botânicos e as ações de conscientização, Vi diante de mim, um jovem muito inteligente, simpático e acolhedor.

frequento. Uma vez, estava em reunião e um advogado me perguntou se eu estava servindo café. Isso ainda acontece com frequência. Quando vou a eventos e nos restaurantes, as pessoas acham que estou ali para servir ou atender, e não de igual para igual, exercendo a profissão”, desabafa. Apesar disso, a jovem, que se tornou uma militante da causa nas redes sociais e na vida, diz que procura resolver as situações com serenidade. “Me sinto ocupando um espaço que não foi feito para mim, mas que alcancei. Todas as profissões são importantes para a sociedade, eu quero que as crianças vejam isso e se sintam representadas”, diz, empolgada. Os planos futuros incluem um mestrado voltado a área, além de dar continuidade no trabalho voluntário.

Olhos verdes e sorriso cintilante. É o que chama a atenção em Leandro Quintino, e ele reconhece que os traços são privilégios e fazem toda a diferença até mesmo para quem veio da periferia.. Quem entra em suas redes sociais e vê selfies em lugares turísticos da Europa não imagina os percalços para conseguir tudo isso. O economista começou a trabalhar ainda criança. Sua mãe era varredora de rua e levava os quatro filhos com ela. Durante o expediente da mãe, Leandro recolhia latinhas para vender e usava o dinheiro para comprar roupas. Depois, passou a trabalhar no bar do pai, além de ajudar nas tarefas domésticas. Foi a mãe que o ensinou a importância sobre trabalhar. “Ela nos dizia que o trabalho é o mais importante. Fazendo sol ou chuva, nós tínhamos que estar com ela”.

Após o ensino médio, conseguiu bolsa para estudar na Universidade São Judas Tadeu, no bairro da Mocca. Ele conta que enfrentava preconceito por morar em Itaquá: “Eu estava em um bairro rico, onde a maioria das pessoas eram muito bem de vida”, afirmou. Mas ele se esforçou para provar seu valor e ganhou diversos prêmios na faculdade. Entre eles o de melhor TCC do curso de Economia, além de ter participado de uma premiação na qual ganhou a 8ª posição em todo o estado de São Paulo. Concluída a pós-graduação, Leandro passou por processos seletivos nos quais encontrou desigualdades sociais. Teve que com concorrer com pessoas que fizeram mestrado no exterior, por exemplo. “Só consegui ser admitido no banco porque sou muito bom no inglês”, idioma que aprendeu sozinho em casa.


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Prêmio de melhor reportagem estudantil é da UMC Magda Nathia conquistou o 1º lugar na Intercom, instituição de fomento à pesquisa em Comunicação YASMIN CAMPOS

Yasmin Campos

A

recém-formada no curso de Jornalismo da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), Magda Nathia, 23, ainda demonstra surpresa ao falar sobre o prêmio que ganhou, em setembro deste ano, pela melhor reportagem, no 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, realizado em Joinville, SC. Primeiro Magda venceu a etapa regional e se qualificou para representar o Sudeste na etapa nacional, na qual concorrendo com produções de alunos de universidades públicas e particulares de renome. É a primeira vez que o prêmio vem para a UMC. “Não imaginei que ganharia na região Sudeste. Quando anunciaram o meu nome eu não acreditei, foi uma grande emoção. Depois disso, fui mais confiante para a etapa nacional”, conta. A reportagem que venceu o prêmio foi “Desaparecidos: histó-

“Quero que as pessoas façam algo”, diz Magda sobre papel da reportagem

ria sem fim”, que retrata o drama de famílias que procuram por respostas sobre os seus parentes desaparecidos. “A ideia surgiu depois que li na capa de um jornal que cerca de 200 mil pessoas desaparecem por ano no Brasil”. Segundo Magda, o seu principal objetivo é fazer com que as pessoas reflitam sobre o assunto. “Eu não queria fazer as pessoas chorarem com a minha reportagem, porque elas choram, mas no outro dia já se esquecem. Eu queria fazer com que as pessoas agissem, ligando para a polícia, compartilhando fotos no Facebook”, explica. A jornalista sempre foi apaixonada por televisão e as suas aulas prediletas na faculdade eram as de telejornalismo. Contar histórias de pessoas e jornalismo investigativo também estavam entre as coisas de que mais gosta. A reportagem exigiu dedicação total. A estudante teve que

“Nossa função é dar voz às minorias”, diz jornalista Cássia Medeiros “A função do jornalista é dar voz às minorias. Essa deve ser a meta da profissão, igual ao médico cuja essência do trabalho é salvar vidas”, afirma a jornalista Jamile Santana, 30. Ela foi indicada ao 39º Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos em 2015, pela reportagem sobre chacinas que ocorreram em Mogi das Cruzes. Jamile é especialista em jornalismo de dados. “Notamos que as datas das ocorrências e que havia um padrão no modo de atuação: alguém

de moto ou carro passava atirando e fugia”. No começo a polícia não dava informações sobre o caso. “Senti que tinha alguma coisa errada. A polícia não prendia nenhum suspeito e as investigações não andavam”. Segundo a repórter, a pressão da imprensa fez a polícia investigar. Policiais foram afastados da Polícia Civil e a Secretaria de Segurança Pública não assumiu que os afastamentos eram por causa das chacinas. “Somente dois policiais foram presos, mas no inquérito as testemunhas afirmam que havia mais policiais envolvidos nos

abrir mão dos finais de semana, das férias e das noites, para concluir o trabalho. Magda, que sempre estudou em escola pública, obteve uma bolsa de estudos para se matricular na UMC. Durante o curso, procurou participar dos congressos da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo). A ajuda dos professores e as aulas de TV foram fundamentais para que conquistasse o prêmio. “Antes eu pensava que deveria ter estudado mais para entrar nas grandes universidades, mas minha mãe me disse: ‘Para que você quer entrar se você venceu os melhores?’ Aí percebi que a questão é o quanto você se dedica e não em qual universidade você estuda”, conta orgulhosa. Para Magda, o reconhecimento que teve pelo trabalho foi melhor do que o prêmio físico. “Ver as pessoas comentando sobre a minha reportagem, discutindo e refletindo sobre o assunto é muito gratificante para mim”. CÁSSIA MEDEIROS

Especialista em jornalismo de dados, Jamile quer lançar site com conteúdos sobre transparência pública

ataques”. Ela diz que é difícil para um jornalista cobrir este tipo de matéria, pois corre muitos riscos, mas, mesmo assim, se declara apaixonada pelo jornalismo. “Quando estou escrevendo uma matéria eu sinto que estou na melhor versão de mim”. No momento Jamile trabalha

no projeto de um site de jornalismo de dados regional. “Vamos trabalhar com matérias guiadas por dados e ensinar o que é transparência pública, onde as pessoas podem obter dados e como cobrar ações”. Segundo ela a ideia é treinar jornalistas e estudantes para engajar cidadãos.

Jamile veio de uma família humilde e, mesmo com dificuldades, nunca desistiu dos seus sonhos e se sente feliz nessa nova fase. “Eu trabalhei para isso, pra fazer a diferença, mas a gente sempre tem que melhorar, por isso continuo estudando. É uma trajetória da qual tenho muito orgulho”, finaliza.


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“Achava que não havia solução para tanto sofrimento” Jovem cantora realiza palestras motivacionais em eventos culturais da região do Alto Tietê MELISSA ROBERTA

Melissa Roberta

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aulistana nascida em 3 de novembro de 2001, filha de metalúrgico e recepcionista. “Sou menina moleca”, define-se Ana Caroline Bispo do Prado, de 16 anos. Na verdade, vi diante de mim uma menina divertida e gentil, apaixonada por skate e capoeira. Carol está no terceiro ano do ensino médio e deseja cursar jornalismo. A pouca idade não impede de ser agente de transformação de pessoas por meio das palestras motivacionais que ela realiza. Em 2016, Carol entrou em um relacionamento abusivo que resultou numa depressão profunda. As crises de pânico e ansiedade eram frequentes. “Não me dei conta de que estava vivendo uma relação nada saudável. Me afastei dos meus amigos e da minha família”, diz. O falecimento do avô em 2017 piorou tudo e foi quando ela tentou tirar a própria vida. “Eu achava que não havia solução para tanto sofrimento”, lembra. Felizmente havia, e estava mais perto do que ela imaginava. A insistência de seus pais em inscrevê-la no curso de música contribuiu para que a jovem tímida e com o olhar carregado de insegurança voltasse a sorrir. “Posso afirmar que a música me salvou. Antes eu não conseguia conversar com ninguém, aquilo foi me consumindo muito rápido. O isolamento parecia ser a única opção, mas depois que aceitei participar das aulas de canto nunca mais fui a mesma”, conta. Por meio da arte, ela conseguiu expressar suas emoções e lidar melhor com a tristeza e a baixa autoestima. Atualmente, faz apresentações musicais e realiza palestras em eventos culturais sobre a valorização da vida com base na sua experiência e na importância do indivíduo ter contato com o meio artístico. Ao assistir uma de suas pales-

tras é possível sentir a energia positiva transmitida através de palavras e gestos que revelam coragem e determinação. Com a alegria de viver, Carol compartilha sua história com outros jovens, alerta sobre os fatores de risco para a depressão e fala sobre o poder da arte em transformar vidas. “Sempre explico quais são as possibilidades dentro da arte, como ela pode ajudar, libertar e estimular a criatividade”, relata. Além de fotografar, cantar letras de artistas já renomados e tocar instrumentos que incluem teclado, violão, ukulele e berimbau, também arrisca escrever músicas autorais e peças de teatro. Não se pode duvidar do talento de Ana Caroline. Quando questionada sobre seu maior sonho, não cita dinheiro e nem fama. “Sonho em criar uma instituição que possa aproximar as pessoas da arte, com muita pintura, dança, teatro e é claro, música. Também quero continuar realizando as minhas apresentações, tenho como objetivo conscientizar, alertar e mostrar que sempre existe solução para os problemas sejam eles quais forem”, conclui. A “menina moleca”, dona de um sorriso largo e cabelos encaracolados é bastante encantadora, conhece bem o valor da solidariedade. Sabe que não mudará o mundo de uma hora para a outra, mas com certeza mudará a vida de quem parar alguns minutos para ouvi-la.

Jovem dedica-se à música e participa de campeonatos ANA LUIZA MORERIA

Para o músico Elionai, comprar seus próprios instrumentos foi uma vitória

Ana Luiza Moreira

Para Ana, a música é transformadora

“Eu sou um instrumento da música”, é o que diz o trompista das Orquestras Sinfônicas de Jacareí e Taubaté, Elionai Lenin, de 20 anos. O dom artístico foi revelado ainda cedo, quando conheceu a coleção de violão e viola do pai e ficou apaixonado. Percebendo o interesse do garoto, a família deu a ele um violão de brinquedo e, a toda oportunidade que tinha, Elionai “arranhava” o instrumento. Ao crescer, começou a estudar violino na Orquestra Sinfônica de Jacareí e, com 12 anos, conheceu a trompa. Por curiosidade, pediu ao maestro Mauro Messias Bueno que o ensinasse. Largou o violino e, apesar da complexidade do instrumento, passou a estudá-lo. Aos 15 anos, prestou a prova para entrar na Orquestra Sinfônica de Taubaté e ganhou uma bolsa de R$ 500,00 mensais para se dedicar à música. Foi quando entendeu que aquela poderia ser sua profissão e que, para ser bem sucedido na área, teria que se privar de muita coisa. “Para ser músico, é necessário disciplina”, conta.

Apesar de ter uma carreira curta, suas maiores conquistas como músico são as experiências que adquiriu nos campeonatos internacionais. Com a Orquestra Sinfônica de Taubaté, viajou para a Alemanha e para a Dinamarca, conquistando o segundo lugar nos festivais de que participou e, em novembro de 2017, foi para o Campeonato de Palm Springs na Califórnia onde com a banda se consagrou campeão mundial. Hoje ele dá aulas para o público infantil, estuda música em São Paulo, pratica com a banda e toca em concertos. Ao se tornar professor ele explica que se encontrou novamente na música. “Eu amo lecionar e a maior vitória é ver as crianças entendendo a música. Elas passam a se comunicar melhor, a ter maior coordenação motora e a se tornarem mais responsáveis”. Para começar na música, Elionai conta que é preciso ter força de vontade. “Se você quer uma coisa tem que se esforçar para conquistar, é o mínimo. A música é meritocrática, se você corre atrás tem resultados”.


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Rapper vence a depressão criando rimas e poesias Brenno Sanjermann viu na música a oportunidade de levar esperança para os jovens do Alto Tietê Mirély Teles

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odos os dias ao chegar em casa Brenno não sabia o que fazer. A rotina exaustiva do trabalho sugava sua vontade de continuar vivendo. A angústia, a tristeza e a desesperança faziam parte dos seus dias e os fins de tardes eram sufocantes, até que ele encontrou nas rimas, que anotava em seu bloquinho, uma chance de mudar esse destino. Em 2016, Brenno Sanjermann, com apenas 18 anos, sentiu que precisava de uma direção para sua vida. Foi quando a união de letras rimadas formando poesias e a idealização de uma vida melhor o tiraram do fundo do poço e o lançaram nos palcos da vida. Assim nascia o “Mito”, como hoje é conhecido. O jovem Brenno, agora com

21 anos, fez daquele período turbulento, combustível para definir o que queria de verdade. Com suas letras inspira e incentiva os jovens a pensar e refletir sobre as questões sociais existentes. Foi justamente por esse caráter social que ele escolheu o rap, o estilo musical que despertou nele o desejo de voltar a viver. “Muitos cantores costumam dizer: O rap salvou minha vida”. Como uma forma de expressão que permite uma análise interna. “Quando você entende a essência da composição, deixa de ser uma questão pessoal e passa a ser uma evolução social”, afirma Brenno. Com a intenção de motivar os jovens, desenha esperança em suas rimas. Cantando há mais de um ano, o compositor lançou o CD “Mitolorgia Mixtape”, que reúne músicas que falam da realidade periférica.

Nelas, retrata desde sua infância difícil até como mesmo diante das dificuldades conseguiu superar e fazer poesia. Ele afirma que com sua música leva informação para muitos, pois maioria de seus shows são voluntários. Seja com seu CD ou nas batalhas de rap, está ali, levando cultura às comunidades e dando voz a periferia. Para o músico, o contato com seus ouvintes é mágico. Ele destaca que a reação de quem escuta suas músicas é motivadora, que serve como estímulo para continuar a compor e expressar seus ideais. “A música ajuda muito quem tem pouco, pois ela tem o papel de enviar mensagens que expressam a realidade”. O rapper ajudou os jovens Lucas Simas, Gabriel Oliveira, Joana Souza e Luan Lúcio a formar a Paese Corp, no início de 2018. O

Cultura Hip-Hop: um sonho que transforma vidas Isabelle Souza Rogério Assunção, baiano, mudou-se com seus pais para o Alto Tietê aos 5 anos e hoje está vivendo um sonho de infância. Agora aos 23 anos de idade, ele é dançarino, coreógrafo e produtor de eventos Assunção busca, primeiramente, apresentar o mundo da dança aos jovens, pois acredita que a imersão nessa atividade proporciona superação e inclusão social. “Acredito que vidas possam ser transformadas pela arte, vejo pessoas se dedicando, superando limites”. A paixão de Rogério pela dança começou aos 10 anos, quando teve contato com o trabalho do cantor e dançarino Cris Brown através de videoclipes. Tendo o norte americano como grande inspiração, Rogério buscou aprender mais sobre o mundo da dança e também passou a treinar em casa. “Nessa época era moda dançar FreeStep”. O FreeStep consiste em deslizar sobre o

ISABELLE SOUZA

MIRÉRY TELLES

“A música ajuda muito quem tem pouco”, diz Breno Sanjermannw

objetivo do grupo é valorizar os trabalhos artísticos feitos por jovens do Alto Tietê. Hoje, Brenno faz parte do grupo Monastério. Ele e seus amigos

Rapper mogiana rompe barreiras Murilo Cabral Martins

Rogério Assunção dá aulas de Hip-Hop em Mogi das Cruzes

chão fazendo movimentos com as pernas e as mãos, no ritmo da música eletrônica. “O pessoal da minha escola dançava e eu quis fazer parte desse mundo”. Ele foi morar em São Paulo com o pai e teve seu primeiro contato com profissionais da dança, o que permitiu que ele aperfeiçoasse sua arte e começasse a participar de competições na cidade. Em 2013 ele voltou para Mogi e, junto com amigos de infância, criou a B2D - Battle Best Dance, uma produtora eventos. Passou também a compartilhar experiências e

apresentar o mundo da dança para outras pessoas. “A B2D organiza a maioria dos campeonatos do Alto Tietê”, afirma. A produtora tem 15 mil seguidores no Facebook e mais de 2 milhões de acessos no Youtube. Além de atuar na produtora, Rogério se tornou professor de dança na casa do Hip Hop, espaço cultural cedido pela Secretaria de Cultura de Mogi das Cruzes. Em 2019 ele participará de uma semana de atividades em escolas e espços públicos visando a divulgação e a exaltação do hip -Hop.

não vivem só de música, e o jovem que superou a depressão com a arte acredita estar no caminho certo, para uma vida com mais sentido e poesia.

“Sempre acreditei na poesia como ferramenta de contestação. Foi ela que me mostrou a música, a militância e me ajudou a acreditar na minha capacidade de mudar a vida das pessoas”. O relato é da advogada, arteducadora, compositora, instrumentista e rapper Karen Santana, de 27 anos, nascida em São Paulo. E é com este sentimento vivo desde a sua infância, Karen coordena sua aula em uma escola pública de Diadema para crianças. Nas salas de aula instrumentos de percussão começam a ser tocados sobre a batuta atenta de Karen e assim é dada a largada para o Matéria Rima, projeto educacional experimental desenvolvido por rappers do ABC, aos quais ela acabou se integrando. “Quando comecei a estudar o rap e construir as minhas poesias pensando em ritmo, ‘levada’ e contestação so-

cial, eu percebi a mudança dentro de mim. Eu precisava ensinar, fazer pessoas serem tocadas da mesma maneira que eu fui pela cultura hip hop”, relata a professora. A arte do encontro que a vida proporciona foi conduzindo Karen por muitas oportunidades até chegar ao projeto, passando desde a articulação de um grupo musical feminista em Mogi das Cruzes – sua cidade de origem – até um intercâmbio para a Europa, que a auxiliou a aprimorar seu desenvolvimento na estrutura de sua poesia e na troca cultural com outros visionários jovens do rap. Mesmo com um sistema educaciona totalmente preso ao conservadorismo Karen enfrenta as barreiras com seu projeto Segundo ela, “é esse resultado que faz o Matéria Rima ser entendido por quem o antes o rejeitava. É ver essas crianças assim que faz absolutamente tudo mudar”.


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ACERVO PESSOAL/JOSÉ DE OLIVEIRA

Documentário leva jovem cineasta para a Rússia Após dirigir longa sobre mobilização estudantil, cineasta conquistou bolsa de estudos em Casã Caroline Cecin

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O cineasta de 21 anos é o primeiro brasileiro a estudar na Universidade de Cultura e Artes de Casã

ma câmera de vídeo e a sede de lutar pelo que acredita foram o suficiente para mudar a vida do cineasta Kevin D’Arc. Quando foi preso em 2016, aos 19 anos, durante gravações do seu primeiro longa-metragem, o jovem não fazia ideia de que aquele momento seria a porta de entrada para inúmeras conquistas – dentre elas, a tão esperada bolsa de estudos no exterior. No final de 2015, o cineasta, que sempre foi engajado em causas sociais, começou as gravações de “Minha Escola, Minhas Regras”, que, depois, o levaria para a Universidade de Cultura e Artes de Casã (KazSUCA), na Rússia. O longa retrata a mobilização estudantil, conhecida como Primavera Secundarista, contra as novas medidas acerca do Ensino Médio. Durante um ano e meio, Kevin acompanhou as manifestações de perto, visando registrar os

acontecimentos pelo ponto de vista dos estudantes. De acordo com o jovem, a ideia inicial do “Minha Escola, Minhas Regras” era retratar a realidade dos estudantes de São Paulo. Entretanto, no decorrer das gravações, diversas pessoas começaram a incentivá-lo a ir para outros estados. O momento marcante, segundo o diretor, ocorreu nas filmagens em Porto Alegre, quando ele foi avisado que os estudantes iriam realizar uma ação na Secretaria da Fazenda, no centro histórico da cidade. “Eles não me explicaram o que estavam planejando, apenas informaram que precisavam de alguém de audiovisual”, relata. “O grupo invadiu o prédio e, pouco tempo depois, as autoridades chegaram para realizar a desocupação. Houve muita agressão física por parte dos policiais e, no meio da confusão, acabei preso e tive meus equipamentos apreendidos. Felizmente consegui salvar o cartão de memória”. As cenas da

violência policial viraram o clímax do filme. “A cena remete à ditadura militar de 1964. O público se emociona e mostra empatia aos alunos quando a assistem, o que é gratificante”. No final de 2017, Kevin participou de um processo seletivo para uma bolsa de estudos em audiovisual na universidade russa. A notícia da aprovação chegou em fevereiro deste ano. Contudo, para custear a nova vida em Casã, Kevin precisou realizar “vaquinhas” online, geralmente divulgadas em Cineclubes, onde o documentário era exibido. Faltando menos de um mês para viajar, o jovem conseguiu arrecadar o dinheiro necessário. Kevin chegou na Rússia em 28 de setembro e conta que seu principal objetivo, atualmente, é aprender a língua. “Não vejo a hora de começar a gravar novamente, mas meu foco agora é aprender o idioma”, afirma.

Jovem faz da fotografia uma ferramenta de luta social INGRID MARIANO

Ingrid Mariano Pedro Aguiar Chavedar, 29 anos, é um fotógrafo mogiano que realiza trabalhos com moradores de rua. Seus registros chocam e trazem a tona a realidade de pessoas que vivem à margem da sociedade. Segundo ele, a fotografia não irá mudar o mundo, mas é uma ferramenta de choque. “Eu acho que é meio que uma missão. Como o fotógrafo Maurício Lima disse, o meu tipo de fotografia é aquela pra fazer engasgar”. É formado em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e a escolha da graduação teve influência dos pais, que, desde criança, o incentivaram a ler e a desenvolver seu lado crítico. A sua curiosidade e instinto investigativo também o motivaram. “Eu queria cobrir

Através das lentes Pedro revela sua visão de mundo

guerra. Meu sonho de vida ainda é cobrir um conflito armado”, relembrou. A fotografia foi consequência do curso de comunicação e seus primeiros trabalhos tinham como inspiração o seu dia a dia. O

olhar, ainda tímido, registrava a sua cidade, carros, ônibus, pedestres e shows de bandas que costumava acompanhar. Após formado, trabalhou em uma agência, na área de planeja

mento e tinha a fotografia como um hobby. Porém, nas Jornadas de Junho de 2013, onde ocorreram diversos manifestos pelo país contra o aumento das tarifas de transporte público, ele teve o primeiro contato com o fotojornalismo e pode explorar, ainda de forma independente, sua veia jornalística. “Tinha muito barulho de helicóptero na Paulista e eu morava ali por perto. Ninguém sabia o que era aquilo, o que estava fazendo ou o que estava acontecendo. Foi tudo instinto. Mas foi ali que começou”, contou. Pedro já percorreu países como Cuba, Argentina e França e tem fotos e textos publicados em portais como Yahoo, Estadão, IG, Agência Plano e outros. Um de seus trabalhos que mais chama atenção são registros de pessoas

em condição de rua. O fotógrafo devolve, com seu trabalho, o lado humano de cada personagem. Um exemplo foi a publicação de entrevistas com alguns moradores sobre o Brasil e a política atual. A publicação desses retratos em redes sociais causam estranhamento e curiosidade. Pedro consegue, dessa forma, chamar atenção para os problemas e dificuldades dessas pessoas e até mesmo mobilizar causas sociais. Questionado sobre a importância do seu trabalho e se considera que é um jovem que faz a diferença, Pedro foi pontual. “Quem vai lutar por eles? Eu, você? Eu faço apenas o que todos deveriam fazer, que é dizer oi, cumprimentar um cara desse. As pessoas são tão egoístas e mesquinhas que o que eu faço é fazer a diferença”.


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A menina que nasceu sem cor Jovem poetisa afirma o empoderamento feminino e negro LUCAS ALMEIDA

Lucas Almeida

P

aulistana, poetisa e decidida. Assim é a jovem Mídria Pereira, de 19 anos, estudante do curso de Ciências Sociais, na Universidade de São Paulo (USP). Com suas letras fortes, marcantes e contemporâneas, ela acredita que a cultura é um dos primeiros passos para a mudança na sociedade. Após participar do programa “Manos e Minas” na TV Cultura, teve mais de 35 mil visualizações no YouTube, afirmando que por anos foi chamada de “a menina que nasceu sem cor”. Com os cabelos crespos, negra com tom de pele um pouco mais claro, ela se considera vítima do colorismo empregado pela sociedade e se recusa se chamada de parda. “Pardo é cor de papel”. Suas narrativas envolvem temas de discussão como o feminismo, o movimento negro e o direito à cidade Como estudante de Ciências Sociais, ela acredita ter um papel diferente na sociedade e afirma que pode mudar a visão de outras pessoas. Acredito que não podemos naturalizar os processos de opressão, em qualquer sentido, seja racial, de gênero, de orientação sexual e evidentemente de classe. Para mim, é essencial pensar que foi constituído socialmente

Mídria Pereira no Sarau do Vale, em São Mateus, zona leste da capital

e da mesma forma, podem ser desconstruído.” “A mensagem para a sociedade acaba sendo no sentido de trazer minha narrativa pessoal com relação a esses assuntos, mas abraçando também pontos de vista mais acadêmicos e referências culturais que levam em si um peso de reafirmação do caminho que construo na poesia”. E ainda, com muita animação afirma atingir seus objetivos. “Costumo ter um retorno muito positivo. Especialmente das pessoas que se identificam com alguma das questões que levanto. Muitas meninas me escrevem dizendo que “também nasceram sem cor”, e minhas poesias sobre pêlo ou

masturbação feminina têm devolutivas parecidas. Também recebo mensagens muito bonitas de pessoas que agradecem minha escrita e até minha existência!” Gratidão é o sentimento expressado no olhar da jovem poetisa. Como retribuição, ela participa de eventos culturais, que nomeia de “rolês poéticos” em suas redes. Um deles é o ‘‘Sarau do Vale’’, no distrito de São Mateus, que ocorre todo segundo sábado do mês há três anos. “O objetivo é um só. Sem verba nenhum do governo, levar cultura para a periferia, lugar onde mais precisamos dessas mensagens e, de forma alguma, é transmitida pelo poder público. Fazer a diferença”.

Jovem usa música contra preconceito Fábio Palodette Diogo Alvaro Ferreira Moncorvo, 22, conhecido pelo nome artístico Baco Exu do Blues, é um cantor, rapper e compositor brasileiro. Atualmente seu canal oficial no Youtube conta com mais de 60 milhões de visualizações. O jovem compartilha a realidade em que cresceu através de suas músicas e faz dela ferramenta para denunciar temas como xenofobia e racismo. Sua mãe era professora de letras e seu pai mestre de Tai Chi Chuan. Nascido no interior da Bahia, mudou-se para Salvador aos 7 anos, quando passou a morar com os avós maternos. “Foi quando comecei a ver o mundo, vi prédios e televisões” Em 2016 Baco lançou a faixa

Sulicídio, junto com o rapper Diomedes Chinaski. A música logo ficou conhecida. Nela ambos fazem críticas aos cenário nacional do rap, concentrado nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Eles cantam por maior visibilidade para as músicas produzidas em outros estados. “Amo a musicalidade do nordeste, todas elas, tem muito estilo diferente por aí, eu busco misturar tudo isso”. Dentre as principais características de Baco estão suas fortes metáforas com letras cruas e poéticas, que falam sobre amor, sexo, poder, religião e sociedade. Em 2018, Baco Exu do Blues ganhou o título de Artista Revelação no Prêmio Multishow de Música Brasileira. Na ocasião, sua canção “Te Amo Disgraça” foi eleita a Canção do Ano. FÁBIO PALODETTE

Música “Te Amo Disgraça” foi eleita canção do ano pelo Multishow

Jovens ativistas transformam Vila Industrial, em Mogi Mariana Gregório Everton Cardoso, 24 anos, é um jovem ativista de causas sociais em Mogi das Cruzes. Com um projeto idealizado por ele e pelo seu irmão, Emerson Cardoso, 20, eles vêm mudando a realidade de jovens e artesãos da cidade. Feirart, como é chamada a feira produzida por eles na rua conhecida como “5”, na Vila Industrial, faz a junção da feira com a arte, tendo o foco em ajudar artesãos moradores da comunidade.

“Vivendo a arte, comprando produtos, parabenizando trabalhos e conhecendo ações que nunca na cidade existia, uma feira na rua, gratuita, misturando cor, raça, etnia, rico, pobre, todos num mesmo ambiente e trocando informações, conhecimento, aprendizado e só por isso, atingimos a meta”, afirma Everton. A ação, que começou pequena, trouxe bons frutos. “Os artesãos desempregados hoje têm clientes, e são até fornecedores”. Como segundo projeto. Ever-

ton criou o cursinho pré Enem “Nelson Mandela”, que atende pessoas carentes que querem ingressar no ensino superior. Ele reuniu amigos que estudam e estudaram nas melhores universidades públicas e privadas do Brasil e aos sábados eles se revezam para dar aulas programadas de 12 disciplinas para trinta alunos, com idade variável dos 17 aos 50 anos, todos com a perspectiva de alcançarem uma oportunidade no ensino superior.

MARIANA GREGÓRIO

A Feirart da rua 5 reúne feira e arte, e ajuda artesãos da comunidade


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“Nasci em Jundiapeba e aqui é o meu lugar!” Jovem artista está realizando o sonho de ensinar dança na periferia, onde oportunidades são escassas DANIELA GOMES

Daniela Gomes

“Q

uando que a periferia vai ter acesso a tudo isso?”, indaga Ítalo Leal de 22 anos. O jovem nasceu e cresceu em Jundiapeba, Mogi das Cruzes. Ele criou a Fábrica de Artes há três anos. A escola fica no bairro em que ele nasceu e oferece aulas em diversas áreas da arte, como teatro, canto e alguns tipos de dança para crianças, adolescentes e adultos. O valor dessas aulas corresponde a apenas 20% do valor das mensalidades das escolas tradicionais. Acompanhei uma aula de ballet ministrada por Ítalo na escola. A precariedade do espaço, a falta de estrutura, o piso rústico de concreto, o espelho quebrado pela pequena aluna de 3 anos e a tinta descascando das paredes, não impedem as piruetas e saltos de Ítalo e nem o comprometimento dos futuros bailarinos. Rígido, ele corrige os erros dos alunos.. “Tá horrível assim!”. Ítalo quer o melhor de

Ítalo criou escola de dança e oferece aulas para alunos da periferia. “Os bairros vivem esquecidos”, afirma

cada um. Quando eles acertam, ele não esconde a satisfação. “Isso! Perfeito!” Ele começou a fazer aula de dança aos 10 anos, mas precisava pegar mais de um ônibus e também trem para assistir as aulas que amava.

Segurando um lápis entre os dedos, Ítalo conta que conseguiu uma bolsa de estudos para o curso técnico em dança, em 2014, na ETEC de Artes, em São Paulo. As dificuldades de locomoção, o amor pelo ensino e pelo bairro onde mora

despertaram nele o desejo de criar a escola. “Nasci em Jundiapeba e aqui é o meu lugar! Queria ensinar o que aprendi”. “O investimento é no centro. Os bairros vivem esquecidos”, ressalta. Ele então começou a dar aulas de dança no

quintal da casa da avó, em Jundiapeba. A avó decidiu mudar-se, mas construiu uma sala em um terreno no mesmo bairro, a escola. Em abril de 2016, a Fábrica de Artes abriu as portas em novo endereço. Os risos dos alunos adolescentes que faziam aula de teatro na sala ao lado ficam mais altos e Ítalo quer uma ajuda da professora. “Pede pra eles diminuirem o tom da voz, por favor?” Com menos barulho, ele continua a falar com orgulho da escola. A Fábrica hoje gera renda para outras cinco pessoas: quatro professores e uma recepcionista. E conta com 60 alunos. Mas Ítalo ainda precisa de outro trabalho para se sustentar, já que, como ele mesmo diz, ensina por amor e ainda não tem ganhos financeiros com a escola. Durante o dia, ele trabalha no setor administrativo de uma clínica de psicologia. “O que a Fábrica representa para a sua vida?”, questionei. Empolgado, Ítalo responde sorrindo. “Nossa! Hoje, tudo! Hoje é tudo para mim! Meu sonho é ficar aqui dentro, só aqui”.

Mogiano faz primeiro “fan film” brasileiro de Cavaleiros do Zodíaco Mateus da Silva Santos Assim como o jogador Neymar, apaixonado por futebol e que, apesar dos contratempos conseguiu realizar seu sonho de atuar em um grande time, Fernando Lúcio Rodrigues, mais conhecido como Nando, também conseguiu deixar sua marca no coração dos fãs de Cavaleiros do Zodiaco. Apaixonado por cinema Fernando ansiava por realizar um sonho: Fazer seu próprio filme, mesmo que idependente. E quando ainda estava no curso de Publicidade e Propaganda, em 2014, teve a chance de aprender sobre cinema na oficina cinematográfica oferecida pela prefeitura de Mogi das Cruzes.

Nela aprendeu desde como fazer roteiro até noções de atuação e edição. A paixão pelo cinema começou a crescer ainda mais, tanto que buscou cursos em escolas renomadas como a Academia Internacional de Cinema (IC) e o Senac. A paixão por animações japonesas falou mais alto que qualquer tema e Fernando decidiu fazer uma live action dos Cavaleiros do Zodíaco, na qual ele faria um dos seus personagens favoritos, o Ikki de Fênix. “Foi difícil. Tinha noite em que eu ia tocar e saía do show às três ou quatro horas da manhã e tinha que começar a gravar às 06h30”, diz. Apesar das dificuldades, o diretor estreante seguiu em frente

“A Lenda de Fênix” foi lançado em 2017, permitindo aos fãs ver seus personagens favoritos “em carne e osso” no filme. A produção obteve mais de 280 mil visualizações no Youtube e bateu a marca de 500 mil views no Facebook. “Diante do sucesso da primeira produção, Nando decidiu montar uma produtora de filmes independentes, a RaciociNando Filmes. Quando perguntado se fará novos “fan films” baseados em animes, o cineasta responde: “Vai ter projeto novo de Os Cavaleiros do Zodíaco, sim! Sairá em breve e será outra live action, que, no caso, é uma continuação de A Lenda de Fênix, mas contando a história de outro personagem. Será coisa grande”.

MATEUS DA SILVA SANTOS

Paixão por animações japonesas levou Fernando a apostar em live action


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Cafeteria inclusiva faz a diferença em São Paulo Atendentes portadores de Síndrome de Down recebem com abraço e se despedem com massagem GETÚLIO SALES

Gabriela Dorta

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magine uma cafeteria em que o cardápio, escrito na parede, ofereça “respeito”, “oportunidade”, “amor” e “inclusão”. Sim, existe um lugar assim e não tem como sair de lá com pensamentos diferentes das sugestões do menu. Inaugurado há cerca de um ano, o café Chefs Especiais localiza-se na rua Augusta, em São Paulo. A iniciativa é parte de um projeto maior, idealizado por Marcio Berti, proprietário e fundador do instituto Chefs Especiais, que desde 2006 atende cerca de 300 alunos anualmente. A instituição tem como foco a gastronomia, mas também oferece cursos de dança, massagem, garçom, todos gratuitos. Daí surgiu a ideia de criar a primeira cafeteria operada por pessoas portadoras de Síndrome de Down. Marcio percebeu a dificuldade de inclusão dessas pessoas e teve a ideia de abrir a cafeteria para eles estagiarem. No dia a dia, os funcionários com Síndrome de Down recebem ajuda, mas a proposta é a de que ganhem ainda mais autonomia e no futuro sejam criadas duas vagas fixas e outras rotativas. Achei o ambiente incrível. Ao entrar no café, recebi um abraço maravilhoso do atendente Matheus. Quem chega sempre ganha um abraço gostoso de algum dos funcionários. Todos trabalham com um sorriso no rosto e felizes por receberem cada cliente. Além dos doces e salgados, a funcionária Maria Carolina Soares, 25 anos, faz uma massagem espetacular. Antes de ir embora, o cliente passa por ela para dar aquela relaxada. Carolina diz que conheceu o Chefs Especiais há um ano. “Já trabalhei com meu pai em um escritório, mas, por conta da crise, eu saí de lá. Vim então para o Chefs Especiais para aprofundar meus conhecimentos. Faço bolo

Local já virou ponto de encontro para famílias com portadores da Síndrome de Down, mas para atrair outras tribos oferece cardápio em braille

de cenoura, brigadeiro e outras coisas para vender, mas o que os clientes mais pedem é o bolo de cenoura e a minha massagem”. No dia em que estive na cafeteria, um sábado à tarde, as mesas estavam todas ocupadas. Havia famílias com integrantes portadores de Síndrome de Down. Virou quase ponto de encontro. Mas eles querem mesmo é juntar todas as tribos possíveis. Uma das providências já tomadas nesse sentido é a oferta do cardápio em Braille. A escolha da rua Augusta foi justamente por ser um centro agregador de tribos. A cafetaria fica na entrada do restaurante “Como Assim?”, que cedeu o espaço. Outra parceria importante foi com o motoclube In’Omertá, que forneceu o uniforme dos funcionários. Durante o expediente, os atendentes vestem colete de couro e bandana na cabeça, como verdadeiros motociclistas. O café não é apenas assistencialista. Apesar de ser uma ONG, é também um negócio que visa ao lucro como forma de recompensar os funcionários com salários dignos e ajudá-los a prosperar.

Gastronomia liga a periferia ao mundo Nicolas Takada

A lua cheia ilumina as casas no morro e as ruas estreitas que desafiam a geografia de uma das localidades de maior densidade populacional de São Paulo. O bairro Jardim São Luiz chama a atenção por seus habitantes criativos e capazes de estreitar laços e ampliar a conexão com o “outro lado da ponte”, onde fica a região central e os bairros ricos da cidade. Uma das iniciativas pode ser vista no número 358 da rua João de Santana. É lá que funciona o SoNego Bistrô ou Gastronomia Periférica, comandado pelo chef Edson Leite e pela psicóloga Adélia Rodrigues. Edson começou como cozinheiro no restaurante “A Leitaria Gourmete”, em Lisboa, onde morou por sete anos. No Brasil, trabalhou no clube Pinheiros, um dos mais elitistas da cidade, mas percebeu que aquilo não era para ele. Começou a dar aula e mostrou que é possível fazer e servir comida boa “na quebrada”.

NICOLAS TAKADA

Adélia (foto) e Edson criaram restaurante-escola no Jardim São Luiz

Certa vez Edson foi dar aula de Gestão de Alimentos na Fundação Julita, e acabou conhecendo Adélia que trabalhava lá. Logo surgiram ideias de parcerias, que resultaram em vários projetos. O SoNego funciona como restaurante e como escola, com o nome de Gastronomia Periférica. De forma inovadora, o lugar incentiva pessoas que querem ingressar no mundo da gastronomia, ensinando trabalho técnico, desenvolvimento psicológico, pessoal e financeiro

para no final inserir jovens questionadores e reflexivos no mercado. A ideia era trazer questões sobre a relação de trabalho com o meio social e mostrar que o emprego pode ser muito mais que um salário. Lá os estudantes preparam as refeições consumidas pelas crianças atendidas nas oficinas da Obras Recreativas, Profissionais, Artísticas e Sociais (ORPA), fundada pelo empreendedor social Daniel Faria, que fica a poucos metros do restaurante.


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Corações jovens movem a esperança no Alto Tietê Com cerca de 120 integrantes, a Liga da Alegria UMC espalha risos e otimismo por onde passa ARQUIVO PESSOAL

Tamiris Neves

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uarta-feira, 19h de um dia frio e chuvoso que para muita gente está chegando ao fim. É o momento de voltar para casa ou dar uma esticada na happy hour. Não é o caso de Cintia Paiva, 22 anos, estudante universitária. Para ela, ainda há mais uma jornada a cumprir. Cintia desce do ônibus e caminha em passos longos até seu destino. Antes de entrar, já com a mão na maçaneta, respira fundo e sorri. A sala não é local de um novo compromisso, mas um escape da rotina exaustiva de estudante do 7º período de Odontologia. Na sala, Cíntia estuda “Contação de Histórias”, um dos cursos oferecidos pela Liga da Alegria UMC, projeto acadêmico retomado em 2010 pelo então estudante de Medicina e atual médico psiquiatra Rodrigo Sinott. Inspirada no pioneiro “Doutores da Alegria”, a Liga da Alegria capacita voluntários para levar riso e esperança a hospitais, creches e asilos. De maneira humanizada e segura, os voluntários fazem a diferença por meio de atuação, palhaçaria, contação de histórias, música e outras dinâmicas. Atualmente o grupo conta

TAJEAN OLIVEIRA

Tajean Oliveira

Voluntários utilizam fantasias, instrumentos musicais, livros e muita animação para encantar as crianças

com cerca de 120 integrantes certificados, com idades entre 18 e 30 anos, que atuam em escalas. Luana Galeano, 22 anos, estudante de Enfermagem também foi para a aula. Ela chegou um pouco atrasada, pois sua filhinha Malú havia passado mal durante a tarde e ela não tinha com quem deixá-la. Luana acabou levando consigo a pequena, na expectativa de que o ambiente

positivo e harmonioso lhe faria bem. Numa manhã de sábado, mais precisamente às 8 horas, eles se encontraram na portaria de um hospital em Mogi das Cruzes. Assim que a primeira dupla, devidamente paramentada, entrou na ala pediátrica, as crianças já voltaram os olhos para eles com curiosidade. Algumas com esperança, pois já conheciam a atuação do grupo,

outras um pouco amedrontadas. Após alguns minutos de histórias, músicas e brincadeiras, até os que estavam dormindo ou um pouco acanhados despertaram para participar das brincadeiras. Nos pequenos e brilhantes olhosdava para perceber a alegria trazida pelo grupo, que não levava apenas o sorriso no rosto, mas também no coração.

Liga forma clowns para atuação como voluntários Jessica Christina

“Mais importante que o sorriso que levamos, é aquele que recebemos”. Esse é o lema da Liga da Alegria, que após um período sem atuar por falta de voluntários, foi reaberta em 2010 pelo estudante de medicina Rodrigo Sinott. Alguns integrantes da Liga atuam como clowns, um tipo diferente de palhaço cujo intuito não é apenas fazer rir, e sim oferecer apoio emocional a quem precisa. Eles Alegram o ambiente com músicas, sketchs, brincadeiras e im-

Estudante lidera projeto social

proviso. Não há roteiro: cada situação exige uma atividade diferente. Lucas de Mello Afonso Negretti, 22 anos, estudante de Psicologia da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), é voluntário da Liga. Após estudar teatro por oito anos, ele conheceu a iniciativa em um dos eventos de Psicologia e se interessou, pois já tinha a experiência em palcos e atuação. Nas visitas aos hospitais, ele é o clown “Mussarela” - “uma ótima válvula de escape para o estresse”, afirma. Quando iniciou o curso de clown oferecido pela liga, Lucas estava enfrentava um processo de-

pressivo, e as aulas o ajudaram a não se fixar nos problemas, extravasar e se auto-reconhecer. Ele se sente gratificado por ajudar outras pessoas que necessitam de apoio em diversas situações, não só os pacientes, mas também acompanhantes e equipe médica, entre outras pessoas. Segundo Lucas, o único requisito para ser um clown é ter disposição. Não faz diferença ser tímido, animado, gordo ou magro. A maior dificuldade, segundo ele, é “se soltar” no começo das aulas, pois “estamos todos acostumados a uma rotina de trabalhos e estudos,

e o retraimento pode ser complicado”. A cada semestre abre uma nova turma, e o horário e dia das aulas é definido de acordo com a disponibilidade dos alunos. São em média 12 aulas, que abordam desde a segurança no ambiente hospitalar, até questões sobre o uso do corpo. As aulas são ministradas pela pedagoga Luciana Zitei, que também é atriz e palhaça. O curso tem um custo mensal de R$ 65,00. Mais informações podem ser obtidas na página “Liga da alegria – UMC”, no Facebook.

Com brilho nos olhos, uma estudante mostra emoção ao falar sobre um projeto que atinge e motiva outros jovens. O nome da jovem é Marcela Siqueira, estudante de Publicidade e Propaganda e criadora do Projeto Social Motirõ, iniciado em 2015. Ela também é presidente do Diretório Acadêmico Assis Chateaubriand, dos cursos de Design Gráfico, Publicidade e Propaganda e Jornalismo, da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Quando decidiu criar o Motirõ Marcela enfrentou piadas e comentários maldosos de pessoas que se negaram a ajudá-la. Ela persistiu, o projeto ganhou forma e atualmente é composto por 70 voluntários. O Motirõ arrecada produtos diversos para serem doados a quem precisa deles. Até o momento, a atuação está focada em Mogi das Cruzes e Suzano, mas os planos incluem expansão para outras cidades do Alto Tietê e da Grande São Paulo. Para realizar suas ações, o Motirõ faz parcerias com organizações de diversos segmentos. Em 2018 ocorreu o Pagode Solidário, por meio do qual foram levantados fundos para um projeto no Dia das Crianças e quatro projetos de Natal. Marcela acredita que o Motirõ é o momento mais bonito que já pode vivenciar. “É o que mais amo na vida e tenho certeza de que mudou a minha vida”.


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Eduardo é um dos jovens mais influentes do Brasil Empreendedor social foi apontado como um dos 15 jovens brasileiros que podem mudar o mundo HIKARY CRISTINA

Hikary Cristina

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duardo Lyra, nascido e criado numa favela em Guarulhos, se tornou em 2014, segundo a revista Forbes, um dos jovens mais influentes do Brasil abaixo dos 30 anos. Entre outras conquistas, Edu, como é conhecido, foi indicado pelo Fórum Econômico Mundial como um dos 15 jovens brasileiros que podem mudar o mundo, graças ao seu empreendedorismo social com a ONG Gerando Falcões, que atualmente beneficia mais de 1200 famílias, apenas em sua sede, em Poá, por meio de ações nas áreas de esporte, cultura e qualificação profissional. “O amor da minha mãe transformou a minha vida. Literalmente. Ela me falava todo dia: ‘Filho, não importa da onde você vem, o que importa na vida é para onde você vai. Você pode ir para onde quiser’”. Edu admite que não imaginava chegar tão longe. “No começo eu corria para ver se conseguia almoçar ou jantar”, conta. Segundo o empreendedor, a ONG Gerando Falcões foi crescendo na medida em que crescia também a sua autoestima. “A autoestima está muito relacionada ao sucesso que as pessoas têm na vida. Aí chega um momento em que você fez um trabalho desses”, diz apontando para dentro de si. “Você se sente forte, vibrante, dono de si! Com a sua identidade inabalada. Aí ninguém te segura mais! Aí você chega aonde você quiser”. Carismático e persistente nos seus desafios, Edu diz que tem sonhos ambiciosos para a ONG, que deverá se tornar a maior rede de ONGs do mundo. “Em 2019 vamos abrir pelo menos mais seis unidades do Gerando Falcões”, afirma. Dá para perceber o amor que ele sente pelo trabalho, pela vida e pelos amigos que adquiriu durante os anos. “Hoje tenho sonhos gigantes e ambiciosos para

“Cartas sem fronteiras” leva atenção e amor a idosos

Bárbara lê carta para moradora da Casa São Vicente de Paulo

Larissa Batalha

Eduardo Lyra na sede da ONG Gerando Falcões, em Poá

o Gerando Falcões. Estamos nos dias iniciais da revolução que a gente quer fazer no Brasil”. Edu defende que o lugar onde nasceu o fortaleceu para a vida. “A falta, a escassez, o medo, a incerteza, a angustia, o preconceito, a

falta. Essas coisas, ou te matam, ou te deixam muito mais forte. Depende de como você lida com essas questões. No meu caso não me matou, mas para a maioria dos jovens e meninos da periferia e da favela, mata, engessa”, diz.

“Em 2030 o Brasil será um país de idosos. Então, cabe a nós prepararmos o nosso próprio futuro”. Foi esse pensamento visionário que Bárbara Rossana, 22, teve há quase dois anos quando leu uma carta repleta de sonhos e pedidos a Papai Noel, retirada por ela nos Correios de Suzano. Esse cenário a inspirou a criar o Cartas Sem Fronteiras, nome inspirado na organização humanitária Médico Sem Fronteiras. O Cartas Sem Fronteiras visa acima de tudo um contato maior e humanizado com idosos, principalmente aqueles residentes em instituições de longa permanência. A escolha desse público surgiu da constatação de que todos chegaremos um dia à velhice e por isso devemos cuidar dos idosos. Estudante de Enfermagem na Universidade de São Paulo, desde a adolescência Bárbara é escoteira do grupo Ubirajara, de Mogi das

Cruzes. Numal atuação recente do grupo, ela e outros voluntários foram à Casa São Vicente de Paulo, que acolhe idosos em situação de risco, e leram cartas escritas pelos “lobinhos” do grupo escoteiro de Caçapava. O fotógrafo dos escoteiros, Vinícius Ramos, registrou um dos momentos mais belos da ação, quando Bárbara lia para uma idosa. A fotografia destacou-se em concursos e ganhou prêmios no escotismo de São Paulo e do Brasil, e tornou-se uma das imagens que representa o Grupo Brasileiro de Escotismo. Além de lerem as cartas, os escoteiros entregam doações obtidas em campanha prévia. Bárbara sonha que as cartinhas possam alcançar mais pessoas e fazer valer de fato o nome do projeto: Sem Fronteiras. Ela espera que se torne nacional e com chance de chegar a um número maior de pessoas, sempre levando atenção e cuidado ao próximo.


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Startup auxilia jovens que sonham com intercâmbio Ariane Noronha criou uma ONG que ajuda jovens da periferia a estudarem fora do País VITORIA MIKAELLI

Vitoria Mikaelli

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ilha de um pai que trabalha em almoxarifado e mãe manicure, a jovem mogiana Ariane Noronha conseguiu, aos 24 anos, realizar o sonho de estudar fora do país. Hoje, startup social, ela criou uma ONG para auxiliar e incentivar jovens que têm o mesmo sonho que ela. O vontade de estudar no exterior surgiu durante o ensino médio, porém a realização do projeto parecia distante demais pela falta de condição financeira. Então ao se formar no colegial, ela decidiu fazer uma graduação antes do intercâmbio. Em 2012, se formou em Jornalismo na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), e apesar das dificuldades e após pesquisar muito, ela jovem descobriu uma forma mais acessível de realizar o que tanto queria. Um formato chamado “Al Pair”, em que o jovem integra os estudos com trabalho. Mesmo tendo esse objetivo em mente, Ariane seguiu outros caminhos, atuando em alguns jornais da região até 2014, quando embarcou para os Estados Unidos. Lá ela trabalhou numa casa de família e cuidou de três crianças. Durante a permanência de um ano e meio no exterior, aproveitou todo o tempo para adquirir conhecimento. Além de aprender a língua inglesa, estudou vários outros cursos relacionados à Comunicação Social. Ao voltar para o Brasil, Ariane não se contentou em apenas ter realizado seu próprio sonho e começou a estudar uma forma de fazer com que outros jovens possam vivenciar o mesmo que ela. “A idéia de criar uma ONG para auxiliar jovens surgiu depois ir para fora e ver o quanto essa experiência é transformadora. Além da necessidade de trazer essa realidade para mais próximo dos jovens de comunidade e periferias”, contou.

Estudante faz tradução de libras em eventos THAMIRES MARCELINO

Para Nadine (última à direita), deficientes auditivos sofrem descaso

Thamires Marcelino

FOTO: VITORIA MIKAELLI

Realização do sonho de fazer intercâmbio inspirou Ariane Noronha a criar a Soul Bilíngue e ajudar outros jovens a estudar no exterior

Há 10 meses, já com 27 anos e mãe de um filho, ela tirou os estudos do papel fez surgir a Soul Bilíngue. O projeto prevê cinco estapas para os jovens candidatos a intercâmbio. A primeira é a analise psicossocial, que visa entender o contexto social do jovem. A segunda é a integração de pais e jovens, que procura preparar os pais para a ausência temporária dos filhos. A terceira é a imersão na língua inglesa, com aulas orais e escritas, além de contato com mentores do exterior. A quarta etapa é o planejamento financeiro e a quinta a preparação do jovem para o intercâmbio.

O primeiro grupo foi composto por 11 jovens selecionados. Para o próximo ano, Ariane prevê mais 100 jovens. O empreendedorismo social, trouxe realização pessoal e profissional para Ariane. “Eu me sinto realizada, por ter encontrado minha função no mundo, pois essa era uma das minhas maiores dúvidas. Através desse projeto eu me descobri e vi que posso ajudar e inspirar outras pessoas a realizar seus sonhos”, afirma. A Soul Bilíngue ocupa um espaço na ONG “Gerando Falcões”, de Poá e atende jovens de Suzano, Ferraz de Vasconcelos, Itaquaquecetuba e Itaim Paulista.

Silêncio, sintonia e gestos. Nas salas quietas, os não ouvintes entregam sua atenção e confiança a alguém que, ali no cantinho da sala, descreve o agora e os enxerga com igualdade. A estudante de Pedagogia Nadine Cunha, 21, de Itaquaquecetuba, começou a se interessar por Libras antes mesmo de iniciar a graduação. “Queria aprender sobre a Língua Brasileira de Sinais, por isso iniciei o curso na Faculdade Paulo IV, em Mogi das Cruzes e, para minha surpresa, a professora era surda e minha vontade de aprender sobre Libras cresceu ainda mais”, diz. A estudante considera a comunicação como “uma via de mão dupla”, na qual ambos precisam estar atentos e sincronizados. Sua paixão pela Língua Brasileira de Sinais vem do entendimento de que, para os deficientes auditivos, as formas de se comunicar são ainda mais pertinentes e intensas. Sua história também envolve o

reconhecimento sobre a importância da acessibilidade aos deficientes que, por sua vez, sofrem com o descaso com a falta de suporte desde a educação básica. Há dois anos ela realiza traduções de Libras em eventos como palestras e musicais. Apesar de ainda não ter o certificado de intérprete, ela fez cursos voltados à área e realiza trabalhos voluntários de tradução há dois anos. Em 2010, mais de 9 milhões de brasileiros declararam ao IBGE ter deficiência auditiva. Já em 2015, a Relação Anual de Informações Sociais (Rais) informou que apenas 80 mil pessoas com algum nível de surdez trabalhavam com carteira assinada. Antes de ser um problema do mercado de trabalho, a baixa contratação de deficientes auditivos têm a sua raiz na falta de acessibilidade à educação básica e superior. Em 2005, foi regulamentada a lei de nº 10.436 que torna obrigatória a disciplina de Libras para os cursos de formação de professores em exercício do magistério.


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“Nossos limites estão dentro da nossa mente” Atleta da Seleção Brasileira de Vôlei Sentado e capitão do Sesi-SP narra superação através do esporte Tauane Barbosa

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aniel estava sentado no chão da quadra de esportes, cheio de conversa com os colegas do seu time de vôlei. Quando me viu, abriu um sorriso enorme e me convidou para entrar na quadra, antes que o treino começasse. Sentei-me no chão também e a conversa foi tão interessante que precisei marcar outro encontro, pois sua história era valiosa e precisava ser compartilhada. Aos 21 anos, Daniel Yoshizawa descobriu, após passar mal e ser levado ao hospital, que tinha meningite meningocócica. Já imaginou desmaiar dentro de um hospital e acordar acamado e com vários aparelhos ligados ao corpo? Após 14 dias em coma, ele acor-

dou e teve que se encarar a realidade que mudaria completamente sua vida: a amputação de parte das pernas e de alguns dedos. Essa mudança trouxe momentos difíceis, que exigiram superação para seguir adiante. Um dia, ao assistir a programação de um canal de esportes, Daniel viu um nadador paralímpico subir ao pódio. A cena lhe trouxe nova esperança. Decidido a apostar no esporte paralímpico, Daniel foi convidado pelo treinador do Sesi-SP para assistir um jogo de vôlei sentado. “Quando vi aqueles caras em quadra, com movimentos ágeis, força nos ataques, eu fiquei encantado, pois não tinha força nem para me mover da cadeira de rodas para a cama”, conta. Hoje, aos 32 anos, Daniel in-

tegra a Seleção Brasileira de Vôlei Sentado e é capitão do time Sesi-SP. O vôlei já lhe proporcionou várias medalhas e premiações. “Nunca usei a deficiência para me fazer de vítima”, garante. Além das atividades esportivas, Daniel faz palestras para estudantes de Educação Física e de Fisioterapia, na intenção de demonstrar mais sobre a modalidade em que atua e a superação que o esporte trouxe para a sua vida. Empolgado, ele fala sobre os próximos jogos Parapan-americanos de 2019, que ocorrerão em Lima, Peru, nos quais a Seleção almeja conquistar uma vaga para as Paraolimpíadas de Tóquio, em 2020. De maneira confiante, Daniel confessa que seu sonho é alcançar o ouro paralímpico.

LARISSA BATALHA

“Nunca usei a deficiência para me fazer de vítima”, afirma Daniel

Nos ringues e na vida: a história de um campeão Felipe Antonelli Gustavo Bernardino de Camargo nasceu em Guararema no dia 29 de dezembro de 1997. Quando criança, gostava de todo tipo de esporte e sempre praticou alguma atividade física. Ainda nesta fase da vida, foi diagnosticado com laringite, uma inflamação na laringe que diminui a capacidade respiratória. Os médicos recomendaram, como tratamento, que Gustavo intensificasse a prática de algum esporte.

Então, aos 7 anos, começou natação e nesse esporte permaneceu por um ano. Aos 8, por indicação de um amigo de escola, começou a treinar caratê, e o que era uma saída para um problema de saúde se tornou estilo de vida. Conciliando a vida de criança com a rotina de treinos, Gustavo participou de vários festivais na modalidade, mas ainda sem protagonismo. O primeiro indício de que teria futuro nas artes marciais surgiu em 2006, aos 9 anos, quando conquistou o segundo lugar logo na estreia em campeonatos oficiais. “Senti que poderia ter sido campeão, ganhar o torneio,

ARQUIVO PESSOAL

coisa que não acontecia nos festivais que disputava antes”, revela. Um ano depois, no campeonato brasileiro realizado em Minas Gerais Gustavo foi campeão do primeiro tornei o importante da carreira, com três nocautes. O jovem atleta intensificou os treinos de caratê e colheu resultados. Além do campeonato brasileiro de 2006, ganhou mais quatro vezes o torneio e se tornou pentacampeão. Também foi duas vezes campeão sul-americano e – o mais recente, em 2018 – vice-campeão mundial na categoria adulto, disputado na Cidade do México. Apesar do sucesso, faltou apoio financeiro para deslanchar a carreira. Gustavo lamenta nunca

Gustavo Bernardino treinando para o mundial de caratê que disputará em 2019

ter recebido apoio financeiro de empresa ou de governo. “Desde as primeiras disputas no Brasil, até as viagens internacionais, sempre dependi da ajuda dos meus pais. Foi bem difícil”, afirma. Gustavo se viu obrigado a abandonar o esporte. “Coloquei outras prioridades na cabeça e o caratê ficou um pouco para trás”. Em 2017 Gustavo retomou a carreira e agora busca o título que lhe falta, o de campeão mundial na categoria adulto, disputa na qual obteve o quinto lugar em 2013 aos 16 anos, e em 2018, aos 20 anos, conquistou o segundo lugar. Que venha 2019.


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Jovem inventor autodidata é premiado no Brasil Ranieri Silvestre criou uma coleira termoeletrônica que garante temperatura confortável para cães RAFAEL COSTA E SILVA

Alessandra Diógenes

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uantas vezes você já quis que alguém inventasse alguma coisa que facilitasse sua vida? Ranieri Silvestre de Barros, de 19 anos, de Suzano, pensava assim também. A diferença é que ele foi à luta e tirou uma ideia do papel. O jovem buscou aprender coisas novas por conta própria. Em 2014, durante uma seca na cidade de São Paulo, quando houve racionamento de água e calor excessivo, Ranieri começou a pesquisar como ajudar seus bichinhos a se refrescarem. Foi assim que descobriu uma pulseira para humanos desenvolvida por alunos do The Massachusetts Institute of Technology (MIT), que emitia pulsos eletroeletrônicos, causando sensação de bem-estar. Imediatamente Ranieri pensou em como adaptar a ideia para os cães. Daí em diante ele se debruçou em estudos sobre o as-

Ranieri e Pandora, sua fiel companheira, equipada com a coleira termoeletrônica, durante passeio no parque

sunto, falou com especialistas em saúde dos animais e consultou pessoas sobre os componentes necessários para fazer uma coleira térmica. Após muita pesquisa e tentativas, Ranieri desenvolveu uma co-

leira termoeletrônica que estabiliza a temperatura corpórea dos cães. Em 2015 ele comprou um kit básico de eletrônica e a peça usada na pulseira do MIT, um dispositivo termoelétrico, e começou a fazer testes.

“Tudo que aprendi em eletrônica, em programação, em design de produto, em usinagem para fazer as peças de metal, tudo isso adquiri através do contato com pessoas que sabiam, que eram da área. Fui até eles, perguntei, fui

absorvendo e coloquei a mão na massa”. Ranieri chegou a fazer nove protótipos antes de levar sua ideia para feiras. Quando o produto estava pronto, ele tentou expor na Google Science Fair, mas não obteve sucesso. Por isso, passou a apostar em eventos nacionais. Na Feira Brasileira de Ciência e Engenharia (Febrace), em São Paulo, obteve o segundo lugar. Na Feira Nordestina de Ciências e Tecnologias (Fenecit), no Ceará, ficou em terceiro lugar. Com muito empenho, Ranieri conseguiu ser aceito num curso de Tecnologia, Inovação e Empreendedorismo, com duas semanas de duração, oferecido pela Harvard Undergraduate Brazilian Association (HUBA), parceira das universidades de Yale e Stanford. Ranieri patenteou a marca Mastiff de coleiras e pretende iniciar a produção até 2019, apesar das dificuldades burocráticas que ainda tem pela frente.

Jovem supera expectativas e se torna pesquisadora

Universitário inova no ensino de Física

Helen Santos

O estudante de Licenciatura em Física pelo Instituto Federal de São Paulo (IFSP), Kauã Estevam Cardoso conseguiu, aos 26 anos e no segundo ano da graduação, a aprovação de um projeto de iniciação científica, intitulado “Experimentos científicos como ferramentas de aprendizagem no ensino de Física”, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Orientado pelo professor Ricardo Plaza, o projeto avalia experimentos científicos de baixo custo para facilitar a compreensão de conceitos de Física no ensino básico. Kauã explica que é possível produzir experimentos com materiais de baixo custo e de fácil acesso. “Nós conseguimos explicar Física com uma bola e movimentos

Débora Yumi Kayano, 22, é uma jovem pesquisadora que logo após concluir a graduação em Ciências Biológicas, na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) ingressou no mestrado. A estudante soma no currículo quatro projetos de Iniciação Científica, tendo obtido “Menção Honrosa” no XX Congresso de Iniciação Científica da UMC. Débora conta que o caminho até a pesquisa foi árduo. “Na escola eu era considerada a ‘burrinha’ da turma. Só aprendi a ler e escrever aos 9 anos. Hoje sei que a culpa é de um sistema falho de educação, que não sabem lidar com as dificuldades dos alunos. Por muito tempo as pessoas me fizeram acreditar que eu era burra”, conta.

No mestrado, Débora pesquisa sobre marcadores no DNA e na morfologia, que ajudem a identificar as espécies do gênero de formigas Solenopsis, mais conhecida como “lava-pés” ou formigas de fogo. O objetivo é identificar como essa formiga age em ambiente populoso, a fim de evitar a diminuição da biodiversidade da espécie. “Sofri um pouco com crises de ansiedade no começo do semestre, pois tinha uma avalanche de coisas para fazer, resolver e ainda tinha a preocupação com os cortes de bolsas de pesquisa que estão ocorrendo”. Ela incentiva outros jovens a também enfrentarem desafios: “Quando tomarmos consciência de que pequenas ações impactam a sociedade conseguiremos fazer uma cascata de mudanças”.

Bianca Schmidt

Projeto prevê uso de materiais cotidianos para ensinar Física

clássicos do futebol, por exemplo. Buscamos situações cotidianas, para facilitar a compreensão. Sem a prática fica muito difícil atrair a atenção do jovem para as teorias.”. Desde 2017, Kauã atua na organização do “Cinedebate e atividades de educação científica e cultural”, composto de palestras, audiovisuais e experimentos para demonstrar fenômenos naturais e tecnológicos. Kauã procura popularizar a ciência na universidade e

nas escolas públicas do litoral norte de São Paulo. “Seria legal estender o projeto para outras regiões, mas por enquanto a Fapesp nos concedeu apenas 12 meses de bolsa. Espero que nesse tempo a gente consiga despertar o interesse pela ciência, já que além de melhorar a qualidade da educação básica, os projetos científicos também contribuem para o desenvolvimento tecnológico e econômico do país”.


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Empreendedor faz sucesso com vídeos no Youtube Empresa familiar ganha destaque entre clientes graças a divulgação por meio das redes sociais FOTO: LARISSA ANJOS

Estudante promove formação política entre jovens MARIANA ACIOLI

Fundador do “Juventude Cidadã” foi jovem prefeito de Mogi

Isabela Macedo Mariana Acioli

Graduado em engenharia mecânica, Bruno também se especializou em gestão empresarial e varejo

Larissa Anjos

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ue ligação poderia haver entre mecânica automobilística e informações turísticas? Bruno Ishikawa, 30 anos, engenheiro mecânico, uniu conhecimento técnico com sua paixão por viagens como forma de fidelizar clientes e fazer bons negócios, com a ajuda do Youtube. Formado pela Unesp de Ilha Solteira, Bruno atualmente é o diretor da Nelson Pneus, empresa de sua família, que está no mercado especializado em venda de acessórios automotivos desde 1988. No período em que esteve na universidade, Bruno desenvolveu um projeto de grupo que visava criar equipamentos para deficientes físicos, as hand bikes, como ficaram conhecidas anos depois. O projeto chegou a ser apresentado em um congresso na Suíça. Na empresa da família, que está localizada na cidade de Suzano,

o engenheiro desenvolveu seu lado empreendedor. Especializou-se em gestão empresarial e varejo. “Hoje em dia eu já me sinto menos engenheiro mecânico e mais varejista. Eu gosto mais da área de varejo do que propriamente de engenharia mecânica.” O interesse pela área administrativa veio da necessidade de ter uma relação mais próxima com as pessoas, possibilidade que não existia na engenharia mecânica, justamente por ser uma profissão mais técnica. Isso fez com que ele utilizasse as redes sociais como ferramenta para se aproximar do público. Responsável pelo departamento de marketing e divulgação da Nelson Pneus, Bruno viu no Youtube a oportunidade de fidelizar e atrair novos os clientes. A ideia principal era fazer com que o canal, que leva o mesmo nome da empresa, não se limitasse a divulgar os serviços realizados na loja, o que, segundo Bruno, atrairia mais pessoas.

Pensando nisso, transformou o canal em algo que pudesse atrair a atenção dos seguidores, por meio de indicações de viagens acessíveis. Através de vídeos, o canal mostra roteiros de lugares onde é possível chegar em poucas horas, praias e cidades do interior de São Paulo. Bruno cuida de todos os detalhes, desde a programação do roteiro da viagem, até a gravação e se preocupa em mostrar os gastos com alimentação e aluguel de equipamentos de mergulho, por exemplo. Ele se empenha para que as informações sejam as mais transparentes possíveis. Os vídeos fizeram sucesso entre os clientes. Hoje Bruno se tornou o rosto da empresa, graças à sua veia empreendedora e ao uso das redes sociais, unindo a tradição do negócio familiar com as facilidades das novas mídias. “Para o futuro, planejo expandir ainda mais a empresa e a interação com o público”.

Com apenas 19 anos, Itânio Mariano teve a experiência de ser o primeiro jovem prefeito da cidade de Mogi das Cruzes, em 2016. Antes, em 2015, ele participou do Parlamento Estudantil, na Câmara Municipal, e se tornou Jovem Vereador. Em 2016, foi eleito conselheiro para a gestão 2016-17 do CACS-Fundeb, da Secretaria de Educação da cidade. Em 2017, foi eleito Conselheiro Municipal de Juventude. Além disso, Itânio é palestrante, embaixador do Politize, líder da Rede de Ação Política Sustentável (RAPs) e fundador do movimento Juventude Cidadã, que faz um trabalho social com jovens estudantes de escolas públicas de Mogi das Cruzes. Atualmente ele cursa Relações Internacionais na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC). Itânio revela que seu olhar para a política surgiu na eleição presidencial de 2010. A atuação política efetiva começou em 2012, no Grêmio Estudantil, aos 13 anos. A partir daí, começou a entender o potencial transforma-

dor que a política tem na vida das pessoas. “É essencial falar sobre política com a juventude”, defende. “Precisamos falar sobre a importância da democracia na sociedade e sobre o quanto a política, em suas diversas formas e esferas, está presente em nossas vidas”. A motivação de Itânio vem da percepção do quanto a consciência política é importante para a população. “Cansei de ver jovens desapontados com a política”. O movimento Juventude Cidadã foi criado em outubro de 2017, juntamente com Yasmin Frezzato e Vinícius Okanishi, todos alunos da UMC. O objetivo é centralizar as atividades para formar consciência cidadã nos jovens e acompanhar e fiscalizar as atividades da Câmara Municipal e dos Conselhos Municipais. “As pessoas não conhecem o papel dos seus representantes”, alerta Itanio. Além da fiscalização, eles promovem uma maior socialização entre os jovens da cidade através de eventos que agregam esporte e cultura, sem deixar de lado a responsabilidade política.


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