ENS - Carta Mensal 259 - Outubro 1989

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A SEGUNDA INSPIRAÇÃO


UM MOMENTO COM A EQUIPE DA CARTA MENSAL Aproxima-se o mês de novembro, e com ele, o momento em que todos nós, brasileiros, iremos escolher um Presidente da República que dirigirá os destinos da Nação a partir de 1990. Inseridas nesta Nação e inseridas na Igreja que está no Brasil, as Equipes de Nossa Senhora e sua Carta Mensal jamais poderiam ficar alheias a assunto de tamanha importância. Os rumos que uma nova administração do Estado brasileiro irá imprimir ao tratamento do bem comum, às condições em que as famílias e os casais de nosso país estarão caminhando na busca de sua realização e de sua felicidade , não podem nos deixar indiferentes . Desde o seu número de agosto, a Carta Mensal vem, neste sentido, publicando alguns artigos voltados ao assunto. Este mês, além da continuação daqueles artigos, apresentamos também um apelo da CNBB, que vem contribui r para que todos os casais do Movimento possam formar um melhor j uízo da realidade dessas próximas eleições. Temos também recebido algumas cartas a respeito do assunto. Aos nossos irmãos que nos escrevem, agradecemos as contribuições e queremos esclarecer que não é nossa função indicar ou "pichar" candidatos, mas apenas colaborar para esclarecer, numa visão cristã e numa visão de Igreja, os critérios que parecem importantes na realidade do processo democr4tico. Temos a certeza de que todos compreendem esta nossa posição.

-o O oPor falar em correspondência , entre as cartas que temos recebido, queremos destacar a que nos enviou D. José Newton de Almeida Baptista, Arcebispo Emérito de Brasíl ia. Neste mês de outubro, que a Igreja consagra às missões, D. José Newton nos lembra uma das principais responsabilidades das fam ílias e dos casais cristãos: o zelo pelas vocações sacerdotais . " Sem dúvida, - diz D. José Newton, - a vocação sacerdotal é a maior glória da família. Mas , hoje sobretudo, ela não é só glória, mas responsabilidade!" -o O o-

o Conselheiro Espiritual da Carta Mensal, Frei Barruel, costuma fazer, em cada uma das reuniões de nossa Equipe, uma pequena estatística, para saber que porcentagem da Carta Mensal é escrita por padres e por leigos. Embora nos tenhamos aproveitado da riqueza dos boletins que recebemos dos diversos Setores , temo-nos ressentido da falta de artigos de casais equipistas escritos para a Carta Mensal. Gostaríamos de melhorar a estatística do Frei Barruel, para o lado dos leigos! Agradecemos a todos aqueles que nos têm enviado sua contribuição, mas seria muito bem se fossem em maior número. Não se esqueçam : esta Carta é de vocês ! \

Fraternalmente A Equipe da Carta Mensal 1-


EDITORIAL

DE ONDE VEM A MORAL DOS POVOS Existem coisas realmente bem curiosas na história e na evolução do mundo. Pascal, o grande filósofo francês, dizia que se o nariz de Cleópatra fosse maior, a história poderia ser diferente .. . Pequenos detalhes podem, aparentemente, mudar a face do mundo ~ O que leva o mundo a mudar? A passar a viver de forma diferente? Será que existem em algum lugar " decisores" secretos que agem às escondidas? Mas de onde viriam seus poderes? Paremos de sonhar! Os pensadores vivem dando a sua opinião: " Não são as idéias que conduzem o mundo, mas as paixões", e outras reflexões profundas do gênero. Quando relemos a história da Igreja, quando estudamos coletâneas d~ grande homilias, percebemos que em cada época, em cada geração, verberava-se, do alto da cátedra, a decadência dos costumes e a perda do sentido moral. Quanto a nós, cremos que o Evangelho possui uma força de persuasão incomparável, que a Palavra de Deus é poderosa. Cremos na eficácia dos métodos de pastoral e de apostolado, e procuramos incessantemente aperfeiçoá-los, modernizá-los. Mas a conversão dos povos, dos grupos, e até mesmo dos indivíduos raramente é imediata. Leva tempo. E preciso que o fruto amadureça, e que, muitas vezes, a semente morra primeiro na terra . De forma mais prosaica, digamos que para que os povos mudem de mentalidade, é preciso que exista um determinado "ethos". Eis uma palavra difícil de traduzir aqui. Não é simplesmente uma questão de moral, como a palavra poderia sugerir. Trata-se, em vez, de um ambiente, de uma maneira de sentir, de uma atmosfera geral que leva a caminhar num determinado sentido ou noutro. E é difícil saber a que se deve! Existem idéias, princípios, que podem ser repetidos centena.s de vezes, sem sucesso. Não pegam. Porque remamos contra a correnteza, porque o tempo ainda não chegou, porque não existe um "'ethos" favorável. De repente, um dia, pega. Não se sabe bem por que . .. Os modismos, as modas, que passam rapidamente, são uma espécie de demonstração deste "ethos", suas manifestações limitadas e episódicas. E a pergunta pode ser feita neste nível : quem lança esses modismos e por que pegam? -2-


Mas por que comecei a falar destas coisas com vocês? por uma razão muito simples e que nos interessa diretamente. Nas Equipes de Nossa Senhora, tentamos proclamar os valores do matrimônio cristão: o amor, a fidelidade, a fecundidade, a santidade ... Estudamos estes valores, esforçamo-nos para compreendê-los melhor, para vivê-los melhor, ao preço de tanto esforço .. . E qual é o resultado em torno de nós? Até mesmo em nossas próprias famílias, até mesmo com nossos próprios filhos . .. Sabemos até que ponto o aborto, a contracepção - para não falar do resto - estão em voga hoje. Freqüentemente, o filho passou a ser, em nosso mundo, um "indesejável". Eis que de 'repente o vento muda. As estatísticas o demonstram. Será que alguém descobriu o argumento decisivo? Não! O caso é bem mais simples, e é aqui que se pode avaliar o que determina a moral dos povos . . . Bastaram alguns filmes de sucesso em torno de um adorável nenê: "'Três homens e um bebê", e logo depois sua sequela americana ... E a mídia dá seqüência; cada vez mais, para vender desodorantes ou sabão em pó, os comerciais mostram cenas de ternura em torno de um nenê. E delineia-se no horizonte um "babyboom". Os bebês estão na moda, o "ethos" se tornou favorável. O que centenas de sermões não fazem, uns poucos filmes conseguem. B matéria para refletirmos. Vou tirar daí duas lições. Primeiro, que não damos importância suficiente à mídia, que sem dúvida não tem igual para moldar as mentalidades. Ela possui uma ação secreta, que não se percebe; que se sofre passivamente e que pouco a pouco nos transforma. Qual é a imagem que ela dá do casal, do amor, do casamento? A mídia é ao mesmo tempo reveladora e agente de uma desestabilização nestes campos. Vamos simplesmente ser passivos e nos deixar alienar? A segunda lição, é que o melhor argumento para convencer e converter não são os discursos, as declarações, as reivindicações .. : mas a inveja! Dar água na boca! O que significa que se quisermos - e a nossa missão é esta - ser apóstolos de uma concepção cristã do casal, da família, do matrimônio, nosso melhor trunfo apostólico é causar inveja: suscitar o desejo de fazer como nós. Não existe melhor receita do que buscar realmente na vida conjugal o amor, a felicidade, a santidade. Que deveriam causar inveja. Fr. Bernard Olivier, OP.

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CARTA DA EQUIPE RESPONSAVEL INTERNACIONAL

"BUSINESS IS BUSINESS"? "'Querem ser competentes na própria profissão ... " Sim, os Estatutos falam do. assunto, e também o documento sobre a Segunda Inspiração divulgado em Lourdes. Mas temos a impressão que. nas Equipes, nem sempre se dá bastante atenção ao trabalho profissional e a suas repercussões sobre a vida conjugal e familiar. Tampouco temos a impressão de que a terceira encíclica de João Paulo 11, a "Laborem Exercens" (1981), publicada 90 anos após a "Rerum Novarum", tenha tido muito eco nos meios cristãos. Será que existem em nosso meio compartimentos que distorcem as nossas perspectivas? Trabalhadores durante a semana, marido ou mulher, pai ou mãe no domingo, equipistas uma noite por mês, senhor ou senhora ·iguais-a-todo-mundo' o resto do tempo. . . A busca de um maior progresso espiritual por meio das Equipes não pode excluir a realidade do trabalho humano, de nossa experiência cotidiana a respeito, do sentido cristão que convém lhe dar. Não estamos convencidos de que esta dimensão fundamental da pessoa no trabalho seja suficientemente levada em conta. e claro que de vez em quando nos interessamos na equipe pela ocupação profissional de cada um. Mas as trocas de experiência sobre o assunto são bastante raras. Conhecemos mais ou menos a profissão ou o 'sem-profissão' uns dos outros. Mas o que sabemos a respeito das condições concretas em que se exerce a profissão que, para a maioria de nós, ocupa a maior parte do tempo? Pouco, reconheçamo-lo, como se se tratasse de um mundo à parte, impenetrável. Aspirações e decepções, dificuldades e constrangimentos, trabalho que valoriza ou que custa, relações humanas no trabalho, compatibilidade das tarefas com as nossas convicções profundas, honestidade profissional, opções éticas, etc., são todos pontos que nos marcam profundamente. E quando vemos um ou mais de nossos irmãos de equipe levados ao desemprego, temos nós a vontade de perceber o sofrimento que causa uma discriminação injusta e de dar nossa ajuda se pudermos? Já que o Movimento é como uma grande família, na qual todas as idades estão representadas, será que vamos demorar muito ainda para ajudarmo-nos mutuamente a passar por certas etapas difíceis da vida, entre as quais . a aposentadoria não é a menor? Não seria nesta direção que deveríamos "personalizar" nossas obrigações, que não são chamados de meios concretos de esforço à toa?

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Nosso objetivo, ao escrever esta carta, não é o de suscitar trocas de idéias sobre os múltiplos aspectos do trabalho, onde quer que estejamos, numa sociedade super-industrializada ou num país em desenvolvimentos. Sem dúvida, existem pelo mundo organizações de inspiração cristã que fazem disto sua maior preocupação específica. Mas num movimento de espiritualidade conjugal como o nosso, o que poderíamos empreender, na linha dos Estatutos e sobretudo da Segunda Inspiração? Um primeiro passo consistiria em não desconhecer as profissões que exercemos. Fomos informados de que existem, nos arquivos das ENS, os resultados de uma pesquisa realizada em 1963 sobre "trabalho profissional e vida de família". Otimo! Mas quem pode afirmar que, passado um quarto de século, os Setores ainda conhecem a vida dos equipistas sob este ângulo? A pergunta "quem são vocês?" continua sendo essencial, mas a questão ,. o que vocês fazem e como?" não deixa de ser profundamente vinculada a ela. Uma outra medida consistiria em fazer uma avaliação em profundidade de nossa vida profissional. Se as ENS são uma escola de formação permanente, como o lembra A Segunda Inspiração, "esta formação nos ajuda a interpretar o desígnio de Deus sobre o nosso casal e nos convida a ajustar nossa vida conjugal, familiar e profissional aos valores do Evan· gelho. Fazer compreender o sentido cristão do trabalho do homem e da mulher no plano de Deus, não dissociar as exigências da moral privada das da moral social, são também objetivos que devem ser perseguidos" (v . 3-1, pg. 9). A expressão "business is business" ( 1) não pode transformar-se para nós, em regra de vida implícita. "Com demasiada freqüência, situamos Deus ao lado da realidade, em vez de vê-lo dentro dela, em vez de compreender os homens e as coisas através d'Ele; e por colocarmos Deus fora do mundo, acabamos colocando o mundo no lugar de Deus" (2). O Espírito Santo nos interpela a todos, a uns através dos outros, a respeito do que fazemos. Pois não consiste nossa vocação de cristãos em cooperar com a criação do Pai , de toda a realidade que nos é dada conhecer e transformar? Seria portanto preciso em casal (no dever de sentarse) e em equipe (na coparticipação) , rezar com esta finalidade e questionar-nos mutuamente sobre a maneira de identificar os apelos, de discernir o que é bom ou não, o que é razoável ou não, o que é útil ou não, o que nos desabrocha ou nos destrói na " carreira" que seguimos. (1) "Negócios são negócios, amizade à parte", diríamos no Brasil (N. T.). (2) R. Guelluy, Vie de foi et tâches terrestres, ed. Casterman, 1966, pg. 114. (Tradução em inglês sob o título "Christian commitment to God and the world", Desclée, N . York).

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Um espírito de decisão deve nos incitar a submeter à reflexão de nossas comunidades cristãs as questões que atormentam a nossa consciência. Por exemplo, "a opção preferencial pelos pobres" no trabalho (e nem tanto fora dele), para citar apenas esta, põe à prova o realismo com que encaramos o amor cristão. E o que dizer de nossos filhos, para os quais um certo tipo de amor nos leva a desejar uma brilhante ascensão social! O que significa o suce~so para nós? Não estaria por demais ligado · à perspectiva do lucro? Por fim, como podemos permanecer insensíveis às mudanças que se preparam em torno de nós, em conseqüência da busca de um maior equilíbrio entre vida profissional e vida familiar? Léon, que é professor universitário, constata a preocupação crescente dos jovens, às vésperas de sair à procura de seu ganha-pão de " não esquecer a família por. causa do trabalho". De seu lado, Annette, que não tem uma profissão específica no sentido social da palavra, cruza com cada vez mais mulheres jovens, mesmo cheias de diplomas, preocupadas com uma presença qualitativa junto a seus filhos. E o que dizer, homem e mulher, de nossa responsabilidade quanto ao ambiente que reina nos locais de nosso trabalho, sem dúvida mais abertos hoje, mas ainda expostos a muitos desacertos. Quantos casais encontram a fonte de sua desunião em atitudes equívocas no trabalho, onde a imprudência e a falta de cuidado são infelizmente habituais? Este recado será lido? Perdoem-nos por expressar esta dúvida, cada vez que um de nós, da ERI, é encarregado de apresentá-lo. Será uma garrafa lançada ao mar de nossas preocupações ou de nossas indiferenças? Pode ser. Mas a convicção de que é possível renovar-se nas Equipes de Nossa Senhora nos leva a terminar de forma diferente. Possa o sopro do vento que reina no alto mar levar nossa garrafinha ao bom porto e ao coração da amizade de vocês! Muito cordialmente, "von Haus zu Haus" (3) como dizem nossos amigos alemães. Annette e Léon Dabin

(3) Literalmente, "de nossa casa para sua casa" (N. T.).

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A EC/R CONVERSA COM VOCES

VOC~ JÁ

ESCOLHEU EM QUEM VOTAR?

Novembro está chegando. Nesse mês você será chamado duas vezes a assinalar nomes e colocar cédula na urna, para ser contada junto com as cédulas de seus irmãos: os brasileiros, numa eleição nacional , e os equipistas , numa eleição na comunidade. Ntls duas eleições você está sendo chamado a um exercício de esperança e de amor. Quanto à eleição nacional , permitam-nos a lembrança e a sugestão de que releiam os artigos da Carta Mensal de agosto e setembro últimos, escritos por Maria Tereza e Carlos Heitor, que apresentam reflexões válidas , pertinentes e muito objetivas. Semelhantemente às reflexões referidas, vamos procurar critérios para melhorar a qualidade de nosso voto , na eleição que indicará em cada equipe o próximo Casal Responsável. E bás ico para que nosso voto tenha qualidade, que procuremos à luz do Evangelho, imergir na sabedoria do Espírito Santo para recolher a história e a realidade atual de cada casal, a história de nossa equipe e, a partir daí, discernir sobre qual o casal que apresenta hoje as melhores condições para prestar o serviço de Casal Responsável. Primeiramente , qual a efetiva disponibilidade para o serviço que podemos perceber no quotidiano em cada casal? Disponibilidade física, de tempo e de saúde , e também disponibilidade de mente e de coração? Em seguida , qual o casal que tem demonstrado estar mais atento ao caminhar do movimento? Nosso Casal Responsável é importante para ajudar-nos a viver em profundidade a mística e a pedagogia do movimento , como o caminho que escolhemos para nossa realização e santificação como casal cristão .

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Perguntemo-nos , qual o casal que tem acompanhado a Igreja em seu peregrinar no tempo, amando o próximo em seu lugar, em cada época ; e que para isso esforça-se por atualizar-se, esforça-se por estar presente na construção do Reino . O Casal Responsável é importante para fazer com que nossa equipe participe efetivamente na vida eclesial , na evangelização da humanidade .

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É assim que votar na eleição em equipe é um exerc1c1o de amor. Somente com amor o reconhecer a história de nossos irmãos atinge toda a plenitude. O amor nos faz penetrar o mistério de cada casal, saber receber suas qualidades e ajudá-lo a ultrapassar suas dificu ldades para bem doar-se no serviço à equipe. É assim que votar na eleição do Casal Responsável é um exercício de esperança, que enraíza-se na fé. A presença do Espírito Santo na pequena Igreja, que se reune, ora e recebe ativamente sua sabedoria através da história das pessoas, dos fatos e do amor compartilhado, permite-nos estar sempre em direção de um futuro onde melhor se realiza o Reino de Deus.

Aproveite este momento que novembro vai nos oferecer. Pare! Busque conhecer. Dialogue. Viva. Efetue este exercício de1 esperança e amor, no plano nacional e em sua equipe. Beth e Rômolo

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NOTlCIA BREVE "Paz com Deus Criador, Paz com toda a Criação" é o tema escolhido pelo Papa João Paulo 11 para o Dia Mundial da Paz (1. 0 de janeiro) de 1990. É um convite de Sua Santidade à comunidade internacional para refletir sobre o aspecto moral da crise ecológica mundial. Porque o modo como as pessoas e os povos utilizam a terra e os seus bens reflete diretamente a verdadeira concepção que eles têm da vida, das relações entre povos e grupos, do próprio mundo. A situação atual, que atinge todas as partes do mundo é portanto essencialmente uma crise moral.

Na recente encíclica Sollicitudo rei socialis, o Papa dizia que a solidariedade é uma virtude moral (n. 0 38) . Não se pode obter um ambiente são sem esta virtude, sem o concurso, moralmente inspirado, dos esforços de todos. Está nisto um convite urgente a trabalhar em conjunto para a paz, que só pode nascer da justa ordem moral.

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SEGUNDA INSPIRAÇÃO

UMA BUSCA CONTíNUA A Segunda Inspiração não é algo pronto a ser passado às bases e por isto pode estar proporcionando alguma dificuldade. A Segunda Inspiração é, antes de mais nada, um espírito. Um espírito de busca do verdadeiro sentido da proposta do Movimento, visando um esforço muito grande por uma coerência de vida, sem a qual não se pode caminhar para a vivência plena do amor, para a felicidade e para a santidade - o grande objetivo das Equipes para os casais. Essa busca exige o aprofundamento de alguns aspectos importantíssimos relacionados com a vivência conjugal, mas sempre com os pés bem firmes na realidade de hoje. Estamos convencidos de que o casamento é um caminho privilegiado para se viver o amor, para se alcançar a felicidade e para se caminhar para a santidade. Deus criou o casal. Criou-os à sua Imagem. Criou-os pois para se amarem com o seu próprio amor , para se santificarem com a sua própria santidade (pela sua graça) e assim serem felizes, como um reflexo do amor e da santidade que ele é. São Paulo, na carta aos efésios, refere-se ao mistério da relação de Cristo com a Igreja, que eleva e transfigura a vida matrimonial. '"Por isso deixará o homem o pai e a mãe e se unirá à sua mulher e serão os dois uma só carne. Grande é este mistério. Quero referir-me a Cristo e sua Igreja" (Ef. 5,31-32) . A relação do casal deve, pois, ser a imagem da relação de Cristo com a Igreja. E isto significa, como diz São Paulo, que como Cristo amou e se entregou pela Igreja para santificá-la, assim também nós devemos amar e nos empenhar pela santificação do nosso cônjuge. No versículo 52 do capítulo 2 de São Lucas está escrito: "Jesus crescia. em sabedoria, idade e graça diante de Deus e dos homens". No nosso entender, isto significa que Jesus não teve que crescer apenas fisicamente , mas também em espírito, isto é, ele foi aos poucos tomando consciência de quem ele era, foi crescendo na comunhão com o Pai e com o outro e no discernimento de sua missão. Por isso sentia a necessidade dos períodos de oração profunda, de intimidade com o Pai. -9-


Nós, infinitamente mais, temos que crescer em nossa vida, até o fim, pois, além de crescer em sabedoria, idade e graça, temos que aprender a superar nossas limitações, nossas fraquezas; temos que aprender a amar, a -desenvolver e utilizar todos os dons que recebemos de Deus; enfim, temos que caminhar para a santidade e Jesus sempre foi santo. Todos são chamados a fazer essa caminhada para a santidade: casados e celibatários. Nós, casados, devemos caminhar para essa perfeição através do nosso matrimônio. Um ponto que nos parece essencial nessa caminhada é o conhecimento próprio. Não se cresce no amor, não se constrói a felicidade, não se caminha para a santidade, se não se conhece, se não se assume a própria realidade. Está claro que não nos conhecemos de uma vez por todas. A busca do conhecimento próprio é uma tarefa para toda a vida. Mas à medida que vamos nos conhecendo, além de irmos nos conscientizando melhor da nossa dependência de Deus, da necessidade que temos do outro, ainda vamos poder melhor distinguir os esforços a serem empreendidos. Na busca do conhecimento da própria realidade, os cônjuges muito podem se ajudar, não somente porque o outro é como se fosse um espelho no qual nos miramos e a partir das diferenças e semelhanças constatadas, nos descobrimos, mas também e principalmente, porque a atenção constante, própria do amor de um para com o outro, leva à descoberta de aspectos escondidos da personalidade de cada um , inclusive no que se refere à sexualidade. Esse é o milagre do amor. Um outro ponto que achamos importante na caminhada: é preciso derrubar as barreiras que colocamos à graça de Deus , que agindo em nós , nos transforma segundo sua vontade . Também aqui os cônjuges se entreajudam, principalmente pela busca de sintonia da unidade casal com a vontade de Deus, através da oração vivida a dois no dia-a-dia; oração em que a aridez de um é compensada pela fecundidade do outro; onde os bloqueios de um são superados pela graça que passa pelo amor do outro. Ainda um outro ponto que julgamos dever lembrar : precisamos cooperar com a graça de Deus, esforçando-nos para corresponder à sua vontade. Aqui também o outro, muitas vezes mais preocupado que nós próprios, está empenhado em nosso aperfeiçoamento e nos ajuda, através de palavras, mas também e principalmente através de atitudes de amor, em nossa conversão; nos ajuda a alcançarmos a coerência de vida. Outro milagre do amor. Jesus e os discípulos de Emaús. Os olhos destes se abriram, reconheceram Jesus, se transfrmaram e decidiram voltar para Jerusalém -

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para anunciar a ressurreição, não pelas palavras de Jesus, mas pelo gesto de partilhar o pão. Não teria Jesus aí sido reconhecido pelo amor inconfundível que certamente colocou nesse gesto de partilha? Atitudes de verdadeiro amor não deixam de produzir seus efeitos, e com elas os cônjuges vão se auto-ajudando na caminhada. Deus criou o casal para se amarem, para se santificarem mutuamente, mas também para uma missão: estarem abertos à vida, não somente através da procriação, mas também e principalmente através do amor, no qual se inclui o amor aos irmãos. E como vamos concretizar esse amor aos irmãos? Colocando-nos ao serviço dos mesmos, lavando-lhes os pés. Jesus nos deu o exemplo lavando os pés de seus discípulos e recomendando:

"Dei-vos o exemplo para que, como voz fiz, assim também façais vós . .. Se compreenderdes isto e o praticardes, sereis felizes" (Jo. 13, 15, 17) .

E como lavar os pés de nossos irmãos? Principalmente ajudando-os a compreender todas essas coisas que, vividas no matrimônio, irão propiciar-lhes a verdadeira felicidade, embora neste mundo totalmente adverso à realidade conjugal e apesar de todas as dificuldades que o casal enfrente hoje na luta pela vida. E nós também seremos mais felizes, porque estaremos cumprindo o mandato de Cristo, de lavarmos os pés uns dos outros. Cidinha e lgar

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ELEIÇÕES/ 89

PARTICIPAR COM ESPERANÇA Apelo do Conselho Permanente da CNBB O Brasil vive, hoje, uma crise de singular gravidade, cuja natureza, raízes e conseqüências não nos cabe, no momento, analisar. Essa crise gera desânimo e perplexidade que ameaçam tomar conta de numerosos concidadãos com resultados incontroláveis e dificilmente reparáveis. Preocupados com esta situação, não podemos omitir-nos. Julgamos, pois, de nosso dever, como Bispos da Igreja Católica, alertar para três pontos importantes e urgentes : 1) Nosso país está buscando caminhos para completar a transição democrática, através da consolidação do novo ordenamento jurídico da sociedade brasileira. Queremos valorizar a iniciativa da Presidência e da Comissão Episcopal de Pastoral da CNBB em requerer do Congresso Nacional empenho urgente na elaboração das Leis Complementares e Ordinárias, sem as quais a Constituição Federal não pode ser considerada plenamente em vigor. Pedimos às dioceses e aos Secretariados regionais que acompanhem atentamente os trabalhos das Assembléias Constituintes Estaduais, para que as Novas Constituições dos Estados não percam os disponíveis espaços de criatividade e não defraudem sérios anseios do povo. Em especial, esperamos que as Igrejas Locais consigam animar as comunidades para que participem ativamente no processo de elaboração das Leis Orgânicas dos Municípios, segundo os critérios Evangélicos. Afinal, é nos Municípios que vive, trabalha, sofre e se alegra o nosso povo. 2) Muitos nos têm perguntado sobre os critérios para a escolha do futuro Presidente da Repblica. A Igreja não tem partido nem indica candidato. No entanto, em nossa última Assembléia Geral, " lembramos a todos o dever de participar conscientemente das próixmas eleições do Presidente da República e das futuras eleições dos integrantes do Congresso Nacional. Critérios para a escolha dos melhores candidatos serão os compromissos que eles assumam de contribuir para a construção da verdadeira democracia e, particularmente . . . as garantias que ofereçam pela coerência de seu testemunho de vida" (Exigências ~ ticas da Ordem Democrática, n. 0 18) . Em seu esforço em " ouvir os clamores do povo" o episcopado requer, também, no mesmo documento, dos candidatos à Presidência da República, o atendimento a exigências prioritárias, tais como: necessidade de uma política agrícola que garanta a permanência do pequeno agricultor no campo, bem como a execução de uma Reforma Agrária justa e eficaz ; -12-


necessidade de garantir a justa distribuição social do solo urbano; necessidade de preservar e renovar o meio ambiente; apóio à luta dos trabalhadores "pela justiça social, pelos justos direitos dos homens de trabalho"; incentivo à participação dos trabalhadores nos sindicatos, na gestão das empresas e nas decisões sobre os problemas de toda a sociedade; necessidade de medidas que garantam a função social da empresa; necessidade de a dívida externa ser submetida a uma auditoria pública, com a participação do Poder Legislativo e de organizações representativas da sociedade civil ... (Cf. n. 0 108 a 115). Por sua especial relevância, queremos ainda acrescentar a necessidade de assegurar os direitos das populações indígenas à vida digna e à própria cultura. E. necessário ter a coragem de escolher o candidato que seja capaz de acolher e administrar as mudanças em vista do bem comum. Estas mudanças devem ser promovidas sem violências, sem distúrbios, mas com coragem para transformar profundamente a inaceitável situação social do Brasil. O candidato por se escolher, além da necessária competência e honestidade, deve ter provado pela sua vida passada ser prudente, corajoso e comprometido com as justas causas populares. As pesquisas sobre a intenção do voto devem ser discutidas e interpretadas criteriosamente. Devemos votar nos candidatos e partidos que mereçam nossa confiança. Não basta votar só para vencer, é necessário o voto lúcido. Nossas comunidades saberão encontrar iniciativas para exame e debate desses critérios. 3) O povo deve manter-se alerta, informado, mobilizado e organizado para exercer responsavelmente a cidadania e exigir a correta atuação das autoridades. . Com efeito, a Democracia "consiste na simultânea realização da liberdade da pessoa humana e participação de todos nas decisões econômicas, políticas, sociais e culturais que dizem respeito a toda a sociedade" (Exigências E.ticas . . . n. 0 66). '"São muitas as dificuldades para se construir uma democracia alicerçada nos valores éticos e cristãos. Com verdadeira ansiedade pastoral, para que não se confunda democracia com permissividade moral, pedimos que todos colaborem na urgente tarefa da educação ou reeducação dos comportamentos individuais, familiares e sociais, hoje tão perigosamente deteriorados entre nós" (Exigências E.ticas .' . . n. 0 119). Alimentamos a convicção de que, se isto acontecer, poderá o Povo, com a graça de Deus, viver a salutar Esperança Cristã que não admite desânimo. Brasília-DF, 25 de agosto de 1989 -13-


ELEIÇOES/ 89

O VOTO CONSCIENTE Retomamos esse tema geral, sempre de forma muito despretensiosa e apenas com o intuito de ajudar a reflexão dos nossos leitores quanto à eleição presidencial que se aproxima. Desta vez usamos como referência o Documento n.o 40 da CNBB: "Igreja: Comunhão e Missão na evangelizção dos povos, no mundo do trabalho, da política e da cultura", título do tema central da 26.a Assembléia Geral da CNBB , realizada de 13 a 22 de abril de 1988. Em seus parágrafos de n.o 184 a 227 o documento aborda especificamente a questão da evangelização do mundo da política de tanta atualidade no momento presente. I

A Igreja (e nós somos também Igreja). não pode ignorar a política, não apenas enquanto instrumento necessário de organização social mas, sobretudo enquanto expressão de opções e valores que definem os destinos do povo e a concepção do homem. Pregando a verdade e iluminando todos os setores da atividade humana pela sua doutrina, e pelo testemunho dos fié is, a Igreja respeita e promove, também, a liberdade política e a responsabilidade dos cristãos. No Brasil, saímos há pouco de um reg ime em que o planejamento sócio-econômico e sócio-político era concebido em gabinetes fechados sem, necessarimente, a preocupação de atender às exigências, necessidades e anseios populares e sem a devida participação dos segmentos da sociedade. Ao completar-se o processo de plena redemocratização do país, decisões importantes no setor econômico e político vêm sendo, e serão, cada vez mais, tomadas por parte e por influência dos políticos. Acontece, porém, muitas vezes que interesses clientelistas ou de grupos poderosos ameaçam prevalecer sobre as aspirações, necessidades e interesses fundamentais relevantes da nação, daí a desconfiança, cada vez maior, do povo em relação à vontade política das elites e dos segmentos dirigentes em resolver os problemas fundamentais desta nação. Esse descrédito da classe política no seio do povo e que chega às raias do ceticismo é altamente preocupante para o nosso futuro. O tratamento que a "res pública" vem merecendo por parte das classes dirigentes atenta contra o bem comum , de modo que ela parece mais

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uma fonte de benefícios e de privilégios pessoais do que a busca do bem de todos e, especialmente, dos mais carentes . Por outro lado, amplas parcelas da população percebem, cada dia melhor, que precisam participar do controle do poder, a fim de que ele não sirva preponderantemente aos interesses das classes dominantes. Tomemos atenção, porém, uma vez que na "Nova República" o discurso da libertação, assumido por aqueles que realmente se comprometeram com o processo de transição democrática, tornou-se lugar comum até mesmo para aqueles que, ontem, foram os principais detentores ou, no mínimo, beneficiários e coniventes com o poder discriminatório e hoje pleiteiam o nosso voto . ~ a enorme distância vigente entre tal linguagem e a prática diária de suas decisões e ações políticas que mais produz descrédito, desconfiança e ceticismo na população. Já, para Jesus , o poder legítimo caracteriza-se pelo serviço e não pela dominação . Só corresponde à evangélica concepção do poder aquele que é exercido em benefício do povo, que se torna, assim, mediação do poder que vem de Deus . ~ por isso que a Igreja proclama que é para o bem da sociedade e para salvaguarda da sua soberania que o poder é necessário, só isso o justifica. A Igreja nos coloca dois conceitos distintos de política e de compromisso político : no primeiro a Política em seu sentido mais amplo visa o bem comum, correspondendo-lhe precisar os valores fundamentais de toda a comunidade e definir os meios e a ética das relações sociais. No segundo, a realizaço dessa tarefa política se faz normalmente através de grupos de cidadãos que se propõem a conseguir e a exercer poder político para resolver as questões econômicas, políticas e sociais, segundo seus próprios critérios e ideologias. ~ neste sentido que se pode falar de política partidária a qual, para a Igreja é o campo próprio dos cristãos leigos, onde gozam de legítima autonomia. Compete a eles a obrigação da séria e responsável participação política até o nível partidário no caso daqueles que se sentirem vocacionados para tanto, sabendo que a política é uma mediação privilegiada da caridade e que a fé cristã a valoriza e a tem em alta estima. Para que os leigos desempenhem' essa sua tarefa específica é sumamente importante que estejam formados e informados para uma participação política que lhes possibilite: -

aprender a fazer a análise da realidade .

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conhecer as propostas e as práticas dos partidos e candidatos e aprender a respeitar a opção partidária dos outros.

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adquirir consciência crítica frente à realidade política .

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desenvolver a sua formação na fé e adquirir sólido conhecimento da doutrina social da Igreja e avaliar com critérios evangélicos a realidade e a ação política.

A luz destas colocações examinemos o quadro po,lítico atual e reflitamos quanto à responsabilidade de darmos o nosso voto a um dos cand idatos que se apresentam à eleição presidencial. Que o Espírito Santo nos ilumine neste 15 de novembro de 1989! Maria Thereza e Carlos Heitor Seabra Equipe 04/ B - São Paulo, Capital

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ORAÇÃO A NOSSA SENHORA APARECIDA

6 incomparável Senhora da Conceição Aparecida, Mãe de Deus, Rainha dos Anjos, Advogada dos pecadores, Refúgio e Consolação dos aflitos e atribulados, ó Virgem Santíssima, cheia de poder e bondade, lançai sobre nós um olhar favorável, para que sejamos socorridos em todas as necessidades em que nos achamos. Lembrai-vos clementíssima Mãe Aparecida que não consta que de todos os que têm a vós recorrido, invocado o vosso santíssimo nome e implorado vossa singular proteção, fosse por vós algum abandonado. Animado com esta confiança, a vós recorro, tomo-vos de hoje para sempre por minha mãe, minha protetora, minha consolação e guia, minha esperança e minha luz na hora da morte. Assim pois, Senhora, livrai-me de tudo o que possa ofender-vos e a vosso santíssimo Filho, meu Redentor e meu Senhor Jesus Cristo . .. Virgem bendita, preservai a este vosso indigno servo, a esta casa e seus habitantes, da peste, fome, guerra, assaltos, raios, tempestades e outros perigos e males que nos possam flagelar. Soberana Senhora, dignai-vos dirigir-nos em todos os negócios espirituais e temporais, livrai-nos das tentações do demônio, para que trilhando o caminho da virtude, pelos merecimentos de vossa puríssima virgindade e do preciosíssimo sangue de vosso Filho, vos possamos ver, amar e gozar na eterna glória. Por todos os séculos. Amém.

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CAMINHANDO COM A IGREJA

A PREOCUPAÇAO SOCIAL DA IGREJA As páginas seguintes são o resumo do texto da Carta Encíclica • Soiicitude Social" de S S. o Papa João Paulo 11 assinada no dia 30 de dezembro de 1987 por ocasião do vigésimo aniversário da carta sobre o ·· Progresso dos Povos" do Papa Paulo VI. Introdução (n .o 1-10)

O ensinamento social da Igreja constitue um corpo doutrinai sempre atualizado desde Leão XIII até hoj e. A atualidade da encíclica de Paulo VI sobre o desenvolvimento dos povos, de 1967, continua atual na sua aplicação dos princípios do Concílio Vaticano 11. Naquele tempo como hoje, viviam milhões de seres humanos na miséria e no subdesenvolvimento. Focalizava essa encíclica a distribuição desigual dos meios de subsistência , e isso não por responsabilidade das populações vítimas nem por uma espécie de fatalidade, enquanto enormes somas de dinheiro eram utilizadas egoisticamente para o enriquecimento de indivíduos ou de grupos, ou para aumentar os arsenais de armas.

I. Situação atual: aspectos negativos e positivos (n .o 11-26) 1) Aspéctos negativos. Atualmente, o abismo que separa o Norte do Sul se aprofunda cada dia mais, agravado que é pelas diversas velocidades do progresso. As 'esperanças de desenvolvimento de todos os homens e do homem todo vão desaparecendo. O nosso mundo único acha-se dividido em primeiro , segundo, terceiro e quarto mundo. A unidade do gênero humano está seriamente comprometida.

O subdesenvolvimento em nossos dias não é apenas econômico, é também cultural, político, humano. Tem diversas causas, mas é necessário denunciar especia lmente a existência de mecanismos econômicos, financeiros e sociais que, embora conduzidos pela vontade dos homens , chegam a funcionar de maneira quase automática, sufocando as economias dos países subdesenvolvidos. Essa situação provoca efeitos negativos até nos países mais ricos, desemprego, subemprego, etc .

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Politicamente, constata-se a constituição de dois blocos opostos, Leste e Oeste, opondo capitalismo liberal e coletivismo marixsta, e sustentando um antagonismo militar. Da guerra fria pode-se passar para a guerra aberta e total. Ao mesmo tempo, se desenvolve uma oposição Norte-Sul, alimentada pelo imperialismo e pelo neocolonialismo . A divisão atual do mundo torna impossível o desenvolvimento harmonioso de todos , gerando até às vezes um injustificável terrorismo . Há também um problema demográfico, enfrentado muitas vezes de maneira inceitável através de campanhas sistemáticas anti-natalistas, numa completa falta de respeito pela liberdade de decisão das pessoas interessadas . 2) Aspectos positivos: a tomada de consciência em muitíssimos homens e mulheres da dignidade própria e da dignidade de todo ser humano; a convicção da interdependência radical e por conseguinte da necessidade da solidariedade entre todos os homens ligados por um destino comum ; a preocupação com a paz, que depende de todos ; enfim, a preocupação ecológica e a procura de uma autêntica qualidade de vida para todos . 11. O desenvolvimento humano autêntico (n .o 27-34)

O desenvolvimento não é um processo retilinear, automático, necessariamente ilimitado. A mera acumulação de bens não basta, pois gera o materialismo radical , o consumismo, e uma profunda insatisfação. Os que · têm" mais não conseguem "ser" , e tão pouco os que não têm nada . O homem é ao mesmo tempo matéria e espírito. O desenvolvimento deve atingir todas as suas dimensões, e portanto subordinar a posse à sua vocação espiritual. O verdadeiro desenvolvimento é de todos os homens e do homem todo . A Igreja considera de seu dever pastoral indicar neste domínio uma hierarquia de valores que vale para todos os homens, todas as mulheres, todas as sociedades e nações . Em caso algum a necessidade de promover o desenvolvimento pode ser visto como pretexto para impor aos outros o próprio modo de viver ou a própria fé religiosa . Para ser integral, o desenvolvimento deve realizar-se no quadro da solidariedade e da liberdade, respeitando a igualdade fundamental de todos os povos como de todas as pessoas . -19-


111. Uma leitura teológica dos problemas modernos (n.o 35-40)

A avidez exclusiva pelo lucro, a sede de poder, são um mal moral, fruto do pecado . Daí, para chegar a um verdadeiro desenvolvimento, a necessidade de uma mudança de atitudes espirituais, numa consciênc ia sempre maior de interdependência entre os homens e entre os povos, e de uma determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; essa interdependência deve se transformar em solidariedade, cujo resultado é a paz. A superação dos imperialismos deve desembocar na instauração (!e uma verdadeira organização internacional baseada sobre a igualdade Je todos os povos. À luz da fé, essa solidariedade tem dimensões especificamente cristãs, tornando-se expressão da unidade do gênero humano, imagem viva do Pai, resgatado pelo Sangue de Jesus-Cristo, tornado objeto da ação permanente do Espírito Santo.

IV. Algumas orientações particulares (n .o 41-45) A Igreja não apresenta soluções técnicas para o desenvolvimento, mas tem uma palavra a dizer baseando-se sobre o seu ensinamento social, que não é uma terceira via entre o capitalismo liberal e o coletivismo marxista. Não é uma ideologia , mas a elaboração de uma parte da teologia moral , à qual compete denunciar males e injustiças, e proclamar as exigências da justiça e do amor. Abre-se sobre uma perspectiva internacional, lembrando que os bens deste mundo foram originariamente destinados a todos. O direito à propriedade particular, válido e necessário, não anula este princípio fundamental. Isso deve ser respeitado em todos os níveis, individual e coletivo. Somente assim serão contemplados os direitos básicos de todos os seres humanos, a começar pelos mais pobres . Conclusão (n.o 46-49)

O que está em jogo é a dignidade da pessoa humana, ameaçada por crises econômicas mundiais e guerras. A Igreja sabe que nenhuma relização terrestre se identifica com o Reino de Deus, mas que pode refleti-lo e antecipá-lo. O Santo Padre termina suas reflexões pedindo à Santíssima Virgem Maria de nos ajudar e nos proteger a todos . fr. J. P. Barruel de Lagenest O.P.

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MISSÃO DOS LEIGOS NA IGREJA E NO, MUNDO Correspondendo ao pedido dos membros do Sínodo dos Bispos sobre a vocação e missão dos leigos na Igreja e no Mundo, encerrado no final do ano de 87, o Papa João Paulo 11 publicou o documento CHRISTIFIDELES LAICI contendo uma síntese das intervenções e recomendações dos participantes do Sínodo, Bispos e Leigos. Importa assinalar que o documento não reflete apenas o pensamento do Papa, mas condensa as preocupações e indicações pastoriais dos representantes do episcopado e do laicato das mais variadas porções do povo de Deus que compõe a Igreja universal. Não se limita a indicar as recomendações para o modo de atuar dos leigos no presente momento, mas oferece uma valiosa fundamentação teológica para clarificar uma visão da Igreja conseqüente às orientações do Concílio Vaticano 11. Assim, o documento se constitui num verdadeiro manual para servir de roteiro na formação dos leigos militantes nos vários setores da pastoral. Será recomendável que esse roteiro seja completado pelo anterior documento, do Papa Paulo VI, resultante do Sínodo sobre a Evangelização. Ambos, integrados numa unidade, poderão constituir uma base prática para vários programas de formação, tanto para os leigos como para o clero e os religiosos, pois dependerá da compreensão destes uma íntima colaboração para a autenticidade da ação dos leigos. Muito rica é a visão atualizada da missão da Igreja, que se costuma chamar de eclesiologia. Está integrada nesta tríplice distinção: 1) A dignidade dos fiéis leigos na Igreja-Mistério;

2) A participação dos fiéis leigos na vida da Igreja-comunhão; 3) A corresponsabilidade dos fiéis leigos na Igreja-Missão. A dignidade fundamental de quem foi batizado é a de ser enxertado no Cristo recebendo a seiva da vida d'Ele, como o ramo unido ao tronco. A Igreja é a árvore frondosa cujos ramos são os cristãos nela enxertados pelo batismo. Floresce e frutifica na medida em que recebe a vida de Cristo pelo Espírito. Essa é a principal dignidade nossa, pela qual somos todos iguais na Igreja, leigos ou ministros. Eis o mistério da íntima unidade vital entre Cristo e os seus membros, que compõem a Igreja. Como conseqüência, a Igreja é uma comunhão de vida. Seus membros estão em permanente comunhão com o Pai, por meio do Filho Jesus Cristo - no amor do Espírito Santo. E, ao mesmo tempo, comu-21-


nhão fraterna de todos os cristãos entre si. Decorre daí o profundo laço de solidariedade pela santificação de todos. O amor fraterno não permite que ninguém seja menosprezado ou rejeitado, mesmo em meio às divergências e conflitos. E. a base do verdadeiro ecumenismo, que nos leva a manter o amor aos irmãos distanciados por pertencerem a comunidades que interpretam diferentemente seu caminho para Deus. Afinal, foram todos remidos pelo sangue de Jesus Cristo. A comunhão não exclui a diversidade e a complementariedade. Ao contrário, são as diferenças pessoais que realçam a riqueza da composição de toda a Igreja. Riqueza que devia ser muito mais apreciada e aproveitada na grande diversidade dos leigos que formam a maior parte do povo de Deus. Todos os valores que diferenciam os leigos entre si e com os ministros são complementares, destinando-se ao enriquecimento mútuo na construção do Reino de Deus . Finalmente, é a corresponsabilidade dos fiéis leigos na Igreja-Missão que merece uma explicitação maior no documento. Decorre do fato de vivermos em comunhão com Cristo e os irmãos. Muito clara é a palavra de Jesus: '"Não foram vocês que me escolheram; fui Eu que os escolhi e constituí para irem e produzirem fruto e para que o seu fruto permaneça" (Jo 15,16). Jesus nos envia em meio ao mundo para que frutifique a salvação desse mundo. Para esse fim, somos todos enviados, leigos, religiosos e ministros. Somos todos corresponsáveis pela missão, mas com atribuições diferentes. O que Ele não admite é a omissão, a inoperância da acomodação, o medo de comprometer-se na luta. Dirigindo-se especificamente aos leigos, é deles que o documento cobra insistentemente o cumprimento da missão. E para exemplificar as várias atuações que caracterizam a índole secular dos leigos, recorda o que já indicou Paulo VI, na 'Evangelii nuntiandi'. Resumindo tudo na idéia da missão evangelizadora da Igreja, lembrava Paulo VI aos leigos que " o campo próprio da sua atividade evangelizadora é o mesmo mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também o da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos meios de comunicação social e, ainda, outras realidades abertas para a evangelização, como sejam o amor, a família , a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho profissional e o sofrimento" . (E.N. 70). Bastaria essa enumeração de realidades e de tarefas para caracterizar e estimular uma variada atuação de leigos, inspirados na mensagem do Evangelho de Jesus Cristo . Seria a transformação da atual realidade social conduzindo o mundo para uma convivência de pessoas e de povos marcada pelo respeito à dignidade do ser humano, fundada nos preceitos da justiça igual para todos. E. a esperança que temos numa atuação mais consciente e responsável do laicato na Igreja no Mundo de hoje. D. Cândido Padin OSB - Bispo Diocesano - Baurú -22-


OUTUBRO, M:ff.S DO ROSARIO O rosário é uma devoção muito antiga a Nossa Senhora. Seus inícios, cercados de lendas, perdem-se lá pela Idade Média. Mas continua uma devoção viva, tanto por ser popular como por ser teologicamente muita rica. Sempre foi encarecida pela Igreja e especialmente pelos últimos papas . Nós a chamamos de rosário. Guardando a reminiscência de que eram muitas rosas juntadas, em cada Ave-Maria, para louvor de Nossa Senhora. f mais comum falarmos em "'terço", porque habitualmente rezamos de cada vez uma terça parte do rosário. Outros povos preferem dar-lhe o nome de " coroa ", lembrando que era uma coroa de rosas que preparavam para Maria. O rosário se caracteriza tanto por repetir quinze vezes o Pai-Nosso e dez Ave-Marias como pela meditação dos "mistérios" . A repetição parece cansativa e sem sentido para algumas pessoas . Deixará de ser quando se lembrarem de que facilita a oração para as pessoas mais simples ou mais cansadas e quando se lembrem de que todas as canções populares são repetitivas . No Nordeste são conhecidos os ABC da literatura de cordel, em que algum cantador popular narra a história aventurosa dos heróis do sertão . Eu diria que o rosário é o ABC de Nossa Senhora. Mas é muito importante que os mistérios sejam meditados, pois neles é que está contida a medula rica dessa devoção . .f bom mesmo que se perca a mania de rezar como quem cumpre tarefas, um terço por dia ou tantos terços por dia. Por que? Deus não faz contabilidade de nossas rezas. Nós é que amadurecemos tanto quanto amadurece nossa oração. Reze um mistério só por dia, se o seu tempo for pouco, ou até uma Ave-Maria só. Mas medite. Frei José Carlos -

(do Boletim de Juiz de Fora)

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NOSSA PRESENÇA FESTIVA Numa leitura mais por alto dos Evangelhos a figura de Jesus Cristo toma um colorido um tanto triste e sério . Talvez seja em função de um ponto de partida das comunidades e dos autores: o drama da paixão e morte. À vezes considerando-se o material elaborado pela reflexão da Igreja e observando-se o modo de viver e sentir-se dos cristãos temos também esta mesma sensação há uma mistura de seriedade excessiva e uma melancolia sempre presente em tudo o que fazemos e somos , enquanto cristãos. t verdade que vivemos muitas vezes num vale de lágrimas e morte e que não temos aqui pátria definitiva; é verdade que a vida e Deus são sérios e merecem ser considerados de acordo com a gravidade de sua importância. Mas sempre fica uma questão, e esta não brota de um momento de hilaridade . Se observarmos com mais precisão e proximidade o modo de ser de Jesus Cristo e a tarefa a que ele se propôs vamos nos defrontar com outra figura de Jesus, talvez muito mais presente e marcante na vida de seu tempo . Uma figura de bom humor e festiva . Um Jesus Cristo que anuncia o Reino de Deus como sendo uma realidade eminentemente festiva e alegre; não que deixe por isto de ser séria e merecedora de luta e esforço. Ora , se Jesus era e foi festivo e um ser alegre e de muito bom humor e com isto queria deixar uma mensagem a respeito da realidade do Reino , esta mesma face leva a nos questionarmos sobre o modo de viver e de ser cristão hoje e anunciadores do Re ino em nossas realidades contraditórias. t verdade que tivemos durante muitos anos , e quiçá milên ios , uma forte influência de uma visão de mundo um tanto maniquéia que dividia a realidade humana em duas partes oponentes : corpo-alma, .. homem-mulher, paixão-razão, pecado-graça , bem-mal , e uma infinidade de outras antinomias . Os mais antigos ainda lembram da atitude de entristecimento que se abatia sobre os católicos de tempo integral por ocasião do carnaval; da mentalidade pelo menos esquisita em relação à mulher na Igreja; do desprezo pelas coisas ligadas ao corpo e às paixões e/ou sentimentos. Claro que há alterações nos dias de hoje, e muitas vezes pelos assim chamados movimentos pendulares em que o que é revalorizado é apresentado como sendo o oposto ao que se valorizava antes . Será que -

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chegaremos à escola de samba da lg_reja? Será que nossas vidas vão mesmo entrar nas celebrações? Será que a alegria poderá ser um dia a marca dos cristãos? ~ verdade que muitas comunidades sabem festejar, alegrar-se e celebrar. ~ verdade que muitas vezes nos encontramos na • hora de chorar", mas o anúncio do Reino é anúncio de Boa Nova, e entre nós homens sempre tem que ter festa e felicidade, alegria e bom humor. Não é só isto, mas esta é uma face de Deus sem a qual não o reconheceremos como o Deus anunciado pelo seu Filho - um Deus alegre, festivo, feliz e animado e animante da vida. Pe . José Luiz Cazarotto

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TESTEMUNHO Através do Setor B de Petrópolis, recebemos este testemunho de nosso irmão equipista Mário Dias de Oliveira, da Equipe 1 de Teresópolis, a respeito do artigo publicado na seção última Página da Carta Mensal de Maio/ 89. ( . . . ) Emocionei-me até às lágrimas com a simplicidade daquele que bem poderia ser um caboclo mineiro, simples e analfabeto como a maioria dos caboclos brasileiros quando, com humildade, declarou ao sacristão que o interpelara: "f: s6 uma oraçãozinha, mas tenho certeza de que ele me ouve". O acidente por ele sofrido e sua passagem pela enfermaria de um hospital fizeram-me recordar, com muita emoção, dos momentos de mais absoluta solidão por mim vividos recentemente em uma UTI de um hospital da minha cidade, onde entre a dor e o desamparo a que me julgava relegado, um só pensamento me ocorria: pedir a Deus, incessantemente, pela minha recuperaçã<?, pois a messe é muito grande e eu tenho ainda muito o que fazer. Quando maior era minha emoção e as lágrimas continuavam a correr livremente pelo meu rosto, e eu "sentia" que Deus estava ali ao meu lado, atento, me ouvindo, embora não vislumbrasse na penumbra daquele ambiente qualquer sinal visível de Sua presença, eu rezava uma oraçãozinha, como o Zé da história: "Meu Senhor e meu Deus!" Uma enfermeira, em sua ronda noturna, surpreendeu-me nesse exato momento e perguntou-me se estava sentindo alguma dor. Respondi-lhe, com os olhos marejados de lágrimas: "Estou rezando . . . " -25-


TESTEMUNHO

Damos a seguir um trecho de relatório recebido da Equipe N. S. da Boa Viagem , n.0 11, do Setor Leste do Rio Grande do Sul.

Sem dúvida, a caminhada proposta a partir do EACRE de março 1988 sobre a PARTILHA foi arrojada e profunda. Foi ainda necessária e oportuna na renovação da mística de nosso movimento, ao retomar os pontos fortes e autênticos que presidiram à sua fundação . Aparentemente mais flexíve l , porque dependente da vontade e do esforço de cada casal e não simplesmente função da • cobrança" na reunião mensal, o novo enfoque da PARTILHA representa mudança profunda de comportamentos e atitudes em nossa vida familiar e conjugal , em busca dos três grandes objetivos : -

a procura assídua da vontade de Deus;

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a procura da verdade sobre nós mesmos;

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a vivência do encontro e comunhão com os outros.

O ano de 1988 foi sem dúvida marcante e decisivo neste sentido. No entanto, temos muito a caminhar. Precisamos realmente assumir nossa partilha , sem falhas. Precisamos dedicar-nos sempre mais. Nossa capacidade de esforço será a grande semente germinada. Este caminho de crescimento é próprio de cada casal. Precisamos, no entanto , ficar atentos à evolução dos demais , para que o sentido "de equipe" est eja sempre presente . O novo caminho definido pelo Movimento para a PARTILHA é grandioso, cabendo a cada um de nós, equipistas, a grande tarefa de realizá-lo plenamente, promovendo , por nosso exemplo , a renovação necessária da Igreja de nosso tempo .

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A FAMíLIA E A COMUNICAÇÃO A Comissão de Pastoral Familiar da Regional Sul-I da CNBB, a exemplo do que vem ocorrendo nos últimos anos, promove na última semana deste mês (de 21 a 29), a SEMANA DA FAMlLIA no Estado de São Paulo. Neste ano, em sintonia com a última Campanha da Fraternidade, o temário concentra-se em alguns pontos relativos à Família e Comunicação. Resumimos a seguir a primeira parte - "Conceitos Fundamentais" - do documento que a Igreja que está em São Paulo está distribuindo sobre o tema. Comunicação é um conjunto de processos físicos e psicológicos pelos quais as pessoas trocam mensagens e que, além, das palavras, inclue manifestações não verbais tais como posturas, gestos, expressão facial, inflexão da voz, seqüência, ritmo e cadência das palavras e até silêncios. Assim, Comunicação confunde-se com comportamento, no sentido mais amplo, donde se conclue ser impossível às pessoas não se comunicarem pois, elas tem sempre algum compor·tamento. O diálogo implica numa interação de comportamento. Toda comunicação tem dois aspectos ou níveis distintos: um de CONTEúDO e outro de RELAÇÃO . O primeiro transmite informação sobre fatos, opiniões, sentimentos, ou outros que possam ser avaliados, objetivamente, em termos de veracidade ou falsidade. O segundo indica a . forma como deve ser tomada esta informação, na medida em que define a natureza das relações entre os que se

comunicam. Qualquer comunicação, portanto, além do conteúdo define a concepção do emissor de suas relações com o receptor. Não só transmite a informação mas, ao mesmo tempo, condiciona um comportamento. Qualquer que seja a seqüência de um diálogo, pouca ou nenhuma conseqüência isto terá para a vida dos envolvidos, quando se tratar de um encontro casual, isolado. O mesmo porém não acontecerá em situações de um relacionamento de longa duração e estável como no caso do matrimônio. Daí ser importante considerar-se o contexto da comunicação. A comunicação depende, portanto, do contexto. Considerando-se a Bíblia, no seu conjunto, como comunicação de Deus aos homens, podemos distinguir aí também estes dois aspectos de conteúdo e relação. Quando meditamos um trecho da Bíblia e nos questionamos sobre o que

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Deus nos pede, através deste texto, aqui e agora, estamos evidentemente no campo da relação. Neste aspecto, a conclusão pode ser diferente cada vez que lemos o mesmo texto em cliferentes contextos de nossa vida. Por outro lado, quando procuramos entender o preciso sentido da Palavra de Deus, em função da língua e do contexto originais, e ainda de outros parâmetros, estamos nos ocupando do conteúdo. A fim de se esclarecer certas situações de diálogo é preciso que os interlocutores conversem entre si sobre a própria comunicação. Muitas vezes a discordância está no nível da relação e não do conteúdo sem que se tome consciência desta situação. A capacidade de conversar adequadamente sobre a própria relação é condição necessária de uma comunicação bem sucedida e está intimamente ligada ao problema da consciência do eu do outro. A comunicação interpessoal é tanto mais sadia quanto mais as discordâncias se dão a nível do conteúdo e não da relação. Inversamente, as relações patológicas são caracterizadas por uma disputa sobre a natureza das relações, ficando num plano secundário o aspecto do conteúdo da comunicação. A nível de conteúdo, para uma correta compreensão da mensagem, emsisor e receptor devem estar sintonizados por uma linguagem comum e terem consciência da soma de informações prévias que cada um dos dois tem. De uma maneira geral, se imaginarmos a soma de conhecimentos que dois interlocutores possuem, po-

deremos classificar estes conhecimentos em três categorias: 1. Os que são do domínio de

ambos. 2. Os que são do domínio de apenas um deles. 3. Os que se situam no nível do inconsciente. Uma aplicação interessante desta teoria pode ser feita analisando-se as expectativas do casal em relação ao matrimônio. Cada um dos cônjuges traz para matrimônio uma série de expectativas a respeito do outro. Essas expectativas podem ser incon~cientes, porque são' resultado de "papéis" que a sociedade define para um e outro: ser pai, ser mãe, ser esposo, ser esposa. Também a religião incute valores religiosos que devem orientar a execução desses "papéis". Todos ficamos, no nosso interior, com certas imagens introduzidas em nós pelo modo de ser de pessoas de nossas relações e convivência: pai só existe como foi o meu. . . devo ser assim! ~

Estas expectativas levadas para o casamento podem envenenar as relações do casal. f: preciso que eles conversem sobre o assunto para poderem esclarecer a situação e concluírem que lhes ensinaram errado. O conjunto das expectativas trazidas para o Matrimônio constitui-se num autêntico contrato, não escrito, dinâmico e variável com o tempo. Estas expectativas têm importância para a vida conjugal porque influem no critério para o julgamento do outro. O cônjuge será bom ou mau na medida em que atenda ou não

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as expectativas que se tem em relação a ele (conscientes ou inconscientes). Por isso, o nível de verdade, clareza e conforto nas relações será tanto maior quanto mais o diálogo conjugal for aumentando o número das expectativas tornadas conscientes e verbalizadas. No entanto, um nível mais alto nas relações se consegue quando se renuncia a algumas expeçtativas em benefício do amor. Por outro lado, Cristo também tem expectativas em relação ao casal, que precisam ser conhecidas (para não situar-se numa área cega), e que não devem ser frustradas sob pena de banalizar-se o sentido da vida conjugal. A verdadeira felicidade só é conseguida na medida em que os cônjuges procuram realizar os desígnios do Criador nas suas vidas, discernindo, através da reflexão da Palavra de Deus, da observação dos sinais dos tempos e da oração, qual a sua vocação a dois, mais do que a vocação de cada um. Esta vocação matrimonial não implica no fechamento do casal em si mesmo, mas consiste num chamado para a realização de uma missão que envolve, conforme se lê na Familiaris Consortio: a) a formação de uma comunidade de pessoas, aí incluídos os filhos e os parentes; b) o serviço à vida (transmissão e educação); c) a participação no desenvolvimento da sociedade; c) a particiapção na vida e na missão da Igreja.

Para bem realizar estes deveres, é necessário um relacionamento harmonioso entre os membros da família e sintonia constante com os desígnios do Criador em relação à família, inserida na Igreja e na sociedade. Faz-se mister, portanto, que haja momentos especiais na vida do casal onde todos estes aspectos estejam integrados: relação com Deus e com o próixmo, vida interna da família e dimensão missionária e social. Nossa conversão para uma comunicação interpessoal sadia, que produza frutos de crescimento recíproco, há de passar necessariamente por uma conversão interior. Esta conversão deve levar-nos a que utilizemos a COMUNICAÇÃO PARA A VERDADE (conteúdo) E A PAZ (relação). Este último aspecto, o da relação, é precisamente o mais importante pois "ainda que eu falasse línguas, a dos homens e as dos anjos (veículo). . . ainda que eu tivesse o dom da profecia, o conhecimento de todos os mistérios e de toda a ciência (conteúdo) ... se eu pão tivesse a caridade (relação), eu nada seria" (1 Cor 13, ls). Esta caridade na relação, fruto do amor pela pessoa, se consegue com a humildade, que valoriza o outro e reconhece nele a imagem de Deus, em igual dignidade que a nossa, e os dons do Espírito Santo nele infundidos. Mas, para amar é preciso conhecer, ir descobrindo pouco a pouco as virtudes, qualidades e defeitos sem preconceitos ou julgamentos: "Cuidado com o que ouvís! Com a medida com que medirdes sereis medidos" (Me 4,24). Portanto, acolher 29 -


o outro como ele é, para que também nós possamos ser acolhidos por ele com nossos defeitos. Agindo assim, praticaremos a comunicação interpessoal, na comunhão do espírito, 'acordes no mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, nada fazendo por vanglória, mas com humildade, julgando cada

um os outros superiores a si mesmo" (FI 2, 2b-3). Nossa comunicação com as pessoas se aperfeiçoará na medida em que descobrirmos, acolhermos e valorizarmos o outro, amando-o efetivamente, pois "o amor é a forma completa da comunicação interpessoal" (Texto base da CF-89, n. 0 16).

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NOTICIAS E INFORMAÇÕES

Volta ao Pai - Luiz Afonso Hansen (esposo da Cely), da Equipe 18·C, de Porto Alegre/AS, em 07/06/89. - Laura Vergeat, há 31 anos na Equipe 04-D, de São Paulo/SP, em 31/07/89.

Ordenação Sacerdotal

guiram para Rondônia , onde foram trabalhar como missionários num hospital em Guajará-Mirim.

Novas Equipes -

Setor E/Rio de Janeiro Equipe n.0 73, N. S. de Nazaré C.P. - lzaltina e Noacir (Eq. 86)

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João Pessoa/PB Equipe n.0 1, N. S. das Neves C. E. - Pe. Guido C.P. - Lucia e Alcindo (Eq. 5, de Recife/PE)

Celebrada em 5 de agosto último, a ordenação sacerdotal do diácono Marcelo de Assis Paiva, Conselheiro Espiritual da Equipe 86-B, do Rio de Janeiro. A cerimônia teve lugar na Catedral Metropolitana daquela cidade.

Novo Setor

Visitantes Internacionais Conforme relatado no Boletim Informativo do Setor E-Rio de julho/89, chegaram ao Rio de Janeiro em 23 de maio último os equipistas franceses Henri e Veronique com seus três filhos (de 8 meses a 5 anos). De lá, se-

A Coordenação das ENS de Assis/SP foi elevada à categoria de Setor. Maria de Lourdes e Mário, que com tanta dedicação vinham exercendo a responsabilidade pela Coordenação, foram escolhidos como primeiro casal responsável pelo novo Setor.

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ATUALIDADE

Dando seqüência à apresentação desta seção, publicamos a seguir um artigo publicado no jornal o Estado de São Paulo, em 12107/ 89, sob o título "Casamento no século XXI é tema de debate". Como as matérias anteriores, este artigo mostra a maneira como os meios de comunicação social retratam os assuntos ligados à espiritualidade conjugal e familiar. Inútil reiterar que o texto não representa a opinião das E.N.S. Procuramos apenas despertar a reflexão de todos os equipistas !I respeito de uma certa visão da realidade.

O maior sucesso do segundo dia do encontro da SBPC não foi nenhum dos áridos temas da ciência exata, mas um dos mais difíceis de ser colocados sob a forma de pesquisas ou equações: o relacionamento amoroso. Perto de 300 pessoas se acotovelaram no exíguo auditório da Faculdade de Estatística e Matemática Aplicada para debater os fluidos e inexatos parâmetros que levam as pessoas a se apaixonar, formar famílias e cultivar desavenças ou harmonia. O psicólogo Flávio Gikovate, a professora Barbara Musumeci, a socióloga Lia Fukui e a demógrafa Elza Berquo tentaram destrinchar o que será do amor, do casamento e da família no século XXI. Do ponto de vista demográfico, explicou Elza, o Ocidente vem montando desde a década de 60 um tipo de família, "empurrado por novas exigências econômicas e de hábitos". Esse comportamento tem conseqüências nas taxas de fecundidade e no casamento formal, pois favorece a coabitação e os nascimentos extramaritais.

A família na qual apenas um dos cônjunges assume todas as responsabilidades é uma invenção deste século, avaliam os conferencistas. A viuvez ou o celibato também contribuem para engrossar essa tendência em direção à família monoparenta!. Segundo os debatedores, a tecnologia - que cria condições de subsistência de pessoas isoladas - e a medicina, que propicia aumento da longevidade, também ajudam nesse processo. Segundo a professora Barbara Musumeci, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o que deverá prevalecer no próximo século são as relações não formais, nas quais a idéia a ser valorizada será a da amizade. O psicólogo Flávio Gikovate, do Instituto de Psicoterapia de São Paulo, também acha que a época do "casamento por necessidades sociais já passou". Para ele, a simples união superficial que arrasta pessoas a uma união pretensamente permanente está com os dias contados. "A ligação entre os opostos não prevalecerá no século XXI", profetiza. 31-


VLTIMA PAGINA

PAI NOSSO Não posso dizer: Pai Nosso Se não ver todos os homens como irmãos meus . Não posso dizer: Que estais no céu Se o que me preocupa sãq os meus bens na terra . Não posso dizer: Santificado seja o Vosso nome Se a minha vida for uma imagem falsa de Cristo . Não posso dizer: Venha a nós o Vosso Reino Se não deixar o amor de Cristo crescer em mim. Não posso dizer : Seja feita a Vossa vontade Se divinizar as minhas vontades , se o que importar é o que eu quero. Não posso dizer : Assim na terra como no céu . Se os meus atos não me permitirem entrar no Reino dos céus. Não posso dizer: O pão nosso de cada dia nos dai hoje Se não for capaz de repartir o meu pão com os necessitados. Não posso dizer: Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido Se a minha vida for permanente ofensa à justiça e à caridade. Não posso dizer: E não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal, Se fechar os olhos à mão estendida, os ouvidos ao pedido, se fugir às minhas responsabilidades na construção de um mundo melhor. Não posso dizer : Amém Porque mentirei , se não aceitar tudo isso. Colaboração da Equipe 2 Recife/PE -32-

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MEDITANDO EM EQUIPE TEXTO DE MEDITAÇÃO (Lc. 2,41-52) Seus pais iam todos os anos a Jerusalém para a festa da Páscoa. Quando o menino completou ·doze anos, segundo o costume, subiram para a festa. Terminados os dias, eles voltaram, mas o menino ficou em Jerusalém, sem que seus pais o notassem. Pensando que ele estivesse na caravana, andaram o caminho de 'um dia, e puseram-se a procurá-lo entre os parentes e conhecidos. E não o encontrando, voltaram a Jerusalém, à sua procura. Trê:; dias depois, eles o encontraram no Templo, sentado em meio aos doutores , ouvindo~os e interrogando-os; e todos os que o ouviam ficavam extasiados com a sua inteligência e as suas respostas. Ao vê-lo, ficaram surpresos, é a mãe lhe disse: "Meu filho , por que agiste assim conosco? Olha que teu pai e eu, aflitos, te procurávamos." Ele respondeu: "Por que me procuráveis? Não sabieis que devo estar na casa de meu Pai?" Eles, porém, não compreenderam a palavra que ele lhes dissera . Desceu então com eles para Nazaré, e era-lhes submisso. Sua mãe, porém, conservava a lembrança de todos estes fatos em seu coração. E Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e diante dos homens.

ORAÇÃO LITúRGICA (Lit. das Horas -

Festa de N. S. Aparecida)

- Entoemos altos louvores a Deus Pai onipotente! Ele determinou que Maria fosse a mãe de Seu Filho, celebrada por todas as gerações, e peçamos confiantes:

R. Nossa Senhora Aparecida, rogai a Deus por nós! -Deus criador de maravilhas, que fizestes a Imaculada Virgem Maria participar em corpo e alma de celeste glória de Cristo, conduzi para a mesma glória os corações de vossos filhos,

R. Nossa Senhora Aparecida, rogai a Deus por nós! - Vós nos destes Maria por mãe. Por sua intercessão, concedei a cura aos doentes, o conforto aos tristes, o perdão aos pecadores e a todos a salvação e a paz.

R. Nossa Senhora Aparecida, rogai a Deus por nós! - Fizestes de Maria a Mãe de Misericórdia; concedei a quem está em perigo experimentar seu amor materno.

R. Nossa Senhora Aparecida, rogai a Deus por nós! - Quisestes que Maria fosse a Senhora em casa de Jesus e José; por intercessão dela, que todas as mães vivam em família o amor e a santidade.

R. Nossa Senhora Aparecida, rogai a Deus por nós! Oremos: 6 Deus todo poderoso, ao rendermos culto à Imaculada Conceição de Maria, Mãe de Deus e Senhora Nossa, concedei ao povo brasileiro, fiel à sua vocação e vivendo na paz e na justiça, possa chegar um dia à pátria definitiva. Por N.S .J.C. AMEM .


Um momento com a equipe da Carta Mensal . . . . . . . . . . . . . . . . . .

1

Pe. Ollvier .... . ..... . , . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

2

Carta da Equipe Responsável Internacional .......... ·. . . . . . . . . .

4

A ECIR conversa com vocês . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

7

Editorial -

Eleições/ 89 -

Participar com esperançâ (CNBB) . . . . . . . . . . . . .. . .

12

-

O voto consciente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

14

Oração a Nossa Senhora Aparecida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

17

A preocupação social da Igreja . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

18

Missão dos leigos na Igreja e no mundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . • . . .

21

Outubro, mês do Rosário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

23

Nossa presença festiva . .. ....... .... . ... . ...... .. : ..... ·. . . . . .

24

Testemunhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

25

A Familla e a Comunicação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

27

Atualidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

31

tlltlma Página -

Pai Nosso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

32

Meditando em equipe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

33

EQU IPES DE NOSSA SENHORA 01050 Rua João Adolfo.ll8 · 9' · cj. 901 -Tel. 34 8833 São Paulo - SP


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