EQUlPES DE NOSSA SENHORA Carta Mensal • n°414 • Dezembro 2oo6
EDITORIAL Da Carta ensal ... .... .......... .... .. ..... 01
SUPER-R GIÃO Natal de luz ........ ... .... .......... .. .. .. .... 02 Presentes e presença .......... .. ......... 03 Nasceu-vos hoje um salvador, que é o Cristo Senhor ... .. .. ..... .. ... .. . 04
CORREIO DA ERI Refletir o amor de Deus .. ...... .. .... .. 06 Encontro "Lourdes 2006" ..... .... .... 11 Notícias das equipes da zona euráfrica .. ... ..... ......... ... .. ... 12
18 de setembro Sacramento do matrimônio: Fonte e missão das ENS ....... .... ...... 36 O sacramento de matrimônio ...... . 38 Causa da beatificação do Padre Henri Caffarel .. ...... .... ... .. 57
79 de setembro Vocação conjugal e compromisso ... . 61 Casais e famílias, a quantas andamos? ........... ... .. .... . 63 Unidade na diversida de .. .. ..... ... .. .. 64
20 de setembro Equipe comunidade de Igreja ....... 66 Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais ...... .. 68
21 de setembro LOURDES 2006 X Encontro Internacional das ENS - Lo urdes 2006 ..... ..... ...... 1 5
76 de setembro Acolhida e abertura .. ..... .... ...... .... .. 16 Mensagem do Papa ... .. ........ .. ... ..... 18
17 de setembro Jesus Cristo centro da vida cristã ..... 1 9 Para vós, quem sou eu? .... ........ .... 20 Jesus Cristo, centro da vida cristã .. .. 2 5
Registro ''Lei de Imprensa" n• 2 19.336 livro 8 de 09.10.2002
Avaui e Carlos Clélia e Domingos Luciane e Marcelo Sola e Sergio Pe. Geraldo Luiz 8. Hackmann
Edição: Equipe da Carta Mensal
Jornalista Responsável: Catherine E. Nadas (mtb 19835)
Graciete e Gambim (responsáveis)
Projeto Gráfico: Alessandra Carignani
Carta Mensal é uma publicação menml das Equipes de Nossa Senhora
ENS: Comunidades vivas de casais, refletindo o amor de crista ....... .. .. 82 Solene eucaristia de encerramento ...... .... ...... ... .... .... 84 O logotipo internaciu onal .. ....... ... . 88 Ação de graças ........ ....... ... ..... ...... . 89 Equipe mista ................. ... ......... .. ... 95 Reunião mista em Lourdes .... ... ..... 96 Lourdes, lugar de peregrinação ... . 97 Sessão de Formação Internacional de Lourdes ... ...... ... ... 98 Carta de Lourdes ...... ..... ...... .. .... .. 1 00
Editoração Eletrônica e Produção Gráfica: Nova Bandeira Prod. Ed. R. Turiassu, 390- 11 " andar, cj. 115 - Perdizes - São Paulo Fone: (Oxx ll ) 3677.3388 Foto da capa: José Carlos Sales
Impressão: Cly Tiragem desta edição: /9.000 exemplares
Can as, colaborações, norf-
cias, testemunhos e imagens devem ser enviadas paro:
Carta Mensal R. Luis Coelho, 308 5° andar. conj. 53 01309-902 • São Paulo - SP
Fone: (Ox.x: /1 ) 3256. 121 2 Fax: (Oxx ll ) 3257. 3599 cartamell sal@ells.o rg.b r A/C Graciete e Gambim
Queridos irmãos e irmãs: Temos a alegria de apresentarlhes a Carta Mensal de dezembro de 2006. Está diferente. Não, ela não mudou! É uma edição especial. Durante dois anos, nos preparamos para o X Encontro Internacional das Equipes de Nossa Senhora, particularmente neste ano, quando refletimos sobre Jesus Cristo, procurando descobrir a sua face. Pois aconteceu o Encontro, em Lourdes. A maioria participou dele à distância. Os muitos que estiveram presentes tinham suas atividades e celebrações centradas numa basílica subterrânea. Mas não estavam escondidos. Ao sair dali, milhares de casais, de mãos dadas, muitos acompanhados de sacerdotes, testemunhavam o amor pela cidade. E o Amor se manifestou: Na acolhida mútua e no abraço de casais e sacerdotes conselheiros chegados de setenta países de todo o mundo. Nas Eucaristias celebradas. No encontro de tantos a fazer comunhão de irmãos. Junto à Mãe, nas basílicas ou na gruta de Massabielle, onde as lágrimas de alguns mais emotivos se juntavam às águas do rio Gave. O amor era evidente no vai-e-vem de uma multidão de cadeiras de rodas empurradas por pessoas vindas de muitas regiões, no milagre do serviço voluntário e gratuito e diário em favor dos irmãos deficientes. Amor que se apresenta exigente nas conferências e homilias sobre a pessoa de Jesus Cristo, sobre o sacra-
mento do Matrimônio, sobre a comunidade cristã, como também no exemplo de vida do Padre Caffarel. É o amor que nos próximos anos somos convidados a vivê-lo mais intensamente, em casal, na fanu1ia, na equipe, na Igreja e no mundo. Esta edição não é para ser arquivada, mas deixada à mão: Nela vamos ler comentários sobre cada dia do Encontro e poder reler e estudar, para levar à vida, os ensinamentos das conferências e homilias e as propostas da "Carta de Lo urdes", com as Orientações do Movimento. Todas essas maravilhas, como dizem Graça e Roberto, foram realizadas por Deus. É Ele quem nos convida a sermos comunidades de casais, reflexos do amor de Cristo. O Correio da ERI também fala do Encontro, sinal de vida para o Movimento. E dezembro aponta para o Natal. Que possamos abrir o coração para receber o Presente de Deus que se faz Presença no meio de nós. Seja uma acolhida amorosa, festa brotada no interior, para que, na humildade iluminada pela gruta de Belém (por que também não de Lourdes?) possamos refletir o rosto de Cristo e vê-lo no irmão. Os casais e o SCE da Equipe da Carta Mensal desejam a todos um Feliz Natal!
Graciete e Avelino Gambim CR Equipe da Carta Mensal
NATAl DE lUZ Caríssimos! "O povo que jazia nas trevas viu uma grande luz". Só Jesus Cristo dissipa as trevas do coração. Viver sem Jesus é viver e caminhar no escuro. Que sentido tem caminhar quando não se sabe para onde? Sem Jesus Cristo não há nem luz e nem caminho. "Eu sou a luz". "Eu sou o Caminho!" O Natal de Jesus abriu para nós o caminho à vida. A festa para a humanidade começou com o aparecimento da Luz. O profeta Simeão, ao receber em seus braços o menino Jesus, exultou: "Agora, Senhor, podeis deixar vosso servo ir em paz, porque meus olhos viram vossa salvação: uma luz que brilhará para os gentios!" O brilho e a beleza da festa do Natal dependem do coração do homem! No motivo e no que ele representa para cada pessoa, está a medida e o peso do significado do Natal, que acontece com brilho exterior em tantos ambientes, mas com significados interiores tão diferentes! Externamente a festa é de todos, mas, interiormente, não é de todos! O Natal celebra a chegada do Salvador, verdadeira e única Luz! O Advento é tempo de espera e preparação para acolher o Sol que dissipa as trevas. Só acolhe essa Luz quem faz da vida uma preparação para sua chegada! Não é fácil descobrir a chegada do esperado Senhor. Não é fácil perceber que Ele já está entre nós ou está chegando! Há três atitudes básicas para 2
perceber sua chegada e sentir sua presença: • Uma atenção feita de recolhimento. "Eis que estou à porta e bato!" "Temo o Senhor que passa!" (S . Agostinho). • Uma escuta amorosa: As ovelhas conhecem a voz do pastor. O hábito de ouvi-lo pela convivência junto a ele toma sua voz inconfundível. A oração é a arte de escutar e conhecer Deus, o instrumento que afina os ouvidos do coração. • Um acolhimento festivo: Quando espero alguém que amo, basta uma batida, uma palavra e já começa a festa. Só falta acolhê-lo na própria casa. Felizes os que acolhem Aquele que não sai da porta do coração, esperando abrir! Mas nem todos escutam sua voz e continuam de porta fechada! Façamos da vida uma amorosa escuta, uma atenta e vigilante espera, um festivo acolhimento do Senhor que aparece esplendidamente aos olhos da fé, mas com rosto disfarçado em tantos irmãos e com voz clamorosa em tantos acontecimentos! Maria convidou as ENS a Lourdes, para lhes dizer: "Este é meu Filho: Escutai-o!" Se não o escutarmos mais, talvez teremos que ouvir dela: Para que viestes aqui? Não quererá Ela esperar como frutos do X Encontro o escutar e acolher melhor o seu Filho? Um santo Natal!
Pe. Fr. Avelino - SCE/SR CM414
PRESENTES E PRESENÇA Amados irmãos equipistas: Aproxima-se o final de mais um ano. Já elegemos os novos casais responsáveis e realizamos o balanço anual. Na Igreja, respiramos o clima alegre e sugestivo da espera do Natal. A liturgia do Advento prepara-nos para celebrar o mistério do amor de Deus que vem ao encontro do homem, trazendo-lhe a Sua paz. É com esse espírito de alegria e esperança no iminente nascimento de Jesus que olhamos para alguns acontecimentos de 2006. Este ano foi para a Super-Região Brasil uma grande dádiva, pois Deus nos quis "presentear" com favores especiais. Um presente significativo foi o Encontro Internacional de Lourdes, não só pela resposta fiel dos equipistas brasileiros ao apelo da ERI, mas, pelo Encontro em si e pela influência que exercerá na vida futura do Movimento. Lembramos primeiramente o "prelúdio" do Encontro: o tema de estudo. Ele preparou-nos para acolher na generosidade os acordes dessa sinfonia internacional, realizada por Deus no Santuário de Lourdes, cujo ápice está na prioridade de reflexão que nos orientará até 2012: EQUIPES DE NOSSASENHORA,CO~ADES
DE CASAIS, REFLEXOS DO AMOR DE CRISTO. O nosso peregrinar "À descoberta do Cristo", centrado na reflexão feita em casal e na troca de idéias na reunião mensal, juntamenCM414
te com a vivência dos Pontos Concretos de Esforço, revitalizou a nossa vivência das três atitudes de vida (Guia das ENS, p. 30). Lourdes nos fez reviver a riqueza do amor fraterno "presente" no convívio alegre dos equipistas e no esforço empreendido para superar a diversidade de idiomas e de costumes que a internacionalidade proporciona. Permitiu-nos também experimentar, nas celebrações litúrgicas, a presença eficaz do amor, reavivando o desejo ardente de comunhão com Cristo, para que Ele fortaleça o nosso vínculo conjugal no amor e na caridade. Por fim, Lo urdes presenteou-nos com a abertura da causa de beatificação do Pe. Caffarel, um sacerdote que marcou a história espiritual do nosso tempo. Ele ajudou os casais a descobrir a presença de Cristo no cotidiano da vida conjugal, a viver uma espiritualidade própria do seu estado de vida e evidenciou o caminho de santidade sacramental do matrimônio. Diante de tantos "presentes", diante da alegria interior que toma conta de nós pelo Natal, que é o Presente de Deus à humanidade, peçamos à Santa Mãe que nos ajude a viver o Natal, como precursores de uma Presença, pois o mundo ainda necessita de pessoas que contem a ele quem é Jesus. Feliz Natal!
Graça e Roberto - CRSR 3
Palavra do Provincial
NASCEU-YOS HOJE UM SALVADOR, QUE E O CRlSTO SENHOR (lc Estimados irmãos equipistas. Deus preparou o nascimento do seu Filho numa farru1ia, pois a vida de Jesus tinha que ser igual à vida de todos os homens. Portanto, necessitado de proteção, carinho, cuidados, como todas as crianças. O lar escolhido por Deus foi o de um casal de Nazaré, decidido a amar sem medidas, ser santo. Nós, casais equipistas, também fomos amorosamente convidados a harmonizar o nosso projeto de vida conjugal com o projeto de Deus, a exemplo de Maria e José. Os Pontos Concretos de Esforço, especialmente a Escuta da Palavra, a Meditação e o Retiro, vivenciados de uma forma mais intensa neste ano, sedimentaram a nossa convicção e a nossa resposta às perguntas que nos foram feitas: "Quem dizem os homens que Eu sou?" (Me 8,27) e "E vós,
2, 11)
quem dizeis que eu sou?" (Me 8,29). O resultado do esforço e da reflexão que fizemos preparou-nos, ao longo do ano, para acolher, com grande alegria, o próprio Deus, Jesus Menino, o Salvador. Ele vem a nós na humildade, na simplicidade, sem ostentação, precisamente para que possamos aproximar-nos Dele e corresponder ao seu amor. Hoje, nossos lares se preparam para a grande festa, nem sempre com a humildade e a simplicidade que marcaram a chegada do Menino Jesus, mas, com sentimentos bem humanos: a ternura, a compaixão, o perdão. É quando nosso coração se dilata em acolhida ao outro, porque sabemos estar acolhendo o próprio Cristo. Este tempo litúrgico em que vivemos o mistério da encarnação do Filho de Deus é, também, o momento próprio para irmos, aos poucos, confor-
mando a nossa vida aos ensinamentos do Evangelho. E, quem sabe, um dia podermos atingir o que São Paulo experimentou: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20). Esse processo acontece, quase sempre, como que em círculos concêntricos. Tem início com o próximo mais próximo, nosso cônjuge, com o qual buscamos um novo estilo de convivência, pela maneira mais amorosa do nosso mútuo tratamento, pela doação, pela renúncia - abnegação. Ampliemos nossas atitudes aos nossos filhos, à nossa fanulia, para que viva a harmonia de um lar habitado pela presença de Cristo. Que a abertura de coração, a disposição à correção fraterna e o acolhimento sejam contagiantes e façam de nossa equipe de base uma comunidade de amor, com a autêntica mística de uma Equipe de Nossa Senhora. "Quando os casais se exercitam
no auxílio mútuo e no amor fraterno, pouco a pouco o seu coração se dilata e, gradativamente o seu amor conquista a casa, o bairro, o país, até atingir as mais distantes paragens". ( Pe.Henri Caffarel)
Não estará aí a fonte da paz tãG almejada, da segurança, da justiça, da solidariedade? Certamente, neste caminho avistaremos a "estrela", encontraremos a gruta e acolheremos Aquele que é a fonte de toda a santidade. E ao Pai, num canto de glória e ação de graças, ofereçamos a nossa vida, pois "que poderemos ao Senhor apresentar, quando Seu Filho de presente Ele nos dá?". Peçamos que Maria, a humilde serva do Senhor, santa, cheia de gra- / ça, bem-aventurada, mestra da esperança, nos ajude a fazer tudo o que Ele disser. Que José, seu castíssimo esposo, o primeiro a contemplar o Deus-Menino nos braços de sua Mãe, nos leve a contemplar a face de Cristo para revelá-la ao mundo. Com muito carinho, em nosso nome e no de toda a Equipe da Super-Região, desejamos a todos os casais, viúvos, viúvas e sacerdotes conselheiros espirituais um Santo e Abençoado Natal!
Eunice e Milton Casal Secretário/Tesoureiro
REFLETIR O AMOR DE DEUS Gostaríamos, antes de mais nada, de pedir que partilhem conosco toda a emoção que sentimos neste momento tão especial de nossa vida de casal. Para além das palavras que podemos dizer-lhes, desejamos que vocês participem em profundidade, pelo pensamento e, sobretudo, pelo coração, da dimensão profunda e intensa do que estamos experimentando: um momento em que se misturam a surpresa e a gratidão pelo dom que recebemos ao sermos chamados para este serviço. Surpresa, porque assim como as crianças arregalam os olhos diante da magia de Na tal, não podendo acreditar em tanta festa e tanta luz, também nós olhamos para o que nos acontece e pensamos que não podíamos imaginar um dom maior: sermos chamados para servir ao amor, amando-nos com mais ternura ainda; sermos chamados a servir ao amor, comprometendo-nos a ser testemunhas itinerantes do amor à maneira do nosso Movimento; sermos chamados a servir ao amor pelo amor que podemos dar a nossos irmãos de todas as equipes do mundo. Haverá um dom maior do que o de estar a serviço do amor por aqueles que, como todos nós, alicerçaram sua vida na aposta do amor? A conseqüência natural é o sentimento de gratidão infinita que sentimos para com o Senhor, que renova nossa vida pelo chamado para este serviço e que olhou com ternura para nós, nutrindo uma vez mais 6
nossa vida com seu amor, como também a vida de todos vocês que aqui estão, porque sabemos e sentimos que vocês nos amam! Assumimos neste momento o bastão das mãos de Marie-Christine e Gerard de Roberty, a quem se dirigem todos os nossos agradecimentos, não apenas pelo serviço prestado durante esses seis anos, mas também pela maneira como eles o vivenciaram e pelo novo rosto que quiseram e souberam dar à Equipe Responsável Internacional: Uma ERI que, na plenitude de sua responsabilidade, vive e partilha todos os valores de uma simples equipe de base: a amizade, a oração, a partilha, a troca de idéias, os trabalhos, o discernimento, a caminhada para frente. A ERI da qual participamos é uma verdadeira equipe, na qual o espírito de colegialidade e de internacionalidade é vivenciada em cada momento, num espírito de unidade, mas também de valorização do pensamento de cada um, por onde a voz dos equipistas do mundo inteiro chega e é ouvida. Um grande e verdadeiro obrigado, pois, a todos os casais da ERI, ao Padre Fleischmann, atencioso e precioso Conselheiro Espiritual, que conosco partilharam esta experiência e uma vez mais, em particular, a MarieChristine e Gerard, que souberam viver plena e profundamente suaresponsabilidade, ao partilhar conosco este serviço e ao abrir o caminho CM 414
para novas veredas na história de nosso Movimento. Gostaríamos agora de nos voltarmos para cada um de vocês, um por um, chamando-os pelo seu nome, dizer caro Michel ou cara Rosita, ou caro John ou cara Maria, ou ainda Carlos ou José e Genevieve ou Laura, Peter e Anna, Regina e Gabriel, Dick e François ... gostaríamos, sobretudo, de fixar o olhar no olhar de cada um de vocês, porque para além das palavras há olhares que transmitem toda a intensidade de um relacionamento. Durante o tempo em que refletimos, antes de dizer "sim" a este serviço de responsabilidade, procuramos auxílio e conforto não apenas no diálogo entre nós e na oração, mas também nas palavras do Padre Caffarel que, no fundo, também nos estava chamando, de certa forma, para prosseguirmos na sua caminhada. Algumas de suas palavras nos marcaram de modo particular: "existe uma fecundiCM414
dade intelectual que é fruto do amor, sentimos a necessidade de um olhar que ouve". Na realidade tão articulada e tão complexa de nosso Movimento hoje, constituído de casais que vivem em setenta diferentes países, seria bem difícil pensar em conseguir comunicar pessoalmente com todos pela palavra, mas talvez nisso também nosso fundador se mostrou profeta do nosso tempo: é possível comunicar com o olhar, mas sobretudo ouvir pelo olhar, ou seja, estar atento às necessidade do outro e servir ao outro naquilo que for necessário para o seu bem, simplesmente olhando para ele e lendo no seu coração. Com efeito, este é para nós o primeiro compromisso da responsabilidade que vamos assumir: servir o Movimento na pessoa de todos os que dele fazem parte, ao estabelecer uma rede de relações feitas de palavras e olhares, que nos permitam sermos fecundos na marcha de amor que o Senhor quer para nossa 7
salvação e de acordo com as orientações que o Padre Caffarel nos indicou, como guias para vivermos a fé e a vocação conjugal. Cremos que a relação é hoje, mais do que em qualquer outra época, a possibilidade mais significativa que nos tenha sido dada para tornar viva a nossa fé. A relação no seio da Trindade está na base da fé; a relação entre Deus e o seres humanos é a base do caminho de santidade; a relação entre um homem e uma mulher é o início e o fim de seu amor. Mas nenhum de nós pode dizer que vive plenamente o significado profundo da relação, tanto do amor quanto da fé, se somente a vivemos num relacionamento individual, no plano humano, entre nós e nosso cônjuge e, no plano teologal, entre nós e Deus. A relação à qual cada um de nós é chamado é, com efeito, a da comunidade humana e eclesial. O valor da internacionalidade, no qual o Movimento nos convidou a refletir nesses últimos anos, é um valor muito maior que o simples alargamento dos limites do mundo das Equipes de Nossa Senhora; ao contrário, torna-se uma possibilidade nova de expressar a atualidade da fé para a qual os sinais do tempo nos chamam: crer que a fé não é uma realidade individualista, que diz apenas respeito ao relacionamento entre nós e Deus, mas que é um espaço no qual devem entrar as necessidades, os pensamentos, os sentimentos de todos os homens e mulheres da humanidade que caminha e, mais particularmente, des8
ses irmãos de equipe com os quais partilhamos a viagem da vida; é uma dimensão na qual devem ser ouvidas as perguntas que ainda não têm resposta ou ainda não foram exprimidas sobre o sentido profundo da vida; é uma dimensão na qual a internacionalidade deve ter como sentido a busca, nas relações que vivemos e sobre o rosto de qualquer outro ser humano, do fragmento do rosto de Deus que ali podemos descobrir. Tudo isso deve, naturalmente, ser vivenciado com uma consciência e com um senso da responsabilidade que expressem nossa capacidade de nos tornarmos e de sermos adultos: homens e mulheres adultos, fiéis adultos. É a isso que o Padre Caffarel nos convidava, ao dizer que "as equipes não são abrigos para adultos bem intencionados!" Se a fé se manifesta também pela nossa capacidade de estabelecer relações entre nós e com os outros, no modelo e no exemplo da relação do Pai com o Filho e com o Espírito, e a imagem vive da relação de Deus com sua Igreja, então devemos também compreender que nosso engajamento prioritário é o desenvolvimento em nós da capacidade de continuar, de maneira consciente e responsável, o progresso do movimento das Equipes de Nossa Senhora, em seu avanço na história do cotidiano, sem perder suas raízes e sem fechar os olhos para o futuro que se aproxima. Juntos, portanto, no espírito de unidade que nos vem de nossa fé de batizados em Cristo ressuscitado e CM 414
juntos no espírito de identidade que reconhecemos como equipistas, para tornar viva a cada dia a graça sacramental do matrimônio, devemos sentir-nos engajados, nesses próximos anos, em assumir como nossas, vivendo-as no dia-a-dia, as orientações que o Movimento nos propõe para crescer na fé e no amor: sermos
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Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, refletindo o amor de Deus.
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Essas palavras podem parecer simples e fáceis de serem postas em prática. Alguns instantes de aprofundamento, porém, nos levam a compreender, à luz daquilo que vivendamos nestes dias, o quanto isto que nos comprometemos a viver nos próximos anos não é nem tão fácil nem tão banal. Ao buscarmos o significado original da palavra comunidade, na sua acepção latina, vemos que se compõe de dois elementos verbais: "com", que significa reunir, estabelecer relação e "munis", que quer dizer dom. O termo "munis" tem uma raiz sânscrita "ma", da qual procede o verbo trocar, distribuir. As equipes devem, portanto, ser para si mesmas e em testemunho para a Igreja e para o mundo, lugares onde pessoas e casais são capazes de pôr em comum aquilo que são e o que são dá-lo mutuamente uns aos outros e doá-lo aos outros. O que possuímos é tudo aquilo que vivenciamos na nossa vida e nosso desejo da busca infinita de Deus . O que nós devemos fazer advir, como dom para nós e para os outros, é a capacidade: CM414
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de partilhar, da mesma forma que o pão sobre a mesa, a nossa vivência, na coparticipação; de fazer jorrar uma fonte de vida nova pelas palavras que trocamos no Dever de Sentar-se; de transformar as palavras que pronunciamos em nossas orações em palavras de vida; de partilhar as tristezas, as limitações, mas também as alegrias e as conquistas de nossa conversão contínua, no auxílio mútuo; enfim, de transformar a Regra de Vida em um estilo novo de vida que saiba nos modelar como pessoas novas.
Equipes como comunidades: isso não significa que encontramos a solução mágica para nossas próprias limitações e para todos os problemas, mas que a comunidade, conforme o significado intrínseco da palavra, contém elementos capazes de transformar essas limitações e esses problemas em novas oportunidades, inéditas e desconhecidas, numa marcha harmoniosa - mesmo se com freqüência íngreme - que vai do ideal à história concreta de nossa vida. Equipes como comunidades vivas de casais, que vivem sua fé na pequena história de cada vida e na grande história da marcha da humanidade, porque nosso Deus se fez homem e porque nossa fé é uma fé encarnada, que não pode ser eliminada da história. É só assim que podemos esperar de alguma forma refletir o amor
de Deus: 9
• um amor que sabe tornar-se atento às necessidades do outro; • um amor que valoriza a gratuidade, um amor que não ignora as fraquezas e os erros mas que os compreende e perdoa; • um amor buscando incansavelmente o indefinido e o infinito; • um amor que busca a verdade do coração antes mesmo que a verdade do espírito, • um amor que se entrega confiantemente ao desígnio do Pai e que faz surgir na história da humanidade os novos caminhos do Reino, pois permite que se libertem as forças subterrâneas da vida e que se manifestem, em pleno dia, as invenções do espírito. Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, refletindo o amor de Deus. Este é o compromisso, quem sabe a utopia, o sonho dos anos que nos esperam. "A utopia está aí, no horizonte. Damos dois passos para frente e ela se afasta dois passos. Damos dez passos e o horizonte se desloca dez passos. Por mais que caminhemos, talvez nunca a alcancemos. Mas então, para que serve a utopia? Para isso: caminhar" (Eduardo Galeno). Nosso Deus também está sempre "mais longe" ("Além"). Continuamente, ele nos chama para avançarmos e ele é o "ainda não" que deve ser sempre procurado, descoberto, encontrado. Mas o Senhor não é uma utopia, ele é, ao contrário, uma realidade de amor que nos espera. 10
"Deus c a ri tas est". Deus é amor, e o Movimento nos pede o compromisso de caminhar em sua direção, sem nunca desanimar. Pessoalmente, não sabemos por que estamos aqui. Estamos cheios de medo diante deste apelo. Não temos nenhuma capacidade especial, pelo contrário, temos muitas fraquezas e muitas limitações, não entendemos porque o Senhor nos trouxe até aqui, para este serviço, estaresponsabilidade. Com certeza, nós nos amamos e amamos o ser humano, amamos todos os homens e todas as mulheres do mundo, amamos muito este Movimento, no qual nos formamos como pessoas e como casal; confiamos no Senhor, em sua fidelidade, em seu amor. Por causa deste amor do ser humano, deste amor das Equipes de Nossa Senhora, deste amor do Cristo, respondemos "sim". Hoje, pedimos que vocês criem conosco um vínculo único, dando-nos as mãos e que cantemos juntos Ecce, fiat magnificat, porque é somente juntos que podemos caminhar para frente e construir o futuro do nosso Movimento, é somente juntos que podemos ser Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, refletindo o amor de Deus. (Eucaristia de encerramento do Encontro Internacional)
Cario e Maria Carla Volpini CRIE RI CM 414
ENCONTRO "LOURDES 2oo6" Foi grande a nossa emoção quando, na noite de 16 de setembro, nós os vimos dirigindo-se à Basílica S. Pio X, em filas cerradas, envoltos em suas capas verdes, sob a chuva que caía. Temos pensado tanto em vocês nestes três últimos anos, que vêlos surgir de repente no meio da noite, e, mais tarde, ocupar toda a basílica, nos inundou de alegria e emoção. Dizemos a vocês hoje o que gostaríamos de lhes ter dito naquele momento: Obrigado por terem vindo! Nossos agradecimentos àqueles e àquelas que permitiram que este encontro acontecesse, a todos os que se puseram a serviço, com competência, alegre e gratuitamente. Foram 800 em todo o mundo, provando que há alegria em servir. Obrigado às equipes formadas para isso em todas as Regiões e Super-Regiões do mundo. Elas se ocuparam das inscrições e do encaminhamento dos participantes para Lourdes. Foram para nós intermediários seguros, eficazes e afetuosos. Sua ajuda prosseguiu durante o encontro e foi preciosa. Obrigado , em particular, à Super-Região França-LuxemburgoSuíça. Seus membros foram muito solicitados e 600 deles se dispuseram a nos ajudar. CM414
Obrigado aos "trabalhadores da la hora", os 14 casais que convocamos. Eles, por sua vez, convocaram outros. Juntos, durante quase 3 anos, construímos "Lourdes 2006". Obrigado aos trabalhadores que nos vieram ajudar alguns dias antes do Encontro, para encher e distribuir nos hotéis as mochilas dobráveis, que foram muito úteis e fizeram sensação na cidade de Lourdes. Obrigado à equipe que arrumou a basílica e à equipe de decoração. Obrigado aos que trabalharam durante o Encontro: às equipes de acolhimento, aos que dirigiram os deslocamentos, inclusive durante as liturgias, e aos responsáveis de cada casa (hotel). Obrigado ao coral, aos músicos, ao maestro, à animadora e a todos os que participaram das animações. Obrigado aos doentes e seus familiares, pela confiança que tiveram em nós. Sua presença nos permitiu alargar o coração. Agradece11
mos também aos acompanhantes que cuidaram deles. Obrigado à equipe de comunicação. Ela se pôs dia e noite a serviço dos equipistas que ficaram em casa, permitindo-lhes acompanhar nosso encontro dia a dia. Ela foi a imagem ideal da internacionalidade do nosso movimento. Obrigado aos trabalhadores de "depois da hora", que vieram numerosos nos ajudar a arrumar a basílica, a deixá-la como a havíamos encontrado. Obrigado a todas as mãos que costuraram as vestes litúrgicas, aos que voluntariamente se dirigiram à estação e aos aeroportos para acolher. Também aos que se encarregaram da manutenção e da loja de souvenirs. Obrigado a todas as casas que se abriram em Paris e em outros lugares, para acolher, antes ou depois do Encontro, os irmãos do mundo inteiro que quiseram prolongar sua estadia na França .
Obrigado a vocês todos que não puderam vir e se uniram a nós em oração desde muito tempo antes do Encontro. Agradecemos às comunidades religiosas amigas que rezaram em comunhão conosco. Obrigado às Carmelitas de Lo urdes que recolheram todas as intenções depositadas aos pés do altar, ou enviadas através do site/ intemet, durante o encontro. Elas as vão apresentar ao Senhor, uma a uma, nas próximas semanas. Um grande agradecimento ao Senhor por nos ter reunido junto a Maria, em Lourdes. Nós convidamos vocês a continuar a caminhar no seu seguimento, com as Equipes de Nossa Senhora, na paz, na alegria, na oração e na certeza de que há felicidade em ser casal, o que foi fortemente sentido por aqueles que nos viram em Lourdes. Obrigado pelo testemunho de vocês.
Pela Equipe Organizadora Renê e Marie ]oele Bannier
................................................... NOlÍClAS DAS EQUlPES DA ZONA EURÁFRlCA 1. Que equipes compõem a Zona Euráfrica? Compõem a Zona Euráfrica as equipes das Super-Regiões Espanha (900 equipes), Itália (700 equipes), Portugal (900 equipes), África de lín12
gua francesa (210 equipes), e aRegião Síria, ligada diretamente à ERI (50 equipes). Somos um total de 2760 equipes de base, cujas línguas são o espanhol, o italiano, o português, o francês e o árabe. CM 414
As quatro zonas foram criadas em 2001. Os primeiros responsáveis de nossa Zona foram Alberto e Constanza Alvarado, casal colombiano, membro da ERI de 1999 a 2005. Em julho de 2005, depois de termos sido responsáveis pela Super-Região Espanha, aceitamos fazer parte da ERI e substituí-los como responsáveis da Zona até 2011.
2. As Zonas facilitam o conhecimento e a ajuda mútua. Pertencer ao movimento internacional das ENS exige de cada SuperRegião e Região: • Viver aberta e atenta às outras Regiões e Super-Regiões; • Estar sempre disposta a dar e a receber; • Repelir a tentação de viver centrada sobre si mesma e de interessar-se somente pelo que lhe diz respeito. As Super-Regiões e as Regiões fazem parte de um todo. Nós não estamos isolados. Mas, se não criarmos vias de comunicação, não chegaremos a nos conhecer. E se não nos conhecermos, não poderemos nos amar, nem ser solidários, nem nos ajudar. O conhecimento conduz à amizade. E esta, à solidariedade, que se concretiza na ajuda mútua espiritual e material. Consegue-se o conhecimento mútuo: • Participando ativamente dos encontros gerais; • Praticando a hospitalidade (acolhendo e sendo acolhidos); • Através da comunicação escrita CM414
(correio eletrônico e postal) e por telefone; • Lendo as publicações; • Buscando as informações necessárias. As Zonas facilitam este conhecimento mútuo, a ajuda espiritual e material.
3. De 2002 a 2006, período no qual fomos responsáveis da SR Espanha, fizemos a experiência da dimensão internacional do Movimento. Foi decisivo para tal o Encontro Internacional de Responsáveis Regionais e Super-Regionais com a ERI, em janeiro de 2003, em Roma, como também o foram a reunião da Zona, de 4 dias, em Valência (Espanha- julho/2003), e as reuniões de um dia, após os encontros da ERI, com o Colégio de Responsáveis Super-Regionais, em Melbourne (2002), no Rio de Janeiro (2004) e na Ilha Maurício (2005). Após estas reuniões internacionais de que participamos, temos relatado, com entusiasmo, às nossas super-regiões e respectivas regiões 13
tudo o que lá temos vivido, a fim de que todos nós, pouco a pouco, sejamos capazes de nos comprometer com a solidariedade internacional de nosso movimento e com a ajuda financeira a projetos concretos. A solidariedade internacional não é algo que diz respeito somente aos responsáveis super-regionais e regionais, mas envolve todos os membros do Movimento. É necessário começar a criá-la em cada equipe de base.
4. Frutos concretos da solidariedade internacional em nossa Zona: • Ajuda financeira das equipes de base das Super-Regiões Itália e Espanha aos projetos de formação de casais responsáveis das Regiões Angola e Moçambique, realizadas na Super-Região Portugal, e da Super-Região da África de fala francesa. • Ajuda econômica das equipes de base das Super-Regiões Itália, Portugal e Espanha, para que alguns casais e conselheiros espirituais das Regiões Angola e Moçambique e da Super-Região da África de fala francesa pudessem participar do Encontro Internacional de Lourdes. • Em janeiro de 2006, Gerard e Marie Christine de Roberty, então Casal Responsável da ERI, estiveram presentes na Síria, para conhecer in loco as equipes da Região Síria e animar uma sessão de formação para os equipistas. • Passaram a ser mais conhecidas e consultadas as seções referen14
tes ao "Correio da ERI" e as notícias de outras super-regiões, publicadas nas Cartas Mensais de nossas super-regiões, bem como a página web internacional das ENS (www.equipesnotre-dame.com).
5. A dimensão internacional do Movimento está em vias de se tornar sempre mais realidade em nossa Zona. Vimo-la acontecer também na participação do Encontro Internacional de Lo urdes: 1100 da SR Espanha; 900 da SR Portu_gal: 750 da SR Itália: 180 da SR Africa de fala francesa; e 50 da Região Síria. Durante o Encontro de Lourdes, pudemos ver representada a internacionalidade do Movimento, com sua variedade de culturas, etnias, línguas, mas sem esquecer a unidade que provém de nossa fé em Deus. 6. Durante os próximos 5 anos, como casal responsável pela Zona, estamos dispostos a ir aonde os responsáveis das SR e da Região Síria nos chamarem, para criar laços de ligação entre elas, com a ERI e as outras Zonas, para promover o conhecimento mútuo, a amizade, a união e a solidariedade entre as equipes, e para formar, com os responsáveis super-regionais e pela Região Síria, uma comunidade cristã de casais a serviço de todas as equipes de base da Zona.
Maru e Paco Nemesio CL Zona Euráfrica CM414
X ENCONTRO lNTERNAClONAL DAS ENS - LOURDES2oo6 Qu e m ficou participou As Equipes de Nossa Senhora de Brasília, no domingo dia 17/09, na Igreja Bom Jesus, participaram de significativa Eucaristia, na intenção dos casais que estavam no Encontro Internacional de Lourdes. Lindo é ver os casais que não viajaram, rezando pelos que estão em missão. Na homilia, seguindo as leituras da liturgia do dia, Pe. Jânison nos encheu de coragem para testemunhar o amor conjugal no mundo de hoje, colocando Jesus Cristo em primeiro lugar nas nossas vidas e no dia a dia de nossas farru1ias. A celebração encheu nossos corações e nos provocou uma vontade de responder bem alto para Cristo a pergunta feita por Ele mesmo, como se lê no evangelho e que está contida em nosso livro de estudo: "e vós quem dizeis que sou?". A exemplo de São Pedro queremos responder a Jesus que Ele é o Messias, o tão amado Cristo da nossa fé. Estamos todos esperançosos e ansiosos com o retorno dos casais, nossos irmãos na fé, trazendo suas notícias do Encontro Internacional.
Paula e Humberto Eq. 22 -A I RCO I CM414
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ACOlHlDA E ABERTURA Abrindo o Encontro Muita expectativa, muita ansiedade ... ! Arrumar malas, documentos, viagem, deixar a família, a casa, enfim desinstalar-se! Mas não era para isso que Deus nos chamava? Ir ao Encontro, ir ao encontro de tantos outros irmãos, unidos por um só Deus, um só ideal e um só rumo: buscar a santidade em casal, como profetizou Padre Caffarel. Sentir-se amado, sentir-se escolhido para estar ali. Sentir-se responsável por tantos outros que ficaram aqui no Brasil, sentir-se peregrino ... acolhidos amorosamente pela Mãe! Nós éramos pessoas vindas de setenta países, das mais diversas partes do mundo! A Basílica São Pio X estava preparada para acolher os peregrinos. O altar, ao centro, solene e simples, realçado pelo jogo de luzes, que dava o toque sobrenatural exigido pelo momento e pelo evento. À frente do altar, a Cruz de Cristo, em aço, tendo aos pés as figuras de São João e de Nossa Senhora, também em aço. O Encontro foi aberto às 20:30 horas. O canto de entrada, criado para o Encontro, Jesus nossa alegria, foi entoado por todos os equipistas, enquanto as bandeiras, agrupadas por zona e por país iam sendo apresentadas . Marcavam a presença dos equipistas esparramados por tantas terras. Lá estava o estandarte do Brasil, conduzido por Regina e Cléber, acompanhados por Frei Avelino. Fomos acolhidos por MarieChristine e Gerard de Roberty, Casal 16
Responsável da Equipe Internacional do movimento das Equipes de Nossa Senhora. A seguir houve a apresentação das zonas de ligação. Um momento rico foi a troca de mensagens. Cada um de nós recebera um marcador de páginas com a imagem de Nossa Senhora de Lourdes. No verso deveríamos escrever nossa mensagem de boas vindas a um irmão equipista. Num dado momento, as mensagens foram trocadas entre os irmãos mais próximos. Foi um acolhimento recíproco e carinhoso entre equipistas vindos de países tão diferentes e falando línguas tão diversas, mas irmanados pelo mesmo amor de Cristo. Os responsáveis pelas zonas de ligação da ERI - Paco e Nemésio pela ZonaEuroáfrica, Jean-Louis e Priscilla Simonis pela Zona Centro-Europa, John e Elaine pela Zona Eurásia, Maria Regina e Carlos Eduardo pela Zona América, e Carla e Maria Carla pelas Equipes Satélites -em seqüência, apresentaram os temas e jornadas dos cinco dias do Encontro. Em seguida, todos os presentes rezaram juntos uma oração, cada um em sua própria língua, graças ao auxílio de um aparelho FM, com tradução instantânea para os diversos idiomas ali presentes. O coral unia a todos através da música. A basílica inteira entoou um canto ao Espírito Santo, com refrão em latim repetido por todos. O texto, cada um o fez em sua própria língua. A seguir as mais de 8 mil pessoas presentes fizeram profundo silêncio para meditação. CM 4 14
Rezamos o Magnificat, encerrando-se a cerimônia com todos agitando seus lenços, nas cores azul, amarelo, verde e vermelho, cores das 4 zonas de ligação da ERI. Oh! Senhor! Agradecemos portanto amor partilhado, pela vida, vida em união, buscando a paz entre as nações! Luzia e Paulo Meirelles CR Região São Paulo Leste II
Cristo nossa alegria Enfim, Lourdes ... No hotel, fomos recebidos por um jovem casal francês, responsável pela casa, que nos passou com muito carinho as instruções e o material do Encontro - mochila, cadeira, cadernos de liturgia, a faixa azul que durante todo o evento nos identificaria como membros da zona de ligação América, e logo dirigimos nosso pensamento para outros inúmeros voluntários que, incansáveis, se dedicariam ao serviço durante os dias do Encontro. Lembramos, com muito carinho, de todos aqueles que nos pediram orações e nos encaminharam suas intenções particulares para que as depositássemos junto ao altar das celebrações no momento oportuno. Tudo isto fazia crescer em nós a expectativa com a cerimônia de abertura. O primeiro momento de congraçamento ocorreu no próprio hotel, durante o jantar. Ali estavam casais que se comunicavam em francês e português, estes vindos de vários cantos do Brasil, de Portugal, das llhas dos Açores e da Madeira e dos Estados Unidos (portugueses que ali vivem há muiCM 414
tos anos). Que alegria este primeiro encontro com irmãos que vivenciam a mesma proposta, o mesmo ideal, o mesmo carisma. Terminado o jantar, fomos orientados a nos dirigirmos para a Basílica São Pio X, subterrânea. Aos poucos, nosso grupo se juntava a outros, todos com as suas mochilas e cadeirinhas verdes, que foram muito úteis durante toda a jornada. Pela cor dos crachás e pelas faixas coloridas, que todos traziam ao pescoço, podíamos ver de onde, provavelmente, vinham. E começamos a encontrar os inúmeros casais brasileiros com suas camisas amarelas. A multidão crescia... Depois de acomodados, perguntávamos aos que estavam próximos de nós de onde vinham, não importando o idioma em que nos comunicávamos (muitas vezes apenas mostrávamos os nossos crachás) e havia gente de todas as partes: Trinidad e Tobago, Alemanha, Colômbia, Espanha.... A alegria de todos era contagiante. Éramos ali milhares de casais, todos conscientes de que ali estávamos chamados a dar testemunho dos valores do sacramento do Matrimónio e das graças recebidas. O coral começou o canto de entrada da Cerimônia de Abertura, "Jesus, nossa alegria". Com aqueles milhares de irmãos, em diversas línguas, pudemos cantar o refrão que traduzia bem o sentimento de todos naquele momento: Jesus teu amor é nossa alegria, I Juntos, somos o reflexo de teu rosto, I Partilhamos a alegria que nos dás. I Jesus, teu amor é nossa alegria. Marlene e Fernando CR da Região Rio I 17
MENSAGEM DO PAPA Vaticano, 13 de julho de 2006 Senhora, Senhor, Informado a respeito do X Encontro Internacional das Equipes de Nossa Senhora, que se realizará em Lourdes, entre os dias 16 e 21 de setembro próximos, o Santo Padre une-se pelo pensamento e pela oração a todos os participantes. O tema escolhido para esse encontro: "As Equipes de Nossa Senhora, comunidades vi vas de casais, refletindo o amor de Cristo", convida os membros do vosso Movimento a assumirem plena consciência de suas responsabilidades eclesial e missionária no mundo de hoje. O Papa os encoraja, pois, a tornarem-se, cada vez mais, testemunhas do Cristo ressuscitado, deixando transparecer, por sua vida de casal, a graça, por eles recebida no sacramento de Matrimônio, de serem sinais do amor de Cristo. Possam eles, assim, contribuir para que se conheça melhor, na sociedade de hoje, a verdade da mensagem cristã sobre a família, que é um convite para se descobrir, de forma cada vez mais plena, a dignidade da pessoa humana criada à imagem de Deus, vivenciando a alegria de relações verdadeiramente humanas, por serem fundadas sobre o amor mútuo, à imagem do amor divino! O Santo Padre convida ainda os membros das Equipes de Nossa Senhora a se aproximarem das pessoas que passam por dificuldades na sua vida conjugal e, por vezes, enfrentam seu aparente fracasso, para auxiliálas a retomar forças, graças a uma caminhada de ajuda mútua fraterna e a redescobrir a esperança que não engana (cf. Rm 5,5). Que o exemplo da Virgem Maria, que acolhe sem reservas o dom de Deus e se entrega totalmente a seu Senhor, seja para os membros das Equipes de Nossa Senhora um sustento e um guia, nas alegrias e também nas dificuldades do testemunho cotidiano. Ao invocar sobre os organizadores e sobre todos os participantes deste Encontro Internacional a materna proteção de Nossa Senhora de Lourdes, Sua Santidade concede-lhes, de todo o coração uma especial Bênção Apostólica, assim como a todos os membros das Equipes de Nossa Senhora, dispersos pelo mundo. Feliz por poder transmitir esta mensagem da parte do Santo Padre, peço que recebam meus cordiais e dedicados cumprimentos em nosso Senhor. 18
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JESUS CRlSTO CENTRO DA VlDA CRlSTÃ Jornada Euroáfyica Jesus Cristo centro da nossa vida A chuva fina da noite de abertura deu lugar a uma estiagem fresca e clara, que favoreceu a nossa missa de domingo, no prado, em frente à gruta. A Celebração Eucarística iniciou às 9 horas. Presidiu-a o Bispo Mons. Mário Russotto. Os responsáveis pela liturgia foram os equipistas da Zona Euroáfrica. A homilia de Mons. Russotto, baseada no Evangelho (Me 8,27-35), abordou a pergunta de Jesus aos discípulos: "E vós, quem dizeis que eu sou?", situando-a nos três Evangelhos (Marcos, Mateus e Lucas). Ao concluir sua homilia, disse-nos: Vós, queridos casais cristãos, sois o beijo de Deus na história. Encerrada e celebração, nos dirigimos para a Basílica São Pio X, a fim de assistir à conferência de D. Jacques Perrier, sobre o tema que permeou tanto as celebrações como as reflexões daquele dia: Jesus Cristo, centro da vida cristã. Dom Perrier sugeriu substituirmos a palavra "centro", do tema, por "coração", palavra bíblica, que evoca o amor compassivo de Deus pelo seu povo e lembra Jesus Cristo, de cujo coração transpassado saiu sangue e água. Por fim desejou: "Que Cristo esteja no coração de vossa vida, que Ele seja o coração de vossa vida", pois, como Ele disse: "Onde estiver CM414
o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração" (Lc 12, 34). Após o almoço, nos respectivos hotéis, todos realizaram sua reunião das equipes mistas. Às 16 horas, os equipistas misturaram-se à multidão frente à Gruta, para participar da Procissão Eucarística, que sempre tem participação expressiva de deficientes físicos em cadeiras de rodas e macas. A procissão vai da gruta à basílica S. Pio X, onde o Santíssimo é exposto para a adoração, culminando com soleníssima bênção. Foi um ato maravilhoso, pela solenidade, pelo ambiente e pela quantidade de peregrinos presentes. Após o jantar, foi realizada a segunda reunião de equipe, esta com o objetivo de assimilar e discutir os pontos mais importantes da conferência de Mons. Perrier. Ao final da reunião, encerramos o dia com o Magnificat, absolutamente convencidos de que "Jesus Cristo é o centro (coração) da vida cristã". Mércia e Aguimar CR Região Centro-Oeste I
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Recebendo o beijo de Deus Oh! Vem conosco vem caminhar, Santa Maria vem ... Com muita fé, invocamos Maria, 19
através deste canto, iniciando a Celebração Eucarística do domingo, dia 17/09, em Lo urdes. A multidão de casais equipistas dirigiu-se ao Prado, em frente à Gruta, a fim de participar da Celebração Eucarística. As belezas do Encontro e do Prado completavam-se. O presidente da Celebração em sua homilia, cujo tema era Jesus Cristo centro da vida cristã, levou-nos a refletir sobre o Cristo, que precisamos e queremos conhecer, através de três abordagens: • O caminho de Marcos (cotidiano do caminho do casal); • A passagem de Mateus (reflexão sobre o parar e o sentar como casal); • Oração de Lucas (momentos de elevação sob o olhar de Deus, que nos permitem descobrir um pouco a identidade de Cristo) .
O ofertório foi marcado pela bonita apresentação dos casais de África, que levaram as oferendas ao altar com cantos e ritmos próprios de sua cultura. Maria, nossa Mãe estava lá conosco. Aos equipistas do muito inteiro, presentes ou não em Lourdes, cheguem as nossas orações, pois como Cristo mesmo falou: "Onde estiver o vosso tesouro, aí está também o vosso coração (Luc. 12,34). Finalizamos com as palavras de Monsenhor Mário Russoto: "Se o ser humano, para se tornar realmente 'vivo ', recebeu o sopro da intimidade amorosa de Deus, isso quer dizer que vós, queridos casais cristãos, sois o beijo de Deus na história! " Dalva e Paulo CR Região Rio Grande do Norte
................................................... PARA VÓS, QUEM SOU EU? Homilia Caríssimos amigos, queridos casais, reunidos neste tão sugestivo Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, para o Encontro Internacional das Equipes de Nossa Senhora, a todos vocês dirijo a minha cordial e afetuosa saudação. Sinto-me honrado em celebrar esta Eucaristia para vocês e com vocês. Sinto tremor e temor ao dirigir-lhes a minha humilde palavra. Confio, porém, na misericórdia de Deus e na materna proteção da Vir20
gem Maria, a fim de que o Espírito do Senhor ponha no meu coração e nos meus lábios as palavras que Ele mesmo gostaria de inspirar e fazer penetrar em seus corações. A vocês peço que se ponham na atitude do Servo sofredor, que nos é apresentado pelo profeta Isaías na primeira leitura: "O Senhor Deus abriu-me o ouvido e eu não me rebelei, não me esquivei" (Is 50,5). Abramos, portanto, a concha de nosso coração, para que a palaCM414
vra de Deus possa revigorar nossa alma, como um orvalho de amor, refrescante e fecundo. 1.
E vós quem dizeis que eu sou?
O tema que orienta o encontro neste dia é "Jesus Cristo, centro da vida cristã". Vamos, então, reler juntos o Evangelho para ver qual rosto de Cristo somos chamados a colocar no centro de nossa fé e da vida de esposos, para que sejamos, como Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, reflexos do amor de Cristo. "E vós quem dizeis que eu sou?" (Me 8,29). Esta pergunta divide o Evangelho de Marcos em duas partes. Trata-se de uma pergunta vital, posta aos leitores e aos cristãos de todos os tempos. Ela não exige somente uma resposta sobre a identidade de Jesus, mas implica também uma resposta sobre a identidade do discípulo em relação a Je-
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sus. É uma pergunta-confronto, porque procurar entender quem é Jesus significa, também, procurar entender quem somos nós na qualidade de discípulos. Os Apóstolos tinham vivido tanto tempo com Jesus e partilhado com Ele tantas experiências. Dãose conta, porém, de que, para conhecê-lo, não é suficiente estar a seu lado e viver com Ele. Cada pessoa, com efeito, permanece sempre um mistério, não se consegue jamais conhecê-la em sua totalidade. O seu agir revela sempre algo novo, às vezes previsível, às vezes impensável. Prova disto é a experiência de tantos esposos, que, após muitos anos de matrimônio, dão-se conta de que não se conhecem completamente. Constatam que vivem junto a um cônjuge envolto ainda em mistério. É assim também, com mais razão, em relação a Cristo. Há dois mil anos a comunidade cristã reflete sobre sua pessoa e sua identidade. Jesus, no
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entanto, permanece sempre um mistério. Conhecê-lo é sempre um dom e uma conquista. Para saber realmente quem é Jesus é indispensável acolher o escândalo de sua fraqueza, condividir com Ele a experiência de seu dom total, por amor, no mistério de morte e de vida.
Três caminhos e uma pergunta
2.
Entremos agora no santuário do texto evangélico, onde ouvimos que "Jesus partiu com seus discípulos para as aldeias situadas na região de Cesaréia de Filipe e, no caminho, interrogava seus discípulos ... " (Me 8, 27). Segundo o relato de Marcos, Jesus faz a pergunta sobre sua identidade enquanto está "em caminho " com os discípulos. Neste itinerário, que é a própria vida vista como um caminho, a pergunta de Jesus "E vós quem dizeis que eu sou?" é colocada durante o caminhar. Pode-se dizer que toda caminhada do discipulado é um contínuo e sempre renovado interrogar-se sobre a identidade de Jesus. O mesmo episódio, no evangelho de Mateus, está situado na ocasião em que Jesus e seus discípulos chegam a Cesaréia de Filipe (cf Mt 16,13). Para Mateus, é um decisivo momento de parada, um tempo de reflexão fundamental para a comunidade. E a pergunta de Jesus chega pontual, pungente, precisa. É um momento de interrogação na parada do caminho. Lucas, por sua vez, oferece uma descrição muito sugestiva sobre o mesmo assunto: "enquanto Jesus se 22
encontrava orando em um lugar à parte e os seus discípulos estavam com Ele ..." (Lc 9,18). Segundo Lucas, Cristo se revela, e podemos conhecê-lo precisamente a partir de uma experiência concreta de oração, numa intensa relação de comunhão. Temos, assim, o mesmo relato, a mesma pergunta, mas com três metodologias diferentes, três vias diferentes para nos confrontarmos com Cristo, para procurarmos compreender quem é Ele e quem somos nós como discípulos. • A estrada de Marcos: é nossa vida e nossa história no seu desenrolar de todos os dias. É Cristo procurado no dia a dia, na quotidianidade do vosso caminho de esposos, ao longo da estrada sobre a qual vocês estão encaminhando o vosso amor... E ali, durante o caminho, o Senhor lhes propõe uma contínua interrogação, que exige permanente coragem na procura da resposta. • A parada de Mateus: é o momento da reflexão, da concentração e do questionar-se interiormente. É o tempo de parar e de sentar, em casal e também individualmente, para entender quem vocês têm colocado no centro da vida e a quem vocês estão seguindo. Na parada, Cristo vem ao encontro, através da meditação sobre a Palavra e do discernimento, e nos pede a coragem de parar para refletir, para compreender e pôr fogo em nossa vida. • A oração de Lucas: é o momenCM414
to alto no qual, colocados sob o olhar de Deus, toma-se possível para nós descobrir um pouco a identidade de Cristo e o que Ele pede que nós sejamos. A oração nos ajuda a buscar Jesus na contemplação, no ek-stasis, isto é, no sair de nós mesmos, numa espera que se faz companhia orante com o Senhor, que se faz coragem contemplativa para atingir as fontes da Vida, a flm de saborear a alegria de estar com Ele (cf. Mc.3,14), porque Deus tem sede de nosso desejo e de nossa sede dEle. Caros amigos, nestes dias, durante o diálogo conjugal, perguntem-se: como podemos encarnar, na nossa vida e na nossa farm1ia, a imagem do caminho, da parada e da oração, para darmos respostas vivas e concretas à pergunta de Jesus: "E vós quem dizeis que eu sou?"
3. O perturbador É importante notar que nos três evangelhos é Jesus quem interroga. Ao mesmo tempo em que se faz objeto da pergunta, Ele continua o sujeito, porque é Ele o interrogante. É preciso, então, passar do interrogar ao ser interrogado, do exigir uma resposta ao dar a Deus uma resposta. E vós quem dizeis que eu sou? O coração da fé cristã não é um objeto, uma doutrina, uma fórmula. E o Vivente que se apresenta a nós como provocação, como inquietude do coração, como espada que fere e cura. O encontro com Cristo exige, por isso, CM 414
abertura à novidade e à alteridade de Deus, exige estupefação frente Àquele que, trespassado por nosso amor, nos trespassa agora com toda a força de seu amor implacável. Então, procurar o rosto de Cristo, quer dizer deixar-se incomodar, sair duma mediocridade fácil e de certezas tranqüilas, de equilíbrios que não nos comprometem; isso quer dizer que se faz uma escolha precisa e determinada na nossa vida. Por isso, Jesus espera dos seus uma mudança de conhecimento: do conhecimento fundado sobre a simples racionalidade e sobre a afetividade para o conhecimento pela familiaridade, na intimidade e amizade. A via para o conhecimento de Deus não é somente a via da razão, ela é também e principalmente a via da relação e da amizade, a via do amor. Os Pais da Igreja diziam: cognitio Dei cum amore: conhece-se Deus pelo amor! Portanto, quanto mais aprofundamos a nossa amizade por Ele, o nosso ser com Ele, mais nos é revelado o mistério da sua pessoa.
4· O escândalo da Cruz E vós quem dizeis que eu sou? Pedro responde: Tu és o Cristo. O próprio Jesus explica o que significa para Ele ser o Cristo: O Filho do Homem deverá sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos escribas, ser morto, mas depois de três dias ressuscitará (Me 8,31 ). Jesus vive ao pé da letra a palavra dos profetas, encarna sem descontos a palavra das escrituras. O 23
texto de Isaías fala do Servo cheio de coragem no sofrimento: Apresentei as espáduas aos que me flagelavam , o rosto aos que me arrancavam a barba; não escondi o rosto aos insultos e às cusparadas ... (Is 50,6) . Como não resiste à palavra do Senhor, o Servo também não opõe resistência às injúrias humanas. É um sofredor, um perseguido. É açoitado nas costas como um louco. Ele, o sábio por excelência, é tratado como um bobo. O Servo protesta com a não-violência . Não fala . Cala e ama! Sua força é a fraqueza humana da não-violência, a linguagem eloqüente do amor que doa tudo e nada espera. Jesus, que hoje queremos escolher como centro da nossa vida, é Deus Servidor do homem. É Deus, mas desfigurado. Vive na sociedade, mas desprezado. É o homem das dores, que faz do silêncio a força do amor. Por isso, o rosto de Jesus deve ser procurado lá onde a sua palavra escandalizou a Pedro: na obscuridade da Sexta-feira Santa e na luminosidade da Páscoa. Se queremos saber quem é Deus, devemos ajoelhar-nos aos pés da cruz e abrir-nos à impossível possibilidade da Páscoa. Quem o procura em outro lugar não pensa segundo Deus, mas segundo os homens. Com efeito, é só na perspectiva da Cruz de Jesus que esta existência humana, marcada pela cruz, adquire um sentido. Também o sofrimento, a fraqueza, o nada, o abandono, a solidão e o vazio mais cruéis são abraçados por um Deus 24
solidário, por um Deus tão louco que nos ama a ponto de morrer! Com razão escreveu o Papa Bento XVI: "Em Cristo encontram-se a beleza da verdade e a beleza do amor; mas o amor supõe também a disponibilidade ao sofrimento, uma disponibilidade que pode chegar até ao dom da vida por aqueles que se ama! Cristo, que é "a beleza de toda a beleza" ... , torna-se presente no coração do homem e o atrai à sua vocação, que é o amor" . 5· Conclusão Queridos casais, Deus semeou em vocês a vocação ao amor. Vocês são o reflexo da beleza do amor de Cristo no mundo e para o mundo. São o Evangelho do Amor nupcial que Deus revela na história. Como a Virgem Maria, vocês são o tabernáculo de carne em que Jesus gosta de morar, repousar, revelar-se. Se o ser humano, para tornar-se "ser vivente", recebeu o sopro da intimidade amorosa de Deus, isto significa que vocês, caros esposos cristãos, são o beijo de Deus na história! Possam estes dias, então, fazer nascer em vocês a consciência, a responsabilidade e a alegria da vida conjugal consagrada no matrimónio. Estou certo de que a Virgem Maria transformará o seio de suas farru1ias em um Magnificat perene, para que sejam, na Igreja e no mundo, hóstias de amor do Cristo Jesus. Amém! Dom Mário Russotto Bispo de Caltanissetta (Itália) CM 414
JESUS CRlSTO, CENTRO DA VlDA CRlSTAConferência Já que tivestes o bom gosto de escolher Lourdes para o vosso encontro internacional e que me destes a honra de me pedir uma conferência, não podia recusar o vosso convite. Vós mesmos escolhestes o tema da minha exposição: Jesus Cristo, centro da vida cristã. Prefiro, aliás, não ser eu a escolher o tema, quando tenho de usar da palavra. Se uma pessoa escolhe o seu tema, corre o risco de se repetir, por uma questão de facilidade. O tema imposto obriga a uma renovação. O título dado à exposição de hoje parece, porém, tão evidente! Conviria para uma meditação. Mas para uma conferência? No entanto, apesar das aparências, vamos ver que este título levanta alguns problemas. Procederemos, então, classicamente, em três tempos. No primeiro, veremos a legitimidade da expressão título. No segundo tempo, faremos algumas perguntas para não nos fecharmos nesta formulação, antes de voltarmos a ela, uma vez que ela se aplica admiravelmente, entre outras coisas, à família fundada no sacramento do Matrimônio. Que Jesus Cristo seja o centro da vida cristã, São Pedro e São Paulo estão de acordo. Este consenso é importante, de tal modo estas duas personagens estão longe uma da CM 414
outra. São Pedro diz a Jesus, a seguir ao discurso do Pão da vida, quando a tendência é o escândalo e o abandono por parte dos discípulos: "A quem iremos nós, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna!" (Jo 6,68). Por seu lado, São Paulo tem estas frases peremptórias: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20); "para mim, viver é Cristo e morrer é lucro" (Fl1,21). A expressão "Jesus Cristo, centro da vida cristã" tem a vantagem de dizer que no centro da vida cristã não está um livro, como no Islã, ou um princípio, como nas sabedorias, sejam elas filosóficas ou religiosas. As pessoas de Sócrates ou de Buda são admiradas pelos seus adeptos, mas, para eles, o essencial é regularem-se pelos seus ensina25
mentos, o "conhece-te a ti próprio" de Sócrates ou as "nobres verdades" do budismo. Notai que há muitas pessoas que dizem a mesma coisa: "Afmal, Jesus Cristo não sei quem era, mas o evangelho é admirável". Reparai que, ao falar de Jesus, essas pessoas exprimem-se no pretérito imperfeito: "quem era Jesus?". Exprimir-se no pretérito imperfeito significa que, para elas, Jesus morreu definitivamente. Ora, a não ser em casos de perturbação mental, um morto que nunca se conheceu nem se amou pessoalmente não pode estar no centro da minha vida. Por outro lado, não tenho certeza de que essas pessoas tenham realmente lido o Evangelho, porque, sem a pessoa de Jesus, que fica do Evangelho? O segundo dos nossos evangelhos, o de Marcos, começa com estas palavras: "Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus" (Me 1,1). O Evangelho, como o Reino, é o próprio Jesus. Ao dizermos que Jesus Cristo está no centro da vida cristã, situamos com razão a religião cristã no plano de uma relação com uma pessoa. Essa pessoa viva comunica conosco e permite-nos viver a sua vida. Cristo só nos pode permitir viver "por Ele, com Ele e n'Ele" se Ele próprio estiver vivo. Encontramos em São Paulo uma expressão lapidar: "Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa fé" (1 Cor 15,14). O cristão é alguém que reconhece Jesus como o Cristo. É esta a profissão de fé de Pedro. Quando Jesus pergunta aos discípulos "E 26
vós, quem dizeis que Eu sou?", Pedro responde: "Tu és o Messias (o Cristo), o Filho de Deus vivo" (Mt 16,16). A dignidade de "Cristo" (Messias) é plenamente adquirida por Jesus quando o Pai O ressuscita de entre os mortos. Escutemos outra vez São Pedro, no dia de Pentecostes. O apóstolo termina o seu primeiro sermão, anunciando aressurreição , com estas palavras "Deus estabeleceu como Senhor e Messias a esse Jesus por vós crucificado" (At 2,36). E como é sempre agradável aproximar Pedro e Paulo, notemos que este último dá a si próprio o título de ser "servo de Cristo Jesus" (Rm 1,1). Começa a sua epístola mais solene, a Epístola aos Romanos, dizendo que a proclamação do Evangelho consiste em anunciar "Jesus Cristo Senhor nosso", títulos que adquiriu plenamente pela sua ressurreição de entre os mortos (Rm 1,4). É desnecessário empilhar os textos. É evidente que é a pessoa de Cristo que cria a distância entre judeus e cristãos. Alguns judeus, sobretudo nos nossos dias, reconhecem em Jesus um rabi de primeira ordem. Como dizia um deles dirigindo-se fraternalmente a cristãos, Ele é "meu mestre e vosso Deus". Efetivamente, a maneira como o Novo Testamento fala de Jesus contrasta com o que encontramos no Antigo Testamento, mesmo a propósito do personagem mais importante da Antiga Aliança, Moisés. Esta observação é válida tanto para a forma como Jesus se exprime e age CM 414
como para as atitudes dos discípulos em relação a Ele. Vejamos ainda por um instante os textos que citamos. Notareis que o nome de Jesus se conservou sempre. Aquele que é Cristo, Aquele que é o Filho de Deus, é um de nós, Alguém que tem um nome de homem. Chama-Se Jesus, e a sua mãe chamava-se Maria. Nasceu no tempo de Herodes e sofreu a sua Paixão sob Pôncio Pilatos, o homem desonesto cujo nome os cristãos pronunciarão até ao fim dos tempos ao rezarem o Credo. Fizestes bem em dizer "Jesus Cristo", centro da vida cristã. A historicidade é uma característica fundamental da fé cristã. O que não deixa de levantar problemas ao nosso tempo, que prefere espiritualidades intemporais. Mas isso é outra questão! Deixemos as Escrituras e voltemo-nos para a liturgia. Entre o primeiro domingo do Advento e o domingo de Cristo Rei, o ano litúrgico vai, curiosamente, da Segunda Vinda de Cristo à Segunda Vinda de Cristo. Por que partir da Segunda Vinda de Cristo? Para evocar, logo no princípio do ano litúrgico, o fim para o qual caminhamos, através dos tempos. O Advento, tempo da espera cristã, não está vazio da presença de Cristo: Ele já veio, na humildade; voltará na glória. Os ciclos do Na tal e da Páscoa (entendo por "ciclo da Páscoa" tanto a Quaresma como o Tempo Pascal) são consagrados ao seu nascimento, à sua morte, à sua ressurreição e ao fruto da sua ressurreição: o envio do CM414
Espírito. Entretanto, seguimos Cristo em diversos momentos da sua vida pública. Assim, pode dizer-se com toda a legitimidade que Jesus Cristo está no centro do ano litúrgico. O mesmo se passa relativamente aos sacramentos. Cada um deles não tem sentido senão em relação a Cristo. O batismo é um mergulho na sua morte e na sua ressurreição. A reconciliação está aberta para nós porque Ele nos redimiu do pecado. O matrimónio cristão tem a sua origem nas bodas de Cristo e da Igreja. O diácono, o padre, o bispo, nos seus diferentes ministérios, são chamados a agir em nome de Cristo, servo e pastor. Pela unção, os doentes são identificados a Cristo salvador, na esperança da ressurreição. De forma suprema, a eucaristia é o memorial de Cristo, segundo as suas próprias palavras. Dir-me-eis que omiti a confirmação, sacramento que Cristo teria concedido ao Espírito Santo. Com efeito, a ação do Espírito Santo consiste sempre em permitir a presença de Cristo, como fez em Maria no dia da Anunciação, como faz em cada Missa, quando o padre pede a sua vinda através da oração chamada "epíclese". Pela confirmação, o batizado torna-se, segundo uma expressão de São Paulo (2Tm 2,3), "soldado de Cristo Jesus", confirmado no batismo que fez dele um cristão. Mudemos outra vez de campo e abordemos a moral ou, para usar uma expressão menos agressiva aos ouvidos delicados, o "agir cristão". 27
Aí encontramos de novo, no centro, Cristo Jesus. Em São João, trata-se de "permanecer" em Cristo e de Cristo "permanecer" em nós. A expressão surge várias vezes no discurso do Pão da vida (Jo 6) e na parábola da vinha (Jo 15). É ainda mais freqüente na primeira carta de São João. São Paulo utiliza outra imagem, igualmente expressiva: "revestir-se" de Cristo. "Todos os que fostes batizados em Cristo, revestistes-vos de Cristo" (Gl 3,27). Esta imagem inspira-se, sem dúvida, no ritual do batismo, em que o recém-batizado é revestido de branco. O comportamento do cristão decorre do comportamento de Cristo. Vejamos algumas palavras de São Paulo . Quando recomenda aos coríntios que sejam generosos na coleta, cita como modelo a liberalidade de Cristo: "Conheceis bem a bondade de nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza" (2Cor 8,9). "Tudo quanto fizerdes por palavras ou por obras, fazei-o em nome do Senhor Jesus" (Cl 3,17). A presença de Cristo não tem a ver só com a nossa alma: "Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo? Iria eu, então, tomar os membros de Cristo para fazer deles membros de uma prostituta?" (lCor 6,15). O cristão deve, em todos os aspectos da sua vida, impregnar-se de Cristo. Isto é válido para todos; isto é válido para a comunidade. Dirigindo-se aos cristãos de Filipos, São Paulo diz: "Tende entre vós os mes28
mos sentimentos que estão em Cristo Jesus". E continua com o hino que se canta durante a Semana Santa: "Ele, que é de condição divina, não considerou como uma usurpação ser igual a Deus ... ". Segue-se a evocação da Encarnação, da morte na Cruz e da Ressurreição (Fl 2,5-11 ). A originalidade desta passagem está na justaposição de um conselho de bom entendimento dirigido à comunidade e a referência ao Mistério de Cristo, no que ele tem de mais radical. Eu disse há instantes: "justaposição". De fato, do ponto de vista da lógica, tratar-se-ia mais de uma dedução: uma vez que Cristo Jesus se comportou de determinada maneira, também vós deveis comportar-vos dessa maneira. Em São Paulo, esta lógica não é voluntarista. Apoia-se na graça do batismo: o cristão é alguém que, em todas as coisas, é chamado a viver segundo o seu batismo. Recebeu dele a força através do Espírito Santo. O pecado é uma incongruência. Acabamos de passar um momento com São Paulo. Voltemos aos evangelhos, mais precisamente ao Evangelho segundo São Mateus. Quando anuncia, pela primeira vez, a sua Paixão, Jesus continua imediatamente associando os discípulos àquilo que Ele próprio vai viver: "Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e sigaMe" (Mt 16,24). Para fechar esta primeira parte, voltemos ao batismo. Somos batizados "em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28, 19). Esta é a ordem que Jesus deu aos discíCM414
pulos na última aparição relatada por São Mateus. É a expressão mais igualitária e mais unitiva que há para exprimir as relações entre as Pessoas divinas. O Pai, o Filho e o Espírito Santo são nomeados lado a lado. A duplicação do "e", que a gramática reprova e que nós, infelizmente, omitimos muitas vezes, insiste no laço absolutamente único que as Pessoas Divinas têm entre si: é impossível pensar numa sem ser remetido para as outras. Todavia, é com uma das Três que nos identificamos pelo batismo: Cristo Jesus. Não nos tomamos nem no Pai nem no Espírito. Tomamo-nos filhos e filhas no Filho. No batismo, não fomos mergulhados num banho de divindade impessoal. A ação conjunta do Pai, do Filho e do Espírito é fazer de nós irmãos e irmãs de Jesus Cristo ou, segundo uma expressão de São Paulo, dar a Cristo "muitos irmãos" (Rm 8,29). Aliás, nos Atos dos Apóstolos fala-se simplesmente dos novos irmãos que foram batizados em nome de Jesus Cristo (At 2,38). A Igreja tinha consciência de que Jesus Cristo era realmente o centro da vida cristã. Em resumo, qualquer que seja o ângulo segundo o qual abordemos esta questão, é verdade, Jesus está realmente no centro, não só da fé cristã mas da vida cristã. O que vou dizer agora não pretende semear a dúvida nos vossos espíritos nem criticar a expressão-título que deram à minha conferência. Gostaria simplesmente que não nos fechássemos numa expressão. Cristo é seguramente demasiado grande e deCM 414
masiado livre para ser fechado numa expressão, por mais exata que esta seja. Uma vez que já fiz referência à liturgia, convido-vos a entrar numa igreja à hora em que ela desempenha melhor o seu papel, isto é, durante a celebração da Eucaristia. É que uma igreja não é uma simples sala de meditação, mesmo cristã, mas o lugar construído e com uma determinada disposição para tomar perceptível o sentido da Eucaristia. O ponto chave da igreja é, portanto, o altar e o padre que aí celebra a Eucaristia. Tanto o altar como o padre são sinal de Cristo: o altar pela sua consagração, o padre pela sua ordenação, a que se poderia muito bem chamar consagração. Ora, conforme forem as igrejas, o altar e o padre que celebra estão colocados de maneira diferente. Na igreja ocidental tradicional, o altar está colocado ao fundo da abside, à cabeça do edifício. Esta localização não deixa de ter sentido, uma vez que Cristo é a Cabeça da sua Igreja (Ef 1,22). Mais recentemente, o altar avançou e o celebrante coloca-se do outro lado do altar em relação à assembléia. Estamos agora numa disposição "frente a frente", que é legítima, pois Cristo não se confunde com a sua Igreja. Ele é o Esposo e a Igreja é a Esposa (Ef 5,25-32). Entre eles travas-se um diálogo cujo cume é a liturgia. Mais recentemente ainda, construíram-se igrejas em arco de círculo, ou seja, em semicírculo, cujo centro geométrico é o altar. Os cons29
trutores da Basfiica São Pio X foram mais longe. Inovaram audaciosamente colocando o altar no centro de uma enorme elipse, estando o celebrante principal rodeado de todos os lados. Esta terceira solução arquitetônica é a que representa mais diretamente o fato de Jesus Cristo estar no centro da vida cristã. Esta solução pode apoiar-se numa palavra do próprio Jesus, uma palavra bem ousada: "Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles" (Mt 18,20). Esta palavra é daquelas que, como eu dizia antes, contrasta com as de qualquer grande personagem do Antigo Testamento. Mas continuemos. À cabeça, frente a frente, ao centro: três disposições litúrgicas, mas também três percepções diferentes da nossa relação com Cristo. Digo bem: "percepções diferentes" e não "relações diferentes". É que a relação com Cristo é idêntica em todos os cristãos, uma vez que ela é estabelecida pelo mesmo e único Espírito, no nosso batismo. Cada uma destas três percepções, se tomada isoladamente e levada ao extremo, não dá o sentido do que é a relação de fé. Se não virmos em Cristo senão a Cabeça da Igreja, corremos o risco de nos transformarmos em corpo de exército. O frente a frente pode transformar-se em cara a cara e o cara a cara, em confronto, mas a posição central representa o perigo inverso: que Cristo seja tão integrado, assimilado, rodeado, que acabe por desaparecer. Num círculo, o centro 30
não é senão um ponto, e o ponto não tem dimensões. Ora, é preciso conservar em Cristo a sua densidade pessoal e a sua liberdade. Cristo é alguém: Jesus. Não é o princípio a partir do qual o círculo se descreva. Cristo habita a Igreja, mas a Igreja não é o seu limite. Apesar destas minhas observações, não lamento esta pequena excursão arquitetural. Porque já não sabemos bem o que é uma igreja. A construção de uma igreja deve, é claro, corresponder às possibilidades técnicas (cada vez maiores) e aos dados econômicos (cada vez mais restritivos) do tempo. Deve, tanto e ainda mais, corresponder ao sentido do que ali se realiza: neste caso, a celebração do Mistério da fé, segundo a expressão que o celebrante pronuncia a seguir à consagração. Já que começamos a refletir nas imagens (Cristo Jesus como cabeça, como frente a frente ou como centro), observemos que Cristo está tanto na periferia como no centro. "Periferia" não é a palavra adequada, e até pode escandalizar. O que eu quero dizer é: quanto mais nos centramos em Cristo mais nos descentramos dos irmãos que Jesus nos dá, todos esses seres humanos, nossos semelhantes, de quem Jesus nos pede que nos façamos o próximo. "Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes" (Mt 25,40). Se Jesus Cristo está no centro, admitamos que este centro está em toda a parte. CM414
Conservamos notas tomadas em encontros que São Vicente de Paulo gostava de ter com as Filhas da Caridade. Sem serem religiosas propriamente ditas, as Filhas da Caridade dedicavam diariamente tempo à oração, como, aliás, os leigos são convidados a fazer: o vosso Movimento encoraja-vos a isso. Voltemos a São Vicente de Paulo e às Filhas da Caridade. Nessas conversas, o santo fundador respondia às perguntas que elas lhe faziam. De entre essas perguntas, havia uma que as atormentava de modo especial: que fazer quando, à hora prevista para a oração, um doente nos chama? Outros que não Vicente diriam: há conflito. Ele, o bom discípulo de São Francisco de Sales, mas também simplesmente do Evangelho, responde: ficai em paz, porque, ao irdes ter com quem vos chama, ides ter com Cristo. Deixando a oração para acorrer a um dos mais pequenos dos irmãos de Jesus Cristo, não abandonais Cristo. Da oração ao serviço, a Filha da Caridade vai de Cristo a Cristo. Compete à superiora velar para que a Irmã não perca a possibilidade de fazer oração . Se não, ela já não deixará Cristo por Cristo, mas apenas realizará um ato de generosidade: isso é alguma coisa, mas não é preciso ser cristão para ser generoso. O que acabo de dizer tem de ser bem compreendido. O Novo Testamento não consiste em substituir o amor a Deus pelo amor ao próximo. A novidade do Evangelho é unir CM414
indissoluvelmente os dois mandamentos. Eles estão unidos na pessoa de Jesus Cristo; Nele vemos e tocamos o Pai, o Senhor Deus que se revelou a Israel. Mas o Filho de Deus, ao encarnar, passa a fazer parte de cada ser humano e em particular de todos os necessitados. O verdadeiro cristianismo une uma mística centrada em Deus ao serviço pelo homem, ali mesmo onde a dignidade do homem é menos reconhecível. É claro que as vocações na Igreja são várias: contemplativas, apostólicas, caritativas etc ... Mas vejo que hoje algumas comunidades que se arriscam nos compromissos humanitários mais perigosos são também as que praticam a adoração eucarística mais fervorosa e mais freqüente. Charles de Foucauld traçou o caminho: passando horas a rezar diante do Santíssimo Sacramento e servindo os seus irmãos tuaregues num desprendimento total. As Irmãzinhas de Jesus seguem hoje o seu exemplo. Assim, Jesus é bem o centro, mas pode mandar-nos para muito longe daquilo a que estamos habituados. Muitas ofertas, no mercado das espiritualidades, convidam-nos a tornar-nos plenamente senhores de nós próprios e a melhorar as nossas capacidades. Jesus diz: «Quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la" (Mt 16,25). Ao tornar-se centro da nossa vida, Cristo não nos instala num ponto fixo, antes lança-nos numa peregrinação que não terminará na terra. Tudo isto é dito, admito, numa linguagem cheia de imagens, que se pode considerar inadequada e mes31
mo falsa. Mas não temos nada a perder quando olhamos de todos os lados o que parece evidente. Desde que não deixemos o leitor ou o ouvinte na confusão. É por isso que vai haver uma terceira parte. Entretanto, antes de lhe dar início, gostaria de propor uma outra reflexão. Sinto um certo embaraço ao ouvir dizer que Cristo Jesus poderia ser o centro. Porque Ele sempre recusou pôr-se no centro. São João é de todos o mais claro a este respeito: Jesus é o enviado do Pai. Ele veio não para fazer a sua vontade, mas a vontade d' Aquele que O enviou (5,30; 6,38). Em São João encontramos expressões deste gênero em toda parte .. Sem desenvolver tanto este tema, os outros evangelhos estão de acordo com São João. Quando os discípulos Lhe perguntam como rezar, Ele ensina-lhes o Pai Nosso. Seus irmãos e suas irmãs são os que fazem a vontade do Pai (Mt 12,50). Na Cruz, é ao Pai que pede o perdão para os seus carrascos (Lc 23,34): não atribui a si próprio o que quer que seja, nem o perdão, quando é Ele que sofre na Cruz. Logo depois do seu batismo, o Tentador tinha-Lhe sugerido que fizesse o que Lhe convinha. E ouviu esta resposta: "Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus. Não tentarás o Senhor teu Deus. Ao Senhor, teu Deus, adorarás" (Mt 4,4-1 0). Paralelamente às frases e aos episódios que acabo de citar, poderíeis citar outras em que Jesus age com plena autoridade. Assim é no 32
Sermão da Montanha, quando repete; "Ouvistes o que foi dito ... Eu, porém, vos digo". Assim é quando, por sua própria autoridade, cura os doentes, expulsa os demônios e acalma a tempestade. Esta aparente contradição é uma porta de entrada no mistério de Deus: o Filho tudo recebeu do Pai, mas não guarda nada para si. Revela-nos assim a nossa vocação de filhos de Deus: pedir e acolher a graça para dar graças. É o contrário da cena do primeiro pecado: comer o fruto porque o Tentador conseguiu persuadir de que Deus tinha agido por ciúme ao estabelecer uma proibição. Quem está no centro da Eucaristia e, portanto, da vida cristã, tanto eclesial como pessoal? Cristo Jesus, cujo memorial celebramos, por sua ordem, refazendo os seus gestos e repetindo as suas palavras? Sim, mas todas as orações eucarísticas, desde as origens da Igreja, se dirigem ao Pai. Todas terminam com a grande doxologia: "Por Cristo, com Cristo, em Cristo, a Vós, Deus Pai todo poderoso, na unidade do Espírito Santo, toda a honra e toda a glória agora e para sempre". A assembléia responde Amém. É o cume da ação eucarística. Há pouco, víamos Cristo Jesus enviar-nos aos limites da humanidade, dizendo que Se encontrava lá. Agora, reenvia-nos ao Pai, pois Ele é o Mediador: não quer monopolizar nada. Se ser cristão significa viver ao jeito de Cristo, o cristão será então alguém que nunca procurará monopolizar os outros, e ainda menos subjugá-los para seu próprio proCM 414
veito. Recusará sempre pôr-se no centro, quaisquer que sejam as suas responsabilidades. Depois de ter situado a expressão-título desta conferência num horizonte mais vasto, querendo evitar fazer disso um absoluto, tinha prometido voltar a ela encontrando novas razões para a sua legitimidade. Comecemos por formular uma objeção: dizer que Jesus Cristo é o centro da vida cristã não será isolar Cristo, pôr de lado o fato de Ele ser o Filho de Deus? Não será negligenciar o Espírito Santo, quando Jesus disse aos discípulos que era bom que Ele partisse, para lhes enviar o Espírito? Isolando Cristo, separando-O, por omissão, do Pai e do Espírito Santo, não se correrá o risco de dirigir o olhar unicamente para o aspecto humano da sua personalidade? Nesse caso, já não veríamos senão o Jesus de Nazaré, um rabi original de há dois mil anos. Em Jesus Cristo, em algumas épocas talvez se tenha minimizado a humanidade de Jesus. Do Credo de Nicéia só se retinha a fórmula: "Deus de Deus, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro". Já o nosso tempo poderia pecar por uma visão unilateral, mas inversa: Jesus de Nazaré, homem do seu tempo, e que ultrapassa o seu tempo pelas suas vistas largas, homem religioso por excelência que nos liberta das estreitezas de uma religião demasiado formalista, apóstolo da tolerância e dos direitos humanos. Este é o retrato religiosamente correto que circula na opinião pública. Não está CM414
muito longe da heresia ariana, que surgiu no século IV e quase prevaleceu em toda a cristandade, pouco depois do fim das perseguições. O princípio do cristocentrismo foi posto em prática, pelo menos em França, na catequese que se seguiu ao Concílio Vaticano II. O resultado, aliás, é espantoso. Nas cartas que os jovens com cerca de quinze anos de idade enviam ao bispo, para pedir a Confirmação, o nome de Jesus Cristo está praticamente ausente. Falam de Deus, de se aproximarem de Deus, de conhecerem melhor, dizem, a história de Deus. Isto pode parecer surpreendente. Mas este fato é tanto mais revelador quanto essas cartas são pessoais. Chegamos assim a um divórcio: a opinião pública, muito secularizada, já não ousa falar de Deus, e a minoria de jovens que, corajosamente, se considera cristã, já não ousa afirmar a humanidade de Jesus. Porquê? Porque, em todo o caso, é difícil acreditar na Encarnação, no fato de o Filho de Deus, Ele próprio Deus, ter-se feito nosso irmão, de o Verbo se ter feito carne. A nossa fé cristã é muito pouco trinitária. Justapomos um vago teísmo e uma sincera admiração por Jesus, pregador do amor. O teísmo (acreditar numa presença do divino) pode responder às interrogações da inteligência e às exigências do coração: este mundo não é insensato; não somos aqui seres abandonados. A admiração por Jesus funda uma moral de altruísmo que está à vontade na corrente humanitária da nossa época globalizada. 33
O nome de Jesus Cristo deveria resolver esta dificuldade. Como já dissemos, Jesus é um nome de homem, mesmo se, como acontece com a maioria dos nomes judaicos, o seu significado seja religioso: Jesus quer dizer "Deus salva". Jesus, Josué, Yeshua: perto de uma quinzena de pessoas diferentes na Bíblia têm este nome. Já "Cristo", este é um nome que é em si mesmo trinitário. Cristo é a palavra grega que corresponde ao hebraico Messias. O Cristo, o Messias é aquele que recebeu a unção. De quem é que Jesus recebeu a unção? Do Pai. E qual é essa unção? O Espírito Santo. Vejamos o relato da visita de Jesus a Nazaré, em São Lucas, no capítulo 4. "Veio a Nazaré, onde tinha sido criado. Segundo o seu costume, entrou em dia de sábado na sinagoga e levantou-se para ler". Nazaré é, por excelência, o lugar da sua humanidade, o lugar onde viveu trinta anos entre os seus semelhantes. A leitura é uma passagem do profeta Isaías: "O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu". Segue-se a enumeração dos sinais que o Messias há de realizar. Lucas prossegue o relato com um agudo sentido da dramatização. "Enrolou o livro, entregou-o ao responsável e sentou-se. Todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele. Começou, então, a dizer-lhes: 'Cumpriu-se hoje esta palavra da Escritura, que acabais de ouvir'. Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam com as palavras repletas de graça que saíam da sua boca". Mas logo a se34
guir, na narrativa de São Lucas, as pessoas corrigem-se e dizem que é impossível: conheciam Jesus demasiado bem: é o filho de José; não pode ser o Messias. No entanto, Jesus foi concebido pelo Espírito Santo. O Espírito desceu sobre Ele, como uma pomba, no dia do seu batismo, enquanto se ouvia a voz do Pai: "Este é o meu Filho muito amado". Jesus vai depois, durante o seu ministério, realizar as obras do Espírito, em particular expulsar os demônios. Contudo, encontramos a mesma dificuldade que os conterrâneos de Jesus: reconhecer nele o homem que Ele seguramente é e Aquele que vem do Pai, porque, no "princípio", como diz São João, Ele estava com Deus e Ele era Deus (Jo 1,1). Cristo, diz São João, é "Aquele que Deus [entenda-se: o Pai] enviou e transmite as palavras de Deus, porque dá o Espírito sem medida" (Jo 3,34). Para indicar a presença do Espírito, a Escritura emprega outra imagem para além da unção: a imagem do selo. Falando do Filho do homem, Jesus diz: "A este é que Deus, o Pai, confirma com o seu selo" (Jo 6,27). Nunca deveríamos esquecer, quando falamos de Cristo, que nele é toda a Santíssima Trindade que nomeamos. Se tivéssemos consciência disso, não haveria nenhum risco em dizer que Cristo Jesus é o centro da vida cristã. Pelo contrário, se esquecermos a dimensão trinitária deste nome, seremos discípulos de Jesus, mas seremos filhos sem Pai e corremos o risco de, com o passar do tempo, ser discípuCM 414
los cada vez mais afastados do seu Mestre. A nossa fé professa o contrário: o Espírito que o Pai deu sem medida a Cristo também faz de nós cristãos, irmãos e irmãs de Cristo, membros do Corpo do qual Ele é a Cabeça. O selo com que Ele foi marcado foi impresso em nós pelo batismo. São Paulo escreve aos efésios: "Fostes marcados com o selo do Espírito Santo prometido" (Ef 1,13-14). A vida do cristão é, pois, como a vida de Jesus Cristo, uma vida trinitária. Tal é a vocação do ser humano, visto ter sido criado à imagem e semelhança de Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. Cristo, que é um com o Pai, também é um com o Espírito. Desde que tenhamos isto em mente, é perfeitamente legítimo dizer: Jesus Cristo, Centro da vida cristã. Isto aplica-se - já o disse no início desta conferência - ao matrimônio e à fanu1ia: "Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles" (Mt 18,20). Visto o matrimônio ser um sacramento, os esposos estão reunidos em nome de Cristo. Esta é uma realidade objetiva e permanente por parte de Cristo. Os esposos e a fanu1ia que eles fundam sempre se poderão apoiar nesta promessa de Cristo. É este o meu desejo: que partais de Lourdes mais convencidos de que Cristo, pelo sacramento que recebestes, se colocou no centro da vossa vida. Ele está lá não como um personagem exterior e indiscreto, mas como uma força, uma luz, um confidente. Em suma, como SalCM414
vador, já que toda a realidade humana precisa de ser salva para não envelhecer. Termino esta conferência propondo-vos a alteração de um termo. A "Centro da vida cristã", eu preferia "Coração da vida cristã". O centro tem algo de geométrico ou administrativo: cada cidade possui o seu "Centro de impostos". Qualquer que seja a utilidade social da profissão de cobrador de impostos, o "Centro de impostos" não é o nosso destino preferido. Gostaria de substituir centro por coração, porque esta palavra é profundamente bíblica. O coração bíblico não é a sensibilidade. É o coração da pessoa, com a sua liberdade e a sua capacidade de entrega. Tanto o Antigo como o Novo Testamento dizem que é preciso amar com todo o coração. O coração lembra Cristo, de cujo lado trespassado sai água e sangue, fontes que jorram para a vida eterna. A um discípulo que lhe pede "mostra-nos o Pai", Jesus responde: "Quem Me vê, vê o Pai" (João 14,9). Um cântico litúrgico francês, composto pelo Padre Didier Rimaud, diz que nessa altura "já nada pode esconder o teu coração de Pai" (Dieu au-delà de tout créé). Então, reformulo o meu desejo de há pouco: que Cristo esteja no coração da vossa vida, que Ele seja o coração da vossa vida, pois, como Ele disse, "onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração" (Lc 12,34). Mons. Jacques Perrier Arcebispo de Lourdes e Tarbes 35
••• 18 de setembro •••
SACRAMENTO DO MATRlMÔNlO: FONTE E MlSSÃO DAS ENS Evocação do Pe. Henry Caffarel Jornada Centro-Europa Dia para louvar e agradecer A manhã estava um pouco fria. As ruas de Lourdes eram tomadas de peregrinos dirigindo-se para a Basílica São Pio X, a fim de participar da oração da manhã, que iniciou com o Laudate Dominum, cantado pelo coral formado pelos equipistas do Encontro. Neste dia, celebrava-se o 10° aniversário da morte do Padre Caffarel. Várias pessoas que oconheceram, com ele conviveram, ou que tiveram acesso a seus livros e a seu trabalho testemunharam as mudanças e transformações ocorridas em suas vidas, graças a leitura de seus livros sobre oração, às orientações dele e à convivência com esse santo sacerdote. O tema para este dia foi "Sacramento do Matrimônio: fonte e missão das Equipes de Nossa Senhora". Após a oração da manhã, foi apresentado o Serviço de Intercessão, criado e estimulado pelo Padre Caffarell em março de 1960, principalmente para interceder em favor do Movimento das Equipes de Nossa Senhora, dos casais dos casais do Movimento e de toda a Igreja, para que vivam o sacramento do 36
Matrimônio. Alguns intercessores, casais e sacerdotes, de várias partes do mundo, se apresentaram e foi feito um apelo para que surjam novos intercessores. Com o tema "O Sacramento do Matrimônio ", a conferência do Padre Alain Mattheeuws e de Priscilla e Jean-Louis Simonis, enriquecida pelos testemunhos vivenciais docasal, mostrou-nos os diversos dons que envolvem este sacramento, que nos revela o desejo de Deus para o amor conjugal. Cada vez mais envolvidos pela figura do Padre Caffarel e todo o seu trabalho, fomos brindados com a evocação de fatos marcantes da sua vida, como homem sequioso de Deus, de muita oração e mestre da meditação; como sacerdote, mestre da Igreja, profeta aberto às realidades do mundo. Um homem arrebatado por Deus, profeta do século XX. Organizados em equipes, participamos de Via Sacra, escolhendo um dos diversos caminhos sugeridos. Refletimos a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo. Ainda em clima de reflexão e oração nos preparamos para a nossa confissão. Espalhados pelos di versos pontos da área dos santuários, sacerdotes de diversas nacionalidades se colocaCM 414
ram à nossa disposição para a celebração do Sacramento do Perdão e da Reconciliação. Uma pequena placa ao lado do sacerdote identificava a língua falada. Em seguida, tivemos a reunião de equipe, na qual se discutiu e refletiu aspectos da palestra sobre o sacramento do Matrimônio .. À noite, novamente na Basilica São Pio X, Celebração Eucarística presidida pelo Cardeal Philippe Barbarin, em cujo início foi anunciada a abertura da causa de beatificação do Padre Henri Caffarel. Após a Comunhão, em ação de graças e junto com o Pe. Caffarel, exaltamos as maravilhas que nele fez o Senhor, segundo suas próprias palavras. Após, nos dirigimos à Tenda da Meditação, para adoração ao Santíssimo, exposto durante a noite inteira. Cada equipista fez sua adoração, em hora previamente escolhida. Carmen Lúcia e Antônio CR Região Minas 1
Agradecendo ao Mestre ... Querido mestre Padre Caffarel: Estamos aqui no Santuário de Lourdes, onde tantas vezes você esteve. Somos quase 9000, graças a você, buscando a luz de Cristo. Hoje pela manhã, tivemos um momento de recordações, testemunhos, entrevistas e fotos, mostrando um pouco da sua vida. Emocionounos, principalmente, o testemunho de pessoas que conviveram consigo e que o descreveram como uma figura CM414
franzina, exigente e austera, mas ao mesmo tempo forte, doce e humana. Querido Padre Caffarel, você está, mais do que nunca, vivo e presente entre nós. À noite participamos de Celebração Eucarística para reverenciar os 1O anos da sua partida e também o anúncio da abertura da causa de sua beatificação. O evento foi encerrado com um fllme inédito, com depoimentos de pessoas que conviveram com você. Foi uma celebração solene, com a presença de 3 Cardeais, 12 Bispos e cerca de 450 Conselheiros Espirituais, além de nós equipistas, seus filhos espirituais, representando as mais diversas nações do mundo, unidos todos na mesma fé, no mesmo carisma e na mesma mística. Quantas semelhanças e ao mesmo tempo, quantas diferenças. Mas é, sobretudo, na Eucaristia que Cristo age em plenitude para a transformação dos homens. E, pela ação do Espírito Santo, éramos todos uma só voz nas canções, nas orações, no Magnificat, uma só alma na Eucaristia! E assim Ele nos ia tocando e transformando ... como você sempre idealizou. Após a Comunhão, pudemos mais uma vez saborear suas sábias palavras, falando de amor, das Equipes de Nossa Senhora, do matrimônio, da oração conjugal, dos missionários do matrimônio, da viuvez ... Padre Caffarel, você realmente foi um profeta do Século XX, como disse seu postulador, Padre PaulDominique Marcovits, pois era aberto às realidades do mundo, apesar de ser um homem de oração e um 37
mestre de meditação. Era sequioso de Deus e tinha a preocupação permanente de ajudar as pessoas a fazerem o encontro com Cristo, o qual você mesmo tinha feito aos 20 anos: "Quanto mais O possuímos, mais O desejamos". Enfim, querido Padre Caffarel,
escrevemos esta carta para dizer quanta diferença você fez em nossas vidas, com suas orientações e agradecer em nome de todos os equipistas, presentes ou não naquele memorável18 de setembro. Hermelinda&Arturo CR Região São Paulo Leste I
................................................... O SACRAMENTO DE MATR1MÔN10 Conferência Pe. Matteeuws - Aos namorados, tudo parece fácil e possível. Para outros, por vezes depois da passagem do tempo ou em função de outros acontecimentos, o único refrão verdadeiro parece ser o seguinte: "Como é difícil amar". Onde está a verdade do amor? Onde está a verdade da relação homem-mulher? Qual é sua fonte? Qual seu caminho? Qual sua finalidade? Há rnilênios que homens e mulheres vêm se amando. As cul-
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turas e as diferentes religiões não se calaram e seus ensinamentos de sabedoria oferecem grandes riquezas à humanidade. Mas o que nos diz Deus a respeito do amor conjugal? A aliança entre o homem e a mulher não é objeto de revelação? O que diz o sacramento a respeito de si mesmo? 1. O dom de uma liberdade
Mesmo em condições culturais diferentes, a Igreja insiste sobre a capacidade de o homem e a mulher comprometerem-se livremente no amor, um para com o outro e diante de Deus. Na liturgia, uma das perguntas que se faz aos futuros esposos é: "É de livre e espontânea vontade que vocês vêm?"- É uma das condições de validade do sacramento. A liberdade é um valor. É claro que nossa liberdade é sempre condicionada, mas ela nunca está totalmente subordinada a CM414
condições. Para se dar um ao outro, convém que o engajamento seja o mais descondicionado possível: não é por hábito, nem por interesse nem por necessidade que os esposos se prometem um ao outro. Não existe amor no temor e no constrangimento. "A verdade vos libertará", diz Jesus. O verdadeiro amor só respira num clima de liberdade e não pode crescer sem essa liberdade que um concede ao outro na confiança. A beleza dessas liberdades que se oferecem uma à outra é que elas decidem não mais decidir sem o outro. Elas fixam para si uma condição "nobre" na sua liberdade pessoal: o outro cônjuge. Oferece-se assim a liberdade para encontrar uma outra liberdade, ampliada pela comunhão pessoal. Parte-se para um "êxodo" de si mesmo, para experimentar uma novidade: passa-se de um "ego" para um "duo". Essa liberdade no casal é fundada e finalizada no amor. Ela modifica concretamente a vida, já que viver juntos amplia todas as manifestações da liberdade individual. Esse dom da minha liberdade individual é generosidade, abundância e se opõe a uma visão egoísta do casal. O casal alarga a liberdade e as condições de liberdade de cada um dos cônjuges se o amor estiver presente e se fortificar com o tempo. Um dos sinais privilegiados do livre engajamento é o "sim". Dizer sim é abrir-se a um projeto comum, é responder a um apelo que se pressentiu, que se adivinhou, que se ouviu. Dizer sim é responder com todo o seu ser, especialmente no consenCM414
timento conjugal. Na maioria dos casos, os namorados já se disseram de diversas maneiras que eles se desejavam, que eles queriam construir algo duradouro juntos, que se amavam para sempre. A troca de promessas é um sim mútuo, acolhido como um presente pessoal. Um sim que faz sonhar e que faz entrar numa terra nova, uma terra a ser cultivada, a tomar bela. Esse sim nem sempre é fácil de dar. Para aqueles e aquelas que pressentem o alcance do engajamento, esse sim possui todo o peso do que se espera e toda a exigência do que vai acontecer. O sim é um risco, não um abrigo, mas uma aventura que começa.
Priscilla e Jean Louis - Nós bem sabemos, como casal cristão, que este sim seguido do "eu te recebo por esposo, por esposa e te prometo ser fiel na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, amando-te e respeitando-te todos os dias da minha vida", que este pequeno sim, de apenas três letras, contém como que a semente, o gene de toda a nossa vida futura de casal. Três letras que contêm toda a sinfonia de nossa vida. Elas soarão especialmente como uma ação de graças nos "dias bons" e como um lembrete nos "dias ruins". Dizemos freqüentemente que nos casamos todos os dias. Mesmo sem pronunciar explicitamente as palavras de nosso compromisso, revivemos a cada dia esse sim como o dom de nossa vida que fazemos um ao outro: "Hoje eu te recebo... " 39
Nossa oração de casal, à noite, nos nossos genuflexórios, é do mesmo jeito que no dia do nosso casamento. Damos graças ao Senhor por ele ter estado conosco durante o dia todo e nos entregamos a ele mutuamente. Ele está próximo de nós como um pai que nos ama muito. Ele consolida nosso casal, graças à ternura que tem por nós dois. Pe. M. - O fato de o sim do homem e da mulher serem pronunciados em público, diante da farm1ia e das testemunhas, é especialmente simbólico. A palavra pronunciada pode ser entendida por todos. Permite que todos se regozijem por este amor, por este compromisso, por esta esperança. Toda promessa requer um terceiro. As testemunhas que ouvem a palavra sim não serão, ao mesmo tempo, testemunhas de Deus, que também ouve o sim, compartilha o sim, diz igualmente sim a essa vontade de amar? Se o ser humano é digno de um sim, o quanto esse sim não o transforma: doravante não são mais dois, mas são um! Deus se alegra com o sim, porque ele é amor. Dizer sim ao amor é dizer sim a Deus, é louvá-lo, é tomar visível seu projeto sobre a criação de todo ser humano. A beleza do ser humano resplandece na sua capacidade de dizer sim à existência, a sua própria, a dos outros, a de seu futuro cônjuge. O sim conjugal é um sim à vida, à diferença amada e procurada, mesmo quando, por vezes, assusta ou quando desconcerta. O sim não é 40
estático. É movimento. É vida. Dá vida. A felicidade surge desse sim dado a um projeto comum: não são os cônjuges os que se põem ao serviço de um "nós" que juntos eles encontram? O sim é uma decisão. Ele faz entrar numa nova morada comum. Afrrmarnos, assim, que a liberdade pessoal desabrocha e se fortalece no vínculo exclusivo do matrimônio. Enquanto para alguns o horizonte parece estreitar-se numa união monogâmica, na realidade a liberdade cresce e aprofunda-se no mistério do outro. Ao dar-se livremente ao outro, cada um dos esposos é chamado a encontrar e amar Deus, que é fonte de todo amor.
P&JL- Tornamo-nos, assim, um novo ser. Podemos falar de "nós", agir em nome do "nós", para juntos ingressarmos numa nova liberdade, a de nos darmos a dois aos outros. Quando éramos noivos, participamos de uma manifestação que queria chamar a atenção sobre a inadequação dos transportes públicos para os deficientes. Ficamos responsáveis por Marta, paralisada em sua cadeira de rodas. Nós a levamos a passear um sábado inteiro pelos bondes de Bruxelas. Depois de casados, continuamos a visitá-la regularmente. Imobilizada na sua cama, ela nos recebia com tanta alegria que voltávamos para casa transformados. Esse pedacinho de nossa liberdade que oferecíamos a Marta com regularidade fortaleceu nosso amor conjugal, soldou nosCM414
so casal num ser capaz, por sua vez, de se doar. 2.
Um dom total
Pe. M. - Doar-se para quê? Qual é a finalidade desse dom exigente e inteiro, que toma conta da pessoa toda? O dom tem por finalidade a constituição da unidade conjugal e familiar. Neste sentido, o dom pessoal está ao mesmo tempo aberto a algo maior que a pessoa que se dá e a uma realidade que a ultrapassa: o casal, a fann1ia. As pessoas não são escravas desses entes abstratos, mas estão a serviço de um mistério que os ultrapassa, mas que não existe sem a sua colaboração e presença. O dom tem essa amplitude. Por isso, parece normal que ele seja total. Cada um encontra a si mesmo numa nova unidade: "uma só carne". Um dom dessa ordem pressupõe uma confiança radical que não coloca limites nem naquele que se dá nem naquele que recebe esse dom pessoal. Cada um dos cônjuges dá o que tem de melhor, mas também suas limitações, suas imperfeições, suas fraquezas. Ele dá tudo ao darse. O cônjuge não pode continuar celibatário. Ele é "conjugado" ao outro: portanto, ele se entrega a outrem na sua "nudez", ou seja, na verdade de sua pessoa, tal qual ele é. Essa verdade, naturalmente, já é pressentida e adivinhada antes do consentimento, mas descobre-se também no ato de se dar. A promessa faz brotar a verdade de cada um. Há um salto que se deve dar, um risco a assumir: é o que permitiCM414
rá a descoberta de uma novidade. Esse dom não é uma fusão ou uma diluição das personalidades num todo uniforme ou num ente que subjuga as liberdades humanas. O casal não é uma mini-empresa à qual tudo deve ser sacrificado. O dom total e exclusivo de que falamos tem a seguinte condição: que cada um conserve a sua personalidade e encontre no dom o terreno favorável para crescer, para fortalecer-se, para desabrochar no amor. E é verdade, apesar de difícil, que é possível permanecer o que se é, e olhar para o outro com admiração e estímulo. É possível permanecer o que se é, amando e promovendo o crescimento do outro. É com essa condição que o verdadeiro amor floresce e que a unidade conjugal toma corpo. Juntos, construímos no amor aquilo que é maior do que nós e que, ao mesmo tempo, permite que sejamos nós mesmos, aos nossos olhos, aos olhos dos outros, aos olhos de Deus.
P&JL- Perguntada sobre a imagem que tem de seus pais, uma de nossas filhas escreve: "O que admiro especialmente nos meus pais é o respeito que eles têm um pelo outro. [... ]É muito importante respeitar o fato de que o outro é diferente. Em havendo esse respeito, permite-se que o outro conserve a sua liberdade. É permitir ao outro ser livre para ser ele mesmo. Tirar essa liberdade do outro seria tornálo infeliz e impedi-lo de se desabrochar. E como conseqüência, isso se tornaria um freio para o desabrochar do próprio casal". 41
Pe. M . - Efetivamente, esse dom total pressupõe o respeito e a escuta mútuos. O total jamais pode tornar-se totalitário. Esse total implica no livre engajamento de cada um em respeitar o outro no seu ser mais profundo. O outro não pode vir a ser o escravo dos meus desejos, dos meus projetas, das minhas vontades. Não estou para policiar o outro. Cada um é guardião do ser do outro em seu inviolável mistério. O respeito passa pela escuta daquilo que o outro é, na sua diferença. Alcança-se neste ponto uma transparência que não é glacial, mas calorosa, respeitosa do mistério do outro, de sua beleza, de uma parte de seu jardim secreto. Essa transparência mútua é uma condição da totalidade do dom e permite que este assuma toda a sua amplitude na história do casal e da farru1ia. Alimenta orespeito e a confiança, mesmo se deve atravessar algumas áreas escuras, algumas incompreensões, algumas limitações insuperáveis. O outro, em seu dom total, é sempre maior que as expressões que revestem esse dom. Suas limitações não são prova de que seu dom não é total, mas mostram, ao mesmo tempo, que o dom existe para além das aparências e que pode ser renovado e enriquecido pela graça divina.
3. Um dom definitivo e para sempre É possível dar-se e continuar a se dar da mesma maneira, com a mesma intensidade, ao longo do tempo? Para a maioria de nossos contemporâneos, surgiu essa dúvida, 42
pois que a duração da vida conjugal aumentou nitidamente em relação às gerações anteriores. Culturalmente, tem-se sede de um amor que atravesse a morte e dure para sempre e, ao mesmo tempo, alguns pensam numa fidelidade sucessiva: a mulher dos meus desejos, aquele com quem construo minha vida profissional, a mãe dos meus filhos, a amante apaixonada da "idade do lobo", a companheira da minha velhice ... A indissolubilidade do vínculo conjugal não é somente difícil de respeitar, mas também de compreender e de prometer. O tempo é visto como inimigo do amor: ele desgasta o que é bom. Alguns gostariam de ajeitar esses novos dados, concebendo modelos conjugais mais elásticos. P&JL- Entretanto, quando interrogamos os jovens de hoje sobre a felicidade, sobre os valores que são importantes para eles, a grande maioria responde "a família", "uma famaia onde haja paz, tranqüilidade, alegria, partilha", diz ainda nossa filha ... "Nossos pais dedicavam tempo para nós, tinham consideração por nós, ouviam-nos, ajudavamnos ... Eles conseguiam fazer tudo isso, porque seu próprio casal vivia em paz, em harmonia!" "Agora cabe a nós procurar seguir este belo exemplo, para que meu marido e eu também tornemos felizes e satisfeitos nossos filhos!" Os noivos e os jovens casais estão, portanto, colocando no CM 414
topo de sua escala de valores "o sucesso na minha vida de casal para tornar, por nossa vez, felizes os nossos filhos". A vida dos pais é, pois, observada, na busca de um exemplo a seguir, de uma receita do "como fazer". "O que admiro nos meus pais é que, depois de 30 anos de casamento, eles continuam apaixonados. Como um casal 'Just Married'! Sei disso porque estou vendo! Muitos casais já não se beijam ou não partilham nenhuma ternura depois de tantos anos de casados, mas eles... sim!" Podemos medir assim a importância dos valores fundamentais de fidelidade e de indissolubilidade do casamento cristão e a desestabilização que infelizmente causa a separação dos pais aos jovens em busca de valores de referência sólidos. Pe. M. - O vínculo forte torna forte. O dom original entre esposos não é do mesmo tipo que um compromisso profissional ou um serviço a ser prestado. Essa "totalidade" da pessoa que se entrega à outra cria, no vínculo que se quis no início, uma força ligada ao mistério do outro. Dar-se assim não é algo banal. Simbolicamente, o dom diz respeito a todo o ser humano na sua vida nesta terra. Realmente, o dom, uma decisão da liberdade pessoal, tem a força do definitivo. A promessa diz respeito ao mistério inesgotável da pessoa que acolhe e que se dá. A vontade de amar se vai conformando não apenas de acordo com o tempo que pasCM414
sa, mas também com o tempo que é o outro: o vínculo duradouro tem esta solidez pessoal. Sou eu, é você, somos nós. Mesmo que as personalidades, as qualidades, o corpo assumam aparências diferentes, conforme as estações da vida, a pessoa permanece a mesma: inesgotável mistério de amor, cuja fonte corre abundantemente mais e mais e sempre e pode até tornar-se um rio. O dom conjugal é impregnado por essa vontade de amor que deposita fé no outro em qualquer circunstância e que aguarda os frutos desse amor ao longo do tempo. O tempo é um aliado dos cônjuges, se viverem o seu amor como uma aliança que respeita o que eles são. Compreende-se o quanto esse dom definitivo não pode sustentar-se apenas nos sentimentos ou nas qualidades exteriores do homem ou da mulher. A vida, às vezes, é dramática e o amor pode comungar apenas em alguns aspectos da realidade: a enfermidade, a mudança do desejo e as infidelidades. O amor é mais forte que tudo, se a vontade dos cônjuges se faz regularmente explícita como continuidade da promessa inicial. Casar-se cada dia, porque cada dia é um dia novo em que a liberdade é chamada a dizer e redizer o "sim". O tempo é amigo do Amor. Sem ele, quantos gestos e quantas palavras ficam sem poder desabrochar! Com ele, quantas descobertas imprevistas e quanta fecundidade! A vontade de dar-se sem volta é uma condição do amor verdadeiro e sincero. Essa vontade é também o terreno da fidelidade. A promessa 43
de dois seres, que tocam de tão perto as raízes daquilo que oferecem um ao outro, só pode ser definitivo, sem o que ela se transforma num jogo ou num artifício do amor. A promessa de se amar de maneira conjugal é a promessa de ir até o fim do amor. A geração de filhos não é uma condição desta fidelidade, confirma, porém, no tempo a perspectiva do amor conjugal, chamado a se tornar farnilial. Assim é que o casal preserva as gerações do esquecimento e consegue inscrever os filhos dos homens não mais no virtual e no instantâneo mas nas alegres e pacíficas profundezas da história humana. Para cada um de nós, ser filho ou filha de nossos pais é uma condição para o advento e a vida feliz de nossa identidade pessoal. A maioria dos que casam na Igreja fica entre o sentimento de pedir ajuda a Deus para fortalecer seu amor e o receio, por vezes, de um compromisso que eles sabem ser definitivo ao nível da fé. Na verdade, Deus não acrescenta como que um verniz de indissolubilidade ao amor humano pelo sacramento do Matrimónio. O amor é promessa de vida e de eternidade. Mas a graça divina tem, sim, seu lugar no dom dos esposos. Deus confirma a aliança dos esposos: ele a completa porque é ele que está na origem desse amor e porque ele decide com os esposos ficar até o fim . A indissolubilidade sacramental é testemunha da força de Deus na história humana: ele permanece presente mesmo quando por vezes o ser humano foge do relacionamento. O 44
Deus de Jesus Cristo é o Deus da Aliança, desde o Gênesis até o Sinai. Nosso Deus é fiel, dizem todos os profetas. A graça do sacramento é, pois, a seguinte: penetrar, por dentro, o voto de fidelidade indefectível do ser humano, confirmá-lo, salválo, fortificá-lo se necessário, dar-lhe um sentido. A aliança que constitui o sacramento é irrevogável. Os esposos podem contar com Deus. Podem considerá-Lo como o "rochedo" de seu amor. Jesus é o salvador de todo amor humano. Ele lhe confere seu pleno sentido: para a vida, para a morte. Todo o mistério pascal está inserido na promessa que os esposos se dão. Apesar do caráter incerto de toda vida humana, cada um pode acreditar na possibilidade de um compromisso como este, alicerçado em Deus e enraizado na sua graça no dia a dia. A indissolubilidade é uma sorte para os esposos. O contrato é mais do que um contrato que pode ser rescindido (cf. repúdio): é um vínculo que une os esposos entre si e com Deus. "De agora em diante, vocês estão unidos por Deus em matrimónio": esta é a vertente mai s positiva. "Não separe o homem o que Deus uniu": é a vertente da fraqueza humana que o Senhor e a comunidade cristã assumem fraternalmente.
4· Um dom fecundo, aberto para a superabundância do amor Dar-se totalmente a outrem é sentir que o amor, no movimento para sair de si, nos ultrapassa, nos CM 414
leva em direção ao imprevisto e a um plus. A fecundidade de um casal se expressa nesse impulso e nessa superação. Engloba todo o campo da vida em comum. Não se confunde com a eficiência, que é mais de ordem técnica (Como ter sucesso na preparação de um bom jantar; chegar a um resultado positivo nas contas financeiras; achar o apartamento que se quer). A fecundidade sempre tem traços de gratuidade e está ligada à felicidade da pessoa, à sua alegria, ao seu desabrochar, à descoberta de suas qualidades, à sua fortaleza em superar tristezas e obstáculos. O amor conjugal e parental é fecundo em todas as idades da vida. Os filhos que já deixaram o ninho familial continuam sendo nossos filhos : continuamos sendo pais até o fim. Todos os casais são fecundos . Essa fecundidade assume um "rosto" ao longo do tempo, por meio de uma dinâmica do dom, que abre o homem e a mulher a todos os valores da pessoa. O casal e a família encontram sua fecundidade no dom de si aos outros. "Aumenta o espaço de tua tenda", diz para nós o profeta Isaías. O casal não é uma finalidade absoluta. É na medida em que ele "se perde" que ele "se encontra". O amor tem valor em si mesmo, mas é sempre um "sair de si" para ir em direção ao outro. A chave da fecundidade reside no "desapego de interesse", na "recusa de fazer cálculos" de "ganhaganha" e de "balanço sistemático". Está no desejo e na vontade de não "deitar a mão" naquilo que se quer CM414
e no que se constrói, assim como o administrador humilde e fiel do Evangelho. Para "assegurar" uma real fecundidade ao amor conjugal, devemos deixar espaço para a aventura. Só é possível dizer ao outro: "Você não me decepciona" ou, depois de alguns anos: "Você nunca me decepcionou", se ele não foi reduzido a um projeto ou a uma visão ideal. O mistério do outro jamais pode ser reduzido a uma imagem, um desejo, um julgamento. A complementaridade tampouco é suficiente: a fecundidade é algo além da complementaridade de caracteres, de qualidades, de desejos. A sede da felicidade a dois deve ser carregada de desejo de infinito e de acolhida da graça. A fecundidade está nas mãos de Deus. A fecundidade é mais ampla do que a procriação e a educação dos filhos, mas está claro que inclui essas. O que pode haver de mais novo, de mais diferente, de mais gratificante, de mais desconcertante do que uma criança que transforma o casal em fanu1ia? Em cada nascimento, um novo universo desperta e são notáveis as mudanças. Num casal que se ama, há algo de natural na chegada de uma criança. Os corpos que se unem estão sempre marcados pelo simbolismo do aparecimento da criança. O homem é sempre fecundante, a mulher nem sempre, mas o abraço conjugal possui em si essa espécie de duplo significado de união e de procriação. É sabido que um casal que consciente e definitivamente recusa o acolhimento de um filho não pode 45
contrair um casamento válido. Um casal estéril, aberto, por exemplo, à adoção, pode casar-se. O que significa que o dom conjugal é sempre marcado por esse matiz parental. O horizonte de toda fecundidade é "interpessoal". É sabido o quanto a esterilidade pode representar uma provação e um sofrimento fortes: abala o casal nos seus alicerces. Todo desejo de filho é complexo e cabe ao amor purificar esses desejos. A criança tem seus direitos, mas não existe um "direito ao filho". O homem e a mulher não gozam de nenhum "crédito de criança" em relação à sociedade ou a Deus. A ausência de um filho não é o fracasso final da vida do casal, assim como qualquer direito absoluto a ter um filho é uma ilusão. O filho não é um objeto de desejo igual a qualquer outro, mas um sujeito com participação inteira, um dom do amor, um dom de Deus.
P&JL - Os progressos científicos atuais no campo da procriação só em parte resolvem a questão da fecundidade, ou melhor, da "não-fecundidade" procriativa. No máximo, propõem paliativos. Tornamo-nos cada vez mais conscientes de que esse mesmo progresso cientifico abre a porta a sérias conseqüências, que preocupam, sob o aspecto ético, não apenas os cristãos que somos, mas também um número cada vez maior de não-cristãos. Diante do vácuo jurídico nessa questão, podemos pensar nas "mães de aluguel", nos "bebés de proveta", nas rei46
vindicações dos homossexuais; os partidos políticos mobilizam-se para "legiferar" sobre a matéria. O "direito ao filho" aparece com freqüência para preencher o vácuo e curar o sofrimento causado pela ausência. Priscilla e eu estivemos próximos desse sofrimento, por causa de uma esterilidade secundária, devido a uma seqüência de abortos prematuros. Nossa ferida, nosso sofrimento só foram aliviados quando compreendemos que o Senhor nos chamava a sermos fecundos de uma outra forma, em outros campos. "Mas" -poderiam objetar os casais sem filhos que nos escutam "vocês tiveram a alegria de acarinhar uma criança, vocês tiveram filhos, enquanto nós... " E eles têm muita razão, nossos sofrimentos não se comparam. Entretanto, essas circunstâncias nos permitiram compreender que a procriação física não nos permite deixar de lado a fecundidade espiritual. Esta não é uma alternativa para aquela. Cremos que nossa missão procriadora não pode ser restrita ao povoamento da terra. Tomamos consciência de que o Pai criador, desde o Génesis, nos chama para também espiritualmente gerar filhos para Deus na Fé, na Esperança e no Amor. Voltamo-nos resolutamente para os outros. "Saímos de nós mesmos", em direção a um plus, em direção do imprevisto de Deus. E essa abertura ao imprevisto tornou-nos disponíveis ao que Deus esperava e ainda espera de nós. CM 414
Voltemos por um instante aos filhos acolhidos como sinal da fecundidade do amor. Os esposos são chamados a colaborar com Deus Criador e Pai. A maneira como eles se unem é fonte de uma força específica para eles mesmos. Ao se darem no ato conjugal, eles se encontram e se firmam mutuamente na sua identidade própria, masculina e feminina, e no seu ser pais. Na proximidade da ação divina, eles sentem os traços específicos desta ação: poder, criatividade, gratuidade. Deus se manifesta neles como Mestre e Senhor de tudo o que é criado. Nada escapa à sua ação criadora: o mundo inteiro está nas suas mãos de "oleiro". "A vida humana é sagra-
da porque desde a origem comporta a ação criadora de Deus" ( Donum Vitae, Introd. 5). Assim também a relação conjugal e o fruto humano da concepção. "Senhor, tu
me sondas, e me conheces. Tu conheces o meu sentar e o meu levantar; de longe entendes o meu pensamento. Esquadrinhas o meu andar, e o meu deitar, e conheces todos os meus caminhos" (SI 139 [138],1-3). Os esposos tocam de muito perto nessa ação de Deus. A consciência que têm dessa presença é reconhecimento, descoberta sempre nova, ação de graças. Experimentar essa presença de Deus no mais íntimo de si mesmo e no mais íntimo da relação do casal é uma singular expressão da fecundidade humana. Ainda mais, se a criança surge, o dom redobra: esse ser novo é "um dom que jorra do dom". O filho é uma pessoa-dom CM414
que surge do dom de seus pais e do dom que Deus lhe fez da existência. "Ninguém vem ao mundo se
não foi querido diretamente por Deus". Essa afirmação do Concílio dobra em intensidade quando os pais têm uma verdadeira consciência de sua responsabilidade e que sua vontade de acolher o filho se "conjuga" livremente com a de Deus. Há circunstâncias em que essa "coincidência" não é perfeita e onde chega a ser um verdadeiro desafio para o amor humano. Todavia, cada criança recém concebida revela um rosto único da bondade e da ação de Deus. Em cada concepção, não é "um nada" que se oferece ao mundo e a esse casal. O filho embrionário, desde sua concepção, é confiado à nossa humanidade. Se sua existência, por vezes ferida, penetra na nossa, é para dizer: "Ama-me como sou". A concepção de um filho aponta para uma alteridade nova: indica que o amor não é puramente dual, mas sempre plural. Essa fecundidade lembra a maneira como Deus ama cada ser humano por seu primeiro nome: do menor ao maior, do deficiente ao mais saudável. A chegada do filho assinala não a eficiência de uma técnica ou de um ato humano, mas a gratuidade do amor de Deus que se pode tocar no corpo humano e que cuida da liberdade pessoal no corpo de cada um. O filho sendo um dom, ele nos cumula pela superabundância que representa. Nem sua presença nem sua ausência podem ser instrumentalizados para a felicidade dos adultos. O amor conjugal fecundo é 47
chamado no mais das vezes a converter seus desejos. O filho é, por vezes, um dos campos de batalha do amor. O sonho do filho perfeito deve ser abandonado para reconhecer o filho real. Suas qualidades e seus talentos serão situados na alteridade daquilo que ele representa. Toda a tarefa educativa, magnífico fruto do amor conjugal, situase neste contexto. Podemos compará-la ao trabalho do semeador, que joga com abundância sua semente na terra que lhe é confiada. Educar é confiar a nossa palavra a outrem, para que este a acolha, seja por ela fortalecido, viva dela, e encontre desta forma também a felicidade. A colheita não é automática. A fecundidade de nossas palavras, de nosso exemplo, de nossa retidão, de nossos valores leva tempo para tornarse visível, para não somente criar raízes, mas para crescer no coração de nossos filhos. Convém que nossos atos correspondam a nossas palavras. Sempre existe um hiato entre o dizer e o fazer, mas estar atento à veracidade de nossa vida é essencial para que uma boa nova passe de geração em geração. Ninguém é perfeito, mas dar testemunho da verdade do amor é possível, mesmo quando- e sobretudo quando - ele nos deixa confusos. Sempre se pode dar testemunho da maneira como se é amado por Deus no perdão, na vida recebida, nos dons recebidos. Os filhos não idealizam por muito tempo seus pais, mas são sempre sensíveis à retidão de seu testemunho. A época da educação nos leva a "viajar" entre o manda48
mento positivo do Senhor: "Honrarás pai e mãe", e a recomendação -tão útil- de São Paulo: "Pais, não exaspereis vossos filhos" (Ef. 6,4).
P&JL- De fato , quantas vezes não constatamos que o que havíamos semeado, consciente ou inconscientemente, na educação que demos a nossas filhas , reaparecia anos mais tarde, depois de estarem casadas e por sua vez mães. Houve momentos em que achamos que a semente se tinha perdido, desperdiçado, não fecunda, e eis que de repente dava fruto. Essa constatação nos anima a esperar que ressurjam os valores cristãos que quisemos transmitir e que estimamos serem tão fundamentais na nossa vida. Se nossos filhos não crêem ou não crêem mais, não praticam ou não praticam mais, de nada adianta ficar puxando pela semente ou pelo pequeno rebento que germina. Corremos o risco de arrancálo. Deixemos ao Senhor o cuidado de fazê-lo crescer, segundo seu modo e ritmo. "Dar tempo ao tempo ", dizia minha mãe. O tempo de Deus não é o tempo dos homens! O Cardeal Danneels dizia-nos um dia: "Pensem no riacho que desaparece numa gruta. Nós o perdemos de vista, não sabemos para onde vai. Mas uma coisa sabemos: em algum lugar ele sai da gruta para continuar seu caminho para o mar. Onde? Quando? Não sabemos ". Desde então, essa palavra muitas vezes sustenta nossa esperança. CM 414
Pe. M.- Ser fecundo é ser portador da paciência do tempo e confiar no tempo, para que ele revele, com a graça de Deus, toda a amplitude de nossa semeadura. A fecundidade de um casal não pode ser avaliada pelos mesmos critérios que se aplicam a uma mini-empresa. A farm1ia toma-se mais profunda mesmo quando as forças definham e a interioridade cresce através da memória de uma longa vida, por vezes no sofrimento e na aproximação da morte. Quando definha a vitalidade, não se "fecha a empresa", bem ao contrário! Ela libera outras energias, no crepúsculo do amor e da vida a dois. Em qualquer idade, os esposos se socorrem mutuamente, se dão suporte, se oferecem um ao outro, dão testemunho de uma chama que aquece. O sofrimento é um espaço de fecundidade onde a presença da graça se torna mais íntima e mais forte . A deficiência, a enfermidade, a velhice podem abrir a porta para uma esperança infinita. A partida de um dos dois deixa o outro desamparado e magoado, mas é o momento para dar o testemunho de uma fecundidade que une o céu e a terra.
5· Um dom do Senhor "Se soubesses o dom de Deus", diz Jesus à Samaritana junto ao poço de Jacó. Toda a história do povo hebreu dá testemunho desse amor "terno e ciumento" de Deus. As numerosas alianças concluídas são sempre queridas e propostas por esse Deus fiel no amor. São simbolizadas por uma relação nupcial enCM414
tre Deus e seu povo, especialmente no anúncio e na vida do profeta Oséias. A história sagrada contada na Bíblia mostra também as dificuldades sentidas para ser fiel ao dom oferecido. A criação do homem e seu pecado pedem uma obra de salvação. Jesus salvador, salva o amor. Na verdade, ele devolve a cada homem a capacidade de amar. Essa Boa Nova é para todos. Esses "tempos novos" são os nossos: tudo mudou a partir de Cristo. O Cristo, o Filho de Deus, é o dom do Pai para a humanidade. Por meio de sua Encarnação, ele se uniu a todo homem: é este um dos acontecimentos mais decisivos de nossa história humana. Ele veio para os seus, diz São João. Doravante nossas vidas não são mais as mesmas, porque Deus está presente nelas de maneira particular. Em Jesus, Deus Trindade uniu a si toda a humanidade: ele está próximo de todo homem, do passado, do presente e do futuro. Ao amar a Igreja como ele o faz pelos séculos dos séculos e em cada instante, ele inscreve na história humana essa novidade do amor salvo. Os sacramentos são fachos de luz que por vezes dão testemunho, em nossas escuridões, da realidade do dom. Vivemos na presença do Filho de Deus: nossos gestos e nossas palavras são dele, vêm dele, são para ele. A economia sacramental (Economia: estrutura coerente e orgânica de vida cristã transformada por Cristo) exprime uma presença nova de Deus. Nós a vivenciamos de maneira tangível e particular no sacramento de Matrimónio. 49
P&JL- Sentimos bem isso na nossa vida de casal. Se não há dom, não pode haver amor. O amor é fiel, é um dom definitivo. O amor não retoma o que já deu. Uma expressão popular diz: "o que é dado é dado, retomar é roubar". Mas percebemos que este dom no casal é mais do que o dom da expressão popular. O dom dos esposos cristãos, nosso dom recíproco, de Priscilla para Jean-Louis, de Jean-Louis para Priscilla é mais que nossa união carnal, muito mais. É um presente de Deus. É uma graça que quisemos não só no dia de nosso compromisso mútuo, há 34 anos, mas que continuamos querendo hoje e todos os dias de nossa vida.
Pe. M -Este plus, que vem de Deus, pode achar expressões diversas. Mas o que é próprio do sacramento é que é o Cristo que nos concede o dom de nos darmos um ao outro em verdade. Como todas as coisas na terra, o amor também é salvo por Cristo. Por seu Espírito, Cristo libera em cada um as forças para amar. Ele abre caminhos no coração. O amor, para além da sedução mútua, é "vontade de se dar ao outro tal como ele é e de querer seu bem". Muitos medos habitam os nossos corações. Muitas feridas estão inscritas nos nossos psiquismos e nos nossos corpos . Cristo não apaga tudo, mesmo quando cura. Mas ele restaura e fortifica uma capacidade de amar naquele e naquela que de50
seja engajar-se no matrimônio. De forma mais profunda, quando uma noiva e um noivo se encontram, não é o fruto de um acaso, mas da providência, ou seja, de Deus que cuida de nossas histórias, que se insere nos nossos encontros e que suscita amistosamente as nossas liberdades. Não se toma marido ou mulher pela força ou segundo o costume social: pela graça, toma-se consciência de que o outro é um presente de Deus. É-nos oferecido como companheiro de jornada para esta vida. É para nós um "rosto" muito especial de Cristo. Toda a nossa força de amar é suscitada, fortalecida, animada por Cristo e seu Espírito. A especificidade do casamento cristão se manifesta na conscientização de que o outro não me pertence, e nunca me pertencerá de maneira absoluta. O cônjuge é um sinal do Outro que é Deus. Deus me faz sinal por meio da pessoa que coloca no meu caminho, a quem posso dizer um "sim" fiel e sem reservas.
a) Ele nos dá de nos darmos Ter confiança em Deus é colocar a vida nas suas mãos: decisões, encontros, acontecimentos diversos. O Espírito Santo permite que o cristão interprete os fatos da vida e indica-lhe, de tempos em tempos, a ação visível de Deus. Deus "está presente em toda parte e em todo lugar", como enfatiza o salmo, nada lhe escapa, ainda que tenha um infinito respeito por nossa liberdade: Tu me envolves por trás e pela frente, e sobre mim colocas a tua mão. CM 414
É um saber maravilhoso, e me ultrapassa, é alto demais: não posso atingi-lo! Para onde ir, longe do teu sopro? Para onde fugir, longe da tua presença? Se subo aos céus, tu lá estás; se me deito no Xeol, aí te encontro. Se tomo as asas da alvorada para habitar nos limites do mar, mesmo lá é tua mão que me conduz, é tua mão direita que me sustenta. (SI 139 [138], 5-10). Esse cuidado de Deus é uma atenção amorosa para cada uma de suas criaturas. O impulso que nos impele em direção a outrem para descobrilo, servi-lo, amá-lo surge do mais profundo de nosso coração. Cristo dá testemunho à sua maneira desse impulso em direção a todos. Sem ser casado, ele mostra que o amor é ablativo, ou seja, aberto e apto para se dar a um "outro que não ele mesmo". Se o caminho do homem em direção a ele passa pelo encontro com outrem é porque Deus assim o quis e no-lo recordou em Cristo. É dando a vida que a encontramos. Quem por minha causa perder a vida, ganha-la-á, diz o Senhor. O êxodo de si mesmo em direção ao outro é baseado em Cristo. Para o Cristo, salvar o mundo é devolver a cada um a capacidade de dar-se até o fim em todas as decisões tomadas, em todos os relacionamentos vividos. O homem e a mulher não estão sós quando se dão um ao outro. Deus está no interior de seu ato.
b) Ele se dá no dom que fazemos de nós mesmos CM414
O Senhor está no coração dos acontecimentos, especialmente nos atas livres que praticam os homens e as mulheres de boa vontade. No consentimento matrimonial, ele dá um passo a mais: junto com os esposos, ele também diz "sim". Ele se compromete no cerne das liberdades humanas, "com" estas e em favor destas. Ele próprio concede amar o casal como ele é, cada cônjuge tal como se apresenta e toda a história da família assim como se realiza. Esse passo a mais é uma decisão divina, concreta, que pertence à história desse casal e que recebemos na fé da Igreja. Somos suas testemunhas de maneira litúrgica. Seremos suas testemunhas, por vezes de maneira mais discreta, nas diversas encruzilhadas da vida conjugal e familiar. Deus se encontra mais interiormente no casal do que se imagina por vezes. Se o casal muda para um novo apartamento, ele vai morar junto. Sempre respeitando a liberdade humana, ele é o verdadeiro "Emmanuel", Deus conosco. Sua presença é segurança, força, confirmação, exigência, verdade da relação mútua dos esposos.
c) Ele nos associa ao Dom permanente que faz de si mesmo à Igreja. Cristo é o dom em pessoa. Ele é somente dom: sua presença na terra e seus vínculos com os membros da Igreja exprimem-se nessa palavrinha. Reconhece-se nele o amor. A Igreja, ou seja, o Povo com o qual Deus firmou a "Nova e Eterna 51
Aliança", vi ve dele a cada instante. Esse dom é tão permanente que é o próprio Espírito de Jesus que o manifesta e com ele impregna a Igreja. Imitar o Cristo, segui-lo e amálo é entrar nessa lógica do dom. Tarefa que seria impossível, não fosse a graça que ele nos dá. A vida da Igreja tem poder e vitalidade por estar ligada permanentemente a seu Senhor. "Teu esposo, teu criador", diz Isaías. E é a esse ponto que o Cristo ama sua Igreja. Ele se dá a ela como um jovem esposo, como um esposo fiel e atento, como um esposo tenro e dócil, como um esposo audaz e forte, como um esposo paciente e serviçal. O vínculo entre o Cristo e sua Igreja é indestrutível: "Estarei convosco, disse ele, até o fim do mundo " . Esse mistério é grande, disse São Paulo: "digo-o em relação a Cristo e à Igreja" (Ef 5,32). Quem ama a Cristo ama a sua esposa, a Igreja, e vice-versa. Pelo sacramento do Matrimônio, Cristo coloca os novos esposos no centro de sua relação nupcial com sua Igreja. O casal está no centro das graças reciprocamente dadas, do amor partilhado entre o Cristo e sua Igreja. Mais ainda, como em toda história de família, os esposos são chamados a dar testemunho desse vínculo de amor. Em sua própria carne, são imagem dessa relação. Esse "mistério grande" torna-se visível e presente na história humana e em todos os recantos da terra, através de milhões de casais cristãos 52
que se amam "no Senhor". Por meio desse amor sacramental, eles transmitem um sinal aos outros. Cada um diz, na sua língua e na sua história, que Deus continua a amar seu povo de maneira concreta e durável. Situados pela graça no vínculo Cristo-Igreja, os esposos são um sinal privilegiado do amor de Deus para com todos os homens e em todos os tempos. P&JL - Assim tornamo-nos conscientes de nossas próprias fragilidades e de nossas infidelidades ao projeto de Deus para nós, para o nosso ser casal. Ao mesmo tempo, sofremos por ver o casamento perder o sentido em nossa sociedade contemporânea, isso até mesmo, com freqüência, entre os que são próximos de nós. Precisamos do amor salvador de Deus. Onde estás, Senhor? Por que nos abandonastes? Vem, Senhor, em nosso auxílio, em auxílio "do casal e do casamento"! Se é o teu desejo ver-nos dar testemunho do teu amor pela humanidade, dá-nos a tua graça, dá-nos a tua força, a força do teu Espírito, pois a semente está demorando para sair da terra e estamos desanimando! Faze-nos reconhecer os sinais pelos quais teu espírito nos chama a testemunhar! Ajuda-nos, Senhor, a responder à nossa missão de "casais cristãos na Igreja e no mundo hoje", assim como nosso Movimento o lembrava após o Encontro Internacional de Santiago de Compostela, no ano 2000. CM 414
Equipistas brasileiros
Estรกtua de Nossa Senhora de Lourdes diante do Santuรกrio
Lourdes 2006
Atendimento a confissões ao ar livre
Concentração de peregrinos diante da Gruta de Massabiele
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Lourdes 2006
Lourdes 2006
III
Lançamento do novo logotipo internacional das ENS
Casal leva símbolos do Brasil no ofertório da M issa de Envio IV
Lourdes 2006
6. Uma sinfonia sacramental Pe. M.- Um sacramento não é um gesto isolado, pontual, sem história anterior, sem conseqüências posteriores. Todos os sacramentos pertencem ao grande rio de graças que Cristo faz correr na sua Igreja para a humanidade. O casamento cresce, floresce e dá fruto no jardim sacramental que Deus nos oferece. Ele está ligado aos sacramentos da iniciação cristã. É um sacramento de missão. Em outras palavras, no concerto de alegrias e louvores que podemos ouvir pelo poder do Espírito e do qual participamos, o casamento é um momento privilegiado dessa sinfonia. Ele dá testemunho da presença do amor divino no amor conjugal e parental. Ouçamos a música desses sacramentos que tocam juntos, um com o outro, um pelo outro. Matrimônio e Batismo Pelo batismo mergulhamos no grande mistério pascal de Cristo: salvos por ele de toda morte, ressuscitamos com ele. Revestimo-nos do Cristo de forma íntima, no corpo e no espírito. Agora, "não sou mais eu que vivo, é ele que vive em mim" (Gl2, 10). Assim unidos a Cristo, já não nos pertencemos mais: dados a ele, somos transformados em nosso interior. Esse mistério já se reveste das características do amor nupcial. Cada batizado está unido a Cristo como "uma esposa está unida a seu marido" . Deste modo, para um batizado, é espontaneamente normal ver essa aliança CM 414
ganhar profundidade na relação conjugal. Pelo casamento, os batizados expressam em toda a sua pessoa esse vínculo nupcial entre Cristo e sua Igreja. São como que chamados pelo Senhor que os atrai um para o outro para caminharem em sua direção na vida. Assim, o casamento confirma a graça ao batizado e lhe dá uma missão na Igreja e no mundo: mostrar como Cristo ama a sua Igreja e toda a humanidade com um amor de Esposo - amor exclusivo, criativo, unitivo, sólido e fiel. Desde o batismo pertencemos primeiramente a Cristo. O matrimônio confirma essa realidade: amarse é não mais se pertencer, mas oferecer-se a outrem, aprender a dizer "sim" com todo o seu ser e dizer esse sim regularmente. Os esposos, no impulso da graça batismal, dão-se um ao outro para darem-se juntos a Deus. É o mesmo gesto de desapego de si mesmo para pertencer a Cristo.
Matrimônio e Perdão Quem ama é chamado a muito perdoar. A benevolência, a paciência e a mansidão são expressões desse perdão. Perdoar é o "dom que vai até o perdão": é um dom sempre renovado. O mais das vezes é preciso redescobrir esse dom do Senhor que é o sacramento do Matrimônio. O amor é possível, mas ele deve superar temores, feridas, pecados de um e de outro. O suporte dado por outros fiéis no seio da Igreja-Sacramento é fundamental, pois "um casal isolado está sempre a perigo": na Igreja e pela Igreja, a 53
consciência do presente recebido se renova e fortalece. É no terreno do diálogo, do cuidado em explicar-se, dos gestos de humildade e de construção da paz que o sacramento do perdão pode vicejar. Reciprocamente, esse sacramento vivenciado por um, pelo outro ou pelos dois fortalece uma vida em verdade. O amor salvador de Cristo nos renova no sacramento da Reconciliação: ao recebê-lo, entra-se livremente na humildade e na alegria. Significa ajustar-se ao amor de Deus assim como somos e confessar que, sem sua graça, pouco podemos. Esposos, pais, não são perfeitos. Mais ainda, acontece sermos infiéis ao amor prometido e de ferir Deus de diversas maneiras. O perdão sacramental rejuvenesce o coração. Ele nos dá a paz para fazer frente aos conflitos de nossa responsabilidade e de muitas outras situações difíceis. Fortalecidos pelo perdão de Deus, os esposos podem aprofundar as expressões de seu amor e suas numerosas responsabilidades. Sendo esposos, o que atinge a um também atinge ao outro. Assim, as feridas e os pecados de um podem pesar sobre o outro. Inversamente, o perdão recebido dilata o coração e coloca o casal numa comunhão mais ampla com Deus e com a Igreja. Enquanto conservam sua vida espiritual pessoal própria, assim como suas consciências, o perdão recebido pelos esposos faz bem a ambos. O que faz um dos dois crescer faz o casal crescer, repercute claramente ou misteriosamente sobre o outro e sobre toda a família. 54
O perdão purifica e fortalece o amor conjugal. O amor conjugal e farnilial abre a consciência de cada um à fraqueza do outro, para carregá-la, perdoá-la e também salvá-la. A consciência pessoal do pecado e do perdão refina o amor partilhado. Aquele ou aquela a quem Deus "perdoa suas dívidas" é chamado a fazer o mesmo e a perdoar até setenta e sete vezes sete vezes.
Matrimônio e Eucaristia Apesar de muitos casamentos, por motivos diversos (No caso, por exemplo, de ausência de sacerdote, de celebração por um diácono, de abertura mínima para a fé), serem celebrados fora da Eucaristia, a tradição pastoral e catequética (CEC 1621), a teologia espiritual e sacramental insistem sobre o vínculo entre esses dois sacramentos. No momento do casamento e, mais tarde, na vida dos esposos, o vínculo entre Matrimônio e Eucaristia é fundamental. O Padre Caffarel insistia, com regularidade, sobre esse tesouro de graças para os esposos. A fonte e o ápice do amor encontram-se na Eucaristia: Jesus torna-se aí presente para se dar a nós e a seu Pai. Toda eucaristia nos mostra pelo ato e nos lembra que a ação de Jesus consiste em dar-se por amor; mais ainda, ele é o "Dom de Deus". Celebrar a Eucaristia é entrar nesse contexto. Cristo se dá aos esposos no momento de seu consentimento: ele também diz "sim". Ele também se compromete. A Eucaristia mostra aos esposos até onde esse compromisso chega. Em cada CM 414
Eucaristia, os esposos reconhecem a graça que lhes é própria: de que maneira Cristo dá a sua vida até o fim por amor a outrem. Os esposos são nutridos por esse amor de Cristo em sua história concreta. De maneira litúrgica, oferecemos o pão e o vinho, para que sejam transformados no corpo e no sangue de Cristo. Esse pão e esse vinho são o símbolo da assembléia: sua vida, seus esforços, seus compromissos.
P&JL- "Fazei isso em memória de mim" passa a ter um significado especial para nós, como esposos. À imagem de Cristo que, ao oferecer seu corpo e seu sangue, renova a aliança eterna, ou seja, a aliança de ontem, hoje e amanhã, nós também renovamos a nossa aliança. Fazemos memória do "dom" conjugal recíproco de todo nosso ser, na alegria e na tristeza, para o melhor e para o pior. .. até que a morte nos separe. "Por Ele, Nele e com Ele" rendemos glória ao Pai que nos fe z "dom" um para o outro e que nos recebe unidos a Ele. Pe. M. - Assim, os esposos podem oferecer-se a si mesmos e ser "incorporados" no mistério de Cristo sempre vivo. Depois de cada eucaristia, uma parte de nós (e, portanto, de nossa vida) entrou em Deus, foi transformada e unida a seu corpo místico. Adivinha-se, assim, o que faz a especificidade do sacramento do Matrimônio: dizer um sim que tem a dimensão do sim de CM 414
Deus. Assim como Maria disse sim ao projeto de Deus, os esposos dizem sim um ao outro e a Deus, que está no interior de seu consentimento. Ele está "dentro do" próprio ato de liberdade. Deus chama os esposos a se darem, a se perdoarem: ele os toma pela mão. Ele assume o risco do amor com eles. Ele pode ser renegado e rejeitado. Ele caminha com os esposos. Ter consciência dessa presença divina é essencial para os esposos. É uma consciência que pode estar adormecida, obscurecida. Ela vai também se desenvolvendo ao longo do tempo, dos anos que passam. É freqüente que os esposos passem a reconhecer, depois do fato, o que de precioso existe nesse dom do Senhor. Muitas vezes, há novas primaveras espirituais nos retiros ou em acontecimentos familiais: o batizado de uma criança, a cura de uma ferida familial ou pessoal.
P&JL- Cada vez mais, os casais que assistem juntos à Eucaristia se dão as mãos no momento da recitação do Pai nosso até o abraço da paz, quando se beijam. Esses pequenos sinais exteriores estão cheios de significado. Eles nos ajudam a tomar consciência da união de dois amores, o amor do Cristo e o amor do cônjuge.
7. Dom e missão Pe. M. - A participação nesse vínculo Cristo-Igreja proporciona raízes, alicerça a relação homemmulher "sobre a rocha", é fonte de uma missão. Não é nem o cristão, 55
nem o casal, nem a farru1ia que se dão a si mesmos sua missão própria. Toda missão é um chamado recebido do Senhor. A missão é recebida d' Aquele que é sua fonte, discerne-se, compreende-se no concreto da vida do casal e com base na graça sacramental. Dizer que o casal recebe uma missão é afirmar desde logo que ele não existe apenas para si mesmo. O ser família, essa "comunhão profunda de vida e de amor" (Gaudium et Spes 48) é um amor transbordante que procede de além dos esposos: esse amor, de maneira mais ou menos espontânea, é chamado a se difundir, a ser fecundo, a dar testemunho da vida e do amor divino no lugar em que se encontra. Trata-se de deixar a abundância das "águas espirituais" derramar-se nos desertos de nossas vidas modernas . As missões podem assim ser múltiplas e diferentes, mas todas se fundamentam sobre a graça do Batismo e dosacramento do Matrimónio. Casarse é responder a um novo apelo. Assim como Jesus, no Evangelho, envia seus discípulos dois a dois para anunciar a boa nova, ele envia os esposos dois a dois nas estradas do amor. Na Igreja, os esposos são como que "consagrados". Recebem dons que lhes são próprios. Eles terão, pela graça do sacramento, um "ministério": um serviço a prestar. Uma missão que é comum à maioria dos esposos é a de dar testemunho de um amor fiel, sólido e forte. Essa fidelidade não é "costu56
me", "bom hábito", "útil", "preciosa" para todos: é cumplicidade e conivência com a fidelidade do próprio Deus para com seu povo. Ser fiel e procurar sê-lo é "agir como Deus" na história dos homens. A primeira atividade do casal e da farru1ia é a de dar testemunho de sua existência, pois esse ato, dia após dia, fortalece as gerações e dá testemunho de uma esperança que atravessa o tempo e o espaço. Como diz o Padre Sonet, os casais que se unem e que se mantêm e se fortalecem dão testemunho de uma fé: "tornar possível o impossível por acreditar que é possível". O serviço da vida na sua transmissão e na educação dos filhos é também essencial. O horizonte dessa paternidade/maternidade não tem limites, porque é feito de amor. Ele permite e também suscita um gosto pela vida, no sentido pleno da palavra. Não se trata apenas de ter filhos, de promover a vida ou de defendê-la, convém também, em cada instante, encontrar-lhe um sentido e um sabor de eternidade. Ligar a vida humana à vida de Deus é uma tarefa magnífica. Insere todas as famílias na família dos santos. Os pais são os primeiros educadores do mistério de Deus. Na família, todos os membros evangelizam-se mutuamente. Pensamos na oração que jorra como fogo dos corações dos cônjuges, que intercedem por cada um. O amor conjugal une a alma a seu Senhor. Pe. Alain Mattheeuws s.j Priscilla e Jean-Louis Simonis CM 414
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CAUSA DA BEATIACAÇAO DO PADRE HENRl CAFFAREL A Origem Henri Caffarel nasceu em 30 de julho de 1903, em Lyon. Foi batizado em 2 de agosto de 1903 e ordenado padre em 19 de abril de 1930, em Paris. Morreu em 18 de setembro de 1996 em Troussures, na diocese de Beauvais, onde está enterrado. ''Vem e segue-me!" Esta palavra do Senhor está inscrita em sua tumba porque, em março de 1923, se produziu um acontecimento que iria orientar toda sua vida: "Aos vinte
anos, Jesus Cristo, em um instante, tornou-se Alguém para mim. Oh! Nada de espetacular. Neste longínquo dia de março, eu soube que era amado e que amava, e que a partir daquele momento entre ele e eu seria para toda a vida. Tudo está lançado ". O jovem Henri Caffarel encontrou "Alguém". Assim tudo que ele vai criar e organizar se fará pouco a pouco, como o Senhor o mostrará. O Cardeal Jean-Marie Lustiger fala do Padre Henri Caffarel como "de um profeta do século XX". Ele tinha assim consciência de fazer "de novo pela Igreja". CM 4 14
Henri Caffarel é tocado pelo amor do Senhor. O ministério do Padre Henri Caffarel será ao serviço do amor, "ser amado, amar''. O amor do Senhor é para ele fonte de dinamismo e de vida. Ele entra imediatamente em harmonia com os casais desejosos de desabrochar seu amor à luz do Senhor... Qualquer que seja a obra a empreender, o Padre Caffarel tem um só objetivo: colocá-la diante do Senhor, a origem de toda vocação. Henri Caffarel conclui: "Tudo 57
está lançado." Eis aí uma conclusão bem a sua maneira... "Não há nada a discutir, nós obedecemos, nós trabalhamos, não ficamos presunçosos com os serviços realizados, e, quando termina, nós partimos ... " É o rigor, exigência, precisão nos detalhes, vontade de ir até o objetivo, olhar concreto sobre os acontecimentos e os outros, capacidade de se despojar de tudo que não está no sentido daquilo que ele "vê" ...
A vida em três per íodos I. As criações (1939-1949) Henri Caffarel responde ao apelo dos casais desejosos de viverem o sacramento do Matrirnônio. "A exigência de santidade vos concerne. Para respondê-la, vocês têm um sacramento para vós, aquele do matrimônio." O número de Equipes de Casais aumenta. Uma orientação espiritual é dada, e torna-se cada vez mais clara à medida em que avança a descoberta da graça do matrirnônio. As publicações, "Carta aos jovens casais" (1942), e "A Aliança de ouro" (1945), marcaram profundamente numerosos casais e suas repercussões ultrapassaram de muito as Equipes. O Padre Caffarel desejava ser compreendido por todos para que a graça do amor de Deus pudesse estar ativa em todos. Ele queria que todos compreendessem a grandeza do matrirnônio. A questão é sempre atual. Um momento decisivo na ação do Padre Caffarel foi a redação e a colocação em prática, em 1947, da 58
"Carta das Equipes de Nossa Senhora". Os meios dados pela Carta são exigentes. "Os pontos concretos de esforço", notadamente "o dever de sentar-se", são características da vida cotidiana dos casais. "Tendo apreendido o espírito das Equipes, não terão dificuldade em consentir com sua disciplina", diz o Padre Caffarel. Viver o Evangelho na vida do casal, tal é "o caminho da Santidade". Neste mesmo período, duas novas criações vêm à luz: o Movimento de Viúvas "Esperança e Vida" e a "Fraternidade Nossa Senhora da Ressurreição" , instituto secular de viúvas. Como sempre, não existe "a idéia" de suas fundações: vinham vê-lo, lhe expunham seu desejo de uma vida santa; então ele discernia, encorajava-os, acompanhava-os.
II. Os tempos de amadurecimento (1950-1973) As Equipes de Nossa Senhora se desenvolvem. Uma organização é colocada em prática. Os grandes encontros acontecem: Lourdes em 1954, Roma 1959, Lourdes em 1965 ... É a ocasião de aprofundamento da graça do matrirnônio e de sua grandeza. O Padre Caffarel insiste também sobre o enriquecimento mútuo dos sacramentos da Ordem e do Matrimônio: dois sacramentos "complementares" para responder à vocação do amor. As Equipes conhecem os grandes debates: são um movimento de iniciação ou de perfeição? O CM 414
equilíbrio entre estes dois aspectos é encontrado. As provações sobrevêm onde está em jogo a unidade do Movimento e a liberdade dos leigos, sua originalidade e sua personalidade. Neste domínio, o Padre Caffarel se mostra sempre em harmonia com a Igreja, às vezes de uma maneira exemplar e corajosa. Ele envia todos os equipistas para suas paróquias, suas dioceses, seu apostolado em suas profissões e no mundo. Aos 70 anos, ele deixa por sua livre e espontânea vontade seu serviço às Equipes, após assegurar-se de sua sucessão. Ill. O aprofundamento (1973-1996) A fecundidade do Padre Caffarel está inscrita nos corações, na relação única de cada um com Deus . Inumeráveis são aqueles que encontraram o Senhor na Casa de Orações de Troussures . Seu imenso desejo era de partilhar a revelação que ele havia tido na idade de vinte anos. Seus últimos anos em Troussures mostram a fonte de onde nele jorravam todas as coisas.
As obras plenas àe viàa • As Equipes de Nossa Senhora: nascidas em 1939, elas contam atualmente 60.000 casais distribuídos em 70 países.
• As Fraternidades Nossa Senhora da Ressurreição nascidas em 1943, apoio de 200 membros.
• Esperança e Vida: movimento espiritual de viúvas. CM414
• Os Intercessores que oram, jejuam e oferecem suas vidas cotidianas.
O Padre Henri Caffarel está também na origem, com a ajuda do Padre Pierre Joly e do Padre d'Heilly, dos Centros de Prepa-
ração para o Casamento. A Casa de Orações de Troussures. Este Centro teve urna irradiação imensa para aqueles que desejavam aprender a rezar. Esta obra se estende através das proposições feitas pelas Equipes de Nossa Senhora para a Casa do casal, Massabielle (em Saint-Prix, Val d'Oise), e sobretudo pela importância dada à oração interior nas Equipes e escolas de oração. É de se notar a atualidade dos escritos publicados pelo Padre Caffarel, nas publicações: "Ofer-
tório", "Cadernos sobre a Oração"..., e nos seus numerosos livros: Presença de Deus, Nas Encruzilhadas do Amor etc. Monsenhor André Vingt-Trois, arcebispo de Paris, recebeu com benevolência, em 25 de abril de 2006, o desejo das Equipes de Nossa Senhora de promover a causa da canonização do Padre Henri Caffarel. "Os Amigos do Padre Caffarel" desejam esta canonização porque:
• A santidade dele é aquela de um "profeta do século XX". • Sua santidade evidencia-se em sua vida, toda ela animada pelo Senhor. • Sua santidade se manifesta na fidelidade de seu amor à Igreja. 59
O processo de beatificação
qual orienta a redação da Positio super virtutibus. Este documen-
A beatificação e sua etapa final, a canonização, são decididas ao termo de um procedimento introduzido pelo Bispo, quando existe a convicção da reputação de santidade, da irradiação da pessoa. O primeiro ato é a constituição de um autor da causa - "os Amigos do Padre Caffarel". O autor nomeia um postulador. O Bispo constitui uma comissão encarregada de conduzir em seu nome a pesquisa diocesana e designa os teólogos e historiadores para verificarem a exatidão da biografia, a qualidade teológica dos escritos e por colocar a causa em seu contexto histórico. Quando o Bispo julga bom, o dossiê da pesquisa diocesana é transmitido para Roma, para a Congn~ga,ção pela causa dos Santos, a
to permite dar um parecer e apresentar a causa para a decisão do Santo Padre. O último estágio da causa é o reconhecimento de um milagre que seria uma cura inexplicável cientificamente, obtida pela intercessão do servidor de Deus. Para bem conduzir uma causa, é conveniente que a associação tenha os meios de subvencionar as despesas de constituição do dossiê; é por isto que é feito um apelo à generosidade de cada um: Tornem-se, pela vossa doação, membros da Associação dos Amigos do Padre Caffarel! Associação dos Amigos do Padre Caffarel 49 rue de la Glaciere
Testemunhas pró-beatificação do Pe. Caffarel entronizam sua fotografia 60
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VOCAÇÃO CONJUGAL E COMPROMlSSO Jornada Eurásia Vocação e compromisso Estamos ainda hoje sob o impacto de tudo o que vivenciamos no X Encontro Internacional das ENS, realizado recentemente em Lourdes/ França. Foram momentos fortes de oração, formação, troca de experiências e de vivência equipista, que ultrapassaram nossas expectativas quanto ao que encontraríamos por lá. Já na abertura do Encontro, pudemos sentir a força de nossa Igreja e de nosso Movimento. Aqui vamos nos deter nos momentos de oração que vivemos no terceiro dia do encontro, cujo tema proposto para trabalharmos foi "Vocação Conju-
gal e Compromisso". Na oração da manhã, realizada na Basílica São Pio X, fomos convidados a meditar a experiência de Abrão (Gn 17, 1-2), quando o Senhor apresenta-se a ele e propõelhe uma aliança. Com este espírito, em silêncio, fomos convidados arever, por 10 minutos, os acontecimentos importantes de nossas vidas e reavaliar como eles influenciaram nossa relação com Deus. As orações foram conduzidas por casais da Zona Eurásia, em quatro idiomas, no intuito de evidenciar a internacionalidade do Movimento e a universalidade da Igreja. A exemplo de Abrão, que acreditou, rezamos junCM 414
tos a oração do Pai Nosso, cada um em sua própria língua, buscando a unidade cristã na diversidade de línguas e culturas. À tarde, após os trabalhos de formação e a reunião da equipe mista, retomamos à basílica para a Celebração Eucarística. As orações, inserções, leituras e a homilia- feita pelo Presidente da Celebração, Dom Michael L. Fitzgerald- versaram sobre o tema do dia e nos convidavam a mais uma vez refletir sobre nossa vocação para o casamento e tudo o que Deus espera de nós na vivência do matrimônio. Dom Fitzgerald destacou o fato de que esta união, desejada por Deus desde a criação do homem e da mulher, este buscar ser uma só carne, é um processo que nunca está pronto, está sempre em desenvolvimento. Enfatizou a importância, nesta busca, do Dever de Sentar-se na vida do casal. Ficou claro para nós que todo o esforço neste sentido precisa ser feito à luz do Evangelho, buscando a graça de Deus, que nos conduzirá no caminho da santidade. Por fim, Dom Michael Fitzgerald nos lembrou que a unidade do casal, com sua diversidade individual, só pode ser conseguida à medida que ele comprende que é parte do corpo místico de Cristo e que, animado pelo Espírito Santo, pode chegar à 61
unidade conjugal desejada por Deus. Foi realmente um dia magnífico, pleno de trocas, de aprendizado e também de tomada de posição quanto à nossa vida de casal cristão no mundo de hoje, um mundo que nos oferece muitas coisas novas, com as quais precisamos aprender a lidar à luz do Evangelho. Ester e Renato CR Região Rio N
... Vocação à unidade na diversidade É o quarto dia do Encontro. Desta vez o dia inicia na Basílica São Pio X e aí vamos para a Oração da Manhã. O tema do dia é Vocação conjugal e compromisso. Na oração, a palavra do próprio Deus a Abrão "multiplicarei sem limites tua descendência", a nos exortar que nosso apostolado nas ENS deve se estender a todo e qualquer casal. E assim preparados, ouvimos a conferência do dia, Casais e famílias, a quantas andamos?, proferida pela Dra. Françoise Sand. A conferencista fez uma apresentação da atual realidade européia, particularmente da França, sobre as relações que envolvem o homem e a mulher neste inicio de século XXI, valorizando a importância do contexto para determinar essas relações. Sua apresentação centrou-se no determinismo e o relativismo nas relações modernas, mal ao qual os papas João Paulo II e Bento XVI creditam a responsabilidade pelo individualismo que domina hoje a sociedade euro62
péia, e que valoriza o homem que dispensa Deus em sua vida e se volta para as conquistas materiais. Para as ENS fica claro, porém, o papel de cada equipista de ser exemplo de um Cristo Vivo em seu meio, fazendo a presença de Deus se tornar uma realidade em seu dia-a-dia. E esta verdade é reforçada na Celebração Eucarística do dia por Monsenhor Michael L. Fitzgerald, em sua homilia Unidade na Diversidade. Ele se vale da segunda leitura, extraída da Carta de São Paulo aos Efésios, para nos recordar como os verdadeiros discípulos de Cristo devem viver para pertencerem ao único Corpo de Cristo, animados pelo mesmo Espírito, partilhando o mesmo fundamento do Batismo na Santíssima Trindade de Pessoas, onde há a perfeita e verdadeira unidade na diversidade. Com este aprofundamento, partimos para o Dever de Sentar-se. Momento necessário para um balanço de vida em casal, na farru1ia, na equipe e na Igreja. Fortalecidos pelo clima de oração conjugal, cada casal pôde se colocar diante de Deus e de seu cônjuge, reconhecendo as graças do matrimonio, a responsabilidade e o compromisso que daí advém. Terminamos o dia com uma simpática e provocativa peça teatral: um musical apresentado por um grupo teatral dos Focolares, que fazem um giro por diversos países, com o objetivo de promover a paz. Nada melhor para encerrarmos o dia e irmos descansar. Vírginia e Marcos Kisil CRR - São Paulo Capital I CM 414
CASAlS E FAMlUAS, A QUANTAS ANDAMOS? (Roteiro da conferência proferida pela Socióloga Dra. Françoise SAND) A partir de dados sociológicos e psicológicos, um panorama das mudanças ocorridas em duas gerações
(1965-2005). 1. As evoluções no ambiente social Os novos conhecimentos científicos, notadamente em medicina • O aumento da longevidade humana e suas conseqüências • O domínio da fecundidade - Os contraceptivos; - A interrupção voluntária da gravidez - Os diversos meios de procriação com assistência médica - Uma inversão do poder em proveito da mulher. A revolução cultural (68-80): • Reivindicação da liberdade pessoal - Da autonomia. realização própria ao individualismo • Contestação da Autoridade e do Institucional Remanejamentos e inovações jurídicas a respeito do casal e da famt1ia. • As tendências gerais • Os principais dispositivos
2. Novas aspirações e modalidades nas relações interpessoais. A) O casal: noção recente e idealizada O casamento não é mais o ato fundador do casal Outras modalidades: • O concubinato: forma inaugural da vida para 9 em 10 casais. Características. CM414
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Os PACS (Pacto Civil de Solidariedade) 1999. Características • O casamento civil: instituição muito antiga e elaborada juridicamente. Características A instabilidade atinge todas as formas de vida do casal • As rupturas - de coabitação (4 a 7 vem> mais freqüentes do que no casamento) de PACS (18% de dissolução) - de casamento (probabilidade de divórcio X4 em 40 anos). • As intermitências: o "Tum Over" conjugal e suas conseqüências - As fanu1ias monoparentais: características - As famílias reconstituídas: características - Haverá realmente uma desvalorização do casamento? B) A farru1ia: uma realidade bem viva e atraente Algumas particularidades contemporâneas. • O delicado ajuste do vínculo parental ao vínculo conjugal no momento da chegada do filho (Problemática dos Trinta Anos). • O trabalho profissional e seus impactos sobre a farru1ia. - Precariedade do emprego, desemprego - O trabalho assalariado das mães. • A rivalidade entre as formas de transmissão educacionais verticais e horizontais • Umnovoposicionamentodosidosos Na cidade, na farru1ia, no casal. 63
UNlDADE NA D1VERS1DADE Homilia "Todos os povos Vos louvem, ó Deus, todos os povos Vos louvem. " Numa assembléia como esta, não é difícil responder ao apelo do salmista. Estamos entusiasmados pela presença de tanta gente, estimulados pela riqueza de culturas diferentes, mas fortalecidos também pela profunda unidade que experimentamos ao celebrar juntos o mesmo Senhor. Não é assim tão fácil para as equipes, e ainda menos para os casais individualmente, mas para as duas realidades (equipes e casais), existe o mesmo mistério de unidade na diversidade. As leituras escolhidas para a Eucaristia de hoje vão ajudar-nos a refletir sobre isto. A passagem do Génesis é-nos muito familiar. Quantas vezes ouvimos esta leitura sobre a criação do casal humano, uma vez que não é bom que o homem esteja só? Podemos ver que, quando o homem vê os animais, procurando em vão uma companhia, impõe-lhes nomes. Isto implica, na mentalidade semítica, um certo poder sobre eles. Ao encontrar a verdadeira companheira, o homem dá-lhe efetivamente um nome, mas não lho impõe. Pelo contrário, ele surge espontaneamente como resultado do reconhecimento: "chamar-se-á mulher (ishshah) visto ter sido tirada do homem (ish)". O próprio nome indica ao mesmo tempo semelhança e diferença. 64
Não será sempre assim quando alguém procura o companheiro para toda a vida? Haverá fatores unificantes: semelhança de interesses, convergência de perspectivas, atração física partilhada. Mas as diferenças persistem. Quando o casal se torna uma só carne, e isso é certamente um processo em desenvolvimento, não têm também de procurar ser um só coração e um só espírito? Não é este o verdadeiro objetivo do Dever de Sentar-se, em que centraremos a nossa atenção, durante o dia de hoje? Neste contexto, como é que esta passagem do Evangelho de hoje deve ser entendida? Trata-se da conclusão do evangelho de Lucas e vem a seguir à descrição das aparições de Cristo Ressuscitado às mulheres, junto ao túmulo; aos discípulos , a caminho de Emaús; aos discípulos reunidos em Jerusalém. Antes dessa última passagem, encontramos este estranho versículo: "e por causa da sua alegria e porque estavam espantados". Apesar da sua alegria pela presença do Senhor no meio deles, não conseguem acreditar porque não compreendem o que aconteceu. Por isso Jesus, com toda a paciência, explica-lhes, como tinha feito com os discípulos no caminho para Emaús, como as Escrituras diziam que "Cristo havia de sofrer e ressuscitar dos mortos ao terceiro dia". A seguir dá-lhes uma missão: hão de CM 414
ser testemunhas, as suas testemunhas às nações, no poder do Espírito. Não poderemos ver nesta passagem os vários elementos do Dever de Sentar-se: um ato de fé na presença do Senhor, uma leitura dos acontecimentos à luz das Escrituras, a descoberta de uma missão? No Dever de Sentar-se, quer seja planeado quer aconteça por acaso, sugerido por alguma circunstância especial, é importante reconhecer a presença do Senhor, do Senhor Ressuscitado que traz paz e alegria e uma vida nova mesmo no meio das dificuldades. Isto toma possível uma partilha mais profunda sobre o que está acontecendo na vida do casal, e na vida de cada um dos cônjuges, descobrindo e respeitando tanto o que é comum como o que é vivido de maneira diferente. A referência às Escrituras ajudará a garantir que é o Evangelho e não o mundo que nos dá os critérios de discemirnento. Assim, a partilha pode resultar em ações concretas, tentando uma maneira diferente de fazer as coisas, renovando alguma resolução ou tomando um compromisso. É desta forma que a partilha no Dever de Sentar-se não se fecha sobre o casal, mas antes se abre às necessidades da farru1ia, da vizinhança, da comunidade eclesial e até do mundo inteiro. Uma perspectiva partilhada leva a uma missão partilhada. A segunda leitura, da Carta de São Paulo aos Efésios, indica a maneira como os verdadeiros discípulos de Cristo hão de viver. Isto se aplica também aos casais cristãos. Paulo fala de modéstia, ou humilCM 414
dade, e de docilidade, ou mansidão. Podemos entender isto como uma disposição para ouvir o ponto de vista do outro, mesmo que implique crítica, e uma capacidade para exprimir o seu próprio ponto de vista sem agressividade nem ressentimento. Paulo também realça a paciência e a tolerância, consciente de que as quedas podem ser freqüentes. Refere a ânsia de manter a unidade do Espírito. O verbo "manter" parece sugerir que essa unidade pode muitas vezes ser frágil, necessitando muitas vezes de ser consolidada. O esforço continuará se for sustentado por uma perspectiva comum: a convicção de pertencerem ao único Corpo de Cristo, animados pelo mesmo Espírito; partilhando o mesmo fundamento do Batismo em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, esta Santíssima Trindade de Pessoas que nos dá o exemplo da perfeita unidade na diversidade. Ao deixar os seus discípulos, Jesus abençoou-os, e eles voltaram para a cidade de Jerusalém cheios de alegria. A fiel partilha do Dever de Sentar-se não nos capacitará a voltar para a cidade da vida cotidiana com renovada coragem e alegria? Afinal, o poder de viver a vida cristã não vem de nós; é dado pelo Espírito Santo. Que o Espírito nos guie e nos fortaleça para podermos ser verdadeiras testemunhas de Cristo, e todos os povos possam alegrar-se e cantar de alegria. Amém. Mons. Michael L. Fitzgerald 65
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EQUlPE COMUNlDADE DElGREJA Jornada Américas
Peregrinos em lourdes No dia 20 de setembro, às 8:30 horas, foi celebrada a "Missa Internacional". A Basílica São Pio X estava completamente lotada de peregrinos vindos de todas as partes do mundo. Os estandartes que portavam na procissão indicavam suas origens ou grupos. Faziam-se acompanhar por centenas de deficientes físicos em suas cadeiras de rodas, conduzidos cada um por um voluntário, todos uniformizados. A unidade da Igreja foi sensível durante a celebração, embora cada um rezasse em sua língua. O coral cantava em latim os hinos e a multidão, em uníssono, cantava o refrão. Chamou atenção também o abraço da paz, quando parecia que todos se conheciam de há muito. Encerrada a missa, fomos convidados a seguir "As pegadas de Bemadete", um itinerário com locais preservados da época em que viveu Santa Bemadete, como o Moinho de Boly (onde Bemadete nasceu e viveu seus primeiros anos); a Masmorra (para onde a família de Bemadete mudou-se após ser expulsa do Moinho); o antigo Presbitério (onde ela se apresentou ao Pe. Peyremale, para lhe contar sobre as aparições); o Hospício (prédio que acolhia também a escola que Bemadete freqüentou como indigente); a Igreja Paroquial doSagrado Coração (onde está a pia 66
batismal de Bernadete); Bartres (vilarejo próximo a Lourdes onde ela foi acolhida por urna família e trabalhou como ajudante da Quinta). À tarde, às 14h30min, a conferência de Alberto e Constanza AI varado, "Equipe, Comunidade de Igreja", da qual destacamos os seguintes tópicos: • A Equipe de Nossa Senhora não é creche de adultos; • É um viveiro de pessoas que cumprem sua missão na Igreja; • Cada cristão é um apóstolo; • São casais construtores da história segundo o Plano de Deus; • Redescobrir que Cristo está no meio de nós; • Formar comunidades baseadas na Fé, em comunhão com os Bispos e o Papa. Às 16 horas foi feita a apresentação das Equipes Jovens de Nossa Senhora pelo sacerdote conselheiro da equipe dirigente internacional das EJNS e por jovens ali presentes, membros da equipe dirigente. E o que ali disseram, sacerdote e jovens, representa um desafio para os equipistas. Também citaram os vários países onde as EJNS estão presentes. Foi destacada a grande riqueza que as ENS representam para os jovens, e a importância dos equipistas na sua implantação e estruturação. Após, todos se dirigiram aos seus hotéis para a reunião de equipe mista, CM 414
para troca de vivências sobre o tema da conferência da tarde. A reunião propiciou a partilha das realidades das diversas equipes de onde provinham os casais e os sacerdotes. Às 20h30min, participamos da Procissão Luminosa em honra a Maria. Os participantes das equipes, somados aos milhares de peregrinos, faziam um maravilhoso cortejo, entoando hinos, elevando as velas nos refrões dos cantos. Foi possível sentir realizada a proposta da procissão: "Que as nossas orações se unam para subir a Deus, como a chama de nossas velas". Graça e Aristeu - CR Região RS I
... A Missa lnternacional Vivemos em estado de graça esses dias em que, passando pela Gruta de Massabielle, parecia-nos escutar o chamado da Virgem Maria para a nossa conversão. A Missa Internacional de quartafeira, por tradição celebrada em vários idiomas, não foi destinada só ao Movimento das Equipes de Nossa Senhora, mas a todos os peregrinos de Lourdes. Presidiu a celebração o Cardeal Alfonso López Trujillo, Presidente do Conselho Pontifício para a Farm1ia, e concelebraram bispos e sacerdotes oriundos de diversos paises. Numerosos doentes, em cadeiras de rodas, procedentes de vários países, ocupavam os lugares a eles reservados. Foi um momento especial e tocante perceber a expressão de fé nos semblantes daquelas pessoas: víamos em cada um o rosto de Cristo. CM414
O canto Lumen Christi, Lumen Christi deu inicio à procissão de entrada. A passagem dos estandartes das várias entidades, instituições e nações deram um realce festivo à celebração. Alegramo-nos ao vislumbrarmos o estandarte das Equipes de Nossa Senhora, como também nos deixou emocionados a procissão de numerosos sacerdotes que se dedicam ao nosso Movimento no mundo todo. O presidente da celebração saudou os peregrinos, em especial os equipistas, que somavam 8.1 03, dizendo que devemos estar com lâmpadas e velas acesas para viver a caridade no mundo de hoje, onde é imprescindível a busca da paz, da solidariedade, da justiça e do amor para um mundo mais humano e mais feliz. Somos um povo em marcha, devemos seguir o Cristo Ressuscitado, levando uns aos outros a luz sustentada pela fé. No momento da aclamação ao Evangelho, quatro casais subiram ao altar levando velas acesas. Nosso movimento foi representado pelo casal Marie Christine e Gérard de Roberty. O Evangelho foi repetido em vários idiomas e o presidente da celebração ressaltou, na homilia, o tema do Encontro para aquele dia: "Equipe, comunidade de Igreja". A oração do Pai Nosso foi rezada em várias línguas. E o abraço da paz aconteceu com todos interagindo com muita alegria e espúito de fraternidade. Éramos muitos, falando cada um em seu idioma, porém a chama que alimentava cada equipista ali presente era a linguagem do Evangelho, que todos compreendíamos muito bem... Fátima e Canêjo- CRR-Norte II 67
EQU1PES DE NOSSA SENHORA, COMUN1DADES VIVAS DE CASA1S Conferência lntrodução Há trinta e três anos, a Constanza e eu vivíamos em França por causa dos meus estudos de doutoramento na Universidade de Paris. Um dia de Setembro de 1973, a Constanza e eu estávamos visitando este Santuário de Nossa Senhora de Lourdes com a única intenção de satisfazer o desejo de Isabelita, a mãe da Constanza. Nesse tempo, a nossa fé tinha arrefecido consideravelmente, devido, em grande parte, à própria natureza dos meus estudos de sociologia, feitos no contexto de uma metodologia empírica, e também à influência do meio universitário descrente em que estávamos inseridos. Não estávamos, pois, interessados em ir visitar a gruta, mas, por mera solidariedade, decidi acompanhar a minha sogra, que estava numa longa fila para entrar na gruta. De repente, encontrei-me diante da imagem de Nossa Senhora ... . ? . . . Q ue pedir?. . . . "NosQ ue dtzer. sa Senhora, se tudo isto é verdade, dá-nos de novo a fé!". Uns meses depois, já de regresso ao nosso país, um domingo, ao passar pela igreja da nossa paróquia - também ela dedicada a Nossa Senhora de Lourdes - sentimos um irresistível impulso de entrar. Celebrava-se a Eucaristia, e o padre estava pregando sobre um texto do evangelho de Lucas, a parábola do Filho Pródigo. Esta diri68
gia-se, sem sombra de dúvida, a nós. . . Uns dias mais tarde, fomos chamados, pela segunda vez, a entrar nas Equipes de Nossa Senhora. Hoje, trinta e três anos mais tarde, graças ao caminho fielmente percorrido no Movimento, aqui estamos os dois, de novo diante da gruta de Nossa Senhora de Lourdes, dando testemunho da fé reencontrada no Filho de Maria. Que dizer? ... Que pedir. .. neste momento? "Nossa Senhora, tudo isto é verdade .. . Dános a graça de transmitir a nossa fé e de redescobrir o papel das ENS no mundo de hoje". Estes maravilhosos anos passados no Movimento constituíram, para nós, uma escola de vida e de formação progressiva na fé e também um caminho para nos aproximarmos paulatinamente de Deus em casal. A fé, mais do que um saber, tem sido para nós dois uma aventura apaixonante de entrega a Deus. Mais do que um ser inacessível, entendemoLo como Deus encarnado no Filho CM414
de Maria, da mesma condição humana que nós. Ele trouxe ao mundo uma mensagem única: o seu mandamento novo do amor, mensagem que compreendemos e aceitamos e à qual nos entregamos, a fim de a difundir onde quer que estejamos. Mas não realizamos sozinhos esse processo de conhecimento de Deus. Fizemo-lo no meio de uma comunidade viva de casais, nas Equipes de Nossa Senhora, graças à qual a nossa fé se tem fortalecido dia após dia. E é justamente disto que hoje queremos falar-lhes. Procuraremos, muito particularmente, precisar o sentido de comunidade, primeiro do ponto de vista da sociologia e, depois, segundo a ótica do Evangelho. A seguir, referiremos os diferentes tipos de comunidades de fé, a começar pelo casal, passando pela farru1ia, pela equipe e pelo Movimento, até chegarmos à Igreja como comunidade de comunidades. Por último, procuraremos responder à pergunta: como é que as Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, poderão dar uma resposta convincente e orientadora ao mundo de hoje? 1.
O sentido sociológico da comunidade
O conceito de comunidade, do ponto de vista sociológico, tem conotações muito particulares que a distinguem de outras manifestações sociais, tais como a categoria, o aglomerado e o grupo social. A categoria social é uma simples construção do pensamento que permite classificar fenômenos sociais CM414
análogos: os europeus, os americanos, os africanos, os asiáticos ... Neste caso não se diz que todos os europeus, todos os americanos, todos os africanos ou todos os asiáticos estejam fisicamente juntos; também não se afuma que, dentro de cada categoria, as pessoas tenham entre si relações permanentes e estáveis. O aglomerado social, pelo contrário, implica a presença física daqueles que dele fazem parte, embora as suas relações mútuas sejam fracas e passageiras. É o caso, por exemplo, dos torcedores de uma equipe de futebol, que se encontram num estádio para apoiar o seu time. Terminado o jogo, cada um regressa para a sua casa e o aglomerado deixa de existir. O grupo social, por outro lado, é uma reunião de pessoas com relações mais sólidas e estáveis, que estão à procura de um objetivo comum. A sua permanência depende da duração do objetivo. As equipes de futebol, as empresas, as associações, os clubes, os sindicatos etc. pertencem a este tipo de grupos sociais. Na maioria dos casos, as suas relações são regulamentadas em termos contratuais. Finalmente, a comunidade é uma associação espontânea e duradoura de pessoas unidas por laços mais fortes, muitas vezes de tipo afetivo; os seus membros partilham uma ideologia e valores comuns, que os fazem ter um forte sentido de unidade, de colaboração e de solidariedade mútua, que lhes permite a consecução de objetivos comuns. O sociólogo alemão Ferdinand 69
Tonnies, no seu livro Comunidade e Sociedade (Gemeinschaft und Gesellschaft), publicado em 1887, foi o primeiro a se referir a este tema. A suas idéias fundamentais podem ser resumidas da seguinte forma: Todas as relações sociais são criações da vontade humana; há dois tipos de relações sociais: um, a comunidade (Gemeinschaft), é constituído pela tendência natural e instintiva, que impele a atividade humana para a associação espontânea entre os indivíduos. O segundo, a sociedade (Gesellschaft), é formado pela vontade arbitrária ou formal, que, de maneira deliberada e finalista, determina a atividade humana em função do futuro. O primeiro, afirma Tonnies, cria relações estreitas e afetivas, que garantem a permanência do grupo, porque a simpatia entre os membros fá-los sentir a relação como um bem em si; a farru1ia e a vizinhança possuem estas características. O segundo, pelo contrário, é próprio das atividades dos homens de negócios, dos cientistas e das pessoas investidas de autoridade, em suma, da sociedade moderna, acrescentaríamos nós. Tonnies manifestou claramente a sua preferência pelos valores associados à comunidade. Nós estamos na mesma linha de pensamento que este sociólogo, no sentido de que, hoje em dia, é não só possível, mas também necessário, reconstruir o tecido social com base neste tipo de relações comunitárias. (Cf. TIMASHEFF Nicholas S., La Teoría Sociológica. Fondo de cultura Económica. Décimo octava reimpresión. México, 1997, pp. 129 e ss.) 70
As Equipes de Nossa Senhora, de um ponto de vista exclusivamente sociológico, situam-se nas organizações de tipo social comunitário (Gemeinschaft), que, em relação à tipologia de Tonnies, se caracterizam pelo fato de partilharem valores comuns - no caso presente, evangélicos - pelos fortes laços afetivos desenvolvidos entre os seus membros, opostos à concorrência, mas prontos para a colaboração chamada, entre nós, entreajuda e com um objetivo comum bem preciso: alcançar a espiritualidade conjugal dos seus membros com a ajuda de meios muito concretos. O número crescente de equipes no mundo (mais de dez mil, e em plena expansão) prova que este tipo de relações é possível no mundo de hoje, e que essas relações podem ser duráveis, eficazes e eficientes. 2.
O s entido cristão da comunidade
Quando contemplamos a vida de Jesus, e muito particularmente a sua vida apostólica, não deixa de nos surpreender o fato de que a primeira coisa que Ele fez foi formar um pequeno grupo de tipo comunitário. A este propósito, escrevia o Padre Caffarel: "A grande preocupação de Nosso Senhor Jesus Cristo, no início e ao longo da sua vida apostólica, foi a de agrupar, de reunir. [ ... ] A vontade de Cristo foi reunir aqueles jovens à sua volta. Lançou o apelo ao passar junto de um deles, [... ] e imediatamente seguiram o Senhor». (CAFFAREL Henri, "L'Ecclesia" Conferência do Padre CM 414
Henri Caffarel, proferida em São Paulo, em Julho de 1957, aos casais responsáveis das Equipes de Nossa Senhora, p. 2.) Não foi por acaso que Jesus reuniu à sua volta uma comunidade. É que o Evangelho vive-se primordialmente em comunidade de fé, porque a prática do amor-entrega se aprende quando vivemos em interação estreita com outras pessoas. Assim, podemos dizer que a primeira comunidade de fé é o casal, a seguir a farru1ia, e depois todas as comunidades unidas à Igreja universal, em que procuramos viver segundo o Evangelho. Como poderemos, então, defmir uma comunidade de fé? É a comunidade que integra pessoas batizadas que procuram a vontade de Deus, cujas relações pessoais são guiadas pelo amor que Cristo nos ensinou, que estão atentas à Palavra de Deus e que são fortalecidas pelo Espírito Santo e prontas a servir os outros. "O que distingue uma comunidade de um grupo de amigos, explica Jean VANIER, um especialista em comunidade, é que numa comunidade explicitamos a nossa pertença mútua e os nossos laços; anunciamos os nossos objetivos e o espírito que nos une. Reconhecemos juntos que somos responsáveis uns pelos outros, e que esse laço vem de Deus, é dom de Deus. Foi Ele que nos escolheu e nos reuniu, numa aliança de amor e solicitude mútua.. . Não há que procurar a comunidade ideal. Trata-se de amar aqueles que Deus CM414
pôs hoje ao nosso lado; eles são para nós sinal da presença de Deus". (VANIER Jean, La Communauté: Lieu du Pardon et de La Fête. FLEURUS - BELARMIN, Paris, 1989, pp. 26 e 52) Neste contexto, a característica fundamental da comunidade de fé é a vida no amor. No entanto, há que procurar a sua origem na própria natureza de Deus, como explicava Xavier Lacroix, há seis anos, no Encontro Internacional de Santiago de Compostela: "O Deus cristão não é um indivíduo, uma substância estática; Ele próprio é relação, comunhão: ao Deus Trindade corresponde o homem Comunhão". (LACROIX Xavier, O nó de três fios. Conferência proferida em Santiago de Compostela a 22 de Setembro de 2000, no ill) A comunidade de fé tem uma dinâmica própria: • Nasce, não por geração espontânea, mas como resposta ao apelo de Cristo: "Segue-Me! E ele levantou-se e seguiu-O" (Mt 9,9). Aprende-se, experimenta-se, vive-se e desenvolvese na prática sustentada. Não há regras precisas para o seu crescimento, mas há critérios: o bem comum acima do bem individual; a caridade cristã acima de tudo; a procura permanente da vontade de Deus. • Cresce, alimentando-se da Palavra, da oração e da Eucaristia. Vive o amor a exemplo de Cristo. Pratica a aceitação e o perdão. Contribui para o crescimento do outro. 71
• Reproduz-se, criando novas comunidades de fé. • Mas também morre, no sentido evangélico da renúncia a si mesmo: cada vez que perdoamos ao nosso irmão, em cumprimento do mandamento novo do amor, morremos um pouco para nós próprios, e é aí que experimentamos um profundo sentimento de verdadeira felicidade. É o próprio Cristo presente que reúne os crentes ; daí que o amor seja o verdadeiro símbolo dos cristãos reunidos na grande comunidade eclesial. Por conseguinte, a comunidade de fé não é uma simples comunidade humana, porque se funda em Jesus Cristo para viver e anunciar o Evangelho em todos os cantos da terra. A obsessão de Jesus, se nos é permitido usar esta expressão, é a UNIDADE: "Como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti; para que assim eles estejam em Nós e o mundo creia que Tu Me enviaste" (Jo 17,21). A estrutura social mais autenticamente unitária é a comunidade. O que menos agrada a Jesus é a ruptura da unidade. Por isso, não se pode ser cristão fora da comunidade ou de costas para ela. "Que pouco é preciso, dizia João Paulo II, para que a Igreja exista, se multiplique e se espalhe a partir da decisão de dois ou três reunidos em nome de Cristo e unidos, por Ele, em oração com o Pai ... " (JOÃO PAULO II, Alocução sobre a Igreja. Osservatore Romano no 356, 15 de Julho 1979) 72
3· O casal cristão, primeira comunidade de fé A primeira comunidade de fé é o casal cristão que vive a fé do sacramento do Matrimônio, segundo a qual Cristo se compromete com os esposos desde o próprio instante em que estes dão o seu consentimento mútuo. É, pois, uma comunidade a três: os dois esposos e Cristo. Em primeiro lugar, é preciso lembrar que, no princípio, Deus quis criar o casal: "Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele os criou homem e mulher. [.. .] Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boa" (Gn 1,27-31). Infelizmente, passaram muitos séculos de vida da Igreja durante os quais se desfigurou ou, pelo menos, se ocultou esta realidade do projeto de Deus. De fato, o ideal de santidade foi, durante muito tempo, considerado como um projeto de relação pessoal, entenda-se individual, do homem ou da mulher com o seu Criador. Não é nossa intenção desqualificar tal projeto de vida e de crescimento espiritual: muito simplesmente queremos constatar o fato de que a vida em casal através do matrimônio cristão era proposta como alternativa de segunda ordem àqueles que tinham a intenção de se aproximar de Deus com um projeto de santidade. É interessante referir que houve quem tivesse sido elevado aos altares "apesar" do matrimônio ou "graças à cruz" que o matrimônio implicava e, na melhor das hipóteses, aproveitando a oportunidade dada pelo estado de viuvez. Felizmente, a posição oficial da CM 414
Igreja a este respeito tem evoluído a partir do Concílio Vaticano II e até a muito recente Encíclica do Papa Bento XVI, DEUS É AMOR, que evoca o matrimônio como caminho de perfeição do casal ao mais alto nível: "O matrimônio baseado num amor exclusivo e definitivo toma-se o ícone do relacionamento de Deus com o seu povo e, vice-versa, o modo de Deus amar toma-se a medida do amor humano" (BENTO XVI, Carta Encíclica Deus Caritas Est, 11. Roma, 25 Janeiro 2006). "Não há que procurar a santidade fora do matrimônio. Não há santidade apesar do matrimônio. A santidade obtém-se no matrimônio.E, sobretudo, pelo matrimônio ". (VERCRUYSSE Marie-Jeanne, Carta ao Padre THOMAZEAU- Julho 1997) Foi por isso que Mons. Fleischmann afirmou: "O Padre Caffarel é daqueles que voltaram a popularizar a concepção tradicional do casal consagrado como célula da Igreja "no sentido de pequena comunidade cristã visível, no seio da grande comunidade que é a paróquia"; mas, bem mais profundamente, no sentido de elemento vivo da grande sociedade espiritual que é a Igreja ... Onde vive um casal cristão, aí começa a viver a Igreja". (FLEISCHMANN François, A herança do Padre Henri Caffarel. Conferência proferida em Roma, durante a reunião dos Responsáveis Regionais das ENS, 22 de Janeiro 2003, p. 7) Mas porquê comunidade? Justamente porque Deus nos criou à sua imagem e semelhança, que não é seCM 414
não a capacidade de amar, e isto não se pode fazer sozinho, mas em comunidade, dado que é aí que se realiza a prática do mandamento novo: "Que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei " (Jo 15,12). Este mandamento exige a entrega mútua, o dom total ao outro, exige viver para ti e não para mim ... e isto experimenta-se e pratica-se no casal cristão como primeira comunidade de base. Neste sentido, afirmamos que a primeira comunidade de fé é o casal unido pelo sacramento do Matrimônio. Um sacramento é uma realidade material que se apresenta como sinal de alguma coisa sobrenatural; o sacramento do Matrimônio é uma realidade material (o casal crente) que se apresenta ao mundo como sinal do amor de Deus pelo seu povo. Mas, como dizíamos antes, no matrimônio cristão, graças ao sacramento, há um elemento adicional e fundamental que o distingue de qualquer outra forma de união entre um homem e uma mulher: a presença de Cristo no casal, o que reforça o conceito de comunidade de fé. Portanto, Deus, o único que é Santo, comprometeu-Se com o casal, como garante de que a santidade dos seus membros é possível e realizável para lá dos limites humanos. A partir da nossa própria experiência de amor, vivida na pequena comunidade do nosso matrimônio, descobrimos um ponto fundamental: o compromisso de Deus conosco, através do seu amor inflnito, da sua fidelidade, do seu desejo do nosso bem, da sua imensa ternura, da sua bondade e da sua compaixão para conosco. 73
4· A familia cristã, comunidade de fé A maioria dos sociólogos concorda em que a farm1ia é a unidade de base da sociedade, enquanto é transmissora básica da cultura. D. Cooper, que, em 1971, tinha escrito uma obra sobre "a morte da Família", teve que corrigir a sua opinião e aftrmar que a família não morre mas se transforma. Assim, se por razões muito diversas, não se pode negar que o modelo tradicional de família está em crise no terceiro rnilênio, também há que aceitar que têm surgido várias outras formas de farm1ia que conservam a mesma função que a família tradicional. (Cf. BOTERO Silvio, La familia en el Tercer Milenio. Ediciones San Pablo. Bogotá, 2000. p. 117) Essa função não é senão privilegiar a "socialização" entendida como o processo através do qual as pessoas, interagindo umas com as outras, desenvolvem as formas de pensar, de sentir e de agir essenciais à sua participação na sociedade. Como Igreja doméstica, a família é o centro do amor e do conhecimento de Deus e do respeito pela vida. É o viveiro das virtudes cristãs e colaboradora no anúncio do Reino de Deus. Em sentido estrito, a farru1ia cristã é uma comunidade de fé, pois vive no seu seio a experiência de Deus e realiza a função educadora da fé em representação da Igreja. "Da família poderíamos afirmar, escreve o teólogo colombiano Sílvio Botero, que é o 'nós ' mais próximo do homem, enquanto ser criado para amar, e é o 74
'nós' mais próximo de Deus, que é a fonte e o modelo das relações interpessoais. Assim, a família encontra-se na intersecção do humano e do divino". (lbid. p 127) Por sua vez, Álvaro e Mercedes Gómez-Ferrer consideram que "a lição mais importante que as Equipes nos dão é talvez a de nos recordar constantemente que a família depende do casal, que cuidar do casal, do seu amor e do seu crescimento redunda sempre em beneficio da família, pois a família apoia-se no amor do casal, que deve permanecer ao longo do tempo ". (GÓMEZ-FERRER Álvaro e Mercedes, «Los Medios que proponen los Equipos para desarro/lar un Proyecto de Familia». Reunião nacional de responsáveis de equipe. Madrid, sábado 27 de Setembro de 2003, p. 3) A função principal dessa comunidade de fé é a educação dos filhos para os valores cristãos. Esta educação realiza-se fundamentalmente através do processo de "imitação", mais do que pelos discursos, numa proporção de três para um, segundo os psicólogos sociais. Ora, queridos pais e fanu1ia das ENS, não se preocupem tanto com o que dizer aos filhos; preocupem-se antes em darlhes o testemunho do amor e da coerência entre aquilo em que acreditam e aquilo que vivem. Isso chega! 5· As Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais No documento O que é uma Equipe de Nossa Senhora ? lê-se: CM414
"Uma Equipe de Nossa Senhora não é uma simples comunidade humana; reúne-se "em nome de Cristo" e quer ajudar os seus membros a progredir no amor a Deus e no amor ao próximo, para responder melhor ao apelo de Cristo". (EQUIPES DE NOSSA SENHORA, O que é uma Equipe de Nossa Senhora?, Setembro 1976) O Movimento é uma comunidade de comunidades na fé. Esta grande assembléia que, aparentemente, é um aglomerado social, é muito mais do que isso, pois vivemos estes momentos em íntima comunhão com Cristo através do seu Espírito. Em Julho de 1957, o Padre Caffarel proferiu, na cidade de São Paulo, Brasil, uma conferência muito importante sobre A Igreja. (CAFFAREL Henri, L'Ecclesia. Op. cit. pp. 9 e ss) Nela afirmou que "para que uma reunião de cristãos seja uma verdadeira Igreja - entenda-se uma comunidade de fé - tem de satisfazer determinadas condições: reunir-se na fé; romper com aquilo a que se está apegado; reunir-se em nome de Cristo; unir-se a Cristo pelo amor fraterno; escutar Cristo presente através da sua Palavra; responder a Cristo pela oração pessoal e pela oração da equipe (ação de graças, louvor ou súplica)". Acabamos de resumir as condições que o Padre Caffarel propôs para que a reunião de equipe constitua uma autêntica comunidade de fé; todavia, todos sabemos muito bem que a reunião de equipe é apenas o momento forte da vida de equiCM 414
pe. Esta prolonga a sua vida de maneira permanente e indefinida. Esta é uma das condições fundamentais da comunidade: a permanência que encontra as suas raízes na entrega mútua entre os seus membros e que a distingue de um simples grupo que se reúne com determinada freqüência para alcançar um objetivo determinado. Uma vez atingido esse objetivo, o grupo deixa de ter sentido. A comunidade de fé procura também um objetivo determinado. Contudo, uma vez que o seu objetivo é, por natureza, inacessível em plenitude, é necessário prolongá-lo no tempo. Esse objetivo não é outra coisa senão a santidade dos seus membros, segundo as palavras de Bento XVI, "devemos modelar continuamente o nosso ser e a nossa vida na imagem do Filho de Deus". (BENTO XVI, Audiência geral das quartas-feiras, 7 de Setembro 2005) A equipe, comunidade de fé, atinge a sua plena maturidade "quando, impelida pelo Espírito de Jesus Cristo, a equipe envia os seus membros ao mundo para lhe revelar esse Amor". (EQUIPES DE NOSSA SENHORA, O que é uma Equipe de Nossa Senhora?, Setembro 1976) A comunidade de fé sente compaixão pelo outro, entrega-se ao outro, compromete-se com ele segundo a imagem do Bom Samaritano. A comunidade de fé não tem sentido se ficar fechada em si mesma. A sua essência é o compromisso com o mundo, porque Jesus, no seu amor, 75
deu a vida pelo mundo inteiro e não apenas por um povo determinado. A este propósito, Jean VANIER afirma: "O sentimento de pertença a um povo, a aliança e o compromisso que ela implica estão no centro da vida comunitária". E, a seguir, interroga-se: "Quem é o meu povo? O meu povo é formado exclusivamente pelas pessoas com quem vivo e que fizeram a mesma opção que eu, ou por aqueles pelos quais a comunidade foi criada?". (VANIER Jean, Op. cit. p. 93) A sua resposta vai claramente para uma comunidade mais vasta. No caso das Equipes de Nossa Senhora, isso significa que o sentido da nossa pertença, o nosso povo, não pode reduzir-se àqueles que hoje constituem a nossa equipe ou pertencem ao Movimento; num sentido mais amplo, o nosso povo compreende todos os casais cristãos e, num sentido ainda mais amplo, todos aqueles que vivem o amor em casal. É exatamente o ponto em que o Padre Caffarel insistiu até à exaustão: «As equipes não devem ser creches de adultos ... Os seus membros devem estar sempre comprometidos em todas as frentes ... ". (EQUIPES DE NOSSA SENHORA, Carta mensal francesa, Junho 1948: Garderies des adultes) "Para que entrei nas Equipes? Para receber ou para dar? ... ". (EQUIPES DE NOSSA SENHORA, Carta mensal francesa, Dezembro 1948: Spiritualité Accommodatric). "Não pareceis estar suficientemente preocupados em INVENTAR a vossa vida de equi76
pe ... " EQUIPES DE NOSSA SENHORA, Carta mensal francesa, Março 1949: Innover). "Se as Equipes de Nossa Senhora não forem um viveiro de homens e de mulheres prontos a assumir corajosamente todas as suas responsabilidades na Igreja e na cidade, perdem a sua razão de ser... ".(Citado em Guia das Equipes de Nossa Senhora. Março 2001, XI-2) O beato Charles de Foucauld, por sua vez, afirmava: "Cada cristão tem de ser apóstolo: não é um conselho, mas um mandamento, o mandamento da caridade". (As melhores frases de Charles FOUCAULD. Cidade do Vaticano, segunda-feira 19 Setembro 2005 -. www.zenit.org) Nós, membros das Equipes de Nossa Senhora, como batizados, em união com todos os outros batizados do mundo, integramos a grande comunidade de comunidades que é a Igreja universal. Por seu turno, o movimento das ENS é uma comunidade ati va da Igreja; os seus membros exprimem a dinâmica da unidade no Espírito e tornam viva a comunidade na história da humanidade. Por conseguinte, os casais das Equipes, enquanto casais unidos pelo sacramento, têm de ser construtores da história, com base no amor, segundo o plano de Deus.
6. A Igreja, comunidade de comunidades, unida pela fé Atualmente, os teólogos aceitam que não seja possível viver-se uma autêntica vida cristã fora da comuCM 414
nidade de fé. Alguns chegam mesmo a afirmar que a Igreja é o sacramento primordial, entendida como comunidade de fé (Karl Rahner). Que a presença de Jesus Cristo só se pode exprimir através da comunidade que é a Igreja. Esta é o espaço em que o Evangelho se realiza. O Concílio Vaticano II pronunciou-se da seguinte forma: "Aprouve a Deus santificar e salvar os homens não individualmente e com exclusão de qualquer ligação mútua, mas fazendo deles um povo que O reconhecesse em verdade e O servisse santamente" (Lumen Gentium 9). Todos fomos educados numa cultura individualista e egoísta, que nos torna difícil perceber a Igreja como comunidade, como povo de Deus. Temos que redescobrir, como os primeiros cristãos, que Cristo está no meio de nós, e está na medida em que formos capazes de nos constituir comunidade de fé, na medida em que formos espaço para que Cristo ressuscitado aconteça, na medida em que formos autêntico povo de Deus. Este é um ponto que nos parece fundamental para a nossa reflexão. Que significa ser povo de Deus? Todo o povo (nação) se identifica pelo fato de habitar num espaço geográfico comum, com fronteiras bem definidas, por ter laços histórico-culturais que o unem, por se expressar através de uma língua comum, por estar de acordo com um regime jurídico que lhe outorga a categoria de Estado autônomo .. . Deus Pai quis-nos constituídos como seu povo CM 414
(nação) e, por isso, reuniu-nos, não num espaço territorial delimitado (ao estilo do povo judaico no Antigo Testamento), mas em torno de seu Filho Jesus Cristo (em união com o Pai e o Espírito Santo, segundo o Novo Testamento). A nossa identidade é, pois, dada pelo grau de identificação com o Espírito de Cristo, que recebemos pelo batismo. A nossa lei é o mandamento novo do amor. A nossa linguagem: a caridade que praticamos com os irmãos, não só com os que pertencem ao nosso povo, a Igreja, mas com todos os seres humanos. O nosso valor mais apreciado é o Evangelho. Daí que Cristo seja o centro da nossa vida e da nossa fé. Não estamos formulando uma teoria, mas constatando uma realidade: a unidade que estamos vivendo neste Encontro, em que nem as barreiras geográficas, lingüísticas ou culturais nos impediram de viver como povo de Deus, unidos pelo Espírito de Jesus. "Formai comunidades com base na fé! [... ] é também importante conservar a comunhão com o Papa e com os Bispos. São eles que garantem que não se anda à procura de caminhos privados, mas que se está vivendo, ao contrário, naquela grande família de Deus que o Senhor fundou com os doze Apóstolos», dizia o Papa Bento XVI nas Jornadas Mundiais da Juventude, em Colónia, no ano passado. (BENTO XVI, Homilia da missa de encerramento das Jornadas Mundiais da Juventude, Colônia, 15 de Agosto 2005) 77
7. O papel evangelizador das ENS no mundo de hoje No início da nossa conferência, fizemos uma pergunta: como podem as Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, dar uma resposta válida e convincente ao mundo de hoje? Como dizíamos há pouco, temos cada vez mais consciência de que nos debatemos num mundo individualista, que tomou um rumo que o afasta rapidamente do ideal cristão da civilização do amor. Paradoxalmente, o nosso mundo não está longe da situação vivida pelas primeiras comunidades cristãs, caracterizadas pela predominância de uma cultura sem Deus, que não é exagero definir como neo-pagã. "Como o paganismo antigo, escrevia o Padre Bartolomeo Sorge, S.J., ela exalta os desvios morais, a violência, o dinheiro e o poder. Sobretudo, mostrou bem a sua incapacidade de edificar uma sociedade humana mais feli z, livre e justa. E, se é verdade que nos permitiu "ter" mais, condenou-nos a "ser" menos ... " .. Face a esta realidade, fazemos, com ele, a pergunta fundamental: "Como anunciar hoje o Evangelho, de forma a ele ser compreendido e livremente aceito por todos? " ... ( SORGE Bartolomeo S.J., Per una civiltà dell 'amore. Quriniana. Terza edizione, Brescia 1999. Cap. 7, pp. 97 e ss) O Evangelho não é um conjunto de verdades abstratas . O Evangelho não é só uma doutrina; é uma experiência de vida. Evangelizar 78
é, antes de mais, abrir espaços para que a pessoa descubra a forma de se unir a Cristo. É tornar as pessoas permeáveis ao Espírito de Cristo. O Evangelho é pessoa. É comunidade. O Reino de Deus não acontece senão em comunidade de fé . Os evangelistas registram a criação daquela pequena comunidade de Jesus com os seus doze discípulos. "Começa para os discípulos um conhecimento direto do Mestre. Vêem onde mora e começam a conhecê-Lo. De fato , eles não deverão ser anunciadores de uma idéia, mas testemunhas de uma pessoa". (BENTO XVI, "Os Apóstolos testemunhas e enviados de Cristo", Audiência Geral, quartafeira 22 de Março 2006) Posteriormente, lendo os Atos dos Apóstolos, verifica-se como Paulo, ao ser expulso das sinagogas, se viu obrigado a inserir-se num outro espaço, primeiro nas famílias dos crentes de origem judaica e, depois, nas famílias pagãs, transformando as suas casas no novo lugar e campo de operação do anúncio do Evangelho. No entanto, o papel principal de Paulo aí não é a pregação; o anúncio é ele mesmo, que, como pessoa identificada com Cristo, impregna a comunidade familiar, transformando os valores naturais e humanos presentes nos pagãos em valores cristãos. Por outras palavras , Paulo desencadeia verdadeiras conversões, despertando para a fé na pessoa de Cristo e fazendo das famílias pagãs verdadeiras comunidades CM414
cristãs. (BAENA Gustavo S.J.,
"Lineamentos de Pastoral de la Cultura". Em Sínodo Arquidiocesano de Bogotá - Seminário Taller de Discernimiento. W. Taller Editorial. Bogotá D.C., 1993, pp. 217-252) A nossa estratégia não pode, pois, ser senão a que foi utilizada pelos primeiros cristãos: inserir-nos nos casais e nas farm1ias a fim de impregnar a cultura, a partir da própria base, com os valores evangélicos. Logo, a difusão do Evangelho não pode ser nem maciça nem discursiva; deve ser vivencial, transformando-nos em testemunhas da pessoa de Cristo. É por isso que hoje temos de reivindicar a vida comunitária, pois só por ela é possível inculturar o Evangelho nos diferentes campos da vida humana, a fim de transformar, a partir de dentro, as consciências, as culturas e os costumes com a força e a luz do Evangelho. Ser cristão é viver os valores do Evangelho no seio da cultura em que se vive. É, contudo, preciso ter em conta que "a Igreja e os cristãos, segundo Sorge, são hoje uma pequena
minoria numa sociedade e numa cultura largamente descristianizadas e neopagãs. Todavia, para a Igreja, ser uma minoria não é um mal: é a sua condição originária ... De fato , a Igreja - 'pequeno rebanho' (Lc 12,32) -nasceu não para ser massa, mas para ser fermento". (SORGE Bartolomeo S.J., Op. cit., p. 101) É nesta perspectiva que podemos situar o papel evangelizador das CM414
Equipes de Nossa Senhora no mundo de hoje. Hoje, sessenta anos após a nossa fundação, temos uma enorme «vantagem comparativa»: estamos presentes nos cinco continentes, com mais de 10000 equipes, o que significa cerca de 50000 casais que equivalem a mais de 100000 membros. Poucos movimentos de Igreja contam, segundo a expressão da nossa Carta, com "grupos de
combate compostos por voluntários " de dimensão e qualidade semelhantes, com uma taxa anual de crescimento contínuo de 4,25% nos últimos doze anos e presentes em quase todos os cantos do mundo. Isto não é por acaso! É uma clara manifestação da Providência e do Espírito Santo, como dizia o Padre Caffarel uns anos antes de morrer. (Cf. CAFFAREL, Henri, O Caris-
ma Fundador: Reflexões sobre as origens, o Carisma fundador e a situação atual das ENS, Conferência proferida em Chantilly, a 3 de Março 1987, por ocasião da reunião dos Responsáveis Regionais e Supra-.Regionais europeus) Apesar desta situação privilegiada, continuamos a ser uma minoria que leva consigo um apelo exigente a que nos convertamos em comunidades vivas de casais, com um claro sentido histórico da missão a que fomos chamados, como nos recordou Sua Santidade o Papa João Paulo II, na sua alocução de janeiro 2003:
"Chamados a 'iluminar aqueles que buscam a verdade' (Lumen Gentium 35), nomeadamente os filhos; os esposos poderão então desenvolver plenamente a graça 79
do seu Batismo, nas suas missões específicas no seio da família, na sociedade e na Igreja ... ". (JOÃO PAULO II, Alocução aos casais Responsáveis Regionais das ENS. Roma, Janeiro 2003, no 5) Certamente, o carisma fundamental do Movimento, a sua razão de ser, não é senão viver Deus em casal, descobrindo as riquezas do sacramento do Matrimônio, o que para nós, membros das Equipes, é viver a espiritualidade conjugal. Para isso, formamos equipe (comunidade de casais), para mutuamente nos ajudarmos a atingir o nosso ideal. É assim que, ao longo dos seus quase sessenta anos de história, as Equipes têm dado provas de uma grande capacidade para formar casais cristãos à luz do Evangelho. Neste sentido, sem sombra de dúvida, as Equipes são autênticas comunidades de fé. Porém, em total acordo com Jean VANIER,
"uma comunidade só se constitui como tal quando todos os seus membros têm um sentimento de urgência da sua missão". (VANIER Jean, Op. cit., p. 92) Fora do Movimento, diz-se que as equipes tendem a viver voltadas para dentro de si, com poucas repercussões no seu meio. Contudo, no Guia das Equipes lê-se: "Os
membros das Equipes de Nossa Senhora vivem no mundo de hoje, fazem plenamente parte dele e querem ser fermento na massa. É por isso que precisam discernir continuamente os sinais dos tempos para descobrir a nova realidade e as necessidades que ela 80
implica para os casais de hoje". (EQUIPES DE NOSSA SENHO-
RA, Guia das ENS, p. 7) "Discernir continuamente os sinais dos tempos" é uma afirmação baseada no reconhecimento da dinâmica histórica e cultural da humanidade, que influencia de forma decisiva o pensamento, os valores, as atitudes e os comportamentos dos seres humanos. Por outras palavras, discernir os sinais dos tempos é interpretar e reconhecer a evolução das aspirações e das necessidades das mulheres e dos homens do nosso tempo. Os sinais dos tempos devem ser observados principalmente nas pessoas de hoje, em cada geração, nas suas interrogações mais angustiantes sobre a vida presente e futura, nas suas aspirações mais profundas, nos seus desesperos mais frustrantes. Não podemos ficar indiferentes face à realidade do nosso povo. Somos chamados a ser fermento na massa (Mt 13,33). "O fermento na massa é, com certeza, minoria, mas não é por isso que é "marginalidade", se é bom; destina-se a fermentar toda a massa. Da mesma forma, o sal é "minoria" nos alimentos que tem de salgar, mas não é por isso que a sua tarefa é 'marginal'". (SORGE Bartolomeo S.J., Op. cit., p. 101) Nós, membros das ENS, temos de ter consciência da exigência da nossa vocação cristã face à necessidade de imprimir um sentido histórico ao nosso Movimento, discernindo os sinais dos tempos e respondendo com diligência e prontidão ao apelo de Jesus para sermos sal da CM414
terra, luz do mundo e fermento na massa. Temos de ter consciência também, como casais cristãos, do fato de estarmos situados no próprio coração da sociedade, na família, reconhecida como tal pela maioria dos sociólogos de todos os tempos. Somos chamados a dar testemunho da nossa fé, do nosso amor e da nossa esperança a um mundo que navega sem rumo nas águas do individualismo. Não podemos renunciar ao anúncio da boa nova do matrimônio cristão a todos os casais casados ou para casar, ao grupo cada vez mais numeroso dos que coabitam antes do casamento e mesmo àqueles que são casados civilmente, a fim de lhes oferecer a possibilidade de conhecer a boa nova do matrimônio cristão como caminho de amor, de felicidade e de santidade. É este o nosso "povo" segundo a ótica de Jean VANIER. Não façamos das nossas equipes "creches de adultos de boa vontade, mas autênticos e eficazes grupos de combate" no interior da Igreja e da sociedade. Por outro lado, o número de divórcios e de separações aumenta de maneira exponencial. Ora, os doentes são os casais que vão ficando estendidos à beira da estrada. O sentido da pertença e a expressão do amor à comunidade não podem excluir do nosso "povo" todos aqueles que vivem nessas condições e com necessidades semelhantes: os casais em dificuldade, os divorciados e os divorciados recasados. Por vocação e formação, somos, como poucos, chamados a acompanhá-los CM 414
-fora do Movimento - a fim de que eles possam encontrar o amor misericordioso de Deus, como nos pediu encarecidamente João Paulo II na sua alocução já referida: "Possam eles encontrar no seu caminho testemunhas da ternura e da misericórdia de Deus!". (JOÃO PAULO II, Alocução aos casais responsáveis Regionais das ENS. Roma, Janeiro 2003, n° 7) Para concluir, devemos dar testemunho de que Jesus, centro da nossa vida, é o único que pode dar sentido às nossas vidas, enquanto pessoas e enquanto casais, bem como às nossas equipes, como autênticas comunidades de fé; é assim que podemos contribuir eficazmente para a construção do Reino de Deus na nossa sociedade sob o signo da Nova Civilização do Amor! Nada mais adequado para terminar esta conferência que recitar a oração a Maria com que Bento XVI termina a sua Encíclica Deus é amor:
Santa Maria, Mãe de Deus, Vós destes ao mundo a luz verdadeira, Jesus, vosso Filho -Filho de Deus. Entregastes-vos completamente ao chamamento de Deus e assim vos tornastes fonte da bondade que brota dele. Mostrai-nos Jesus. Guiai-nos para ele. Ensinainos a conhecê-o e a amá-lo, para podermos também nós tornar-nos capazes de verdadeiro amor e de ser fonte de água viva no meio de um mundo sequioso. Alberto e Constanza ALVARADO Casal membro das ENS 81
Equipistas brasileiros reunidos
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de setembro • • •
ENS: COMUNIDADES VIVAS DE CASAIS, REFLETINDO O AMOR DE CRISTO Jornada Internacional . . . e o Encontro continua Quinta-feira, 21 de setembro. A aurora ainda não havia rompido quando chegamos ao Santuário, para a Oração da Manhã e a Celebração Eucarística de encerramento do X Encontro Internacional das Equipes de Nossa Senhora. Era como se tivéssemos pressa em chegar à morada do Pai. Éramos muitos. No olhar de cada 82
um, a alegre expectativa do encontro com o Senhor. As orações iniciais prepararam o nosso espírito para a meditação silenciosa, durante a qual refletimos sobre os meios e as oportunidades que o Senhor concede aos casais para se tornarem oferenda permanente de amor (Parecia quase impossível: milhares de equipistas, que chegaram pouco antes em ruidosa alegria, CM 414
se mantiveram em silêncio profundo durante toda a Meditação). Na meditação, compreendemos que o Senhor não quer nada de nós além do nosso amor. Na Missa de Ação de Graças, o Senhor nos falou pela voz do apóstolo Paulo, exortando-nos à unidade, "mediante o vínculo da paz" (Ef 4,3), o que requer humildade, mansidão e paciência. Unidade entre os casais e entre as famílias. Com a Igreja e o movimento das Equipes de Nossa Senhora. Como a Mateus, o Senhor nos convida a segui-lo: "Segueme", e aguarda que repitamos o gesto desprendido do evangelista que, imediatamente, "levantandose, o seguiu" (Mt 9, 9). Assim como os estendeu a Mateus, Jesus mantém os seus braços abertos para nos acolher. Seguindo-o, teremos restituída a nossa condição de filhos de Deus, como assinalou dom Geraldo Majella, em sua homilia. E, certamente, a nossa condição de "casais de Deus". Antes da bênção final e do envio à missão, o casal Gérard e Marie Christine de Roberty dá posse aos novos casais membros da ERI- entre eles Sílvia e Chico, que serão o novo Casal Ligação da ERI para a Zona América - e, após dirigir palavras de agradecimento a Deus e a todos os que o ajudaram no exercício da responsabilidade, transmite a responsabilidade da ERI ao casal Carlos e Maria Carla Volpini. Maria Carla e Cario, já novo CRIERI, nos lembraram que é por CM 414
amor que servimos, e nos enviaram de volta aos nossos lares e comunidades, agora mais fortalecidos pelas abundantes graças recebidas. Finalmente, a belíssima coreografia de apresentação do novo logotipo das Equipes, constituído pelo peixe e pelas alianças, envolveu e encantou a todos. Foi uma manhã em que o Senhor nos falou dos seus projetos para o casal e inclinou-se para ouvir as nossas súplicas e os nossos louvores. É sempre surpreendente redescobrir que a intimidade com o Pai só é possível porque Ele nos amou primeiro e continua nos amando e nos amará eternamente. Quando correspondemos ao seu amor, nos tornamos semelhantes a Ele e ficamos em condições de conhecê-lo melhor, seguí-lo e amálo sem ressalvas. Então, o nosso rosto de casal será reflexo mais próximo do rosto do Pai, com o nosso coração se fundindo ao seu coração, possibilitando que amemos com o seu amor. Inspirados no hino de louvor que Maria, nossa querida Mãe, cantou quando viveu a experiência da graça plena de Deus, também ousamos dizer: o Senhor faz em nós maravilhas e santo é o seu nome! O Encontro de Lourdes continua nas graças recebidas e no convite renovado que o Senhor nos faz para segui-lo, na condição de servidores do seu reino. Silvia e Glauco Equipe N. S. do Rocio Setor B Florianópolis/SC 83
SOLENE EUCARlSTIA DE ENCERRAMENTO Homilia "Equipes de Nossa Senhora, comunidades vivas de casais, reflexos do amor de Cristo" Chegamos à conclusão de um belo encontro, promissor de graças que o amor de Cristo traz aos casais que procuram ver o seu matrimônio como uma missão de testemunho para o mundo. A palavra de Deus, deste dia da Festa do evangelista São Mateus, nos ajudará, com a proteção de Maria, Mãe de Deus e nossa, a encontrar Jesus, caminho, verdade e vida. A primeira leitura, carta de Paulo aos Efésios, desde sua prisão, lembra que na diversidade de carismas e funções, somo s um só corpo em Cristo, chamados ao estado de homem perfeito , na medida que convém à plena maturidade de Cristo . Nessas linhas, Paulo denuncia a divisão dos cristãos, exorta-os a caminhar para a unidade e a pagar o preço: humildade, doçura, paciência. O texto é rico de esperança: a 84
unidade pode ser feita, porque no fundo ela já existe. A ação de Deus é indivisível, e toda a graça que é comunicada ao coração dos homens vem da única fonte, que é Cristo, em vista de um único desígnio. Também as diversidades de carismas e de funções específicas no âmbito da comunidade cristã devem ser colocadas a serviço da unidade, para a edificação do corpo de Cristo. Deus está além de todas as nossas divisões. Ele está em todos
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os que querem chamar-se seus filhos, em Jesus, e viver como tais. A leitura de Paulo, com a autoridade que lhe dá a sua condição de prisioneiro, exorta os seus a serem fiéis ao Senhor, dignos do chamado recebido, humildes, mansos, pacíficos. A paz leva à unidade. Unidade que, segundo Paulo, se articula e realiza em vários níveis: "Um só corpo": o corpo de Cristo é uno e compreende todos os cristãos. "Um só espírito": fonte da vida do batizado, fonte da esperança. "Um só Senhor": é a confissão dos primeiros cristãos: nasce da única fé dada pelo único batismo. Enfim, "um só Deus", o Pai, Senhor de todos, que opera mediante todos, que habita em todos. Além de conservar o dom do Espírito, cada cristão deve contribuir para edificar o corpo de Cristo. Os dons de cada um têm o papel de tomar todos os outros capazes, por sua vez, de servir para a edificação da Igreja. O fim é realizar "com a unidade da fé", o "homem perfeito", a "medida da estatura da plenitude de Cristo", a Igreja. A unidade da fé pressupõe os diversos fiéis reunidos pela consciência de serem filhos de Deus e irmãos no Cristo. Somente assim os cristãos não são mais crianças instáveis, fácil presa de ideologia, de enganos e espertezas, mas, cumprindo a verdade com fatos, isto é vivendo no amor, crescem para o Cristo total. É Cristo a fonte de todo crescimento da Igreja. Dele é levada à unidade e é mantida. Por obra dele, seus vários membros se prestam ajuCM414
da mutuamente. É ele que faz crescer a Igreja, porque o amor mútuo de seus membros é a mesma caridade de Cristo. Assim Cristo é a fonte do crescimento do amor conjugal, da Igreja Doméstica, como a chamou João Paulo II na Familiaris consortio. O Salmo 19 (18) proclama: "Os céus proclamam a glória do Senhor, e o firmamento a obra de suas mãos!". O céu revela ao homem a ordem e o louvor: a ordem como fato ontológico: o louvor como interpretação de linguagem. A criação interpela o homem, convidando-o ao louvor e à obediência. Só o homem pode entoar o louvor, dando linguagem formal ao discurso inarticulado dos céus, e esperando que Deus o aceite. O Evangelho de Mateus 9,9-13: Jesus chama o publicano Mateus, que o segue imediatamente. Os fariseus criticavam Jesus, que responde, justificando a sua conduta: "Não vim para chamar os justos, mas os pecadores". Estas palavras de Jesus têm um significado preferencial, não exclusivo. A vocação de Mateus, que Marcos e Lucas chamam também de Levi, é sem dúvida a mais surpreendente entre as dos doze apóstolos, tratando-se de um publicano, isto é de um cobrador de impostos para os romanos, declarado oficialmente pecador público pelos mestres da ortodoxia. Jesus quer associar Mateus ao grupo dos seus amigos íntimos. Mateus responde imediatamente "sim" ao convite "segue-me" de Jesus, e organiza um banquete de despedida do qual participam al85
guns seus colegas, juntamente a seu novo Mestre e aos discípulos. Jesus provoca intencionalmente o escândalo dos puritanos, colocando-se a favor das "ovelhas perdidas da casa de Israel", para que se manifestasse evidente a misericórdia de Deus que acolhe os pecadores e os perdoa, como faz o pai com o filho pródigo. Por isso advertiu os chefes religiosos do povo que publicanos e prostitutas os precederiam no caminho do reino de Deus. De fato, foram os pecadores e os pequeninos, os pobres, os ignorantes e os doentes que se apegaram à sua mensagem libertadora melhor que os sãos, os justos, os sábios e os doutos. Mateus era um marginal da salvação, mais que um pobre; era também um discriminado social como o são hoje os delinqüentes habituais, os encarcerados, os alcoólatras e os drogados, as prostitutas. Entretanto Jesus o restitui à sua condição de pessoa e de filho de Deus, infundindo-lhe confiança com o convite "segue-me", convite que certamente contraria pressupostos psicológicos e sociológicos. Todavia, para o Senhor, a pureza religiosa autêntica não é a legal, mas a conversão ao amor, à piedade e à misericórdia. As leituras da festa de São Mateus nos mostram que todos somos diante de Deus necessitados do seu acolhimento, da sua misericórdia e do seu perdão. Nenhum de nós é tão santo que não necessite de conversão e perdão. Não obstante os nossos pecados, o amor de Deus é maior do que toda a miséria moral e nos oferece perdão. E mais, torna86
mo-nos membros de Igreja santa e pecadora, que confia sempre na misericórdia e no perdão. Por isso Deus faz sua Igreja missionária para levar a todos o Evangelho e a força sacramental do amor de Deus, testemunhado pelo seu Filho e agora por nós, seus filhos adotivos. A fam11ia, como realidade criada, não perdeu a sua dignidade anterior ao pecado e encontra seu pleno significado somente como família cristã, como comunidade para a qual Jesus Cristo mesmo é o único Salvador. Jesus faz desta comunidade instrumento de sua própria obra salvífica em favor da humanidade. A visão da fami1ia como Igreja "em miniatura" e chamada "falll11ia de Deus", são idéias que estão presentes desde os primeiros séculos do cristianismo. São Paulo, na carta aos Efésios, trata o mistério da Igreja em relação ao matrimônio e à farm1ia. Insiste em que a relação entre marido e mulher imite o amor sacrifical de Cristo pela Igreja. Nesse mesmo sentido "o sacramento do Matrimônio significa a união de Cristo com a Igreja. Dá aos esposos a graça de amarem-se com o amor com que Cristo amou a sua Igreja; a graça do sacramento aperfeiçoa assim o amor humano dos esposos, reafrrma sua unidade indissolúvel e os santifica no caminho da vida eterna". A farm1ia tem urna vocação alta na Igreja. Já que a farnília é "comunhão de pessoas", é "reflexo e imagem da comunhão do Pai e do Filho no Espírito Santo". Além dessa imagem trinitária, a CM 414
faiDI1ia, em "sua atividade procriadora e educativa é reflexo da obra criadora de Deus. É chamada a participar na oração e no sacrifício de Cristo. A oração quotidiana e a leitura da Palavra de Deus fortalecem nela a caridade. A família cristã é evangelizadora e missionária". Os pais são os primeiros e principais educadores, portanto primeiros catequistas de seus filhos, chamados a ser testemunhas vivas. Em nossa sociedade secularizada, a transmissão da fé na faiDI1ia se faz cada vez mais difícil. A atenção à família é importante e urgente. Falando à diocese de Roma, em 6 de junho passado, dizia o Papa Bento XVI: "Precisamente nesta situação todos, especialmente nossas crianças, adolescentes e jovens, necessitam viver a fé com a alegria, apreciar a serenidade profunda que brota do encontro com o Senhor. Na encíclica Deus é amor escrevi: 'Cremos no amor de Deus: assim pode expressar o cristão a opção fundamental de sua vida. Não se começa a ser cristão por uma decisão ética ou uma grande idéia, senão pelo encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que dá novo horizonte à vida e, com ele, uma orientação decisiva'. A fonte da alegria cristã é a certeza de ser amados por Deus, amados pessoalmente por nosso Criador, por Aquele que tem em suas mãos todo o universo e que nos ama a cada um e a toda a grande família humana com um amor apaixonado e fiel, um amor maior que nossas infidelidades e pecados, um amor que perdoa. Esta certeza e esta alegria de ser amados por Deus deve CM 414
fazer-se de algum modo palpável e concreta para cada um de nós, e sobretudo para as novas gerações que estão no mundo da fé". Este Encontro Internacional
das Equipes de Nossa Senhora não podia ter escolhido lugar mais adequado que Lourdes. Nossa Senhora aqui apareceu e continua presente acolhendo milhares de fiéis que vem em busca de Jesus, querem ouvir a Palavra de Jesus e segui-lo. Todos aqui vêm não para simples passeio, turismo ou curiosidade, mas em busca de ouvir a palavra da Mãe de Deus, assim como ouviu Santa Bernadete: Fazei tudo o que Ele disser. O acolhimento da Palavra de Jesus possibilita que Ele realize o seu primeiro milagre. Assim cada fiel que aqui vem pode ser agraciado por Cristo, ao fazer o que Ele disser. Que cada faiDI1ia das Equipes de Nossa Senhora esteja sempre atenta para ouvir o pedido de sua Mãe e a voz do Mestre. Assim sereis de fato testemunhas para o mundo, sinal dos valores familiares para os nossos jovens. Que a Imaculada Conceição de Maria indique o caminho do grande amor e da felicidade a todos que aqui passam. Que esta gruta de Massabielle, como o foi a gruta de Belém, seja lugar de encontro com Deus, com o próximo e consigo mesmo para cada peregrino. Deus nos conceda Seu Espírito Santo para realizarmos sempre o bem, como seu Filho Jesus que passou por este mundo fazendo o bem. Assim seja.
Cardeal Geraldo Majella Agnelo Presidente da CNBB 87
O lOGOTIPO lNTERNAClONAl
Equipes de Nossa Senhora
Após refletir, o Colégio Internacional decidiu adotar um logotipo único para a totalidade do nosso movimento, em nível nacional e internacional, para fixar claramente nossa identidade e nossa unidade. Somos um movimento de "espiritualidade conjugal" que reúne casais cristãos unidos pelo sacramento do Matrimônio e que desejam, em conjunto, aprofundar as graças do seu matrimônio. Essa identidade toma-se visível pelos dois símbolos fortes, constitutivos do nosso movimento, que são a referência cristã e aquela da aliança, simbolizados pelo peixe e pelas alianças. • O Peixe é o emblema dos primeiros cristãos. • As letras da palavra grega "peixe" são as iniciais de "Jesus Cristo, Filho de Deus Salvador"; o peixe era, assim, o modo de representar Cristo. É em seu nome que nos encontramos nas nossas reuniões. A palavra equipe vem da palavra em francês antigo "esquif', que, em português, significa esquife, barca; também aqui encontramos o símbolo do peixe. Assim, podese ver no peixe a relação entre 88
Cristo e as Equipes, que constitui justamente a base mesmo da nossa razão de ser. • As alianças: são as alianças do casamento. São o sinal da afeição, do amor, da fidelidade ao ser amado e escolhido. As alianças, em forma de círculos entrelaçados sobre o peixe, simbolizam a aliança de Deus com o seu povo, aliança onde o matrimônio cristão vai buscar o seu fundamento e da qual recebe a sua natureza própria como sacramento. O logo é constituído pelas três cores primárias, com referência ao significado que lhes é dado na iconografia: • O azul para simbolizar a divindade de Deus • O amarelo ou dourado para mostrar a glória de Deus • O vermelho para a humanidade. O logotipo é composto do peixe e das alianças, sublinhado pelo nome do Movimento na língua do país, para marcar por sua vez a diversidade de países que compõe nosso movimento, unidos na internacionalidade. CM 414
AÇÃO DE GRAÇAS 1.
lntrodução
Caros amigos, É com muita emoção que tomamos a palavra para transmitir a Cario e Maria Carla o serviço das Equipes de Nossa Senhora. É claro que nossas palavras não estarão à altura dos sentimentos que nosso coração e nossa alma gostariam de expressar. Recebemos tanto que não seria possível, diante de vocês, fazer a conta das Graças de que fomos cumulados. Queremos partilhar com vocês, nessas poucas palavras e em algumas imagens, o que sentimos após todos esses anos que passamos servindo o casal, o casamento no seio das Equipes de Nossa Senhora: encontros, convicções, questionamentos, certezas ...
Nosso encontro com o Padre Caffarel e os casais ào Movimento
2.
Em Saint Ouen, numa bela manhã, somos pela primeira vez responsáveis de nossa jovem equipe e participamos de um encontro . Um homenzinho, vestido inteirinho de preto, sobe ao palco, tem um aspecto tão frágil, mas em alguns instantes passa a ocupar a totalidade do grande palco e invade o imenso auditório onde se assentam 3.500 pessoas. Pelos cochichos, entendemos que se trata do Padre Caffarel, fundador do Movimento. Ficamos intrigados e, mais ainCM 414
da, impressionados com sua palavra segura e com o momento em que leva todos os participantes à oração de meditação, num silêncio impressionante. Este homem é grande! Não sabíamos, então, que o encontraríamos em várias ocasiões. No ano seguinte, durante oito dias na escola de oração: para nós, existe o antes e o depois da escola de meditação. Em Chantilly, diante dos regionais da Europa, pronuncia palavras tão fortes e tão atuais que desejamos que todos possam estudá-las. Enfim, em várias ocasiões encontramo-nos com ele, sós ou com outros, no seu escritório, para conversas que nos marcaram, porque 89
o encontro com esse homem é muito intenso, ele respira Deus e sopra Seu Espírito. Somos definitivamente marcados pela presença de Cristo nesse sacerdote que nos diz: "Sejam exigentes! Vocês nunca estarão enganando!" Essa palavra é um choque elétrico para nossa vida, para nossa fé; ela nunca nos deixou e vivemos dela desde então na nossa vida de cada dia, nos nossos engajamentos, na nossa vida conjugal e familiar. Rendemos graças pelo Padre Caffarel e pelos casais que ele conduziu e orientou; cruzamos com eles em nossa caminhada e eles nos permitiram que nos déssemos e que servíssemos, seguindo a estrada que Jesus nos mostra, quando diz: "Vem e segue-me".
3· Transmitir nossa fé no casal e no casamento É impressionante ver vocês daqui, casais de todos os países, marido e mulher juntos um do outro e, para aqueles que não têm, ou não têm mais, a felicidade de estar junto com o outro, sentimos bem o amor de vocês presente e somos agradecidos por esse testemunho ainda mais forte. Olhem em volta e vocês entenderão como é entusiasmante, num mundo onde é real a crise do casal, num mundo que prega o indivíduo, com suas vontades imediatas, seus desejos epidérmicos, combater este combate do amor ao serviço do casal e do matrimónio com as únicas armas que temos, que são as do amor. Assim como Deus criou o ho90
mem e a mulher à sua imagem e semelhança, ele quis que o casal que vive seu matrimónio seja imagem e semelhança da aliança de seu Filho, Jesus Cristo com a Igreja. Essa aliança nos fortalece na idéia de que o casal sólido é a base de uma farru1ia sólida e de um mundo de concórdia. Com freqüência, quando as pessoas nos dizem família, nós, equipistas, devemos retrucar com casal - casamento. Caros amigos, ao final deste período de serviço, estamos ainda mais convencidos de nossa responsabilidade para com todos os casais, aqueles que conhecem o matrimónio e aqueles a quem devemos anunciá-lo. Nosso movimento não deve fazer "bravatas" diante dos fracassos do matrimónio, mas mais do que nunca devemos anunciar, a tempo e contratempo, a beleza deste caminho de santidade que o casal toma na união conjugal. O que estamos esperando para dizer da nossa alegria por fazermos parte desse maravilhoso movimento das Equipes de Nossa Senhora? Não são 60.000, mas centenas de milhares que deveríamos ser. O que estamos esperando para ir, dois a dois, evangelizar os casais tão numerosos que negligenciam a sustentação do "sim" do seu casamento? Damos graças por todos os casais felizes que encontramos ao longo desses anos e que nos dão vontade de dizer a alegria do casal e do matrimónio a todos aqueles que, apesar de crises por vezes graves, prosseguem com esta bela aventura. CM414
4· A família e
a evangelização Aí estão eles, em equipes, em volta de uma refeição trazida numa sacola, estão celebrando em fanu1ia o fim do ano. As crianças correm, os maiores estão num canto, partilhando suas descobertas de adolescentes, os pais dão gargalhadas, enquanto aguardam a continuação do passeio iniciado pela manhã. Eles vivem fanu1ia! A fanu1ia é destinada a ser uma "comunidade de amor e de vida", à imagem da Santíssima Trindade, como afirmou o Papa Bento XVI, quando a Igreja celebrou em junho passado a solenidade da Santíssima Trindade. A fanu1ia é destinada a ser uma comunidade de amor e de vida, na qual as diversidades devem confluir para formar uma "parábola de comunhão". Graças ao Espírito Santo, podemos conhecer de certa forma a própria intimidade de Deus e descobrir que Ele não é solidão infinita, mas comunhão de luz e de amor, vida dada e recebida num diálogo eterno entre o Pai e o Filho, no Espírito Santo - "Amante, Amado e Amor", retomando o que disse Santo Agostinho. Neste mundo, ninguém pode ver Deus, mas Ele mesmo se deu a conhecer, de maneira que podemos afirmar, com o apóstolo João: "Deus é amor, nós reconhecemos e cremos que o amor de Deus está entre nós". Nossa tarefa de esposos cristãos, de faffil1ia cristã, de equipistas é, portanto, fazer com que aconteça esse encontro com Cristo, para que CM 414
cada casal, cada faffil1ia entre numa relação de amizade e assim, beneficiando-se da comunhão trinitária, acolha-O em sua casa, Ele que vem com o Pai para ficar conosco. Damos graças por nossa família, por todas as fanu1ias que encontram em outras faffil1ias as alegrias de esperar, de testemunhar, e amigos para as amparar.
5. As Equipes de Nossa Senhora: um movimento para amanhã Como é bonito o ambiente de Lourdes nesses dias: todos esses casais que passeiam nesta cidade santa, de mãos dadas. Até parece um vento de amor soprando nas margens do Rio Gave. Explicação desta alegria comunicativa: "Vede como eles se amam". Apesar das dificuldades que encontramos, é o que traduz nosso entusiasmo por viver os Estatutos das Equipes. Desde que aqui chegamos, a maioria de nós tem experimentado diariamente o que é a leitura da Palavra de Deus, a Oração Conjugal, a Meditação, a ruptura das nossas atividades, para ficarmos disponíveis à escuta do Senhor. Fizemos nosso Dever de Sentar-se e talvez tenhamos assumido, nessa ocasião, uma nova regra de vida. Só a oração constante e a atenção dada aos outros nos permitem entrever uma solução: abandonarse em Cristo, por ele e com ele. Vivenciamos, também aqui, as alegrias da vida de equipe, por meio do auxílio mútuo fraterno e sobretu91
do espiritual, pela partilha e pela escuta dos outros. Encontramos muitas equipes felizes e, às vezes, equipistas insatisfeitos com sua equipe, mas sempre preocupados em bem viver sua vida de equipista. Sabemos por experiência que contamos com a ajuda dos que partilham de nosso ideal e se comprometem em fazer "equipe", porque conhecem a dificuldade de viverem como cristãos e porque têm consciência de sua fraqueza e da insuficiência de seus esforços. Ficamos felizes por encontrar em nosso movimento de espiritualidade conjugal casais que crêem no ideal do matrimônio cristão e querem • Permanecer fiéis aos compromissos de seu batismo; • Colocar o Cristo no centro de suas vidas; • Fazer do Evangelho o fundamento de sua vida conjugal e familiar; • Procurar conhecer melhor a vontade de Deus sobre o homem e a mulher, para cumpri-la; • Testemunhar, por sua vida, o amor de Deus; • Levar ao mundo a mensagem de Cristo; • Dar testemunho dos valores cristãos em sua vida social e profissional; • Dar seu suporte ativo à Igreja, aos bispos e aos padres em nossas dioceses e paróquias; • Fazer de suas atividades uma colaboração com Deus e um serviço aos outros; • Promover o casamento e a vida de farm1ia na sociedade. 92
Então, o que estamos esperando para prosseguir em nossas casas o que começamos aqui? Damos graças por esses Estatutos e por este Movimento que nos permitem prosseguir em nossa vida de casal, no caminho bem conhecido do Amor, da Felicidade e da Santidade. Damos graças por todas essas equipes encontradas pelo mundo, preocupadas com o bem comum e com a correção fraterna, sempre prontas a dar suporte uns aos outros na dificuldade e a congratularem-se pela felicidade vivida.
6. A certeza de que o serviço e a responsabilidade levam a crescer na unidade Eles se reúnem periodicamente nos quatro cantos do mundo e põem em comum, partilham suas descobertas espirituais, oram juntos e trabalham pelo futuro de seu setor, de sua região, do Movimento. Formam uma verdadeira equipe que se reúne em espírito de serviço e de auxílio mútuo, que os caracteriza a todos e que é também o espírito de sua vida de casal. Eles aceitaram responder a um apelo para servir seus irmãos por um tempo e para vivenciar a colegialidade entre eles, porque, mais do que um método, para as Equipes de Nossa Senhora é um estado de espírito que vivenciamos, para juntos encontrarmos a vontade de Deus. O serviço é um meio eficaz e profundo para ter em conta o máximo de riquezas de cada um e de levar a crescer, da melhor forma CM414
possível, os talentos que temos, para manifestar com força à luz do dia a beleza do matrimônio cristão e da fanu1ia, na escuridão do mundo. Sejamos os servos que dão a todos os casais, a todos os filhos e a todos os jovens da terra o desejo de viver a felicidade duradoura, fiel, livre e fecunda do matrimônio, que leva em conta a realidade do que vivenciam todos os casais. O serviço e a responsabilidade partilhados num exercício de verdadeira fraternidade são realmente o dinamismo missionário de nossos casais, de nossas fanu1ias, das equipes e da Igreja. Viemos de todos os horizontes da terra, nossas culturas são diferentes e, no entanto, somos habitados por um mesmo Espírito e uma mesma espiritualidade. Nossos encontros nos levam a melhor nos conscientizarmos de que o carisma das Equipes de Nossa Senhora, a espiritualidade conjugal, é um dom de Deus. Nossa fidelidade pessoal e coletiva a este carisma, mais do que grandes discursos, são a fonte de nossa unidade vivida hoje ao serviço da universalidade. Damos graças pela vida de equipe, de nossa equipe de base, daquela que nos iniciou no serviço do Movimento, da equipe França com a qual servimos durante vários anos e desta equipe a serviço da vida internacional. Damos graças pela energia dedicada por muitos para responder ao apelo do Senhor, que nos convida a segui-lo e a arrastar atrás de nós todos aqueles que estão apaiCM 414
xonados por transmitir a boa nova do casamento.
1· A vida em lgreja e com a Jgreja, a vida no mundo e com o mundo ... Eles participaram dos grandes acontecimentos de nossa Igreja: Pentecostes 98,jubileu do ano 2000, Stuttgart 2004, Valência 2006 e muitas outras ocasiões de encontro. São testemunhas da amizade que nos une a nossas amigos de outros movimentos católicos de apostolado dos leigos e da fanu1ia, da fé que nos une a nossos irmãos de outras Igrejas cristãs, Protestantes, Anglicanos, Ortodoxos. Eles se emocionam ao partilhar conosco seu humilde e discreto trabalho naquele bairro pobre, naquelas favelas, no campo de refugiados ou ainda ao evocar o cuidado delicado daquele casal para uma senhora idosa que vive na solidão. Estão, junto com outros equipistas, engajados na política, nas associações civis ou sindicais, para tentar transmitir, por seus atos, os valores cristãos que os animam; seria uma longa lista ... A dádiva da vida em movimento é formada por todos esses encontros fraternos com o outro, nosso próximo. É o nosso engajamento na vida da Igreja, em nossa paróquia, em nossa diocese, no lugar onde vivemos; são ainda todos esses testemunhos que todos nós damos, na nossa vida social, profissional, humana, eclesial. Nossa riqueza de engajamento em movimento o transforma numa 93
sementeira de homens e mulheres presentes em todas as frentes e disponíveis, na discrição, para pôr seus dons ao serviço dos outros, vendo no rosto do próximo o rosto de Cristo, por vezes dilacerado pela dor da cruz. Damos graças pela acolhida dada pelos outros movimentos cristãos, católicos, protestantes, ortodoxos, anglicanos e por todos os que na Igreja exercem um serviço ou uma responsabilidade. São os aguilhões para que nos amemos mais corno cristãos.
8. A oração pelas vocações Sentado geralmente na ponta da mesa, ele fala por sua vez, corno todos os demais equipistas; ele está presente em todas as reuniões familiares da equipe. Ele também está presente na equipe de setor e em todos os demais escalões de serviço das Equipes: o Sacerdote Conselheiro Espiritual. Sua presença se origina no primeiro encontro do Padre Caffarel com os jovens casais que vieram interrogá-lo. A justa razão de seu papel na equipe decorre da intuição de que os sacramentos de Matrirnônio e da Ordem têm algo em comum e algo a se dar mutuamente em profundidade. Nossas farrn1ias são um lugar de transmissão dos chamados ao sacerdócio e à vida consagrada, da mesma forma que ao casamento. Transmitindo aquilo que têm de mais caro, sua fé, os pais cristãos e particularmente os equipistas têm o dever de criar boas condições 94
para esse apelo do Senhor para a entrega da vida a Ele. Nós te damos graças por todos os Conselheiros Espirituais e por todos aqueles com quem cruzamos em todos esses anos. Por tudo o que recebemos. Neste dia em que festejamos o apóstolo Mateus, bendizemos-Te por aqueles que chamas para, seguindo a Cristo, se tornarem discípulos.
9· Conclusão Nós Te damos graças, Senhor, por tudo o que és em nossas vidas, na dos nossos amigos, Tu que nos chamas de teus amigos e que fazes de nós colaboradores na tua missão, Tu que fazes de nossos casais os cocriadores da humanidade, Tu que fazes de nossas equipes cadinhos para a construção da civilização do amor. Nós Te damos graças por aqueles que hoje chamas a prosseguir na tarefa iniciada por outros há mais de 60 anos, e por todos aqueles que, na penumbra, cumprem no dia-a-dia o serviço a seus irmãos. Nós te damos graças pelo dinamismo que dás a cada um para anunciar sem cessar o Evangelho do amor e do casamento. Virgem Maria, tu que nos acolhes aqui, em Lourdes, intercede junto a teu Filho Jesus e junto ao Pai por nós todos, por todos os que hoje assumem o serviço das Equipes e por todos os equipistas do mundo, para que as graças do rnatrirnônio e do sacerdócio os cumulem de felicidade e de paz. Gérard e Marie Christine de ROBERTY CM 414
EQUlPE MlSTA Foi uma graça muito especial termos participado do X Encontro Internacional das Equipes de Nossa Senhora, em Lourdes. Lourdes é um convite à oração, à meditação e ao encontro com Deus. Todo o ambiente de Lourdes é como uma fonte que vai derramando graças e nos transformando. Era nesse clima envolvente, após celebrações e conferências, que nos reuníamos em pequenas equipes. Quanta riqueza! Quanta espiritualidade! Quantas experiências diferentes, quantos testemunhos de vida! Podia-se sentir de maneira quase palpável a unidade do Movimento, pois, embora vindos de lugares diversos (Brasília, Ilha da Madeira, Lisboa, Porto Alegre, Salvador e Natal), buscávamos o mesmo ideal de vida. A reflexão sobre: •
a importância das equipes, comunidades vivas de casais, refletindo o amor de Deus.
•
Jesus Cristo, centro da vida cristã- que Ele seja realmente "o coração de nossa vida".
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o sacramento do Matrimônio - fonte e missão das equipes. "O Senhor fez do matrimônio um sacramento, ou seja, uma realidade humana habitada e trabalhada pela Caridade divina". (Pe. Caffarel)
•
vocação pessoal e compromisso - "não contentar-se apenas com um amor voltado para a própria felicidade, mas aberto aos outros".
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equipe, comunidade de Igreja- "onde vive um casal cristão, aí começa a viver a Igreja".
Mostrou-nos o quanto a partilha dos dons de cada um ajuda a enriquecer e aprofundar os temas sobre os quais refletimos: o que as equipes devem ser para si mesmas e em testemunho para a Igreja e para o mundo. Como destacou um casal da equipe: "Foi uma grande graça de Deus pertencer a este grupinho que o Senhor pensou". Podemos afirmar que os momentos vivenciados na equipe mista serviram para demonstrar o quanto podemos nos ajudar, conforme falou o Cardeal Arcebispo de Salvador, Dom Geraldo Majella Agnello, para uma verdadeira "conversão ao amor, à piedade e à misericórdia".
Clélia e Domingos Eq. Carta Mensal CM 414
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REUNlÃO MlSTA EM lOURDES Agradecemos a graça que Deus nos concedeu de participar do Encontro Internacional, num lugar abençoado e também pelo contato mais próximo com irmãos equipistas de lugares tão distantes. O fato de estarmos junto a tantas pessoas vindas de todas as partes do mundo demonstra o sentimento de pertença existente entre os peregrinos e a internacionalidade do Movimento, todos falando a mesma língua, observando os mesmos princípios e buscando o mesmo ideal: a espiritualidade conjugal. A nossa equipe mista era formada por cinco casais brasileiros e um casal português. Nela pudemos vivenciar a unidade através de nosso relacionamento pessoal com os casais que mesmo sem nunca nos termos encontrado, tínhamos a impressão de sermos amigos há muito tempo. Em tão curto espaço de tempo, criaram-se elos de amizade, confiança e solidariedade, permitindo testemunho de vida de cada um e a prática da entreajuda. O sentimento era de que estávamos com nossa equipe de base em Lourdes, tamanho nosso entrosamento. Quando estávamos em reunião, nem dávamos conta de quão longe estávamos de nossas casas. Ouvimos testemunhos importantes, como o de um casal que chegou ao hotel de madrugada, depois de muitos contratempos na viagem e se assustou com as acomodações, e até 96
pensou em trocar de hotel. No entanto, na primeira reunião mudaram de idéia, tal foi o acolhimento na equipe e por perceberem que todos estavam passando pela mesma dificuldade. O que pudemos tirar desta experiência é que, tendo Deus um propósito para cada um de nós, o nosso era encontrarmo-nos com aquelas pessoas especiais que marcaram nossas vidas. Destacamos especialmente o testemunho dos homens da equipe, todos afirmaram que o Movimento realizou mudanças em suas vidas, melhorando-os como pessoa, como esposo e como cristão. Todos demonstraram um profundo amor pelo Movimento e muita gratidão pelas graças recebidas em suas vidas. O momento de maior espiritualidade que vivenciamos em equipe foi a Via Sacra, realizada num local que nos fez lembrar o martírio de Jesus Cristo, como se estivéssemos presentes em cada momento de seu sofrimento. Em cada estação nosso sentimento era de que Jesus estava ao nosso lado. Uma reunião mista sempre permite a prática do acolhimento, oconhecimento de novas pessoas e a oportunidade de trocarmos experiências, enriquecendo com isso nossa caminhada. A experiência que vivemos em Lourdes foi extraordinariamente marcante. Carmem e João Fernando Baciotti CRR São Paulo Centro II CM 414
lOURDES, lUGAR DE PEREGRlNAÇÃO Todos gostamos de estar na casa da mãe. Lourdes atrai milhares de peregrinos todos os dias, que vão lá para encontrar-se com Maria e obter alívio para seus males corporais e espirituais. Respira-se em Lourdes um clima de paz, um ambiente familiar, impregnado de espiritualidade. "Sente-se" a presença da Mãe. Vê-se desfilar pelas ruas que levam à gruta todo tipo de pessoas, que falam as mais diversas línguas, que usam vestes próprias de suas regiões. Encontramos grupos reunidos em torno às mais di versas bandeiras. Passam os mais variados tipos de cadeiras de rodas, das mais simples às mais sofisticadas. Em frente à gruta das aparições há sempre um grupo numeroso de peregrinos em oração silenciosa, tendo, como fundo musical, o suave murmurar das águas do rio Gave. É ininterrupta a corrente de pessoas que passam em fila por dentro da
gruta de Massabielle e tocam emocionados suas paredes já lisas, sempre em oração. É contínuo também o afluxo de peregrinos às torneiras, donde jorra a água da fonte da gruta, da qual bebem, com a qual banham seus rostos e braços e enchem vasilhas para levar para casa. Há também piscinas apropriadas, onde os doentes, mas não só eles, podem banhar-se nas águas da gruta. Se não obtêm a cura de seus males corporais, os peregrinos partem de Lourdes renovados em sua fé e esperança, com muito mais serenidade e confiança, que se vêem refletidas em seus rostos. Este é um dos milagres de Lourdes, talvez o mais importante. Da casa da Mãe ninguém parte de mãos vazias. Maria acolhe a todos e tem uma palavra, um gesto de carinho de Mãe para cada uma ou cada um. Sola e Sérgio Croccoli Equipe da Carta Mensal
Deslocamento na Procissão Eucarística CM 414
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SESSÃO DE FORMAÇÃO lNTERNAClONAl DE lOURDES A dez minutos do Santuário de Lourdes está instalada a "Cité St. Pierre", local de realização da Sessão de Formação, que aconteceu de 21 a 24/09 de 2006. Por conseguinte começou no mesmo dia do encerramento do Encontro de Lourdes. Os participantes foram em número de 74 casais e 26 sacerdotes conselheiros espirituais. Descrevemos a seguir os nomes dos países que se fizeram presentes: Brasil, França, Espanha, Síria, Guatemala, Colômbia, Argentina, Costa Rica, Bélgica, Líbano, Canadá, Índia, Ilhas Maurício, Angola, Moçambique, Portugal, Togo, Congo, Inglaterra, Irlanda, Hungria, Alemanha, Itália, Estados Unidos, Austrália, Filipinas, Polónia, e Coréia. Ao todo 28 países. A abertura foi feita, na quintafeira, pelo novo casal responsável da ERI- Equipe Responsável Internacional -Maria Carla e Cario Volpini, que nos deu as boas vindas. Nesta mesma noite, tivemos ainda meditação e reunião de "equipes mistas" (por grupo de línguas: portuguesa, inglesa, francesa, e espanhola). Toda a parte litúrgica foi preparada pelo casal Silvia e Chico - casal ligação da ERI junto a SuperRegião Hispano-América- que con98
tou com a ajuda do casal colombiano Sílvia e Andrés Merizalde. Foi um dos pontos altos da Sessão. Dentro da dinâmica utilizada, os dias de sexta, sábado e domingo foram destinados respectivamente a "o caminho", "a verdade" e "a vida" e, aconteceram celebrações eucarísticas todos estes dias. Queremos esclarecer que durante todo o encontro houve tradução simultânea para as quatro línguas já referidas acima. As palestras foram didáticas e de grande profundidade para o aprendizado de todos nós. Na sexta-feira Maria Carla e Carl o Volpini nos falaram sobre "Enviados para servir", e aqui descrevemos um trecho: O serviço é muitas vezes motivo de incompreensão: às vezes gastamos o nosso tempo e as nossas energias para planejar coisas que vamos oferecer com o entusiasmo e com a certeza de que a resposta daqueles CM 414
que acolherão as nossas propostas nos recompensarão de todo trabalho ... mas isto nem sempre acontece ... Porém não é este o autêntico espírito do serviço ... somos nós que temos que compreender e procurar entender as verdadeiras necessidades e os reais estados de espírito dos que estão perto de nós. Neste mesmo dia, dentro do grupo formado pelos que falam a língua portuguesa, ti vemos a intervenção do casal Sílvia e Chico nos falando sobre "Viver o serviço" do que destacamos alguns tópicos: Quando somos convocados a um serviço nas ENS, cremos que as pessoas comuns como nós, geralmente se assustam ... mas o Senhor só quer o nosso coração e isto está ao nosso alcance fazê-lo ... Não podemos cumprir o nosso papel de casal servidor sem exercitar a fé e a humildade... Obviamente, faz parte do serviço propor objetivos, perseguir resultados, fazer pensar e realizar. Não podemos servir ficando apenas de braços cruzados ... No sábado tivemos a palestra do Padre Fleischmann, sacerdote conselheiro espiritual da ERI, que nos falou sobre "O carisma fundador das ENS segundo o padre Henri Caffarel". A seguir algumas citações: No plano espiritual, a meta número um proposta pelo Padre Caffarel aos casais do movimento é a união em Cristo ... O padre Caffarel, ao fundar as ENS, colocou a reflexão sobre o sacramento do Matrimónio no centro da espiritualidade dos casais ... Na parte da tarde deste mesmo dia, tivemos palestras (testemunhos) CM414
de quatro casais regionais das seguintes SR: Super-Região Brasil, Super-Região França, Super-Região Transatlântica e Super-Região Hispano-América, que falaram de suas experiências de vida na prestação de serviço ao movimento, especialmente como casal responsável regional. A conclusão de todos é a de que servir a Deus é gratificante e compensador, as graças alcançadas são de grande valor. No domingo tivemos a palestra do ex-casal responsável da ERI-Gerard e Marie Christine de Roberty, que nos falou sobre "O exercício da colegialidade nas ENS". Em seguida alguns tópicos: A colegialidade é, antes de tudo, um estado de espírito mais que um método ... o processo de decisão deve ser entendido como uma reflexão que conduza à discussão e não como um simples debate de opinião ou comunicação .... Durante a Sessão de Formação tivemos também momentos para reflexão, adoração e dever de sentarse. As reuniões de "equipes mistas" aconteceram todos os dias e foram proveitosas ocasiões de conhecimento e troca de experiências com casais das mais diversas partes do mundo. No encerramento tivemos o envio, seguido do almoço e a consciência de que todos saíram dali abastecidos com tudo o que se viveu nestes dias e dando glória a Deus pela oportunidade de participar de tão belo evento. Eneida e Álvaro Eq. 01/B - N. S. Auxiliadora Fortaleza- CE acorreia@secrel.com.br 99
CARTA DE lOURDES Da Equipe Responsável aos Equipistas do Mundo Inteiro Queridos Equipistas: Ao término do 10° Encontro Internacional que vivemos em Lourdes, com fervor, na alegria e na fé, em união com os nossos equipistas para junto dos quais voltamos, confiamo-vos pessoalmente uma mensagem que o movimento das Equipes de Nossa Senhora vos pede que leveis aos quatro cantos do mundo. As Equipes de Nossa Senhora oferecem aos nossos casais a possibilidade de viverem a espiritualidade conjugal, que decorre do sacramento do Matrimônio e nos ajuda a percorrer o caminho da santidade. As Orientações de Vida nos foram confiadas para desenvolver esta espiritualidade, que nos abre a todas as realidades da nossa vida de casal, segundo o Espírito, em Cristo e na procura constante da vontade de Deus.
As Orientações de Vida, fruto do discernimento dos casais regionais do mundo inteiro, são um dom que o Senhor oferece a cada Equipe, a cada Setor, a cada Região, ao Movimento .. . para que cada um dos seus membros aprofunde a sua vocação cristã, numa atitude evangélica, que encarna em cada casal unido no sacramento do Matrimônio e também, na experiência dos padres consagrados pelo sacramento da Ordem, em cada conselheiro espiritual. 100
As Orientações de Vida são um apelo a abrirmos o nosso coração e a nossa existência quotidiana a uma dimensão espiritual que tem a sua origem no coração de Deus e que nós fazemos atuar no amor ao próximo e, ainda, que faz das nossas ''EQUIPES DE NOSSA SENHORA COMUNIDADES DE CASAIS, REFLEXOS DO AMOR DE CRISTO". A orientação geral inspira-se nesta palavra do Evangelho:
"Como Eu vos amei, amaivos também uns aos outros" (Jo 13,34). Esta Orientação geral apoia-se em três idéias: 1. Equipe, comunidade de lgreja
«Como Tu, Pai, estás em Mim e Eu em Ti, que eles estejam em Nós» (Jo 17,21)
Em equipe para iluminar e fortalecer a nossa experiência cristã, graças a essa comunidade de Fé, de Esperança e de Amor Os equipistas têm o desejo de redescobrir a equipe, enquanto comunidade de leigos na Igreja, como um lugar de iniciação e de "refontalização", orientado para o apelo à santidade dirigido aos casais. O amor fraterno dos equipistas, de que a entreajuda é expressão, CM 414
alarga-se à dimensão da Igreja universal, através dos seus compromissos eclesiais. Alarga-se também à dimensão da sociedade, através dos seus compromissos sociais e políticos. A unidade dos casais, na Fé, na Esperança e no Amor, enraíza-se numa forte vida espiritual conjugal e pessoal, alimentada no seu "agir cristão" pelas orientações do Movimento.
Em equipe para viver a fidelidade aos carismas das Equipes de Nossa Senhora Não há vida de equipe, como comunidade de Fé, de Esperança e de Amor, sem fidelidade a um compromisso, para cujo crescimento contribui sobremaneira a prática de CM 414
uma espiritualidade conjugal viva e radiosa. O Movimento considera que a equipe é a comunidade essencial em que se vive a espiritualidade do casal. Os métodos que as Equipes de Nossa Senhora propõem nos conduzem à procura do SER, mais do que do FAZER. Desta forma, levamnos a dar um verdadeiro sentido evangélico à nossa vida de casal. Para cada equipista, a plena adesão à Carta das Equipes de Nossa Senhora supõe a aceitação da exigência dos Pontos Concretos de Esforço e o esforço para pôlos em prática. São pontos de referência, apoios que obrigam a ir mais longe no caminho da santidade na vida dos casais. 101
As nossas equipes não são meros lugares de amizade: são, antes, verdadeiras comunidades de homens e mulheres de fé, unidos pelo sacramento do Matrimônio e reunidos por Cristo. Elas privilegiam a qualidade e o conteúdo da partilha espiritual. Esta partilha ajuda-nos a viver de maneira autêntica a vida comunitária: o acolhimento do amor do Pai, a comunhão em Cristo e a missão para a qual o Espírito Santo nos envia. A refeição fraterna, o tempo do pôr em comum, a oração partilhada e meditada, o tempo de formação a partir de um tema espiritual, tudo isto contribui com peso igual para "bem viver" o tempo forte mensal da Reunião de Equipe, na qual acolhemos Jesus Cristo como nosso irmão. A oração diária do Magnificat aumenta a comunhão entre todos os equipistas do mundo.
Equipes de Nossa Senhora ao serviço
2.
«Aquele que permanece em Mim e Eu nele produz muito fruto» (Jo 15,5)
Os equipistas ao serviço dos seus irmãos no Movimento Viver as Equipes de Nossa Senhora como um "serviço dos casais aos casais". Pôr-se ao serviço do Movimento é uma necessidade real: isto faz de nós servidores do casal, da família, do Evangelho, do matrimônio e da vida. A caridade não tem limites: motiva os nossos compromissos no Movimento das Equipes de Nossa 102
Senhora, que são serviços de Igreja. Assim, passamos a ser instrumentos do Espírito Santo e experimentamos, em nós e no nosso casal, a presença ativa do Senhor. Ele conhece as fraquezas e os limites daqueles que aceitam segui-Lo, mas dá a cada um a capacidade de realizar a sua missão. É bom recordar as palavras do Padre Caffarel: "As Equipes respondem às necessidades do nosso tempo para o casal e para o matrimônio, e, para isso, precisamos de casais que se amem, que criem a imagem da família e da sociedade e que se comprometam ao serviço do Movimento".
Os equipistas ao serviço dos seus irmãos na Igreja hoje A Orientação de Vida dada em Santiago de Compostela no ano 2000 - "Ser casal hoje na Igreja e no mundo"- convida-nos a participar na obra da evangelização, através do nosso compromisso na Igreja, nos seus movimentos, nas nossas paróquias, nas nossas dioceses etc. Devemos, juntos, procurar métodos novos para que as equipes e os equipistas se comprometam ainda mais na Igreja. As propostas e as instruções do documento sobre "A missão do casal" devem ser estudadas neste sentido por cada um e em equipe (A missão do casal nas Equipes de Nossa Senhora ERI, julho de 2005). Tenhamos uma atenção especial às nossas relações com os conselheiros espirituais. Rezemos para que nas nossas famílias nasçam vocações CM 414
sacerdotais e religiosas. E que o nosso movimento continue a ser um viveiro para o diaconato permanente. Dizia o Padre Caffarel: «É preci-
so inventar dia a dia o Movimento das Equipes de Nossa Senhora». 3· Para os casais de hoje, Equipes de Nossa Senhora acolhedoras
«Quem recebe aquele que Eu enviar, a Mim recebe, e quem Me recebe recebe Aquele que Me enviou» (Jo 13,20)
Testemunhas no nosso tempo de uma fidelidade alicerçada no Evangelho Seria vantajoso que as Equipes de Nossa Senhora, deste início do século XXI, escutassem as palavras que o Padre Caffarel proferiu em Chantilly, em 1987: "As Equipes de
Nossa Senhora não tiveram suficientemente em conta o fato de que a espiritualidade evolui consoante a idade dos casais e consoante a situação em que os mesmos se encontram".
Devemos tomar todas as iniciativas necessárias para ajudar os equipistas e o Movimento a poremse à escuta das necessidades do nosso tempo, a aprenderem a comunicar e a dialogar acerca da espiritualidade conjugal e familiar. De ouvidos e olhos bem abertos a tudo o que se passa no mundo, atentos àquilo a que algumas pessoas chamam "a profecia do mundo", receptivas ao que vem de Deus, a fim de receber e de valorizar o que é bom, assim são as Equipes de Nossa Senhora. Elas prosseguem e intensificam as suas investigações sobre todos os aspectos do matrimónio, em particular sobre o seu caráter sacramental. Acolhamos a realidade de vida de irmãos e irmãs viúvos e viúvas. Procuremos também a forma de nos fazermos próximos daqueles que se vêem confrontados com a crise, com o fracasso do casal; abramos o coração e tomemos iniciativas para que nasçam e se desenvolvam grupos ou movimentos específicos que respondam às novas situações desses casais. Apoiemos os casais que uma crise ainda não separou totalmente e que ainda podem assumir compromisso por um caminho de "reencontro".
A pedagogia das Equipes de Nossa Senhora deve exprimir-se numa linguagem atual, que tenha em conta os sinais dos tempos. Compete-nos a nós inculturá-la, sem tornála insípida, simplificá-la, adaptá-la à idade e à duração dos casais, permitindo aprofundá-la sem que ela perca a sua essência. Trata-se de um caminho de felicidade tanto humana como espiritual.
Testemunhas encarregadas de difundir a espiritualidade conjugal e de apresentar o sacramento do Matrimônio às novas gerações
Testemunhas do Evangelho do matrimônio anunciado a todos
É nossa preocupação constante uma atenção particular aos jovens: a nossa atenção aos que se encon-
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tram afastados da Igreja, aos que se reaproximam, aos que não conhecem Cristo e o Evangelho, àqueles para quem o matrimônio não tem um significado claro e essencial, tudo isso mostra que estamos ao serviço da Boa Nova do amor entre o homem e a mulher e encarregados de a levar ao mundo. São muitos os aspectos em que podemos favorecer a descoberta do mistério do amor humano no seu alcance espiritual: o perdão, a caridade, a escuta, o dom recíproco, a gratuidade o compromisso etc. M1fmemos que o matrimônio é um caminho de felicidade, onde o amor é incessantemente renovado, que o diálogo conjugal e a partilha em equipe ajudam a conhecer-se melhor, a abrir-se ao outro e a recebê-lo como um dom, acolhendo assim o imprevisto de Deus. A aliança entre o homem e a mulher, reflexo do amor de Cristo pela sua Igreja, é o cerne da espiritualidade e da vocação conjugal. Essa aliança conf1rma o próprio amor dos esposos e o seu compromisso incondicional no matrimônio sacramental. As Equipes de Nossa Senhora querem levar à descoberta de que o casal é amado por Deus, de que é dom de Deus e de que se dá a Deus.
Em conclusão Escutamos e pomos em prática a mensagem do Papa João Paulo II, de 20 de Janeiro de 2003, quando ele: • nos convida a retomar a herança do Padre Caffarel relativa à grandeza e à beleza da vocação 104
para o matrimônio, ao apelo à santidade, ligado à vida conjugal e familiar, à espiritualidade própria dos casais, • nos compromete a viver pontos concretos de esforço, com atenção e perseverança, em particular a oração pessoal, conjugal ou familiar, e a participação regular na Eucaristia, • nos reafirma a sua proximidade espiritual em relação às pessoas separadas , divorciadas e divorciadas recasadas que, em virtude do seu batismo, são chamadas, no respeito pelas regras da Igreja, a participar na vida cristã, • nos pede que desenvolvamos plenamente a graça do nosso batismo nas missões que nos são próprias, que participemos de forma cada vez mais ativa na vida da Igreja junto aos jovens, nomeadamente nos períodos de noivado e dos primeiros anos de casamento, • nos encoraja a dar sem cessar testemunho da grandeza e da beleza do amor humano. Na Paz de Cristo e sob a projeção de Maria! A Equipe Responsável Internacional: Gérard e Marie-Christine de Roberty, Mons. François Fleischmann, Cario e Maria Carla Volpini, John e Elaine Cogavin, Carlos Eduardo e Maria Regina Heiss, Francisco e Maruja Nemesio, Jean-Louis e Priscilla Simonis Lourdes, 18 de Setembro de 2006 CM 414
Meditando em Equipe Dezembro é o mês de celebrar outra importante festa litúrgica : o Natal. O nascimento do Salvador evoca diversas atitudes, a exemplo de Maria e de José: fé na Palavra de Deus, disponibilidade no cumprimento do desígnio de Deus, obediência consciente ao plano de salvação e, enfim, confiança em Deus.
leia o Evangelho cle Mateus
1,18-2 5
Sugestões para a meditação: 1. Como o casal poderá traduzir em suas vidas as atitudes de Maria e de José? 2. Como criar estas atitudes na própria família? 3. Como o casal cristão poderá aliar a sua vida espiritual ao seu compromisso de ser agente de transformação do Reino de Deus no mundo? 4 . Como Nossa Senhora pode iluminar a celebração da festa do Natal, evitando a perda de seu sentido religioso?
................................................... Oração litúrgica (Salmo 22/23)
O Senhor é meu pastor, nada me falta . Em verdes pastagens me faz repousar. Para as águas tranqüilas me conduz e restaura minhas forças; ele me guia por bons caminhos por causa do seu nome. Ainda que eu caminhe por um vale tenebroso, nenhum mal temerei, pois estás junto a mim; teu bastão e teu cajado me deixam tranqüilo. Diante de mim preparas uma mesa, à frente dos meus opressores; unges minha cabeça com óleo, e minha taça transborda . Sim . Felicidade e amor me seguirão todos os dias da minha vida; minha morada é a casa do Senhor por dias sem fim .
Participaram do X ENCONTRO 1NTERN.AC10N.Al DAS ENS
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África de língua francesa: 154 Alemanha e outros países de língua alemã : 37 346 América hispânica: 104 Bélgica : 1714 Brasil: 17 Canadá : 30 ERI: 1046 Espanha : 2799 França/Luxembu rgo/Suíça : 49 Ilha Maurício: 15 Índia : 49 Irlanda: 707 Itália: 18 Líbano: 37 Ocean ia: 66 Polônia : 661 Portugal: 47 Síria: 124 E.U.A.: 83 Transatlântico : 8103 Total: dos quais 450 padres, 3 cardeais e 12 bispos
Equipes de Nossa Senhora Movimento de Espiritua lidade Conjugal R. Luis Coel ho, 308 • 5° andar, cj 53 • 0 1309-902 • São Paulo - SP Fone: (Oxx11) 3256 .1212 • Fax: (Oxx11) 3257 .3599 secretariado@ens.org .br • cartamensal@ens .org.br • www.ens .org.br