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nº 13 | mar/07 | R$ 7,90
ESTADUAIS O que acontece quando é pequeno contra pequeno
COPA PELÉ Beckenbauer já jogou no Canindé. Sério!
• Violência na Itália • Brasileiros em outras seleções • Francesco Totti • Clubes de torcedores • Ronald de Boer editora
P O O L
nº 13 | mar/07 | R$ 7,90
E MAIS...
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“No Brasil não jogo mais” Rei na Espanha e magoado com as críticas, Roberto Carlos diz que só volta ao país para ser técnico 2/28/07 3:20:39 PM
Espere o Inesperado Como fazer uma chuteira para alguém que, com um único toque, desafia a lógica, a física e os 11 jogadores do time adversário? É preciso entender todos os seus desejos e seguir à risca suas especificações. O resultado é a combinação perfeita de um couro extremamente macio com uma ampla área de contato com a bola. E outro detalhe importante são suas travas com textura, que facilitam o controle de bola no melhor estilo futsal. Bem-vindo à Nike Tiempo Ronaldinho. Experimente o Inesperado no Nikefutebol.com
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índice Entrevista: Roberto Carlos fala sobre Real Madrid e Seleção Brasileira Estaduais: Como são os jogos que envolvem apenas equipes pequenas Brasileiros naturalizados: Já virou hábito ver brasucas em outras seleções História: Copa Pelé, a competição que trouxe Beckenbauer e Paolo Rossi
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Stringer/Reuters
Crise na Itália: Por que a temporada 2006/7 deve ser esquecida Curtas Opinião Jogo do mês Peneira Tática Clubes de torcedores Entrevista: Ronald de Boer Chineses no Brasil Capitais do futebol Entrevista: Francesco Totti Embaixadas Negócios Cadeira cativa E se... Cultura A Várzea
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editorial O que (não) é sério Menos de 3 mil pessoas assistiram a uma das semifinais da Taça Guanabara. O número é baixo até mesmo para um jogo entre dois times pequenos, embora tradicionais. No dia seguinte, com ingressos a R$ 40, 23 mil viram o Flamengo, mais uma vez, passar pelo Vasco, para chegar à final do torneio. Mais simbólica que essas duas cifras, talvez só a imagem de Eurico Miranda bradando nos corredores da federação fluminense: “A federação é minha!” Quem assiste ao campeonato que essa federação organiza não acha difícil de acreditar. Em São Paulo, o presidente da federação apoiou um dos lados na eleição do Palmeiras. E perdeu. Continua, porém, comandando o futebol do Estado e o campeonato disputado por seu clube. Assim é nas federações dos maiores estados, e é difícil não imaginar que possa ser igual em tantas outras. Enquanto isso, com a Copa do Brasil e a Libertadores, começa de fato a temporada futebolística. Ainda há entre os jornalistas da velha guarda quem vocifere contra os “times mistos” que tomam conta dos estaduais. “ O torcedor do Flamengo gosta de ver jogo com o Vasco, não com o Maracaibo!”, bradam. Estranhamente, a partida contra o Maracaibo, que não decidia nada, encheu mais do que o contra o Vasco, que dava vaga em uma final. Nosso futebol vive nas trevas por causa de seus políticos. A apatia do torcedor, é claro, ajuda muito. A falta de qualidade de parte mídia dá um verniz de seriedade ao que não pode ser sério. Assim vamos vivendo.
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www.trivela.com Editor Caio Maia Reportagem Carlos Eduardo Freitas Cassiano Ricardo Gobbet Leonardo Bertozzi Ricardo Espina Tomaz Rodrigo Alves Ubiratan Leal Colaboradores André Pase, Gustavo Hofman, João Tiago Picoli, Marcus Alves, Matthew Smith, Mauro Beting, Mauro Cezar Pereira, Mauro Donato, Oliver Birkner, Paulo Torres, Rafael Martins, Renate Krieger, Renato Andreão, Robert Mills, Victor Birner, Zeca Marques Foto da capa Frank Polich/Reuters Detalhe: Mauro Donato Projeto gráfico e direção de arte Luciano Arnold (looks@uol.com.br) Diagramação e tratamento de imagem s.t.a.r.t. (start.design@gmail.com)
Assinaturas www.trivela.com/revista (11) 3038-1406 Diretor comercial Evandro de Lima evandro@trivela.com (11) 4208-8213 Atendimento ao leitor contato@trivela.com (11) 4208-8181 Atendimento ao jornaleiro e distribuidor Pool Editora pooleditora@lmx.com.br (11) 3865-4949 Circulação LM&X - Alessandra Machado (Lelê) lele@lmx.com.br (11) 3865-4949 é uma publicação mensal da Trivela Comunicações. Todos os artigos assinados são de responsabilidade dos autores, não representando necessariamente a opinião da revista. Todos os direitos reservados. Proibida a cópia ou reprodução (parcial ou integral) das matérias e fotos aqui publicadas Distribuição nacional Fernando Chinaglia Impressão Parma Gráfica Tiragem 30.000 exemplares
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Curtas GOLS PEQUENOS
COPA AMÉRICA
O jornal alemão Hamburger Abendblatt descobriu o motivo para o Hamburg sofrer tanto para fazer gols nesta temporada. Segundo reportagem publicada no diário, constatou-se que as traves da AOL Arena são mais baixas do que as medidas estabelecidas nas regras do futebol. No estádio, cada travessão estava localizado a 2,39 metros do chão, cinco centímetros a menos do que o previsto. Desde a correção do problema – que coincidiu com a saída de Thomas Doll do comando da equipe –, o Hamburg ganhou as duas partidas que jogou em seu estádio, as primeiras vitórias em casa nesta temporada. Além disso, marcou seis gols – até então, em nove partidas, havia feito apenas sete.
A Conmebol realizou o sorteio dos grupos da Copa América, que será realizada de 26 de junho a 15 de julho, na Venezuela. O México será o primeiro adversário do Brasil, cabeça-de-chave do grupo B. O jogo contra os mexicanos será realizado em Puerto Ordaz, em 27 de junho. A Seleção fará suas outras partidas pelo grupo B em Maturín (contra o Chile, em 1º/julho) e Puerto La Cruz (Equador, 4/julho). Classificam-se para as quartas-de-final os dois primeiros colocados de cada grupo e os dois melhores terceiros colocados.
Eddie Keogh/Reuters
Grupo A Venezuela Bolívia Uruguai Peru
Grupo B Brasil México Equador Chile
Grupo C Argentina Estados Unidos Paraguai Colômbia
EXPORTAÇÃO DE VIOLÊNCIA Os barrabravas argentinos inovaram. Segundo reportagem do diário Olé, além de disseminar a violência em solo nacional, os “torcedores” resolveram agora exportar suas técnicas de brigas para outros países da América Latina. Pior: ganham dinheiro por suas “aulas”: torcedores de Colômbia e México já passaram pelo treinamento de extorsão a clubes e jogadores, além de receberem dicas de como obter recursos com venda inflacionada de ingressos. O pacote inclui ainda o fornecimento de alguns gritos de torcida adaptados aos clubes de cada país – isso sem contar a ajuda para a aquisição de armas.
frases “Todo treinador é um burro em potencial” Caio Júnior procura encontrar uma explicação para as vaias que recebeu durante o empate por 1 a 1 com o Bragantino, no Pacaembu.
“Foi esse burro quem salvou o Corinthians do rebaixamento, no último Brasileiro” Leão responde a torcedores do Timão que pediram sua saída após o empate por 1 a 1 com o Rio Branco, no Pacaembu.
“Podem usar a camisa para me atingir, porque não chegam a outro ponto” Dunga, sobre as críticas que a imprensa internacional fez à camisa que usou no amistoso com Portugal.
“Estou apenas numa fase de baixa autoestima. Tenho até visto DVDs com meus gols para recuperá-la”
“Não temo por mim, mas por minha família. Como posso trabalhar tranqüilo sabendo que eles correm perigo? Por isso, pedi para sair”
Pauleta, o maior artilheiro da história da seleção portuguesa, justifica seu jejum de gols.
Marquinhos, zagueiro do Corinthians, fala sobre os motivos que o levaram a deixar o clube, após cometer um erro no clássico contra o São Paulo. Diz ele que recebeu ameaças de morte, por conta da falha no segundo gol Tricolor.
“Ronaldo não está gordo. Ele tem uma estrutura larga e músculos grandes” Ao menos é essa a visão de Carlo Ancelotti, treinador do atacante no Milan.
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Divulgação
NO ALTO DO MORRO A seleção peruana estuda uma forma de contar com uma ajuda da natureza para se classificar para a Copa de 2010. A seleção pretende mandar seus jogos pelas eliminatórias da na cidade de Cuzco, a 3,3 mil metros do nível do mar. Um dos defensores mais ferrenhos da idéia é Juvenal Silva, diretor de seleções da federação e também presidente do Cienciano. O clube foi responsável pelo título de maior expressão do futebol peruano, a Copa Sul-Americana de 2003. Normalmente, a seleção joga em Lima, mas raramente vence. Das nove partidas disputadas nas eliminatórias para 2006, venceu apenas três.
DESDE PEQUENINO O Blooming foi eliminado pelo Santos na fase preliminar da Libertadores, mas deixou o torneio com um recorde. No confronto de ida, em 31 de janeiro, o clube boliviano escalou Diego Suárez, de apenas 14 anos – nasceu em 7 de outubro de 1992. Suárez, que teve pela frente a missão de marcar Zé Roberto, deixou o gramado aos 8 minutos do segundo tempo. A marca anterior havia sido estabelecida em 12 de fevereiro de 2004, quando Sergio Agüero, do Independiente, enfrentou o Cienciano com apenas 15 anos.
por Renate Krieger Pouca gente notou a atuação minguada de Vikash Dhorasoo na Copa. No entanto, sete meses depois da derrota da França na final, o ex-meia do Lyon começou a fazer barulho com o filme “Substitute”, nas salas francesas desde meados de fevereiro. Preterido pelo técnico Raymond Domenech durante o Mundial, Dhorasoo aproveita o longa de 70 minutos para criticar indiretamente o ex-mentor. “Substitute”, iniciativa do músico e jornalista Fred Poulet, amigo do jogador, foca o “impedimento” de Dhorasoo durante o Mundial – ele defendeu a equipe francesa durante apenas 16 minutos. Entretanto, não é um filme sobre futebol, nem fala da chegada da seleção francesa à final. A proposta inicial de Poulet era rodar cenas do cotidiano de Dhorasoo na Copa. “Depois, vamos ver no que vai dar”, diz o diretor, na primeira cena do filme, enquanto explica o funcionamento de uma Super 8 ao jogador. Nos minutos iniciais, dá-se o tom da narrativa: cada um filma a si mesmo, mas também filma ao outro nos encontros furtivos durante os quais Dhorasoo entrega as fitas a Poulet. Relegado ao papel de coadjuvante na equipe, filma a si mesmo no hotel, na concentração, andando pelos corredores, nos aviões e nos ônibus, sempre com a concordIancia dos colegas. A imprensa francesa acolheu calorosamente a iniciativa (os jogadores e Raymond Domenech criticaram duramente o filme). “O fato de encontrar a voz que triunfa num filme destinado à ação, às feridas e aos combates é uma ótima lição de cinema”, diz o cineasta Christophe Honoré, na revista mensal So Foot. O treinador francês não opina sobre o filme, mas deixa claro o que pensa do jogador: “Talvez ele devesse aproveitar para mudar de carreira”.
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Albert Gea/Reuters
SEM IMPEDIMENTOS O PREÇO DAS CRÍTICAS Famoso por seu nacionalismo catalão, o meia Oleguer Presas, do Barcelona, criticou publicamente a forma como a Justiça espanhola trata a prisão de Iñaki de Juana, líder do grupo separatista basco ETA. Suas declarações pegaram mal, em um país em que atentados terroristas patrocinados pelo grupo ainda não fazem parte do passado. Com isso, a Kelme, empresa de material esportivo, rompeu o contrato de patrocínio qua mantinha com o jogador. Mesmo assim, a torcida barcelonista tem saído em defesa do jogador.
erramos Na edição de fevereiro, comemos algumas bolas. Eis as correções: Pág. 30 As quatro estrelas menores no distintivo do Internacional representam os três títulos brasileiros (1975, 76 e 79) e o da Copa do Brasil de 1992, e não o tetracampeonato brasileiro, como informado. Pág. 31 As duas estrelas amarelas sobre o escudo do São Paulo não são referentes às medalhas olímpicas de Adhemar Ferreira da Silva, mas sim aos recordes mundiais e olímpicos alcançados pelo atleta nos Jogos Olímpicos de Helsinque, em 1952, e no Panamericano de 1955, no México. Pág. 37 O Bayern de Munique conquistou quatro títulos da Liga dos Campeões, e não cinco, como está no texto. Pág. 64 O nome do Inter é Sport Club Internacional, e não Internacional SC, como deixamos passar.
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Denílson no Betis
Marcelo Del Pozo/Reuters
Transação mais cara da história até então, Denílson foi para o Betis em 1999, disputado a tapa por meia Europa. Pior para os espanhóis, que gastaram US$ 35 milhões por um jogador que não foi nem sombra do que prometia.
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Roque Júnior no Leeds
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Vampeta na Internazionale
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Renato Gaúcho na Roma
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Fábio Júnior na Roma
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Caio na Internazionale
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Kléberson no Manchester United
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Rodrigo Fabri no Real Madrid
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Geovanni no Barcelona
Uma experiência cinzenta no Milan não animou Roque Júnior a deixar a Europa. O zagueiro foi para o Leeds, onde jogou sete vezes, fazendo seu time tomar 25 gols. Apavorada, a torcida inglesa apelidou-o de “Roque Horror Show”.
Str Old/Reuters
Stefano Rellandini/Reuters
Depois de impressionar num jogo contra a Argentina, Vampeta foi para a Inter de Milão, por €15 milhões. Lá, virou motivo de chacota. Só não foi pior para os italianos porque a diretoria conseguiu trocá-lo pelo atacante Adriano, com o Flamengo.
Mais um que desembarcou em Roma cercado de expectativas, Renato foi comparado ao holandês Gullit. Na Série A, teve um desempenho risível, marcando zero vezes em 23 partidas. No fim da temporada, foi embora sem nenhum adeus.
Artilheiro da Copa Mercosul e vice-campeão brasileiro em 1998, Fábio Júnior desembarcou em Roma com expectativas que o davam por um “novo Ronaldo”. Na capital italiana, não deixou rastro e acabou sendo emprestado até seu contrato se encerrar.
Ian Hodgson/Reuters
“Destaque no pré-Olímpico? Vamos comprar!” Foi isso que a Inter de Milão deve ter pensado em 1996, antes de pagar US$ 5 milhões ao São Paulo por Caio. O impacto em San Siro foi nulo. Emprestado ao Napoli, ele também não emplacou e voltou ao Brasil.
Campeão do mundo em 2002, Kléberson aceitou uma proposta do Manchester United. Quando deixou Old Trafford, dois anos depois, era considerado a pior contratação de Alex Ferguson em seus 20 anos de clube, ao lado do “craque” Djemba-Djemba.
A Portuguesa queria vender a revelação do Brasileirão de 1996 para o La Coruña, mas o Real Madrid tinha um pré-contrato com o atleta e o levou por US$ 8 milhões. Sem jamais jogar no Bernabeu, Rodrigo Fabri está na lista de “micos” dos Merengues. Gustau Nacarino/Reuters
10 piores transferências de brasileiros para o exterior
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Em 2001, Sempre de olho em talentos brasileiros, o Barcelona veio ao país para tirar do Cruzeiro o atacante Geovanni, herói da conquista da Copa do Brasil do ano anterior. Pagou €15 milhões. Até hoje, devem agradecer os catalães na Toca da Raposa.
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Sócrates na Fiorentina
Ídolo no Brasil, tido como maior jogador do país ao lado de Zico, o “Doutor” deixou o Corinthians em 1984, frustrado com a derrota da campanha das “Diretas Já” para presidente. Pelo futebol que jogou na Fiorentina, parece que a frustração não tinha passado. Março de 2007
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Opinião
A (relativa) importância dos estaduais
hat trick
Mauro Cezar Pereira
VAMOS IMAGINAR O CALENDÁRIO próximo do ideal para o futebol brasileiro. Primeiro, a rápida disputa dos estaduais, entre meados de janeiro e março. Aí, já começou a Libertadores, e a Copa Sul-Americana está chegando, assim como a Copa do Brasil, novamente com a participação dos times classificados para a principal competição continental. Ainda em março, tem início o Brasileiro, com jogos nos fins de semana. Às terças, quartas, quintas-feiras, os demais torneios teriam vez e se desenvolveriam até o encerramento da temporada. Entre novembro e começo de dezembro, aconteceriam as três decisões, além das rodadas que fecham o Brasileirão. Só que não é assim. Os torneios internacionais espremem-se em um semestre cada, com o campeão nacional participando de ambos, uma insensatez. Também é disputada às pressas a Copa do Brasil, e ficamos, assim, com campeões em profusão nos primeiros meses do ano (os estaduais inclusive), e a segunda parte da temporada é destinada apenas ao Brasileiro, que, pelo formato, concentra o interesse em título em dois, três times, não mais. Além das questões políticas, existe outro problema, chamado campeonato estadual. Não defendo o fim desses torneios, afinal, o Brasil é mais de três vezes e meio maior do que a Espanha, por exemplo. Distâncias maiores geraram rivalidades regionais, e me parece sem sentido enterrá-las. Há quem goste, e não são poucos. Bons públicos em jogos locais vêm confirmando isso. Claro que
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O Fluminense era dirigido por Joel Santana até o fechamento desta edição. Nada contra o Natalino e seu jeito simples, simplório até. Ao contrário: ele faz bem ao dia-a-dia do futebol, nestes tempos de “professores” arrogantes, com seus discursos ocos e empolados. Os cartolas das Laranjeiras, porém, demonstram total falta de rumo, a ponto de tentarem técnicos com perfis distintos: Tite, Renato Gaúcho e, enfim, Joel. E o cartola Branco não se justificou.
os estaduais são grandes em demasia – o Paulista, por exemplo, tem praticamente o dobro dos participantes que deveria aceitar. Diante da falta de empenho dos cartolas em mudar tal cenário, o que fazer? Com o fim do mata-mata no Brasileiro, o torcedor acostumou-se à nova realidade, ou seja, sabe que o imponderável perdeu vez no nacional, e que só um elenco forte e estruturado pode chegar em primeiro nos pontos corridos. Tolice dizer que o título é disputado por uma dúzia de candidatos. Como em uma eleição presidencial, dezenas podem lançar seus nomes, mas, em geral, só dois duelam pra valer. Ao perceber isso, os fãs valorizam os estaduais, para muitos, a única chance do ano de gritar “é campeão”. No entanto, quem se prepara, de fato, para colocar em campo um grupo competitivo no Brasileiro não pode dar importância exagerada à competição regional, tomar decisões em função dos tropeços desse início de temporada. É preciso lutar pelo título local sem esquecer que as turbinas ainda estão sendo aquecidas para a parte mais torturante da maratona. Mais grave ainda é mudar os rumos devido a resultados em estaduais quando se está na Libertadores, um alvo incomensuravelmente maior. Conquistar um desses títulos, especialmente para os clubes com maiores ambições, tem gosto de aperitivo, que deve ser bem saboreado. Pode parecer banquete, quando um time menor levanta a taça. Não são competições que devamos valorizar demais, tampouco jogar no lixo.
O Flamengo reclamou da altitude de Potosí. É direito do clube protestar contra as condições desiguais impostas pelos 4 mil metros da cidade boliviana. Daí, porém, a cumprir a ameaça de não mais jogar acima de 1,5 mil metros vai uma distância abissal. É razoável, sim, apresentar relatórios médicos à Fifa, argumentando contra a disputa de partidas oficiais em cidades tão acima do nível do mar. Entretanto, não pisar no gramado é, claro, motivo para a eliminação imediata. O Boca Juniors tem em seu grupo três equipes que atuam “lá em cima” (Toluca, Bolívar e Cienciano). Se somarmos as altitudes das cidades que os Xeneizes terão visitado ao fim desta fase da Libertadores, teremos 9,7 mil metros. Se quer, mesmo, fazer bonito no torneio, o Flamengo tem que ir além das bravatas.
Steve McClaren já admite o retorno de Beckham à seleção inglesa. Símbolo da tentativa de renovação do English Team que o técnico ensaia desde que assumiu, após a Copa do Mundo, o ex-capitão pode virar salvação. O time se arrasta nas eliminatórias para a Euro-2008 e segue dependente de cruzamentos. Os ingleses perderam a chance de contar com alguém capaz de levá-los ao patamar que sonham alcançar quando não fecharam com Luiz Felipe Scolari. Como diz um amigo meu, “esse McClaren aí está no esporte errado”.
Março de 2007
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Capello e Robinho podem se ajudar FABIO CAPELLO BRIGOU COM EMERSON. Capello bri-
Caio Maia Futebol brasileiro
gou com Ronaldo. Capello brigou com Robinho. Capello é um italiano retranqueiro que não gosta de jogadores brasileiros porque os brasileiros jogam “futebol arte”. Você certamente já leu ou (mais provavelmente) ouviu isso. Deve ter ouvido, também, o outro lado: Fabio Capello é o maior técnico do mundo, ganhou tudo e, se os brasileiros não estão se dando com ele, o problema é dos brasileiros. Um time é o dos “brasucas sempre”, aquele que é capaz de dizer que o Fabão é melhor que o Cannavaro. O outro é o dos “antibrasucas”, os caras que, sabe-se lá por quê, preferem diminuir a importância de nossos jogadores e clubes e, quase sempre, acham que um nome como Rogério Ceni não é “de primeira linha” porque nunca atuou na Europa. Como em quase todas as questões, é provável que nenhum dos dois extremos esteja com a razão. Obviamente, Fabio Capello não é um idiota. Ganhou inúmeros títulos em sua carreira, alguns por equipes não tão cotadas, como a Roma de 2000/1. Esse time, aliás, prova o quanto é mentirosa uma outra tese, a de que Capello não gosta de brasileiros: foi campeão com nada menos que Antonio Carlos, Cafu, Lima, Marcos Assunção, Emerson e Aldair no elenco. A volta por cima de Ronaldo, porém, mostra que o “outro lado” pode ter um pouco de razão. Motivado, o atacante brasileiro sempre jogou bem e, embora não tenha mais a explosão do começo da carreira, ainda poderia render muito pelos Merengues, se Capello quisesse se dar
ao trabalho de apostar nele. Não quis. Com Robinho, porém, as explicações fáceis não funcionam tão bem. É fácil, por exemplo, constatar que o jogador chegou à equipe da forma errada, recebendo logo a camisa 10 e sendo comparado a Pelé – muito, para um jogador que havia brilhado no Santos, mas só isso. É também simplista dizer que Robinho atuava bem no Brasil porque as defesas, por aqui, são ruins. É só lembrar que a defesa do campeão espanhol e europeu é formada por Puyol e Rafa Márquez, para perceber que há nessa teoria um preconceito contra o futebol brasileiro. No Brasil, Robinho passou, sim, por uma fase de baixa, quando seus malabarismos ficaram manjados. Seu futebol, porém, evoluiu, e seus dribles, idem: ficaram mais objetivos e decisivos. De malabarista, passou a ser o principal jogador do time, aquele em quem dava para confiar sempre. A diferença, ao que parece, é apenas a confiança. No Santos, era incensado, justamente, por todos e tratado como jóia da coroa. No Real Madrid, precisa provar a cada partida que pode vestir a camisa merengue. Embora não seja mais um moleque, é compreensível que a mudança de situação mexa com sua cabeça. Aí, pode entrar a comparação com a situação vivida por Ronaldo, na equipe. Que Fabio Capello não esteja a fim de se dedicar a recuperar o “Fenômeno”, que tem 30 anos, joelhos suspeitos e um problema crônico de peso, vá lá. Que não dê a Robinho as inúmeras chances que deu a Cassano – que, além de nunca ter mostrado na Espanha o futebol exibido pelo brasileiro, tem uma atitude muito menos profissional – deve ser criticado. Do Real Madrid, Robinho não tem para onde ir sem “descer” na carreira. Deveria fazer de tudo para ficar e vencer. Tem contra si a arrogância da torcida e de uma mídia servil. O atacante tem recebido oportunidades, mas, por outro lado, tem sido obrigado a se adaptar a um esquema rígido, que não privilegia suas melhores características. Fabio Capello, embora extremamente competente, tende a ser “quadrado”, e o conceito de ter um jogador “livre” no esquema tático provavelmente não lhe “assenta” bem. O resultado disso, porém, pôde ser visto no “superclássico” diante do Barcelona: com liberdade, Robinho acabou com o jogo. Capello pode ser quadrado, mas definitivamente não é burro e entende muitíssimo de futebol. Deixar Robinho à vontade pode ser uma boa não só para o jogador, mas também para a equipe. Se não funcionar, perde-se muito pouco. Ou alguém vai dizer que o que está sendo feito agora está dando certo? Março de 2007
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Reconhecimento de paternidade
Mauro Beting
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UM PAI QUE NÃO RECONHECE O FILHO é drama para a vida. Um filho com vários pais é outro tipo de problema. É preciso conhecer para poder reconhecer. Por mais que meu exame de DNA dos campeonatos nacionais dos anos 50 e 60 mereça contestações, ele não é simplista – muito menos clubista ou bairrista. Apenas realista. Taça Brasil (1959-1968) é a mãe da Copa do Brasil – um torneio eliminatório, com representantes de todo o país. O Robertão (1967-1970) é o pai do Brasileirão – um campeonato de fato, quase sempre com regulamentos malucos, clubes igualmente convidados, mas, de um modo geral, com os melhores do país. A Taça Brasil só foi ter algo além do mata-mata nas duas últimas edições, com grupos nas fases preliminares – quando já dividia o calendário com o Robertão. O campeão da Taça Brasil de 1960, o Palmeiras, jogou só quatro vezes e foi para a Libertadores de 1961. O enorme Cruzeiro de 1966 fez apenas seis jogos e foi campeão. O Bahia de 1959 até que fez 14 partidas, playoffs incluídos, e venceu o Santos de Pelé. Foi um dos maiores campeões da história dos torneios nacionais, o grande vencedor do Brasil, em 1959. Porém, para este pária da sociedade, não é campeão brasileiro como o Bahia de 1988. Por casuísmo, já tivemos duplicidade de vencedores em outros anos, como em 1987, quando o Flamengo foi o campeão brasileiro de fato, e o Sport, de direito (ou o da CBF, reconhecido pela Conmebol). Em 1967, quando começou o Robertão, ainda existia a Taça Brasil. Em 1968, último ano de disputa, o Botafogo foi campeão de um torneio esvaziado, sem a presença dos paulistas. Eles preferiram jogar o Robertão: o pai legítimo, DNA reconhecido do Brasileirão que começaria em 1971. O Torneio Roberto Gomes Pedrosa foi o primeiro disputado em grupos, em ida e volta, e com caráter de campeonato, não de copa. Em 1967, 15 clubes de cinco Estados disputaram o campeonato vencido pelo Palmeiras; em 1968, o Santos foi o primeiro entre 17 clubes de sete Estados, divididos em dois grupos; em 1969, o Palmeiras voltaria a ser o melhor de um campeonato com o mesmo número de clubes e Estados participantes; em 1970, com os mesmos números e regulamento de 1969 e 1968, o campeão foi o Fluminense. Se Santos (pentacampeão da Taça Brasil, de 1961 a 1965), Palmeiras (campeão em 1960 e 1967), Bahia (1959) e Botafogo (1968) querem ser campeões “brasileiros” daquelas temporadas, o Criciúma de 1991 e o Juventude de 1999 também são campeões “brasileiros”, como vencedores da Copa do Brasil.
Nesta modesta opinião, não são. Não foram. Já o Palmeiras campeão do Robertão (em 1967 e 1969), o Santos (1968) e o Fluminense (1970) podem se dizer campeões brasileiros. De fato, de direito, de história. A Taça Brasil apontava o campeão do Brasil, o melhor do país, o representante brasileiro na Libertadores. Não se discute, nem quero desvalorizar o mérito daquelas conquistas. Só não se pode hipervalorizá-las. Elas não devem se equiparar ao Robertão e ao Brasileirão. Reconhecer todos como pais da criança é deixar órfã a história do futebol. É não educar corretamente nossos filhos. Essa é a opinião deste, que já virou bastardo por este texto.
Março de 2007
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Jogo do mês, por Ubiratan Leal
Pelé, Puskas e...
Marcelo a consagração do atacante tricolor, que, curiosamente, havia sido dispensado pelo clube da Gávea, em 2006. Sob o calor de Bangu, um dos bairros mais quentes do Rio de Janeiro, o Flamengo sentia o desgaste da viagem até Potosi, três dias antes, para a estréia na Copa Libertadores 2007. Sem ação, mesmo com a necessidade de virar, o time grande parecia o pequeno, vendo o adversário construir sua goleada. Em tarde esquecível de Bruno, Marcelo fez mais dois. Para o campeonato, o 4 a 1 final não mudou muita coisa. De fato, serviu apenas para colocar o Madureira na primeira posição do grupo, pois o Botafogo perdeu do Boavista, e o Flamengo se classificou mesmo com a derrota. Entretanto, o fato de um único jogador marcar quatro gols nos flamenguistas fará esse jogo ser lembrado por muito tempo. Naquela tarde em Moça Bonita, Marcelo tornouse o quarto jogador da história a marcar quatro vezes dainte do Rubro-Negro em uma única partida. Trata-se de um feito notável, ainda mais se for considerado que os outros três são Pelé (Santos 7x1 Flamengo, em 1961), Puskas (Honvéd 6x4 Flamengo, em 1957) e Russinho, artilheiro dos Cariocas de 1929 e 1931 (Vasco 7x0 Flamengo, em 1931). É uma lista de respeito, que contará para sempre um até então desconhecido atacante do Tricolor Suburbano.
MADUREIRA 4 FLAMENGO 1 Data: 17/fevereiro/2007 Local: Estádio Moça Bonita (Rio de Janeiro) Público: 2.871 pagantes Árbitro: Marcelo de Lima Henrique Gols: Marcelo (14min, 49min, 57min, 84min) e Renato (21min) Cartão amarelo: Valdir Papel MADUREIRA Everton; Wágner, Odvan, Léo Fortunato e Amarildo (Marcílio); André Paulino, Djair (Neto), Maicon (Osmar) e Zé Augusto; Marcelo e Valdir Papel. Técnico: Alfredo Sampaio
ficha
O
Madureira é o atual vice-campeão do Rio de Janeiro, e o jogo contra o Flamengo valia uma vaga nas semifinais da Taça Guanabara 2007. Ainda assim, a expectativa é de que seria mais uma vitória de um grande sobre um pequeno, no Campeonato Estadual do Rio. A previsão foi reforçada depois que a partida, marcada inicialmente para o Estádio Aniceto Moscoso, em Madureira, foi transferida para o campo “neutro” de Moça Bonita, casa bangüense. Pois um certo Marcelo tratou dar a esse jogo um lugar especial na história do futebol carioca. O quase anônimo atacante do Tricolor Suburbano abriu o marcador aos 14 minutos do primeiro tempo, aproveitando de cabeça a cobrança de escanteio de Vágner. Uma vitória tricolor, somada a um eventual sucesso do Botafogo contra o Boavista, em Saquarema, desclassificaria o Flamengo. Por isso, os rubro-negros partiram para o ataque. Demorou apenas sete minutos para o empate aparecer: uma cobrança de falta de Renato acertou o travessão, bateu nas costas de Everton e entrou. No intervalo, o placar de 1 a 1 mostrava que o jogo caminhava mais ou menos como esperado. Só que, aos 4 minutos do segundo tempo, Marcelo driblou três defensores flamenguistas, passou por Bruno e fez o segundo gol. Era a senha para a ruína rubro-negra e
André Coelho/Agência O Globo
Sob o calor de Bangu, o atacante do Madureira fez quatro gols no Flamengo, marca atingida por apenas outros três jogadores, entre os quais dois dos maiores craques da história
FLAMENGO Bruno; Leonardo Moura, Moisés, Ronaldo Angelim e Gérson Magrão (Léo Medeiros); Paulinho, Claiton (Souza), Renato e Juninho Paulista (Renato Augusto); Roni e Obina. Técnico: Ney Franco
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Peneira
Cavani:
exportação precoce
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enos de uma semana depois de terminar o Sul-Americano sub-20, o atacante uruguaio Edison Cavani era anunciado como novo reforço do Palermo. Durante a competição, seu nome ainda constava na lista de possíveis contratações de Juventus e Milan. A transação deu continuidade a uma ascensão muito rápida. Cavani profissionalizou-se em 2006, no Danubio, clube que revelou recentemente jogadores como o goleiro Carini, o meia Recoba e o atacante Chevantón. Mesmo disputando a titularidade com o colombiano Hamilton Ricard, o atacante nascido em Salto teve a boa marca de 13 gols em 30 jogos (média de 0,43 por partida) e ajudou seu time a conquistar o Apertura, no segundo semestre do ano passado. Isso foi suficiente para dar um lugar de titular ao atacante na seleção uruguaia, no Sul-Americano. Alto, habilidoso e oportunista, acabou ofuscando o colega Elias Figueroa, considerado antes do tor-
Nome: Edison Cavani Nascimento: 14/fevereiro/1987, em Salto (Uruguai) Altura: 1,84m Peso: 71kg Carreira: Danubio (2006) e Palermo
neio o atacante mais perigoso dos celestes. Os oito gols de Cavani ajudaram o Uruguai a classificar-se ao Mundial sub-20 e chamaram a atenção do futebol europeu. O fato de o ex-atacante Daniel Fonseca ser seu empresário ajudou na ponte para a Europa. No último dia do mercado de inverno, o Palermo anunciou que Cavani assinara contrato até 2011. Se a expectativa se confirmar, porém, é provável que, nessa data, ele esteja mostrando seu futebol em campos mais prestigiados. [UL]
(desde 2007)
Cahais:
líder aos 19 anos
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(desde 2004)
Fotos Leo La Valle/EFE
nos acréscimos da última partida. Apesar de ainda cometer falhas ocasionais – o que é normal, para um defensor inexperiente –, o boquense tem bom posicionamento na área e se impôs sem abusar da violência, no torneio realizado no Paraguai. Além disso, mostra desenvoltura e confiança no apoio ao ataque. Forte no jogo aéreo e dono de potente chute de esquerda, fez dois gols no Sul-Americano sub-20. O Boca Juniors acredita tanto no jogador que já o tem como titular da equipe adulta. Por isso, imagina-se que, em alguns anos, Cahais rume ao futebol europeu. [UL]
fichas
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atías Cahais ainda está devendo em seu clube, o Boca Juniors. Foi ele quem recuou mal a bola para Bobadilla e permitiu que Pavani fizesse o segundo gol – o decisivo – do Estudiantes, na final do Apertura-2006. Mesmo assim, o zagueiro já mostrou que é uma das melhores perspectivas para a defesa argentina, na próxima década. O jogador surgiu precocemente. Em 2003, aos 15 anos, foi titular da Argentina, no Mundial sub-17 da Finlândia. Era, ao lado do norte-americano Freddy Adu, o atleta mais novo do torneio. Desde então, o defensor sempre fez parte das seleções de base argentinas. No Sul-Americano sub-20, o jogador de 19 anos foi capitão da Albiceleste e tornou-se referência para o time, ao organizar a defesa e liderar o elenco, em um torneio tão complicado para os argentinos – que se classificaram para a Olimpíada
Nome: Matías Cahais Nascimento: 24/dezembro/1987, em Morón (Argentina) Altura: 1,82m Peso: 80kg Carreira: Boca Juniors
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Tática, por Cassiano Ricardo Gobbet
Alguém tem que ir para o
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emprego de Dunga à frente da Seleção Brasileira pode ter a pressão que for, mas uma coisa não dá para negar: sobram opções para quase todas as posições do meio-campo e ataque, e suas principais estrelas – Ronaldinho Gaúcho e Kaká – podem se entrosar tranqüilamente. O que faria Dunga, porém, se os dois jogassem exatamente na mesma posição? Pior: e se fora delas, eles mostrassem um futebol medíocre? Aquilo que é uma simples conjectura para Dunga – camisas à parte – é a maior dor de cabeça de Steve McClaren, técnico da seleção inglesa, que sofre uma pressão até maior do que a que a de seu congênere brasileiro. Dois dos nomes mais importantes da seleção – Steven Gerrard e Frank Lampard – são sofríveis quando atuam juntos, mesmo brilhando em seus clubes. O drama todo acontece porque os dois fazem questão de jogar na faixa central do meio-campo inglês – como fazem no Liverpool e no Chelsea –, onde nenhum dos dois precisa suar a camisa na marcação. Quando isso acontece, a defesa inglesa desanda completamente. A solução mais simples seria mandar um dos dois para o banco, para assegurar a presença de um homem de marcação à frente da defesa. Michael Carrick, do Manchester United, e Owen Hargreaves, do Bayern de Munique, mesmo sem serem geniais, dariam conta do recado. Só que Gerrard e Lampard são venerados pela imprensa britânica como se fossem Zidanes melhorados. Sem dúvida, são ótimos atletas, mas não conseguem coexistir. O técnico não é ajudado em nada pelo fato de o lateral-esquerdo Ashley Cole ter uma grande vocação ofensiva nem pela contusão de outro titular, o meia Joe Cole, também do Chelsea. Mesmo com todo mundo em campo, porém, o buraco fica indiscutivelmente na parte central, onde Gerrard e Lampard se esfalfam, não criam e marcam sem eficiência. Gerrard foi testado na meia direita, mas torceu o nariz. O antecessor de McClaren, Sven Goran Eriksson, e o atual comandante do English Team tentaram de tudo: jogar só com um atacante, com três na defesa, três no meio-campo, mas nada deu certo. O 4-4-2 é natural na seleção inglesa, e as alternativas só têm piorado a vida de McClaren – e da torcida –, uma vez que David Beckham está “barrado” pelo treinador. A veneração aos dois “queridinhos” da mídia é um desafio para McClaren. Se ele não bater o pé e botar um deles no banco, corre o risco de seguir decepcionando, como contra a Espanha (0x1), ou dando vexames, como contra a Croácia (0x2). Muita gente sente um cheiro de frigideira, e, hoje, não há nenhuma alternativa que sugira uma possível melhora dos ingleses, com Gerrard e Lampard como titulares.
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Crouch
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ME Joe Cole
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Lampard
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2. Inglaterra “ideal”
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V Carrick (Hargreaves)
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Lennon
G: goleiro / LE: lateral-esquerdo / LD: lateral-direito / Z: zagueiro / V: volante / ME: meia-esquerdo / MD: meia-direito / M: meia / A: atacante
banco
1. Inglaterra com Gerrard e Lampard
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Entrevista, por Carlos Eduardo Freitas
Bye, bye, Brasil Ídolo em Madri e ainda com mercado na Europa, Roberto Carlos diz à Trivela que, pelas críticas que recebeu após a Copa do Mundo, não pensa mais em voltar a jogar em seu próprio país
O
s números não mentem: Roberto Carlos é um dos maiores jogadores que vestiram a camisa do Real Madrid. Completou nesta temporada 10 anos na equipe e, recentemente, superou Di Stéfano como o estrangeiro que mais vezes jogou pelo clube. O próprio Roberto diz que não esperava ficar tanto tempo num mesmo clube. Em seu currículo com a camisa merengue, constam três Ligas dos Campeões, três Campeonatos Espanhóis e dois Mundiais de Clubes. Aos 33 anos, com tantas conquistas na carreira, o lateral-esquerdo está em contagem regressiva para pendurar as chuteiras e, depois, voltar para o Brasil. Isso mesmo: jogar em seu país, nunca mais. “Pode até ser que eu mude de idéia, mas pretendo encerrar a carreira na Europa”, conta Roberto, nesta entrevista exclusiva concedida à Trivela. O motivo? As críticas que recaíram sobre ele, após a derrota para a França, na Copa do Mundo de 2006, quando foi considerado o culpado no lance que resultou no gol de Thierry Henry – a famosa “ajeitada de meia”. “Não sei nem de onde inventaram isso, pois não devia nem estar ali... Só sei que o culpado sou sempre eu. Lembram da Copa de 1998, da bicicleta que eu errei”, desabafa. Roberto diz não querer mais saber da pressão com que convive há tanto tempo no Real Madrid e que sofreu nas 132 partidas que fez pela Seleção Brasileira. Agora, quer um pouco mais de tranqüilidade. Na conversa com a Trivela, o lateral-esquerdo conta um pouco dos bastidores daquele que se auto-intitula o maior clube do planeta. Fala sobre a época de Florentino Pérez e o início, meio e fim da era dos “galácticos”, que, segundo ele, colocaram o futebol em segundo plano, no Santiago Bernabéu. O jogador não foge de comentar a passagem de Vanderlei Luxemburgo pelo clube. “Se ele tivesse chegado uns três ou quatro jogos antes, teríamos sido campeões”, diz.
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Depois de tantas vitórias, sua última partida pela Seleção foi uma derrota. Você gostaria de ter uma oportunidade de mudar isso? Queria ter me despedido da Seleção com o título mundial. Só que teve todo aquele problema lá, que inventaram a história da minha meia (risos). Não sei nem de onde inventaram isso, pois não devia nem estar ali... Ainda assim, minha época na Seleção acabou mesmo. Foram 15 anos muito bons e, pelo que me lembro, perdi apenas 16 perdidos. Foi uma época muito boa, e devo todo meu crescimento no futebol à Seleção. Então você se despediu mesmo da Seleção? Me despedi porque... (silêncio) ...o que eu tinha de ganhar com a Seleção eu ganhei. Tem a questão da idade, são muitas viagens... Você chega na segunda, treina na terça, joga na quarta, volta na quinta, treina na sexta, joga no sábado... Chegou uma hora em que cansei – tanto que cheguei nessa Copa do Mundo cansado. Foram muitos anos na Seleção. Só tenho agradecimentos a todas as pessoas com quem trabalhei na Seleção, ao grupo de jogadores, comissão técnica, presidente... Qual será a melhor recordação que você guardará de jogar pelo Brasil? A Copa do Mundo de 2002. Perdemos em 1998, perdemos em 2006... Toda minha passagem pela Seleção foi mui-
to boa, mas quando você ganha é mais gostoso de relembrar. Aquela época do Felipão, aquela família, aquele ambiente, aquele grupo e tudo o que vivemos antes, durante e depois da Copa do Mundo foi inesquecível. Já que você falou na história do jogo da França, na última Copa, e da tal ajeitada de meia, você não considera uma injustiça o segundo jogador que mais vezes vestiu a camisa da Seleção, com 132 partidas, ser lembrado por causa de um único lance? São 180 milhões de opiniões... Eu até entendo tudo isso. O importante é que, quando estou com minha mãe e com meu pai, entramos numa salinha que tenho em casa com todos os troféus que conquistei, eles vêem o que consegui. É lá que esqueço toda a crítica que caiu sobre mim. O culpado sou sempre eu. Lembram da Copa de 1998, da bicicleta que eu errei. O problema é que, com a Seleção, por menor que seja o erro cometido, você fica marcado para sempre. O brasileiro lembra mais das coisas ruins do que das boas que acontecem na vida da gente. Você se sente mais valorizado na Europa do que no Brasil? Não. As pessoas me tratam super bem na rua, no Brasil. O problema é que qualquer jogo da Seleção Brasileira é transmitido para o mundo inteiro – e é normal que o brasileiro, que vive do futebol 24 horas por dia, julgue mes-
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Na Seleção, por menor que seja o erro cometido, você fica marcado para sempre
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mo sem conhecer você, sem conhecer sua trajetória. Vejo isso como uma coisa muito normal, porque quando vejo um jogo eu também critico. É uma reação normal nossa de analisar o erro, por menor que seja, enquanto as vitórias são esquecidas. Você mantém a intenção de voltar a jogar no Brasil, antes de parar? Depois da Copa do Mundo, eu pensei bem e decidi que não quero voltar a jogar no Brasil. Quero trabalhar como treinador, como auxiliar técnico, mas jogar eu não jogo. Por algum motivo especial? Pelas críticas e por tudo o que aconteceu. Pode até ser que eu mude de idéia, mas, hoje, pretendo encerrar a carreira no futebol europeu. Por falar em Brasil, você tem acompanhado as partidas da Seleção? Sim. (Seco) O que tem achado do time? Saíram muitos dos jogadores daquela nossa velha guarda, uma época muito vencedora. Chegaram novos, com uma mentalidade diferente. A mudança de tantos jogadores, tão rapidamente, exige um pouco de paciência. Tem que dar muita tranqüilidade para o Dunga trabalhar e segurar a pressão que virá – ainda mais por não termos sido campeões da Copa do Mundo. Se não ganharem a Copa América, que será difícil, vai vir mais cobrança ainda. Pouco a pouco, o Dunga vai chamando jogadores com mais experiência. De resto, acho que o time está bem. Só no último jogo (contra Portugal), que nós tomamos dois gols de bobeira. De resto, a Seleção está bem organizadinha. Quem você vê como seu herdeiro na lateral-esquerda? O Gilberto está bem. Gosto de ver ele jogar, pois tem personalidade, mas ainda quero que o Marcelo volte, porque é um grande jogador. O que você achou da ida dele para o Real Madrid? Achei legal. Foi muito bom para ele, que é um menino bom, de caráter bom, moleque para frente e feliz.. É
uma experiência maravilhosa, para a vida dele: tão novo e já num clube desse porte. Vai ficar 10, 15 anos aqui. Converso todo dia com ele, e ele tem ganho muita confiança. Só que já falei para ele que nos próximos três anos quem vai jogar sou eu (risos). Falando em Real Madrid, o que significa para você estar há 10 anos num clube desse porte? É difícil explicar. Para começar, confesso que não esperava ficar tantos anos num mesmo time. Sendo brasileiro e respeitado num clube tão grande como o Real Madrid, então, é motivo de muita alegria para mim. De verdade. Minha trajetória aqui é muito boa. Consegui até passar o Di Stéfano e me tornar o estrangeiro com maior número de jogos pelo clube. Além de bater o Di Stéfano, você é um dos seis jogadores que têm mais de 100 partidas em Ligas dos Campeões. O que isso significa para você? Sempre falo que a Liga dos Campeões é uma espécie de Copa do Mundo de clubes. Estou com quase 110 partidas na competição e, de fato, foram poucos os jogadores que chegaram a essa marca. Essa história toda começou lá em Araras, no União São João. Todo o sacrifício e a dificuldade que tive no começo estão sendo recompensados agora. É claro que, na trajetória de um jogador como eu, sempre há momentos em que se cria polêmica e em que esquecem tudo de bom que fiz, mas no dia em que escrever um livro poderei contar todas essas histórias da minha vida. É uma história super bonita. É claro que também vou contar bastidores de Copa do Mundo, coisas normais do trabalho de qualquer profissional. Esse livro tem data de lançamento? Tem sim: quando eu parar de jogar, daqui três anos. Quero lançar um aqui na Espanha e outro no Brasil. Nesse livro, o que você contará sobre seus 10 anos de Real? Que momentos você considera mais marcantes? Começaria com a Liga dos Campeões de 1997. Depois de 32 anos, chegamos
de novo ao título. Esse seria um bom ponto de partida. Nesse intervalo, passaram por aqui vários grandes jogadores, mas só ganharam a Copa Uefa, não a Liga dos Campeões. São histórias de gente que encontro na rua, pessoas na casa dos 30 anos que nunca tinham visto o Real Madrid ser campeão e que puderam fazê-lo. Sempre vejo e ouço coisas boas na rua. Graças a Deus, as pessoas, aqui na Espanha, não se cansam de pedir autógrafos, de bater fotos, de agradecer, de pedir para que eu nunca saia do clube, que eu continue trabalhando no Real Madrid depois de parar de jogar bola. Esse exemplo que as pessoas vêem em mim – e não me vejo como exemplo para muita gente (risos) – é muito legal. Aos 33 anos e quase 10 só aqui, as pessoas não parecem cansadas de se aproximar de mim. Às vezes, é até difícil falar sobre isso, porque convivo com isso diariamente.
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As pessoas aqui na Espanha não se cansam de agradecer, de pedir para que eu nunca saia do clube
Podem até falar que o Roberto está se achando o bonitão por falar assim, mas não é o caso. Estou apenas descrevendo o que vejo na rua, nos estádios... O que mudou no clube desde que você chegou, em 1996, até hoje? Chegou o Florentino Pérez, que é um grande empresário, pagou todas as dívidas do clube, construiu um estádio e um centro de treinamentos entre os melhores da Europa. O Real Madrid sempre foi um clube que não tinha tanto marketing. Hoje, praticamente só se fala em contratos milionários de televisão e grandes jogadores – principalmente depois que ele trouxe Ronaldo, Figo, Zidane, Beckham... Por conta disso, nestes últimos três, quatro anos, perdemos um pouco o foco no futebol. Hoje, se um jogador do Real Madrid briga com o outro no treino, não importa se todos os países do mundo estão em eleições ou se tem
guerra não sei onde: só se fala do Real Madrid. Essa é a grandeza que tem o clube. Nestes dez últimos anos, mudou muita coisa nesse sentido. Isso tem sido uma dificuldade grande para a gente. Em que essa mudança afeta o dia-adia de vocês, especificamente? Bom, basicamente, todo mundo odeia a gente, em qualquer lugar onde vamos jogar. Por se falar muito mais em dinheiro do que em futebol, quando o assunto é Real Madrid, todo mundo ganha uma motivação a mais para nos derrotar. É a mesma coisa da minha época de Palmeiras, quando a Parmalat chegou e só contratou grandes jogadores. Como tínhamos a obrigação de vencer os campeonatos que o time não ganhava havia tempos, todo mundo queria ganhar do melhor time. Querem fazer o jogo da vida para ver se o Palmeiras ou, no caso, o Real Madrid contrata.
Até que ponto a instabilidade política do clube afeta o desempenho da equipe, dentro de campo? Jogador não tem de ficar preocupado com esse tipo de coisa. No vestiário, a gente – pelo menos os mais velhos de clube – procura se distanciar de todo problema externo, como notícias sobre a diretoria ou o presidente. Mas, recentemente, houve aquela troca de críticas entre o presidente e alguns jogadores, em que vocês rebateram... Ele sabe as coisas erradas que falou e assumiu o erro. Naquela ocasião, fomos até ele e, sempre com muito respeito, explicamos que aquilo não poderia funcionar daquele jeito. Ele é o dono, ele que manda. Não é por isso que pode faltar com o respeito. Conversamos na boa e, depois dessa reunião, tudo voltou à normalidade. Na edição de fevereiro, a Trivela publicou uma entrevista com Arrigo Sacchi, que foi diretor do Real Madrid e pediu demissão pouco depois da saída do Luxemburgo. Ele disse que deixou o clube por não concordar com a política do presidente, de dar privilégios a certos jogadores. Passado mais de um ano da saída dele, ainda há algo desse tipo? O Florentino, naquela época, deu muitas facilidades a alguns jogadores, e isso acabou prejudicando o vestiário. Hoje mudou, sim, e todo mundo tem se ajudado bastante. É preciso entender que, em qualquer clube que você vá, sempre há o carinho do presidente por algum jogador em especial. Aí, vão lá e dão facilidades para ele. A imprensa aqui costuma chamar esses jogadores de mimados. Sempre há um ou outro que têm mordomias, mas nunca faltando com o respeito aos companheiros. Por falar em Luxemburgo, como você avalia a passagem dele pelo Real? Achei boa. Terminamos a primeira temporada dele aqui quatro pontos atrás do Barcelona. Quando o Vanderlei chegou, estávamos numa situação difícil, mas chegamos a ganhar até sete jogos seguidos. Se ele tivesse vindo umas três ou quatro rodaMarço de 2007
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das antes, teríamos sido campeões. O problema é que ser estrangeiro no futebol europeu é complicado. Estamos sempre invadindo o espaço deles. Você sente isso no vestiário? Sempre, sempre. (Silêncio) É muito difícil. (Silêncio) Mesmo você, que é tão respeitado dentro do clube? Mesmo eu. (Silêncio) Nós, brasileiros, somos diferenciados. A gente chega no vestiário, e aquele que não dá risada a gente xinga. Procuramos passar essa alegria para ver se motiva um pouco mais o pessoal, porque senão fica tudo muito quieto. Essa nossa alegria contagia o grupo, mas sempre tem um ou outro que olha diferente. O cara acorda 9:30 para treinar e fica bravo. Aí, muitas vezes, dizem que o brasileiro é irresponsável, coisas do tipo: “menos samba e mais trabalho”. O europeu é muito calado, muito organizadinho. Nós, não: chegamos sempre contando piada, abraçando. Somos assim sempre, mesmo nos momentos difíceis. Essa é a diferença – e não fazemos isso como algo forçado, mas porque somos assim. Em qualquer lugar, se você não estiver feliz, não trabalha bem. Com a saída do Ronaldo e do Beckham, chega ao fim a era dos “galácticos”. Você, que a viu de dentro, do início ao fim, o que acha dessa política? Essa história de só trazer grandes nomes prejudicou o clube em campo? O clube não se prejudica nunca. Quem sempre sai prejudicado é o jogador. Se o clube contrata grandes nomes, vem toda a mídia e elogia. Se o jogador não está bem, já viu. O Cannavaro, por exemplo: é o melhor do mundo, e todo mundo critica muito – só porque não está se adaptando ao Real Madrid. Esse é um esquema muito arriscado. São grandes contratações, mas quem perde sempre é o jogador, enquanto o clube ganha muito dinheiro. Entre esses grandes nomes, vez por outra, aparece um Portillo, um Soldado e outros jovens revelados pelas categorias de base. Trazer tantos es-
Roberto Carlos da Silva Nascimento: 10/abril/1973, em Garça-SP Carreira: União São João (1992 a 1993), Palmeiras (1993 a 1995), Internazionale (1995 a 1996), Real Madrid (desde 1996) Principais títulos: Copa das Confederações (1997); Copa América (1997, 1999); Copa do Mundo (2002); Campeonato Paulista (1993, 1994); Campeonato Brasileiro (1993, 1994); Torneio Rio-São Paulo (1993); Campeonato Espanhol (1997, 2001, 2003); Liga dos Campeões (1998, 2000, 2002); Supercopa Européia (2002); Mundial de Clubes (1998, 2002) Na Seleção: 132J / 10G
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trangeiros não prejudica o surgimento de novos jogadores espanhóis? Aqui, no Real Madrid, a maioria dos jogadores que sobem para o time principal jogam uma ou duas partidas bem, sentem-se pressionados e nunca mais voltam. Eles não têm estrutura para agüentar tanta pressão. Nesse sentido, não há escola melhor para um jovem se desenvolver que o Brasil, onde há jogadores maduros desde uma Copa São Paulo de Juniores. Aí, o clube tem alojamento, psicólogo, treinamentos... Tenho certeza de que qualquer jogador do time júnior do Palmeiras pode jogar com toda tranqüilidade no time principal. Acho difícil que os europeus cheguem nesse nível de desenvolvimento da base que temos no futebol brasileiro. Por isso é que digo que não adianta nada ter dinheiro e não ter a mentalidade para virar um grande jogador no futuro. No final da temporada passada, sua saída do Real Madrid era dada como certa. Diziam até que Chelsea ou Fenerbahçe seria seu destino. Houve algum motivo especial para você não sair? De fato, tive uma reunião com o Peter Kenyon (presidente do Chelsea). Conversei também com o vice-presidente do Fenerbahçe. Em todos esses anos, tive muitas chances para sair, mas tenho toda minha vida aqui. Ainda não renovei meu contrato e, se não chegar a 40 jogos até o final da temporada, tenho passe livre. Preciso conversar com a minha filha e com a minha família para ver o que é melhor. Vamos ver se sigo renovando meu contrato aqui ou se vou para outro país. O problema é que aqui, no Real Madrid, tem muita pressão. Como são tantos anos de Palmeiras, de Seleção Brasileira e de Real, às vezes uma mudança de clube, para um lugar com menos pressão e menos responsabilidade, pode ser boa. A chegada do Capello teve algum efeito em sua decisão de ficar no clube? Sempre conversei com os treinadores que vieram para cá. Expliquei meu pensamento e falei sobre a possibili-
dade de ir embora. Na maioria das vezes, foram os treinadores – Camacho, Vandelei e, agora, o Capello – que pediram para eu ficar. Aí, fiquei. Como é trabalhar com o Capello? Ah, para mim, é fácil. Foi ele que me trouxe para cá, em 1996 (risos). Ele sempre me tratou muito bem – o que não quer dizer que é diferente dos outros. Por outro lado, mesmo que tenha amizade e um respeito grande por ele, se surge um problema, não sou daqueles caras que vai chegar nele e vai falar. Não misturo confiança com profissionalismo. Gosto muito dele, respeito muito seu trabalho, e, para mim, está sendo muito bom trabalhar mais uma vez com ele, alguém que me ajuda muito. Sempre pergunta como estou e me trata muito bem. Dá para comparar a fase atual com a outra passagem dele pelo Real Madrid, entre 1996 e 1997? Ele continua muito chato de se trabalhar e briga com todos os jogadores, quando não fazem o que ele quer, mas é um amigo de todo mundo aqui no vestiário – menos um ou outro, com quem ele tem discussões. Teve problema com o Beckham, com o Ronaldo... No entanto, quando não coloca um jogador em campo, ele sempre dá o motivo e explica por que fez isso. É uma pessoa muito sincera e verdadeira. Esse excesso de sinceridade dos europeus é uma das grandes dificuldades que os jogadores brasileiros sentem ao lidar com outras culturas? Nós, brasileiros, não estamos acostumados à sinceridade. Para um jogador que é considerado craque, então, é claro que muitas vezes não é fácil ouvir a verdade. Fica sempre achando que é implicância e dizendo não ser compreendido, não entender por que tratam ele assim – ou diz que não vão com a cara dele. Essa descrição se encaixa no caso do Ronaldo, que saiu do clube fazendo questão de agradecer a todos os treinadores, menos um. É isso? Com o Capello, se você não treina
bem, não está concentrado ou não está feliz, não tem jeito. Ele até disse, logo que chegou: “Se alguém não está feliz, as portas estão abertas”. Aí, teve a história do peso do Ronaldo, de ele não treinar, de estar machucado... O treinador acabou perdendo um pouco daquela confiança que sempre teve no Ronaldo, com quem ele sempre conversava – e olha que o Capello sempre falou que, para ele, o Ronaldo vai ser sempre o maior atacante do mundo. Para mim, o Ronaldo foi para uma melhor. Não foi para um Batatais da vida. Foi para o Milan, o que significa que ainda hoje é importante. Já que o assunto é Ronaldo, em 1997, você foi considerado o segundo melhor jogador do mundo, na eleição da Fifa – atrás dele. Em 2002, quando você teve um ano excepcional, ficou na quarta posição, e ele ganhou novamente. Não ter conquistado esse prêmio te deixa frustrado? Não. Eu não ganhei o prêmio em 2002 por causa da Copa do Mundo do Ronaldo. Ele fez um torneio sensacional. Como ele é meu amigo, aceito numa boa. Quais são seus objetivos para os próximos anos? Três anos mais de contrato, depois eu paro, fico um ano descansando e vou fazer um curso de treinador e voltar a morar no Brasil. Quero treinar um clube aí. Nesses próximos três anos que tenho pela frente, vou procurar sempre estar na elite. Espero nunca perder a motivação, nunca deixar de querer ser campeão, dar o máximo em todos os jogos. Eu sou assim: quero deixar boas recordações. Tem também essa história de eu ser brasileiro e querer representar bem o meu país, aqui fora. E como você se vê daqui a dez anos? Gordo (cai na gargalhada). Tudo o que não posso fazer por causa do futebol eu vou aproveitar para fazer quando eu parar de jogar. Tenho minha fazenda, quero levar meus filhos para passear e curtir mais minha família, pois como jogador eu não tenho muito tempo.
Todo mundo odeia o Real Madrid e quer ganhar da gente, do melhor time
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Campeonatos estaduais
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s campeonatos estaduais valem por alimentar as rivalidades locais. Eles ainda são importantes para o torcedor do interior poder ver seu time – normalmente algum da capital – de perto. Esses torneios também são bons para jogadores desconhecidos de equipes pequenas mostrarem seu futebol diante das forças locais e ganharem espaço no cenário nacional. Esse é o discurso padrão que se ouve por todo o Brasil. No entanto, o que sobra dos campeonatos estaduais quando não há nada disso em campo? Foi essa pergunta que a Trivela se fez. Por isso, a revista mobilizou colaboradores pelo país para ver partidas de primeira divisão que não contassem com glamour algum. Eles assistiram a jogos de uma equipe pequena contra outra equipe pequena, sem que houvesse nem ao menos uma rivalidade entre duas cidades em jogo. Afinal, bem mais do que a metade dos campeonatos estaduais é composta por esse tipo de partida. O resultado dessa investigação pode ser visto nas próximas páginas. Há muitas histórias interessantes. De fato, a paixão do torcedor do interior divide-se entre o time da cidade e o grande da capital, muitas vezes com preferência pelo segundo. Realmente, o público quase sempre é pequeno e composto por familiares dos jogadores, mostrando que mesmo o interior não se mobiliza para acompanhar os campeonatos estaduais. Do outro lado, vê-se a dedicação de alguns abnegados que lutam para manter Jogos entre vivos seus clubes – até porque, em várias cidades, o campeonato estadual é a única times pequenos oportunidade de ver futebol profissional. mostram um outro Com isso, muitos jogos transformam-se em um programa de fim de semana interessante lado dos estaduais, em para várias pessoas, pois unem futebol e a chanque a rivalidade entre ce de se encontrar com amigos. Fica, é claro, a questão: a importância disso é os favoritos dá lugar suficiente para que valha a pena mobilizar todo o para a abnegação futebol do país por quase três meses? Resolvemos deixar isso para você, leitor, decidir. Trata-se de um de alguns poucos cenário alternativo do futebol brasileiro, uma visão que raramente a mídia se preocupa em ter, mas que é tão verapaixonados dadeira quanto o Maracanã com 23 mil pessoas para ver Flamengo x Vasco, o Mineirão com 42 mil para acompanhar Atlético-MG x Cruzeiro ou o Morumbi com 32 mil para torcer em São Paulo x Corinthians.
Quando os
grandes não estão em campo
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São Paulo, por Gustavo Hofman
Chuva, pinga e muita risada Rio Branco x Ponte Preta teve de tudo, mas o que menos se viu foi o futebol em campo
D RIO BRANCO 0 PONTE PRETA 2 Data: 8/fevereiro/2006 Local: Estádio Décio Vitta (Americana) Público: 631 pagantes
ona Íris Bardella Torres, de 46 anos, trabalha num pequeno boteco em frente ao Estádio Décio Vitta, em Americana (133 km de São Paulo), há 13 anos. Ao longo desse tempo, viu as torcidas dos principais times do estado passarem por lá e seu estabelecimento tornar-se o ponto de encontro da Malucos do Tigre, única torcida organizada do Rio Branco, o time da casa. No entanto, a quarta-feira chuvosa lhe reservava uma preocupação especial. “Esse jogo é perigoso por causa da torcida da Ponte Preta. Contra Palmeiras, Santos ou Corinthians, é bem legal, mas contra a Ponte é complicado”, alerta Dona Íris, enquanto os fregueses pagam R$ 0,70 pelo copo de pinga e R$ 2,00 pela latinha de cerveja.
“Jogo bom dá R$ 300, mas antigamente era melhor, vinha bem mais gente. Agora, com a violência, é complicado”. Rio Branco e Ponte Preta se enfrentaram pela sétima rodada do Campeonato Paulista, no dia 8 de fevereiro. O jogo, marcado para as 20:30, reuniu apenas 631 torcedores, que se aventuraram a sair de casa e enfrentar a chuva chata e fina que caía. O Décio Vitta é um estádio pequeno e aconchegante somente para as pessoas que pagam R$ 30 pelas cadeiras cobertas. A partida começa, e a sensação é de que todos que estavam na torcida do Rio Branco se conhecem. Nas arquibancadas, a Malucos do Tigre, um grupo de uns 30 jovens, pula e canta o tempo todo. Logo, os palavrões são direcionados à diretoria, que assiste à partida no alto das cadeiras. A cada xingamento, os riobranquenses divertem-se e olham para a cara dos envergonhados diretores. Enquanto isso, é possível ouvir in loco as transmissões das rádios locais, já que os narradores não ficam em cabines com um bom isolamento acústico. No final do primeiro tempo, a chuva finalmente dá uma trégua. O jogo está 1 a 0 para a Ponte, gol do incansável Finazzi. O intervalo chega, e as arquibancadas ficam vazias: todos foram comprar seu espetinho de churrasco. A partida recomeça, e a Ponte marca novamente. Os mesmos torcedores que no primeiro tempo pulavam e gritavam sem parar parecem desanimados e conformados com o placar. Enquanto isso, os cerca de 100 pontepretanos que vieram de Campinas – muitos vão de carro, já que Americana é vizinha – cantam e comemoram. Ainda há tempo para mais risadas, provocadas pela narração dos alto-falantes do estádio. A cada gol anunciado do Corinthians, que vencia o Rio Claro no Pacaembu com quatro gols de Roger, uma boa parcela dos torcedores comemorava. O jogo entre Rio Branco e Ponte tinha ficado em segundo plano. No quinto gol corintiano, o momento sublime para o locutor do estádio: “gol do Corinthians, no Pacaembu”. Uma breve pausa, e o silêncio toma conta novamente do Décio Vitta. Mais alguns segundos e a frase sensacional: “Não foi do Roger... Wilson”. Desfecho perfeito, para uma história de um jogo no interior paulista. Lembram-se da Dona Íris? Pois é, no final das contas, ela faturou apenas R$ 90. “Dia ruim é assim mesmo, mas tudo bem”. Março de 2007
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Rio de Janeiro, por Rafael Martins
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ábado de sol inclemente na Baixada Fluminense. Faltam 40 minutos para o jogo começar e, nas imediações do Estádio Giulite Coutinho, não há nada que indique isso. Mulheres conversam no portão de casa, um funk toca bem alto, e um garotinho brinca de embolsar o muro do estádio com um resto de massa largado no chão. Nas TVs dos inúmeros botecos, só dá Madureira x Flamengo. Lá dentro, porém, a atmosfera é outra. É o time de juniores do América que está perdendo, mas dói como se fosse o profissional. “Respeita essa camisa, ela foi do Edu, porra!”, grita um dos muitos torcedores da antiga sentados na arquibancada. É gente que viu o time de 1974, vencedor da Taça Guanabara – ou até o de 1960, campeão carioca. Marco Pinheiro, 40 anos, lembra-se bem da equipe de 1982, com Luisinho Tombo, Elói e Moreno. “Eu não ia mudar de time depois de velho”, diz ele, quando perguntado se os maus resultados não teriam esfriado a relação. Marco vê no campeonato estadual, não só um importante combustível para a rivalidade local, como também a chance de voltar a comemorar um título, segundo ele, a senha para a renovação da torcida. Renovação que ele procura promover em casa: o filho Marquinho, com bandeira e tudo, o acompanha. A dupla saiu de Marechal Hermes (não é perto!), em pleno carnaval, para bradar “Saaaanguêêêêêêê...”. Começa o jogo principal, e o América, já classificado para as semifinais da Taça Guanabara (primeiro turno), toma logo o primeiro gol, marcado pelo lateral Crispim. Atrás da baliza oposta, um torcedor com a camisa do Friburguense vibra loucamente. A equipe da região serrana precisava de um milagre para progredir na competição: goleada sobre o América, aliada a um caminhão de gols do Fluminense em cima do Vasco. Mesmo assim, o rapaz soca o ar de modo efusivo. De onde vem tanta empolgação? “Meu irmão joga no Friburguense”. E quem é ele? “É o Crispim”. O irmão-torcedor é, na verdade, flamenguista. Os outros gatos pingados ao redor são, todos eles, familiares ou amigos do lateral. Mais à direita, o time de juniores e alguns dirigentes completam a “torcida” do emblema de Nova Friburgo. Alexandre Vaz, diretor do clube, explica que a organizada Garra Friburguense só costuma viajar nos confrontos com os quatro grandes. Ele assegura que os caras são mesmo fiéis ao time da serra. Resta saber o que eles fazem no segundo semestre.
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Anoitece, e o América perde por 4 a 3. O ágil Mossoró fez dois gols e atormentou Júnior Baiano, xingadíssimo nos minutos finais. Válber arquiteta lançamentos, mas não adianta. Os dois veteranos disputaram, há 15 anos, o título brasileiro, num Maracanã abarrotado. Agora, tentam empurrar o tradicional time tijucano, diante de 571 apaixonados. Um deles é Sérgio, que lamenta o provável desmonte após o estadual. Ele levou os filhos ao estádio, inclusive a pequena Melissa, de 1 ano. Raphael, o mais velho, é vascaíno e nega-se a tirar foto com a camisa vermelha. “Ainda não consegui convencêlo”, confessa o pai. A derrota para o Friburguense evitou o confronto com o Flamengo na semifinal da Taça Guanabara, mas, com ela, a tarefa de Sérgio ficou um pouco mais complicada.
AMÉRICA 3 FRIBURGUENSE 4 Data: 17/fevereiro/2006 Local: Estádio Giulite Coutinho (Nova Iguaçu) Público: 571 pagantes
Beleza americana A resistente paixão de torcedores do América dá um pouco de sentido a um jogo perdido numa tardinha de Carnaval
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Minas Gerais, por Paulo Torres
Tropeiro sob o sol Apesar do calor e da lanterna, Democrata atraiu bom público na partida contra o Villa Nova
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anhã de muito sol em Sete Lagoas, na região central de Minas Gerais. Um bom público comparece ao Estádio Joaquim Henrique Nogueira, a “Arena do Jacaré”, inaugurada em 2006, para acompanhar a partida entre Democrata e Villa Nova. Isso às 10:30 da manhã. Ambos os clubes têm grande tradição, mas, enquanto o Villa é presença constante na Série C e na Copa do Brasil, o Democrata vem de um período negro. Rebaixado à segunda divisão, em 1995, só retornou à elite dez anos depois e chegou a se afastar do futebol profissional por três temporadas, entre 2000 e 2002. Entretanto, nem mesmo os anos de inatividade fizeram a torcida setelagoana abandonar o Jacaré. “Venho em todos os jogos, desde 2003”, diz Rodrigo, que faz parte da bateria da torcida Raça Alvi-Rubra. “Na Taça Minas Gerais, o público é menor, em torno de mil pessoas, mas no Campeonato Mineiro são pelo menos 3 ou 4 mil”. A torcida do Leão do Bonfim também se faz presente. São cerca de 150 pessoas, a maior parte vinda de Nova Lima, a 100 quilômetros de distância. Márcia, Virgínia e Wanda, três animadas vilanovenses, dizem ter viajado a cidades como Poços de Caldas, Uberaba,
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Americana e Cabo Frio para torcer pelo Leão – e fazem questão de afirmar que torcem apenas pelo Villa Nova. Já entre os torcedores do Democrata, há muitas camisas de Atlético-MG e Cruzeiro. “Todo mundo é Democrata e um outro time”, comenta Rodrigo. As duas torcidas, com suas camisas alvirrubras se confundindo, entram no estádio pelo mesmo portão sem que ocorra qualquer incidente. Durante o jogo, torcedores, mesmo uniformizados, têm livre acesso aos bares localizados no setor da torcida adversária – a corda que isola os vilanovenses é uma mera formalidade. A Arena do Jacaré tem banheiros limpos, vários guichês na bilheteria e bares espalhadas pelo perímetro da arquibancada, montados em barracas de metal. Além de refrigerante e cerveja, vendem pastéis e pratos de tropeiro – uma verdadeira refeição, com arroz, torresmo e couve acompanhando o feijão tropeiro. Mesmo sob o forte calor, não são poucos os que encaram o “tropeirão”. Ainda durante o aquecimento, o goleiro Glaysson, do Villa Nova, tem seu nome cantado pela torcida do Jacaré. Ele defendeu o time de Sete Lagoas em 2006 e foi um dos destaques da boa campanha no campeonato estadual. No entanto, o carinho com o antigo ídolo termina quando a partida começa. As duas equipes mostram muita disposição no início do jogo, e, logo aos 15 minutos, o atacante Potita abre o placar para o time da casa. O mascote do Democrata, um garoto com uma fantasia meio desajeitada de jacaré, sobe no alambrado para comemorar junto à torcida. A charanga do Villa continua fazendo seu carnaval mesmo com o time em desvantagem. Aos 38 minutos, Márcio Guerreiro empata a partida, e a música pára pela primeira vez – apenas enquanto os membros da charanga comemoram o gol de empate. O sol forte faz o ritmo cair no segundo tempo, tanto dentro de campo quanto na torcida. Apenas as crianças que brincam de escorregar pelo talude gramado atrás da arquibancada, ignorando completamente o jogo, mantêm o mesmo pique. A partida fica nervosa e truncada, e as equipes criam poucas chances de gol. O empate termina sendo um resultado justo, e a torcida volta para casa um pouco frustrada pelo placar, mas satisfeita por ter visto uma boa partida, sem tumultos, sem violência. Apenas um agradável programa de domingo, como o futebol deveria ser sempre.
Data: 11/fevereiro/2006 Local: Estádio Joaquim Henrique Nogueira (Sete Lagoas) Público: 3.565 pagantes
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Rio Grande do Sul, por André Pase
Como o churrasco Novo Hamburgo e Gaúcho provam que o Ruralito vai além da dupla Gre-Nal
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eixe de lado clubes como Grêmio, Inter e Juventude. O Campeonato Gaúcho vai além, com uma base formada por times do interior e comunidades ligadas ao hábito de ver um jogo no domingo – como pôde ser visto em Novo Hamburgo 4x1 Gaúcho. “Adoro esse time”, afirma Ione Schreck, torcedora do Novo Hamburgo. “Venho para os jogos desde que tinha 14 anos”. A senhora de 53 anos reclama do juiz, torce e ainda discute com outros torcedores, que falam da dupla Gre-Nal. Entre um dos quatro gols que o Anilado aplicou no Gaúcho de Passo Fundo, Ione explica que sua relação com o time vem da família. “Meu pai deu a vida por este clube”, desabafa, ao recordar o vínculo de Arnaldo Schreck com a agremiação. “Os outros times são supérfluos”. A mescla de torcedores fiéis e outros com o coração dividido marca o Gauchão. Neste jogo, um fenômeno singular foi registrado. Em virtude da partida do Grêmio ser transmitido pela TV desde as 16:00, muitos torcedores esperaram o fim do encontro de Venâncio Aires e conferiram apenas o segundo tempo do jogo, que começou às 17:00. É o caso de Francisco Soares. Depois de ver o Grêmio encaminhar o resultado pela TV, foi com a esposa Roselei e os dois filhos, Andrei e Ângelo, para o Complexo Esportivo Feevale. Olhando para o campo e com o ouvido no rádio, mostra ser um torcedor com o pé no chão. Para o casal, qualquer resultado em um eventual confronto com o tricolor da capital será bem-vindo. A arquibancada atrás de um dos gols é o ponto de encontro de alguns torcedores diferentes dos que vão até a social. Na construção desgastada, com a proteção quase caindo, juntam-se amigos que não combinam de ir até o campo, mas notam quando alguém falta. Uma hora antes de a bola rolar, Luiz Felipe Schmidt e Jair Bruxel já estão sentados atrás do gol. “Pena que Grêmio e Inter não venham jogar mais com a força de antes”, afirma Schmidt, que vai aos jogos desde a década de 70. “Venho aqui para me divertir, ter uma
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conversa boa, olhar a partida sem muita preocupação com o resultado”. Pouco depois, Altair Becker Júnior chega. São torcedores sem vínculo formal, mas com paixão pelo clube, regada a muito bom humor. Antes de ir até o bar, Schmidt brinca com os amigos e solicita que guardem o seu lugar, mesmo em um estádio com apenas 907 pessoas presentes. Mais adiante, está a turma da “Bafo na Nuca”, a torcida que tem orgulho de ser “a menor e a mais fiel”. Flávio Radde tem orgulho de dizer que é “anti-dupla Gre-Nal”. A seu lado, estão outros seis amigos, que lembram os fiéis dissidentes do judeu Brian no filme “A Vida de Brian”, comédia de 1979 dos ingleses do Monty Python. Basta Kélson marcar um gol para Fernando Mendonça e o menino de 13 anos Alexandro Gluck correrem para a tela que separa o público do gramado. É uma “avalanche” de duas pessoas apenas, mas com o espírito bem diferente e mais sadio que a tradição argentina. Os personagens vistos em Novo Hamburgo representam bem o Gauchão. Por vezes encarada como “cafezinho” ou “título menor” pelos grandes, a disputa ainda movimenta o interior e serve de espaço para novos jogadores, nascimento das tradicionais promessas da colônia que não vingam na capital e refúgio para “craques” que não conseguiram ir além de poucos jogos nos times maiores ou estão no estágio final da carreira. Uma repassada nas escalações revela onde estão Danrlei (São José-POA), Arilson (Glória de Vacaria), Caio e Zé Alcino (Esportivo de Bento Gonçalves) e Eduardo Marques (Guarany de Bagé), entre outros. O Ruralito, apelido do campeonato, reflete a situação do Estado. Governo e clubes driblam dificuldades para pagar as folhas de pagamento. Num fenômeno que não ocorre em muitos outros Estados, em algumas cidades pequenas, o futsal ganhou espaço e escanteou equipes para as séries menores. Apesar disso, jogar a primeira divisão ainda é motivo de orgulho para torcedores e cidades, uma tradição gaudéria como o churrasco no domingo.
Data: 11/fevereiro/2006 Local: Estádio Santa Rosa (Novo Hamburgo) Público: 907 pagantes
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Reginaldo Pereira/Agência A Tarde
Bahia, por Marcus Alves
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FLUMINENSE 2 VITÓRIA DA CONQUISTA 0 Data: 7/fevereiro/2006 Local: Estádio Jóia da Princesa (Feira de Santana) Público: 8.080 pagantes
uma hora do início da partida entre Fluminense e Vitória da Conquista, o Estádio Jóia da Princesa ainda estava vazio. Os poucos torcedores presentes, sem muito que fazer, conversavam entre si a respeito do momento da equipe de Feira de Santana, que, enfim, melhorara no Campeonato Baiano. Num clima de total harmonia, o sistema de som, que anunciava o nome de empresas repetitivamente, era o único detalhe que destoava da atmosfera. A arquibancada, antes cinzenta, coloria-se aos poucos. O verde, o vermelho e o branco misturavam-se com o preto e o azul, entre outras cores. Ao lado das camisas do Fluminense, também se destacavam as de clubes da capital baiana e de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Como curiosos ou meros exemplares de uma paixão dúbia, esses torcedores não se mostravam acanhados ao expor esse sentimento pouco compreensível para os moradores de centros mais desenvolvidos futebolisticamente. É claro, porém, que nem todos compartilham essa postura. O funcionário público Gilberto Silva, por exemplo, não admite torcer por nenhuma outra equipe, a não ser o Fluminense. Freqüentador assíduo do estádio, ele critica a falta de um placar eletrônico – inadmissível, de acordo com o mesmo. Assim como Gilberto, uma parte do público presente no estádio não economizava nas
O Touro do Sertão com sua torcida Apesar da má fase, Fluminense ainda é o orgulho de Feira de Santana críticas ao tricolor. O lateral-esquerdo Robinho, por sinal, sofria com a pressão da arquibancada a cada erro. Essa mesma pressão ocorria ainda mais intensamente sobre o banco de reservas do Vitória da Conquista. O alvo era o técnico Guilhermino Lima. A proximidade entre ele e os torcedores, separados apenas pelo alambrado, tornava ainda mais difícil o trabalho do comandante alviverde, que não tinha outra saída senão se concentrar nos acontecimentos em campo e esquecer as palavras “simpáticas” direcionadas a ele por meio de um megafone. Espalhados pelas arquibancadas, compressores modificados de caminhão respondiam um ao outro por meio de buzinas ensurdecedoras, que, quando emitidas, indicavam um bom momento para o Fluminense, na partida. Os demais torcedores, também animados, até ensaiavam apoiar a equipe com cantos, os quais, surpreendentemente, quase não foram ouvidos durante os 90 minutos. Entoados, eles não demoravam muito a perder força. Apesar dessa aparente frieza, percebe-se que o Fluminense é considerado um dos patrimônios da cidade, chamada de “Princesinha do Sertão”. Isso se reflete na importância com que o clube encara o Campeonato Baiano, ansiando, a cada temporada, pelo retorno de um tempo não muito distante, no qual o Touro do Sertão amedrontava seus adversários, mesmo os mais fortes. Março de 2007
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Clubes de torcedores, por Matthew Smith e Cassiano Ricardo Gobbet
Esse time é
meu! Dívidas, rebeldia e apego ao time estão motivando torcedores europeus a assumirem o comando de seus clubes. Para azar de alguns deles, nem sempre está dando certo
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uando jogava em casa, no final da década de 90, a torcida da Roma expunha na Curva Sul uma imensa faixa em que se lia: “A Roma somos nós”. A mensagem dirigia-se ao presidente Franco Sensi, que não aceitava perder o controle do clube, sem conquistas desde a década de 80. O raciocínio da torcida era simples: “se somos nós que enchemos estádios, acompanhamos o clube na TV e compramos camisas, por que razão que o presidente não nos escuta para dirigir o clube?” Nos últimos anos, pelos menos dois clubes da primeira divisão inglesa sofreram cisões que viram parte de suas torcidas fundar novas agremiações. Na Alemanha, um time que foi finalista de uma copa européia salvou-se da extinção graças à torcida. Tudo bem, eles estão comendo o pão que o diabo amassou, nas profundezas das ligas amadoras, sete ou oito divisões abaixo da original. Só que, quando eles dizem “esse é o meu clube”, não é só uma força de expressão.
Supporters Direct A Inglaterra é o país onde os torcedores têm mais força. Não é à toa. A Supporters Direct, entidade mantida pelo governo, presta assistência aos torcedores que querem ter uma participação maior na
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vida de seus clubes. No Reino Unido, são mais de 95 mil pessoas, em 100 associações de torcedores (não confundir com as torcidas organizadas brasileiras). Ao menos 61 delas têm algum tipo de participação no controle de seus clubes, sendo que 12 são dirigidos por essas associações. Foram organizações como essas que não aceitaram a troca de comando em Manchester United e Wimbledon e radicalizaram, fundando novos times – respectivamente, FC United e AFC Wimbledon. No caso dos Red Devils, por enquanto, só mudaram os donos. Nos Dons, porém, a transformação foi profunda: a equipe mudou de cidade e de nome, adotando oficialmente o apelido – passou a se chamar Milton Keynes (nome da nova cidade) Dons. Tudo bem, os times dos torcedores tiveram de recome-
çar em divisões amadoras, mas aceitaram assim mesmo – tudo para poder voltar a se sentir como parte de alguma coisa. Não dê risada, porque o United chegou a ter mais de 6 mil pessoas presentes, em um jogo pela sua divisão. É pouco provável que titãs como Bayern de Munique e Milan venham a ser comandados por seus sócios. De qualquer maneira, essa saída é uma resposta do torcedor ao seqüestro de suas cores amadas por uma cartolagem cada vez mais assanhada por dinheiro. “Os clubes de futebol na Inglaterra começaram com grupos de pessoas que se reuniam para jogar bola. O Manchester United foi fundado por funcionários da companhia ferroviária Lancashire e Yorkshire”, observa David Conn, autor do livro “Football Business” (“O Negócio do
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Alessia Pierdomenico/Reuters
Bournemouth Depois de ter vendido o estádio e alugado-o de volta, o segundo presidente demitiu-se. Em 1997, quando o clube passou para o controle dos torcedores, os Cherries foram chamados de “o primeiro clube comunitário da Europa”.
AFC Wimbledon Em termos de grana, o “verdadeiro Wimbledon” não está mal, mas sofreu duas duras punições em pontos nesta temporada, que estão dificultando o terceiro acesso do clube.
Brentford No ano passado, as Abelhas quase subiram para a segunda divisão. Nesta temporada, porém, a coisa está feia, e o clube ocupa a penúltima posição da tabela. A torcida mobilizou-se e juntou cerca de € 70 mil para contratar reforços.
Exeter O Brentford tem como presidente Greg Dyke, que foi diretor-geral da BBC
O primeiro adversário da Seleção Brasileira na história está no páreo para voltar à Football League (a liga profissional inglesa, que vai até a quarta divisão). Quase 60% do público dos jogos em casa vêm dos mais de 2,2 mil sócios da associação de torcedores.
York
Única opção A iniciativa dos torcedores não significa que esteja tudo às mil maravilhas. Nos casos de FC United e AFC Wimbledon, o radicalismo veio por pura – e saudável – rebeldia, mas, na maioria dos casos, os torcedores uniram-se para arrancar seus times da bancarrota, uma vez que, lá por aqueles lados, dívidas não pagas podem fazer com que um clube simplesmente deixe de existir. Na Alemanha, o Lokomotive Leipzig, fundado em 1893, foi campeão alemão, em 1903, e finalista da Recopa Européia, em 1987. Uma longa agonia financeira drenou o clube até que, em 2004, foi declarado falido. Assumido pelos tor-
cedores, o Lok caiu para a 11a divisão, mas não sumiu. Graças à fidelidade de sua torcida, bateu o recorde mundial de público médio para divisões amadoras (mais de 12 mil pagantes por jogo). No ano retrasado, fundiu-se com um outro clube e subiu para a sétima divisão. Os clubes administrados por torcedores estão dando certo? Menos do que os estes gostariam. Apesar de vários dos times terem assegurado suas existências, as dívidas continuam preocupando. Clubes como o Bournemouth não tiveram como manter seus estádios; outros, como o York, acabaram voltando a ter um único proprietário, porque os torcedores não tinham como arcar com os gastos. Mesmo assim, há finais felizes até aqui – que o digam os torcedores do Lokomotive, que já contam os dias para a próxima final européia.
Notts County O clube mais antigo do mundo está com ânimo renovado. A associação de torcedores aumentou sua participação na diretoria e assumiu o controle do time.
Divulgação
Futebol”). Para ele, o fenômeno das associações de torcedores é bastante similar.
alguns dos “times da galera”
O York é o primeiro clube inglês onde a experiência de controle de torcedores fracassou oficialmente. O time de Bootham Crescent não conseguiu a promoção para a quarta divisão no ano passado e um empresário local foi “convidado” a assumir.
United of Manchester Ainda que distante da riqueza de Rooney e companhia, o FCUM tem uma média de público só superada pelo Exeter, abaixo da quarta divisão. Para botar uma banca, os caras têm transmissão ao vivo de rádio e pela Internet dos jogos em casa. Vixe! Março de 2007
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Brasileiros naturalizados, por Ricardo Espina e Leonardo Bertozzi
Marcos Senna nĂŁo se arrepende de ter trocado o Brasil pela Espanha
Felix Ausin Ordonez/Reuters
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Já é comum brasileiros se naturalizarem para defender outras seleções – e conquistar um espaço que nunca teriam aqui
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Legião
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m “croata” chamado Eduardo da Silva. Um “tunisiano” conhecido como Francileudo dos Santos. Ou então Alex Santos, um legítimo “japonês”. À primeira vista, tais nomes relacionados a países tão diferentes deveriam causar estranheza. Contudo, esse fenômeno já se tornou comum. São jogadores brasileiros que, sem espaço para vestir a camisa da Seleção, adotaram como suas outras equipes nacionais. Para eles, a naturalização é uma chance de obter um reconhecimento que dificilmente teriam no Brasil e até mesmo uma oportunidade de realizar alguns sonhos inatingíveis, caso dependessem exclusivamente da Seleção. Disputar uma Copa do Mundo, por exemplo, é algo que, para essa legião de “estrangeiros”, tornou-se uma tarefa bem mais fácil de ser alcançada. Amauri vive essa expectativa. O atacante do Palermo, que hoje se recupera de uma contusão, já foi cotado para defender a Itália. O goleiro Doni e o meia Rodrigo Taddei, ambos da Roma, também tiveram seus nomes cogitados recentemente para jogar pela Azzurra. O treinador Roberto Donadoni não descartou essa possibilidade. Tal hipótese inquieta Amauri. “Agora, estão falando pouco sobre isso. Meu passaporte deve chegar no final de fevereiro, mas acho que esse assunto a respeito da seleção italiana deve ficar mais para a frente. Sempre disse que meu sonho é jogar pelo Brasil e, enquanto não me disserem que eu não tenho condições de atuar pela Seleção, não a descartarei. Primeiro, procurarei me informar e, se pelo menos me disserem que estou sendo observado, colocarei o Brasil em primeiro lugar”, observa. Para alguns atletas, a mudança para outra seleção não traz grandes transformações em suas rotinas. Por atuarem há algum tempo em suas pátrias “adotivas”, eles adaptamse bem à cultura, aos costumes e ao idioma locais. Em outros casos, há a necessidade de uma alteração mais drástica. De acordo com as leis da Turquia, por exemplo, todo cidadão do país deve ter um nome de origem turca. Por isso, para defender a seleção nacional, o atacante Marco Aurélio teve que mudar seu nome para Mehmet Aurélio. Esse caminho também foi seguido por Márcio Nobre, hoje Mert Nobre, que ainda não foi convocado. Amauri afirma sentir-se um pouco italiano, após passar sete anos no país. “Com certeza, nunca escondi isso. No entanto, minhas raízes estão no Brasil, e certamente realizarei meu sonho de defender a Seleção”, afirma. Março de 2007
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Hungria Leandro de Almeida
Bulgária Tiago Silva Lucio Wagner
Croácia Eduardo da Silva Alemanha Kevin Kuranyi
Turquia Mehmet Aurélio
Espanha Marcos Senna
Azerbaijão Ernani Pereira André Ladaga Leandro Gomes
Portugal Deco Honduras Denílson Costa
Tunísia Francileudo
Trinidad e Tobago José Luis Seabra
Macedônia Aginaldo Braga Gilson Jesus da Silva Vandeir Oliveira dos Santos
Togo Alessandro Faria Jefferson de Souza Christiano Parreira Fabio de Oliveira Fábio Azevedo Hamilton Henio Ferreira
México Antonio Naelson (Zinha)
Bolívia Alex da Rosa
Japão Alex Santos Marcus Túlio
Bósnia Ricardo Baiano
Líbano Gilberto dos Santos Luis Fernandes Marcílio Silva Newton de Oliveira
Cingapura Egmar Gonçalves Hong Kong Cristiano Cordeiro
Guiné Equatorial Danilo
Seleções que contam com jogadores nascidos no Brasil
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José João Altafini sentiu o gostinho dessa sensação. Por aqui, ele ficou conhecido como Mazzola. O centroavante defendeu o Palmeiras em 1957 e 1958, e suas boas atuações pelo time alviverde renderam-lhe a convocação para a Copa de 1958. Do banco de reservas, ele viu o Brasil conquistar o título mundial pela primeira vez. Nos anos seguintes, porém, o jogador viveria seus melhores momentos, no futebol italiano. Em 1958, o Milan o contratou. Começava então a história de Altafini, como se tornou célebre no futebol italiano, onde também teve passagens bem-sucedidas por Juventus e Napoli. Completamente adaptado ao “calcio”, o brasileiro surpreendeu-se com o convite que recebeu, para disputar o Mundial de 1962, pela seleção italiana.
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Antes de responder, o centroavante levou em consideração algo que hoje é corriqueiro e que leva muitos jogadores a tomarem a mesma decisão que ele: “Os dois melhores pontas-direitas do Brasil, na época, eram Garrincha e Julinho. Não havia o hábito de chamar jogadores que atuavam fora do país. Julinho esperou tanto e não foi convocado. Em 1962, o Amarildo estava na Itália e foi chamado, mas foi um caso muito raro”, contou, citando exemplos de seus até então companheiros. Sem muitas esperanças de ser lembrado, Altafini recebeu uma autorização especial da Fifa para vestir a camisa da Itália, na Copa do Chile – feito do qual se arrependeria mais tarde (leia box ao lado).
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Altafini: “Jogar pela Itália foi a pior coisa que poderia ter feito”
Na sua opinião, jogadores como Doni, Amauri e Taddei acrescentariam algo à Itália? O jogador de futebol tem como aspiração defender uma seleção. Quando ele sabe que as portas estão fechadas, por exemplo, na do Brasil, toma a decisão de jogar por outra. Há o caso do Camoranesi (meia da Juventus nascido na Argentina que defende a seleção italiana). Eu acredito que, antes de aceitar jogar pela Itália, ele tenha perguntado se tinha chances na Argentina. Ninguém pode dizer que ele está errado. O Amauri disse exatamente isso. Se tivesse alguma esperança, ele aguardaria. Com você foi assim? Comigo foi o contrário. Jogar pela Itália, mesmo com toda a honra e orgulho, foi a pior coisa que eu poderia ter feito. Hoje, eu poderia ser tricampeão mundial, com o Brasil. Fui campeão em 1958, e praticamente o mesmo elenco foi para 1962. Eu teria sido chamado e seria campeão duas vezes. Em 1970, tinha dois anos a mais que o Pelé, e o Brasil não tinha centroavante. Esse foi o meu erro. O Amauri pode perguntar para o Dunga: “o senhor vai me chamar?” Se a resposta for não, ele pode jogar pela Itália. Havia outro tipo de vantagem em jogar pela Itália? Não, nenhuma. Eu tinha 22, 23 anos, não sabia o que estava fazendo. Para mim, era normal ser chamado pela Itália e jogar pela seleção. Não queria criar um problema pessoal. Tinha direito ao passaporte, não apenas por jogar na seleção, e não ganhei nada a mais para isso. Como foi a reação no Brasil quando souberam que defenderia a Itália? Passei muito mal. Um jornalista – Antonio Guzman, do jornal Última Hora – ficou o ano inteiro me chamando de vendido, traidor, ex-brasileiro. Era todo dia, no jornal, essa aporrinhação. Por que ele não fala do Aldair, do Cafu, que hoje têm passaporte italiano, se eles são traidores? Joguei pela Itália porque meus avós eram italianos, mas não sabia o que estava fazendo. Se eu conseguisse raciocinar naquele momento, pensaria que ainda seria chamado em 1962. Era mais novo que o Vavá, poderia ter sido reserva dele. Em 1970, eu estava no auge, mas são coisas do passado. Pela Itália, joguei com muito orgulho, mas só com o passar dos anos comecei a perceber. Doeu muito ser chamado de traidor.
Carlos Eduardo Freitas/Trivela
Um dos maiores artilheiros da história do Campeonato Italiano, com 216 gols marcados, Altafini tornou-se um dos jogadores brasileiros mais respeitados na Itália. Hoje, com 69 anos, o ex-atacante comenta as partidas da Série A para a emissora de TV Sky Italia. Nesta entrevista à Trivela, ele comenta sua decisão de defender a Azzurra, na Copa de 1962 - uma escolha da qual se arrepende.
Copa do Mundo No ano passado, diversos jogadores nascidos no Brasil passaram pela experiência de atuar por outras seleções, no Mundial. Houve os casos de Deco (Portugal), Francileudo (Tunísia), Zinha (México), Alex Santos (Japão) e Marcos Senna (Espanha). Antes de a Fúria ser eliminada pela França nas oitavas-de-final, o volante do Villarreal estava preparado para enfrentar sua pátria-mãe, na fase seguinte do torneio. “Eu adoraria que isso tivesse acontecido. Já tive a emoção de disputar uma Copa; se cruzasse com o Brasil, para mim, seria muito especial. Sinceramente, gostaria de ganhar da Seleção como profissional. Jogar contra o Brasil faria eu me sentir como uma criança, ao ver meus ídolos de perto. Já atuei contra alguns deles aqui na Europa, mas numa Copa seria muito melhor. O coração bateria forte, mas, depois de o juiz apitar o início de jogo, seria indiferente”, comentou. Se, para Marcos Senna, jogar contra o Brasil seria motivo de alegria, Altafini preferia nem imaginar essa possibilidade. “Graças a Deus, isso não ocorreu. Nunca pensei em como seria; torcia para que não acontecesse. Time de futebol é como a mãe: não se pode mudar. A gente pode trocar de partido político, mas não de time, nem de mãe”, comparou. Para Marcos Senna, a possibilidade de enfrentar o Brasil tem tudo para tornar-se cada vez mais comum. “Para os brasileiros, isso é muito bom, pois mostra que a quantidade de jogadores no Brasil daria para fazer quatro seleções fortes. É um sinal de que o país é muito rico em bons atletas”, disse. Essa qualidade vira-se contra nós, quando a Seleção sofre um gol de Kuranyi, leva um drible de Deco ou perde a bola para Marcos Senna. Março de 2007
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Entrevista, por Renato Andreão
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irmão
do Frank
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onald de Boer não teve o mesmo sucesso na carreira que seu irmão Frank. Ainda assim, esteve em grandes equipes do futebol mundial e, ao lado de seu gêmeo, conquistou a Liga dos Campeões de 1994/5, pelo Ajax. Nesta entrevista exclusiva à Trivela, o jogador, hoje no Al Shamal, do Qatar, fala sobre sua carreira e sobre alguns dos jogadores e técnicos com quem trabalhou.
Você fez parte daquele grande time do Ajax que bateu o Milan na final da LC de 1994/5. Foi o melhor momento de sua carreira? Com certeza. Foi a primeira grande conquista, e eu tive um grande papel naquele campeonato, o que me dá mais orgulho ainda. Tanto naquela equipe como no Barcelona, você foi treinado pelo Van Gaal. Na Catalunha, o assistente dele era o então desconhecido José Mourinho. Você acha que o trabalho de um influenciou o do outro? Van Gaal é o melhor treinador com quem eu trabalhei. Ele é rigoroso, genial na parte tática e organiza todas as coisas. Ele muda todo o jogo da equipe e implanta seu trabalho, sempre! Com relação ao Mourinho, quando eu vi aquele time do Porto jogar durante a Liga dos Campeões de 2003/4, eu via a mão de Van Gaal: uma equipe sem estrelas, mas coesa, com cada um trabalhando em prol do outro, exatamente como foi em 1995 (quando Van Gaal venceu a LC com o Ajax). Como foi jogar no Barcelona? Gostou do futebol espanhol? Eu tive um pouco de azar, nos meus
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tempos de Barcelona. Quando eu finalmente estava no ponto e jogando como titular, tive uma lesão mais séria. Essas contusões me impediram de mostrar muita coisa. Eu acho que a Liga Espanhola é uma das melhores e mais atrativas do mundo. Do topo até a parte de baixo, é preciso lutar por todos os pontos, especialmente fora de casa. Você jogou quatro anos na Escócia. Porquê é tão difícil aparecerem jogadores escoceses talentosos? O trabalho de base é ruim? Eu penso que é uma coisa que vem de baixo. Você tem que começar ensinando um jovem a jogar futebol, e não como ele vai vencer um campeonato quando tiver 12 anos. A habilidade é todo o caminho primário, a parte tática e física vêm no final. Quando você tenta aprimorar sua habilidade, a parte física aprimora-se também. Acho que, na Escócia, eles se esquecem disso, então os garotos nunca aprendem como realmente usar suas habilidades e chegam ao time principal assim. Aí, você não pode mudar o jogador mais. Numa recente entrevista à Trivela, o ex-técnico da seleção argentina, José
Pekerman, disse que, se entendesse de tática, o Brasil seria imbátivel. Sendo um jogador da Holanda, uma das escolas mais evoluídas taticamente no mundo, você concorda? Eu entendo o que ele quis dizer. Algumas vezes, os brasileiros não fazem da tática sua principal opção, o que é natural no jogador brasileiro. É instintivo o que eles fazem, e é um futebol legal de se assistir. É por isso que os brasileiros são os melhores de todos os tempos. Por serem muito habilidosos, sempre têm uma solução para todas as situações. Eu adoro ver o Brasil jogar. As derrotas para o Brasil, nas Copas de 1994 e 1998, ainda doem? É claro que doem, especialmente o pênalti que eu perdi (na semifinal, em 1998). Ainda penso nesses momentos. Perdi uma oportunidade de ser uma lenda. Como vê Marco van Basten no comando da seleção da Holanda? Eu penso que Marco tem muito carisma e é um grande conhecedor de futebol. Ele foi um dos melhores jogadores do mundo, e acho que pode passar muita coisa para os atletas.
Por serem muito habilidosos, os brasileiros têm solução para todas as situações
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O melhor da América
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64 páginas, com o perfil dos 32 clubes participantes, entrevistas e tudo o que você precisa saber sobre a competição
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Já nas bancas! 2/28/07 2:49:49 AM
Chineses no Brasil, por Tomaz R. Alves Andrew Wong/Reuters
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Receita chinesa, tempero
brasileiro Em 1993, 28 jovens jogadores da China vieram ao Brasil, em um projeto que mudou a história do futebol chinês
Li Weifeng, que disputou a Copa de 2002, desenvolveu seu futebol aqui, no Brasil
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oje, a China é um país razoavelmente respeitado no mundo do futebol. Não é uma potência, mas briga por títulos na Ásia e, nas eliminatórias para a Copa, figura entre os favoritos para a classificação. Os chineses disputaram um Mundial neste século e têm jogadores atuando em times da primeira divisão de ligas importantes da Europa. Com base na situação atual, fica fácil esquecer que, há menos de 15 anos, o futebol no país era amador. A China não exportava jogadores, estava longe de ir para uma Copa e era considerada a eterna decepção da Ásia. A virada nos destinos da China é freqüentemente creditada ao técnico Bora Milutinovic, que levou o país à Copa de 2002. Sim, o sérvio foi importante. No entanto, as sementes para o salto do futebol chinês foram plantadas muito antes, em 1993. E mais: isso foi feito no Brasil. Nesse ano, um grupo de 28 jogadores chineses, entre 12 e 14 anos, desembarcou aqui, para um “estágio” no país, que duraria cinco anos. Não se tratava de um grupo qualquer de jovens – eram os futebolistas mais promissores da China, na prática, a seleção infantil do país. O grupo ficou conhecido como “Time Jianlibao”, em referência à empresa de sucos e bebidas isotônicas que bancou a maior parte dos custos do projeto. “Essa foi a primeira viagem de uma seleção de futebol chinesa para treinar fora do país”. Quem explica é Joseph Lee, empresário que fez o contato da empresa e da federação chinesa com clubes brasileiros e montou a estrutura que recebeu os atletas. “Políticos chineses e até emissoras de TV vieram aqui visitar a equipe”, completa Lee. Entre os jovens atletas que vieram para cá, estavam Li Tie e Li Weifeng, jogadores que disputaram a Copa de 2002 e depois foram para o futebol inglês – o primeiro, hoje, está no Sheffield United; o segundo retornou à China. “A época em que estive no Brasil foi a mais importante da minha carreira. Aprendi mais lá do que nos cinco anos que passei no Campeonato Chinês”, disse Weifeng a um jornal de seu país. Outra figura destacada do grupo que veio ao Brasil era Zhu Guanghu, um dos três integrantes da comissão técnica – hoje, é o técnico da seleção chinesa principal. Ao todo, dos 28 joga-
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dores que participaram do projeto, 12 chegaram a defender a seleção da China em partidas oficiais. Atualmente, a maioria dos atletas tem posição de destaque no Campeonato Chinês ou até joga na Europa – como é o caso de Li Tie.
Um novo estágio, na Alemanha
Ao todo, foram organizadas três viagens da delegação chinesa para o Brasil: em 1993, 1995 e 1998. Entre elas, houve pequenas alterações no grupo de jogadores, mas a base manteve-se basicamente a mesma. Na primeira visita ao Brasil, o grupo ficou confinado num sítio isolado, na cidade de Juquitiba-SP, por mais de um ano. Para orientar os garotos, foi contratado o treinador Écio Pasca, que é conhecido por ter revelado Dener e outros jogadores na Copa São Paulo de Juniores de 1991. Embora a experiência tenha sido considerada positiva, não era o que a federação queria. “Esse modelo não estava certo. Era um desperdício deixar os jogadores isolados. Para isso, seria mais barato levar os técnicos brasileiros para a China”, avalia Joseph Lee. Depois de um período de descanso em seu país natal, os jogadores retornaram ao Brasil, em 1995. Dessa vez, no entanto, o modelo da preparação foi bem diferente, e os atletas treinaram no Guarani. Em vez do isolamento, a estratégia adotada foi de máxima interação dos jovens com o futebol brasileiro. Segundo Lee, que fez o contato com o time campineiro, os chineses usufruíram toda a estrutura do clube: técnicos, campos de treino, acomodações, medicina esportiva e até organização logística. “Esse convívio fez muita diferença. Ajudou os chineses a incorporarem o modo de pensar dos jogadores brasileiros”, diz o empresário. Além do contato no clube, os asiáticos freqüentavam aulas de português e faziam excursões quinzenais pela região. Na terceira viagem, em 1998, o esquema foi parecido. A diferença é que, dessa vez, o Time Jianlibao treinou no Atlético-PR, por um período mais curto, de apenas oito meses. “Nessa última viagem, foi feita uma quantidade maior de amistosos, para medir a evolução dos jogadores”, comenta Lee.
Retorno à China O que aconteceu a esse time de promessas, depois que voltou à China? “Infelizmente,
Ian Hodgson/Reuters
Três viagens
os jogadores separaram-se. Seria bom se pudessem ter ficado juntos, para jogar o Campeonato Chinês. Assim, daria para comparar o nível técnico deles com o dos atletas que não vieram ao Brasil”, argumenta Lee. A essa altura, os integrantes do Time Jianlibao tinham entre 16 e 19 anos, e havia muita pressão das equipes chinesas para contratá-los. Uma das maiores indicações da evolução dos chineses após o “estágio” no Brasil foi a participação da seleção do país no Torneio de Toulon (tradicional competição sub-21 disputada na França) de 1998. Na primeira fase, a equipe, formada quase inteiramente por jogadores que estiveram no Brasil, ficou em segundo lugar de seu grupo, atrás de Portugal e à frente do... Brasil! Nas semifinais, os chineses sofreram sua única derrota no torneio, perdendo para a Argentina, por um apertado 1 a 0. Se é verdade que a China ainda está muito longe de ser, no futebol, a potência que ela é em alguns esportes olímpicos, também é inegável o desenvolvimento do país na última década. Para plantar essa semente, bastou reunir jovens talentosos e realizar um estágio bem planejado em um país com tradição no esporte. Será que não dá para aprender nada daí?
Li Tie chegou a ser titular do Everton (foto) e, hoje, defende o Sheffield United
Tão bem-sucedida foi a experiência dos jovens chineses no Brasil que a federação local decidiu repetir o projeto, em 2004. No entanto, dessa vez, a delegação do país foi para a Alemanha. “Entrei em contato com dirigentes chineses e tentei convencê-los a vir para o Brasil, mas não teve jeito”, explica Joseph Lee. “Lá na Alemanha, houve apoio da prefeitura e dos clubes, que têm muito interesse no mercado chinês. Aqui, infelizmente, os times não têm essa visão de mercado e só estão interessados em receber o dinheiro pela hospedagem”, diz o empresário, que foi um dos organizadores da viagem dos chineses, na década de 90. Foram para a Alemanha, para a cidade de Bad Kissingen, 27 jogadores, formando um grupo batizado de “2008 Star Team”. O objetivo desse estágio, que durou dois anos, era desenvolver um time forte, capaz de ganhar uma medalha na Olimpíada de Pequim. Participaram da comissão técnica três técnicos chineses e três alemães, incluindo Eckhard Krautzun, responsável por levar o Canadá e a Tunísia a Copas do Mundo. No entanto, para saber se os resultados vão ser tão bons quanto os do grupo que esteve no Brasil, vai ser necessário esperar pelo menos até 2008. Março de 2007
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Capitais do futebol, por Marcus Alves
Além das
arquibancadas de Salvador. A princípio, o Ypiranga, conhecido como “O Mais Querido” por, então, possuir a maior torcida, destacou-se dos demais. Nem mesmo o Vitória, que, à época, se dedicava mais a esportes como remo e críquete, fazia frente à equipe aurinegra – esta, impulsionada pelo craque Apolinário Santana, mais conhecido como Popó. A queda de seu domínio coincidiu com o surgimento do Bahia, em 1931. A rápida ascensão tricolor, atestada por suas primeiras conquistas, levou ao crescimento da rivalidade com o Ypiranga e o Botafogo. Os encontros com este último, por sinal, eram chamados de “Clássico do Pote”. O nome veio da idéia de um peixeiro que, revoltado com a invencibilidade do Bahia no clássico, prometeu que levaria um pote de barro a todas as partidas entre os dois e que o quebraria assim que o alvirrubro vencesse. Como isto demorou a ocorrer – cerca de sete anos –, criou-se essa mística. Esse período vitorioso do Bahia foi interrompido pelo tricampeonato estadual do Galícia, entre 1941 e 1943. O clube fun-
1ª divisão estadual
clubes da cidade
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1 Esporte Clube Bahia
1 Campeonato Brasileiro 1 Taça Brasil 2 Copas do Nordeste 4 Copas Norte-Nordeste 43 Campeonatos Baianos
2 Esporte Clube Vitória
3 Copas do Nordeste 1 Copa Norte-Nordeste 22 Campeonatos Baianos
2ª divisão estadual*
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m meio ao pior momento de sua história, não há muito que enaltecer no futebol baiano, a não ser o fanatismo do torcedor. Exaltado com freqüência, ele se mostrou ainda mais presente no último ano, quando as duas principais equipes do estado, Bahia e Vitória, disputaram a Série C do Campeonato Brasileiro. Nem mesmo esse cenário provou-se capaz de afastar os torcedores das arquibancadas. A cada rodada, os soteropolitanos deslocavam-se à Fonte Nova ou ao Barradão, na ânsia de dias melhores. Dias melhores que, aliás, parecem estar distantes de Salvador. Além da derrocada de Bahia e Vitória, a capital baiana se ressente da inexistência de um terceiro representante da cidade na primeira divisão estadual. Galícia e Ypiranga, clubes outrora vencedores, competiram na divisão de acesso na temporada passada, enquanto outros, como Botafogo, Redenção, Leônico e ABB, não mantêm atividades profissionais atualmente. Durante 49 anos, o Campeonato Baiano foi disputado exclusivamente por times
Eduardo Martins/Agência A Tarde
A paixão dos torcedores dos clubes de Salvador resiste à má fase das equipes da cidade
dado pela colônia espanhola de Salvador foi, aliás, um dos que mais resistiu ao domínio da dupla Ba-Vi, conquistando até um vice-campeonato baiano, em 1995. Entre outros, participaram da construção da história do Demolidor de Campeões nomes como Marinho Peres, que disputou a Copa do Mundo de 1974, e, mais recentemente, Oséas, que foi descoberto nas divisões de base dos Granadeiros.
A maior rivalidade Norte-Nordeste O Bahia não encontrou dificuldades para assumir a supremacia do futebol baiano. Em suas duas primeiras déca-
3 Esporte Clube Ypiranga
1 Copa Norte-Nordeste 10 Campeonatos Baianos
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AFLORA A PRIMEIRA RIVALIDADE
Em 2007, Bahia e Vitória só se enfrentarão no Campeonato Baiano
4 Galícia Esporte Clube
5 Campeonatos Baianos
Sport Club Botafogo 7 Campeonatos Baianos
Associação Desportiva Leônico 1 Campeonato Baiano
Bahia
localização
de entre Bahia e Vitória firmou-se no cenário estadual. Entre outros fatores, contribuíram para isso os desentendimentos entre os dois fora de campo. Por diversas vezes, eles romperam relações, por causa do assédio de um sobre atletas do outro. Dentro de campo, o clima é quase sempre amistoso. Essa atmosfera reflete-se nas arquibancadas, onde a torcida do tricolor, composta, em sua maioria, pelo “povo”, provoca, respeitosamente, a do Leão da Barra – que mantém desde seus primórdios um perfil de classe média/alta.
outros clubes
das, o clube tricolor “papou” nada menos que 12 títulos estaduais. Nem mesmo Ypiranga e Galícia foram capazes de contê-lo. A necessidade de que um adversário à altura do tricolor despontasse era perceptível. Eis que o Vitória, humilhado pelo Bahia em 1939, quando perdeu por 10x1 – maior triunfo do confronto –, resolveu voltar a apostar no futebol, por meio do presidente Luiz Martins Catharino Gordilho. Bicampeão em 1908 e 1909, o rubronegro conquistou seu terceiro Baianão em 1953, liderado pelo atacante Quarentinha. A partir de então, a rivalida-
O primeiro Campeonato Baiano foi disputado em 1905 – é o segundo mais antigo do país, só perdendo para o Paulista. Dos quatro times – Vitória, Clube Baiano de Tênis, São Salvador e Internacional – participantes, só o Vitória ainda tem, hoje, um time profissional. Foi o rubro-negro que protagonizou a primeira rivalidade do futebol baiano – e não foi com o Bahia. No fim do século XIX, o grande clube da cidade era o Internacional, representante da comunidade inglesa. Como não podiam participar das partidas de críquete promovidas pelo clube, adolescentes baianos decidiram fundar o Vitória, em 1899. Em meio a isso, existia um sentimento patriota, com o rubro-negro constituindo-se como representante “brasileiro”, no confronto contra o Internacional, o time dos “estrangeiros”, no que foi a primeira grande rivalidade no esporte de Salvador.
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Salvador 2.715.000 habitantes
Redenção Futebol Clube ABB Estrela de Março Real Salvador São Cristóvão * Em 2006. O torneio de 2007 ainda não tem seus participantes definidos – a participação ocorre mediante inscrição
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História, por Leonardo Bertozzi / fotos Mauro Donato
O dia em que
Beckenbauer jogou no Canindé
Idealizada por Luciano do Valle, Copa Pelé trouxe ao Brasil craques como Breitner, Overath e Paolo Rossi, que jogou até no campus da USP
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Beckenbauer (camisa 5), em partida da Copa Pelé de 1989, no Canindé. Abaixo, Luciano do Valle
magine estádios como Pacaembu, Vila Belmiro e Canindé recebendo, nos dias de hoje, jogadores como os franceses Zidane e Cantona, o alemão Klinsmann, os italianos Baggio e Baresi e os argentinos Batistuta, Caniggia e Redondo. Não poderia, é claro, faltar o Brasil, também inspirado por figuras de destaque na história recente da Seleção. Tudo isso em um uma competição de duas semanas, com transmissão pela TV aberta. Um evento do tipo pode não passar de exercício de imaginação nos dias de hoje, mas, há duas décadas, aconteceu de fato. Na Copa Pelé, disputada por atletas veteranos e ex-jogadores, estiveram nos gramados brasileiros nomes do calibre de Franz Beckenbauer, Paolo Rossi e Rivellino. A criação da copa foi conseqüência direta do sucesso da Seleção Brasileira de Seniors, idealizada pelo narrador e empresário Luciano do Valle – que também fazia as vezes de técnico da equipe. A presença de jogadores como Jairzinho, Edu e Dario levava público aos estádios, durante as excursões da equipe pelo país, para jogos contra combinados locais, transmitidos pela TV Bandeirantes, aos domingos. “O futebol, na época, estava muito ruim”, conta Luciano. “A idéia era mostrar que o Brasil ainda tinha jogadores que podiam demonstrar habilidade. As pessoas estavam ávidas por bons jogos. Os estádios eram sempre lotados. Então, começamos a enfrentar países, como Argentina e Uruguai, até que decidimos juntar seleções campeãs do mundo para a Copa Pelé”. A primeira edição do torneio, em janeiro de 1987, contou com a participação de Brasil, Argentina, Uruguai, Itália e Alemanha Ocidental. Pelé, como convidado, defendeu o Brasil no primeiro jogo: vitória por 3 a 0 sobre a Itália, no Pacaembu. A equipe, porém, acabou derrotada duas vezes pela Argentina – uma delas, na final – e ficou apenas com o vice-campeonato. “Perdemos de forma absurda. O Djalma Dias foi recuar uma bola e deu no pé do jogador da Argentina. Passamos o jogo inteiro pressionando, e o Buttice pegou tudo”, lembra Luciano, referindo-se ao goleiro da Argentina, que havia atuado pelo Corinthians, nos anos 70. Rivellino, que fora seu companheiro de clube, ironiza o sucesso do argentino no reencontro: “Naquela final contra a Argentina, fizemos uma de nossas melhores partidas, mas o Buttice fechou o Março de 2007
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gol. Eu disse a ele: ‘Lá no Corinthians, você não pegava nada, entregava meu bicho. Aqui, você pega tudo’”.
Time reforçado
Herói de 1982, Paolo Rossi enfrentou o Uruguai no Cepeusp
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“A derrota de 1987 serviu de lição. Para 1989, reforçamos o time, nos preparamos mais”, lembra Luciano. Na segunda edição, o Brasil contou até com jogadores então em atividade, como o atacante Cláudio Adão, que jogaria pelo Corinthians no restante do ano. A II Copa Pelé, que teve como novidade a seleção do Reino Unido, proporcionou algumas cenas curiosas. Paolo Rossi, menos de sete anos após ser carrasco do Brasil durante a caminhada da Itália rumo ao título mundial de 1982, chegou a jogar no Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo (Cepeusp). Beckenbauer, que no ano seguinte venceria a Copa do Mundo
como técnico da Alemanha, desfilava sua classe no gramado do Canindé. Não por acaso, os estádios receberam bons públicos na maioria das partidas, e não apenas nas que envolviam o Brasil. A presença de tais personalidades foi possível, segundo Luciano do Valle, graças à boa repercussão do torneio, a um alto investimento em estrutura – bancado por um grupo forte de patrocinadores – e a importantes intervenções pessoais, como a de Júlio Mazzei, preparador físico da Seleção. Mazzei foi técnico de Beckenbauer, no New York Cosmos, no início dos anos 80. “O professor Mazzei tornou-se amigo do Beckenbauer, que também é amigo do Pelé. Beckenbauer ainda trouxe o Overath, outro campeão em 1974. Espalhou-se a notícia de que os jogadores eram bem tratados, a competição era organizada, eles ficavam em hotel cinco estrelas. O
nome do Pelé dava credibilidade ao projeto”, conta o locutor. Mais forte que dois anos antes, o Brasil chegou sem sustos à decisão. Com exceção de um empate por 1 a 1 com a Itália, na segunda rodada, o caminho foi sossegado: 3 a 0 no Reino Unido, 3 a 0 na Argentina, 2 a 0 na Alemanha e 2 a 0 no Uruguai. O jogo com os uruguaios serviu apenas para cumprir tabela, já que as duas seleções estavam garantidas na final. O time platino também havia batido britânicos, argentinos e alemães e empatado com a Itália – um belo 3 a 3 no Cepeusp. Na decisão, dia 2 de fevereiro, no Canindé, Cláudio Adão foi o nome do jogo. Marcou duas vezes no primeiro tempo, aos 6 e aos 45 minutos, e ampliou para 3 a 0, aos 4 do segundo. Siviero descontou, aos 25, para o Uruguai, mas a certeza da vitória brasileira veio cinco minutos de-
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pois, com Rivellino. Cabrera ainda marcou o segundo gol uruguaio, aos 42, decretando o placar final de 4 a 2. Naquela decisão, o Brasil jogou com: Paulo Vítor (Ado); Eurico, Luís Pereira, Jaime (Amaral) e Vladimir; Rocha, Batista, Zenon (Rivellino) e Mário Sérgio; Cafuringa (Chico Espina) e Cláudio Adão (Nunes).
Edições posteriores Nos anos seguintes, a competição ainda viveu alguns bons momentos. Em 1990, sem paciência para respeitar o “calendário” do torneio, foi criada a Copa Zico. Foi o primeiro campeonato com a nova denominação da categoria – Masters, em vez de Seniors, que, para Luciano, “dava impressão de velhice”. A história de 1989 repetiu-se, com o Brasil mostrando jogadores mais entrosados – era a única seleção permanente
Rivellino, à direita, foi o grande nome do Brasil. Abaixo, o troféu da Copa Pelé de 1989
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O Canindé lotou em jogos como a vitória do Brasil sobre o Reino Unido, por 3 a 0. Abaixo, a Seleção perfilada, antes da final contra o Uruguai
–, em melhores condições e conquistando o título com facilidade: 5 a 0 sobre a Holanda, na final. Em 1991, a Copa Pelé foi disputada pela primeira vez fora do Brasil, no Joe Robbie Stadium, em Miami. Na semana da competição, porém, estourou a Guerra do Golfo, e o torneio acabou sendo um fracasso de público. Novamente, o título ficou com o Brasil, que venceu a
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Argentina por 2 a 1, na final. A partir de 1993, a competição passou a ser organizada pela International Federation of Master Football, entidade criada na Europa, devido à repercussão da Copa Pelé. Naquele ano, a disputa aconteceu em Klagenfurt, na Áustria, e em Trieste, na Itália. Ao contrário das edições anteriores, era o Brasil a ter desvantagem
pela idade avançada de alguns jogadores. Os dois países-sede fizeram a final em Trieste, com vitória italiana por 2 a 0 sobre os austríacos. O Brasil deveria disputar o terceiro lugar contra a Alemanha, mas recusou-se, alegando não ter recebido os pagamentos devidos. Em 1995, foi disputado o último Mundial de Masters, já sem o nome “Copa Pelé” e sem a mesma repercussão dos anteriores. O Brasil foi campeão nos pênaltis, contra a Argentina. Desde então, o público tem visto os ídolos do passado apenas em “esportes” como showbol e futevôlei. Não seria possível repetir a experiência da Copa Pelé e trazer as lendas para perto do público brasileiro, em jogos de verdade? Rivellino acredita que sim e até sugere jogadores para um novo time: “Careca, Neto, Marcelinho... são jogadores de nome, que poderiam participar. Também os jogadores da Copa de 1994 que pararam. Daqui a pouco, o Romário, talvez o Edmundo. É um produto maravilhoso. Eu gostaria de assistir. Se pudesse atuar até hoje, estaria jogando”. “Apesar de terem vindo nomes extraordinários, se naquela época foi possível, hoje também seria. Já deveria funcionar há muito tempo”, acrescenta Luciano. Se assim é, que a competição aconteça rápido. O Canindé espera por Zidane.
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Crise na Itália, por Leonardo Bertozzi
Uma temporada para
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Mesmo em clássicos, como Catania x Palermo, torcedores não têm problemas para entrar com rojões nos estádios
Morte de policial é mais um capítulo de uma temporada melancólica para o futebol italiano. Estádios são inseguros, público cai e campeonato não tem emoção na disputa pelo título
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ilippo Raciti, o policial morto no dia 2 de fevereiro, depois do clássico entre Catania e Palermo, tinha 38 anos. Deixou mulher, Marisa, e dois filhos, Fabiana e Alessio. Como na maioria dos casos de morte por violência, os familiares não conseguem evitar as lembranças ruins de um dia que começou normal, dentro da rotina, nem a sensação de que nada poderia ser previsto – não por eles, pelo menos. O carro em que Raciti estava foi atingido por uma bomba atirada pelos torcedores do Catania, o que não deixa dúvidas de que o ato foi premeditado. O tumulto começou quando os policiais que escoltavam a torcida do Palermo foram atacados pelos “ultras” locais. Entre agentes de segurança e torcedores, mais de 100 pessoas ficaram feridas. Foram cenas de guerrilha, capazes de incluir o vermelhosangue na aquarela de manchas espalhadas pelo futebol italiano, nos últimos tempos. Horas após a morte de Raciti, o comissário extraordinário da federação italiana, Luca Pancalli, determinou a paralisação dos campeonatos do país. Na semana que se seguiu, uma série de reuniões, entre federação, comitê olímpico e governo, discutiu quais medidas de emergência deveriam ser adotadas antes que as competições fossem reiniciadas. Ficou determinado que os estádios não adequados às exigências do Decreto Pisanu – uma espécie de “estatuto do torcedor” italiano, editado em 2005, mas que vinha tendo sua entrada em vigor adiada – não poderiam receber público até se enquadrarem nas normas. Além disso, as penas previstas para os cidadãos flagrados em atos de violência ligados a futebol foram reforçadas. A Série A recomeçou no fim de semana seguinte, e não se registraram incidentes significativos. A medida de maior sucesso foi a inibição à presença dos torcedores visitantes, pelo veto à venda de ingressos em bloco – o que impede as viagens organizadas, que habitualmente resultavam em baderna não apenas na cidade de destino, como também durante o percurso. As poucas medidas, porém, não são suficientes para dissipar a dúvida fundamental: por que só foram tomadas depois de mais uma tragédia? No fim de semana anterior, um dirigente havia sido morto, ao tentar separar uma briga generalizada em uma partida amadora. Em vez de agirem imediatamente, as autoridades preferiram esperar outro corpo.
“As medidas adotadas pelo governo são claramente tardias”, avalia o jornalista Marcel Vulpis, diretor da agência de notícias italiana SportEconomy. “Não era preciso esperar o morto para ativá-las. A situação é perigosa em toda a Itália há muito tempo, e todos sabiam. Jogar com estádios vazios é a resposta desesperada de um Estado que não consegue mais controlar a delinqüência que impera no território nacional. Esses violentos são os mesmos que vamos encontrar daqui a 20 anos sem trabalho e dispostos a tudo pelas ruas”. As novas leis impedem qualquer tipo de associação financeira ou de trabalho entre clubes e torcidas organizadas. Para Vulpis, a solução ideal seria a extinção dos grupos de “ultras”: “Não creio que seja preciso ir ao estádio em um grupo de 100 pessoas para sentir-se satisfeito. Basta apenas um amigo, ou a namorada. É claro que esses grupos também perseguem outros objetivos extra-esportivos”, argumenta. O ex-jogador Mazzola (Altafini, para os italianos), hoje comentarista de televisão, também aponta o dedo para as organizadas: “É um problema muito grave: parte das torcidas é financiada pelos clubes. Elas ameaçam se não recebem ingressos de graça, se as viagens não são pagas. É mais do que ameaça, é como se estivessem pedindo um resgate”. Mazzola, que atuou na Itália entre 1958 e 1976, passando por Milan, Napoli e Juventus, identifica uma degradação da educação do italiano, especialmente se comparada aos dias em que jogava. “Havia casos em que a torcida ficava sentada à beira do campo, e ninguém ultrapassava a linha. Hoje, nos estádios ingleses, há até crianças sentadas na primeira fila, e não acontece nada, porque é outra educação esportiva”.
Elefantes brancos O exemplo inglês é recorrente nas discussões sobre a crise italiana, já que o país teve êxito em uma difícil luta contra os “hooligans”. A Inglaterra é modelo não apenas pelo combate à violência, como também pela estrutura dos estádios. Para começar, a maioria pertence aos clubes, enquanto, na Itália, grande parte é das prefeituras – o que não apenas impede que os times explorem um grande potencial de marketing, como também causa um jogo de transferência de responsabilidades, na hora de fazer as reformas. Março de 2007
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Orietta Scardino/EFE
A Itália organizou a Copa do Mundo de 1990, mas cometeu erros de avaliação, na hora de construir os estádios. Hoje, alguns deles são verdadeiros “elefantes brancos”, como o San Nicola de Bari. Com capacidade para quase 60 mil torcedores, o estádio ainda recebeu a final da Copa dos Campeões entre Estrela Vermelha e Olympique de Marselha, em 1991. Hoje, o Bari disputa a Série B, em um estádio semideserto – a média de público tem sido inferior a 9 mil pessoas. Ironicamente, o estádio que simboliza os equívocos de 1990 foi palco de um embaraçoso episódio no ano passado. A partida entre Reggina e Juventus, pela última rodada da Série A na temporada 2005/6, foi disputada no San Nicola, depois de o time de Reggio Calabria perder um mando de campo. As evidências do esquema de influência sobre árbitros encabeçado pelo diretor geral da Juve, Luciano Moggi, já haviam sido amplamente difundidas pela imprensa italiana, mas isso não impediu o time de festejar em campo a conquista do título, com a vitória por 2 a 0. Meses depois, com as punições a Juventus e Milan, o “scudetto” de 2005/6 seria atribuído à Inter, e a Vecchia Signora ainda perderia o título da temporada anterior – que foi declarado “vago”. Além do gigantismo, os estádios italianos ainda pagam por preciosismos arquitetônicos e adendos desnecessários, como pistas de atletismo, que praticamente não são utilizadas e ainda tiram da torcida o prazer de ficar perto do gramado e sen-
tir-se parte do espetáculo. Esse era um dos principais problemas do Delle Alpi, de Turim, que nunca caiu nas graças dos fãs da Juventus e deve vir abaixo em breve, para dar lugar a um novo estádio, mais adequado aos padrões atuais. Hoje, os Bianconeri dividem com o rival Torino o Olímpico de Turim, antigo Comunale, reformado para os Jogos Olímpicos de Inverno de 2006. “Os estádios do Mundial de 90 nasceram deficientes. Só um louco poderia imaginar que as pessoas se divertiriam vendo uma partida precisando conviver com pistas de atletismo ou barreiras arquitetônicas de gosto duvidoso. Seria preciso ir buscar os nomes daqueles ‘fenômenos’
da época que os projetaram e descarregaram o custo na coletividade”, critica Vulpis, da SportEconomy. Além da falta de segurança, a má condição dos estádios ajuda a afastar os torcedores. A média de público da Série A não ultrapassa a casa dos 20 mil espectadores. “Os italianos não vão ao estádio porque os custos dos ingressos são muito elevados e porque os estádios dão nojo. Some-se a isso o risco de envolver-se em episódios como o de Catania”, lembra o jornalista. A Itália é candidata a receber a Eurocopa de 2012 – a decisão da Uefa está prevista para 18 de abril, mesmo dia em que devem ser realizados os jogos adiados, após
Cenário de guerra: conflito entre torcedores e policiais tomou as ruas de Catania
cronologia das mortes no futebol italiano As mortes no futebol italiano, infelizmente, não são uma novidade deste século. Embora o contexto e as razões mudem, desde 1962 a violência dentro e fora dos estádios deixou dezenas de mortos e centenas de feridos. Veja abaixo alguns dos casos de maior repercussão.
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ABRIL DE 1962 Gaetano Plaitano foi vítima de um disparo da polícia, em uma partida entre Salernitana e Potenza, pela Série C. Os policiais tentavam conter o tumulto provocado por torcedores, após um pênalti não marcado. Ficaram feridas outras 57 pessoas.
OUTUBRO DE 1979 O mecânico Vincenzo Paparelli, torcedor da Lazio, foi morto por um rojão atirado pela torcida da Roma, durante um clássico. Paparelli, que tinha 33 anos, foi atingido no olho. Foi a primeira morte provocada por torcedores rivais.
FEVEREIRO DE 1984 Stefano Furlan, torcedor da Triestina, morreu por lesões cerebrais sofridas em confronto com a polícia durante jogo contra a Udinese. Os policiais entraram em ação para conter um tumulto entre as duas torcidas rivais.
SETEMBRO DE 1984 Marco Fonghessi, torcedor de 21 anos do Milan, foi esfaqueado após uma partida contra a Cremonese, em Milão. O assassino, Giovanni Stefano Centrone, de 18 anos, confundiu ele com um torcedor rival. O criminoso foi condenado a 22 anos de prisão.
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Ciro Fusco/EFE
O Estádio San Paolo, em Nápoles, é um dos vetados devido às novas normas de segurança
OUTUBRO DE 1988 O torcedor do Ascoli Nazzareno Filippini, de 32 anos, morreu após ser espancado por torcedores da Inter, durante uma briga entre as torcidas, no Estádio Cino e Lillo del Duca. Quatro torcedores interistas foram presos.
a morte de Raciti. Mesmo com o período complicado por que passa seu futebol, o país ainda é favorito, contra as candidaturas conjuntas de Croácia-Hungria e Polônia-Ucrânia, que também se vêem às voltas com adversidades internas, como problemas políticos e falta de apoio. Ainda que possa ser vista como um impulso bem-vindo para a modernização da estrutura dos estádios, uma eventual escolha da Itália como palco da competição européia poderia ser encarada pelos dirigentes como uma vitória do modelo atual de organização – o que aconteceu com o título na Copa do Mundo de 2006. “O tetracampeonato pode fazer mal so-
JUNHO DE 1989 Antonio de Fanchi, torcedor da Roma, sofreu um ataque cardíaco e morreu enquanto fugia de um grupo de torcedores do Milan. Três dos milanistas foram processados, e um deles condenado a sete anos de prisão.
bretudo à classe de dirigentes esportivos, que acredita que, com uma medalha e uma copa, acabam em glória. Podemos até ter conquistado o título, mas continuamos sendo um país de terceiro mundo, no que diz respeito à cultura esportiva”, alerta Vulpis.
Justiça ineficiente Os festejos pela vitória na Alemanha duraram poucos dias e deram lugar ao julgamento dos clubes envolvidos no escândalo que ficou conhecido como Calciocaos. A diferença entre os veredictos iniciais e o resultado final das punições evidenciou a complexidade e a questionável eficiência do sistema judicial esportivo italiano.
JANEIRO DE 1995 Vincenzo Spagnolo, torcedor do Genoa, morreu esfaqueado por Simone Barbaglia, fã do Milan, antes da partida entre os dois clubes. A rodada do fim de semana seguinte foi adiada, em respeito à vítima.
SETEMBRO DE 2003 O torcedor do Napoli Sergio Ercolano, de 20 anos, caiu do anel de arquibancadas do estádio do Avellino, enquanto era perseguido por torcedores locais. Ele morreu no hospital, dois dias depois.
Os tribunais da federação italiana deram sentenças de primeiro e segundo grau, mas as decisões definitivas couberam ao comitê olímpico, que concedeu descontos a quatro dos seis clubes punidos, com o campeonato em andamento. Em resumo, o órgão regulador do futebol no país não tem a última palavra na hora de penalizar clubes e dirigentes. Apesar de reconhecer a necessidade de punir os clubes cujos dirigentes se envolveram no esquema, Mazzola acredita que o processo tenha sido conduzido de forma equivocada, com os times – e seus torcedores – pagando mais que os responsáveis diretos pelo escândalo. A razão, segundo ele, foi a escolha de pessoas não ligadas ao futebol para coordenar os julgamentos. “O escândalo foi julgado por gente incompetente, que não podia decidir sobre futebol. Eles estragaram e enfraqueceram o campeonato. Restou apenas um time, a Inter. A Juventus está na segunda divisão, Fiorentina e Milan tentam recuperar posições, a Lazio também. Sobrou a Roma, que não tem estrutura para conciliar Liga dos Campeões e Campeonato Italiano”, comenta o ex-jogador. Pouco tempo atrás, a elite do futebol italiano tinha sete equipes capazes de brigar pelo título do campeonato. Essa lembrança reforça a melancolia dos torcedores, que só podem esperar que esta temporada termine logo. Leia mais sobre crise na Itália na coluna Fuoriclasse, em www.trivela.com
JANEIRO DE 2007 O dirigente Ermanno Licursi, da Sammartinese, foi agredido até a morte, ao tentar separar uma briga generalizada, em partida contra a Cancellese, por uma liga regional de Cosenza. Licursi tinha 40 anos.
FEVEREIRO DE 2007 O policial Filippo Raciti, de 38 anos, morreu ao ser atingido por uma bomba lançada por torcedores do lado de fora do estádio Angelo Massimino, em Catania, na ocasião do clássico entre Catania e Palermo.
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Entrevista, por Oliver Birkner
“Ficou provado que ”
eu tinha razão
Francesco Totti conta como denunciou favorecimentos à Juventus e acabou punido
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m 5 de março de 2005, a Roma perdeu por 2 a 1 para a Juventus, em pleno Estádio Olímpico. O gol da vitória foi marcado por Alessandro del Piero, num pênalti duvidoso, aos 44 minutos do primeiro tempo. Ao final da partida, quando questionado sobre o jogo, Francesco Totti, capitão romanista, não hesitou: “Fica difícil ganhar uma partida com 11 homens de um lado e 14 do outro”. Por essa declaração, acabou punido. Dois anos depois, com o esquema de manipulação de resultados escancarado pela mídia, Totti relembra aquele dia. “Ficou provado que eu tinha razão”. Agora, o “Capitano” diz ter aprendido a lição e, mais maduro, estar mais calmo dentro de campo – a ponto de não repetir erros como a cusparada que deu em Poulsen, durante a Eurocopa de 2004, em Portugal. “Aquilo foi um erro, e já pedi desculpas”. Nesta entrevista concedida à revista alemã Kicker, publicada com exclusividade no Brasil pela Trivela, Totti conta a história do garoto que saiu das arquibancadas para brilhar no Olímpico e comenta o fim do romantismo no futebol. “Hoje em dia, o que mais importa são os negócios”, comenta. O italiano relembra o início de sua ligação com a equipe da capital. Ainda garoto, estava nas arquibancadas torcendo pelos Giallorossi. Quando começou a despontar como jogador, recebeu propostas de Lazio e Roma – e não teve dúvidas sobre para onde iria. Desde então, começou uma história que teve, em 2001, seu ponto mais alto: a conquista do “Scudetto”, com grande participação do capitão da equipe. Mais recentemente, conquistou o título mundial com a Azzurra, feito que nem Paolo Maldini alcançou. O jogador conta também como aprendeu a rir de si mesmo, depois de muito tempo sendo satirizado por sua suposta falta de inteligência. Lançou dois livros com piadinhas a seu próprio respeito, que foram best-sellers na Itália por vários meses e suas rendas reverteram em benefício de ações da Unicef.
Afinal, qual sua piada favorita? Como? Você não editou dois livros de grande sucesso, com piadas sobre si próprio, com a renda destinada a organizações de caridade? Ah, agora entendi (risos). No começo, não sabia bem como lidar com essa história do livro, mas, após os lançamentos, me senti menos inseguro. Isso até ajudou minha imagem a mudar, aqui na Itália. Antes, eu era considerado burro; agora, dizem que aprendi a rir de mim mesmo. O futebol da Itália passa por uma grande crise, que começou com o “Calcio-
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caos”. O que ficou provado com o escândalo do último verão europeu? Alguns anos atrás, depois de um jogo contra a Juventus, comentei que era impossível ganhar uma partida de 11 contra 14. Por causa dessa declaração, acabei punido e suspenso. Desde então, comecei a me segurar em meus comentários. Aprendi que não tenho a menor chance contra os todopoderosos. Depois que estourou todo o escândalo, ficou provado que eu tinha razão. A punição aos envolvidos foi adequada? Se levarmos em consideração todos os fatos, sob hipótese alguma – e ainda acabaram reduzidas.
Dá para dizer que o futebol italiano está mais limpo do que antes? Espero que sim, mas acho que, para chegarmos a uma conclusão, precisamos esperar até o fim da temporada. Na 14ª rodada, no começo de dezembro, foram marcados dois pênaltis a favor da Roma, na vitória por 2 a 1 sobre a Atalanta. Depois da partida, muita gente comentou que a equipe, como a Juventus, havia sido favorecida. O que você acha disso? A Roma nunca foi beneficiada por juiz nenhum. Muito pelo contrário! Esse tipo de bobagem diz quem tem inveja da gente, do nosso futebol de espetáculo, que incomoda muita gente. Ganhamos sempre dentro de campo, sem precisar de ajuda alguma. O que significa para você, um romano, ser o capitão da Roma? É algo difícil de ser descrito em palavras. Temos os torcedores mais apaixonados da Série A. Além disso, cresci dentro do clube: era torcedor, ia ao Olímpico e jogo aqui desde os 17 anos. Posso dizer que é uma mistura de orgulho e enorme satisfação. E muita pressão? Não necessariamente. Prefiro falar em responsabilidade – ainda mais por ser um capitão romano aqui na Roma. Isso me torna uma peça ainda mais importante, para que tudo nesta grande equipe funcione direito. Isso nem sempre é fácil. Com o status que você tem, não deve ser seguro nem ir ao cinema, não? Adoraria poder fazer esse tipo de coisa, mas, para um jogador de futebol, a vida
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Juan Carlos Cรกrdenas/EFE
A Roma nunca foi beneficiada por juiz nenhum. Muito pelo contrรกrio
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Francesco Totti Nascimento: 27/setembro/1976, em Roma Altura: 1,80m Peso: 82kg Carreira: Roma (desde 1989)
Títulos: Copa do Mundo de 2006; Campeonato Italiano de 2001; Supercopa Italiana de 2001; Eurocopa sub-21 de 1996
Claudio Peri/EFE
Pela seleção: 58J / 9G
Cometi um erro durante a Eurocopa e pedi as devidas desculpas. Basta.
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pessoal torna-se naturalmente algo difícil. A atmosfera de Roma, que é bem diferente, ajuda um pouco. Aqui, torcedores e jogadores são unidos de uma maneira muito forte emocionalmente, quase como irmãos. Então, como você faz para se locomover por Roma? Ando levemente disfarçado ou de capacete, quando estou com minha Vespa. Adoraria poder visitar com tranqüilidade alguns lugares da cidade, onde gostava de ir em minha juventude. Por outro lado, sei que isso faz parte do meu trabalho e que esse é o preço que pagamos pela fama. É verdade que você recebeu uma proposta da Lazio, quando estava começando no futebol? Sim, Lazio e Roma me fizeram propostas ao mesmo tempo. Não tive nem de pensar para tomar minha decisão. Como torcedor da Roma, jamais poderia aceitar um convite da Lazio. Era algo impossível de cogitar. Por que, hoje, há tão poucos jogadores como você ou Maldini, que ficam tanto tempo no mesmo clube?
Talvez, isso aconteça porque, hoje, as coisas no mundo do futebol acontecem muito rapidamente e, muitas vezes, as promessas acabam não sendo cumpridas. Tenho grande orgulho de ser o símbolo da Roma e de vestir a camisa “giallorossa” e quero fazê-lo até o fim da minha carreira. Você acha que, no passado, o futebol era mais romântico? Acho que era mais despretensioso e divertido. Se, no futuro, continuar trabalhando nesse ramo, gostaria muito de treinar crianças. Hoje em dia, o que mais importa no futebol são os negócios – há muito dinheiro, muita publicidade e muitos outros elementos que colocam o esporte em segundo plano. Além disso, há pessoas que não gostam de futebol, mas que se utilizam desse meio apenas para ganhar dinheiro. Em 2004, você teve um ano para ser esquecido. O que aconteceu naquela época ainda passa por sua cabeça? Cometi um erro durante a Eurocopa (Totti deu uma cusparada no dinamarquês Poulsen e acabou expulso) e pedi as devidas
desculpas. Basta. Depois, me acusaram de algumas coisas que não condiziam com a realidade. Posso garantir que aquele incidente não me assombra mais. Além dessa história, a Roma, naquela temporada, viveu um verdadeiro caos nos bastidores. No total, nada menos do que quatro treinadores (Cesare Prandelli, Rudi Völler, Luigi del Neri e Bruno Conti) passaram pelo comando da equipe. O que aconteceu? Naquele ano, deu tudo errado. Foi uma temporada terrível, mas esse tipo de coisa infelizmente acontece, mesmo em clubes com enorme prestígio. Entre outros, naquele período, você foi treinado por Rudi Völler. Que tal trabalhar com ele? A chegada dele em Roma foi cercada de grande entusiasmo. Ele é amado por aqui, desde seus tempos de jogador. Lembro de gritar seu nome das arquibancadas, quando era um garoto. Depois de tê-lo conhecido pessoalmente, minha admiração por ele aumentou ainda mais. Há dois anos, você parecia mais nervoso em campo do que hoje. Antes de sua grave contusão, em fevereiro do ano passado, e principalmente agora, temos visto um Totti mais amigável e jogando bem. O que isso significa? Não é nada mais que uma evolução. Estou com 30 anos e bem mais maduro. Além disso, passei a ver as coisas com uma outra perspectiva, desde que me tornei pai. É até difícil acreditar como nosso comportamento muda de maneira positiva, depois disso. Em breve, terei meu segundo filho e não quero parar por aí. Quero ter pelo menos cinco crianças. Recentemente, você foi alvo de duras críticas, por sua decisão de não voltar a defender a seleção italiana neste ano. Por que essa decisão? Conversei com Donadoni e disse a ele quais eram meus motivos para não ter jogado depois da Copa do Mundo, e ele os aceitou. Isso continua valendo. Não entendo: por que temos que tornar tudo público? Para ser sincero, não estou nem aí para as polêmicas. Ao longo de minha carreira, tive o suficiente delas – e superei todas.
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Embaixadas Itália, por Cassiano Ricardo Gobbet
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Milão em febre Matteo Bazzi/EFE
Ronaldo tem a última grande oportunidade da carreira para conquistar os troféus que seu talento merece
Uma imagem inusitada até pouco tempo atrás: Ronaldo “rossonero”
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esmo antes do início da temporada, sabia-se que o tempo de Ronaldo em Madri tinha acabado. Ao recusar a oferta do Milan, de €15 milhões, em junho, o clube espanhol fez um favor ao italiano, que o contratou pela metade do preço, em janeiro – e o brasileiro já provoca febre na cidade. A estréia de Ronaldo contra o Livorno foi ótima, mas sua segunda partida, contra o Siena, é que ensandeceu a massa “rossonera”. Ronaldo mostrou o futebol que o consagrou, com velocidade, força e técnica, além de uma liderança que o ataque milanista certamente precisava. Em duas partidas, ele conquistou a parte de Milão que o detestava. O encaixe de Ronaldo no elenco foi igualmente bom, até agora. O jogador deu ao técnico Carlo Ancelotti uma opção que pode jogar de maneira eficiente com qualquer um dos atacantes do time. Até então, Ricardo Oliveira era o único que tinha um estilo compatível seja com Gilardino, seja com Inzaghi. As casas de apostas na Itália apontam para um Ronaldo terminando a Série A com nove gols. O número não seria ruim, mas os planos do clube para o atacante são primordialmente para o futuro. Só na próxima temporada é que Ronaldo poderá jogar a Liga dos Campeões em “rossonero” – o verdadeiro objetivo do clube e do jogador. Apesar da festa, ainda há uma certa preocupação por parte da torcida, em relação ao brasileiro. Sua chegada foi cercada de festa, mas como será sua despedida? Seus últimos três clubes não guardam boas lembranças dele e, de fato, mesmo tendo jogado bem em todos, Ronaldo teve um gerenciamento de relações públicas bem fraco. O desejo milanista de formar um ataque “dos sonhos”, com Kaká, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho, não é uma hipótese para vender jornal. Depois de uma temporada enterrado na mais pura lama, entre escândalos, contusões e mau futebol, o Milan deve ir pesado ao mercado, para reaver prestígio. Uma oferta surreal para garantir o outro Ronaldo não está descartada. Prova disso é que, pela primeira vez em anos, os dirigentes milanistas passaram a se referir a uma possível contratação do craque do Barça em termos concretos. “Seria um valor muito alto, mas o pagamento poderia ser em parcelas”, afirmou Adriano Galliani, vice-presidente do Milan, quando perguntado sobre a possibilidade. Para Ronaldo, não seria nada mal. Na sua idade, ninguém questiona seu valor, mas, para um jogador de seu calibre – certamente o maior atacante brasileiro desde Romário –, um título espanhol, uma Copa Uefa e uma Recopa Européia na bagagem clubística são muitíssimo pouco. O Milan é a chance de o craque redimir-se – e também de preparar uma saída do clube em paz com a torcida, para variar.
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Espanha, por Ubiratan Leal
De cima para baixo Briga de Eto’o com Rijkaard e Ronaldinho originou-se na direção do clube e espalhou-se pelo elenco
Cisão na diretoria acabou causando desentendimentos entre Ronaldinho e Eto’o
Guido Manuilo/EFE
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cena de Eto’o desancando meio Barcelona, durante uma entrevista coletiva, teve grande repercussão pelo mundo. Aqui, no Brasil, o foco dos comentários foi uma eventual rixa, motivada por inveja, entre o camaronês e Ronaldinho. Na verdade, o caso é mais complexo do que apenas uma crise de estrelismo de dois jogadores e envolve a diretoria do clube catalão. Quando foi eleito, Joan Laporta tinha como vice na chapa seu amigo Sandro Rossell. Foi Rossell, aliás, quem teve participação decisiva na ida de Ronaldinho ao Camp Nou, aproveitando o bom contato que tinha com o meia-atacante, desde que foi diretor da Nike no Brasil. Com um projeto de modernizar o clube e, eventualmente, até aceitando colocar patrocinadores na camisa, Laporta foi eleito, em 2003. Após duas temporadas, não havia mais esse clima de paz. O presidente era muito próximo de Johann Cruyff (Laporta é advogado do holandês), e a influência do ex-craque sobre o dirigente cresceu demais – a ponto de Laporta romper com Rossell e boa parte do conselho, descontente com os novos rumos que a administração seguia. Esse racha teve efeito no elenco. O vice-presidente não era apenas amigo de Ronaldinho. Tratava-se também do maior defensor do grande contingente brasileiro na equipe (hoje, o time tem Ronaldinho, Edmílson, Belletti, Sylvinho e Thiago Motta, além do naturalizado Deco). Isso também significava que ele era um dos principais partidários de diminuir a quantidade de holandeses no elenco culé.
É natural que um racha na diretoria tivesse efeito parecido nos jogadores. Ainda no início da temporada 2005/6, Xavi – um dos líderes do elenco – havia “sugerido” que Cruyff falasse menos sobre o Barcelona, deixando claro que as opiniões do ex-craque holandês atrapalhavam o grupo. Nos últimos meses, pode-se dizer que Laporta e o técnico Rijkaard foram extremamente hábeis em conter as forças que agiam no elenco. O problema é que, para isso, tiveram de fazer concessões. Por exemplo, há quem considere que Ronaldinho tenha privilégios – reforma salarial vantajosa e mais tolerância com folgas e amistosos de seleção –, por ser o melhor jogador do time e ainda estar sob a influência de Rossell. No entanto, é inegável
que todas as estrelas do elenco barcelonista tiveram uma boa renovação de contrato, em junho de 2005, logo após a conquista do Campeonato Espanhol. Foi por isso que Eto’o rejeitou as críticas de que não se dedicaria ao grupo feitas por Rijkaard após o atacante negar-se a entrar em campo, contra o Racing Santander. A reação do camaronês foi exagerada e fora de hora, mas apenas expôs um problema que consome silenciosamente o ambiente “blaugrana” há um bom tempo. A diretoria e, principalmente, Rijkaard não têm mais condições de conter essa crise. Por isso, a não ser que algum fato novo mude drasticamente a situação no clube, o técnico holandês dificilmente manterá seu emprego ao fim da temporada. Março de 2007
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Phil Noble/Reuters
Inglaterra, por Tomaz R. Alves George Gillett (esq.) e Tom Hicks prometem investir em reforços para o time
Os ianques já chegaram Clubes ingleses são lucrativos, têm fama mundial e são fáceis de serem comprados. Então, nada mais lógico que a chegada de investidores estrangeiros
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alcolm Glazer, Randy Lerner e, agora, a dupla George Gillett Jr e Tom Hicks. Os ianques definitivamente estão invadindo a Premier League. Para os ingleses, chega a ser quase uma afronta ao orgulho nacional o fato de que três clubes importantes do país – Manchester United, Aston Villa e Liverpool – tenham como donos norte-americanos. Pode-se dizer quanto quiser que os empresários dos Estados Unidos não sabem nada de futebol. No entanto, é inegável que de negócios eles entendem. Hoje, a Premier League é um investimento extremamente atraente – talvez, o mais rentável e seguro dentro do mundo do futebol. Bons investimentos, inevitavelmente, atraem compradores. Esses investidores norte-americanos são bem diferentes dos Roman Abramovichs da vida. Não há suspeitas de lavagem de dinheiro, nem ego ou vontade de ajudar o time do coração. É um investimento financeiro, puro e simples. Para explicar por que os clubes da Premier League são bons investimentos, vejamos alguns números. Atualmente, os 20 times da primeira divisão faturam por volta de € 1,9 bilhão por ano.
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A partir da próxima temporada, com a entrada em vigor dos novos contratos de TV, o faturamento subirá para € 2,5 bilhões. Nada mal, não é? Para melhorar, diferentemente do que acontece em outros países, as fontes de renda dos clubes ingleses são bem distribuídas, entre direitos de TV, venda de ingressos, licenciamentos e outros negócios. Enquanto isso, clubes como a Juventus, por exemplo, têm 70% de seu faturamento advindo da TV – o que os torna um investimento muito mais arriscado. Além disso, os clubes ingleses têm tradição e apelo mundial. A Premier League é o campeonato transmitido em mais países do mundo, alcançando quase 200 nações. Por isso, o potencial internacional de uso de imagem de um Liverpool é muito maior do que de um Atlético de Madrid ou um Borussia Dortmund, por exemplo. Com isso, as aquisições de equipes da Premier League por estrangeiros não devem parar. Arsenal, Newcastle e Everton aparecem como prováveis alvos. Há dois anos, temia-se que clubes como esses acabassem nas mãos de bilionários russos. Agora, tudo indica que vão parar nas mãos de capitalistas norte-americanos.
Clubes com donos estrangeiros Aston Villa Randy Lerner (EUA) Chelsea Roman Abramovich (Rússia) Fulham Mohammed al Fayed (Egito) Liverpool George Gillett Jr e Tom Hicks (EUA) Manchester United Malcolm Glazer (EUA) Portsmouth Alexandre Gaydamak (França/Rússia/Israel) West Ham Bjorgolfur Gudmundsson (Islândia)
Clubes com donos da Comunidade Britânica Arsenal Blackburn Bolton Charlton Everton Manchester City Middlesbrough Newcastle Reading Sheffield United Tottenham Watford Wigan
Danny Fiszman Walker Trust Eddie Davies Richard Murray Bill Kenwright John Wardle e David Makin Steve Gibson Freddy Shepherd John Madejski Kevin McCabe Joseph Lewis Lord Ashcroft Dave Whelan
* Legalmente, os donos de muitos clubes são pessoas jurídicas; em alguns casos, as ações estão espalhadas entre vários donos. Na medida do possível, ligamos o clube à pessoa que na prática manda nele
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Alemanha, por Carlos Eduardo Freitas
E Inverno entre o céu e o inferno Thomas Bohlen/Reuters
Werder Bremen e Mainz 05, respectivamente líder e lanterna no primeiro turno, trocam de papéis no início do returno da Bundesliga
Zidan chegou do Werder Bremen e marcou seis dos dez gols do Mainz, no segundo turno
Desempenho na Bundesliga 1º 3º
Werder Bremen
6º 9º
1º turno
2º turno
12º 15º Mainz 05 18º
Rodada 17ª
18ª
19ª
20ª
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m 2006, tanto São Paulo quanto Internacional, campeão e vice do Brasileirão, citaram a pausa de um mês proporcionada pela Copa do Mundo como decisiva na arrancada que ambos deram no torneio, no segundo semestre. Na Alemanha, a tradicional pausa de inverno, que separa o primeiro do segundo turno, ocorre todo ano e tem também esse papel de dividir águas. Werder Bremen e Mainz 05 são excelentes exemplos – antagônicos – de como o destino pode mudar, após o mês de inatividade no futebol alemão. Os alviverdes, repletos de astros, terminaram a primeira metade da temporada na ponta (empatados com o Schalke 04, com 36 pontos). Do outro lado da tabela, o Mainz era o lanterna isolado, com apenas uma vitória e 11 pontos conquistados. Eis que, no início do segundo turno, os rumos se inverteram. Nos seis primeiros jogos, o 05 venceu cinco vezes e empatou uma – isso mesmo: conquistou 16 pontos, cinco a mais do que em toda a metade inicial do campeonato. Com isso, deixou a lanterna e chegou ao 10º posto. Do outro lado, o Bremen caiu para a terceira colocação, com apenas uma vitória, quatro empates e uma derrota desde a parada. Do lado alvirrubro, o que fez a diferença foram as contratações realizadas na janela de transferências. Sem gastar um tostão, a equipe trouxe por empréstimo Mohammed Zidan e Leon Andreasen, ambos do... Werder Bremen. Reservas nos alviverdes, tornaram-se referência, sob a batuta de Jürgen Klopp. Nesse período, o egípcio marcou seis dos dez gols do Mainz, enquanto o dinamarquês fez três. Além disso, virou o guardião da defesa, que passou do posto de segunda mais vazada no primeiro turno para o de segunda mais sólida do returno. Pelo lado de Bremen, o bom desempenho na metade inicial dá mostras de ter sido fruto do início antecipado das atividades físicas do clube, que começaram com a Copa do Mundo ainda em andamento – sobretudo pela aposta de que o time iria mais longe do que foi na Liga dos Campeões. Como a equipe está na Copa Uefa, Thomas Schaaf não pôde diminuir a carga de treinamentos durante o inverno. Muito por conta disso, a lista de jogadores no departamento médico nestes primeiros meses de 2007 cresce a cada rodada: Borowski, Frings, Mertesacker, Naldo, Klose e Klasnic são os desfalques mais freqüentes. Bremen e Mainz são os exemplos mais emblemáticos, mas a queda do Bayern de Munique e a ascensão do Hannover 96 também poderiam muito bem ser usadas para mostrar que a pausa de inverno é capaz de apagar a tênue linha entre céu e inferno, na Bundesliga. Março de 2007
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Robert Pratta/Rueters
França, por Ricardo Espina Carlos Eduardo Freitas/Trivela
Portugal, por Zeca Marques
Savidan (dir.): de lixeiro a artilheiro na França
Felipão deixará a seleção portuguesa em 2008
Quem será o próximo? L
uiz Felipe Scolari estreou como técnico de Portugal em fevereiro de 2003, num amistoso com a Itália. A “era Felipão” tem data certa para terminar: julho de 2008, após a Eurocopa da Suíça-Áustria. Desta vez, não assistiremos às novelas da renovação do contrato, como ocorreu durante a Euro-2004 e o Mundial-2006. Scolari anunciou que não emplacará um novo acordo, pois entende que terá passado tempo demais no comando dos Tugas. Portugal obteve, nos últimos anos, um reconhecimento e um respeito que o colocam entre as grandes equipes do futebol mundial. Para manter o nível, será necessário um novo técnico vitorioso e carismático à frente de um elenco em renovação. Hoje, o português que mais se encaixa nesse perfil é o polêmico José Mourinho, cujo casamento com o Chelsea também parece próximo do fim. A seleção lusa padece historicamente de um complexo de “vira-latas”, que atravanca os triunfos do escrete nacional. Mourinho é o único treinador português que sabe lidar com situações psicológicas adversas e extrair o máximo de seu elenco (como demonstrou em sua passagem no Porto). Além disso, conhece tática e estratégia de jogo como poucos e sonha com o cargo máximo do futebol português. Mourinho, porém, é tido como arrogante e difícil. A questão, portanto, é: será que a torcida e os jogadores também sonham com ele?
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Máquina de fazer gols O
Valenciennes está distante da briga por uma vaga em competições européias, quanto mais da disputa para ficar com o título da Ligue 1. Contudo, o time, que luta contra o rebaixamento, conta com um dos principais destaques da temporada. Eis uma prova de que sempre é bom ficar de olho nos clubes que não figuram na ponta da tabela. No VA, o brilho vem do ótimo desempenho de um ex-barman e lixeiro. Steve Savidan conta em seu currículo com passagens por diversos clubes modestos. Em 2004/5, ele foi o goleador da National (terceira divisão), pelo próprio Valenciennes, onde o atacante de 28 anos encontrou seu lugar. Artilheiro da Ligue 2 em 2005/6, ele foi um dos principais responsáveis pelo retorno do clube à primeira divisão, após 13 anos. Coube a Savidan fazer esquecer que a equipe se tornou mais conhecida pelo escândalo de suborno de 1993, ao lado do Olympique de Marselha. Essa missão, o atacante cumpre com muitos gols. Até a 25ª rodada, ele havia feito 13, sendo o goleador do torneio. Para completar, deu duas assistências – ou seja, participou de 57,7% dos gols marcados pelo Valenciennes. Os quatro gols em cima do Nantes, na 24ª rodada, não foram apenas sorte ou um lampejo. Savidan tem provado ser um jogador de qualidade e um ótimo finalizador. Agora, ele caminha para mais um feito: ser o artilheiro das três principais divisões francesas em temporadas consecutivas.
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África, por Marcus Alves Olivier Hoslet/EFE
Mohamed Kallon é dono de um time em seu país natal, Serra Leoa
Prazer, N FC Kallon Estreante, o clube do atacante do Monaco Mohamed Kallon destaca-se na Liga dos Campeões africana
a temporada passada, o Sfaxien surpreendeu ao se classificar para a decisão da Liga dos Campeões da África. Não conquistou o título, mas mostrou que equipes menos badaladas, como o próprio CSS, podem, sim, vencer outras mais tradicionais. O atual campeão Al Ahly, por sinal, perdeu sua invencibilidade de mais de dois anos no continente para os tunisianos. Acreditando nessa possibilidade, o FC Kallon, de Serra Leoa, derrotou o Ocean Boys, da Nigéria, na fase preliminar da LC. Assim, qualificou-se para enfrentar o Asec Mimosas, um adversário que, além de
impor respeito, tem ainda um retrospecto bastante positivo no confronto contra times leoneses. No ano passado, aliás, ele desclassificou o representante do país, o East End Lions, da Liga dos Campeões. Mohamed Kallon, atacante de Serra Leoa e do Monaco, certamente estará atento ao desempenho de seus compatriotas nessa partida. Como dono do FC Kallon, nada mais natural. Desde que o comprou por US$ 30 mil, em 2002, ele acompanha sua ascensão de perto. Para que esta possa acontecer solidamente, Kallon investe na estrutura da equipe e mantém um contato próximo com os atletas – em sua maioria, promessas –, transmitindo-lhes, quando possível, sua experiência, para que possam entrar tranqüilos em campo. Antes conhecido como Sierra Fisheries, o FC Kallon adotou o atual nome a partir de 2000, quando foram iniciadas as conversas entre o ex-atacante da Internazionale, à época com 21 anos de idade, e os então donos. Depois de dois anos de discussões, estes deram um ultimato a Kallon, afirmando que, caso ele não efetuasse a compra do clube dentro de um prazo determinado, este voltaria a chamar-se Sierra Fisheries. A compra, então, acabou confirmada. Desde que passou a apoiar a equipe, Mohamed Kallon nunca escondeu que sonha com um futuro melhor para o futebol leonês. O FC Kallon é o meio que encontrou para introduzir o profissionalismo no país e, também, contribuir para que outros nomes de sucesso de Serra Leoa possam ser revelados. Em virtude disso e dos demais investimentos que realiza, o jogador é freqüentemente comparado ao ex-craque do Milan George Weah, da vizinha Libéria. O sucesso do FC Kallon pode resultar, entre outras coisas, no retorno dos torcedores leoneses às partidas. Menos assíduos do que eram antes do conflito que durou dez anos (1991-2001) e do choque de interesses políticos na federação leonesa, eles não mantêm o mesmo interesse de outros tempos pelo futebol. Uma boa campanha do clube de Mohamed Kallon na LC provavelmente começará a reverter esse quadro. Março de 2007
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Fotos Só Futebol Brasil
Negócios, por Ubiratan Leal
Excesso de exposição Clubes brasileiros cada vez mais enchem suas camisas com marcas de diversos patrocinadores, política que vale a pena em algumas situações pontuais
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ila Belmiro, 22 de janeiro de 2007. Santos e Sertãozinho enfrentam-se, em jogo adiantado da quinta rodada do Campeonato Paulista. Os torcedores que acompanhavam a partida puderam perceber com clareza a diferença na realidade das duas equipes, em relação a patrocínios. De um lado, o Santos joga sem nenhuma marca (exceto a do fabricante da camisa), desde que o contrato com a Panasonic acabou, em 2005. Do outro, mal era possível ver a cor do time sertanezino, tamanha era a quantidade de logotipos – sete – na camisa originalmente grená. O caso do Touro dos Canaviais não é único. Em todo o Brasil, muitos clubes pequenos têm adotado a política de colocar vários patrocinadores em seus uniformes. Essas equipes mostram bastante criatividade para pensar em como aproveitar qualquer espaço. Além da tra-
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dicional barriga e do alto das costas, coloca-se a marca do anunciante no ombro, nas mangas, em pequenos logotipos no peito, na frente e atrás do calção... Tudo o que garanta uns milhares de reais a mais no fim do mês. O aumento exagerado de patrocinadores nas camisas é tratado com desdém por muitos torcedores e pela mídia, por mais que seja comum em vários países europeus, como França, Bélgica e Áustria. No entanto, pode ser visto como solução válida, dependendo da situação. “É fácil criticar, mas tem de sentir de verdade a necessidade do clube, para ver até que ponto essa atitude não é fundamental para pagar as contas no fim do mês”, comenta Rafael Plastina, consultor de marketing esportivo. O fato de o fenômeno ganhar força neste início de temporada não é gratuito. Os campeonatos estaduais e as primeiras fases da Copa
do Brasil proporcionam vários jogos entre grandes e pequenos. Estes últimos têm uma exposição – aparição em televisões e jornais – maior que o normal e têm mais condições de negociar com potenciais anunciantes. “Isso fica claro pela forma como são feitos muitos contratos, com validade apenas por um campeonato ou até para uma partida que será transmitida em rede nacional”, comenta Plastina. O Sertãozinho é um bom exemplo disso, mesmo afirmando ter contratos anuais com seus anunciantes. “Precisamos aproveitar a oportunidade para conseguir o máximo possível de patrocinadores”, comenta Pedro Luís Lopes, diretor de marketing do Sertãozinho. Ele não revela os valores acertados (“cerca de R$ 100 mil mensais”), mas confirma que é o dobro do que o clube conseguia em 2006, quando atuou na Série A2. “É o que podemos fazer, diante dos custos de
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RANKING DO FATURAMENTO De acordo com a consultoria Deloitte, o Manchester United perdeu a condição de segundo clube que ganha mais dinheiro no mundo. No ranking divulgado pela empresa, os Red Devils foram ultrapassados por Barcelona e Juventus. O Real Madrid manteve-se no topo da lista. O levantamento considerou as receitas geradas na temporada 2005/6 com venda de ingressos, ações de merchandising e direitos de transmissão. Não foram incluídos nesses números os ganhos ou perdas com transferências de jogadores. Eis a lista, com a posição no último ranking em parênteses:
Da esq. para a dir., as camisas de Santos Laguna, Adap, Millonarios, Genk, Ituiutaba, Brasiliense, São Carlos e Sertãozinho
Negociar exclusividade Na teoria do marketing, é muito melhor ter poucos parceiros do que vários, pois facilita a visualização do logotipo dos patrocinadores e aumenta o vínculo entre as duas partes. O dirigente do Sertãozinho admite que gostaria de ter apenas uma ou duas marcas na camisa do clube, mas não consegue. Aí entra a questão da possibilidade ou não de vender a exclusividade para uma empresa. Em um mercado com potencial pouco desenvolvido como o futebol brasileiro, apenas grandes clubes têm esse poder de barganha. Primeiro, porque a exposição na mídia é garantida, e a massa de torcedores representa um grande número de consumidores, para os patrocinadores. Além disso, o time pode ficar sem patrocínio por algum tempo, enquanto procura um acordo mais vantajoso financeiramente. O Cruzeiro é um exemplo. Em 2005, o clube tinha contrato de exclusividade com a Siemens – a empresa, apesar de pagar por isso, abdicou do direito de colocar a marca nas mangas
para valorizar a colocada no peito. Em 2006, ficou boa parte do ano sem parceiro algum. No segundo semestre, acertou com a Xerox e, no início deste ano, assinou com a Aethra, para posições de menor destaque. “Não dá para viver sem patrocínio, mas é importante oferecer vários modelos, inclusive um eventual contrato de exclusividade, para fazer uma negociação mais cuidadosa”, afirma Antônio Claret, diretor de marketing do clube mineiro. Como as principais equipes brasileiras, os cruzeirenses vendem apenas peito, costas e manga da camisa e a parte da frente do calção. “Não negociamos a parte de trás do calção porque, convenhamos, o uniforme fica feio, poluído”, comenta Claret. A questão estética pode parecer preciosismo ou ir contra as necessidades econômicas, mas não é bem assim. Segundo o dirigente cruzeirense, a receita com venda de camisas cresce quando o time não tem patrocínio ou o logotipo do patrocinador fica harmonioso com o desenho tradicional da camisa. Por isso, Claret não crê que o aumento de patrocinadores na camisa se tornará uma prática comum, em todo o Brasil. Há muitos benefícios em manter poucos parceiros. Para os clubes que não têm uma marca própria muito forte, ceder várias posições em sua camisa é a solução mais simples. Nesses casos, pode-se dizer que há uma tendência de aproveitar os poucos momentos de destaque, para aumentar a arrecadação com patrocínio – queiram ou não os amantes de camisas tradicionais, “limpas” de marcas que não sejam a do clube.
1 (1) 2 (6) 3 (4) 4 (2) 5 (3) 6 (5) 7 (9) 8 (7) 9 (10) 10 (8) 11 (15) 12 (11) 13 (12) 14 (14) 15 (13) 16 ( - ) 17 (17) 18 ( - ) 19 ( - ) 20 ( - )
Real Madrid .................................... € Barcelona ........................................... € Juventus .............................................. € Manchester United ............... € Milan ........................................................ € Chelsea .................................................. € Internazionale ............................. € Bayern de Munique ............. € Arsenal ................................................... € Liverpool ............................................. € Lyon ........................................................... € Roma ........................................................ € Newcastle .......................................... € Schalke 04 ........................................ € Tottenham ........................................ € Hamburg ............................................. € Manchester City ....................... € Rangers ................................................ € West Ham .......................................... € Benfica ................................................... €
Quem quiser acompanhar o Chelsea de perto terá mais uma ferramenta à disposição, desta vez graças a um acordo com uma das empresas mais populares da rede. Os Blues assinaram uma parceria com o site de compartilhamento de vídeos YouTube, em iniciativa inédita, na Inglaterra. O time de Stamford Bridge terá um canal exclusivo (www.youtube.com/chelseafc), com notícias diárias e conteúdos diversos. Por causa de restrições da Premier League, porém, não haverá transmissões ao vivo.
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292,2 mi 259,1 mi 251,2 mi 242,6 mi 238,7 mi 221,0 mi 206,6 mi 204,7 mi 192,4 mi 176,0 mi 127,7 mi 127,0 mi 124,3 mi 122,9 mi 107,2 mi 101,8 mi 89,4 mi 88,5 mi 86,9 mi 85,1 mi
TV CHELSEA NO YOUTUBE
notas
manter um time competitivo para a Série A1 e pagar as taxas da federação”, justifica. Lopes afirma que, para determinar o valor de cada anúncio, o clube estipulou um valor para toda a camisa e foi atrás de empresas vendendo as cotas de patrocínio, até chegar no número projetado. Para encontrar interessados, foi importante a influência do presidente do clube, Antônio Savegnago, dono de uma rede de supermercados no interior paulista, que entrou em contato com alguns de seus fornecedores.
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Nononono nononono/ONONNO
Cadeira cativa, por Robert Stuart Mills
O despertar do
craque
A
ssistir a um jogo de futebol na Inglaterra é uma experiência única. Para começar, conseguir ingressos para ver um jogo da Premier League no estádio é uma coisa complicada, para um estrangeiro. No país, 80% dos ingressos do time da casa são vendidos antecipadamente para os ”sócios-torcedores”, sobrando para o resto da cidade apenas 20% dos assentos. Em outubro de 2002, o Arsenal era o campeão da Premier League, o que tornava a missão ainda mais difícil. Para quem estava em Liverpool, a opção era tentar em um dos dois jogos nos quais os Gunners visitariam a cidade. Um mês antes da partida contra o Everton, o ingresso, na área do mandante, saiu por £ 19, no chamado Lower Gladys (uma espécie de cadeira inferior) do Goodison Park, um dos estádios mais antigos da Inglaterra. Chegando ao local, via-se uma multidão que se aglomerava nas ruas próximas, em sua maioria torcedores dos Toffees. O frio de outubro fazia com que todos tivessem seus cachecóis no pescoço e seus casacos colocados. Dentro do estádio, a torcida do Everton fazia uma grande festa, como em qualquer jogo importante, na Inglaterra. O adversário era de peso, já que o Arsenal defendia, além do título, uma invencibilidade de 30 partidas na Premier League. O curioso é que, como esse estádio é antigo, os assentos eram bem apertados, como em um cinema. Quando alguém queria levantar, todas as pessoas da fileira precisavam ficar em pé também. A apenas três fileiras do campo, via-se tudo perfeitamente, já que não há alambrado, por questões de segurança dos torcedores. Após os times entrarem, os torcedores sentados atrás do gol defendido por Seaman pegavam no pé do goleiro do Arsenal, mas sem exageros. O jogador vinha de um frango memorável (sofreu um gol
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olímpico), em partida contra a Macedônia, pelas eliminatórias da Euro-2004. O jogo começou com domínio do Arsenal, que estava bem melhor na tabela. Logo aos 7 minutos, o sueco Ljungberg abriu o placar, o que dava a impressão de que a partida ia ser mais um passeio do Arsenal. O Everton, porém, endureceu e empatou, com o canadense Radzinski. Com muitos gols perdidos, o Arsenal não conseguiu desempatar no primeiro tempo. No início da segunda etapa, o Arsenal voltou forte, mas sem marcar. A primeira cena curiosa foi quando o jovem Francis Jeffers entrou em campo, pelos Gunners. Fazia um ano e três meses que ele havia trocado o Everton pelo time londrino e nunca havia voltado ao antigo lar. A torcida azul não perdoou Jeffers, que a cada toque na bola era vaiado e sofria com o canto “One Greedy Bastard” (um bastardo ganancioso), ao ritmo de “Guantanamera”. O jogo caminhava para um empate, que manteria o Arsenal invicto por mais uma partida, quando o jovem de 16 anos chamado Wayne Rooney entrou no lugar de Radzinski, aos 35 minutos do segundo tempo. Com bons dribles, mudou o jogo e, aos 44, chutou de longa distância para encobrir Seaman. A bola bateu na trave e entrou, colocando o nome de Rooney na história do futebol inglês. Além de acabar com a invencibilidade do Arsenal, Rooney tornou-se o jogador mais novo a marcar um gol na principal divisão inglesa. O atacante, hoje astro do Manchester United, estava a cinco dias de completar 17 anos. Seaman, então com 40, tomou o terceiro gol por cobertura, desde o marcado por Ronaldinho Gaúcho, na Copa de 2002. Você foi a algum jogo que tem uma boa história para ser contada? Escreva para contato@trivela.com, que seu texto pode ser publicado neste espaço!
ficha
A cinco dias de completar 17 anos, Wayne Rooney entrou em campo pelo Everton, no final do segundo tempo, para terminar com uma invencibilidade de 30 jogos do Arsenal. Estar junto da fanática torcida nesse momento foi uma experiência única.
EVERTON 2 ARSENAL 1 Competição: Campeonato Inglês Data: 19/outubro/2002 Local: Goodison Park (Liverpool)
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E se..., por Victor Birner
E se Márcio Rezende de Freitas fosse apenas
um bom jornalista a cabine de rádio, em Valência, o comentarista Márcio Rezende de Freitas, indignado, diz: “Ele é incapaz. Ninguém no estádio viu essa falta. Como pode ter errado?” O gol não validado do italiano Luzardi empataria o jogo, aos 40 minutos da segunda etapa. Nem os torcedores da Espanha entenderam o que o árbitro assinalou. A partida valia a vaga nas semifinais da Olimpíada de Barcelona. Talvez por isso o sóbrio e jovem jornalista tenha sido mais direto que de costume. Já o experiente narrador ao lado continuou a enaltecer a vitória da Fúria, enquanto observava a reação de Freitas. Contrariado e sem respirar, o comentarista criticava a velha cartilha do futebol, que manda beneficiar os amigos, os ricos ou os da casa. “Este é um esporte digno, que valoriza o sacrifício, a técnica, a tática e a sorte. Não pode ser assim”. O narrador gosta da polêmica, mas, sarcástico, vibra apenas por acreditar que o povo adora festa e detesta protestos. Freitas, idealista, não se importa e repudia a submissão conveniente e desonesta. Prefere dormir em paz. A sele-
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A cada edição, um convidado imagina como seria o mundo do futebol, se alguma coisa fosse diferente. Você tem sugestões de temas para esta seção? Mande um e-mail para contato@trivela.com
ção da casa foi à semifinal por causa do erro. “Se faz parte da vida, estamos aqui para que não faça”, prega. Os profissionais prejudicados não serão indenizados. O “soprador” não pagará. Surgia o mito do ouro espanhol. Aos italianos, resta o direito de chorar e reclamar até quando agüentarem. Freitas deixa o estádio cabisbaixo, apesar do bom trabalho. No hotel, enquanto revê o jogo, a mente cria um personagem abominável, o homem que não falava, mas tinha a história na boca e pulmão. As belas jogadas pouco valem. Basta o sopro, e a mentira se perpetua. No raciocínio maniqueísta do jovem, o bem e o mal travam uma guerra no futebol, e ele sabia em qual time queria jogar. Três anos depois, as maiores equipes brasileiras da era do futebol-arte decidiam o campeonato nacional. Santos e Botafogo, com Pelé e Mané apenas no coração dos fãs, foram ao gramado do Pacaembu, com Giovanni e Túlio. Freitas estava eufórico e fascinado pela festa na arquibancada. O comentarista argumentava sobre as possibilidades das equipes. Comparava Gottardo e Gonçalves a Ronaldo e Narciso; elogiava Beto, Donizete, Sérgio Manoel, Marcelo Passos e Robert. O delicioso clima de final, porém, ruiu quando a bola rolou. A sensação horrível voltou. O árbitro, novamente, fora mais decisivo que os jogadores. Vira um impedimento inexistente de Camanducaia, no gol que daria a vitória ao Santos, errara ao não anular o do impedido Túlio e deixara passar a mão na bola de Capixaba no de Marcelo Passos, entre outros enganos. O Glorioso merecera o título? Não havia resposta. Sobrava a certeza, porém, de que, mais uma vez, a história podia
ter sido modificada. Tentou se consolar com os raríssimos brados de indignação contra a cartolagem na imprensa. Os anos aumentaram a revolta. Viciado em futebol, na folga da semana, assistiu à decisão da Copa Libertadores, em 2001. O Cruz Azul, com Palencia, Cardozo, Brown, Galdames e Pinheiro, recebia, na primeira partida, o Boca de Riquelme. Foi uma das piores atuações de um árbitro. Não deu dois pênaltis, mais que claros, a favor dos mexicanos. Marcelo Delgado garantiu a vitória argentina. Freitas foi tomado pela teoria da conspiração. O México não é da Conmebol, o Boca é pop... Enfim, achou razões para os absurdos. No jogo de volta, torceu que nem louco pela justiça disfarçada de Cruz Azul. Por uns segundos, ficou bravo com Deus porque, após a vitória na Bombonera, a Máquina Cementera perdeu o título nos pênaltis. Passou a defender de maneira radical o uso de recursos eletrônicos. Por que a TV mostrava ao mundo o que houve e, no lugar mais importante, a informação não chegava? Os políticos da bola não o convenciam. Dinâmica da partida prejudicada? Bobagem, basta uma cabine com TV e uns pontos eletrônicos. Os países pobres não terão o sistema? Puxa! Quanta preocupação com as diferenças sociais nessa hora! Freitas queria diminuir a chance de manipulação de resultados, e os cartolas não. Mais uma vez, dois lados bem definidos e a tranqüila vantagem do mal. Quando o Corinthians empatou contra o Internacional, em 2005, no mesmo local, mas uma década após o título do Botafogo, a participação decisiva do responsável pela imposição das regras recebeu apenas comentários céticos e realistas. Só não tinha certeza que logo mais veria algo parecido, por ter aprendido, com o tempo, que ver já é um privilégio! Hoje, o jornalista comenta com menos interesse o trabalho dos homens de preto. Victor Birner é jornalista e comentarista esportivo da rádio CBN.
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Cultura, por Carlos Eduardo Freitas
Como no
Camp Nou Penyas Barcelonistas espalham-se e fazem os Blaugranas sentirem-se em casa, em qualquer canto do planeta
O vicepresidente do Barcelona, Alfons Godall (2º da esq. para a dir.), visitou a penya de São Paulo
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em São Paulo, por um grupo de integrantes do Catalonia, Centro de Cultura Catalã de São Paulo, no bairro do Cambuci. “Resolvemos criar essa entidade devido ao interesse cada vez maior dos brasileiros pelo Barcelona”, contou à Trivela o presidente da penya paulistana, Ferran-Ramon Seubas. Desde então, os paulistanos que gostam do Barça têm um ponto de encontro para acompanhar as partidas do clube, conhecer um pouco mais a respeito da cultura catalã e, também, falar catalão. Os grandes eventos do calendário são os jogos contra o Real Madrid, como o que acontece em 11 de março. Em dia de “superclássico”, os organizadores convidam os simpatizantes para acompanhar a partida e também degustar uma paella, além, claro, dos tradicionais “pa amb tomàquet”, pão com tomate, no melhor estilo catalão. “O clima é tão bom que dá para se sentir quase como se estivéssemos no Camp Nou”, comenta Seubas.
Penya Barcelonista de São Paulo Av. Lins de Vasconcelos, 1.807 Cambuci - São Paulo-SP CEP 01537-001 www.penyabarcelonistasp.com.br
Carlos Eduardo Freitas/Trivela
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uando desembarcou em em Tóquio, dezembro passado, para a disputa do Mundial de Clubes, Ronaldinho disse sentir-se em casa, no Japão – tanto por seu histórico com a Seleção Brasileira lá, onde conquistou o título de 2002, quanto pela receptividade dos torcedores japoneses. “Aqui, sinto-me como se estivesse em Barcelona”, disse. A declaração do astro brasileiro pode até ter soado como uma tentativa de “fazer uma moral” com o público japonês, mercado interessante para o clube, mas, de fato, o Barcelona tem torcida lá. Do aeroporto ao hotel onde ficou hospedada, a delegação foi acompanhada por cerca de 100 torcedores, já conhecidos do clube. Todos são filiados à Penya Barcelonista japonesa, a primeira torcida oficial da equipe espanhola no país. A “penya” – em catalão, o mesmo que “associação” – nipônica é apenas uma das mais de 1,8 mil espalhadas por todo o planeta que têm o aval e a própria participação do clube. Geralmente, as entidades são fundadas por torcedores que têm alguma ligação com a cultura catalã. É o caso de um dos fundadores da penya japonesa, Ryo Matoji, que morou em Barcelona no início dos anos 90 e adquiriu o hábito de acompanhar o clube. “Somos pessoas comuns, que gostamos de nos reunir, para acompanhar os jogos do Barcelona em bares”, conta Matoji, que formalizou sua torcida pelo clube em 2004 e, hoje, tem mais de 100 seguidores cadastrados. A maioria das penyas, naturalmente, localizam-se na Catalunha, mas elas estão espalhadas por todos os cinco continentes. No Brasil, a primeira foi fundada em agosto de 2004,
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JOGABILIDADE AINDA É O FORTE Em fevereiro, chegou ao Brasil a décima versão do Winning Eleven, um dos games de futebol mais populares no país. A nova versão reforça as virtudes tradicionais da série: realismo no desenvolvimento da partida, jogabilidade e possibilidade de editar os times. Por outro lado, há poucos jogadores e clubes com os nomes verdadeiros. “Winning Eleven – Pro Evolution Soccer 2007” Fabricante: Konami Plataformas: Playstation 2, XBox 360, Nintendo DS e Play Station Portable Preço sugerido: R$ 199,90 Lançamento: 27/fevereiro
RESUMO DO BRASILEIRÃO 2006 Gustau Nacarino/Reuters
Apesar da foto de Rogério Ceni na capa, o filme lançado pela Globo Marcas com o selo Globo Esporte é um resumo da competição, com gols mais bonitos, principais lances e destaque para os melhores jogadores de todas as equipes. O apelo maior, claro, é para os são-paulinos, que também poderão assistir a todos os gols da equipe na competição.
Outros clubes espanhóis também têm suas penhas espalhadas ao redor do mundo. O Real Madrid computa em seu site algumas centenas de agrupamentos de torcedores em território espanhol e muitos outros ao redor do mundo. A grande diferença das penyas barcelonistas, porém, reside na própria natureza do Barcelona como agremiação: além de serem uma concentração de torcedores da equipe, constituem, muitas vezes, reduto do catalanismo local. Sempre que viajam para o exterior, dirigentes catalães fazem questão de visitar as sedes de suas torcidas, seja para acompanhar as partidas do clube ou para tornar ainda mais próximo o contato com os torcedores: isso aumenta ainda mais a aura do Barcelona, famoso por ser um clube comandado por seus sócios. “Acho importante esse contato com nossos seguidores e mostrar que, apesar da distância, estamos próximos e queremos ouvir o que têm
a nos dizer”, contou à Trivela Alfons Godall, vice-presidente do Barça, em recente visita à penya paulistana. “Gosto muito de viajar aos países mais distantes e encontrar pessoas que falam catalão, gostam do Barcelona. Sinto como se estivesse em casa”, completou. O próprio Joan Laporta foi a Buenos Aires no final de 2006 e, depois de encontrar-se com políticos locais, visitou a penya local, a mais antiga da América. Em Nova York, Xavier Sala-i-Martín, presidente da comissão econômica do clube, e também Ph.D da Universidade de Columbia, é freqüentemente visto na penya local, localizada num bar chamado Nevada Smiths. Parece que o Barça entendeu e assimilou muito bem o lema do Liverpool, adversário do clube nas oitavas-de-final da LC: “You’ll never walk alone” (“você nunca caminhará sozinho”). Como dizem os barcelonistas, isso faz com que a legião “blaugrana” se sinta no Camp Nou em qualquer lugar do mundo.
Produção: Globo Marcas Preço sugerido: R$ 24,90 Onde encontrar: bancas de jornais e livrarias
lançamentos
Visitas freqüentes
TRADIÇÃO “HI-TECH” A Umbro lançou a camisa que a seleção inglesa vai usar até 2009. Feita com um tecido especial, que, segundo o fabricante, ajuda a equilibrar a temperatura do corpo, a camisa da Inglaterra é o carro-chefe da Umbro e dá uma idéia dos lançamentos futuros da marca. Deve chegar ao mercado brasileiro em abril.
Fornecedor: Umbro Preço sugerido: R$ 170
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A Várzea
Tri-lete-legal
A lorota do mês “Tenho estilo de Libertadores, mas de repente também tenho de Champions League” O futebol de Tuta, do Grêmio, bem que lembra o do Shevchenko. Afinal, os dois jogam com uma bola...
A manchete do mês
A charge do mês
A equipe da Trivela resolveu olhar para os estaduais. Com receio de mandar repórteres para os confins do país e nenhum deles voltar antes da revista fechar por causa da crise aérea, os editores resolveram discutir o assunto no bar do Chico Lingüiça, onde acabaram por encontrar a equipe d´A Várzea. Sem pensar, pediram uma sugestão para resolver o problema. Tolete rapidamente cuspiu o gole de Jurubeba que bebia e decretou: “Meu primo escreve procês!” Trilete parecia ser a solução dos problemas jornalísticos. Gaúcho tradicionalista, tem orgulho de ir para o estádio com bombacha e uma camisa da seleção brasileira. Consultado, o guri nem pensou: “bah, tri legal, escrevo um texto e faturo uns trocos pra sair cas chinocas”. O jogo escolhido foi Novo Hamburgo x Gaúcho, em Novo Hamburgo. No campo, quase provocou a ira de torcedores, ao perguntar se eram colorados ou gremistas em primeiro lugar, trocou o nome da universidade que comprou o estádio pela concorrente de outra cidade e passou mal na primeira dentada em um churrasquinho de R$ 1. Depois de algumas entrevistas, um torcedor mais revoltado viu a mochila com os equipamentos jornalísticos made in Paraguai do repórter – na verdade, uma caneta quatro cores e um bloco de rascunho. A torcida organizada de 7 pessoas o acusou de espião, o que logo se espalhou pelas outras 900 testemunhas do estádio. Trilete correu para fora e, sem ver o jogo, só teve uma saída: adotou o que aprendeu com os jornalistas mais experientes – ou seja, copiou o texto de dois sites e mudou apenas o primeiro parágrafo. Sorte que a Trivela é uma revista séria. O texto foi rejeitado e só poderia servir para ocupar espaço n’A Várzea. Trilete já contava com as moedas, mas acabou mais triste que seu ex-colega Ronaldinho no Japão – o Editor, bêbado, sem querer apagou seu texto. Da próxima vez, o primo de Tolete já sabe: faz o trabalho de casa, mesmo.
Em alta Flamengo
Não tinha como ficar mais em alta (ou melhor, no alto) do que jogar em Potosí. Pena que os dirigentes resolveram que foi a última vez.
“Sem camisinha” (Olé)
Em duas palavras, o diário argentino sacaneia, no melhor estilo, o Brasil, pela derrota contra Portugal, e o Dunga pelo modelito horrível que vestiu durante a partida.
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Roberto Horcades O cara não se contenta em pagar mico no Fluminense! Resolveu ser o único jurado do carnaval do Rio a dar notas em múltiplos de 0,5, em vez de 0,1.
Março de 2007
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