28 minute read
VI. A induqiio por eliminaqiio e o "experimentum crucis"
VI. j\ indmG&o por eliminaG&o
0s dois procedimen tos que compeem Uma vez purificada a mente dos idolos e fixado o verda- deiro escopo do saber no conhecimento das formas da natureza, o metodo para alcanqar tal escopo se compZie de dois procedi-
Advertisement
o metodo para tTIentos: o conhecimento 1) extrair os axiomas da experiencia; das formas 2) derivar experimentos novos dos axiomas. da na tureza 0s axiomas sao assim tirados da experi@ncia mediante a 4 3 1-2 indu(;a"o por elimina(;a"o da hipotese falsa, que suplanta a indu(;a"o tradicional de tip0 aristotelico, conduzida por simples enurnera- gao de casos particulares. A induqao por eliminaqao e precedida de uma impor- tante classificag30 que registra: a) nas tabuas de presenga, todos os caos em que o fen6meno indagado se apresenta; 6) nas tabuas da ausencia, os casos afins aos precedentes em que, porem, o fen6meno nao se apresenta; C) nas tabuas dos graus, todos os casos em que o fen6meno se apresenta segundo maior ou menor intensidade. Depois da compilaq~o das tr@s tabuas, comega a operaqao de verdadeira e propria exclusao ou eliminaqao das hipoteses falsas de explicaqao do fenbmeno, ate que se chegue a uma primeira vindima, isto e, a uma primeira hip6tese coe- rente com os dados expostos nas tr@s tabuas e avaliados por meio 0 conceit0 do processo seletivo de exclusao. A primeira vindima e assumida da primeira depois como hipotese-guia para a pesquisa posterior, isto 4, dela vindima deduzindo os fatos que ela implica e preve, e experimentando se 4 3 3-5 tais fatos se verificam tambem em condigdes tecnicas experimen- tais (ou instrincias prerrogativas), entre as quais assumem parti- cular relevo as instrincias da cruz. De tal modo, Bacon iniciava um caminho dirigi- do a unir de mod0 sempre mais firme a faculdade experimental e a faculdade rational.
Purificada a mente dos "idolos" e fi- xado no conhecimento das formas da natu- reza o verdadeiro objetivo do saber, C preci- so ver agora atravCs de qua1 mitodo tal objetivo pode ser alcanqado.
Bacon afirma que o objetivo C alcan- qavel realizando-se um procedimento de pesquisa compost0 de duas partes: "A pri- meira consiste em extrair e fazer surgir os axiomas da experihcia, a segunda em de- duzir e derivar novos experimentos dos axio- mas." Mas que fazer para extrair e fazer sur- gir os axiomas da experigncia?
Para Bacon, o caminho a seguir C o da indu@o, mas a "indu@o legitima e verda- deira, que 6 a propria chave da interpreta- @o", e niio a indu@o aristote'lica.
Conforme diz Bacon, a induqiio aristo- tClica C uma induqiio por simples enumera- @o de casos particulares, "passando muito rapidamente sobre a experitncia e sobre os particulares". A partir de poucos particula- res, secundando a mi tendencia da mente a subir imediatamente de escassas experiin- cias aos principios mais abstratos, ela "cons- titui logo de inicio conceitos tiio gerais quan- to inuteis".
Em poucas palavras: a induqiio de Aris- toteles deslizaria sobre os fatos, ao passo que a induqiio proposta por Bacon, que C uma
Induqtio por eliminas3o.O me- todo indutivo tradicional, que re- monta a Aristoteles, caracteriza-se segundo Bacon pela simples enume- ra@o dos fencimenos, razao pela qual se julga com base a um nlimero de fencimenos inferior ao necessario e apenas em base aos que se tern ao alcance da m%o: este metodo, que procede silogisticamente do mais par- ticular ao mais universal, saltando os aneis intermediarios, leva a conclu- s6es precarias e constantemente ex- postas ao perigo de teses contradi- torias. A verdadeira induqso cientifica, que faz "uso de muitas coisas as quais ate o momento nenhum mortal jamais pensou", deve ao contrario analisar os fenbmenos da natureza a partir dos experimentos, mediante as de- vidas elimina@es e exclusBes dos casos em que o fendmeno em ques- ti30 esta ausente ou n%o esta presen- te de mod0 pleno, para chegar as causas e aos axiomas sempre mais gerais que expressamente a ele se referem. A induq%o por eliminaq%o e "a pro- pria chave da interpreta@o", e nela "sem duvida e depositada a maior es- peranqa".
indu~iio por elimina@o, estaria em condi- q6es de captar a natureza, a forma ou a es- sincia dos fenemenos.
2As tr& "t6buas" sobre as quais se deve basear a nova induC&o
Pois bem, na opiniiio de Bacon, a pes- quisa das formas procede do mod0 que des- creveremos.
Antes do mais, ao se indagar sobre urna natureza, como, por exemplo, o calor, C pre- ciso "fazer urna cita@o, diante do intelecto, de todas as instiincias conhecidas que coin- cidem em urna mesma natureza, ainda que se encontrem em matirias muito diversas".
Assim, se pesquisamos a natureza do calor, devemos inicialmente compilar urna "ta- bua de presenqa" (tabula praesentiae), onde registrarnos todos os casos ou instiincias em que se apresenta o calor: "1) os raios do sol, sobretudo no veriio e ao meio-dia; 2) os raios do sol refletidos e reunidos em pequeno espa- $0, como entre montes, entre muros ou, mais ainda, nos espelhos ustorios; 3) os meteoros incandescentes; 4) os reliimpagos ardentes; 5) erupqoes de chamas das crateras dos montes etc.; 6) toda chama; 7) solidos em fogo; 8) as aguas quentes naturais; (.. .); 18) a cal viva, borrifada de agua (...); 20) os animais, so- bretudo e sempre nas entranhas etc."
Compilada a "tabua da presenqa", pro- cede-se 2 compilaqio da "tibua das ausin- cia" (tabula declinationis sive absentiae in proximo), na qual siio registrados os casos proximos, isto 6, afins, aos anteriores, nos quais, porim, o fen6men0, em nosso caso o calor, nio se apresenta: 6 o caso dos raios da lua (que S~O luminosos como os do sol, mas nio sio quentes), dos fogos-fatuos, do fogo-de-santelmo (que C fen8meno de fosfo- rescincia marinha) e assim por diante.
Concluida a tibua da ausincia, pas- sa-se a compilaqiio da "tabua dos graus" (tabula graduum), na qual sio registrados todos os casos ou instiincias em que o fen& meno se apresenta segundo urna intensida- de maior ou menor. Em nosso caso, deve-se atentar para a variaqiio do calor no mesmo corpo, colocado em ambientes diversos ou em condiqoes particulares.
3Como das tr2s t6buas se extrai a "primeira vindima"
Armado com essas tabuas, Bacon pro- cede entiio a operaqiio de induqiio propria- mente dita, seguindo o procedimento da exclusio ou eliminaqiio. Escreve ele: "0 objetivo e a funqao dessas tris tabuas sio o de fazer urna citagiio de inst2ncias diante do intelecto [...I. Feita a citaqiio, C preciso p6r em a@o a propria indupio."
Deus, "criador e introdutor das for- mas", e "talvez tambem os anjos e as inteli- gincias celestes" tim "a faculdade de captar imediatamente as formas por via afirmativa e desde o inicio da especulaqiio". 0 homem, porkm, nio possui essa faculdade, sendo- lhe "concedido somente proceder primeiro por via negativa e apenas por ultimo, de-
pois de um processo completo de exclusiio, passar a afirmaqiio". A natureza, portanto, deve ser analisada e decomposta com o fogo da mente, "que i quase um fogo divino".
Mais especificamente, porim, em que consiste o procedimento por exclusiio ou eliminaqiio? Pois bem, por "exclusiio" ou "eliminaqiio" Bacon entende exatamente a exclusiio ou eliminaqiio da hipotese falsa.
Retomemos o exemplo da pesquisa da natureza do calor. Considerando as tibua de presenqa, aushcia e graus, o pesquisa- dor deve excluir ou eliminar como proprias da forma ou natureza naturante do calor todas aquelas qualidades niio possuidas por algum corpo quente, as qualidades possui- das por algum corpo frio e as que permane- cem invariiveis sob o aumento do calor.
Para ficar ainda mais claro, a proposito da pesquisa da natureza do calor, o procedi- mento por exclusiio poderia assumir o seguin- te processo de argumentaqiio: o calor 6 ape- nas um fen6meno celeste? Niio, pois tambim os fogos terrenos siio quentes. Ele i, entiio, apenas um fenBmeno terrestre? Niio, pois o sol i quente. Todos os corpos celestes siio quentes? Niio, porque a lua i fria. Sera que o calor depende da presenqa de alguma parte constitutiva no corpo quente, como poderia ser o antigo elemento chamado "fogo"? Niio, pela raziio de que qualquer corpo pode ser tornado quente pel0 atrito. Sera que depen- de entiio da composiqiio particular dos cor- pos? Niio, ja que podem ser esquentados os corpos de qualquer composiqiio.
E assim por diante, at6 se chegar a urna "primeira colheita" (vindeminatio prima), isto 6, a uma primeira hipotese coerente com os dados expostos nus tris tabuas e criva- dos atrave's do procedimento seletivo de eli- mina@o e exclusiio. No que se refere ao exemplo do calor, Bacon chega a urna con- clusiio como esta: "0 calor i um movimen- to expansivo e forqado, que se desenvolve segundo as partes menores."
4,t #"""L" f\ nova induC&o CO~O "via mediana" entre as seguidas por empiristas e racionalistas
Procedendo desse mod0 na busca da verdade, Bacon trilhava um caminho dife- rente do dos empiristas e dos racionalistas. Ele proprio escreve: "At6 agora, aqueles que trataram das cihcias eram empiricos ou dogmaticos. 0s empiricos, como as formi- gas, acumulam e consomem. 0s racionalis- tas, como as aranhas, extraem de si mes- mos sua teia. 0 caminho intermediario e' o das abelhas, que extraem sua mat6ria-pri- ma das flores do jardim e do campo, trans- formando-a e digerindo-a em virtude de urna capacidade que lhes C pr6pria. N5o muito diferente i o trabalho da verdadeira filoso- fia, que niio deve se servir somente ou prin- cipalmente das forgas da mente, pois a ma- tCria-prima que ela extrai da historia natural e dos experimentos mecinicos niio deve ser conservada intacta na memoria, mas sim transformada e trabalhada ~elo intelecto. Assim, a nossa esperanqa se deposita na uniiio sempre mais estreita e s6lida entre essas duas faculdades, a experimental e a racional, uniiio que ate agora ainda nio se realizou. "
Chegando a "primeira colheita", Ba- con toma essa primeira hipotese como guia para a pesquisa posterior, que consiste na dedu~iio e no experimento, no sentido de que, da hipotese obtida, devem-se deduzir os fatos por ela implicados e previstos, ex- perimentando em condiq6es diversas se tais fatos implicados e previstos pela hipotese se verificam.
Desse mod0 se constroi urna espicie de rede de investigaqao, da qua1 parte toda urna s6rie de "interrogag6esn a que a natureza C forqada a responder.
Com tal objetivo, Bacon cogita um conjunto rico de ticnicas experimentais (ou de instiincias prerrogativas), por ele indica- das com nomes muito fantasiosos (instin- cias solitarias; instincias migrantes; instin- cias ostensivas; instincias clandestinas; instincias constitutivas; instincias confor- mes ou proporcionais; instincias monidicas; instincias desviadoras etc.), entre as quais destacam-se particularmente as "instiincias da cruz", assim chamadas "por methfora extraida das cruzes colocadas nos caminhos para indicar urna bifurcaqiio".
A estratigia do experimentum crucis se da "quando, durante a pesquisa de urna natureza, o intelecto esta incerto e como que
em equilibrio no decidir sobre a qua1 de duas naturezas, ou mais de duas, deve ser atribui- da a causa da natureza examinada; pel0 con- curso freqiiente e ordinario de varias natu- rezas, as instincias cruciais mostram que o vinculo de uma dessas naturezas com a na- tureza dada C constante e indissoluvel, ao passo que o das outras C variavel e separa- vel. Assim, a questiio resolve-se, e C acolhi- da como causa a primeira natureza, enquan- to a outra C rejeitada e repudiada". E Bacon comenta: "Tais instincias trazem portanto muita luz e apresentam uma como que for- te autoridade, de mod0 que, algumas vezes, chegando a elas, nelas se dettm o process0 de interpretaqiio".
No segundo livro do Novum Orga- num, niio faltam exemplos de pesquisas que necessitam de experimenta crucis para se- rem resolvidas. Detenhamo-nos sobre o exemplo da solugiio da quest50 da forma do peso.
Para alguns, o peso dos corpos devia- se a uma propriedade intrinseca dos corpos, ao passo que, para outros, devia-se B gravi- dade.
Eis, portanto, para exemplificar, a bifur- ca@o: "1) Ou os corpos pesados e graves tendem para o centro da terra por sua pro- pria natureza, isto C, segundo o seu esquema- tismo, 2) ou entiio S~O atraidos e aprisiona- dos pela propria forga da massa terrestre."
Ora, se a primeira hipotese fosse ver- dadeira, entiio todo objeto deveria ter sem- pre o mesmo peso, ao passo que, sendo ver- dadeira a segunda hipotese, deveria seguir- se que "quanto mais os graves se aproxi- mam da terra, tanto maiores siio a forqa e o impeto com que siio impelidos em sua dire- $30, ao passo que, quanto mais se afastam dela, mais lenta e fraca se torna aquela for- qa [...]".
Pois bem, sendo assim, eis a instiincia da cruz: "Tomam-se dois relbgios, um da- queles que se movem por contrapesos de chumbo, outro daqueles que se movem por contragiio de uma mola de ferro. Experimen- te-se se um C mais veloz ou mais lento que o outro. Depois, coloque-se o primeiro na extremidade de um templo altissimo, apos te-lo regulado de acordo com o outro, de mod0 a que marquem o mesmo tempo, dei- xando-se entiio o outro aqui embaixo. E isso para observar diligentemente se o re- logio colocado no alto move-se mais lenta- mente do que antes, em virtude da menor forga de gravidade. 0 experiment0 deve ser repetido, levando-se o relogio para a pro- fundidade de alguma mina, situada muito abaixo da superficie da terra, para ver se ele se move mais velozmente que antes, em ra- ziio do aumento da forqa de atraqiio. E so- mente no caso de se concluir que efetiva- mente o peso dos corpos diminui quando se elevam ou aumenta quando se abaixam em diregiio ao centro da terra, C que se determi- nari que a causa do peso C a atraqiio da massa terrestre."
BACON
NTERPRETAC~O DA NATUREZA
0 NOVO ORGANUM DA "GRANDE RESTAURACAO DAS CIENCIAS E DAS ARTES"
ou
"PRINC~PIOS DA INTERPRETACAO DA NATUREZA"
i
Refuta~iio das --.I. DE PARTIDA I w antecipa~oes da natureza, isto e, dos 7-
I 1
Primeira parte: @\ deriva~do dos axiomas - -
a partir da experigncia
7
I/" Segunda parte: deriva~do de novos fendmenos da primeira vindima por meio de te'cnicas experimentais (insthcias prerrogativas, retificaq6es da induqiio etc.) 1. idolos da tribo 2. idolos da caverna 3. idolos do for0 otr do mercado 4. idolos do teatro
A) CLASSIFICAQ~O: a. tibuas da presenga b. tibuas da aushcia c. tibuas dos graus
B) METODO: indu~do por elimina@o da hip6tese falsa na explicaqIo do fedmeno
C) OBJETIVO: primeira vindima (ou interpretagIo inicial), isto 6, primeira hipotese coerente corn os dados experimentados
COGNOSCITIVO: descoberta da forma de uma natureza dada (interpreta~ao final completa dos fenhmenos), isto 6, compreens50 da estrutura (esquematismo latente) v de um fen6meno e da lei (processo latente) que regula seu processo
A
OPERATIVO: geragiio de uma ou mais novas naturezas em um corpo dado, isto 6, transforma@o dos corpos materiais por meio da introduqiio neles de uma ou rnais qualidades sensiveis
A necessidade de um novo m8todo nas ci9ncias e nas arks
- -
No opinido da Bocon, as c/&ncias da sua Qpoco ndo sdo capozes da novos das- cobartas, e o prdprio Iogica trodiclonal Q mci- ti1 poro os pesquisas ciantificos. 0s conceltos qua Figurom nos silogis- mos do filosofia trodicionol 580, no raalida- de, no@s Fontdsticos, ndo axtraidas dos objatos com mhtodo; a o masmo discurso vole poro os oxiomos, qua am garal sdo in- davidomente extroi'dos por maio de uma passogem precipitodo a ilagitima de poucos cosos particularas oo univarsol. /7 aste procedimanto, que h o falsa indusdo, Aocon op6e a verdadeira indu~bo, qua avonqo para os princ@ios madianta os oxiomos mddios a procada com cautalo e paci&ncio, continuamanta controlodo palos cosos do axpari&ncio.
Nessa p~pactivo deva-sa antandar a chlabra distin~do baconiano entra antecipa- @es da natureza e interpretag%s da natureza.
1. A natureza pode ser vencida apenas obedecendo a ela
1. 0 homern, rninistro e inthrprete da na- tureza, opera e entende apenas pelo que, com a pr6tica ou corn a teoria, tiver aprendido da ordern da natureza: al&m disso nada sabe nem pode. 2. Nem a mdo nua, nem o intelecto aban- donado a si mesmo t&m poder. 0s resultados sbo alcanpdos corn instrumentos e corn auxi- lios e destes tern necessidade ndo rnenos o intelecto do que a rndo. Como os instrurnentos ampliam e regsrn o rnovimento da rndo, tam- bQrn os instrurnentos da rnente guiarn ou man- t&m o intelecto. 3. R ci&ncia e o poder humano coincidem, porque a ignor6ncia do causa faz corn que fake o efeito. fl natureza, com efeito, nBo se vence a ndo ser obedecendo a ela, e o que na teoria tem valor de causa, na opera@o tern valor de regra. 4. Em relaq3o 6s obras o hornem nBo tern outro poder que o de aproxirnar ou afastar os corpos naturais: o resto 6 obra do natureza, que opera a partir de dentro.
2. lnsufici&ncia das ciQncias atuais e da 16gica traditional
1. Costumam ocupar-se da natureza, no que se refere bs obras, o rnec6nic0, o matern6- tico, o rnhdico, o alquimista e o rnago; todos. porhm, no atual estado das coisas, com Iev~ empenho e escasso resultado. 2. Seria loucura e contraditorio em si crer que aquilo qua at& ac~ora jomais foi feito, pos- sa ser feito sem recorrer a rn&todos ainda ja- mais tentados. 3. Nos livros e nos oficinas parecern de- rnasiadamente numerosos os produtos da man- te e da mBo. Mas toda essa variedade est6 fundarnentada sobre urna extraordin6ria sutile- za e sobre uma s&rie de consequ&ncias extrai- das de poucos conhecirnentos j6 adquiridos, e ndo @st6 fundarnentada sobre o nljrnero dos axiomas. 4. Tamb6rn as invenq3es jd realizadas se devem ao acaso e b empiria rnais do qua bs ci&ncias. Corn efeito, as cihcias que hoje te- mos, ndo sdo mais que combinagies de coisas j6 encontrodas, ndo mQtodos para a inven@o ou indicqdes de novas obras. 5. R causa e a raiz de quase todos os males nos ci&ncias & apenas esta: enquanto erronearnente admiramos e exaltarnos as for- <as da mente hurnana, nBo procuramos verda- deiros auxilios para ela. 6. A sutileza do natureza supera em muito a sutileza do sentido e do intelecto, tanto que todas as boas msdita<bes, especula@es e con- trovCrsias hurnanas sdo coisas sern sentido; apenas ndo existe algu&m que perceba ISSO. 7. Como as ci&ncias, que agora temos, sdo totalrnente inljteis para a inven~do de obras, tarnbbm a logics, como & atualmente, & ~nljtil para a inven~do das ci&ncias. 8. R logica hoje em uso vale rnais para con- firmar e para fixar erros que se apoiam sobre no~bes vulgares do que para a busca da verda- de: por isso, ela d rnais danosa do que util. 9. 0 siloglsrno, sendo totalrnente inade- quado para a sutileza da natureza, ndo se apli- ca aos principios das ci&ncias e i; aplicado em vdo aos axiornas rn&d~os. Obriga ao assenti- rnento, ndo obriga as coisas. 10. 0 silogismo consta de proposiq%s, as proposi@es de palavras, as palavros sBo as etiquetas das no@es. Portanto, se as pro- prias no@es, que estdo na base de tudo, sdo confusas e arbitrariamente abstraidas das coi- sas, ser6 totalrnente privado de sol~dez aquilo
qua se constroi sobre sua base Rsslm, a ljnlca esperanca reside na verdadslra ~ndugdo 11 Ndo h6 nada de incorrupto nos no- @es, nam nos Iog~cas nem nos fislcas As no- cdes de substdnaa, quo lid ad^, agdo, paix60, e as propnos no$% de ssr nbo sbo v6l idas e muto menos o sdo as de pesodo, Isva demo tgnus, cjrnldo, ssco, gsrogdo, corrupgdo, otra- <do, r~pulsdo, sl~rnsnto, rnattr~a, Forma s se- melhantes Todas essas nopix sdo fant6sti- cas e ma1 dehnrdas 12 Rs no<des das espbcles inflmas, como hornsm, cdo, pornba, e das percep<des sensi- vsis ~msd~atas, como qusnta frio, bronco, pre- to, nbo sdo multo falazes Elas, porhm, por ve- zes sbo confusas pelo fluir do mat6r1a e pela m~stura das colsas Todas as outras nocdes, que os homens usaram at6 agora, sbo aberra<des abstraidas ou extraidas das coisas com modos nbo apropriados 13 0 arbitno e a absrra~do na constru- sbo dos axiomas ndo sdo menores do que no abstrqdo das nocdes, e lsso tamb6m nos pro- prlos principios que dependem do indugio co- mum Muto maior 6 o arbitr~o nos axlomas e nas propos~c;des conseguidas por melo do silogismo 14 Aqu~lo que at6 agora foi produz~do nos cihncias 8 de tat monta que depende quase sempre das no~des vulgares Para penetrar nos recessos escondidos do natureza 6 necess6r1o que tanto 0s concsltos quanto os axiomas se- jam abstraidos das colsas por uma via mais certa e segura e que nos hab~tuemos a usar o Inte- lecto de modo melhor e mals seguro
3. Antecipa~6es da natureza e interpretag6es da natureza
1 . Sdo e podem ser dois os caminhos para a pesquisa e a descoberta da verdade. 0 pri- meiro, do sentido e dos fatos particulares voa para os axiomas mais gerais e, sobre a base destes principios e de sua imut6vel verdade, julga e descobre os axiomas mhdios: sste 6 o caminho agora em uso. 0 segundo, do sentido s dos fatos particulares extrai os axiomas, su- bindo corn medida e gradativamente ds modo a alcan~ar apenas no fim os axiomas mais ge- rais: este 6 o caminho verdadeiro, mas ainda ndo tentado. 2. 0 intelecto abandonado a si mesmo se pde no primeiro caminho e o percorre ssgundo as regras do dial6tica. R mente tende, com efei- to, a subir aos principios mais gerais e ai parar; enfastia-sa logo com a experihncia. A dial6tica. por causa de sua complac&ncia com as dispu- tas, torna estes deFeitos ainda mais pesados.
3. 0 intelecto abandonado a si mesmo, em uma mente sobria, paciente, severa (sobre- tudo se ndo for impedido pelas doutrinas tradi- cionais), tenta por vezes tamb6m o segundo caminho, que 6 o justo, mas com escasso pro- veito. 0 intelecto, com efeito, se ndo for guia- do e sustentado, procede irregularmente e 6 completamente incapaz de vencer a obscunda- de das coisas. 4. Rmbos os caminhos sa movem do sen- tido e dos particulares e terminam nos principios mais gsrais, mas diferem enormemente entrs si: um toca apenas de passagem a exper~hncia e os fatos particulares, o outro oi se demor~ com m6todo e com ordem; um estabelece des- de o inicio principios gerais abstratos e inljteis: o outro sobe gradativamente as coisas mais conhecidas por natureza. 5. N8o 6 pequena a diferenp entre os idolos do mente humana s as idhias da mente divina, isto 8, entre opinides falazes e os ver- dadeiros selos e marcas impressos por Deus sobre as criaturas assim como se encontram. 6. De nenhum mod0 pods ocorrer que os axiomas estabelecidos mediante a argumenta- <do sirvam para a inven<do de novas obras, porque a sutileza da natureza supera grande- mente a da argumenta<bo. Mas os axiomas extraidos com m6todo e com ordem dos parti- culares facilmente por sua vez indicam e desig- nam particulares novos, e desse modo tornam ativas as cihncias. 7. 0s axiomas agora em uso sdo extrai- dos de uma limitada e superficial experihncia e dos poucos particulares que mais frequents- mente se apresentam; sdo de tal modo feitos b medida e segundo a extensdo destes; ndo h6, portanto, nada de estranho se nbo conduzem a novos particulares. E se por acaso se apre- senta uma inst6ncia qualquer antes n6o perce- bida ou conhecida, cuida-se de salvar o axio- ma com alguma Frivola distinsdo, quando ssria mais justo emend6-lo. 8. Para fazermo-nos sntender melhor, es- tabelecemos chamar de ant~~/pag%s do notu- rsza os temer6rios e prematuros procedimen- tos da razbo dos quais fazemos uso comumsnts nas rela<des com a natureza. Chamaremos ao contr6rio de int~rpretogdo da noturszo a raz8o que se desenvolve a partir das coisas confor- me os modos devidos. 9. As antecipa@es sbo bastante firmes relativamente ao consenso; com efeito, se tam- b6m os homens enlouquecessem de modo uni- co e conforms, poderiam mu~to bem encontrar- se todos de acordo. 10. Ou melhor, as antecipa<dss servem muito mais que as ~ntarpreta(des para provo-
car o consenso porque, extraidas de poucos exsmplos e justamente dos qus parecsm mais familiares. logo prendem o intelecto e preen- chem a fantasia; ao contrario, as interpretaq3es. extraidas esparsamente de exemplos bastante variados e muito distantes entre si, ndo podem atingir imsdiatamente o intel~cto s parecsm necessariamente, para a opinido comum, dificeis e estranhas, quase como os mistbrios da f6. 1 1. Nas ciisncias fundamentadas sobre opiniaes e sobre principios prov6vais & oportu- no o uso das antecipaQ3es e da dialhtica: nes- tes casos trata-se de forp o assentimento, e ndo de obrigar as coisas. 12. TambBm se todos os engenhos da todas as eras colaborasssm juntos e reunissem e transmitissem suas fadigas, nenhum grands progresso poderia ser obtido nas ciisncias me- diante as antecipa@ss, porque os erros enrai- zados na mente e que remontam a suas primei- ras slabora<des ndo podem ser corrigidos pela excelisncia das fun@es e dos remhdios suces- sivos. 1 3. Em vdo se espera um grands progres- so nas ci&ncias pela superposi<do s pelo en- xerto do novo sobre o velho. A instaura@o deve investir os primeiros fundamentos, se ndo qui- sarmos girar perpetuamente em um circulo com progresso escasso e quase insignificante. 14. 0s autores antigos e todos os outros conservam sua honra, porque aqui ndo ss insti- tui um confront0 sntre os engenhos e as capaci- dades, mas entre diversos caminhos e mbtodos. Ndo pretendemos ssr juizes, mas indicadores. 15. € precis0 dizer com clareza que sobre a base das antecipa~aes (isto 6, do mbtodo agora em uso) ndo se pode formular nenhum reto juizo a respeito de nosso mQtodo ou em torno das descobertas a que ele conduz. Ndo s~ pode, com efeito, pretender que nos sub- metamos ao julgamento de quem deve ser ele proprio chamado em julgamento. 16. E ndo 6 fdcil sxpor ou explicar aquilo que aqui se propas, porque coisas novas em si serdo entendidas apenas por analogia corn as antigas. 17. Da expedi(do dos franceses na IMlia, Rorgia disse que eles vieram trazendo no mdo o giz para marcar os alojamentos, e ndo as armas para combater. Do mesmo modo, nosso m&todo deve penetrar em espiritos capazes e adqua- dos a recebis-lo. Ndo podem ser utilizadas as refuta@es, dado que ndo sstamos de acordo sobre principios, nem sobre conceitos, e nsm sequer sobre a forma das demonstra@es. 18. Resta-nos apenas um cinico e simples mod0 de exposic;do: conduzir os homens para diante de fatos particulares, para suas s&rias e suas ordens, de modo que elss, por algum tem- po, se imponham renunciar 6s no@es s come- cem a familiarizar-se com as proprias coisas.
F. Bacon, Novum organum (Novo orc$o)
As linhas gerais do novo m6todo
0 caminho sminants para a d~scobar- to da vsrdada 6, portanto, o qu~ do santido s dos particularss sxtroi os axiomas, rsmon- tando por graus a ascola da genaralizo@o, at6 chsgar aos axiomas gsnsralissimos. Tal cominho Q a indu~do por elimina<do, no qua1 'ispbs-ss a ssperanga maior".
1. Ndo se trata apenas de procurar s pro- videnciar maior quantidade ds experimentos de gisnero diverso dos at& agora em uso; deve-se tamb&m introduzir um m&todo complatamente diverso e um procedimento diferente para con- duzir s fazsr avanpr a experiisncia. Como j6 foi dito, uma experi&ncia vaga s que segue ape- nas a si mesma & a190 semelhante a um andar as apalpadelas, que confunde os homens em vez de informa-10s. Mas onde a experi&ncia pro- cede squndo uma lei certa, regularmente s sem interrup~aes, entdo se pode esperar a190 de melhor das ciisncias. 2. Depois qua todo o abundante material da historia natural a da experihcia tiver sido aprontado e preparado assim como requer a obra do intelecto, ou seja, da filosofia, nem por isso o intelecto est6 em grau de agir esponta- neaments e confiante na memor~a sobre aqua- le material: seria como s@ algu&m esperasse poder tar de memoria e dominar os c6lculos de um livro de efem6rides.' At& agora, nos inven- @as, preferiu-se meditar a escrever e, portan- to, ainda ndo existe a experi&ncia Istrada. Ndo pode ser aprovada nenhuma inven~do qua ndo se sirva do escrito. Quando isso tiver entrado no uso e a experiisncia tiver ss tornado letrada, poder-ss-do nutrir maiores esperanps. 3. 0 numero dos particulares, que sdo quass um ex6rcito. & grandissimo, e estss par- ticulares estdo tBo esparsos e difundidos que confundem e desorientam o intelecto. Ndo se
deve, portanto, esperar algo de bom das es- caramucas, dos movimentos Ievianos e dos sus- piros do intelecto, at6 qua todo o material que se refers ao orgumento que & objeto do pes- quisa ndo tiver sido preparado e coordenado medianta t6buas de pesquisa id8neas, orde- nadamente dispostas e quase vivas, e at& qua a mente ndo se aplique a trabalhar sobre os auxilios devidamente dispostos e preparados que estas t6buas fornecern. 4. Na verdade, depois que tivermos sob os olhos a grande quantidade dos partlculares bem ordenados, ndo 6 preciso colocar-se ime- diatamente a pesquisar e a inventar novos par- ticulares e novas obras: e, em todo caso, se isso acontecer, ndo ser6 preciso parar nestes. De fato, quando todos os experimentos de to- das as artes tivessem sido recolhidos e reuni- dos, e submetidos ao conhecimento e ao jul- gamento de um so homem, este - limitando-se a transferir estes experimentos de uma arte para outra e mediante a experi6ncia que chamamos letrada - estaria em grau de descobrir muitas coisas novas, irteis b vida e 6 condi@o huma- na. Ndo negamos isso, mesmo que as maiores ssperanps n6o devam ser postas no expe- ri&ncia Ietrada, mas no nova luz dos axiomas, que sdo extraidos dos particulares segundo regras certas e que, por sua vez, indicam e de- signam particulares novos. 0 caminho n percor- rer, com efeito, ndo & plano, mas em subida e em descida: primeiro se sobe at& os axiomas, depois se desce as obras. 5. Todavia, n60 devemos permitir qua o intelecto sake e voe dos particulares para axio- mas mais distantes e gerais (tais sdo os assim chamados principios das artes e das CO~SOS), para depois provar e verificar os axiomas m&- dios b luz de sua verdade imovel. Rt& agora se procedeu assim, em parte porque o intelecto seguia este caminho por impulso natural, em parte porque a isso o tinham habituado as de- monstra@es de tipo silogistico. Poderemos es- peror bem das ci&ncias apenas quando, por meio de uma escala verdadeira, em graus con- tinuos, sem saltos ou interrup~des, se podera subir dos particulares at& os axiomas menores, destes aos mbdios, depois aos outros superio- res e, finalmente, aos axiomas mais gerais. 0s axiomas mais baixos, com efeito, ndo diferem muito da pura experi6ncia. 0s mais altos ou mais gerais (falo daqueles de que dispomos atualmente) s6o conceituais e abstratos, priva- dos de qualquer solidez. 0s axiomas m&dios, ao contr6ri0, sdo verdadeiros, solidos e vivos: a eles estdo confiadas as esperantos e as sor- tes dos homens. Sobre eles, enf~m, se funda- mentam os axiomas mais gerais, por&m tais que n6o sejam abstratos, mas sejam verdadeira- mente limitados pelos axiomas mbdios. Ao intelecto dos homens, portanto, ndo devemos acrescentar asas, mas chumbo e pe- sos a fim de impedi-lo de saltar evoar. lsso at& agora ndo foi feito; quando isso for feito se poder6o nutrir mais altos esperanps sobre o destino das ci&ncias. 6. Para estabelecer os axiomas, devemos alhm disso excogitar uma forma de indu@o di- ferente da qua at& agora ssta em uso, que ndo deve apenas encontrar e provar os assim cha- mados principios; mas tambbm os axiomas me- nores e mhdios e todos os outros. R inducdo qua procede por enumera<do simples &, com efeito, uma coisa pueril: suas conclusdes sdo prec6rias; ela & exposta ao perigo de uma ins- tdncia contraditoria; julga com base em um nir- mero de fatos inferior ao necess6r10, e apenas em base aos que tem ao alcance do mdo. A indu~do que sera 6til para a inven@o e a de- monstrqdo das cihcias e das artes deve QO contrbrio analisar a natureza medlante as devi- das elimina$%s e exclusdes; e finalmente, de- pois de um nirmero suf~ciente de negativas, pode concluir em base as afirmativas. lsso at& agora jamais foi feito e nem tentado, a n60 ser talvez por Platdo, que em algum caso faz uso desta forma de indu<do para ~sxtrair defini@es e idbias. Todavia, para fazer que esta forma de indugm ou de demonstra@o possa operar de modo bom e legitimo, & preciso fazer uso de muitas coisas bs quais, at& agora, nenhum mor- tal jamais pensou. Deveremos, portanto, trabo- lhar sobre ela mais do que at& agora ndo se trabalhou em torno do silogismo. Com o auxilio dessa indu~do se dever6 proceder nd0 so para descobrir os axiomas, mas tamb&m para definir as no<des. Nessa indu~do sem duvida pde-se a esperanca maior. 7. Ao constituir os axiomas mediante esta indu~do, & preciso tambhm consideror e exami- nar se o axioma que se const~tui & adequado e quase construido sobre medida em rela@o aos particulares dos quais se extrai, ou se ao contr6- rio & mais amplo e mais vasto. Se for mais am- plo ou mais vasto, & preciso ver se esta sua amplitude e vastid60 560 justificadas pela de- signa<do de novos particulares, como por uma fidejussoria: a fim de que n60 ocontqa ou de fixar-se apenas sobre particulares j6 conhecidos, ou entdo de prender, em um abrqo confuso. apenas sombras ou formas abstratos, e ndo coi- sas solidas e determinodas na mathria. Quando tudo isso tiver entrado no uso, entdo veremos nascer com raz6o esperanps bem fundadas. F. Bacon, Novum organum.