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O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS
TERESA PAIVA
Neurologista, especialista em Medicina de Sono
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Dormir bem é um dos segredos para manter uma boa saúde física e mental. Há que adotar uma boa higiene do sono, para uma noite verdadeiramente descansada.
H – Por que é tão importante dormir bem? Teresa Paiva (TP) - Porque o sono assegura a nossa saúde, a nossa capacidade intelectual, cognitiva e de memória, e a nossa sobrevivência. H – Nos últimos anos, parece estar na “moda” vangloriarmo-nos de que dormimos pouco… TP – Sim, mas é algo que não faz sentido nenhum. Todos os grandes génios da época pós-industrial dormiam bem, se contar todas as diferentes disciplinas. Desde Einstein, ao Darwin, ao Beethoven. Três exemplos completamente diferentes, e todos dormiam muito bem e muitas horas. Também foi feito um inquérito, em Portugal, a pessoas bem-sucedidas e quase todos dormiam muitas horas. A ideia de que dormir pouco é bom, é uma ideia verdadeiramente estúpida, com consequências, igualmente estúpidas e pouco saudáveis. H – Por que motivo dormimos mal? TP – O que perturba mais o sono é, por um lado, a personalidade. As personalidades perfeccionistas e muito preocupadas, geralmente, gostam de estar em controlo de tudo e sob o controlo do sono. Por outro lado, levam as preocupações e tudo
o que têm de fazer para a cama e, depois, não dormem. Essa é uma característica que, geralmente, é muito contrária ao sono. Depois, em termos de hábitos, tudo o que seja multimédia, desde a televisão às redes sociais, os jogos online, os iPad’s, os iPods, são ações que distraem as pessoas com tarefas não essenciais, mas que, por serem repetitivas, conduzem à redução do sono. H – No caso das características de personalidade, como se controlam? TP – Através de técnicas comportamentais, que visam o controle de algumas características ou comportamentos que são negativos para dormir. H – A pandemia veio agravar a situação? TP – As pessoas tendem a ser muito catastróficas. Por exemplo, na primeira vaga, constatámos que metade das pessoas passou a dormir pior, mas outra metade dormiu igual ou melhor. Se pensarmos na metade das pessoas a dormir pior, percebemos que é muito. Felizmente, outras passaram a dormir melhor, graças a uma importante redução do stress: deixaram de se levantar tão cedo, de andar nas filas de trânsito de manhã para levar os filhos à escola, entre outras tarefas. Nestes casos, esta redução do stress foi algo real e positiva. H – Houve, então, efeitos positivos no sono, fruto da pandemia? TP – Temos que aprender com esta pandemia e temos de mudar comportamentos. Isso é uma ideia muito importante, e fundamental, senão o sofrimento não serviu para nada. H – Há grandes diferenças entre homens e mulheres? TP – Há diferenças, sim. As mulheres, em todo o mundo, têm mais problemas de sono do que os homens. No período da pandemia, há a acrescentar o facto de, efetivamente, as mulheres tirem tido mais trabalho doméstico do que os homens; na maioria dos casos, terem assumido a responsabilidade de lidar com a telescola dos filhos, para além do risco acrescido de poderem ficar sem o emprego. Como se percebe as diferenças existem, com a pandemia ficaram mais nítidas. H – Qual as patologias do sono mais frequentes? TP – A insónia é a mais frequente de todas. A seguir, a apneia do sono, e a mistura das duas, que é uma outra doença bastante frequente. A síndrome das pernas inquietas e dos movimentos periódicos do sono e a privação de sono, que atinge todas as idades e é um problema, do ponto de vista de saúde pública, bastante grave. H – A pandemia veio agravar estas patologias? TP – Houve uma pequena minoria que sofreu com a pandemia, mas muitos estiveram até razoavelmente bem e equilibrados. Recebo doentes muito graves, de todo o país e do estrangeiro e, na maior parte das vezes, não chegam com coisas relacionadas com a pandemia, mas sim com patologias bastante antigas. Portanto, na minha prática não notei atrasos no diagnóstico, e falamos de cerca de 1500 doentes que são seguidos na rede de laboratórios de sono especializados, localizados em todo o país. H – Quais os hábitos que se devem adotar para uma boa higiene do sono? TP – Horários regulares; praticar atividade física, preferencialmente, de manhã e nunca à noite; apanhar luz do sol, preferencialmente, da parte da manhã; fazer quatro e cinco refeições por dia e nunca refeições muito tardias, bem como seguir a dieta mediterrânica – o aumento do consumo de vegetais e fruta frescos, de vegetais cozidos, leguminosas, ovos e leite, moderar o consumo de carne e peixe e eliminar os doces, as sobremesas, os refrigerantes com açúcar, assim como moderar o álcool (quem tem apneia do sono não deve beber álcool ao jantar). Relativamente ao trabalho e, principalmente o teletrabalho, tem que haver limites. As pessoas não podem trabalhar, de uma forma indefinida, horas e horas a fio. É preciso fazer uma separação nítida entre teletrabalho, trabalho da casa e vida quotidiana. Devemos, ainda, adotar comportamentos e atitudes que sejam positivos, como por exemplo, hobbies, divertirmo-nos e, em vez de nos queixarmos, relativizar e usar o stress só quando é resolutivo de qualquer coisa.
O SONO NAS CRIANÇAS
As crianças também podem sofrer de problemas relacionados com o sono, mas tudo depende da idade. «Uma criança recém-nascida, saudável, em princípio, dorme bem, desde que os pais não façam coisas que a habituem a dormir mal», refere Teresa Paiva. Quando se tem um bebé pequeno em casa, a médica deixa um alerta: «A primeira pessoa a ser acompanhada tem que ser a mãe. Se a mãe estiver doente, ansiosa e com privação de sono, vai ter muito mais dificuldade em tratar do bebé». Por isso, reforça, «deve existir sempre uma intervenção à família, no seu todo».