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Opinião, Miguel Vassalo

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Opinião

Miguel Vassalo

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Modelo de subscrição: será o fim da propriedade?

Ao longo dos últimos anos a indústria automóvel tem vindo a evoluir, procurando dar uma resposta à altura dos novos cenários macroeconómicos e legislativos, de inovação tecnológica e das alterações do comportamento do consumidor. É neste contexto de transformação que temos assistido à emergência de novos modelos de negócio, nomeadamente o modelo de subscrição.

Especialmente a partir de 2017, muitos fabricantes seguiram os passos de pequenos pioneiros no desenvolvimento deste modelo inovador, desbravando território desconhecido. Em retrospectiva podemos observar que o grau de sucesso foi variável. Perante as dificuldades algumas marcas recuaram, optando por encerrar ou colocar em pausa algumas dessas iniciativas. No entanto, ainda que nem todas as empresas pareçam ter encontrado um modelo de negócio viável, é certamente prematuro declarar a morte do modelo de subscrição.

A pandemia trouxe uma procura acrescida por meios de transporte individual e, ao mesmo tempo, alterou padrões de deslocação. Por outro lado, nos tempos de incerteza económica em que vivemos, o consumidor valoriza como nunca a flexibilidade e o baixo risco. Todos estes são factores que se adequam especialmente bem à promessa de valor deste produto: a vantagem de ter um automóvel só para si, sem as desvantagens de realmente o possuir, parece ser, portanto, o melhor de dois mundos.

ninguém quer ficar fora do negócio

Procurando conveniência, flexibilidade e um compromisso mínimo, pagamos uma renda mensal com tudo incluído (manutenção, seguro, etc.) por períodos que podem variar entre um a vários meses.

Tipicamente, quanto mais prolongado o compromisso, menor é a renda. E sim, caro leitor: em bom rigor, o modelo de subscrição partilha características com os tradicionais modelos de aluguer e renting. Na verdade, propõem-se fazer a ponte entre eles. Se por um lado podemos escolher um veículo específico, ao contrário do aluguer onde apenas podemos selecionar a categoria, por outro dispensa os compromissos contratuais rígidos que tradicionalmente sentimos no renting. Para efeitos de caracterização, combina os benefícios de ambos, posicionando-se do ponto de vista de duração entre os dois.

A consultora BCG estima um crescimento acentuado deste modelo de negócio na Europa e Estados Unidos, podendo chegar a 30 a 40 mil milhões de dólares (15% da venda de novos) em 2030, representando entre cinco a seis milhões de automóveis subscritos.

Sem surpresa, vemos diversos atores, dentro e fora da indústria a testarem o conceito; fabricantes, rent-a-cars, gestoras de frota, concessionários, plataformas online e start-ups, parece que ninguém quer ficar para trás.

Os fabricantes e respetivas financeiras estão empenhados em encontrar novos canais de venda e chegar diretamente ao consumidor.

A abrangência do conceito “pacote de mobilidade”

Pelas suas características a subscrição permite baixar barreiras de entrada na marca ou em produtos como os elétricos, além de encurtar o ciclo de diálogo com o consumidor, potenciando a fidelização. Adicionalmente, este negócio está eminentemente assente numa plataforma de e-commerce e pode estar estrategicamente ligado com a implementação do modelo de agência que explorámos aqui há umas edições. Já as RAC e gestoras de frota, experientes na optimização do ciclo de vida do automóvel, estão a jogar no seu terreno natural, explorando as possibilidades de interceção do seu modelo tradicional com este novo. Conceitos abrangentes como a subscrição de pacotes de mobilidade, onde não só se inclui o automóvel, mas também o acesso ao transporte público e outras formas de mobilidade partilhada, apenas aguardam a necessária escala e maturidade do

Os fabricantes e respetivas financeiras estão empenhados em encontrar novos canais de venda e chegar diretamente ao consumidor

ecossistema para se consolidarem como proposta verdadeiramente atraente em meio urbano.

Finalmente disruptores, energizados pelo capital de risco, sem as amarras de organizações e processos existentes desenham todo o negócio de raiz. Efetivamente, parecem estar a ser os mais bem-sucedidos, com um reconhecido foco no cliente, uma experiência do consumidor de excelência e uma viagem digital conveniente, oferecendo invariavelmente uma solução multimarca.

Uma evolução natural da forma de encarar o automóvel

A heterogeneidade não se fica pelos intervenientes e a configuração do seu modelo de negócio. A diversidade de abordagens à construção do produto é demonstrativa do nível de empenho em servir vários tipos de consumidor, alinhamento estratégico corporativo e testagem da viabilidade económica do modelo. Desde ofertas puramente elétricas até topos de gama, novos ou usados, monomarca ou multimarca, muita flexibilidade ou alguma rigidez, particulares ou empresas, são apenas exemplos do largo espectro apresentado.

Será apenas uma questão de tempo, várias iterações e ciclos tentativa-erro até vermos o modelo de subscrição ser economicamente viável de forma generalizada e encarado pelo consumidor como mais uma alternativa ao suprimento das suas necessidades de mobilidade.

Apesar de o conceito de posse permanecer importante para alguns, é expectável que produtos orientados para o serviço tenham um enorme potencial. E tal como o Spotify não acabou com a indústria fonográfica ou a Netflix com a indústria cinematográfica, a indústria automóvel como a conhecemos não será certamente ameaçada pelo modelo de subscrição.

Nos tempos de incerteza económica em que vivemos, o consumidor valoriza como nunca a flexibilidade e o baixo risco. A vantagem de ter um automóvel só para si, sem as desvantagens de realmente o possuir parece ser, portanto, o melhor de dois mundos

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