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Curtos em insustentabilidade

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Enrico Stacchietti

Enrico Stacchietti

CURTOS EM INSUS TENTABI LIDADE

No mundo dos investimentos há muitas maneiras de incentivar as empresas a assumir boas práticas ESG. Utilizar estratégias long-short é uma delas.

No universo de investimento sustentável há várias formas de enfocar a aproximação a uma empresa cuja abordagem à sustentabilidade esteja em dúvida, seja pelo seu posicionamento individual ou pela sua pertença a um setor controverso.

O mais habitual é a exclusão, ou seja, não investir nesse tipo de empresas.

ADOTAR POSIÇÕES CURTAS NAS EMPRESAS COM PRÁTICAS ESG DÉBEIS PENALIZA AS EMPRESAS COM MODELOS DE NEGÓCIO POUCOS SUSTENTÁVEIS E PERMITE A REALOCAÇÃO DE CAPITAL PARA OUTRAS COM MELHORES PRAXIS NESTA MATÉRIA

Mas se já se investiu e, ou a avaliação da sustentabilidade se deteriora ou não melhora como se esperava, os gestores e analistas podem exercer a sua persuasão e pressão desdobrando as diversas formas de ativismo dos acionistas. Claro que se nada disto funciona, há sempre a hipótese de desinvestir.

Para além disso, existe outra fórmula. A de aproveitar as diferenças de valor que pode haver entre as empresas mais e menos sustentáveis através da tomada de posições longas nas primeiras e curtas nas segundas.

As estratégias long-short no âmbito do investimento sustentável têm sido frequentemente objeto de estudo por parte da literatura académica, sobretudo em relação à análise das diferenças de rentabilidade entre o investimento sustentável e o convencional.

No mundo da prática da gestão, alguns investidores “decidem dar um passo em frente adotando posições curtas naquelas empresas que apresentem práticas ESG débeis. Isto penaliza as empresas com modelos de negócio pouco sustentáveis e permite a realocação de capital a longo prazo para outras com melhores praxis nesta matéria”, assinala Álvaro Cabeza, responsável da UBS AM para a Península Ibérica.

Meraj Sepehrnia, diretor de Estratégias Sustentáveis de Rentabilidade Absoluta da Pictet AM, e Nataliya Taleva, especialista da mesma gestora, destacam que os hedge funds foram pioneiros em aplicar esta técnica relativamente à sustentabilidade, centrando-se fundamentalmente em questões de governo corporativo. “Nas últimas décadas muitos escândalos corporativos podiam não ter visto a luz do dia se não fossem estes fundos. Detetaram pela primeira vez problemas no gigante da energia Enron; perseguiram a suposta fraude na fintech wirecard, e descobiram uma fraude contabilística na Steinhoff”, dão como exemplo. Para ambos os especialistas, se esta estratégia funcionou quanto ao governo corporativo, pode funcionar também em assuntos ambientais e sociais.

Ramón Esteruelas, especialista sénior de Investimentos de Ações Temáticas e Especializadas na BNP Paribas AM, considera que as estratégias long-short têm sentido no âmbito do investimento sustentável por diversas razões. “O posicionar-se curto nas empresas que não estão a tomar medidas para descarbonizar, digitalizar e armazenar o nosso sistema energético atual, tem como resultado aumentar os custos de financiamento dessa empresa. Para além disso, enviamos um sinal claro ao mercado: esta empresa tem menos potencial de crescimento sustentável no longo prazo”, aponta.

VENCEDORES E DERROTADOS

Trata-se de diferenciar entre vencedores e derrotados como oportunidade de investimento. “As empresas com credenciais meio-ambientais sólidas têm mais probabilidades de bater as que têm modelos de negócio insustentáveis e vulneráveis ao risco de transição. É possível tirar partido dos ativos obsoletos mediante estratégias de investimento alternativas, como a tomada de posições curtas”, estima.

No entanto, estas estratégias long-short entranham certos riscos. Podem ocorrer coisas como a posição curta subir e a longa cair. O pior. Para além disso, há que ter em conta a assimetria do ganho em cada uma das partes e o custo de colocar-se curto. Deste modo, como implementar esta manobra?

Álvaro Cabeza assinala que na UBS AM adotam “posições curtas em empresas com potencial de subida limitado e com muito risco de queda. Procuramos empresas que não se classifiquem bem no nosso método de análise, que combina a análise fundamental com a quantitativa e qualitativa. Estas entidades costumam mostrar balanços débeis, pobres governos corporativos e valorizações excessivas”.

A OPINIÃO DE

ISABEL DE LINIERS, Vendas sénior, DWS Ibéria

Ramón Esteruelas, da BNP Paribas AM, explica como podem funcionar em empresas de um mesmo setor. “O setor siderúrgico tem uma das maiores pegadas de carbono do mundo atual, mas existem siderurgias que utilizam energia renovável e apenas trabalham com sucata e aço reciclado, cuja pegada é muito menor. Tendo em conta tais posições longas, um gestor pode posicionar-se curto numa siderurgia tradicional, que utiliza mineral ou ferro e carbono, e que tem uma pegada muito maior”, detalha. Na sua opinião, trata-se de tentar conseguir melhores rentabilidades e reduzir o risco.

Outro exemplo é dado por Meraj Sepehrnia e Tanaliya Taleva, da Pictet AM. Na temática da mudança para um sistema alimentar mais sustentá-

OS HEDGE FUNDS FORAM PIONEIROS, PENALIZANDO EMPRESAS POUCO SUSTENTÁVEIS, SOBRETUDO EM MATÉRIA DE GOVERNANCE. ESCÂNDALOS COMO O DA ENRON VIRAM A LUZ DO DIA POR CAUSA DESTES FUNDOS

vel, “uma empresa de cereais pode ter elevadas pontuações ESG, apesar de continuar a produzir alimentos açucarados e pouco saudáveis comercializados com embalagens de plástico. Neste caso, pode ter lugar uma posição de queda, mas de subida noutra empresa que produz alimentos saudáveis em embalagens recicláveis que geram cerca de 47% menos resíduos”, explicam.

EXCLUSÕES

Para além disso, podem combinar-se as exclusões na parte longa com as apostas a curto prazo. Robert Schramm-Fuchs, gestor de carteiras da Janus Henderson Investors, explica que para a carteira longa do seu universo europeu investível de cerca de 1.300 títulos, excluem todas as empresas com uma percentagem de receitas de grupo superior a 10% na extração de carbono térmico, areias betuminosas, perfuração no Ártico e energia de xisto. “Para além disso, descartamos todas as empresas que violam o Pacto Mundial das Nações Unidas. Por último, também deixamos de fora 10% dos títulos europeus mais baixos segundo os dados de pontuação de risco das agências de classificação ESG”, acrescenta. Nessa parte longa combina-se com posições curtas. “Em geral, elegemos cerca de 25 títulos do nosso universo investível para a carteira curta”, aponta.

Acerca das dúvidas sobre se colocar-se curto pode ser menos ético, Ramón Esteruelas é claro: “Acreditamos que estas práticas habituais não deverão considerar-se pouco éticas, inclusive no contexto de um fundo sustentável; ao fim e ao cabo, vender de forma curta ativos obsoletos permite a um gestor utilizar o lucro gerado para financiar outras empresas que criem soluções sustentáveis”.

OFERTA MONETÁRIA E INFLAÇÃO

A política monetária ultraacomodatícia adotada pelos bancos centrais em resposta à COVID-19 fez com que o M2 subisse massivamente ao longo da tendência de crescimento de 15 anos nos EUA. Se olharmos para a grande crise financeira, vemos que a oferta monetária não registou esse incremento, porque naquela altura o sistema financeiro estava sob pressão, consumidores e bancos estavam a desalavancar-se, e os governos foram empurrados para a austeridade. Desta vez os bancos estiveram em melhor forma, os consumidores estimulados e não houve desalavancagem: um ciclo diferente. Os bancos centrais estão a aplicar medidas imediatas, mas a questão é até que ponto as taxas de juro devem subir para trazer o M2 de volta ao normal e a que ritmo. A Fed elevou sua principal taxa de juros em 0,75% (em junho), e as principais taxas de juro devem chegar a 3,25 - 3,50%. O BCE ainda não reagiu, mas planeia fazê-lo em julho. A boa notícia é que a taxa básica e as expetativas de inflação do mercado estão a mover-se de forma relativamente paralela. Estudos mostram que carteiras de ações de baixa volatilidade/beta oferecem uma combinação de altos retornos médios, com baixas quedas. O ETF Xtrackers MSCI World Min.Volat. tem um beta de 66% em relação ao índice de referência, demonstrando baixos drawdowns que podem ser alcançados em ambientes de mercado turbulentos.

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