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Contratar em tempo de crise Para onde olha a indústria
Da Nfoque Executive Search medem a temperatura às oportunidades profissionais que oferece hoje a indústria da gestão de ativos. Vivemos uma época de incerteza onde abrandaram os projetos de crescimento de equipas que estavam planificados e que agora ficam em stand by. E algumas oportunidades profissionais que tinham possibilidade de seguir em frente estão agora paralisadas.
Existe muito mais prudência na hora de procurar talento e oferecer oportunidades profissionais no setor. Poderá ter a ver com a situação atual da pandemia? Serão os movimentos de fusões e aquisições que o setor está a sofrer? Estamos perante uma mudança de ciclo? A resposta é dada pelos próprios agentes do negócio. Fizemos uma aproximação a alguns destes interlocutores e entidades de gestão na Península Ibérica com o objetivo de conhecer as suas opiniões acerca da situação atual na indústria de fundos quanto às questões comentadas.
“Enfrentámos anos duros para muitos setores da economia, incluindo o setor financeiro”, vaticina Sebastián Velasco, responsável pela Península Ibérica na Fidelity. “A indústria de fundos estará submetida a forças opostas”. Por um lado, problemas de liquidez nas famílias e empresas provocarão reembolsos e menor apetite pelo risco. Por outro lado, a taxa de poupança aumenta em períodos de recessão, como aconteceu entre 2008 e 2010, e os fundos absorveram parte deste crescimento. “Mas não nos esqueçamos de que já antes do aparecimento da pandemia nos estávamos a preparar para uma mudança de ciclo que nos obrigou a rever os nossos planos de negócio”, recorda.
E essa mudança pode ver-se como um desafio ou como uma oportunidade. Sophie del Campo, diretora geral da Natixis IM para a Península Ibérica, América Latina e US Offshore, opta pela segunda opção. “O crescimento das gestoras internacionais
NESTA CRISE SURGIRÁ A PROCURA DE NOVOS PERFIS: ESG, ALTERNATIVOS, TECNOLOGIA…
pode continuar a uma velocidade elevada, já que se vê impulsionada por alguns factores que têm beneficiado a indústria nos últimos anos e que, em certa medida, a irrupção da pandemia está a acelerar”, afirma.
IMUNIDADE
Apesar do coronavírus e da crise económica que trouxe consigo, muitas gestoras internacionais fazem um balanço positivo do ano. É o caso de Miguel Luzárraga, responsável de Vendas para Portugal e Espanha da AllianceBernstein, que reconhece que 2020 foi para eles melhor do que o esperado. “Não restam dúvidas de que uma pandemia gera incerteza, mas também é um momento de oportunidades”, sustenta.
Enfrentar uma crise deste calibre foi uma grande prova de fogo para as gestoras. E se nos resumirmos ao geral, tem sido um desafio superado. “Na situação atual demonstrou-se a força, a capacidade de adaptação e a eficiência deste setor”, assegura Ignacio de la Maza, responsável do Canal Intermediário para EMEA e América Latina na Janus Henderson Investors.
“A indústria tem sabido oferecer soluções a situações complexas mostrando a capacidade para se adaptar às circunstâncias e saindo reforçada de cada problema que superou. O setor está preparado, é sólido e forte para o que possa vir”, concorda Carla Bergareche, diretora geral da Schroders para Portugal e Espanha.
Por isso, Elena Guanter, diretora geral da Candriam para a Península Ibérica e América Latina, atrever-se-ia a falar de imunidade face à pandemia no setor. “A situação atual não afetou negativamente a inústria”, explica.
É nesse contexto, depois de se ter passado por uma das mais difíceis crises do setor em décadas, que devemos enquadrar as projeções de contratação das gestoras internacionais. Javier Dorado, diretor geral para Portugal e Espanha da J.P. Morgan AM, comenta que da perspetiva da estratégia da entidade, os números são bons e isso leva a ter estabilidade nas equipas, embora seja um momento de prudência e, portanto, não preveem muito movimento salvo casos muito pontuais. “Existem sempre necessidades, mas agora prevalece a eficiência dos profissionais”, conta.
Marisa Aguilar, diretora geral da Allianz Global Investors para a Península Ibérica também defende
A INDÚSTRIA DEMONSTROU FORÇA, CAPACIDADE DE ADAPTAÇÃO E EFICIÊNCIA
prudência: “Continua a faltar-nos visibilidade, por isso o nosso objetivo para os próximos meses é otimizar a estrutura existente, consolidando esta nova forma de levar a cabo o negócio, uma vez que estamos muito próximos do cliente. O tempo o dirá se estes novos usos são temporais ou estão aqui para ficar, e aí terá mais sentido tomar decisões relativamente às equipas”. É a sensação geral entre os responsáveis das entidades estrangeiras: estamos num momento de pausa para respirar.
Sasha Evers, diretor geral para a Península Ibérica e América Latina da BNY Mellon Investment Management, atualmente percebe que a grande maioria das entidades não tem a intenção a curto-médio prazo nem de reduzir nem de incrementar a estrutura organizativa.
No que várias entidades estão de acordo é em que talvez os maiores movimentos venham de operações inorgânicas. Por fusões entre gestoras de tamanho mediano ou pequeno, acredita Evers. “A situação no setor financeiro em geral e na atualidade ver-se-á alterada em função dos movimentos de integrações entre distintas entidades, firmas e outras instituições como aconteceu recentemente com a Franklin Templeton e a Legg Mason”, analisa Javier Villegas, responsável para a Península Ibérica na Franklin Templeton.
NOVOS PERFIS
Isto não quer dizer que não existirão oportunidades de crescimento em capital humano. “Embora a priori possa parecer que a concentração da indústria por ambos os lados (buy side e sell side) vá limitar o número de oportunidades, acredito que uma indústria em constante evolução como a nossa vai sempre requerer uma elevada especialização que fará com que surjam novos perfis com elevada procura (por exemplo, especialistas ESG). Por tanto, estou convencido de que a indústria continuará a oferecer oportunidades interessantes para os profissionais qualificados”, defende Nabil El-Asmar Delgado, responsável da Vontobel para a Península Ibérica.
Sebástián Velasco também o defende: “Todas as empresas do setor financeiro vão continuar a procurar formas de fazer mais com menos. As gestoras de fundos não são uma exceção à regra. O setor vai necessitar de talento nas áreas de sustentabilidade, alternativos e tecnologia”.
A OPINIÃO DE
ARIEL BEZALEL Responsável de estratégia e obrigações, Jupiter AM
AS YIELDS DOS TREASURIES AMERICANOS SUBIRAM, MAS NÃO SE PREOCUPEM COM A INFLAÇÃO
O maior evento deste ano no mercado de obrigações foi a forte subida das yields das obrigações do tesouro Americano a 10 anos. Este tema foi mais tarde invalidado pelo presidente da Fed Jerome Powell e o movimento das obrigações do tesouro não abalou a nossa forte convicção de que as yields vão continuar baixas. Com o elevado valor de dívida na economia global - cerca de 280 biliões que continuam a aumentar e boa parte dos quais não é produtiva - qualquer aumento nas yields pode criar volatilidade em ativos de risco e fazer com que as yields voltem a cair. Os spreads de crédito tiveram uma incrível viagem de ida e volta no pós-pandemia e estão de volta aos ajustados níveis prépandemia. Isto reflete tanto a procura por yield como o apoio dos bancos centrais (os bancos centrais não querem spreads de créditos mais alargados). A inflação está a ser controlada em parte pelo fraco crescimento dos salários. O trabalho não tem poder de fixação de preços e a inteligência artificial, a robótica e outras tecnologias fazem desta uma tendência de longo prazo e durante a pandemia as empresas criaram formas ainda mais eficientes de operar. As obrigações soberanas chinesas a 10 anos estão a ser vistas como muito atrativas. A economia chinesa está a crescer fortemente sem sinais de inflação, enquanto está a contratar trabalhadores, tem o crescimento populacional estagnado e uma bolha de crédito - semelhante às condições no mundo desenvolvido - o que significa que, do meu ponto de vista, a China está preparada para enfrentar muitas das forças macroeconómicas e demográficas que têm levado à queda das yields noutras partes do mundo desenvolvido.